Revista Interativa Sinttel-Rio nº 11

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As polêmicas da Rio+20 Este nº 2 da Interativa online circula exatamente no período em que as atenções do mundo todo estão voltadas para a Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. A exemplo do que ocorreu duas décadas atrás, dois grandes blocos dividem a cidade do Rio. Em Jacarapeguá, na Zona Oeste, quase 200 chefes de Estado e de governo discutem o futuro com a responsabilidade de quem está à frente dos destinos de bilhões de seres humanos. No Aterro do Flamengo, na Zona Sul, milhares de representantes e militantes de ONGs e movimentos sociais planetários fazem o contraponto, denunciando o que chamam de “capitalismo verde” e cobrando um novo modo de produção que respeite a vida e o meio ambiente. Dois temas da Conferência são abordados por Interativa: o acesso universal à água potável e ao saneamento, ainda hoje um sonho distante de milhões de pessoas em todo o planeta; e a Economia Verde, conceito altamente polêmico e tema que vai dominar os debates na Rio+20 associado à ideia de desenvolvimento sustentável. Sustentabilidade que é questionada pela professora Tatiana Dahmer, em artigo nas páginas 7 e 8. Para além dos debates fundamentais da Rio+20, esta edição também discute a questão da saúde na busca pela beleza a qualquer custo. E fala de cultura, com a diversidade do Anima Mundi, o festival internacional de filmes de animação que mobiliza centenas de pessoas de todas as idades; e a explosão de talento da jovem Gabriela Queiroz, uma das mais premiadas violinistas brasileiras. Talento, aliás, que levou à operadora Lorrana Bilheo a responder à convocação da WebTV Sinttel-Rio e enviar um texto para a revista. Uma boa leitura! EXPEDIENTE Edição: Rosa Leal Programação Visual: Alexandre Bersot Diretor de Imprensa: Marcello Miranda Arte da capa: Alexandre Bersot

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Interativa é uma publicação do


Rio + 20

Acesso à água potável e saneamento Direito humano reconhecido, mas ainda ameaçado Rosa Leal

Nos últimos vinte anos, desde a Rio 92, a população do planeta cresceu 26%, atingindo sete bilhões de pessoas em 2011. Desse total, cerca de 800 milhões ainda não têm acesso à água potável e 2,5 bilhões não contam com saneamento adequado. Rosa Leal

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ma das prioridades da agenda da Rio+20, o acesso universal à água e saneamento deverá ser alvo de um pacote de medidas, de acordo com a opinião geral de todos os Estados negociadores da Declaração do Rio, que esperam assim mandar uma dupla mensagem: não temos energia sem água e nem água sem energia. Para os especialistas, além de garantir a universalização do acesso à água potável, os governos também tem que se preocupar

com a economia da água e com a necessidade de proteger os ecossistemas, uma vez que a seguir o ritmo atual de uso de recursos naturais, não haverá mais água em 15 anos. Isso, apesar de o mundo ter conseguido cumprir uma das metas dos Objetivos do Milênio, a de reduzir à metade a população mundial sem acesso a água potável antes de 2015. Os Objetivos, definidos pela Assembléia Geral da ONU, incluem ainda reduzir pela metade o número de pessoas que

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sofrem pobreza e fome, com relação a 1990, garantir educação primária universal, promover a igualdade de gênero e reduzir a mortalidade infantil e a materna, combater a Aids, a malária e outras enfermidades, assegurar a sustentabilidade ambiental, e fomentar uma associação mundial para o desenvolvimento. Tudo isto até 2015. Só que o mundo chega à Rio+20 com o dobro de produção de plástico e elevação de 40% na emissão de gases poluentes. Aprodução de comida aumentou 45% e a extração de materiais, 41%. Se a demanda por recursos naturais utilizados na Terra continuar a expandir nesse ritmo pelos próximos vinte anos, precisaremos de quase três planetas em 2050 para suprimir as necessidades da população. É o que diz o relatório Living Planet, divulgado pela WWF em maio deste ano.

Crianças, as principais vítimas da falta de saneamento A partir de 2010, o acesso à água potável e ao saneamento básico passou a ser considerado um direito humano essencial, conforme Declaração da Assembleia Geral da ONU. A decisão foi tomada por 122 votos a favor, dentre os quais o Brasil, 41 abstenções e nenhum contrário, apesar de 29 países terem se ausentado da votação. De acordo com o informativo Progress on Drinking Water and Sanitation2012 (Progresso sobre a Água Potável e Saneamento 2012) da Unicef e da Organização Mundial de Saúde, em 2015 mais de 92% da população mundial terá acesso à água potável. Para o Diretor Executivo da Unicef, Anthony Lake, a notícia é especialmente importante para as crianças. Os estudos indicam que, anualmente, cerca

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de 1,5 milhão de crianças menores de cinco anos morrem e 443 milhões de aulas são perdidas no planeta por conta de doenças relacionadas à potabilidade da água e à precariedade dos serviços de saneamento básico. O saneamento, aliás, é absolutamente desatendido pela comunidade internacional. Hoje, somente 63% da população mundial tem acesso ao saneamento e este número não deverá ultrapassar os 67% em 2015, porcentagem ainda muito abaixo para os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, que é atingir 75%. Há enormes problemas que ainda precisam ser resolvidos. Os países mais pobres perdem 5% de seu produto interno bruto por culpa da crise, enquanto a população perde tempo coletando água ou sofrendo de doenças como diarréia, o que a impede de trabalhar e estudar e sobrecarrega os frágeis sistemas de saúde. Na África, por exemplo, somente 61% dos habitantes tem água potável, em comparação com os 90% da América Latina e Caribe, sendo que mais de 40% das pessoas que necessitam de água limpa, vivem na África. Lá, na região subsaariana, metade de todos os leitos hospitalares está ocupada por pessoas que adoecem pela má qualidade da água e do saneamento. “O acesso à água limpa e a um saneamento adequado é um requisito para tirar as pessoas da pobreza”, disse em março a vice-secretária geral da ONU, AshaRose Migiro, no Diálogo Interativo de Alto Nível sobre a Água.

