SolangeDasCerejas

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“SolangeDasCerejas, o mundo é redondo como o teu ventre fértil Vou voar em sonho de madrugada de Lisboa para Belo Horizonte És de Minas, serei de Minas sangue de aço do poeta Drummond Serei mineiro no teu corpo no dia em que nos faltam as forças Em que mudam os anos de vigor do minério e da sua poeira seca Eu sonho em castelo, bela princesa do memorial divino, vou Tocar todo o teu peito com pedrinhas doces e sensíveis”

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ISBN 978-989-8821-51-5

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SolangeDasCerejas – 53 Poemas de Amor

José Gil

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Edição: edições Vírgula® (Chancela do Sítio do Livro) TÍTULO:

SolangeDasCerejas – 53 Poemas de Amor AUTOR: CAPA: PAGINAÇÃO:

NOTA DE ABERTURA:

José Gil

Sandra Rocha

Ana Bela Aguizo

REVISÃO:

Jorge Vicente

PREFÁCIO:

Jorge Vicente

Prof. Dr. Luís Carlos Santos 1.ª edição, julho 2017 ISBN:

978-989-8821-51-5

DEPÓSITO LEGAL:

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PUBLICAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO:

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à Solange. Por tudo o que foi possível. Mesmo por tudo o que parecia impossível. Um namoro de dez anos, companheira de muita estrada e muita viagem pelo Brasil e por Portugal e por outros países como o Chile que amámos, musa real da minha vida, amante da poesia! Solange que nos abraça com o bálsamo na mão e uma folha seca de tília nas costas e no chá” [Lisboa, 12 de Junho 2017]

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“A minha obra é o meu corpo O meu corpo é a minha obra”. (versos populares entre bailarinos e actores)

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Nota de Abertura Sobre a poesia como indutor da Pedagogia, da Educação e da Sala de Aula Pedagogos entre Poemas Não há longe nem distância para quem se quer bem em Minas Gerais, as nossas amigas e o Amor. Das palavras mágicas e das pinturas abertas, dos postais: lembrança de uma paixão, sonhos , dança a troca de línguajares e da assumida lusofonia, do luso tropicalismo: Itabira, Uberaba, Belo Horizonte. Amadora e Setúbal em Alhos Vedros, um politécnico feito em caminho-de-ferro feito, uma varanda, um parapeito em que me deito sob o manto do diáfano luar luminoso das estrelas dos nossos poemas, do vento que me leva a mim, e das águas deste oceano que me trazem as tuas flores no meio do meigo balanço das águas de março. Entornei-me no Chile, meu amor! Desfiz-me em mel e dei-me em colheres de cerejas às tuas trincas, aos lábios de morangos, do vermelho e do azul dos teus encantos roxos que eu afago, aqueço, e me lembro da respiração da emancipação popular do trabalho e dos tiros em são salva-dor. Mas ainda não é aquela a manhã, meu amor, que te eleva e te enleia e me enrola na teia dos teus bordados de letras, das antropologias de luz da Parede, do calçadão, de Estoril e Cascais. A Ti te descrevo e te descarrego aqui, na nossa imagem e te trago em homenagem nos intervalos das letras, ponto a ponto-cruz, entre mantras. 7

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Palavras tantas, tontas e tântricas, consciência subtil que refino e que te dou por inteiro, Brasil, Mil, Estudo Geral, afinal, das caetanias siderais e da Paz que invadiu o meu coração, e me trouxe o mundo da paz, do g(ent)il cultural ministério em que adoças o meu café, de agostinianas curtes em são salva-dor. Me desventro de ti Solange dos ouros egípcios, e do deserto na luz do candeeiro a petróleo, alquimia do espírito que se me abre em infinito brilho, multicolorido, indizível luz branca dos prismas, dos irmãos, é a Hora. As crianças leem os meus poemas de ti, Solange. As minhas almas puras, dançam e cantam em ti. Estudantes, estudam...Os mundos tremem e o futuro transparece radioso em bola de cristal no anúncio do nosso amor que se derrama dos copos, das vestes multiculturais, e universais, até que todo o mundo junto, um corpo, em ti, que é meu e teu. Enfim, nas rugas que ternamente, meigamente, acaricio e adoço, o doce fruto do milagre da semente que um dia fecundou a pedagogia, da escola da vida. Eis os nossos filhos, as nossas crianças, no roliço das nuvens, nas letras do livro feito, da digital ternura, um autor no teatro, no teu retrato. Te amo. Luís Carlos dos Santos

