O Aprendiz de Poeta, Sinais e outros Prodígios

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CONTOS

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FICHA TÉCNICA O Aprendiz de Poeta. Sinais e outros Prodígios. Contos Victor Marques dos Santos EDIÇÃO: edições Vírgula® (Chancela do Sítio do Livro) AUTOR:

CAPA:

Alda Teixeira Carolina Quirino

Lisboa, março 2020 ISBN:

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PAGINAÇÃO:

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TÍTULO:

978-989-8986-16-0 466422/20

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DEPÓSITO LEGAL:

© VICTOR MARQUES DOS SANTOS

Todos os direitos de propriedade reservados, em conformidade com a legislação vigente. A reprodução, a digitalização ou a divulgação, por qualquer meio, não autorizadas, de partes do conteúdo desta obra ou do seu todo constituem delito penal e estão sujeitas às sanções previstas na Lei.

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PUBLICAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO:

www.sitiodolivro.pt publicar@sitiodolivro.pt (+351) 211 932 500

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ÍNDICE

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Fim de Semana . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Jantar de Curso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Apenas um Jogo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Sinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Um Domingo Diferente . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O Sabor da Canela . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . “Happy Hour” . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Entrevista . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Carta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . James . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Um Homem de Poucas Palavras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Observação Participante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Vernissage. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O Comboio de Calais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . “Thanksgiving”. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O Feriado . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O Aprendiz de Poeta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Água Tónica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Farda. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Gabriela . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Na Minha Rua. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Um Verão Inesquecível . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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Epílogo – Rir, Sorrir, Imaginar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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Prefácio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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PREFÁCIO

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Nos momentos em que a vontade de escrever prevalece sobre a sensação de futilidade, se não mesmo de inutilidade do exercício, e quando procuramos uma razão para que, apesar de tudo, a escrita aconteça, encontramos sempre justificações pertinentes e explicações objectivas que nos permitem entender, enquadrar e contextualizar a origem dessa vontade. Talvez não seja muito importante tentar perceber se o acto de escrever constitui um fenómeno aleatório no contexto da vivência de um quotidiano desinteressante, se é um epifenómeno acidental e transitório, decorrente dos efeitos de uma conjuntura evolutiva, ou ainda, se é determinado pela força das circunstâncias ou pelas exigências inerentes à importância atribuída ao conteúdo que se pretende transmitir. No prefácio do meu segundo livro de contos abordei questões relacionadas com as razões, os propósitos, a pertinência dos objectivos e a complexidade causal cujos efeitos adquirem expressão na génese dessa vontade de escrever, bem como na identificação dos momentos em que a escrita acontece, como derivada e resultante dessa mesma vontade. O “contexto propício” e a “disponibilidade intelectual”, que então considerei como elementos interactivos cujas sinergias favorecem a passagem da vontade ao acto de escrever, transformam a escrita numa forma de expressão e, ao mesmo tempo, num meio de comunicação que lhe confere uma função instrumental. 7

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As razões consideradas como pertinentes dependem da circunstância. Porém, a consequência é sempre a mesma: escrevemos. Com objectivos muito diversificados, com resultados muito variáveis, elaboramos textos reveladores das perspectivas que a realidade nos sugere. A influência do ambiente sobre a decisão de escrever evidencia, assim, não apenas a vontade prevalecente de comunicar, mas também a importância que reconhecemos ao conteúdo da mensagem veiculada e ao consequente grau de urgência da respectiva transmissão. Talvez a recorrência frequente da vontade de escrever derive de uma percepção inconsciente, subtil, latente e tácita através da qual elegemos a escrita como o elemento interactivo por excelência, o instrumento que, na prática, preenche essa necessidade intrínseca ao fenómeno relacional, que é a comunicação. A consequência da palavra escrita transcende a capacidade da palavra dita, que corre sempre o risco de se perder, de ser “levada pelo vento”, terminando no momento em que é pronunciada. Ao contrário da oralidade da expressão verbal, a palavra escrita permanece e é revisitável. Pode ser ignorada, desprezada, mas não pode ser esquecida. Fica gravada, registada e pode ser reproduzida. Mas, mais do que tudo isso, na sua essência, o valor da palavra escrita reside, é determinado e, sobretudo, parece impor-se pela simples decisão de o autor a ter perspectivado como meio de comunicação, e lhe ter confiado a missão de perpetuar o significado e a importância que atribui ao conteúdo da mensagem originando, em consequência, fórmulas que lhe permitem transcender a finitude humana da sua existência. O “contexto propício” e a “disponibilidade intelectual” actuam aqui como elementos indutores, como factores de influência na formação de uma atitude tendencialmente proactiva, tornando-se a escrita, uma forma de intervenção. 8