Metas para garantir o acesso universal Embora sete em cada dez pessoas sem saneamento apropriado vivam em áreas rurais, a quantidade de habitantes de áreas urbanas que carecem dessas instalações aumenta junto com as populações das cidades. “Apesar de 1,3 bilhão de pessoas ter conseguido

acesso a um melhor saneamento desde 1990, é provável que no mundo falte atender 1 bilhão de pessoas para cumprir o Objetivo sobre saneamento”, disse Asha-Rose. Relatora Especial da ONU para Água e Saneamento, Catarina de Albuquerque, duas semanas antes do início da Rio +20 divulgou carta aberta aos Estados que negociam o documento final da Conferência. Na carta, ela expressa sua preocupação com o fato de que, após as três rodadas de negociações ocorridas em Nova York nos últimos três meses, o reconhecimento do direito humano a esses bens corre o risco de ser suprimido do documento. “Alguns Estados sugeriram termos alternativos que não se referem explicitamente ao direito humano a água e saneamento”, afirmou Catarina. “Alguns tentaram reinterpretar ou mesmo diluir o conteúdo deste direito humano.” Para ela, os governos precisam estabelecer metas para o acesso universal a tais bens, sem discriminação, para proteger a saúde e a dignidade, em particular das populações marginalizadas. Como combater a crescente escassez de água? Para os formuladores dos documentos da Rio +20, é indispensável o aumento de investimentos na melhoria da eficiência e fornecimento de água. “O suprimento necessário de água doce, de qualidade e em quantidade suficientes, é um serviço básico do ecossistema. O gerenciamento, e investimentos, dos ecossistemas são, portanto, essenciais para abordar a garantia do fornecimento de água tanto para as pessoas quanto para os ecossistemas em termos de escassez de água, a abundância excessiva de água (riscos de alagamentos) e sua qualidade. As práticas atuais são projetadas em direção a uma diferença grande e insustentável entre o fornecimento global e a retirada de água que só pode ser resolvida através de investimentos em infraestrutura e reformas das políticas hídricas, isto é, esverdeando o setor hídrico.”


No Brasil, poluição e desperdício Por causa de vazamentos, seis em cada dez municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes desperdiçam entre 20% e 50% do volume de água captada. Nas cidades com população inferior, a perda fica em torno de 20%. Os dados são do Atlas do Saneamento 2011, produzido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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aniela dos Santos Barreto, uma das pesquisadoras do projeto, alerta para a gravidade do problema em tempos de escassez de água. Como as perdas são causadas por vários fatores, como insuficiência do sistema, redes antigas e sem manutenção adequada, além de furtos de água, as operadoras tem dificuldades de mensurar o real volume do desperdício, que pode ser até maior do que o oficialmente apurado. O Atlas revela, ainda, que a maioria da água fornecida à população é obtida, sobretudo, pela captação em poços profundos e pela captação superficial. Em 2008, em todas as regiões do país, a água disponibilizada à população por meio de rede geral recebeu algum tipo de tratamento. Mas há um enorme desnível entre as regiões. Na Região Norte, o percentual de água tratada distribuída à população passou de 67,6%, em 2000, para 74,3%, em 2008. Ainda assim, insuficiente para que a região se aproximasse dos índices nacionais porque a quantidade de água que não recebe nenhum tipo de tratamento ainda permanece bem acima dos 7,1% que representam a média nacional. Nas demais regiões, mais de 90% da água distribuída recebe algum tipo de tratamento. A Região Sul, por sua vez, teve um incremento de 10% no volume de água distribuída à população, porém, não teve um acompanhamento no percentual de água tratada. O estudo mostra que 78% dos municípios brasileiros investem em melhorias na rede de distribuição de água e a Região Sul é a que apresenta o maior percentual de municí-

Interativa nº 5, em 1996, já abordava o risco de escassez de água potável e a situação do abastecimento no Rio de Janeiro

pios que se incluem nessa situação (86,4%), de investir em melhorias nesse serviço público. Outra parte do processo de abastecimento que vem recebendo grande investimento por parte da maioria dos municípios (67,8%) é o das ligações prediais. Além disso, estão sendo feitas,

em menor escala, melhorias na captação (49,5% dos municípios); no tratamento (43,7%); na reservação (36,1%) e na adução (19,9% dos municípios brasileiros).

RIOS POLUÍDOS

Análise feita pela SOS Mata Atlântica em 49 rios de 11 estados brasileiros comprova que nenhum deles apresentava uma situação considerada boa ou ótima. Em termos de contaminação, 75,5% foram classificados como “regular” e 24,5% com nível “ruim”. As avaliações foram feitas entre janeiro de 2011 e o início de março de 2012, durante visitas da expedição itinerante “A Mata Atlântica é Aqui”. Ao longo desse período foram avaliadas amostras nos estados do Rio de Janeiro, Ceará, Piauí, Bahia, Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Muitos dos rios já tinham sido analisados na primeira expedição, entre maio de 2009 e dezembro de 2010. Em geral, o quadro não melhorou. No primeiro levantamento foram feitas 70 análises: 69% dos rios ficaram no nível regular, 27% ruim e 4% péssimo. Alguns passaram de ruim a regular, como o Rio Tietê, em Itu. Já outros caíram um degrau, como o Rio Criciúma, na cidade catarinense do mesmo nome, que perdeu cinco pontos e ficou ruim. Nas visitas, os pesquisadores buscam alertar as populações para o problema de contaminação dos rios, riachos, córregos, lagos, etc. As pessoas são convidadas a investigar as condições de um ou mais corpos d’água por meio de um kit de análise da água. Os dois principais responsáveis pela contaminação, de acordo com os pesqu isadores da SOS Mata Atlântica, são a agricultura irrigada - que “capta grande volume de água e devolve agrotóxicos e erosão” - e a falta de saneamento básico, que permite que esgoto doméstico seja jogado nos corpos d’água.

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Economia verde

Muito longe do consenso Tema central da Rio+20, a economia verde ainda é um conceito quase desconhecido para a maioria da sociedade Rosa Leal

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efinida pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) como “uma economia que resulta em melhoria do bem-estar da humanidade e igualdade social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente riscos ambientais e escassez ecológica, a economia verde é criticada pelos movimentos sociais. Para eles, o conceito é só uma tentativa de “pintar de verde” o neoliberalismo, uma vez que não implica qualquer mudança no modelo atual, a chamada “economia marrom” – poluente, que estimula o consumismo e leva o mundo ao esgotamento dos recursos naturais. Em artigo publicado pelo site Carta Maior, o teólogo Leonardo Boff dá voz a essa crítica. “O Documento Zero da ONU para a Rio+20 é ainda refém do velho paradigma da dominação da natureza para extrair dela os maiores benefícios possíveis para os negócios e para o mercado”, diz ele. “É como se tudo se destinasse ao uso exclusivo dos humanos e a Terra tivesse criado somente a eles, e não a outros seres vivos que exigem também sustentabilidade das condições ecológicas para a sua permanência neste planeta.” Boff aponta ainda um agravante: “todo o texto (o Documento Zero) gira ao redor da economia. Por mais que a pintemos de marrom ou de verde, ela guarda sempre sua lógica interna que se formula nesta pergunta: quanto posso ganhar no tempo mais curto, com o investimento menor possível, mantendo forte a concorrência? Não sejamos ingênuos: o negócio da economia vigente é o negócio. Ela não propõe uma nova relação para com a natureza,

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sentindo-se parte dela e responsável por sua vitalidade e integridade. Antes, move-lhe uma guerra total. (...) Nesta guerra não possuímos nenhuma chance de vitória”, denuncia.

