FOTOLIVRO JORNADA DO PATRIMÔNIO 2019 MEMÓRIA PAULISTANA Prefeitura da Cidade de São Paulo Secretaria Municipal de Cultura Coordenadoria de Programação Cultural Departamento do Patrimônio Histórico ©Secretaria Municipal de Cultura, 2020 Proibida a reprodução total ou parcial sem a prévia autorização dos editores. Direitos reservados e protegidos de acordo com a Lei 9.610⁄1998, que altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais e dá outras providências.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Fotolivro da jornada do patrimônio 2019 : Memória Paulistana / Organização: Higor Henrique Advenssude Teixeira. -- 1. ed. -- São Paulo : Secretaria Municipal de Cultura da Cidade de São Paulo, 2020. -(Fotolivros da Jornada do Patrimônio da Cidade de São Paulo ; 1) ISBN 978-65-89128-04-5 1. Cultura 2. Memória cultural 3. Patrimônio cultural 4. Preservação histórica 5. São Paulo (Cidade) I. Advenssude, Higor. II. Série. 20-49709 Índice para Catálogo Sistemático: 1. Patrimônio cultural : Memória e preservação 363.69
CDD-363.69
A Jornada do Patrimônio foi criada pela Secretaria Municipal de Cultura, por meio do Departamento do Patrimônio Histórico e da Coordenadoria de Programação Cultural, para democratizar o acesso ao patrimônio cultural de São Paulo e estimular a população a reconhecer e valorizar os bens que tratam da memória e identidade dos diferentes grupos sociais presentes na cidade. Entre seus objetivos específicos, está a abertura à visitação pública de imóveis históricos tombados, com programação de visitas mediadas, palestras e oficinas que, por vezes, tratam apenas do imóvel e sua história com relação à história da cidade, podendo usar de recursos do próprio local para conversar sobre preservação e restauro, ou mesmo para ser cenário de atividades que tratem do patrimônio cultural de maneira mais ampla. Outro objetivo é conduzir a população a explorar a cidade por meio de roteiros de memória temáticos, estimular agentes culturais, mestres, pesquisadores, educadores, artistas e instituições culturais a propor e organizar atividades culturais que se relacionem com o projeto, para que o evento seja uma oportunidade de identificação de bens e práticas culturais em todos os territórios da capital paulista. Inspirado nas Journées Européennes du Patrimoine, em São Paulo o projeto foi realizado pela primeira vez em 2015, com um tema introdutório: “Reconheça Seus Bens Culturais”. Desde então, o evento se realiza anualmente no terceiro fim de semana de agosto, próximo ao Dia do Patrimônio Histórico (17/08), e tem procurado abordar temas que enfoquem diversos aspectos do patrimônio cultural paulistano. A edição 2016 foi lançada com o tema “As Origens da Cidade”, e o foco recaiu sobre os processos que configuraram a ocupação da metrópole e que podem ser
observados até hoje na paisagem urbana. Em 2017 o tema foi “Construindo Histórias”, no qual o projeto buscou abordar a inserção do patrimônio no presente por meio das mudanças de uso e significado dos bens culturais. Dessa vez, foram produzidos textos desenvolvendo a proposta em sete subtemas (“Morar”, “Trabalhar”, “Se Divertir”, “Lembrar”, “Estudar”, “Circular”, “Comprar e Vender”). Em 2018 o tema “Uma Cidade, Muitas Mãos” procurou destacar os diversos grupos que construíram o patrimônio cultural da cidade de São Paulo e formaram a identidade paulistana. Em 2019, em sua maior edição, na qual o tema foi “Memória Paulistana”, o projeto celebrou todos os cantos da cidade de São Paulo por meio de histórias, memórias, pessoas e lugares que configuram o patrimônio cultural paulistano, enfocados em iconografias, personagens e paisagens culturais. Teve como objetivo compartilhar e fortalecer iniciativas de valorização do patrimônio cultural paulistano que procuram trabalhar os distintos territórios, evidenciando as particularidades históricas e aspectos contemporâneos das cinco regiões da cidade: centro, norte, sul, leste e oeste.
Memórias do território e o território das memórias “Esse é o grande mistério das cidades: elas crescem e se modificam, guardando porém sua alma profunda apesar das transformações do seu conteúdo demográfico, econômico e da diversificação de suas pedras”.
