Caldas de São Jorge

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FICHA TÉCNICA edição: Albano Gomes título: Caldas de São Jorge – Uma viagem através de mil anos de História autor: Albano Gomes revisão: Cecília Sousa paginação: Alda Teixeira capa: Patrícia Andrade

1.ª Edição Lisboa, Janeiro 2015 isbn: 978-989-96997-6-2 depósito legal: 373494/14 © Albano Gomes

publicação e comercialização:

Rua da Assunção n.º 42, 5.º Piso, Sala 35 | 1100-044 Lisboa www.sitiodolivro.pt

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Postal antigo

Eu não sou escritor e muito menos poeta. No início, sou homem, sou água, sou sangue. No fim, sou homem, sou pó e nada mais. ✳

Um olhar pela nossa vila Uma vila acolhedora, com mais de mil anos de história construída por palavras e obras, por factos escritos e visuais. O Mundo está repleto de história, e todos os povos procuram salvaguardar a sua, firmando a sua identidade no Mundo,

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protegendo a sua cultura, os seus valores e as suas tradições. A primeira imagem que nos ocorre é a dos nossos entes queridos, os vivos ou os já falecidos, sendo que a segunda é a da nossa cidade ou vila e a terceira é a do nosso País. A história sobre as Caldas de São Jorge foi escrita por mim, ao longo de anos, com fotografias e letras de várias cores e locais cada vez maiores, que nos fazem vibrar de felicidade.

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Caldas de São Jorge. Magnífica vista da Sé, com os seus tesouros, os seus segredos e a sua história. Do lado direito, na zona grande, a branco, a Bébécar, empresa de artigos para crianças. Do lado esquerdo, na zona a branco, mais pequena, as Termas e o Parque.

Descobrindo a nossa história ao longo das épocas Neste ano de 2013 celebramos cerca de mil anos de história de Caldas de São Jorge. A Junta de Freguesia que preside aos destinos desta rica vila termal, de um passado milionário, exprime o prazer e a felicidade que sente ao exercer a sua função, tal como D. Iundezindo que, no ano de 889, ofereceu a quinta parte dos seus bens ao antiquíssimo Mosteiro de São Salvador de Lavra, no tempo dos Suevos, em Matosinhos. No mesmo ano, mandou construir três conventos, em Azevedo, na freguesia de São Jorge, Conce7

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lho da Vila da Feira, onde existia a igreja de Santa Eulália. Nesta terra, entre o rio e as montanhas, o pinhal e o mato, por amor e em honra de sua filha, Adosinda, que se tornara religiosa, ordenou a construção, em São Jorge, do Convento de São Miguel Arcanjo e seus companheiros. Dom Iundezindo era filho de Era, casado com Enderquina Pala, filha do Capitão Menda Enterres. Do seu casamento nasceram quatro filhas: a Sacira, a Ermezinda, a Adozinda e a Fraila. Fraila nasceu tão aleijada que nem se podia sentar. As culpas da sua deficiência foram atribuídas aos seus pais, que libertaram os seus escravos e separaram a quinta parte dos seus bens, construindo diversos conventos e igrejas. Na Universidade de Coimbra existe um documento que faz referência ao Mosteiro de São Salvador de Lavra e aos diversos conventos e igrejas aqui mencionados. O documento foi impresso num jornal no Porto, no dia 11 de fevereiro de 1957 e, nesse mesmo dia, o Sr. Adelino Ferreira dos Santos do Costeiro leu-o e tirou uma cópia. Nas constituições diocesanas, edições de 1690 e de 1924 do Boletim Diocesano do Bispado do Porto, é feita referência à freguesia n.o 21 de São Jorge, paróquia dada como existente no ano 1097. A essa chama de luz e fama, que começou por volta do ano 1000 até aos nossos dias, e aos 3000 caldenses que ainda hoje a fazem existir, eu dedico este livro como testemunho da continuação da nossa fidelidade. Uma vila não é nada sem os seus habitantes. São eles quem a engrandecem, a cada dia, tornando-a cada vez melhor, mais atraente e sedutora. Este é o resultado do esforço de dezenas de gerações, que nela acreditaram e por ela lutaram com muita coragem e trabalho. Por isso pensei em render homenagem a esses homens e mulheres, que duramente lutaram e ali desejaram viver, ao lado do rio Uíma – com a sua nascente em Milheiros de 8

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Poiares, Azevedo no Vale das Léguas e Fonte Fria, na Ribas – e que amaram, como se da sua própria vida se tratasse, este bocado de terra, de vale e montanhas: a nossa vila de hoje, Caldas de São Jorge, uma vila termal de tamanho humano e bem na sua pele, onde é bom viver e onde não falta trabalho! Poucas vilas em todo o Mundo existem há mais de mil anos, com benefícios e privilégios, com as autoridades a quererem ir mais longe, ao fundo dos problemas, de modo a construir um futuro melhor.A vila de Caldas de São Jorge permite aos seus eleitores e políticos colocar uma pedra na construção do seu segundo milénio. Todos afirmam querer fazer o melhor para participar no maior desenvolvimento de sempre: continuar a construir as Caldas de São Jorge, já a pensar no dia de amanhã. Esta obra relata alguns dos segredos e tesouros da nossa vila, a origem de algumas casas e famílias de antigamente, assim como pequenos acontecimentos mais atuais. ✳