ONU propõe investimentos de mais de US$ 1 trilhão Para Pedro Ivo Batista, do Fórum Brasileiro de ONGs para Movimentos Sociais e Desenvolvimento (Fboms), coordenador da Cúpula dos Povos, “há muita confusão, entre os movimentos sociais, sobre como lidar com serviços da natureza. Mesmo que isso represente fonte de renda para agricultores e povos tradicionais”. Ele destaca que a atual

crise mundial é muito mais ampla do que há 20 anos. “Hoje existe uma crise social, política e também de credibilidade das instituições perante a sociedade, que está pressionando seus governantes”, explica ele. “A pauta também se diversificou, mas aumentou o nível de divergências entre os movimentos da sociedade civil. Há duas décadas, havia maior protagonismo das ONGs, que foram importantes para trazer os sindicatos para esse tema”, completa. No relatório Rumo a uma Economia Verde: Caminhos para o Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza, a ONU defende a necessidade de investimentos intensivos e propõe um investimento anual de cerca de US$ 1,3 trilhão (R$ 2,6 trilhões), equivalente a 2% do PIB global em dez setores-chave da economia, nas próximas décadas: agricultura e pesca; construção, energia, florestas, indústria, turismo, transportes, água e resíduos e metrópoles. E quem paga Socorro Andrade

Cúpula dos Povos: 30 mil pessoas/dia no Aterro do Flamengo


Rosa Leal

essa conta? Segundo o Pnuma, os recursos poderiam sair do cofre tanto dos governos, por meio de incentivos e subsídios, quanto da iniciativa privada, em investimentos diretos. Por outro lado, o relatório Rumo ao Desenvolvimento Sustentável: Oportunidades de Trabalho Decente e Inclusão Social em uma Economia Verde, defende que se todos os países adotarem uma economia mais verde como modelo de desenvolvimento, em 20 anos seriam criados entre 15 e 60 milhões de novos empregos no mundo. O grupo, que reúne especialistas do Pnuma, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Organização Internacional de Empregadores (OIE) e da Confederação Sindical Internacional (CSI), mostra que o atual modelo de desenvolvimento não é mais capaz de gerar emprego produtivo e trabalho decente. “Se a situação continuar como hoje, os níveis de produtividade dos países em 2030 serão 2,4% menores do que os atuais. Em 2050, esses níveis cairiam 7,2%. Os índices coincidem com estimativas de estudos sobre danos econômicos produzidos pela degradação do meio ambiente e a redução dos ecossistemas básicos”, sugere o relatório. As indústrias responsáveis por cerca de 80% das emissões de dióxido de carbono empregam pouco mais de 8% da força de trabalho nos países industrializados, diz o relatório. Em contrapartida, considerando apenas os empregos relacionados a produtos e serviços ambientais nos Estados Unidos, 3 milhões de pessoas já se beneficiam do novo padrão. Na União Europeia, existem 14,6 milhões de empregos diretos e indiretos na proteção da biodiversidade e recuperação dos recursos naturais e florestas, sendo mais de meio milhão só na Espanha. Na Colômbia e no Brasil, os organismos internacionais destacaram a formalização e organização de quase 20 milhões de catadores informais. O relatório destaca ainda que o Brasil já criou cerca de 3 milhões de empregos com iniciativas sustentáveis, o que

Líderes sindicais se reúnem na Assembleia Mundial representa aproximadamente 7% do emprego formal. Ainda de acordo com o relatório, no setor de pesca, por exemplo, os trabalhadores vão sofrer, temporariamente, os efeitos sobre pesca, o que pode exigir a redução de capturas para permitir a recuperação dos estoques. Na atividade, 95% dos 45 milhões de trabalhadores empregados são pescadores artesanais em países em desenvolvimento.

Empregos Verdes e Trabalho Decente. A posição da CUT Principal central sindical brasileira, a CUT divulgou documento no qual explicita sua posição quanto à economia verde. Diz a Central: “Nos documentos-base divulgados pelas Nações Unidas para subsidiar a discussão para a Conferência Rio + 20, conhecido por rascunho zero, o termo Economia Verde aparece diversas vezes, sem, todavia, ter em concreto o seu conceito, suas formas de implementação e de financiamento. Trata-se de um termo em construção no âmbito das Nações Unidas e que poderá ser interpretado e preenchido de diferentes formas pelos distintos países e atores (movimentos sociais, entidades de classes, empresas etc.). Dessa maneira, abre espaço para o livre comércio, para a financeirização do clima e mercantilização dos bens comuns.”

A CUT destaca que “a participação do movimento sindical nas iniciativas acerca da economia verde tem sido propositiva de um ponto de vista crítico. Parte da explicação está justamente na crise financeira e econômica que se converteu em uma grande crise de emprego devastadora em muitos países. Organizações sindicais tem papel na construção de propostas de recuperação, para criar empregos e garantir a cobertura social da recessão. Dentro desse contexto, os investimentos na economia verde, uma vez demonstrados por estudos de que os novos setores poderiam criar mais empregos e de maior qualidade, se tornaram uma oportunidade importantíssima para contrabalancear o terrível ritmo de destruição do emprego.” Para a CUT, “é importante evidenciar que não nos opomos à parte “verde” da economia verde. No entanto, até o momento da negociação oficial o termo segue baseado no modelo de desenvolvimento vigente e nós queremos é que seja claramente definida dentro de uma proposta de modelo econômico alternativo ao que hoje temos em prática pela maior parte dos governos, tanto na economia verde como na marrom. Precisamos buscar uma economia eficiente no uso de recursos, uma economia baixa em carbono e que priorize de maneira definitiva o uso de produtos de fontes renováveis. Uma economia que utilize com bom senso os recursos não renováveis, e que proteja e restitua os ecossistemas e que integre os custos e benefícios ambientais.”