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Prefácio

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No início dos anos 1970, o ambiente de evolução política e social, a força das circunstâncias, a urgência e a importância das mensagens originaram o aparecimento esparso dos primeiros escritos. Desde então, e até ao final da década de 1980, foram elaborados apenas alguns textos de reflexão, cartas, páginas soltas e ocasionais sobre temas diversificados, fragmentos de um diário imaginado mas, de facto, inexistente, alguns ensaios e alguma ficção, a par de manifestações inócuas de uma pseudopoesia. O objectivo do exercício superava, então, o prazer de passar ao papel, de verter em forma de escrita algumas ideias e perspectivas que, na altura, pareciam pertinentes e, se não importantes, pelo menos suficientemente interessantes e dignas de consideração, de reflexão e de debate. De facto, a utilização da escrita como instrumento de comunicação tinha então, como finalidade última, o registo dessas ideias e perspectivas, evitando que fossem esquecidas e se perdessem num tempo sempre limitado e dependente das vontades que se mudam e das capacidades que se alteram. Inequivocamente influenciada pela evolução dos acontecimentos, a interrupção de quase vinte e seis anos na produção de escrita de ficção, desde o Outono de 1988 até à retoma dessa actividade em Janeiro de 2014, talvez signifique que só em anos recentes, terá chegado o momento de partilhar o que, entretanto, se tornou inesquecível ao longo de uma experiência de vida de quase meio século. Volvidas mais de quatro décadas sobre as primeiras produções, folheando de novo esses escritos não publicados, pareceu pertinente seleccionar alguns textos de ficção datados das décadas de 1970 e 1980. Assim, já depois dos setenta anos, chegou o momento de publicar pela primeira vez, textos de ficção, o que aconteceu em Fevereiro de 2018, com a publicação de O Obe9

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lisco de Kubrick. Por entre Encontros e outros Momentos. Contos que, entre duas dezenas de textos, contém um conjunto de cinco contos e um ensaio de reflexão, aos quais chamaria “textos do século passado”, por serem os únicos que datam das décadas referidas, tendo os restantes sido elaborados entre Janeiro de 2014 e Março de 2017. Seguiu-se-lhe, em Março de 2019, O Homem que Não Gostava de Música. Histórias e outros Sonhos. Contos, que reúne também, cerca de vinte textos elaborados ao longo do ano de 2018. O Aprendiz de Poeta. Sinais e outros Prodígios. Contos é, pois, o terceiro desta série de livros de contos, que constitui a manifestação de uma escrita ficcionada cuja expressão só agora encontrou a forma, o momento e o espaço próprios. O livro reúne um conjunto de contos elaborados ao longo do ano de 2019, cuja característica dominante se torna evidente na acentuada diversidade temática. Tal como nos livros anteriores, os textos não são autobiográficos, embora possam conter alguns elementos historicamente comprovados, e referências a uma experiência de vida numa realidade contextual concreta. Apesar da autonomia temática de cada texto, e do facto de não se relacionarem entre si, alguns dos contos acolhem personagens e evidenciam articulações recíprocas derivadas de situações e de referências genéticas comuns, cuja origem remonta a alguns dos textos do livro anteriormente publicado, O Homem que Não Gostava de Música. No presente volume estas articulações recíprocas verificam-se em relação aos textos “Sinais”, “O Sabor da Canela”, “A Entrevista” e “Um Homem de Poucas Palavras”. A diversificação temática característica do conjunto dos contos é atenuada por elementos de coerência identificados na transversalidade espácio-temporal da acção e na permanência dos personagens. O primeiro desses elementos encontra expres10

