Parábolas de fazer crescer

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João Martins & Jorge Damas

Para´ bolas de fazer

CRESCER ilustrações de Tiago Leal

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FICHA TÉCNICA edição: edições Vírgula ® (Chancela Sítio do Livro) título: Parábolas de Fazer Crescer autores: João Martins & Jorge Damas ilustrador: Tiago Leal revisão: Marília Julião paginação: Alda Teixeira capa: Patrícia Andrade

1.ª Edição Lisboa, Novembro 2015 isbn: 978-989-8821-12-6 depósito legal: 399499/15 © João Martins & Jorge Damas

publicação e comercialização:

www.sitiodolivro.pt

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PREFÁCIO A pedagogia é uma arte. Há já vários anos que transporto dentro de mim, como referência luminosa e como faúlha incendiária da paixão amorosa da educação, a metáfora de François Jacob da estátua interior. O(a) pedagogo(a)-educador(a) é um(a) escultor(a) da estátua interior do(a) educando(a). Educar, no senƟdo originário dos verbos laƟnos educere e educare, é a arte (a mais bela e a mais grandiosa de todas as artes) de bem conduzir e bem alimentar o(a) educando(a) na subida íngreme e diİcil, por vezes dolorosa mas sempre exaltante (estou a pensar dentro de uma certa terminologia do filósofo-pedagogo Platão), para as alturas mais elevadas e para os horizontes mais longínquos do Bem, do Belo, da Verdade… Conduzir (no significado eƟmológico de pedagogia a parƟr do grego, conduzir a criança – o servo que conduz a criança - para a escola do conhecimento e da vida ou do conhecimento que se faz vida)… Alimentar (a caminhada-subida exige alimento adequado)… Esculpir (com paixão pela perfeição, com os olhos da alma fixados no Alto e no Longe da Perfeição)… É uma arte. Melhor: é a arte por excelência, a arte das artes, a arte de todas as artes. Os textos-parábolas deste livro são testemunhos daquilo que acabo de escrever: a arte da linguagem metafórico-imaginaƟva, míƟco-poéƟca, ao serviço da arte de ensinar o(a) aluno(a)-educando(a) a conduzir-se, a alimentar-se, a esculpir-se, a crescer… Crescer… Fazer crescer… Parábolas de fazer crescer… De quem assume a responsabilidade de ser autoridade (dos termos laƟnos auctor e auctoritas, ligados ao verbo augere que significa fazer crescer): ser autor-poeta (do grego poiéo, no senƟdo de criar)-escultor de métodos-caminhos que permitam ao educando ir crescendo, crescendo, crescendo de modo a tornar-se cada vez mais e mais e mais autor-poeta dos métodos-caminhos da sua própria caminhada-subida e autor-poeta-escultor da sua estátua interior. No processo pedagógico-educaƟvo, o(a) autor(a)-condutor(a)-alimentador(a)-escultor(a) faz a dolorosa experiência de que é muito diİcil encontrar a palavra certa e o gesto certo. A linguagem conceptual é sempre limitada, frágil e incapaz de dizer com rigor o indizível e o inefável do mistério. A linguagem dos nossos gestos também é limitada e é, sobretudo, ambí5

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gua. As imagens, as metáforas, as parábolas, as alegorias e outros balbucios da prodigiosa capacidade míƟco-poéƟca do ser humano (esse animal-que-fala, na acertada definição de Aristóteles) são, como magistralmente nos mostrou Platão, complementos lançados em socorro da nossa carência linguísƟca. São manifestações do núcleo essencial da alma estéƟca da raça humana. E são luzes e sons a iluminar e a despertar a inteligência de quem se disponibiliza a ler e a escutar o ÍnƟmo da Vida e do Ser.

à Äç ½ ÄçÄ Ý (imensamente grato aos autores deste livro)

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ÍNDICE 1.

O pote rachado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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2.

Porque é que as pessoas gritam? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

3.

As duas vizinhas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

4.

Os biscoitos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21

5.

A carroça vazia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

6.

Inocente ou culpado?. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29

7.

O cavalo no poço. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33

8.

O monge e o escorpião. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

9.