Mestre em Ciências da Educação Doutor em Filosofia da Educação Professor escritor

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PREFÁCIO Escrever poemas do amor: tal o sentido deste texto e de toda a poética de José Gil. Escrever não apenas que se sente um anseio demorado pela presença da Amada, mas que a Amada pode ser uma outra coisa: uma oração pelas vítimas; aquela que está entre duas linhas continentais, acompanhando o passo lento e arrastado entre o paredão de Cascais e a cidade mineira de Itabira; aquela cujo ventre redondo é dimensão eterna do mundo (“o mundo é redondo como o teu ventre fértil”). A poética de José Gil é uma poética do corpo e da gastronomia, ou melhor se poderia dizer, de um corpo sensível e gastronómico, que se renova a si mesmo como objecto de amor e desejo (“salada de pêssego, pêssego e pele de anca, sumo doce ou mel”, “os dias são alegres nas fronteiras de / agosto com flores e frutos de agosto / amêndoas, alfarrobas, no seio fértil / de frutos secos o ar lúcido dos figos”). Um corpo feito de memórias, mas também de inúmeras paisagens: não só Itabira e Cascais, mas também a Damaia, o Algarve, o Alentejo e o Chile (“lembramos Santiago com saudade infinita”). Um corpo de arte e de escrita que se revela na presença da pele, como um ritual do amor (“a minha arte é o teu corpo no meu”). A poética de José Gil é um diálogo constante com a própria ideia de poesia. Não tanto uma arte poética ou uma teoria literária, mas todo um saber gastro-poético que se reflecte nas leituras alongadas do amor e do corpo ( “poemas de areia e mar, os poemas da casa da tarde e da noite como aguarelas e esta noite”). Uma poética onde Agosto é sempre mágico e onde o mar, mais do que um lugar de naufrágios e catástrofes, é um lugar de distância e de esperança (“o mar é esperança, amor, de corpo a corpo no luar da praia curta”). Uma poética que se escreve para e para além desse imenso corpo feminino que se ama: pois como escrever um milhar de poemas sem se transcender nesse escrever do amor? (“amar-me-ei apenas dizendo que já ultrapassou os mil desordenados poemas, um eixo Norte-sul que conheço com os dedos”). Uma poética do teatro e do espectador, da personagem, da experiência sem filtro do palco. Aqui a memória: tantos palcos e tantas viagens. Agora, a mais nova viagem que se reinaugura entre as paredes do mar de Cascais e Itabira: “toda a casa se move pela viagem pura do país frágil”, “nunca esquecerei o público e falarei sempre dos 9