Caldas de São Jorge Alguns testemunhos obtidos em cerca de mil anos de história de Caldas de São Jorge vão certamente agradar a uns e desagradar a outros. Porém, os mesmos fazem parte da nossa história, quer queiramos quer não. Sinto um orgulho muito grande nesta grandiosa e magnífica vila, em falar dela e divulgá-la pelo mundo. Cada vez mais rica, atraente e charmosa, a nossa vila ainda é nova, embora tenha mais de mil anos. É necessário que amadureça neste segundo milénio, abrace o progresso e continue a renovar-se, a modernizar-se, a fazer história. Assim sendo, não podemos abordar a sua história sem recuar ao seu passado recente, à atualidade 9

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do nosso povo e ao nosso Santo Padroeiro, o São Jorge. Estamos num mundo de liberdade, porém, turbulento, fraco e inseguro. Uma vez que há muita competição entre os seres humanos e os bens materiais, vão continuar a existir dificuldades em tudo, tal e qual como no passado, porque as histórias dos homens estão marcadas pelas guerras e pelo sangue. Devemos comparar-nos a um fósforo. Este é muito forte, apesar de passar despercebido, por ser muito pequeno. Apesar disso, é muito usado, tal como o nosso corpo. Se olharmos para um fósforo durante alguns instantes, verificamos que apenas se trata de um bocado de pau muito pequeno, com uma pequena chama de cera na extremidade. Uma das extremidades tem uma composição que se inflama, se o roçarmos nela, ou se utilizarmos um processo de força de calor. Gosto de comparar a vida de cada um de nós com um fósforo. Não estou a pensar na aparência física, apesar dos grandes esforços que algumas pessoas fazem para se aproximarem da largura de um fósforo. Não! Eu penso no papel que um fósforo possa ter ou desempenhar na nossa breve existência. Um fósforo é verdadeiramente pouca coisa. Apesar de ser pequeno e pesar pouco, mais ou menos 0,15 gramas, podemos fazer com ele muitas coisas maravilhosas, que nos deixam surpreendidos. Com um fósforo podemos fazer coisas das quais nos orgulhamos, como por exemplo, acender uma lareira para nos aquecermos, acender o grelhador, para fazer grelhados, acender o fogão, para cozinhar, acender um cigarro, provocar uma explosão, para iluminar, por alguns segundos, o caminho que queremos percorrer… são muitas as utilidades deste pequeno objeto, que é capaz de fazer o melhor ou o pior, como fazem os homens, pois uns fazem coisas boas e outros, coisas más. Para acender um fósforo é preciso raspá-lo em alguma coisa, noutra extremidade, na 10

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caixa ou noutra qualquer força viva de calor, porque ele não se acende sozinho, tem de entrar em contacto com outra matéria ou com outra fonte de calor para acender. É como no nosso caso, pois para que uma nova vida nasça, tem que haver contacto entre dois seres. Um fósforo acende-se com a ajuda de alguém. Após desempenhar a função que lhe atribuímos, deixa de existir, morre. Porém, por ele morrer não quer dizer que nunca tenha existido. O fósforo cumpre a sua função, ele tem que se sacrificar e ser consumido. Foi criado para isso. Isto não é comparável à nossa vida? Um fósforo que fica na caixa serve para nada, nem serve a ninguém, não percorre o caminho que lhe foi destinado. Com os humanos passa-se o mesmo. No caso do fósforo, foi o Homem que lhe deu esse destino, no caso da nossa vida, foi alguém a quem chamamos de Deus! O mesmo se passa connosco, pois se nos fecharmos em nós mesmos e não corrermos riscos por alguém ou por alguma coisa, a nossa vida não atinge qualquer objetivo. É difícil de compreender, mas é sempre urgente chamar a atenção e lutar por algo que está errado, alertar e dar a conhecer. Vamos ler algumas declarações e conhecer alguns enigmas, que nos farão sentir muitas saudades de quem anda por este mundo fora, com o coração nas mãos e as lágrimas na cara, cheios de saudade. Temos de investir na nossa vida, ter onde nos agarrar, segurarmo-nos a alguma coisa, que nos dê força e vontade de viver. Temos que arriscar a «inflamar-nos» para levar um pouco de calor para este Mundo, cada vez mais complicado e que precisa tanto do bem de todos nós. Devemos de usar a realidade e o sonho, para vermos a nossa vila crescer nestes tempos que correm. Não sou um homem muito complicado. Não me registei no facebook, porque não quero que 11

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me encontrem, não gosto que me procurem para me tentar impor seja lá o que for, como é o caso dessas grandes ofertas de riqueza de todo o género, umas boas e outras más. Prefiro decidir por mim, mas aceito um conselho ou uma outra opinião, um sussurro e o sorriso de um amigo, desses colegas de outrora, que continuam comigo no coração, esses jovens que toquei e abracei, esses amigos verdadeiros, que ficaram na minha mente e que continuam a brincar comigo em sonhos e a encher o meu coração de boas recordações. Não quero esses amigos de fim-de-semana, que bebem e dançam sem saberem porquê, que só olham numa direção, na do mal e da violência gratuita. Eu preferia a amizade verdadeira do nosso amigo António ou do Benjamim. Vós lembrai-vos deles? Desses amigos em quem eu confiava e tocava, que olhavam de frente e sorriam, com um olhar franco, de uma beleza tal, que enchia o meu coração de felicidade. Um olhar sincero de pureza que me deixava sereno, um olhar de honestidade que me deixava sem medo. Porém, esses amigos desapareceram, tal como um fósforo, deixando um vazio na minha alma e na de todos os que os conheceram, permanecendo na recordação de outrora, que iluminava a minha alma e as suas vidas. Eles fizeram o seu papel, neste quadro da vida, que tanto pode durar um dia como cem anos. Não fui eu quem decidiu a sua partida, mas sim Aquele que lhes deu a vida. Assim como eu dou a vida a um fósforo, também posso determinar a sua morte. O mesmo se passa com o Dono do Universo, seja ele extraterreste ou Deus, esse alguém desconhecido e invisível, que nos deixa umas vezes tranquilos, e outras vezes com medo, a chorar de desespero, dependendo da serenidade ou da dor que sentimos. Vós também conheceis o Hugo, esse pequeno amoroso dos anos de 2005, que fez da internet a sua melhor amiga, 12