Milton Santos
A percepção da cidade vai muito além de uma visão prática de como viver nela e deve ser vista pelos valores simbólicos que pode produzir. Somente pela memória, que agrega afetos e desconfortos históricos, pode se constituir um significado amplo de nossa cultura relativa à urbanidade. Assim, a Jornada do Patrimônio vem conquistando os paulistanos por ser um evento que resume esse sentido de aprender com o passado para viver melhor o presente e projetar o futuro da cidade. Realizada nos dias 17 e 18 de agosto de 2019, a quinta edição da Jornada do Patrimônio, cujo tema foi Memória Paulistana, tornou-se a maior de todas. A grande festa, que celebra São Paulo por meio de seu passado e sua gente, ocupou as cinco regiões da cidade com visitas a imóveis, edifícios, ruas e praças. Espaços que contam e fazem a nossa história. A Jornada do Patrimônio 2019 levou mais de 1000 atividades a cerca de 500 espaços, como casas de cultura, centros culturais, teatros, bibliotecas, museus, imóveis tombados, CEUs, unidades do Sesc, museus do estado, Fábricas de Cultura e o Memorial da América Latina. Em todas as regiões da cidade, um Cortejo de Memória, com foco à cultura de cada região. Como na área central, que recebeu o Grande Cortejo da Memória Paulistana, um teatro a céu aberto que teve início no Pátio do Colégio e terminou no Largo do Paiçandu. Os anfitriões eram personagens históricos, com destaque para os ícones modernistas de 22. No resgate desse espírito modernista de como olhar São Paulo, com vanguardismo, conectando todos os seus territórios, do centro à periferia e de periferia ao centro, se revelou uma perspectiva diferente de compreender nossa cidade.
Outros fatos ligados à sua história ganharam destaque com as placas do projeto Memória Paulistana, que permanecem depois da Jornada, contando a história dos lugares. Além disso, tivemos os Roteiros de Memória, que foram recorde na história do evento, com 400 diferentes trajetos, como um convite para que o público pudesse conhecer e reconhecer lugares históricos a pé, de bicicleta e até sobre pernas de pau. O sentido de confraternização da população com a sua cidade se faz de uma ocupação de territórios que dão sentido afirmativo da memória e estabelecem sua relevância cultural. Da compreensão da memória é que irá se construir o necessário campo civilizatório e, principalmente, a relação de auto estima cidadã em relação esses territórios. A Jornada representa que a memória é muito mais que uma imagem etérea, mas que é uma poesia concreta, a memória viva e intensa de como São Paulo sempre será.
Hugo Soveral Possolo
Secretário Municipal de Cultura da Cidade de São Paulo
Houve um fim de semana de agosto de 2019 em que milhares de pessoas saíram às ruas de São Paulo para uma celebração diferente. Naquele fim de semana de agosto, essas pessoas saíram às ruas de São Paulo para celebrar a memória e o patrimônio histórico da cidade. A maior metrópole da América Latina guarda nas suas fachadas, trajetos e interiores, como se sabe, um fenomenal acervo histórico e cultural, mas que muitas vezes passa despercebido por seus habitantes, atarefados e apressados na correria do dia a dia. A Jornada do Patrimônio nasce então em 2015 com o intuito de despertar no paulistano o desejo de conhecer melhor e explorar os pontos históricos e de memória e identidade da sua cidade. Desde o início da gestão do Prefeito Bruno Covas, a Secretaria Municipal de Cultura (SMC) vem atuando, por meio de políticas públicas, em torno de dez eixos estratégicos de fomento a todas as cadeias da expressão cultural. A Jornada do Patrimônio de 2019 teve um papel relevante na execução desses movimentos estratégicos. Ao reunir milhares de pessoas nas ruas, seja para acompanhar o Cortejo, que trouxe atores consagrados representado figuras históricas da cultura da cidade ao longo de um trajeto não menos histórico pelo centro, berço e palco de tantos acontecimentos marcantes; seja para transitar pelos mais de 400 roteiros de memórias espalhados por todas as regiões da cidade, criados em uma parceria entre o Departamento do Patrimônio Histórico e a população; seja visitando os mais de 300 imóveis tombados abertos ao público, encontrando dezenas de placas do projeto Memória Paulistana, frequentando as mais de 200 oficinas
ou assistindo às 50 sessões de cinema, a Jornada do Patrimônio de 2019 afirmou o caráter acessível e o apelo universal da valorização do patrimônio, assim como deu o devido reconhecimento às histórias que fazem a nossa cidade. O trabalho de toda a equipe da SMC, pelo Secretário de Cultura Alexandre Youssef e pela Chefe de Gabinete Carlota Mingolla, na realização desta que foi a maior e mais bem-sucedida Jornada do Patrimônio, foi reconhecido, em 2019, pelo prêmio da APCA (Associação Paulista de Críticos de Artes), na categoria Arquitetura, pela Valorização do Patrimônio Arquitetônico.
Tais Ribeiro Lara
Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Cultura da Cidade de São Paulo
FOTO: Francio de Holanda
centro
Nรบmeros da Jornada 1. Placas Memรณria Paulistana
leste
norte
oeste
sul
10 18 24 86 90 102
6. 7. 8. 9.
Educativo da Jornada Imรณveis Histรณricos Espaรงos Culturais
112 118 152 158
2. 3. 4. 5.
O Grande Cortejo da Memรณria Paulistana Festas da Jornada A Expediรงรฃo Globo Museu de Rua
1. 2. 3. 4.
Cortejo de Memรณria da Leste Imรณveis Histรณricos Espaรงos Culturais
180 194
Roteiros de Memรณria
208
1. 2. 3. 4.