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Sustentabilidade

Arquivo pessoal

para quem?

De 20 a 22 de junho acontecerá a Rio + 20 - Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (UNCSD). O evento mobiliza chefes de Estado, celebridades e empresários. Em momento sem precedentes, ocorre também a Cúpula dos Povos com manifestações e debates críticos e propositivos que se contrapõem aos limites claros da Conferência oficial. Tatiana Dahmer Pereira A Rio + 20 ocorre em cenário mundial mais complexo que o da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92 ou Eco 92, ocorrida nesta cidade em 1992). Crise na Europa e movimentos contra o neoliberalismo em diferentes países, guerras civis e devastação social na África, a Primavera Árabe e contradições de toda sorte expõem desafios para se entender o mundo e como nos relacionamos com tudo isso. A pauta a Rio + 20 origina da proposta de corporações mundiais para a construção de uma Economia Verde, estratégia de reformular práticas no capitalismo visando assegurar “sustentabilidade”. A abordagem tem como princípio gerar novos tipos de padrão de consumo com determinadas posturas éticas no processo produtivo. Há anos assistimos ao movimento dos “países do Norte” (os ricos) do planeta, em transferir as indústrias poluentes e seu lixo industrial para países da América Latina e da África, os “pobres do Sul”. Essa relação predatória é escamoteada na agenda que se propõe na Rio + 20, quando governantes optam por pauta de reformas pontuais no capitalismo, sequer questionando estruturalmente as bases

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da degradação da vida humana.

“As perspectivas que fundam a lógica da ‘Economia Verde’ podem ser claramente identificadas como parte do projeto das grandes corporações” Orienta-se por dois princípios: um que considera possível “domesticar” o capitalismo, a despeito do que diferentes autores apontam como a dimensão “predatória” do Capital em busca incessante pelo lucro e pelas condições de acumulação. O segundo foca-se na minoração (ou mitigação) dos impactos ambientais: já que não é possível mudar o sistema, amenizem-se estragos causados. Como tudo se mercantiliza nessa ordem, adquira-se ganhos com isso. Se há problemas no capitalismo, vendam-se soluções. A proposta alicerça-se, entre outros aspectos, na mercantilização e na financeirização da natureza, ao incentivar o consumo individual de itens politicamente corretos, com preços inacessíveis à maior parte da população voltados apenas para determinadas

segmentos sociais. Ora, não somos contra o consumo de produtos sem agrotóxico, nem às reflexões individuais pautadas por boas intenções - mas essa questão não se resolve nas opções em frente à gôndola do supermercado. Ao se limitar a atitudes individuais, alimentamos indústria de mercantilização de produtos com “selo de qualidade” por possuírem práticas que deveriam ser obrigatórias – e não se constituir em elementos que “agreguem valor ao produto”. Não testar produtos em animais, não explorar trabalho infantil nem escravo são práticas louváveis ou deveriam ser obrigações de todo produtor? É preciso ficar atento à racionalidade mercantil de valores mais básicos que construímos em relação aos direitos humanos. O enfrentamento das questões estruturais do sistema não se resolve na ação individualizada do cotidiano no momento do consumo. Ele deve ser construído em enfrentamentos de movimentos sociais como o Movimento dos Sem Terra (MST) ao Agronegócio. Este último financiado largamente pelo Estado brasileiro, há anos investe em produções extensivas de alimentos com amplo uso de agro-


tóxicos. Os alimentos produzidos sob essa racionalidade trazem as marcas da violência da propriedade privada do latifúndio, das relações perversas de trabalho no campo e na cidade, da contaminação do veneno do agrotóxico de quem trabalha na lavoura, da terra e da água e, nas cidades, de quem consome o produto. Os problemas no campo são parte das lutas de resistência a esse modelo e não podem ser compreendidas como “outra coisa” em relação às mobilizações cotidianas por direitos nas cidades. As perspectivas que fundam a lógica da “Economia Verde” podem ser claramente identificadas como parte do projeto das grandes corporações as quais representam os sujeitos beneficiados diretamente com a acumulação de riquezas pela dinâmica do Capital.

“...as pessoas, inseridas em classes sociais, têm acesso desigual ao que é socialmente construído, sofrem desigualmente as injustiças de toda sorte...” Os princípios relacionados a essa proposta reforçam a tradicional (e falsa) dicotomia ser humano X natureza. Traz a relação de separação entre ambiente e sociedade, entre ser humano e natureza, como se fôssemos sujeitos e os recursos =ambientais, objetos de nossa intervenção. Essa separação entre ser humano e natureza, construída dentro da racionalidade capitalista, materializa-se na definição de desenvolvimento sustentável expresso no Relatório de Bruntland (1987). Essa definição é bastante criticada por movimentos sociais e pelo ambientalismo crítico, por apresentar problemas estruturais relacionados ao tipo de sociedade que defende. Na origem ela pressupõe o desenvolvimento como uma trajetória linear e evolutiva (LEROY et alii, 2005), sem conflitos ou diferenças de projetos de sociedade, sem antagonismos de inte-

resse. Sugere, como uma das medidas para alcançar essa sustentabilidade, o controle sobre o crescimento populacional. Percebe os recursos naturais como objetos para uso, visando atender nossas finalidades, expressa como a racionalidade capitalista transforma tudo em mercadoria, naturalizando relações utilitárias com aspectos e demandas da vida que não deveriam ter preço. Como mensurar o custo de um recurso natural, fundamental à vida, como a água, por exemplo? Segundo ponto a se considerar, nega-se dimensão sociocultural de como tais recursos se apresentam. Não há ambiente sem significação humana e as dinâmicas dos ecossistemas podem sofrer com a influência da humanidade, também possuem lógicas e dinâmicas próprias, em relação às quais ainda estamos distantes de produzir todo o conhecimento necessário – apenas sofremos muitas de suas conseqüências, materializadas na degradação das condições de vida da maior parte da população do planeta. Em primeira instância é preciso compreender que os tais “problemas ambientais” referem-se à degradação da vida humana. A leitura hegemônica não contribui para a transformação da realidade, para que tenhamos crítica sobre o centro dessa produção de catástrofes e/ou degradação permanente das condições de vida: o modelo de desenvolvimento impulsionado pela racionalidade da acumulação capitalista. Reforçamos, portanto, que, da mesma forma que as pessoas, inseridas em classes sociais, têm acesso desigual ao que é socialmente construído, sofrem desigualmente as injustiças de toda sorte, nesse caso, são impactadas pelas tragédias (nada naturais) ambientais de forma desigual. Tal concepção parte do princípio liberal que todos somos igualmente responsáveis pelos danos ambientais causados ao ambiente. Além de reforçar a leitura dicotômica que mencionamos, nega-se como no processo histórico e social, a relação entre seres humanos

se constitui em bases desiguais tanto nas condições de produção, quanto de usufruto em relação aos recursos ambientais socialmente apropriados. Dessa forma, são vivenciados de forma desigual os impactos sobre a vida que as catástrofes ambientais e a degradação da vida humana trazem. Portanto, não existem necessidades nem futuro comuns, pois não há condições igualitárias de vida.