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são no facto de, em quase todos os contos, a acção decorrer na actualidade e de, em muitos deles, se desenvolver ou se articular com os mesmos locais. Quanto ao segundo elemento, na maior parte dos textos reencontramos vários personagens de outros contos dos livros anteriores. Não se pretendeu, no entanto, estabelecer qualquer tipo de relação, sequência ou continuidade entre os três livros que, aliás, constituem unidades muito diferenciadas em termos de escrita, de diversificação temática e, sobretudo, de narrativa. Finalmente, talvez se torne pertinente justificar a inclusão de um epílogo num livro de contos. Por definição, epílogo é a parte final de um discurso, de uma narrativa ou de uma história contendo um resumo do seu texto principal, a resolução final da intriga, o desfecho do enredo e assinalando as suas mais importantes conclusões. Tratando-se de um conjunto de histórias e de narrativas autónomas, cada uma com a sua conclusão própria, seria lógico que cada uma tivesse o seu epílogo. Tal como os livros anteriormente publicados, O Aprendiz de Poeta termina também por um epílogo cujo título, “Rir, Sorrir, Imaginar”, corresponde a um conteúdo ensaístico-reflexivo, não ficcionado, através do qual se procura estabelecer uma articulação sincrónica e contrastante entre a realidade concreta do hoje, do aqui e do agora, e a heterogeneidade das temáticas ficcionadas que caracteriza a diversidade do conjunto dos textos propostos. Essa articulação assim estabelecida entre a realidade actual e a ficção intemporal, decorre do facto de ser no quadro desta realidade que a elaboração textual se verifica. É dessa mesma realidade que a ficção deriva, é nela que a ficção se inspira e, em última análise, é nela que a ficção vive e se integra. O contraste evidenciado permite considerar que a ficção assim contextualizada se situa nessa realidade, tornando-se parte dela e 11

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adquirindo o estatuto de elemento estruturante da respectiva evolução. A temática ensaístico-reflexiva do epílogo pretende, assim, reencontrar as referências da realidade actual, acentuando as diferenças entre a vivência da realidade concreta, e as vivências ficcionadas dos protagonistas. O resultado deste exercício sugere a exigência incontornável de assumirmos que é na vivência do dia-a-dia dessa realidade concreta, que encontramos a motivação inspiradora da imaginação criativa, e a inerente génese de uma realidade ficcionada que adquire forma, conteúdo, expressão e sentido nos textos agora publicados.

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Bom Sucesso, 14 de Setembro de 2019.

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FIM DE SEMANA

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estrada de terra batida estendia-se desde o portão da propriedade até à pequena rotunda onde começavam os degraus que davam acesso ao alpendre e à casa. A seu tempo, a Primavera encarregava-se de colorir o canteiro que ocupava o centro da rotunda adornando-o com flores. Aí cresciam também, entre alguns arbustos de espécies variadas, três pinheiros nórdicos de elevado porte, que davam o nome à propriedade, a Quinta dos Três Pinheiros. A casa ficava a cerca de cinco quilómetros da aldeia de Corália. Situava-se, isolada, no pequeno promontório que descia em declive suave até à margem do lago. As casas mais próximas ficavam em frente, na outra margem do que era, de facto, a albufeira de uma pequena barragem situada a jusante do ribeiro e dos riachos que convergiam formando o lago. Propriedade dos Westwood desde há várias gerações, a Quinta dos Três Pinheiros era a residência dos pais de Leonor e o local onde, tradicionalmente, a família se reunia pelas ocasiões festivas. Foi durante uma dessas estadias que António e Leonor, passeando ao longo da margem do lago pensaram que 13