Cortejo de Memรณria da Norte
226 232
Roteiros de Memรณria
248
1. 2. 3. 4.
Cortejo de Memรณria da Oeste Imรณveis Histรณricos Espaรงos Culturais
264 276
Roteiros de Memรณria
294
Roteiros de Memรณria
198
Imรณveis Histรณricos Espaรงos Culturais
240
290
1. Cortejo de Memรณria da Sul 2. Imรณveis Histรณricos
304 324
Jornada dos Teatros Campanha Publicitรกria
358 382
3. Espaรงos Culturais 4. Roteiros de Memรณria SESC na Jornada Passaporte Jornada
334 350 386 390
zona norte
zona leste
zona oeste
centro
zona sul
nĂşmeros
DA JORNADA MAPA: Carolina Wieck
1
EXPOSIÇÃO/ INTERVENÇÃO URBANAEXPEDIÇÃO FOTOGRÁFICA GLOBO
2
FESTAS
2
LANÇAMENTOS DE LIVROS + MONÓLOGO NO SOLAR DA MARQUESA
5
ESPETÁCULOS/ CORTEJOS DE MEMÓRIA
12
EXPOSIÇÕES
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ROTEIROS GASTRONÔMICOS/ SELOS DE VALOR CULTURAL
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PLACAS DO PROJETO “MEMÓRIA PAULISTANA”
30
ATIVIDADES COM TEATROS - PARTIMÔNIO IMATERIAL
30
ROTEIROS/ AÇÕES DO SESC SP
50
SESSÕES DE CINEMA - CIRCUITO SPCINE
101
ESPAÇOS CULTURAIS
145
IMÓVEIS HISTÓRICOS
150
CAIXAS DO EDUCATIVO DA JORNADA DO PATRIMÕNIO 2019
300
OFICINAS
400
ROTEIROS DE MEMÓRIA
+ de 1000
ATIVIDADES EM CERCA DE 500 PONTOS
250.000
DE PÚBLICO
350.000
DE REAIS INVESTIDOS PELA SECRETARIA MUNICIPAL DE TURISMO
900.000
DE REAIS INVESTIDOS PELA SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA
jornada do patrimônio
A criação da Jornada do Patrimônio, em 2015, veio de encontro à política de participação da população para o reconhecimento e valorização dos bens que são significativos da memória paulistana. Esse conhecimento, que forma a nossa memória, nos faz compreender as relações simbióticas que construíram nossa cidade, tanto no nível material, como a evolução urbana, os estilos arquitetônicos, as técnicas construtivas; como no nível do patrimônio imaterial, presente nos fatos relativos às ações sociais e culturais, no contexto temporal e econômico. Essas reflexões formam a nossa identidade, pessoal e coletiva, que, por sua vez, tornam-se as sementes de conhecimento que germinarão nas próximas gerações. Na sua quinta edição, em 2019, o evento se expandiu em número de ações, de locais e de diversidade de programação. Reuniu cerca de 250 mil pessoas em mais de 500 pontos da cidade, com mais de 1.000 atividades. Foram realizadas ações em todas as regiões da capital, que contemplaram visitas guiadas a edifícios, oficinas, roteiros temáticos, exposições e programação artística. A cada ano, a Jornada do Patrimônio tem maior reconhecimento no calendário da cidade, com parcerias que envolvem outros equipamentos culturais, outros órgãos do governo, apoio de empresas e, principalmente, pela participação de pessoas e grupos que são agentes permanentes na conservação do patrimônio cultural. Além da sua proposta de educação patrimonial, o Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), por meio desses eventos, aproximou a população ao órgão de patrimônio da cidade, tornando mais frequente os trabalhos conjuntos com a sociedade.
Marco Winther
Diretor do Departamaneto do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura da Cidade de São Paulo
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placas
MEMร RIA PAULISTANA
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OTO: Francio de Holanda
memória paulistana
Sempre achei que a principal forma de gerar o sentimento de pertencimento entre os cidadãos e a cidade, era o trabalho contínuo e coletivo de preservação da memória cultural. Em cada canto de uma grande cidade, existem histórias que precisam ser contadas e preservadas, para que a própria cidade seja valorizada em sua plenitude e com isso se estabeleça um ciclo virtuoso de vínculo e cuidado. Nas viagens que tive oportunidade de fazer, sempre me chamou a atenção a força de projetos públicos que tinham essa compreensão. As placas redondas de Londres, por exemplo, em praticamente todos os quarteirões da capital inglesa, com a precisão e detalhamento até de onde viveu cada um de seus moradores ilustres, me encantavam. E tantos outros projetos similares ao redor do mundo. No Brasil, em minha temporada carioca, as estátuas de bronze de ídolos da cultura contemporânea e o orgulho das pessoas em contar cada pedaço da riquíssima história cultural da cidade maravilhosa, também sempre serviram de inspiração. Ao assumir a Secretaria Municipal de Cultura, trouxe comigo todas essas referências e o desejo enorme de buscar, por meio da memória, essa conexão das pessoas com a cidade, tendo a história da nossa cultura como fio condutor. Nasceram então as placas azuis do projeto Memória Paulistana, um dos pilares estratégicos do nosso Programa São Paulo Capital da Cultura. Da casa de um grande nome, passando por um fato importante no território, ou uma edificação com relevância histórica. O mapa das rodas de samba, os primeiros cinemas de rua, onde
nasceram nossos principais eventos e movimentos, onde se deram nossas maiores lutas. O caldo cultural da nossa São Paulo é tão rico que a tarefa de identificação dos locais que merecem o reconhecimento de uma das placas de Memória Paulistana parece infinito. Que bom que começamos. Temos muito trabalho pela frente. Arte é ocupar.