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amigos, dessa formação da leitura da arte”. Uma viagem-sempre-viagem entre a sombra do papel e a generosidade mais pura do coração. Uma viagem que é uma escola de aprendizagem e que é uma leitura do corpo: o corpo amado, o corpo próprio, o corpo do poema e o corpo de quem o lê, na singularidade sempre crescente da pele. E nesta poética amorosa e humanista, Minas não é apenas uma paisagem ou um lugar físico: é também uma possibilidade de humanidade, um lugar onde o poema pode ser solidário como o amor ( “vou entrar pelo mar se Deus oferecer a solução e conhecer devagar e com energia a força de Ana”, “recordando o drama da povoação de Mariana à beira lama”), poema esse que também se emociona com o drama dos refugiados, com a lembrança de uma Europa anterior a Abril (“corri os múltiplos jardins verdes e o corner em Hyde Park onde tudo se discutia e conheci o MPLA, a FRELIMO, o PAIGC, o seu discurso proibido em Portugal colonial, mas bem recebido nesse ano na ONU”) ou com o desemprego (“como te explicar o desemprego a crescer na nossa mátria, Mãe”). E é esse humanismo, é esse saber ser empático com o Outro, partilhando e integrando essa mesma alteridade na relação amorosa entre homem e mulher que constitui uma das características mais marcantes da poesia de José Gil. “Solange” não é só a musa amada, mas também é aquela que testemunha, com o poeta, a alegria e a tristeza do mundo. Uma poética humanista, amorosa e erótica, de um erotismo colado à pele e à gastronomia dos sentidos: “voo sobre o teu corpo e sou leve como um pelicano no mais famoso destino de há um ano, natal de pêssego de pele”. Uma poética da noite, da noite que, lentamente, vai desanuviando os seus véus e vai deixando nascer os primeiros raios de sol (“Lisboa só começa dentro de cinco horas em ponto”, “regresso de Cascais ao Estoril e passo por tanta gente de madrugada”), ou uma poética da não desistência / da resistência ao desânimo ( “anda sempre, nunca pares / anda, anda devagar se necessário, mas anda”). Uma não desistência que é também (ou, talvez, ainda mais) um maravilhoso apelo à Vida, na sua mais delicada e na sua mais radical manifestação. Jorge Vicente Poeta

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1. Solangedascerejas, o mundo é redondo como o teu ventre fértil Vou voar em sonho de madrugada de Lisboa para Belo Horizonte És de Minas, serei de Minas sangue de aço do poeta Drummond Serei mineiro no teu corpo no dia em que nos faltam as forças Em que mudam os anos de vigor do minério e da sua poeira seca Eu sonho em castelo, bela princesa do memorial divino, vou Tocar todo o teu peito com pedrinhas doces e sensíveis Só Deus sabe o que temos lutado para não haver longe nem distância Leite de moça com bagas de cereja e sultanas do fim de 2015, pela União.

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2. Chile

“Anunciación de los Reyes, bien lunada y mal vestida (…) En su chaleco bordado grillos ocultos palpitan. Las estrellas de la noche se volvieron campanillas .” (Federico Garcia Lorca)

Mato grosso para o poema crescer, torre e cálice de floresta. Para celebrar a mudança selvagem, de ano para ano doce vinho, vinhedo que celebramos há muito em Vale Paraíso num Inverno, natal passado que demorou meses a preparar, o Vento húmido. Mato grosso nos lábios do poeta na nossa casa, a Europa no verão Quando se reúnem os povos, os refugiados à escala global Bonitos como os chineses para um caldo de sopa no forno Abóbora e pera-rocha em jejum, depois de uma festa madrugadora que nunca se esquece, lê todo o teu corpo E bebe um tinto do Chile e esquece as saudades, nos meus dedos Vagabundos de mel, lembramos Santiago com saudade infinita Há quantos anos? Quantos dias passaram sem as cerejas das tuas Carícias, Deus é grande.

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3. eu subirei os degraus do oceano onde crescem os teus cogumelos rosa e violeta, a cereja cor de vinho opera, tingirá as nossas mãos devagar, tudo vermelho e negro entre as ondas e o teu corpo e os barcos lilás como a piedade e a cruz rubra do teu olhar, perde-se tudo onde se navega à vista – ficará o meu amor a boiar nas minhas ancas bem seguras e as algas roxas aprenderão a amar e alguns violetas se fecharão em tristeza com esse dia a dia de viver tristes dos encarnados. alguns estarão assobiando em suas portas ao passar na avenida do mar, eu cantarei a tua janela de persianas rosa na casa rubra que caracteriza o teu quarto. vê, amor, o sol que nasce no teu coral no urdir deste tempo, respira, ouve as flores da paz, os gigantes da serra no fundo do oceano como um bosque, eu amo-te dolorosamente na linha da distância só sei que Dezembro nasce no fundo das ondas onde se desenha o sexo com pequenos búzios redondos de casta amora e brilhantes com mentol e chocolate rosa quente.

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