A cenoura, o ovo e o café. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

10. Viver como as flores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 11. Papel ao vento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 12. O fumo e o assado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 13. O prego na porta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 14. Comédia da vida corporaƟva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61 15. O lápis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65 16. A flor da honesƟdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 17. Maneira de dizer as coisas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 18. O samurai idoso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77 19. A Ɵgela de madeira. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81 20. Sabedoria. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85 21. Marcenaria… . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89 22. A pureza. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93 23. As sete maravilhas do mundo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97 24. O lenhador e a raposa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101

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I. O POTE RACHADO

A felicidade humana geralmente nĂŁo se consegue com grandes golpes de sorte, que poucas vezes acontecem, mas com pequenas coisas que acontecem todos os dias. (Benjamin Franklin)

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O pote rachado Havia na Índia um carregador de água que transportava, em ambas as pontas de uma vara, que levava atravessada no pescoço, dois potes grandes de barro. Um dos potes Ɵnha uma racha e o outro era perfeito. O pote perfeito chegava sempre cheio ao final do longo caminho que ia do poço até à casa do patrão, mas o pote rachado chegava apenas com metade da água. E assim, durante dois anos, o carregador entregou diariamente um pote e meio de água em casa do seu senhor. O pote perfeito, é claro, estava orgulhoso do seu trabalho. O pote rachado, porém, estava envergonhado da sua imperfeição. SenƟa-se miserável, por apenas ser capaz de realizar metade da tarefa a que estava desƟnado. Depois de perceber que, ao longo de dois anos, não Ɵnha passado de uma amarga desilusão, o pote disse um dia ao homem, à beira do poço: – Estou envergonhado e quero pedir-te desculpa. Durante estes dois anos só entreguei metade da minha carga, porque a minha racha faz com que a água se vá derramando ao longo do caminho. Por causa do meu defeito, tu fazes o teu trabalho e não ganhas todo o salário que os teus esforços mereciam. O homem ficou triste, com a tristeza do velho pote e disse-lhe com compaixão: – Quando voltarmos para casa do meu senhor, quero que repares nas flores que se encontram à beira do caminho. De facto, à medida que iam subindo a montanha, o pote rachado reparou que havia muitas flores selvagens à beira do caminho e ficou mais animado, mas no final do percurso, tendo-se vazado mais uma vez metade da água, o pote senƟu-se mal, de novo, e voltou a pedir desculpa ao homem pela sua falha. Então, o homem disse ao pote: – Reparaste que, ao longo do caminho, só havia flores do teu lado? Reparaste também que, quando vínhamos do poço, todos os dias, tu ias regando essas flores? Ao longo de dois anos, eu pude colher flores para ornamentar a mesa do meu senhor. Se tu não fosses assim como és, ele não poderia ter essa beleza para dar graça à sua casa. 10

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O POTE RACHADO Ser perfeito e cumprir funções segundo as expectaƟvas, faz parte da vida dos objetos… como dos humanos… Não encaixar dentro de um padrão… apresentar uma diferença, aparentemente desvalorizante, pode levar-nos a descartar algo ou alguém com um potencial inesperado. A riqueza está na diversidade de possibilidades e na surpresa constante que se reserva aos que mantêm um olhar limpo e atento. Helena MarƟnho

A minha reflexão

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II. PORQUE É QUE AS PESSOAS GRITAM?

Se soubéssemos quantas e quantas vezes as nossas palavras são mal interpretadas, haveria muito mais silêncio neste mundo. (Oscar Wilde)

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Porque é que as pessoas gritam? Um dia, Mahatma Gandhi fez a seguinte pergunta a quem o acompanhava: – Porque é que as pessoas gritam quando se chateiam? – Gritam porque perdem a calma. – disse uma das pessoas. – Mas por que é que gritam quando a pessoa está mesmo ao lado? – perguntou novamente Gandhi. – Bem, as pessoas gritam porque querem que os outros a ouçam. – respondeu outra pessoa. – Então e não faz mais senƟdo falar em voz baixa? – perguntou Gandhi. Várias outras respostas surgiram, mas nenhuma convenceu Gandhi. Então ele decidiu explicar: – Quando duas ou mais pessoas se chateiam, os seus corações afastam-se muito e para cobrir essa distância é necessário gritarem para se escutarem mutuamente. Parou por uns instantes, mas todos conƟnuavam atentos à espera das próximas palavras: – Quanto mais chateadas esƟverem as pessoas, mais alto têm de gritar para se ouvirem umas às outras. Por outro lado, o que é que acontece quando duas pessoas estão apaixonadas? – Não gritam. Falam suavemente. – respondeu uma das pessoas. – Certo. E isso acontece porque os seus corações estão próximos. A distância entre eles é pequena. De tão próximos que estão, por vezes nem é necessário falar, basta sussurrar. – disse Gandhi. Todos conƟnuavam atentos e Gandhi prosseguiu com a sua explicação: – Quando o amor é muito intenso, nem é necessário sussurrar, apenas basta um olhar para transmiƟr palavras e pensamentos. É sinal que os corações se entendem mutuamente e isso acontece quando existe amor. Por fim, Gandhi concluiu: – Quando vocês discuƟrem, não deixem que os vossos corações se afastem. Não digam palavras que os distanciem mais, pois pode chegar o dia em que a distância será tanta que os corações não mais encontrarão o caminho de volta.