Alê Youssef
Ex- Secretário Municipal de Cultura da Cidade de São Paulo
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FOTO: Francio de Holanda
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25 FOTO: Francio de Holanda
2 o grande cortejo
DA MEMÓRIA PAULISTANA
Criado a partir do conceito de roteiros de memória, ou seja, um passeio cultural que conta a história de um determinado território, o Grande Cortejo da Memória Paulistana trouxe uma nova forma especial e simbólica de valorização do patrimônio Cultural na cidade de São Paulo. Como um espetáculo itinerante a céu aberto e conduzido pelo ator Pascoal da Conceição, que representou Mário de Andrade, o espetáculo percorreu o centro histórico da capital paulista, mais conhecido como Triângulo SP, trazendo personagens históricos, interpretados por grandes nomes da dramaturgia brasileira que dialogavam com o público a partir de sacadas de prédios históricos. Com direção artística de Georgette Fadel e dramaturgia de Bernardo Galegale, o projeto trouxe Beth Araújo como Marquesa de Santos, Cássio Scapin como Adoniran Barbosa, Laila Garin como Elis Regina, Aílton Graça como Tebas, Leopoldo Pacheco como Plínio Marcos, Fernando Sampaio como Piolin e o encontro dos modernistas com Marcelo Drummond como Oswald de Andrade, Letícia Coura como Tarsila do Amaral e Kelly Campelo como Anita Malfatti. Ainda como forma de valorizar grupos sociais que simbolizam e representam a cultura paulistana, o espetáculo trouxe participações especiais de grupos tradicionais como Mbyá mbarete, os povos indígenas Pataxó, Guarani Mbya, Fulni-ô, Kariri Xoco, Pankará, Pankararu, Pankararé; o Bloco Ilú Inã, a Bateria da Escola de Samba da Vai-Vai, o grupo Back Spin Crew com a grafiteira Negra Ziza, o Coro Antropofágico do Teatro Oficina, a Banda dos Palhaços Sem Fronteiras e, para encerrar, um grande show com a cantora e pianista Cida Moreira ao ar livre.
FOTO: Marcio Salles
dramaturgia
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pátio
DO COLÉGIO
Após a concentração dos participantes em frente ao Museu Anchieta, Mário de Andrade (Pascoal da Conceição) dá início a um poema:
Quando eu morrer quero ficar Quando eu morrer quero ficar, Não contem aos meus inimigos, Sepultado em minha cidade, Saudade. Meus pés enterrem na Rua Aurora, No Paissandu deixem meu sexo, Na Lopes Chaves a cabeça Esqueçam. No Pátio do Colégio afundem O meu coração paulistano: Um coração vivo e um defunto Bem juntos.
FOTO: Francio de Holanda
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MÁRIO DE ANDRADE
(no silêncio das descobertas)
É aqui. Foi aqui. Em 1554, exatamente nesse lugar, Foi fundada a cidade de São Paulo. (trompete) Nada de asas! Nada de poesia! Nada de alegria! Essa imensidão modernizante que há séculos assola nosso imaginário, inspirou tantas narrativas que parece não caber mais nos seus contornos. Explode em possibilidades do que ainda pode vir a ser; ou implode naquilo que poderia ter sido. Sua história entalhada nos edifícios e monumentos tentam nos mostrar como chegamos aqui hoje.
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Mas imóvel, ela não consegue olhar pra trás. Não consegue ver Na base da escultura os (indígenas) que moravam e viviam nessas terras milhares de anos antes de fundarem a cidade. Tem início o manifesto dos grupos indígenas.
São Paulo! Comoção da minha vida Galicismo a berrar nos desertos da AMÉRICA!!!!... Sejam TODAS E TODOS bem-vindas e bem-vindos ao Grande Cortejo da Memória Paulistana! Todos se encaminham para o Solar da Marquesa de Santos.