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seria agradável passar algum tempo na casa mas noutras circunstâncias, fora daquelas épocas de celebração sempre concorridas e agitadas pela presença de uma família numerosa. Nesse ano, os pais de Leonor tinham embarcado numa viagem de cruzeiro à volta do mundo. À semelhança de muitos outros aposentados que iniciam dessa forma a nova fase da sua vida, o pai, professor universitário recentemente reformado, aproveitava aquelas férias, antes de entrar no circuito dos convites para as conferências internacionais. Durante essa ausência, Leonor e António planearam um fim-de-semana prolongado. Chegaram no final da tarde de uma quinta-feira, com a Primavera a assinalar timidamente, por entre os últimos resquícios de neve, os primeiros sinais de aproximação do bom tempo. Estacionaram o SUV, entraram em casa e Leonor apressou-se a arejar o ambiente abrindo as portas da sala e da biblioteca do piso da entrada, que davam para o exterior. Depois, subiu ao piso dos quartos e abriu as janelas. A casa estava vazia e fechada há algumas semanas e, apesar de o tempo ter melhorado, as noites continuavam húmidas e frias justificando a utilização das lareiras. Arrumaram as compras que tinham feito na mercearia de Corália, foram ao anexo das arrumações buscar o barco a remos que se encontrava sobre o reboque transportador, empurraram-no pelo caminho estreito que conduzia ao lago e cujo piso irregular não ajudava a manobra. Passaram ao lado do passadiço que dava acesso à plataforma flutuante que servia de cais, chegaram à margem, deixaram descair o barco para a água, saltaram para dentro da pequena embarcação e fizeram-se ao largo remando lentamente, saboreando a calma do entardecer. – Não podemos demorar-nos muito, António –, disse Leonor. – Não temos luz aqui no meio do lago e deixámos a casa às escu14

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Fim de Semana

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ras, por isso não temos sequer um ponto de referência… Além disso, não sei se os telemóveis têm rede aqui. – Não te preocupes, Leonor –, respondeu ele.– Damos só umas remadas para descontrair e abrir o apetite para o jantar. No regresso, vamo-nos manter sempre ao longo da margem. Não há hipótese de falharmos o cais. – António interrompeu-se por alguns momentos antes de continuar: – É incrível o efeito apaziguador que esta mudança súbita de ambiente provoca num citadino como eu… Se não tivéssemos vindo, estaria agora a entrar no bar para o drink do costume, com as pessoas do costume e a pensar no futebol e nos compromissos da próxima semana… E também é estranho estarmos aqui os dois sozinhos… Estamos tão habituados à casa cheia de gente, a sermos rodeados pelas correrias, e a ouvirmos os gritinhos das crianças… Não sentes isso, também? – António interrompeu-se de novo, olhou de frente para Leonor e, sem esperar pela resposta dela, segredou num tom confidencial: – Aqui para nós, sempre que estamos aqui, tenho vontade de cá ficar, de não voltar à cidade, nem ao escritório. Apetece-me sempre esquecer tudo e começar uma vida nova, diferente, mais calma, mais…verdadeira… E hoje, que estamos sozinhos, ainda sinto mais isso. – Leonor não lhe respondeu, e António continuou a reflectir em voz alta: – Até o Inverno no campo é diferente… É mais genuíno do que na cidade… – admitiu ele. Nos meses mais frios os campos e a floresta cobriam-se de neve e nas águas paradas do lago, formavam-se pequenos icebergs que flutuavam imóveis, pela ausência de corrente. O silêncio que os rodeava era apenas interrompido pelos escassos sons típicos daquele ambiente. Ouviam-se os peixes a saltar, um ramo ou outro que estalava, a folhagem das árvores agitada pela brisa vespertina. Àquela hora, o sol já se tinha escondido, deixando de iluminar as copas das árvores, calando 15