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PORQUE É QUE AS PESSOAS GRITAM? Gandhi sempre se fez ouvir pelo tom pausado e educado com que transmiƟa as suas ideias. Ainda hoje nos ensina, ainda hoje é escutado! Nunca nos devemos tentar impor pelo grito. Para além de poluirmos o ambiente, é sinal de fraqueza e insegurança. A força das palavras está no seu conteúdo, e nunca nos decibéis uƟlizados. Nós próprios, quando estamos em conflito, gritamos internamente. Ficamos irracionais e detestamo-nos. A força da razão nunca esteve no grito, mas na mensagem que se quer transmiƟr. A emoção presente deve estar centrada no olhar e no carinho que damos às palavras! Tal como Gandhi, só seremos ouvidos se interiorizarmos a ideia que devemos falar com amor! Fernando Machado

A minha reflexão

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III. AS DUAS VIZINHAS

A maldade bebe a maior parte do veneno que produz. (Séneca)

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As duas vizinhas Havia duas vizinhas que viviam em pé de guerra. Não podiam encontrar-se na rua que era briga na certa. Depois de algum tempo, a D. Maria descobriu o verdadeiro valor da amizade e resolveu que iria fazer as pazes com a D. CloƟlde. Ao encontrarem-se na rua, muito humildemente, disse a D. Maria: – Minha querida CloƟlde, já estamos nesta desavença há anos e sem nenhum moƟvo aparente. Estou a propor-te que façamos as pazes e vivamos como duas boas e velhas amigas. A dona CloƟlde, no momento, estranhou a aƟtude da velha rival e disse que iria para casa pensar no assunto. Pelo caminho foi pensando... – Esta D. Maria não me engana, está a querer preparar-me alguma coisa e eu não vou deixar que isso aconteça. Vou mandar-lhe um presente para ver a sua reação. Ao chegar a casa preparou uma bela cesta de presentes, cobrindo-a com um lindo papel de embrulho, mas encheu-a com esterco de vaca. – Eu adoraria ver a cara da D. Maria ao receber este “maravilhoso” presente. Vamos ver se ela vai gostar disto! Mandou a empregada levar o presente à casa da rival, com um bilhete: “Aceito a tua proposta de paz e para selarmos o nosso compromisso, envio-te este lindo presente”. A dona Maria estranhou o presente, mas não se exaltou e pensou: “– O que é que ela está a propor com isto? Não estávamos a fazer as pazes? Bem, não me vou deixar ir abaixo por causa disto”. Algum tempo depois, a D. CloƟlde recebeu na sua casa uma linda cesta de presentes, coberta com um belo papel. – É a vingança daquela asquerosa da Maria. O que será que ela me aprontou?!” Qual não foi a sua surpresa, ao abrir a cesta e ver um lindo arranjo das mais belas flores que podiam exisƟr num jardim, e um cartão com a seguinte mensagem: “Ofereço-te estas flores em prova da nossa amizade. Foram culƟvadas com o esterco que me enviaste e que proporcionou um excelente adubo para o meu jardim. AFINAL, CADA UMA DE NÓS DÁ AQUILO QUE TEM EM ABUNDÂNCIA NA SUA VIDA!...” 18

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AS DUAS VIZINHAS Da leitura deste texto, poderia reƟrar a moral que a “Paz depois de velhos” pode ser mais diİcil. É muito mais fácil perdoar, condescender, relaƟvizar, quando a Paz foi obƟda mais precocemente. Se se deixam passar anos, ficará diİcil acreditar na vontade genuína de Paz. Será, provavelmente, demasiado tempo a parƟlhar, mostrar (e receber de volta) o nosso lado mais agressivo e negaƟvo. Terá acordado tarde a D. Maria para os seus desejos de Paz. A outra não acreditou nela. E, neste caso, tornou-se numa profecia auto cumprida: perante o envio menos (ou muito) cheiroso, recebeu de volta a resposta sarcásƟca, irónica, quase violenta, da vizinha Maria (talvez até a caraterísƟca dominante das quezílias entre ambas). Mais umas achas para a fogueira. Nao deixes para amanhã, a Paz que podes fazer hoje. Carlos Marques A minha reflexão

