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GLOSSáRIO CONCEPTISTA
Allready-made/Allready-unmade — Allready-made é a prática que considera o mundo como perpétua obra de arte total, de onde se tem que evadir como de um pesadelo. Para isso criaram uma pseudo-arte que des-artiza o mundo. Allready-unmade é a atitude que conjura o desconhecido como suprema obra de arte. Nesta perspectiva é «tudo o que não sabemos» que altera criativamente o significado das coisas e das obras de arte. Assim, uma obra não é feita de intencionalidades mas das potencialidades que o ainda não conhecido vai inflingindo, sendo estas intermináveis.
Arte Pólvera — Um tipo de arte que mistura o lirismo conceptual afecto a materiais com uma atitude de guerrilha intelectual de origem futurista, capaz de levar a actos de choque político e moral.
Caligrafistas — Grupo de artistas pomposos, que cultivam o elitismo anarquista e atitudes excêntricas no quotidiano (roupas bizarras, fora de moda, mas de boa qualidade, etc.). Fazem poemas e textos com caligrafia esmerada, complicada, dentro da tradição seiscentista e setecentista. Escrevem versões de filosofia analítica em estilo gongórico. Vivem em casas senhoriais na província. São redactores dos inúmeros artigos da Grande Enciclopédia da Academia de Vanguarda.
dadafracassado — Seita de falhados fiéis ao fracasso original dadaísta, e que recusam a recente reciclagem do dadaísmo na história de arte. São contra toda a legitimação. Produzem obras clandestinas. Auto-provocam-se e humilham-se. Estão sempre em polémica contra eles mesmo. Tentam extinguir-se como movimento mas são incapazes de o fazer. Odeiam toda a volorização de acto histórico, sendo apologistas de datas tardias (ou a ausência delas) e de sub-atitudes decadentes.
dissimulacro — Tendência para volorizar, como Duchamp no conceito de inframince, as diferenças nas réplicas, relativamente a um modelo. O dissimulacro é dissimulação e diferendo (máscara e diferença). expurguismo — Modo de reformular ou fazer desaparecer obras em que foi pioneiro Rauschenberg, no erased De Kooning drawing. O expurgismo encontra a sua raison d’être nos frequentes actos (auto)destrutivos, como a cremação de pinturas feita por Baldessari, o desaparecimente de Arthur Cravan e todo o tipo de tardo-rimbaldismo e barthlebismo. Um livro que serve de manual para o expurguismo é Les Unités Perdues de Henri Lefebre. A teoria expurguista é da lavra de Fabiana Sorrento, na sua tese sobre o expurgo na obra de Herberto Helder.
inapropriacionismo — Atitude de construir uma obra através de actos que têm uma relação imperfeita, distorcida e desviante relativamente a obras que lhe servem de estímulo. O recurso à anamorfose, à alteração de detalhes e ao erro voluntário é recorrente.
macula — Nome de uma revista francesa dos anos 70 e mais tarde uma casa editorial. Na acessão conceptista é uma arte de auto-humilhação e de anti-aura (como em Jesus), com um gosto pelo informalismo e pelo carácter viral, vulgar. Moshé Benamor dá-lhe um feição cabalista, ao declarar que é da mácula, da contracção, do húmus, da inferioridade, da nulidade, do proletarismo, que nascem os mundos, assim como se expande o explendor divino.
meta-documentalismo — Atitude de conservação de actos efémeros levada ao extremo. Têm tendência a documentar todos os actos da vida, em particular os actos de documentação, de documentação de documentação, e por aí adiante.
metaforistas — Grupo de artistas que valoriza a metáfora em detrimento de conceitos e definições. Os seus percursores são Emanuelle Tesauro, Baltazar Gracian e Nietszche. Fazem obras de arte onde as palavras são determinantes na sua relação para-alegórica com imagens, e consideram, como Borges, que o número de metáforas significativas é limitado.
meta-modernismo — Reclamam-se de origem pessoana e consideram que a sensação é a base de toda a estética, seja nas sensações «puras», sejm nas nebulosas sensações que provoca o pensamento mais retorcido, seja na interface entre este ou outros tipos de
sensações. Enquanto meta-modernistas (e ao contrário dos post-modernistas) aceitam tanto as grandes narrativas como as micrologias e os caprichos. Preferem a noção de jogo e regra (como os Oulipianos) ao caos, à ironia e à paródia, processos que, no entanto, não excluem localmente. «São as regras que provocam os ismos, é a cartografia das regras que nos possibilita escolher o maior número de possibilidades», escrevem.
Protesismo — Consiste em injectar dispositivos ou obras alheias a criadores para que estas funcionem melhor, como, por exemplo, atribuir a Pessoa a escrita das Singularidades de uma Rapariga Loura e lê-la à luz de uma biografia equívoca (como sendo um escrito em parte autobiográfico).
Quietistas — Grupos de artistas que se dedicam à meditação e à prática de estados alterados da consciência respeitantes a obras de arte. Consideram que a atitude estética mais válida é a de recepção não-verbal, e que as obras foram feitas para serem lentamente desfrutadas.
retournement — Termo que traduz a prática de inversão das paródias (o anti-parodismo ou a paródia séria da paródia), ou da «tradução» que actualiza as obras. Nesta disciplina as obras literárias ou obras de arte são susceptíveis de melhorias ou actualizações constantes.
transformalismo — Conjunto de ciências (gramática, teologia, sociologia, ciência política, biologia). Na sua aplicação às artes dedica-se a estudar não as formas, mas os intervalos e as relações entre as formas; sobretudo as transformações estilísticas e as propensões das mutações. Baseiam-se na escola de Focillon e Kubler, assim como em Thompson (On Growth and Form), mas integram incursões na Teoria das Catástrofes de René Thom, e elementos do pensamento chinês clássico. Também valorizam os processos de mudança na feitura das obras e nas biografias, em particular a ideia de crise.