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assim o chilrear dos pássaros. Como se o entardecer fosse responsável pela extinção gradual dos sons, e o silêncio fosse apenas o prolongamento da tendência sonora daqueles momentos mágicos e únicos, no cenário idílico daquelas águas tranquilas e das margens paradisíacas do lago. À medida que o fim da tarde transformava a paisagem, a natureza anunciava a proximidade da noite embrenhando-se lentamente numa penumbra repousante. Estavam a meio do lago, de onde podiam observar as casas situadas nas margens. Viam-se as lareiras acesas nas salas iluminadas pelas luzes que começavam a acender-se, pouco a pouco, com o cair da tarde, e as pessoas que lhes davam vida movimentando-se no seu interior. Leonor continuava a remar e a olhar para longe, procurando uma réstia de céu ainda iluminado por entre as copas das árvores, após o ocaso ter mergulhado o horizonte numa neblina que, entretanto, se adensava rapidamente sobre a superfície líquida. – Está a ficar demasiado escuro para o meu gosto –, disse ela. – Está bem –, respondeu António. – Voltamos para trás. – Deram meia volta e rumaram directamente ao cais que parecia ter desaparecido da margem, envolto na neblina cinzenta da noite. Apesar de não verem a plataforma, foram-se orientando por uma luz difusa e de intensidade intermitente, que vinha da margem. Envolta pelo nevoeiro, não se percebia a origem daquela claridade meio ocultada pela opacidade translúcida do ar húmido. Continuaram a remar e, à medida que se aproximavam do cais, António perguntou: – Deixámos as luzes acesas? – Acho que nem chegámos a acendê-las –, respondeu Leonor. 16

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– Que luzes são aquelas, meio ofuscadas pela neblina? – insistiu ele. – Onde? – perguntou Leonor, que remava de costas para a proa. – Ali… Na margem… Pela localização, parecem muito perto da casa, se é que não são mesmo as luzes da casa… Mas as outras, azuis intermitentes não são da nossa casa. Parecem as luzes das ambulâncias e dos carros da polícia. – Deixámos as portas abertas… Será que entrou alguém na casa? – Espero bem que não … – disse António, revelando no tom de voz que lhe saiu alguma inquietação que não conseguiu disfarçar. O cais era agora visível através da neblina. Quando já estavam suficientemente próximos, António agarrou no cabo de atracação, enrolou-o em torno do cabeço da amura e passou-o pela argola de fixação da plataforma. O arvoredo cerrado não deixava perceber a localização nem a origem das luzes. Leonor e António correram pelo passadiço e continuaram pelo caminho de terra batida até que chegaram à estrada que conduzia à casa. Perceberam que as luzes eram de facto as luzes da casa, mas que havia outras no exterior. Abrandaram o passo e pararam. Olharam um para outro interrogando-se em silêncio sobre o que iriam fazer. Que atitude deveriam tomar se houvesse alguém dentro de casa? António agarrou na mão de Leonor e segredou: – Leonor, vai para o carro e deixa-me entrar em casa sozinho. – Mas…mas eu fechei o carro e as chaves ficaram em cima da mesa da cozinha… – respondeu ela. – Então o que fazemos? – perguntou ele. – Tens o telemóvel contigo? E se ligássemos para a polícia? – sugeriu Leonor.

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– Boa ideia! Por que não pensei eu nisso mais cedo?! – António procurou o número da polícia de Corália e ligou. Enquanto esperava que o atendessem, foram-se aproximando da casa e viram duas silhuetas masculinas no interior. Entretanto, atenderam-lhe a chamada: – Polícia de Corália… – Boa tarde, senhor agente. O meu nome é António Campos, da Quinta dos Três Pinheiros. Estamos a regressar do lago, e vimos que temos pessoas em casa e que as luzes estão todas acesas… – Boa tarde, senhor António Campos. As pessoas que estão em sua casa devem ser agentes da polícia. Fomos informados pelos proprietários da casa em frente da sua, na outra margem, de que havia movimento na vossa casa, e como sabemos que os Westwood estão fora e que a casa está fechada, enviámos uma patrulha… Tente aproximar-se com cuidado e confirme que é a polícia que está em sua casa. – Muito bem… Mas não desligue até eu confirmar –, respondeu ele. – Fique descansado… – disse o agente. António e Leonor aproximaram-se e, quando estavam já perto da rotunda, as luzes da casa apagaram-se e pouco depois, viram dois polícias fardados a descerem os degraus da entrada e a dirigirem-se para um carro da polícia, que era de onde provinham as luzes azuis. António retomou o contacto com o agente da esquadra, confirmando a presença da polícia e desligou o telemóvel. Foram ao encontro dos agentes, que lhes pediram as identificações. António e Leonor foram buscar os documentos, confirmaram as identidades e um dos agentes aconselhou-os, à laia de despedida: – Não devem sair da propriedade sem deixarem todas as portas da casa fechadas à chave e o anexo das arrumações trancado. Tenham uma boa noite! 18