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IV. OS BISCOITOS

A lei de ouro do comportamento é a tolerância mútua, já que nunca pensaremos todos da mesma maneira, já que nunca veremos senão uma parte da verdade e sob ângulos diversos. (Mohandas Gandhi)

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Os biscoitos Certo dia, uma moça estava à espera do seu voo na sala de embarque do aeroporto. Como deveria esperar muitas horas, resolveu comprar um livro para ajudar a passar o tempo. Também comprou um pacote de biscoitos. Então, ela sentou-se numa poltrona na parte reservada do aeroporto para que pudesse descansar e ler em paz. Ao seu lado, sentou-se um homem. Quando ela Ɵrou o primeiro biscoito, o homem também Ɵrou um. Apesar de indignada, não disse nada, mas pensou para si: “Que atrevido! Se eu fosse capaz, dava-lhe um estalo na cara, para que ele nunca mais se esquecesse...” Cada biscoito que ela Ɵrava, o homem também Ɵrava um. Aquilo deixou-a tão indignada, que não conseguiu reagir. Restava apenas um biscoito e ela pensou: “O que será que o atrevido e abusador vai fazer agora?” Então, o homem dividiu o biscoito ao meio, deixando a outra metade para ela. Aquilo deixou-a tão irritada e aborrecida, que arrumou o livro e as suas coisas e dirigiu-se para a porta de embarque. Quando se sentou confortavelmente no avião, para sua surpresa, o seu pacote de biscoitos estava ainda intacto, dentro da sua bolsa. Ela senƟu muita vergonha, pois quem estava errada era ela, e já não havia mais tempo para pedir desculpas. O homem dividiu os seus biscoitos sem se senƟr indignado, ao passo que isto a deixara muito transtornada. Nas nossas vidas, por vezes, somos nós que estamos a comer os biscoitos dos outros e não temos a consciência de que quem está errado, somos nós.

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OS BISCOITOS E se o erro fosse o impulso necessário para o progresso humano? E se o erro e a consciência da sua superação fizessem parte do mesmo ser? Seria o encontro com a humildade do conhecimento. Reconheceríamos a ignorância, daríamos saltos significaƟvos para a descoberta da verdade, encontraríamos a face moribunda dos absolutos. A verdade que se vai revelando na crise, na rotura do eu, na compreensão do outro como um fim em si mesmo e não como um meio – seres descentrados. Na ausência do centro e na presença da pessoa nascerá a parƟlha. Eduardo Marques

A minha reflexão

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V. A CARROÇA VAZIA

Cala-te ou então diz coisas que valham mais que o silêncio. (Pitágoras)

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A carroça vazia Certa manhã, o meu pai convidou-me a dar um passeio no bosque e eu aceitei com prazer. Ele parou numa clareira e, depois de um pequeno silêncio, perguntou-me: – Além do cantar dos pássaros, estás a ouvir mais alguma coisa? Apurei os ouvidos e alguns segundos depois respondi: – Estou, estou a ouvir o barulho de uma carroça! – Isso mesmo, disse o meu pai. É uma carroça vazia ... Perguntei ao meu pai: – Como podes saber que a carroça está vazia, se ainda não a vimos? – Ora, respondeu o meu pai. É muito fácil saber que uma carroça está vazia, por causa do barulho. Quanto mais vazia vai a carroça, maior é o barulho que faz. Tornei-me adulto, e até hoje, quando vejo uma pessoa a falar demais, inoportuna, interrompendo a conversa de todo a gente, tenho a impressão de ouvir a voz do meu pai dizendo: Quanto mais vazia a carroça, mais barulho ela faz...

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A CARROÇA VAZIA A minha vida é feita de caminhos com crianças. E sobre algumas já tenho comentado: ”Fala pouco… é dada ao silêncio… mas cada palavra sua é preciosa.” Neste conto transparece essa ideia de que a discrição, pouco ruído, contenção… andam aliados a maior valor, sabedoria e profundidade de pensamento. O vazio tende a mascarar-se de forma exuberante e excessiva. Vale a pena estar atento aos que nos presenteiam com poucas e sábias palavras. Helena MarƟnho

A minha reflexão

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VI. INOCENTE OU CULPADO?

A sabedoria é a única riqueza que os tiranos não podem expropriar. (Khalil Gibran)

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