“A crítica à devastação da vida humana que ocorre no planeta deve centrar fogo em rejeitar falsas propostas de alternativas...” Nossa dificuldade de superar essa leitura sobre a separação entre ambiente e seres humanos tem dificultado o fortalecimento de agendas convergentes de lutas entre movimentos sociais, organizações da sociedade civil e sindicatos, as quais permitam tensionar governos para que não aceitem lobbies e pressões das empresas, das grandes corporações. Nesse contexto e para além do evento oficial, o lugar para reflexões e debates críticos é a Cúpula dos Povos. A crítica à devastação da vida humana que ocorre no planeta deve centrar fogo em rejeitar falsas propostas de alternativas, centradas sempre em partilhas iguais de responsabilidades que são desiguais. É preciso que, com base nessa leitura, nossa práxis e sua expressão na luta política, permita articular diferentes bandeiras de movimentos sociais e sindicatos sob um grande tema comum: o questionamento ao modo de produção capitalista e, especialmente, ao modelo de desenvolvimento para que enfrentemos a racionalidade que funda esse modo de produção, denunciando o quanto se cresce a qualquer custo, mesmo que isso custe vidas. Tatiana Dahmer Pereira é assistente social, professora adjunta da ESS/UFF

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Anima Mundi+20 Fotos arquivo pessoal

O Festival Internacional de Animação do Brasil, mais conhecido como Anima Mundi, faz 20 anos. E podemos dizer sem medo que é a idade do desenvolvimento da animação brasileira, pois o Anima Mundi, desde que foi criado, não queria apenas exibir filmes. Queria criar um futuro para a animação brasileira. Alexandre Bersot

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ssim como os cineclubes, os festivais de cinema - que já somam centenas por todos os cantos do Brasil graças às políticas públicas lançadas ainda no governo Lula - vêm aproximando o cinema das pessoas. O Anima Mundi é ainda mais antigo: sua primeira edição data de 1993 e surgiu da necessidade de quatro animadores - Marcos Magalhães, Aída Queiroz, Léa Zagury e Cesar Coelho - em alavancar a então incipiente animação brasileira. Eles sabiam que, além de exibir filmes e formar público, era preciso derrubar preconceitos e mostrar que animação não era (só) coisa de criança. Por isso a preocupação em realizar um festival que mostrasse um panorama da animação mundial, com obras praticamente

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desconhecidas do público brasileiro, e que pudesse cativar o público adulto, mostrando que animação é muito mais que desenhos animados exibidos na tevê. Que existe uma infinidade de técnicas diferentes, com nomes estranhos como pixilation, rotoscopia, stop-motion, animação com massinha, areia, objetos, 2D, 3D, pintura em vidro, tradicional etc, cada uma delas utilizada para contar um tipo de história, da mais singela à mais non-sense, da mais infantil à mais bizarra. Ao patrocinar o festival desde o início, o Centro Cultural Banco do Brasil não só ofereceu sua excelente estrutura de cinemas e salas de vídeo, como grandes espaços para as oficinas de animação do festival, em grande parte responsáveis pela popularização

das técnicas de animação entre o público. As oficinas oferecem até hoje atividades de stop-motion (animação com massinha), pixilation (animação de pessoas e objetos), desenho direto na película, entre outras técnicas, e são muito disputadas pelo público, que formam filas enormes durante os 10 dias do festival. Foi graças a essas oficinas que muitos profissionais de animação, hoje respeitados no Brasil e no exterior, começaram suas carreiras. Muitos estúdios e produtoras de animação foram criados desde então e acabaram por absorver muita mão de obra formada nas oficinas e também nos cursos do Anima Mundi, oferecidos em sua sede em Botafogo, no Rio de Janeiro, nos níveis básico e avançado.


Com o passar dos anos, o Anima Mundi foi se tornando referência entre os festivais do Brasil e do mundo e, claro, entre os animadores. Dividido em diversas categorias, o festival possibilita tanto ao realizador autoral quanto aos estúdios que produzem longas e séries animadas, por exemplo, mostrarem suas obras. Ao saírem de suas “tocas”, realizadores brasileiros que faziam um trabalho solitário e, na maioria das vezes, desconhecido do público, viram no Anima Mundi uma vitrine e passaram a “trocar figurinhas” entre si, o que acabou culminando na criação da ABCA (Associação Brasileira de Cinema de Animação), fundada em 2003 para aglutinar esses animadores “perdidos” pelo Brasil adentro. Hoje a associação conta com cerca de 300 sócios, entre profissionais e aspirantes.

Anima Forum: compartilhando experiências

Mas o Festival foi mais além. Ao criar o Anima Forum, animadores e profissionais de animação passaram a discutir políticas públicas para o setor em mesas pra lá de animadas. Profissionais de renome, nacionais e internacionais, estão sempre presentes para compartilhar suas experiências em tudo o que engloba o universo da animação, desde o pequeno realizador, que trabalha sozinho com seu computador em casa, até os estúdios que produzem séries animadas em parceria com estúdios estrangeiros, como os canadenses, referência na animação mundial. Toda essa experiência permite que o setor, organizado nos festivais e através de suas associações, possa criar propostas a serem apresentadas às instituições de fomento, como a Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura. Editais como o AnimaTV, para séries animadas, e de curtas e longas-metragens, foram extremamente bem sucedidos e o resultado já pode ser visto nos cinemas e na tevê, que exibe séries brasileiras de alta qualidade, como Meu Amigãozão, Tromba-Trem e Carrapatos & Catapultas, além dos mais antigos e não menos excelentes Peixonauta, Quarto do Jobi e Anabel. O Anima Mundi fez escola. Depois dele, vários festivais de animação pipo-