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passando horas a fio em frente ao ecrã do computador, confundindo o seu mundo virtual com a realidade e fazendo amigos desconhecidos por todo o Mundo. Ele podia cortar o fio ou o cordão umbilical a qualquer momento e ficaria com nada, a não ser essas horas de ilusão em que ele jogava ou via um filme, alegrando-se um pouco, nessa hora, e depois sentindo nada. Observo o meu filho de 15 anos, que se destrói no facebook, enviando e recebendo mensagens, caindo, por vezes, na desgraça e no engano, 50 ou 100 vezes por dia, com os seus amigos do mundo. Por vezes, julgo que ele já se encontra morto de cansaço e de desilusão, como se já estivesse morto naquele mundo virtual do engano e do suicídio. Depois hesito em chamá-lo à razão, em dizer-lhe para arranjar amigos reais, verdadeiros, com sentimentos e sensações, os quais possa tocar e amar. Amigos de verdade. Com a minha idade, não me convenço que é possível juntar amigos, num quadro repleto de desenhos, no qual uns dançam e outros cantam, e onde, ao desligar o computador, tudo acaba, como se tivesse sido um sonho ou uma miragem. Onde está a aranha que se encontrava no teto do meu quarto, que me fazia arrepios, que eu queria caçar e mandar lá para fora? Ela era vida, era uma realidade que eu via, mas enquanto jogava na minha máquina moderna, esqueci-me que ela estava no teto do quarto, tendo-a perdido de vista, pois ela tem pernas e é vida. Como não a vi, fui dar mais uma volta nessa rede social virtual, tendo recebido muitos convites e mensagens, mas como já estava tão cansado como um porco e polido que nem um urso, não respondi mais. Então, sem saber porquê, percorri o sítio cheio de perigos, como um astronauta à procura de Marte, cheguei ao fim do tapete do teclado e desliguei antes que esse robô me matasse.

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Pensei então que era preferível procurar verdadeiras amizades na sociedade local e fazer parte da vida natural, do contato humano e pessoal, que anima e que dá calor, aquilo que podemos tocar e sentir, como se nos encontrássemos em casa e nos sentíssemos seguros. Os amigos verdadeiros dão-nos o seu carinho e podem ajudar-nos, dar-nos a mão e levantar-nos. São esses que nos compreendem e nos podem salvar e que, quando se encontram longe, nos deixam muitas saudades, com lágrimas na cara e com um vazio na nossa vida. Tal como o António e o Benjamim, que nos deixaram com o coração ferido e cheio de saudades e que nos arrasaram a alma. Como muitos outros por este Mundo fora: Uns que nos deixaram a verter lágrimas, e outros, sangue; que procuraram algo que queriam nas suas vidas, uma miragem ou o sonho da realidade. Deixámos os brinquedos tradicionais e entrámos na era virtual. Por quanto tempo ainda se vai esperar pela felicidade, que devia de existir para sempre? Espalhando os meus sonhos pelo céu, olho a água deste desejo que já caminha há vários anos, observando o calmo ondular que está para chegar dessa margem, onde o amor se escondeu e teima em não voltar. E os barcos sem destino, repousados nos seus braços bem erguidos, em direção ao céu, lembram os dedos das mãos, esguias e puras, que tocaram a minha cara e que eu beijei com ardor e carinho, assim como os seus olhos, envolvidos por um hálito, resplandecem confiantes nesse amor profundo, como um pilar de cimento. É do fundo do meu coração que te falo. Só desejo transmitir-te calma e confiança, nesse rio do amor que banha calmamente a nossa alma, com as suas ondas suaves e quedas de água, para ele nunca mais secar e nos deixar marcas de boas recordações no coração. Vamos virar a página e continuar a 14

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procurar pelo espólio e a descobrir esses tesouros magníficos que se encontram, um pouco por todo o lado, nas Caldas de São Jorge ✳