(Descobre a escultura no meio do Pátio)
Vejam!!! A obra de Amadeo Zani: Glória Imortal aos Fundadores da Cidade. No topo, uma mulher, representando a cidade. Como se irrompeu no centro do Centro, ela olha altivamente pra frente; pro Pico do Jaraguá ela sabe para onde vai e onde quer chegar. Antevê o futuro! (chora arrependido)
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DA MARQUESA
FOTO: Francio de Holanda
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MÁRIO DE ANDRADE
(com uma carta na mão, cochichando para não invadir a privacidade)
Essa é a casa nº 3 da antiga Rua do Carmo. Casa da Domitila de Castro Canto e Melo, a Marquesa de Santos, uma das mais importantes mulheres da cidade de São Paulo no século XIX. Famosa pelos bailes de máscaras e saraus literários... (lendo a carta, acordes de “Meu Bem”)
24 de novembro de 1826. Meu bem, forte gosto foi o de ontem à noite que nós tivemos. Ainda me parece que estou na obra. Que prazer!! Que consolação!!! Que alegria foi a nossa!!!! Tenho o prazer de lhe ofertar essas rosas e essas duas torcazes, que comeremos à noite. Aceite os mais puros e sinceros votos de amor do coração deste seu amante constante e verdadeiro e que se derrete de gosto quando... com mecê. “Fogo, foguinho”, o “Demonão”, (segredando a vida alheia), Dom Pedro I, o imperador, Algumas bocas diziam que Dom Pedro chegou a desenhar o aspecto de seu membro ao redor do texto de algumas cartas...
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A Marquesa de Santos (Beth Araújo) sai no balcão do Solar:
MARQUESA DE SANTOS
(manda um balde de água fria)
Olha isso! Quantas fofocas sobre mim e sobre D. Pedro I! Morri com quase setenta anos de idade, fui amada amante do meu Fogo Foguinho durante sete anos e só lembram disso. Só querem falar sobre isso! Nasci aqui perto. Vi tudo isto se transformar de mato em uma das principais cidades do Brasil. Os tropeiros da minha infância seriam substituídos pelo cavalo de aço, pela ferrovia, que eu cheguei a ver as instalações lá na Luz, onde eu patrocina corrida de cavalo. Fui maltratada e quase morta pelo meu primeiro marido! Mas dei a volta por cima, e fui uma das pouquíssimas mulheres brasileiras a se envolver em política! Eu era do Partido Liberal e até a maçonaria eu frequentei! Na minha veia corre o sangue desses bravos índios que aí estão e de um nobre português que veio fugido de Portugal depois de dar um golpe, enfim, mais brasileira que essa mistura, impossível!
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E você, hem? Mário de Andrade!!! Que original... Não foi o senhor que falou em um poema seu sobre a minha imperial bundinha. Querem ver? (lê o poema de Mário de Andrade)
Nada de ajuntamento! Os policiais dirigem O “Circulez”. Meu Deus! É a Marquesa de Santos! Está pálida... O olhar fuzilando coragem Faísca da cadeirinha atapetada de anjos. Segue pra forca da Tabatinguera. Lento O cortejo acompanha a rubra cadeirinha Pro Ipiranga. Será que em tão pequeno assento A Marquesa botou sua imperial bundinha?! ... MÁRIO DE ANDRADE (palmas) Vamos em frente que atrás vem gente! MARQUESA DE SANTOS E outra coisa, bundudo é você. Vocês já repararam no tamanho da bunda dele....
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MÁRIO DE ANDRADE Enviarei uma carta com explicações para vossa excelência assim que acabar nosso Cortejo! Ao final, todos seguem para a Praça da Sé.
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DA Sร FOTO: Francio de Holanda
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FOTO: Juan Quintas
MÁRIO DE ANDRADE:
(chegando na praça, anunciando)
O Padre José de Anchieta levanta sua cruz para todos que passam pela Praça da Sé! Sua catequização perpetua-se no tempo! Os indígenas, agora em maior número, rodeiam a estátua de Padre Anchieta, apontando suas flechas para a estátua e para outros pontos ao seu redor, como em uma coreografia para a guerra. Depois do rito (pausa):
Misericórdia!!! Talvez não seja o fim, mas é pra lá que vamos. Acompanhados por Mário de Andrade, todos vão para o Largo da Misericórdia.
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FOTO: Juan Quintas
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MÁRIO DE ANDRADE
Um pouco mais abaixo, bem à nossa frente, mediando esse encontro dos tempos de guerra e de paz, a famosa “esquina musical”! O Palacete Tereza Toledo Lara... a Casa de Francisca. Foi sede da Rádio Record a partir dos anos 30. Revelou personagens cômicos como Barbosinha, Zé Conversa, Mal Educado da Silva, e o mais popular de todos, o Charutinho. Todos eles interpretados por Adoniran Barbosa.
DA MISERICÓRDIA
Tebas, negro escravo, profissão alvenaria construiu a velha Sé em troca pela carta de alforria. Largo da Misericórdia: coração do triângulo histórico de São Paulo! O Largo da Misericórdia era o lugar onde as pessoas se informavam enquanto recolhiam água do chafariz construído pelo grande Joaquim Pinto de Oliveira, o Tebas, “um Tebas”, como exaltou o compositor Geraldo Filme... Catedral da Sé, Igreja do Carmo, Mosteiro de São Bento, o arquiteto Tebas está em toda parte. Mas eu não encontro ele em lugar nenhum. Inclusive aqui. Aqui sempre foi um local de encontros. (Olha para cima, apontando) Do lado de lá, o Edifício Ouro para o Bem de São Paulo, construído com doações das alianças das mulheres paulistas para a Revolução de 32, se encontra com o Edifício Triângulo, esse grande “moderno-estilizado” projetado pelo escritório de Oscar Niemeyer.