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– Boa noite, senhores agentes… Muito obrigado! – disseram eles e ficaram a ver o carro a contornar o canteiro da rotunda e a desaparecer na curva da estrada. António e Leonor entraram em casa. Tudo parecia estar em ordem. Decidiram deixar o barco atracado à plataforma, já que o utilizariam de novo na manhã seguinte. António foi tomar um duche enquanto Leonor preparava o jantar. –Tens muita fome, António? – perguntou Leonor. – Nem por isso… – respondeu ele, enquanto se secava. – Podemos tomar um aperitivo lá fora, no alpendre? É que o jantar vai demorar um bocadinho… – sugeriu ela. – Claro que podemos, querida…até me está a apetecer um whisky… – António vestiu-se, desceu para a cozinha e perguntou: – Posso preparar as bebidas, ou ainda vais demorar muito? – Podes preparar tudo, meu querido, O que falta fazer do jantar, a partir de agora é da responsabilidade do forno! – brincou ela, sorrindo-lhe. Estavam sentados nas cadeiras de baloiço do alpendre. A noite estava escura mas, apesar da neblina, conseguiam-se distinguir as luzes das casas na outra margem. – Devem ter sido os daquela casa mais próxima do lago que ligaram para a polícia. Amanhã temos de lá ir agradecer-lhes, não achas? – perguntou António. – Acho que sim –, disse Leonor, e continuou: – São os Cooper, um casal amigo dos meus pais. O contacto deles deve estar na agenda junto do telefone. Podemos ligar-lhes ainda hoje, talvez… – Agora não me apetece ir à procura do contacto, minha querida. Amanhã tratamos disso logo de manhã. Pode ser? – sugeriu ele. – Tudo bem –, concordou Leonor. 19

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A noite começava a esfriar. Resolveram entrar em casa e acender a lareira da sala. O ambiente tornava-se mais aconchegante e, pouco de pois, o jantar estava pronto. António e Leonor estavam dispostos a tirar o maior partido daquele fim-de-semana. Jantaram vagarosamente, à luz de velas e ao som de uma música de fundo que ele seleccionara. Tomaram o café na sala e ficaram juntos, abraçados, sentados no sofá. – Já reparaste como a televisão não nos faz falta? – perguntou António. – É verdade, meu amor, nem nos lembrámos de a ligar… Preferimos a música maravilhosa que tu te encarregas sempre de escolher –, respondeu Leonor. Passados alguns momentos de silêncio, António começou a cabecear, como se estivesse prestes a adormecer, e bocejou. – Sinto-me completamente de rastos, extenuado –, disse ele, e continuou: – Como se todas as forças me tivessem abandonado, como se tivesse batido o recorde do triatlo…! – depois, olhando Leonor nos olhos, pegou-lhe na mão e disse: – Acho que vou descansar… Vens-te deitar também, querida? – Se me for deitar já, tu não vais conseguir descansar, meu amor –, respondeu ela enroscando-se no seu abraço. – Porquê? – perguntou ele. – Porque eu não te vou deixar descansar. – Leonor riu-se e continuou: – Não te vou dar descanso, meu querido… Vou proporcionar-te uma noite just like in the movies. Que tal? The sky is not the limit! Agrada-te a ideia? – Podemos deixar para amanhã de manhã esses teus programas tentadores, que eu já conheço e sei onde vão dar, minha querida? – perguntou ele. – Só com uma condição… – disse ela. – …E que é… – quis ele saber.