Não há futuro sem passado! Comecemos por São Jorge, um guerreiro corajoso, carregado de história, cuja fama chegou até aos nossos dias. Com o estalar dos seus dedos e das suas proezas, foi um verdadeiro guerreiro na defesa pelos seus ideais, por aquilo que ele considerava serem os melhores e os mais justos, acabando por se tornar num Mártir e num Santo. É o nosso representante, marcando a sua identidade no Mundo, tal como D. Afonso Henriques o é para Portugal, assim como muitos dos nossos antepassados que nos legaram e a quem temos de agradecer os valores que hoje temos. O primeiro tesouro das Caldas de São Jorge é o próprio Santo São Jorge, a nossa identidade no Mundo, quem nos relaciona com Jesus e com Deus, que representa a nossa terra, a nossa fonte de energia, tanto na comida como na água. O segundo tesouro é a nossa Igreja e todos nós, no seu seio, na comunhão com o nosso Santo São Jorge e com Deus. O terceiro tesouro são as nossas escolas, onde aprendemos e nos instruímos com a ajuda dos professores. O quarto tesouro é o posto médico, onde prolongamos a nossa vida com ajuda dos médicos. O quinto tesouro é o Rio Uíma, as termas, as fábricas, o comércio e todos os outros serviços. O sexto tesouro é o cemitério, onde somos sepultados, quando a nossa vida acaba. A nossa última morada, da qual temos tanto medo e nos faz gritar de raiva, onde se misturam os vivos e os mortos, recordando os belos tempos que passaram juntos. 15

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Sé. Inauguração do monumento dedicado a São Jorge, em 22 de Abril de 2012. Projeto do Arquiteto Pedro Castro e Silva.

O Santo São Jorge 16

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Quem foi o Santo São Jorge? A história medieval conta que o Santo São Jorge era filho do Lorde Albert de Coventry, e que sua mãe faleceu ao dá-lo à luz, tendo sido raptado em menino pela dama do bosque, para mais tarde vir a ter poderes sobrenaturais. O corpo de São Jorge tinha três marcas: um dragão no seu peito, uma jarreira em volta de uma das pernas, e uma cruz em vermelho vivo no seu braço. São Jorge lutou contra os sarracenos e, depois de viajar durante muitos anos por terra e por mar, foi para uma cidade da Líbia. Outros dizem que nasceu na Capadócia, atual Turquia, e que se mudou para a Palestina quando ainda era criança. Alistou-se no serviço militar e foi subindo de carreira até chegar a Capitão dos Guardas do Imperador. Aos 23 anos já exercia a função de Tribuno Militar. Era um bom cristão e depressa começou a praticar verdadeiros atos de coragem e de valentia. Certa vez, o Imperador mandou reunir o Conselho Imperial para o consultar a respeito da perseguição que estava a ser feita aos cristãos. Diocleciano tinha planos para matar todos os cristãos e reuniu o Senado para promulgar o Decreto Imperial. São Jorge, que pertencia a esse conselho, também compareceu e, quando chegou a sua vez de falar, levantou-se para defender os cristãos, afirmando que os ídolos adorados nos templos pagãos eram falsos deuses. Todos ficaram surpreendidos com as palavras vindas de um membro da Suprema Corte Romana. São Jorge foi degolado, a mando de Diocleciano, em 23 de Abril do ano 303, na Nicomédia (Ásia Menor) e os seus res17

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tos mortais foram transportados para Lida (antiga Dióspolis) cidade onde cresceu com a sua mãe. Mais tarde, o Imperador cristão, Constantino, mandou erguer um sumptuoso oratório, aberto aos fiéis, para que a sua devoção fosse espalhada por todo o Oriente. Atualmente, a devoção a São Jorge está espalhada um pouco por todo o Mundo, mas, no Século V, já existiam cinco igrejas em Constantinopla dedicadas a ele. Só no Egipto, após a sua morte, foram construídas quatro igrejas e quarenta conventos dedicados ao mártir. Pensa-se que foram as cruzadas inglesas que ajudaram D. Afonso Henriques a conquistar Lisboa, no ano de 1147, e que foram essas cruzadas que trouxeram a devoção a este Santo para Portugal. Contudo, na minha opinião, essa devoção apareceu muito antes.

O Santo São Jorge.

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D. Nuno Álvares Pereira, o Condestável, nomeou o Santo São Jorge como sendo o responsável pela vitória da Batalha de Aljubarrota, ordenando que fosse construída, nesse sítio, uma capela em sua honra. O Rei D. João I, no ano de 1387, substituiu o patrono de Portugal, que até ali tinha sido Santiago, pelo Santo São Jorge, ordenando que a sua imagem fosse transportada na Procissão do Corpo de Cristo. Também consta na história que o Santo São Jorge matou um dragão, espetando a sua lança na garganta deste, para salvar a princesa Sabra, filha do Rei, que ia ser sacrificada. Depois de a salvar, levou-a para Inglaterra onde casaram e viveram felizes até à sua morte. O Santo São Jorge simboliza o bem de Deus, o Dragão simboliza o mal do demónio.

Caldelas. Igreja Matriz, pilar e arraial, em tempos de liberdade.O pilar devia de ter ficado do lado direito, em frente ao Salão Paroquial, na direção do Cruzeiro, que se encontra do lado esquerdo, em frente à Igreja. 19

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Termas e Parque, ainda com a sua linda fonte. ✳

Cores locais Dez séculos de existência, com todas as suas sombras e as suas cores, as suas conquistas e os seus atentados, tudo escrito numa comunidade próxima e familiar: é um quadro airoso da nossa vida neste «cadeado» humano, por vezes forte, por vezes frágil. Nas páginas deste livro, de uma forma simples, vou transmitindo aos caldenses o seu passado e o seu presente, como se fosse uma aventura ou filme, construindo e restaurando os tesouros do passado, em direção a um futuro de progresso e de modernidade. Legar às gerações futuras a antiga arquitetura tradicional, restaurando os monumentos tradicionais, que embelezam as povoações, as vilas e as cidades, é deixar algo dos nossos antepassados, abençoados com as lágrimas do céu e com os corações dos Homens.