DE FRANCISCA
Na varanda da Casa de Francisca, Adoniran Barbosa (Cássio Scapin) sai com seu cigarro/charuto junto com Elis Regina (Laila Garin). Após um pequeno diálogo, cantam juntos. Ao final, aparece a bateria da Vai-Vai que irá conduzir o Cortejo sentido Largo São Francisco.
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SÃO FRANCISCO
FOTO: Ana Lucia Armigliato
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No Largo São Francisco, a bateria da Vai-Vai dá uma pausa e Mário de Andrade volta a falar, em frente ao balcão da Faculdade de Direito:
MÁRIO DE ANDRADE (num só fôlego)
Prudente de Moraes, Campos Salles, Rodrigues Alves, Afonso Pena, Artur Bernardes, Washington Luiz, presidentes da República! Álvares de Azevedo, Castro Alves, Fagundes Varella, Hilda Hilst, José de Alencar, José Celso Martinez Corrêa, artistas, escritores, poetas! Até... Oswald de Andrade! Luís Gama, Não. Patrono da Abolição da Escravidão no Brasil, foi impedido de frequentar o curso de direito.
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MÁRIO DE ANDRADE Tebas! Esse é um Tebas. Grande Tebas! TEBAS Você também é um Tebas, Mário!!! Venham, venham cá! Como disse o próprio Luís Gama: Em nós, até a cor é um defeito. Um imperdoável mal de nascença, o estigma de um crime. Mas nossos críticos se esquecem que essa cor, é a origem da riqueza de milhares de ladrões que nos insultam; que essa cor convencional da escravidão tão semelhante à da terra, abriga sob sua superfície escura, vulcões, onde arde o fogo sagrado da liberdade.
TEBAS
(Ailton Graça)
Impedido por ser negro. Isso mesmo, por ser negro! Ele que foi advogado para os pobres e os cativos e que conquistou a própria liberdade judicialmente. (do balcão da Igreja de São Francisco). Aqui, Mário!
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FOTO: Ana Lucia Armigliato
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PACHECO E SILVA
FOTO: Marcio Salles
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TEBAS
MÁRIO DE ANDRADE
Sou Tebas, negro escravizado até meus 57 anos. Fui “mestre pedreiro” e me tornei construtor e arquiteto. Me alfabetizei e conquistei minha alforria pelo reconhecimento do valor do meu trabalho. Sou eu o “arquiteto-escravo” de São Paulo... Minha marca está por aí, mesmo meu nome não aparecendo em nenhuma placa.
Palmas para Joaquim Pinto de Oliveira! TEBAS virou adjetivo. Quando alguém demonstrava que era capaz de fazer tudo com acerto e perfeição, era um TEBAS!!!
MÁRIO DE ANDRADE Conta pra nós a história de você ficar observando as obras enquanto construíam a primeira Catedral da Sé.
Nesse momento, ocorre a entrada do Bloco Afro Afirmativo Ilu Inã. A bateria da Vai-Vai acompanha. Depois, tocam a música “Tebas, o Escravo”, de Geraldo Filme. Tebas então sai do balcão. Ao deixar o local, Tebas vem acompanhado do Ilu Inã e se juntam ao Cortejo.
TEBAS É, um dia o capelão do Convento do Carmo ficou intrigado e foi perguntar o motivo de eu estar ali parado. Eu perguntei pra ele: “E cadê a torre??” Ele disse que não havia nenhum construtor capaz de erguer tal torre. Eu falei que a construiria. Sob duas condições: receber minha carta de alforria e que o primeiro casamento da catedral fosse o meu. Então em 1755 ficou pronta a primeira Catedral da Sé, com a minha torre.
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Tebas, negro escravo Profissão: Alvenaria Construiu a velha Sé Em troca pela carta de alforria Trinta mil ducados que lhe deu padre Justino Tornou seu sonho realidade Daí surgiu a velha Sé Que hoje é o marco zero da cidade Exalto no cantar de minha gente A sua lenda, seu passado, seu presente Praça que nasceu do ideal E braço escravo É praça do povo Velho relógio, encontro dos namorados Me lembro ainda do bondinho de tostão Engraxate batendo a lata de graxa E camelô fazendo pregão O tira-teima do sambista do passado Bexiga, Barra Funda e Lavapés O jogo da tiririca era formado O ruim caía, e o bom ficava de pé No meu São Paulo, oi lelê, era moda Vamos na Sé que hoje tem samba de roda. Tebas e Ilu Inã conduzem o Cortejo até a Praça Antônio Prado. Tebas junta-se a Mário de Andrade como protagonistaguia do Cortejo.