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– E que é deixares-me fazer ainda esta noite, o trailer do filme de amanhã…ou talvez o primeiro episódio da série –, respondeu Leonor sorrindo, depois de o beijar inesperadamente. – Aceito a condição… É irrecusável! – disse ele correspondendo ao longo beijo de Leonor. No dia seguinte, dormiram até tarde aproveitando o silêncio do campo e a calma da manhã. António acordou primeiro mas decidiu que não se levantaria tão cedo, apesar de ter a sensação de que estava a perder uma bela manhã para respirar o ar puro e fresco. O certo é que tinham ainda mais três manhãs que, tudo indicava, seriam como aquela, pensou ele. Quando finalmente se levantou, Leonor ainda dormia, e ele desceu à cozinha, fez café e torradas. Depois, achou que já estava na hora de a acordar. Preparou um tabuleiro com o pequeno-almoço e subiu para a surpreender. Leonor continuava a dormir e ele começou por abrir lentamente as cortinas para deixar entrar alguma luz de um sol que não insistia muito em superar as contingências que lhe eram impostas por um céu nublado reflectido nas águas calmas da superfície do lago. Olhou para a outra margem, para a casa dos Cooper, e ficou a observar o movimento de algumas pessoas que iam e vinham entre a casa e o cais privativo onde estava atracado um pequeno barco equipado com um motor fora de borda. Eram dois casais que deveriam andar pelos cinquenta e muitos anos, e uma mulher mais nova, e todos transportavam caixas de cartão da casa para o barco. Com a claridade, Leonor acordou, entretanto. Espreguiçou-se, viu o tabuleiro com o pequeno-almoço a seu lado, em cima da cama, e António virtualmente colado aos vidros da janela. Recostou-se ajeitando as almofadas contra as costas da cama e disse:

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– Bom dia, meu amor! Que bela surpresa, este pequeno-almoço! Mas prefiro começar por um beijo bem doce e…bem longo. Achas que pode ser? – Pode ser, e assim será, minha querida! – respondeu António afastando-se da janela e dirigindo-se à cama, onde se deitou parcialmente, tendo o cuidado de não entornar o café. Beijaram-se, e Leonor perguntou: – Estavas a satisfazer a tua curiosidade de voyeur inveterado, meu amor? – Sim –, respondeu ele. – Estava a ver a movimentação em casa dos Cooper. Parece que estão a carregar um barco com umas caixas de cartão. – Temos de lhes ligar, querido… – lembrou Leonor, e acrescentou: – E vai ser já antes que nos esqueçamos! – e dito isto, levantou-se, desceu, seguida por António e dirigiu-se à pequena mesa da entrada onde estava o telefone. Abriu a agenda, localizou o número dos Cooper e sugeriu: – António, talvez seja melhor seres tu a ligar… – ele concordou e, no minuto seguinte, estava a falar com os vizinhos. – Senhor Cooper? – perguntou ele. – Sim, quem fala? – perguntou a voz de homem que atendeu. – Senhor Cooper, o meu nome é António Campos, sou genro do Sr. Westwood, da Quinta dos Três Pinheiros… A casa em frente à vossa na outra margem do lago. – António interrompeu-se aguardando uma reacção, que não tardou a chegar: – Sim, faça o favor de dizer. Em que posso ser-lhe útil, senhor Campos? – Estou a ligar para lhe agradecer por terem avisado a polícia ontem ao fim da tarde, por estranharem ver movimentação na nossa casa. Penso que foi o senhor, não é verdade? – Ah! Sim, de facto, ontem, quando ia a sair de casa, vi pessoas a movimentarem-se no exterior da vossa casa, a empurrarem 22

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um barco, e tomei essa iniciativa porque sei que os Westwood estão fora, e pareceu-me pertinente avisar a polícia. Eles ligaram-me de volta a confirmarem que não havia problema. Enquanto falava, António aproximou-se da porta de casa, saiu para o alpendre, olhou de novo para a outra margem, viu que o movimento continuava e concluiu que nenhum dos homens que carregavam as caixas poderia ser o senhor Cooper, que estava ao telefone com ele naquele preciso momento, e resolveu perguntar: – Desculpe perguntar-lhe, senhor Cooper, mas está em casa? – Sim, estou, mas por que pergunta? – quis saber o homem. – Bem –, começou António –, é que estou a olhar para a sua casa neste momento, e vejo várias pessoas a movimentarem-se entre a casa e um barco que está atracado ao seu cais. Parece que estão a transportar umas caixas de cartão, e é evidente que nenhuma delas pode ser o senhor, que está ao telefone comigo. – Eu estou na minha casa em Tarsos, neste momento! Saímos da casa do lago ontem ao fim a tarde... Está a dizer-me que está a ver pessoas na minha casa do lago, senhor Campos? – perguntou o homem num tom apreensivo. – Sim, estou… – Vou já ligar para a polícia. Não é suposto estar ninguém na casa! Obrigado pela sua chamada! – disse ele, e desligou rapidamente. António ficou com o telefone na mão, sem saber o que fazer. Leonor ouvira a conversa e ambos se precipitaram para a margem do lago para verem melhor o que se passava. A aragem fresca da manhã fê-los estremecer. Leonor estava ainda vestida com um robe de seda sobre a camisa de dormir, António vestia calções e t-shirt e ambos calçavam chinelos. Quando chegaram ao passadiço olharam para a outra margem e viram que o barco começava a mover-se com as cinco pessoas a bordo e 23