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Em frente a um computador, mesmo sem saberem ler e escrever. ✳

Adoro que se encontrem na alegria, essas almas que somos e que vivemos. Adoro que sintamos amor neste dia, do muito amor que merecemos. Recordo e vivo esses momentos de amizade verdadeira, momentos intensos e estranhos, mas felizes, de amor humano que nos toca. Recordando esses e outros sentimentos que deixam cicatrizes na nossa alma, vêm as marcas, não de dor, mas de saudade. Foram gravadas e vincadas de ternura, bordadas pela vida no teu corpo, que amo de verdade, sinais desse padrão que ali ficaram, num sinal de amor sem fim.

Castelo de Santa Maria da Feira, em 2007. 21

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Sr. Alfredo Henriques

Sr. José Carlos Baptista Martins

Atual Presidente da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira.

Atual Presidente da Junta de Freguesia das Caldas de São Jorge.

Nas belas terras de Santa Maria da Feira, há alguns anos, nasceu o nosso menino Zezé, que se tornou num bom rapaz. José Martins é como se chama, e sua terra Natal é São Jorge. O menino foi crescendo e, tanto cresceu em fama, que chegou a presidente. Começou a dar aulas de karaté e a lutar contra as pedreiras. Medalhas, eram aos milhares, mas cuidado com a brincadeira, que é a coisa que mais o aborrece. Presidente de grande fama, a quem não falta bom senso. Raparigas, prestem atenção! O herói de que tratamos é um grande partido, com saúde, dinheiro e amor. Um presidente é de «apanhar», não é preciso muita cautela. Pequenas, lancem as vossas antenas; mamãs, não tenham nada a recear deste menino pacato e meigo. O José Martins é hoje a esperança, e amanhã será um mito, pois todos irão guardá-lo, como se fosse uma pérola, dentro do seu coração. Será que este presidente terá finalmente um romance? Nas questões de amor não sei bem, mas nas promessas, ele é um ás. 22

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Contudo, vou contar-vos o que se diz lá fora: que lá para os lados da serra encontrou o par ideal, mas não sei ao certo se é verdade ou simplesmente intrigas feitas pela oposição. Enquanto as beldades passeiam pelo parque, muito animadas e às gargalhadas, em descuido vão mostrando as belas pernas às ruas da vila termal, onde também passeia o Zé, que é «passarão». Com os olhos postos no chão, o seu olhar penetrante vai subindo, começando pelas meias das elegantes beldades, subindo, subindo... Não há mulher que resista – não só mulheres, mas também as belas moças – em lançar a vista a este amor de rapaz, de olhos azuis e de cabelo aos caracóis. Meninas, apurem os sentidos quando passarem por este belo rapaz, pois ele atravessa os vestidos com um olhar de raio-X. Caro leitor, se julgas que isto é gozo, vai à Sé dar uma vista de olhos, se te julgas capaz. Ao ver uma linda moça, esbelta e loira, os seus cabelos ficam logo em pé, com medo de não poder agarrá-la. Passa o tempo a «tirar-lhes as medidas», mas só por observá-las logo fica doente e com tonturas. Velho, irá deixar-nos, mas vamos sentir muitas saudades desta alma franca e leal de presidente. Senhor, o que lhe parece o presidente aqui do lado? Eu conto-lhe, se ainda não o conhece. Foi toda a vida um bom ponto, de fraca estatura, muito reservado e tímido e, enquanto pequeno, sempre doente e com o pingo no nariz. Passou a ser para todos uma incerteza. Fala sempre sobre qualquer assunto, prometendo o céu a todos, mas não cumprindo, como se fosse rei ou dono do Mundo. Até já lhe chamam o «ás das promessas». Com cabelo aos caracóis, de ondas mil, pelas moças é adorado. De baixa estatura, olhos da cor do mar, muito orgulhoso, mas gentil, este Zé é hoje presidente! Na cerveja ele é um ás e, no discurso, um valente, mas como presidente audaz, há-de salvar muita gente! Jul23

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gam que, porventura, ele esqueceu por um momento, em algum momento de doçura, a dona do seu pensamento? Pequenas, «cautelinha», pois o presidente de que vos falo, embora seja um regalo, já tem a sua querida, lá para os lados da serra ou de Lobão! O José Martins, caro leitor, é bem deste cariz que tens na tua frente, com ares de rei, de olhar tímido e reservado, com um andar forte e sonante, é inteligente! Se reparares bem, é de longe um terror, e de perto um zé-ninguém, que sorri sempre, francamente, com ar de brincalhão e de bom coração. Anda sempre a rir e, logo que encontra um grupo a conversar, acena com a mão e mete-se na função, nos mexericos de ocasião. Não é nada madrugador e, na pontualidade, este caro presidente é muito trapalhão. A Vila de Caldas de São Jorge, terra de onde ele é oriundo, grande festa vai prestar ao melhor presidente do Mundo! Este presidente sempre fez coisas de jeito e, para mostrar o que vale, entrou com o pé direito, nas obras do Calvário, a ilha e Zip Zip Bar, e com um conhecimento profundo para passar guias de marcha ao progresso e ao desenvolvimento da nossa vila. Eu, como todos os cristãos, quando precisar de algum favor, vou logo ter com esse sabichão, que a todos dá «lições de lustro e de sabedoria», com o seu sorriso malicioso, dizendo uma coisa e fazendo outra. Como os polícias, tudo topa e nada lhe escapa. É um bom especialista para as brincadeiras das promessas, nunca diz «não» a ninguém, mostrando-se assim seguro de si e do seu orgulho. Tem remédio para tudo, mas só da boca para dentro, pois da boca para fora não é bom falar, senão tínhamos história para contar durante dias ou meses. Se nisto exagerei, não foi por mal nem para ofender, mas sim para chamar a atenção de que alguma coisa que é necessária fazer e, se não mencionei 24