caram pelo país. O mais interessante é que festivais brasileiros mais antigos e consagrados, como o Curta Cinema, Vitória, Guarnicê, Kinoforum, Gramado e Cinesul passaram a aceitar filmes de animação em suas mostras competitivas, numa prova de que o preconceito com relação ao gênero vem caindo a cada ano. Hoje, todos os festivais brasileiros aceitam filmes de animação em suas inscrições e com certeza devemos isso ao Anima Mundi, que já figura entre os cinco mais importantes festivais de animação do planeta. Nesses 20 anos de Festival, a animação brasileira deu um salto gigantesco, em qualidade e quantidade, mas a luta pela criação de uma indústria de animação brasileira continua acirrada. Os festivais, capitaneados pelo Anima Mundi em parceria com a ABCA, aos

poucos estão convencendo os governantes que a indústria da animação gera empregos e produtos correlatos, como álbuns, revistas em quadrinhos, bonecos, livros e brinquedos e é a que mais cresce no mundo. No mês de julho o Anima Mundi estará presente mais uma vez no Rio de Janeiro, de 13 a 22, e em São Paulo, de 25 a 29. A 20a edição do festival promete bater, mais uma vez, o recorde de inscrições e de público, que há anos lota salas como o Odeon BR, Circuito Estação e outras salas do circuito comercial do Rio e de São Paulo, além das salas do CCBB. Você não pode perder a oportunidade de conhecer o que se faz de melhor em animação no Brasil e no mundo. A dica é: crianças, levem seus pais e mostrem para eles que animação também é coisa de gente grande!

Os animamundis de Bersot Alexandre Bersot, 47, ilustrador e programador visual do Sinttel-Rio, faz cinema de animação há 10 anos, quando foi chamado para fazer Cidadelas, sobre a saga de Antônio Conselheiro com versos do poeta Cacaso. Seu primeiro curta autoral foi História de beber água, de 2003. Com mais domínio sobre as técnicas de animação, Bersot fez Pavloviana em 2004, com nove minutos de duração, e o Anima Mundi foi o primeiro festival do qual participou. “A emoção foi indescritível. Não há preço que pague a reação da plateia assistindo a um filme seu na telona”, diz ele. Em 2006 concluiu A última lenda, também selecionado para o Anima Mundi. Este filme foi o primeiro a participar de um festival internacional e teve boa repercussão no Brasil. Os prêmios começariam a vir com o thriller Justiça emplaca, um curta realizado com colagem digital de fotografias, sem desenhos. Justiça ganhou o cobiçado prêmio Aquisição Canal Brasil no Anima Mundi em 2007, Menção Honrosa no Goiânia Mostra Curtas e o Prêmio Linguagem no FestCine Amazônia, além da indicação para o Grande Prêmio do

Cinema Brasileiro em 2009. Depois veio o singelo De ovos e guarda-chuvas, exibido no Anima Mundi em 2008 e que conquistou os prêmios de Melhor Animação em Cabo Frio, (RJ), em Sergipe e em Mariana (MG). Este curta faz parte do acervo da Programadora Brasil a convite da Secretaria do Audiovisual do Ministério da Cultura (SAv-MinC). A consagração viria em 2010 com Imagine uma menina com cabelos de Brasil..., desenhado da forma tradicional e com duração de dez minutos. Ganhou o Prêmio Aquisição Canal Brasil no Anima Mundi RJ (o segundo de Bersot), Melhor Animação no Anima Mundi São Paulo e vários prêmios nos principais festivais do país, além de Armênia, México, Argentina e Uruguai, somando ao todo 15 premiações em mais de 40 festivais. Concorreu também ao Grande Prêmio do Cinema Brasileiro em 2011 e este ano vai virar livro infantil. “Para mim e para a maior parte dos animadores do Brasil, tudo começou no Anima Mundi e graças ao Anima Mundi. O festival abriu quatro portas: a da animação para os animadores, a da animação para o público, a da animação do mundo para o Brasil e a da animação do Brasil para o mundo”, destaca Bersot.

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Fotos arquivo pessoal

Gabriela Queiroz

Uma virtuose do violino

Com apenas 27 anos, Gabriela de Souza Queiroz Guedes é uma brasileira com um currículo de fazer inveja a músicos de qualquer lugar do mundo. Violinista, ela já tocou nas principais salas e teatros brasileiros. Fora do país, se apresentou, entre outras, na Sala Berlim Konzerthaus, uma das mais importantes do mundo. Socorro Andrade

M

ineira de Cataguases, Gabriela foi criada em João Pessoa, capital da Paraíba, onde foi morar depois da separação dos pais. Adotou a cidade como terra natal e é comum vê-la dizer, com o tradicional sotaque nordestino, que é paraibana. Embora nunca tenha feito outra coisa na vida, foi só aos 17 anos, no final de 2003, quando conquistou o primeiro lugar para ocupar uma vaga de violino na Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB), que Gabriela compreendeu que iria viver da música e para a música. Na OSB, onde permaneceu até 2010, chegou a 1º violino e spalla, os mais altos

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degraus na hierarquia de uma orquestra. Sua relação com a música começou antes mesmo das primeiras palavras. Segundo sua mãe e grande incentivadora, Solange de Souza, até os dois anos o programa televisivo preferido da menina Gabriela era “Concertos para a Juventude”. Ninguém entendia àquela paixão - a mãe é dentista, o pai bancário e não há ninguém na família ligado à música clássica. Para ela, contudo, o estímulo decisivo veio por acaso, quando, levada por uma vizinha, assistiu a um concerto didático para crianças no Espaço Cultural de João Pessoa. “Tinha apenas três anos e

fiquei fascinada. Assisti todo o concerto com total atenção, ao contrário das outras crianças que se inquietavam e choravam”, conta Gabriela. A vizinha, que aqui pode ser elevada à categoria de primeira madrinha musical de Gabriela, comentou sobre o interesse da menina com um músico amigo, que sugeriu matricularem-na no Projeto Espiral, comandado pelo violinista Ademar Rocha. Sem imaginar que tinha pela frente uma virtuose e, em breve, uma de suas mais dedicadas alunas, o professor se limitou a dizer que ela era muito pequena e voltasse depois de completar quatro anos. Pen-


sou que Gabriela fosse esquecer, mas enganou-se. Daquele dia em diante a menina não falou em outra coisa. Ao completar quatro anos foi matriculada no Espiral e aos nove anos ganhou o primeiro concurso de violino, o “Prêmio Paraíba de Música”. O Projeto Espiral acabou, mas Gabriela continuou seus estudos de violino e os progressos eram visíveis, com premiação em todos os festivais de que participava.