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FOTO: Ana Lucia Armigliato
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FOTO: Marcio Salles
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ANTONIO PRADO
FOTO: Juan Quintas
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Ao chegarem à praça, ao lado do Edifício Martinelli, Ilu Inã faz uma pausa para Tebas falar:
TEBAS Em 1737, tempos já perdidos na nossa memória, houve uma antiga Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos aqui, na Praça Antônio Prado. Os homens brancos se acotovelavam nos arredores da Igreja para assistir às tradicionais festas de congos! Depois, tudo foi mudando. As congadas dos homens pretos foram sendo
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FOTO: Marcio Salles
substituídas por festejos que (ressalta) “não interferiam nos bons costumes da sociedade branca”... A Igreja do Rosário foi ficando mais triste. O tão aclamado progresso de São Paulo e da sua burguesia empurrou minha Igreja lá para o Largo do Paissandu. E hoje, ironicamente simbólico, na Antônio Prado está a Bolsa de Mercadorias e Futuros. Ilu Inã se prepara para uma celebração afro. Ao final, parte para o Largo São Bento.
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FOTO: Francio de Holanda
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SĂƒO BENTO
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Ao chegarem ao Largo, Tebas começa um rap, acompanhado pela bateria do Ilu Inã:
TEBAS Minhas mãos nas pedras do São Bento Você vê? Não! Vão pro esquecimento A raça dos gigantes bandeirantes com seu enriquecimento empurraram quem trabalha pro tormento. Fomos expulsos do centro da cidade. Proibidos do próprio território. Em vão! Escravos? Não! Escravizados! Mas nossa história refizemos bem no Largo Rappers, Djs e grafiteiros Boombox no sábado inteiro E o São Bento ganhou sua estrofe Virou o centro nacional do Hip Hop Em frente, na praça, como resposta, o pessoal do Hip Hop começa com os boomboxes, liderados por Marcelinho Back Spin:
Centro da Cidade (Mc Jack) Pessoas subindo e descendo essa rua pensativas e sem rumo à procura de aventura moços, velhos, pessoas de idade vejo tudo isso no centro da Cidade plaquinha de emprego
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plaquinha compra ouro plaquinha compra prata plaquinha de almoço pessoas mal vestidas formando a ralé boy mal informado onde é a Praça da Sé? onde está a bolinha? um jogo de azar por incrível que pareça você nunca vai ganhar trombadinhas, trombadões roubando o que puder andando pelo centro à procura de um mané vendedores ambulantes vendendo seus produtos mendigo maloqueiro dormindo como um urso chega o meio-dia começa a correria horário de almoço é hora de alegria Ao som do Hip Hop, Mário de Andrade puxa o Cortejo pela Rua Líbero Badaró.
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MÁRIO DE ANDRADE
MÁRIO DE ANDRADE
1917! Enquanto o mundo passa por revoluções, a nossa começaria daqui a três quadras! Vamos, vamos todos! Quero lhes mostrar a modernidade em si mesma, a pincelada livre e revolta de Anita! Seguimos rumo à garçonnière de Oswald de Andrade!
Cozinheiro das Almas desse Mundo!
Na altura da Rua Líbero Badaró com a Avenida São João, Oswald de Andrade (Marcelo Drummond) está parado ali, com um pequeno grupo de pessoas (parte do Coro do Teatro Oficina):
MÁRIO DE ANDRADE (ao avistar Oswald) É um Calcanhar-de-Aquiles! OSWALD DE ANDRADE Decano! (Abraçam-se) Onde vão? MÁRIO DE ANDRADE Até a exposição da Anita. Não dá pra visitar o “covil da Rua Líbero”...
OSWALD DE ANDRADE Ver a cidade com os olhos livres! Mário, nossa época anuncia a volta ao sentido puro! (Recita:) “Aprendi com meu filho de dez anos Que a poesia é a descoberta Das coisas que eu nunca vi” (de Poesia Pau Brasil, 1925) Continuam se divertindo pela Rua Líbero Badaró até o cruzamento com a Rua Dr. Miguel Couto. Lá, pintando uma tela em um cavalete, encontram Tarsila do Amaral (Letícia Coura).
OSWALD DE ANDRADE Tarsila! TARSILA DO AMARAL Olha quem chega! E se não é parte do bando de doidos...
OSWALD DE ANDRADE
MÁRIO DE ANDRADE (completando)
Ah! Meus quarenta e dois metros quadrados de lascívia! Amor, ciúmes e música!
...em disparada por toda parte no Cadillac verde de Oswald! (Divertem-se)
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TARSILA DO AMARAL
OSWALD DE ANDRADE
Mário, meu carinho!
Tarsila, você está no Masp com recorde de público.
MÁRIO DE ANDRADE Querida. Agora sim, temos “Rosivaldo”! OSWALD DE ANDRADE E me diga, o que há nessa tela, Tarsila? Bombas de gasolina, postes de eletricidade, edifícios em construção? TARSILA DO AMARAL Não! ...Um “homem carne humana”.
que
come
OSWALD DE ANDRADE Abaporu! TARSILA DO AMARAL Pois vinguei-me da opressão. Chega de conservadorismo! MÁRIO DE ANDRADE (como um grito de guerra) Está lançado o Desvairismo!