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algo, desculpe, que foi sem intenção. Sabendo que há um engano no lugar da verdade, não faz nada para remediar o mal. Será que o Zezé tem alma e coração? Parece-me que não, parece que tem coração de aço. Em todo caso, aceite um abraço de um amigo do Pinheiro, com desejo de muitas felicidades. Este presidente do Candal, com um metro e cinquenta, apesar de muito comer e correr, não tem altura suficiente. Porém, de tanto comer e correr, chegou a presidente. Falta-lhe em altura, mas em fama é um ás É grande e tem comprimento de sobra. Não é só de comer que o presidente gosta. Também não desgosta de beber. Para o sexo fraco é muito amável, só o que detesta é ser formidável na concretização de todos os problemas. A volta dos tristes não gosta de dar. É lá preciso isso para as conquistar? Sabe levá-las de outra maneira, com palavras doces de amor, com festas, romarias e prazeres, vendo os outros sofrer. O presidente lá sabe o que tem aldrabado. Eu conheço um que acreditou e, no fim, nada aconteceu. Não vou falar mais, quer de promessas, quer de comer, quer de amor, só para não o aborrecer! Presidente reservado, de carinha ameninada, com um sorriso mordaz, de barba, nem se vê nada. Porém, cautela com o rapaz! Anda sempre de olho vivo, vendo só o que lhe convém, e em algumas direções, nada lhe escapa. Vendo passar uma moça na rua, lá lhe diz a sua piada, mas ela não lhe liga. Caro leitor, que triste sorte o menino presidente tem! Fala, ninguém lhe responde. Olha, e não vê ninguém. Pode andar pelo beicinho, pode ser forte a paixão, pode até já ter feito o ninho, pode ter pedido namoro ou mesmo já ter casado, mas não assim, tão reservado! Diz ele: – Elas não puxam por mim, o meu remédio é ficar calado. Então é vê-lo 25

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corar. Será por simpatia? Talvez, mas para camuflar ele diz: – Ah, esta vida! Terminou a minha missão de vos apresentar este presidente. Como? Sim, tens razão. Parabéns ao José Martins!

Sr. Padre António Teixeira Machado Pároco atual. ✳

Um padre revolucionário das modernas tecnologias e um conservador das tradições, amado por uns e rejeitado por outros, mas lutando com fervor por São Jorge, tal como lutou na sua infância e juventude pelos valores em que acredita. Um dos maiores, ou mesmo, o maior impulsionador das grandes obras das Caldas de São Jorge, desde o dia 8 de janeiro de 1984, há 30 anos, um grande progressista das novas tecnologias, do desenvolvimento e do crescimento da nossa vila. Por este meio, quero dar os meus sinceros parabéns a este nosso amigo querido. Espero que ele continue entre nós por muitos mais anos, que Deus lhe dê a força e a coragem de espírito suficientes para continuar com a dinâmica e a alegria de sempre, em relação ao progresso e à modernidade da nossa vila termal, nesta luta, que é de todos, pelo bem dos nossos valores culturais e tradições e 26

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pelo bem de Caldas de São Jorge, que somos todos nós. Nasceu a 1 de Novembro de 1943 e foi batizado a 7 de Novembro de 1943, no seu domicílio, Molar, Rebordosa, Paredes. A sua infância foi igual à de muitas outras crianças da época. Passeava a pé e andava de bicicleta pelos montes e pelas freguesias vizinhas, gostava de ir aos ninhos e domesticar pássaros e de tratar da vida do campo. Quando tinha cerca de oito, nove anos, já tratava de três ovelhas e de uma vaca. A sua juventude, passou-a no estudo, no convívio e no teatro, em passeios e festas com os seus colegas. Nos tempos livres, gostava de ler livros. Os seus pais queriam que ele fosse serralheiro, mas ele optou por ir estudar para o Seminário, onde foi um bom aluno e tornou-se padre. Naquela época, os pobres iam estudar para o Seminário e depois seguiam conforme a sua vocação: uns iam para padres, outros para engenheiros, doutores, etc. Entrou para a escola primária no dia 7 de outubro de 1951 e completou o ensino primário, com o exame oficial, em junho de 1955.Com 12 anos entrou para o Colégio Seminário de Godim/Régua Depois continuou nos seminários dos colégios do Faião/Braga, tendo completado o Curso de Humanidades em 1962, no Liceu Sá Miranda-Braga. Frequentou dois anos de Filosofia (1963-1965), quatro anos de Teologia (1965-1969) e dois anos de professorado no sul de Angola (1969-1971) e na Universidade Católica (1971/1972). Ordenação a 16 de abril de 1972 e Missa Nova a 21 de maio de 1972, em Rebordosa. De 1972 a 1974, encontrava-se de novo nas Missões, no sul de Angola, Cuanhama e outras, regressando em setembro de 1974.Prestou serviço na paróquia local de Rebordosa e foi incardinado na diocese do Porto entre 1974 e1983.É pároco das Caldas de São Jorge desde 8 de janeiro de 1984 e pároco de Cristo Rei da Vergada desde 22 de novembro de 2008.Este ano faz 71 anos. 27