Um casamento musical

Em 2001, com 15 anos, ganhou o 1º lugar no Concurso Jovens Instrumentistas do Brasil, em Piracicaba, um dos mais tradicionais e respeitados do país. Foi só o começo. A vida de Gabriela mudou mesmo quando, em 2002, conheceu Daniel Guedes, um jovem violinista talentoso, premiado e reconhecido no Brasil e no exterior. Em um festival de música em Juiz de Fora (MG), Daniel foi seduzido pelos acordes do violino de Gabriela, quando estudava em uma das salas. De imediato reconheceu uma virtuose e ficou encantado. Saíram do festival apaixonados e menos de um ano depois estavam casados. Um casamento literalmente musical. De professor, Daniel passou a parceiro no Quarteto da Guanabara, formado por ambos e pelos músicos Márcio Mallard e Daniel Albuquerque. Além de estarem sempre estudando juntos, os dois fazem solos em diversas orquestras brasileiras e recitais. Colecionando prêmios, em 2003 e 2006 Gabriela levou o 1º lugar no Concurso Jovens Solistas Brasileiros, realizado em Salvador. Também em 2006 ganhou o Prêmio Furnas Geração Musical, concorrendo com músicos de todo o país.

Prêmios e Villa Lobos

Em 2010, tirou o 2º lugar no Concurso Nelson Freire, um resultado que teve enorme repercussão nas redes sociais. Quem assistiu ao concerto garante que a melhor era Gabriela. Antes de anunciar o resultado, o maestro se justificou

dizendo que a comissão julgadora teve muita dificuldade em escolher entre os dois finalistas. Mas as galerias e a plateia do Teatro Municipal gritavam: “É Gabriela! É Gabriela! É Gabriela!”. A vitória de outra concorrente causou comoção entre os músicos. Naquele mesmo ano Gabriela teve que fazer uma das mais difíceis escolhas de sua vida. Após ter sido selecionada para um mestrado em Chicago (EUA), com bolsa integral oferecida apenas a virtuoses, passou no concurso para professora da UFRJ. Optou por garantir um emprego estável, que lhe desse mais tempo para estudar. Ficou no Rio de Janeiro, fez prova e passou para o mestrado da UFRJ deixando para fazer doutorado no exterior. Em 2011, foi a única brasileira a participar do Festival de Israel, um dos mais importantes e concorridos do mundo. Entre 600 inscritos apenas 30 foram selecionados e ela foi um desses.

Participou por duas vezes do Festival da Suíça, da última vez como convidada. Gabriela se considera uma pessoa de sorte. Por que sorte? “Mesmo não tendo afinidade com música clássica, minha família me deu total apoio. Foi graças a minha mãe que participei de todos os festivais e tive aulas com os melhores professores. Para fazer isso, ela sacrificou sua vida pessoal e profissional”, conta. A vida de músico exige mesmo muita dedicação. Ela reconhece que no Brasil não há investimento nessas vocações. “Com certeza muitos talentos são perdidos sem sequer serem descobertos”, diz a jovem professora universitária. Apaixonada por Villa Lobos, no seu trabalho de mestrado Gabriela quer resgatar uma obra do maestro esquecida, sem partitura. Trata-se de um concerto para violino. “Meu trabalho é editar a partitura para que ela possa ser disponibilizada e tocada”.

Uma carreira internacional Da Paraíba ao mundo, a formação de Gabriela como violinista inclui os professores Daniel Guedes (RJ), Marcello Guerschfeld (RS), Patinka Kopec (NY-EUA) e Shmuel Ashkenasi (Chicago-EUA). Participou de diversos festivais e cursos nacionais e internacionais, como o “Margess International” (Zuoz-Suíça/2005) e o Keshet Eilon Violin Mastercourse (Israel/2010) onde pode participar de Master Classes com renomados violinistas como Chaim Taub, Ida Handel, Shlomo Mintz, Hagai Shaham,

Detlef Hahn entre outros. Em 2011 participou de Master Classe, com o violinista Pinchas Zukerman, em São Paulo. Gabriela se apresenta com freqüência como solista e recitalista em todo o Brasil, tendo sido solista da Orquestra Sinfônica Brasileira, Orquestra Filarmônica do Espírito Santo, Orquestra Sinfônica de Sergipe, Orquestra Sinfônica da Bahia. Em 2011 integrou a Young Euro Orchester, tendo se apresentado na Konzerthaus em Berlin. Como camerista, é integrante do Quarteto da Guanabara e se apresenta ao lado de renomados músicos, entre eles Shmuel Ashkenasi, Ori Kam, Alex Klein e Daniel Guedes. É professora da Escola de Música da UFRJ desde 2009. Gabriela toca em um violino Giuseppe Gagliano que pertenceu à violinista Mariuccia Iacovino, gentilmente cedido por Myrian Dauelsberg.

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- Peso + Saúde

Hábitos saudáveis unem

saúde e beleza

Melhor do que estar nos padrões de beleza da sociedade é estar bem consigo. A indústria alimentícia, cosmética, de moda, farmacêutica e, principalmente, a TV nos designam padrões estéticos e comportamentais que influenciam as nossas escolhas. Antes de qualquer coisa, questione-se quanto ao que realmente é importante para a sua saúde. Taiana Storque

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Organização Mundial de Saúde (OMS) publicou relatório, em maio, no qual indica que a obesidade duplicou entre 1980 e 2008 e hoje há 500 milhões de pessoas obesas no mundo. A obesidade pode causar diversas doenças como hipertensão arterial, diabetes, doenças das articulações como artrose e artrite e até câncer colorretal. O relatório da OMS indica também que um em cada três adultos, em todo o mundo, tem pressão alta, responsável por metade das mortes por ataque cardíaco; e a diabete afeta 10% da população mundial. Adotado pela OMS, o Índice de Massa Corpórea (IMC) avalia as diferentes faixas de peso. Quanto mais perto esse índice estiver dos limites inferior (18,5) e superior (40), maiores os riscos para a saúde. O cálculo do IMC é feito através da fórmula: peso, em quilos, dividido por sua altura, em metros, elevada ao quadrado. Uma pessoa que pese 70 kg e meça 1,75m terá o seguinte IMC: 70 ÷ 1,75² = 22,8 será considerada com peso saudável. O IMC não é aplicável em crianças e não pode ser o único parâmetro para definir os riscos relacionados à obesidade, pois não leva em consideração outros fatores, como colesterol, circunferência abdominal e etnia.