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carregado com as caixas. A pequena embarcação aumentava de velocidade à medida que se afastava do cais dos Cooper, seguindo na direcção do extremo do lago que terminava numa pequena baía, onde havia sempre pequenos botes assentes no relvado da margem. António e Leonor perderam-nos de vista devido à densa vegetação e à curva que o lago formava na direcção em que o barco seguia. Nesse momento, António ouviu o telefone a tocar e atendeu. – Posso falar com o Senhor Campos, por favor? – disse a voz de um homem. – É o próprio –, respondeu António. – Desculpe ligar-lhe de volta. Fiquei com o seu número registado. Fala Steve Cooper. É apenas para o informar de que já liguei para a polícia e que talvez eles apareçam em sua casa e queiram interrogá-lo sobre o que viu. – António não podia esquivar-se e respondeu: – Tudo bem, senhor Cooper. Entretanto, posso informá-lo de que as pessoas que lá estavam acabam de sair com o barco carregado com as tais caixas e foram na direcção do extremo do lago. – Obrigado pela informação. Vou já transmitir isso à policia –, disse o homem, e desligou. Passados breves momentos, quando estavam já a caminho da casa, António e Leonor ouviram ao longe uma sirene que presumiram ser de um carro da polícia e pouco depois, viram as luzes giratórias. O carro parou junto da entrada do alpendre e saíram dois agentes, os mesmos que tinham lá estado com eles na véspera. Cumprimentaram-nos e um dos agentes perguntou: – O senhor Campos importa-se de nos relatar o que viu esta manhã e de nos responder a algumas perguntas sobre a questão? 24

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– Está bem. Podem entrar –, disse António que, por esta altura, percebera que Leonor cruzara os braços sobre o peito aconchegando a gola do robe e tremia de frio junto dele. – Querem tomar um café? – perguntou António. Eles aceitaram. Sentaram-se todos na sala e um dos agentes pediu a António que descrevesse o que tinha visto. De vez em quando interrompiam-no, pedindo-lhe que esclarecesse certos pontos do seu relato. A certa altura, ouviu-se o som roufenho do sistema de alta voz, vindo do carro da polícia. Um dos agentes pegou no walkie-talkie que colocara no sofá ao seu lado, atendeu a chamada e ouviu a informação: – Podem regressar à base. O barco foi interceptado, os suspeitos foram detidos e o material roubado foi recuperado. – Entendido! – respondeu o agente e, percebendo que António tinha ouvido o mesmo que ele, informou-o do fim da missão. Agradeceram ambos a colaboração e o café, e saíram. – Que fim-de-semana tão excitante! – exclamou Leonor. – Chegámos há menos de vinte e quatro horas e já tivemos direito a duas visitas da polícia! – Afinal, parece que a vida no campo é ainda mais agitada do que na cidade! – disse António, recordando a conversa que tinham tido na véspera enquanto remavam. Depois de alguns momentos em que ficou pensativo, comentou: – Não consigo deixar de pensar em toda esta sucessão de eventos com alguma perplexidade. É uma série de estranhas coincidências. Não sei porquê, nem como explicar tudo isto, mas não acredito em coincidências… Nada disto pode ser por acaso. – Pois eu acho que, desta vez, foi mesmo por acaso. As decisões que tomámos, e que não tinham nada a ver com isto, é que desencadearam a situação, que é um efeito colateral, uma 25

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