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Assumiu também a Administração Paroquial de Milheirós de Poiares e Macieira de Sarnes, Lobão, Freguesia de Canedo (há cerca de dois anos) e Sanguedo (por três vezes). Segundo ele, o dever de um padre é o mesmo de o de muitas pessoas que se levantam cedo: o dever de ajudar os homens e salvar as almas. Cristo foi um revolucionário, um guerrilheiro progressista pacífico, que fez o papel da formiga contra as cigarras. Segundo o Sr. Padre António Machado, o povo de São Jorge sempre teve iniciativa e aprecia «ficar na fotografia», revelando uma excelente autoestima – o que ele acha bem! Sentiu-se sempre amado pela maioria do povo e também gosta de ficar nas fotografias, sente-se orgulhoso do seu rebanho. A paróquia sempre sentiu orgulho e sempre teve consideração pelo Sr. Padre António Teixeira Machado. Por outro lado, ele também é muito simpático, gosta de dizer as suas graças e brincar, sabendo levar o seu rebanho a bom porto. Para ele, a nossa vila é bela e atraente, mas merecia muito mais, pois não tem o que merece. A sua primeira opção foi sempre valorizar a igreja e, em seguida, a freguesia. A igreja está aberta ao Mundo, mas este não se abriu a ela, procurando as práticas do mal, tais como a lei dos divórcios e dos casamentos vazios entre pessoas do mesmo sexo. Na opinião do Sr. Padre, as Caldas de São Jorge é uma vila semelhante a uma pérola ou a uma rosa vermelha, é um tesouro que lhe enriquece a alma e que o faz verter lágrimas de felicidade. É como um despertar num dia lindo de sol de primavera, cheio de amores e sonhos, que deviam tornar-se realidade nos nossos corações, nestes tempos de incerteza. O fogo que sinto dentro de mim e que me aquece nas noites de solidão, não queima, mas é muito apetitoso. O calor dessa chama, que quanto mais intensa, melhor. São brasas de prazer que fazem acelerar o coração. Escrever poemas de 28

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amor dá alegria e prazer, no geral, dá felicidade e gosto em viver. Há sempre presença no presente, onde está presente o passado, ou num futuro imaginado. Seja como for, sempre se viveu, vive-se ou sonha-se. Como uma vela, a sua vida traz luz e calor e, se ele nos deixar, um dia, a sua chama continuará nos nossos corações. Na honra de ter cumprido o seu destino ficarão as saudades do seu povo, mas ele continuará a brilhar nos nossos corações. O amor não tem fronteiras e não se mede aos palmos. O amor é invisível, é uma energia que se sente no coração, mas que não se vê. O amor é algo especial que se dá, mas que não se compra. É um íman que atrai todos os seres da terra nesta esfera da vida, em que uns vencem e outros são vencidos. O amor é imenso, tal como o vivo e penso, é uma virtude que não podemos esquecer. O que há de mais punível no amor é o vazio que ficará quando o nosso querido amigo desaparecer ou partir, deixando uma vila harmoniosa, mas com muitas saudades.

Igrejas antigas e atuais! Descrição das duas ou três igrejas de Caldas de São Jorge A igreja antiga estava situada precisamente na direção da casa da Tulha, que estava emprestada ao magistério primário. O outão da parte de baixo encontrava-se na direção da Capela-Mor da antiga igreja, na parede, por detrás do altar-mor. O Sr. Adelino Ferreira dos Santos, do Costeiro de Arcozelo, reconheceu-a perfeitamente. Tinha uma cornija de esquadria, em cima, mais alta em cerca de um metro que o teto da casa, da qual fazia parte nessa altura, e que por 29

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isso se via que as paredes laterais tinham sido demolidas, em parte, para que a casa dos caseiros ficasse mais baixa. Aí ele reconheceu uma pia de água benta, embutida numa das paredes laterais dessa dita casa que, pelas suas dimensões, devia de ser muito pequena. A terra que faz parte do arraial, a que está entre a igreja atual e a residência paroquial, tinha a largura de um caminho de bois, estreito, encostado ao adro atual. Toda essa terra serviu de cemitério no tempo da antiga igreja. Ele pôde comprovar isso, uma vez que transportou muitas vezes desse desaterro as ossadas que lá apareciam, para o cemitério atual, tendo até levado gengivas, com os dentes completos e brancos como fina cal. Quem lhe dera ter tido assim os seus dentes na sua juventude! A antiga igreja, que foi inutilizada por volta de 1735, estaria talvez situada onde existiu a antiquíssima Igreja da Santa Eulália, referida num documento do ano de 889 existente na Universidade de Coimbra. Quem sabe disto, caro leitor? A igreja atual, bem como o cemitério novo, foram construídos em terreno lavradio, que pertencia ao passal. Todos esses terrenos, mesmo naqueles onde se levantaram bons edifícios, que se encontravam em frente da estrada, do lado sul, desde o Cruzeiro até ao Largo dos Lavadouros da Sé, e do lado norte, desde a Escola do Cruzeiro até ao dito largo, e que faziam parte do passal, eram constituídos por terra e mato, a chamada Mata da Bica ou da Marquinhas. A esses terrenos pertenciam também as duas junqueiras grandes, e todo o terreno das Caldas, com o terreno onde edificaram a Pensão do Parque, a Pensão Central e a Pensão Silva. Os maiores beneméritos e benfeitores da igreja antiga vieram da casa da Ribas, como a pedra do testamento de Baltazar Fernandes. O Abade Loureiro carregou todas as madeiras dos terrenos do passal de São Jorge para a grande casa que construiu, em 30