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Confira as dicas do médico gastroenterologista Dr. Rossilênio Lopes da Fonte para emagrecer com responsabilidade. Interativa - Como perder peso e ganhar saúde? Dr. Rossilênio - Perder peso é quase sempre ganhar saúde. Pessoas com sobrepeso (IMC acima de 25) ou obesas (IMC acima de 30), devem procurar eliminar esses excessos, inicialmente aumentando a perda de calorias com atividade física racional e alimentação adequada, reduzindo gorduras, doces e excessos em geral. Usar o bom senso, comer devagar, não comer mais do que o estômago suporta, não repetir prato, comer menos a noite, dormir bem, não ficar muitas horas sem se alimentar, fracionar a alimentação em seis vezes ao dia e baseá-la em saladas, frutas, carnes magras e cereais. Se precisar, vá ao medico. Interativa - Quais são os alimentos capazes de potencializar a perda de peso? Dr. Rossilênio - Perde mais peso

quem comer menos calorias que necessita para as atividades diárias; ganha quem comer mais calorias do que precisa. Assim, pode-se emagrecer com todo tipo de alimento. Como o organismo precisa de proteínas, carboidratos e gorduras para funcionar, o equilíbrio entre estes grupos e as fibras formam uma boa alimentação. Como as fibras são pouco absorvidas pelos seres humanos e dá sensação de saciedade, elas podem ser usadas em grande quantidade para o emagrecimento. Assim, começar uma refeição pelas saladas de folhosos pode diminuir a ingestão do alimento mais calórico, mas é preciso cuidado com a quantidade de fibras que engordam, como aveia e germe de trigo, para não errar. Interativa - Como ter uma alimentação saudável no inverno? Dr. Rossilênio - Uma boa alimentação deve ter carboidratos (pão, arroz, feijão, frutas, batata, biscoitos, etc.) em 60% do total, proteínas (carnes, queijos, leite, soja) em 25% e gorduras em


15% do total consumido. O inverno diferencia-se do verão porque as pessoas tendem a se mexer menos, ficar mais em casa e beber menos líquidos. Interativa – Quais os tipos de exercícios e tratamentos estéticos para perder a barriga? Dr. Rossilênio - A gordura abdominal é a mais sensível ao emagrecimento por regimes alimentares e exercícios aeróbicos. Esta gordura visceral vai sendo eliminada mais rapidamente que a gordura periférica. Ginástica abdominal em excesso, em pessoas com excesso de gordura no abdome tende a aumentar a barriga, já que crescem os músculos abdominais e como ainda há gordura acima deles, eles empurram o conjunto para frente, deixando a pessoa com a barriga maior, embora mais dura. Tratamentos que diminuem a barriga existem na área da Medicina Plástica (lipoaspiração), da Medicina estética (mesoterapia, carboxiterapia) e com aparelhos de ultrassom (lipocavitação, etc.). A reeducação postural e o uso de cintas modeladoras podem colaborar também para diminuir a barriga. Interativa - Fale um pouco sobre os mitos das dietas que prometem fazer milagres. Dr. Rossilênio - Dietas milagrosas aparecem todos os anos, principalmente no verão. Elas quase sempre desequilibram o organismo na sua necessidade diária de vitaminas, fibras e elementos orgânicos essenciais para a nossa saúde (dieta sem carboidratos, dietas de frutas, dieta liquida, etc.). São usadas por pessoas, principalmente mulheres, na ânsia da beleza imediata. Podem funcionar por certo tempo, mas não em longo prazo. As mudanças de hábitos de vida, mesmo que de maneira lenta e gradativa, dão melhores resultados. Um dia o peso estará de acordo com a pessoa, seja medicamente ou esteticamente e essa pessoa saberá mantê-lo. Saúde e beleza costumam andar juntas com hábitos saudáveis. O Dr. Rossilênio atende na rede West Clin Estética: 3331-9844.

Novos Talentos

Um começo, uma

oportunidade Se você trabalha ou já trabalhou na área de telecomunicações e sabe dançar, atuar, contar piada, fazer mágica ou possui outros talentos que deseja apresentar, faça como a Lorrana. Entre em contato pelo e- mail comunicacao@sinttelrio.org.br, assunto “Novos Talentos”. Lorrana Bilheo trabalhou na Tivit e na SPCOM. Ela atendeu à convocação da WebTV Sinttel-Rio, que está em busca de novos talentos para participarem de um novo programa, e enviou a sua contribuição. “Um começo, uma oportunidade” foi o texto que Lorrane escreveu especialmente para os “Novos Talentos”. Inspire-se! “Criar, mudar, transformar, sonhar... Esconde-se na cadeira do trabalho, por trás de um telefone, de um olhar... ENTENDA! Nascemos com vontade de causar mudanças, de expor pra todo mundo que ser um artista depende unicamente da gente, que ter um dom não é pra qualquer um, que sorrir e chorar pelo que você ama fazer é coisa rara. O mistério, o talento, corpo e coração fazendo pra valer, o medo não tem vez, o medo não faz parte do nosso mundo, mesmo que nos chamem

de loucos, de sonhadores...ninguém acredita no inesperado, porque sonhar não é pra qualquer um, ser artista é ousar o nada, é fazer o inesperado, é surpreender. Ter talento é transpor seu coração, é falar baixo e todo mundo te ouvir, cantando, tocando, compondo, escrevendo, seguindo o sonho, o desejo, correndo os riscos, tirando as pedrinhas, caminhando até o fim, seguindo além de si, contaminando o mundo, contagiando o real, fazendo o que era pouco se tornar inesquecível, seguindo as oportunidades, ser melhor a cada passo, porque ser único é ser especial, é ser o que ninguém consegue ser. Então, Seja! Quebre seus tabus, transforme-se, corra, mostre porque veio pra ficar... Porque como tudo tem um começo, a gente tá no meio e não podemos pensar no fim.” Lorrana Bilheo

ENQUETE Em sua opinião a Rio+20 colocará em prática o seu principal objetivo, de implementar uma economia verde com metas sustentáveis de produção, consumo e geração de emprego? Acesse o Portal do Sinttel-Rio e responda. www.sinttelrio.org.br 15


Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Telecomunicações do Estado do Rio de Janeiro Rua Morais e Silva, 94 Maracanã - Rio de Janeiro 20271-030 Filiado à Fenattel e à CUT

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