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AMIZADES E
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COMPROMISSOS
e Compromissos Barros Costa edição: Edições Vírgula ® (Chancela Sítio do Livro) autor: Rogério
capa:
Ângela Espinha Paulo Resende
paginação:
1.ª edição Lisboa, maio 2020 isbn:
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título: Amizade
978‑989-8986-20-7 468892/20
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depósito legal:
© Rogério Barros Costa
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www.sitiodolivro.pt publicar@sitiodolivro.pt (+351) 211 932 500
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COMPROMISSOS
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Aos meus amigos de toda a vida
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AGRADECIMENTOS
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A Justine Weissbach, a Rosalina R. Nunes, a Vanda Grisel e a João Silveira, para além dos demais amigos com quem estas questões foram e são regularmente debatidas, numa consciência universal de um realismo que nos avassala todos os dias, pela comunicação social, apesar da voluntária ignorância expressa pelos poderes constituídos, a quem movem outros interesses, ignorando as gerações que no futuro terão que sofrer as agruras dos actos praticados ou não praticados no presente. Devo agradecer também aos meus inimigos. Diz-se que eles definem o nosso carácter e devemos desconfiar de quem os não tem. Pois bem: eles fazem parte da nossa vida e são o sal que nos tempera a vontade de cumprir bem a nossa missão terrena até que se abra a última gaveta do armário da vida, como eu o denominei. Devo também agradecer a todos aqueles com quem troquei eventualmente en passant ideias sobre os temas aqui explanados e que, por serem razoavelmente controversos, deram origem a discussões interessantes onde um autor 9
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acaba sempre por beber um pouco para confirmar ou corrigir as suas próprias opiniões, muitas vezes alterando o desenvolvimento que inicialmente teria pensado dar ao seu trabalho. O excelente e recente trabalho do Prof. Frederico Lourenço impeliu-me para a inclusão de alguns textos dos Livros Sapienciais da Santa Bíblia, que considerei adequados em certos momentos do livro, provando-se que o pensamento foi, é e será sempre uma componente por vezes muito desprezada pelo ser humano moderno, mas que está na base do que de melhor o Homem pode contribuir para a Humanidade. Por outro lado, comprova que a marcha do interior do Homem ao longo dos milénios não terá sido tão profundamente diferente da actualidade, mesmo se no exterior nos possamos enganar pelos trajares e outros detalhes circunstanciais.
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NOTA INTRODUTÓRIA
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O maior mistério da vida é a morte. A maior certeza da vida é a sua perenidade. Se os mais novos não lhe dão grande relevância, os demais, à medida que a idade avança, vão reagindo das mais diversas maneiras à realidade desse futuro acontecimento que a todos toca. Para a grande maioria, a morte é o maior tabu condicionante da vida, sem entenderem que sem morte não existe vida, convivendo desconfortavelmente com uma realidade que a todos toca, mais dia, menos dia. Mas porque ter medo da morte e não ter medo da vida? Todas as crenças religiosas, mais ou menos primitivas, contiveram desde sempre um pacote filosófico sobre a morte, colocando-a acima da vida, adorando-a mesmo, respeitando-a sempre, prometendo remunerar os seres humanos em função do que fizeram em vida, variando a forma de remuneração e demonstrando, através de anjos ou demónios, como somos lembrados ou esquecidos do convívio com outros seres, conhecidos ou não, amigos ou 11
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não, familiares ou não. Seremos, porém, sempre imortais enquanto se lembrarem de nós, para o bem e para o mal. A grande maioria sai da vida para a morte com grande temor e desespero. Outros, menos tementes do desconhecido, sobem simplesmente para a barca de Caronte com o sentido do dever cumprido e assumem temerosamente que, a cada um, o caminho de vida que desejarem os levará à morte que merecerem. Cada um tem a sua morte numa gaveta privada do grande armário da vida, que não se abre a ninguém para além do próprio. Os filhos, a existirem, podem ser eles mesmos, eventualmente, uma continuidade de vida, nunca uma continuidade de morte. Porém, somos todos filhos de todos, irmãos de todos, pais de todos, uma comunidade que define as regras da sua vida e da sua morte colectiva ao abrigo das suas necessidades e do seu bem-estar. Dispensando as metáforas, é evidente de forma bastante lúcida que a morte não existe. Existe sim a não vida, o vazio aparente que se segue à vida, a ausência, a imortalidade da memória (na medida de terceiros), mas a morte é incorpórea, um mero substantivo sem formulação real, que assusta, porque no-la ensinaram a temer, porque Dante9 e Bosch10 a “pintaram” num quadro negro apropriado à época, gerando para todo o sempre um terror que nos assola a vida de uma 12
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forma grotesca e totalmente desnecessária, enriquecendo os vendedores de desgraças.