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Guisande, inclusivamente uma carreira de castanheiros que havia em frente ao campo, onde se encontra agora o cemitério novo. Isto dos castanheiros já lhe foi contado pelo seu pai e o seu padrinho do Carvalhal, o Sr. José Alves da Ribas. Lista dos nomes de alguns dos párocos de Caldas de São Jorge que ele conheceu e que são de interesse: - Padre António Correia Pinto de Guimarães, de Espargo, que se iniciou em 1950; Padre João Gonçalves Marinheiro, de Arada, que começou em 1943, e daqui foi para Oleiros, Concelho da Feira, em 1950; Padre Delfim Augusto Guedes, de Guisande, que aqui começou em 1939, e que daqui foi para Escariz, Arouca; Padre José Inácio da Costa e Silva, de Pigeiros. Esteve em Fermedo de Arouca, e aqui se iniciou em 10 de maio de 1906, onde acabou por morrer em março de 1947. Está sepultado em Pigeiros, contra a sua vontade, pois ele dizia constantemente que queria ficar em São Jorge. Paroquiou a freguesia de maio de 1906 a outubro de 1939; Padre José Valente de Matos, de Avanca, Estarreja, começou em março de 1904 e saiu em maio de 1906, tendo ido para Oliveira de Azeméis e Gondomar; Vigário José Correia Dias de Almeida, de São João da Madeira, que se iniciou em São Jorge, em 1882, e saiu em 1904 para Espinho. Foi sepultado em São João da Madeira; Padre José Ferreira Coelho, de Guisande, que veio encomendado e conseguiu escapar-se, talvez por grande influência politica, pois não tinha paroquiado qualquer freguesia, se não a de São Jorge. Entrou em 1840 e cá ficou durante 38 anos, tendo falecido em 1878. Aqui ficou sepultado, na entrada lateral do adro, na parte debaixo e abaixo do chão uns dois ou três metros, numa campa de pedra; Padre Joaquim de Vasconcelos Vargas e Silva, do Porto, que paroquiou a freguesia durante 15 anos. Aqui morreu e foi sepultado a par da Sacristia, do lado 31

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sul, precisamente do meio para cima, encostado à Sacristia; Padre Manuel Alves Preda, da Ribas de Arcozelo, que paroquiou a freguesia durante um mês, talvez sem ser nomeado, mas sim por ser o mais velho ou o único da freguesia quando morreu o seu antecessor; Padre Ignácio António da Cunha, o descobridor das águas milagrosas das Caldas. O Abade Ignácio está sepultado no cunhal de baixo, abaixo da sacristia, do lado sul, para baixo, a cerca de 2,5 metros abaixo do Abade Vasconcelos, mas já se encontra debaixo da parede do adro; Abade Julião, o grande impulsionador da construção da igreja, que deixou a imagem de São Julião no nicho, cavado na parede da Capela-mor, na parte exterior sul do lado das Caldas. Conta-se que esta imagem tenha sido roubada em tempos passados. O Sr. Adelino Ferreira dos Santos, de Arcozelo e o seu primo, o Sr. Benjamim da Albarrada, a pedido das suas tias freiras, trouxeram para a superfície da terra a campa do seu avô e encontraram por debaixo a do Abade Ignácio António da Cunha. Levantaram-na, a pedido do Sr. Abade. «José Inácio da Costa e Silva», lá se lia o seu nome, que estava bem gravado e conservado. Eu pergunto se não se deveria ter ali conservado a sua campa e a do Abade Vasconcelos, visto que as três se encontravam quase em carreira, a do Abade Loureiro, a do Abade Vasconcelos e a do Abade Ignácio António da Cunha, assim como a do célebre José Correia Leite Barbosa, que estava um metro acima da do Abade Joaquim de Vasconcelos Vargas e Silva. Não seria bonito e curioso conservar estas relíquias históricas, em pedra natural, estas marcas das diferentes épocas? Porém, foram todos levantados pelo Abade José Inácio da Costa e Silva, para fazer os passeios do adro novo. A do José Correia Leite Barbosa encontra-se no lajeado, fora da porta principal.

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Caldelas. Igreja Matriz de Caldas de São Jorge, em 2010. O tesouro número um da nossa vila, construída em honra do nosso Santo São Jorge e de todos nós. ✳

Ares dos tempos! Mil anos ou mil cento e vinte e quatro anos que atravessam épocas diferentes da nossa história. O ano milenário da nossa vila oferece-nos a oportunidade de pesquisar a nossa história, de dá-la a conhecer ao Mundo, abrindo-a para o exterior, mostrando a nossa identidade, rica em património e acontecimentos, participando no seu desenvolvimento, com ideias novas relativamente à área da construção, da cultura, da literatura e outros. Está na hora de fundarmos 33

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