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O crescimento continuado da esperança média de vida, com a ajuda dos avanços da medicina, adia o momento também médio da morte, embora viver mais tempo não represente de per si qualquer vantagem especial para a comunidade humana no seu global, para além do adiamento do inevitável. A esperança média de vida útil continua a ser sensivelmente a mesma desde os anos 60 do século XX, significando que o prolongamento da nossa passagem pela Terra tem apenas sido um óptimo e crescente negócio para determinadas actividades ligadas à área da saúde. Pelo adicional de vida e pelo adiamento da morte somos induzidos e iludidos em erro, fazendo-nos crer que 1. existe uma batalha da vida contra a morte e 2. que o ser humano está a vencer essa batalha, ao prolongar o período da nossa vida. Ou seja, vivemos em ilusão. Vivemos sonhos de imortalidade, casando os nossos defeitos com máquinas que fabricamos e nos transformam em verdadeiros ciborgues. Mas em prol de quê? Basta, para já, que cada um procure e encontre o seu próprio equilíbrio na Terra e aceite 13
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e apoie “os homens de boa vontade” e todos aqueles que, pelos motivos mais diversos, carecerem do apoio dos seus vizinhos, independentemente de sexo, raça ou credo, como a ONU definiu1. No mais, será difícil adivinhar boas notícias no século XXI com o crescimento de mais de 80 milhões de novos seres por ano (o equivalente a uma população da Alemanha por ano) procurando desesperadamente por todo o mundo onde se localizarem, fugindo das cada vez piores condições de vida que o planeta lhes oferece porque nós próprios o ajudamos a degradar-se, carregando com eles a sombra do seu futuro e os limites da sua vida.
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LIVRO DE SABEDORIA 2:1 – 20
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Pois disseram entre si, pensando incorretamente: «Breve e triste é a nossa vida; Não há cura na morte de um ser humano; E não se conheceu quem regressasse do Hades. Porque nascemos por acaso; E doravante seremos como se nunca tivéssemos existido. Porque fumo é o sopro nas nossas narinas; E a razão é uma faísca no bater do nosso coração; Quando se extinguir, o corpo tornar-se-á cinza; E o espírito se dissolverá como ar ténue. E o nosso nome será esquecido como com tempo; E ninguém se lembrará das nossas obras. E a nossa vida passará como rastros de nuvem E como névoa se dispersará, Perseguida pelos raios do Sol E pesada por causa do seu calor. Pois o passar de uma sombra é o nosso tempo de vida; E não existe adiamento do nosso fim, Porque foi selado e ninguém o reverte.
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HENRIQUE
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Recebi a notícia sem mexer um simples músculo da cara ou do resto do corpo. Aparentemente. Assim estava sentado, assim fiquei. Assim estava a olhar para o médico, assim fiquei olhando sem ver o infinito através das linhas de luz que nos iluminavam, coadas pelas ripas da persiana metálica da janela que dava para o pequeno jardim exterior, varrendo móveis e subindo pelas paredes, criando uma atmosfera de penumbra mais fresca que o calor exterior. Creio que o médico cardiologista estava mais nervoso do que eu, ou parecia estar, talvez porque deve ter ficado sem saber se eu teria entrado em estado de choque, numa catalepsia qualquer, porque notícias daquelas devia ele já estar farto de dar, certamente. Embora mais novo do que eu, estava longe de ser um garoto e estaria certamente preparado para todas e quaisquer reacções que eu pudesse vir a demonstrar, mesmo porque já me conhecia e seguia há um par de décadas. É um facto que sabíamos que a minha “máquina” tinha alguns defeitos no bombeamento, mas até chegar aqui… 19
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pensei que iria levar mais um tempinho. O homem é assim mesmo, sabendo das inevitabilidades, quer, no entanto, sempre mais um bocadinho de tempo. Embora por casualidade, chegáramos a viajar juntos e a beber umas cervejas de litro em Dusseldorf, a acompanhar umas enormes weisswurst. Nessa viagem ganhamos alguma amizade e um à vontade pessoal que me vieram a ser úteis mais tarde, quando comecei a sentir alguns sinais físicos diferentes do normal e me submeti aos seus cuidados. A minha actividade entre diversos países não me permitia ter uma marcação rígida de consultas onde quer que fosse, pelo que poder fazer essas marcações em cima da hora com médicos conhecidos era-me extremamente conveniente. Agora, só falei para perguntar: quanto tempo? E ele falou para responder, engasgando-se um pouco: não sou bom em lotaria, mas aguardemos mais um mês e mais uns exames antes de entrar em conversas dessas. Dependerá dos cuidados que tiver consigo. Nesta altura já eu me estava a levantar e a juntar os papéis e imagens todos que me competia levar, a esboçar um sorriso do lado direito da boca e a dizer-lhe: depois dou-lhe uma ligada, doutor, se não se importar. – Claro, claro, Dr. Henrique, quando o desejar, disse-me, enquanto empurrava a cadeira e se levantava meio confuso 20
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para me acompanhar até à porta do consultório. Peço-lhe que aguarde a chamada da minha assistente que lhe vai marcar o nosso próximo encontro, se não se importar, mas não hesite em ligar-me sempre que considere necessário. Ao chegar à porta senti que me queria dizer algo mais, mas que lhe faltara coragem, talvez. Os médicos fogem de assistir os amigos e têm alguma razão para o fazerem. Com um breve aceno de cabeça, seguiu-me até à porta do gabinete e voltou rapidamente para dentro da sala. Antes de franquear a porta da rua, sem ele ver, não resisti e forcei-me a sentar-me numa das cadeiras da sala de espera. A recepcionista, minha velha conhecida, olhou-me, sabendo que tinha saído da consulta e inquiriu-me com um olhar interrogativo se precisava de alguma coisa. Sorri de volta e disse-lhe que não, antes de desmaiar.
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