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Tarsila pega o cavaquinho, ela e o coro cantam. Os três modernistas seguem puxando o Cortejo pela Rua Líbero Badaró até chegarem em frente ao Edifício Sampaio Moreira, atual Secretaria Municipal de Cultura.
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Na janela/varanda do Edifício Sampaio Moreira, aparece Anita Malfatti (Kelly Campelo). Junto com ela, preenchendo as outras janelas, o Coro do Teatro Oficina:
MÁRIO DE ANDRADE, TARSILA E OSWALD Viva Anita Malfatti!!! ANITA MALFATTI Pintei. Pintei. Pintei. Ninguém pinta como eu pinto!!! TODOS Viva Anita Malfatti!!!
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ANITA MALFATTI
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Não aguentava mais o academicismo mesquinho! A inércia do mau gosto! Deu na crítica do Monteiro Lobato! A cidade me chamava de louca, paranóica... mistificadora... Desistiram dos meus quadros. Mas o Mário de Andrade aparecia por aqui todos os dias enquanto durou a exposição. Pintei! Pintei! Pintei! Pintei a boba... Pintei um Homem Amarelo... Pobre, excluído, desconhecido. Um imigrante italiano que praticamente me pediu para pintá-lo... Estava com uma expressão desesperada. Resolvi retratá-lo desgastado, desajeitado, Sua camisa estava suja... como se estivesse mal acomodado no assento. Estava tenso, oprimido, ansioso. Me reconheci na aguda melancolia do seu olhar vago e distante.
Contra o mundo reversível e as ideias cadaverização! Só a antropofagia nos une!
MÁRIO DE ANDRADE Anita Malfatti, comprei seu quadro, assim como eu prometi.
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O Coro do Teatro Oficina ganha a cena. Enquanto Anita Malfatti e o Coro descem das varandas e janelas do Edifício Sampaio Moreira, Mário de Andrade veste uma saia. Ele irá homenagear Flávio de Carvalho e sua “Experiência nº 3”, atravessando o Viaduto do Chá assim como fez Flávio. O Cortejo sai da Rua Líbero Badaró e segue até o Theatro Municipal, acompanhado pelo Coro do Teatro Oficina.
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Na escadaria do Theatro Municipal, Plínio Marcos (Leopoldo Pacheco) está vendendo seus livros. Nas janelas e balcões, surgem os Palhaços Fantasmas Sem Fronteiras, representando os artistas Sarah Bernard, Antônio Abujamra, Cacilda Becker, Antunes Filho, Paulo Autran, Dercy Gonçalves, Flávio Rangel e Ademar Guerra. Eles falam repetidamente o nome de Plínio até que ele sinaliza para que pausem:
PLÍNIO MARCOS Vendo meus livros, dou autógrafos e eu prometo morrer logo para valorizálos. (pausa, quem compra?) Morreria de fome se fosse viver dos meus livros. Teria de acabar fazendo milhares de concessões. Eu nunca fui um escritor profissional. Eu já fui o analfabeto mais premiado do País! Aliás, quando querem me ofender, me chamam de analfabeto; quando querem me badalar, dizem que sou gênio. Poucos de vocês sabem, mas eu comecei no circo. Me apaixonei por uma moça de uma trupe e seu pai só permitia o namoro se o pretendente fosse do circo. Então resolvi me tornar o palhaço Frajola - como já havia sido preso roubando um passarinho, adotei o apelido... O que sou mesmo é um cara de sorte.
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Tenho boa estrela e sei me virar! Aceito a regra do jogo na porcaria da vida. Ninguém me passa pra trás, não. E se bobearem passo na frente dos outros, sou malandro, no duro. Sou maldito, mas um maldito autêntico! Quando Plínio termina, descem as escadas e conduzem o Cortejo rumo ao Largo do Paissandu (no caminho, passam por oficinas de circo cheias de palhaços).
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Quando o Cortejo passa pelo Centro Cultural Olido, encontra-se com o boneco gigante do Piolin. Os palhaços o conduzem e acenam para o público.
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Entra o palhaço Piolin (Fernando Sampaio) e apresenta um número clássico, “O Namoro dos Pássaros”, junto com o palhaço Chicharrão (Raul Barretto). Ao final, interagem com o grande boneco do Piolin, e o Cortejo vai cantando para a Praça das Artes.
Com vocês a “Síntese da Alma Brasileira”. No Largo do Paissandu, o lugar do circo, Abelardo Piolin!!! O maior artista popular deste País!
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DAS ARTES
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O Cortejo chega à sua parada final. À frente, para uma última conversa, estão Plínio Marcos, Tebas, Tarsila do Amaral e Mário de Andrade (estão sem microfone):
TEBAS Memória é, antes de tudo, a lembrança das vidas. Existe para nos recordar do passado e dar sentido ao nosso futuro. Passado e futuro sofrem ataques há séculos. Mas nós sobrevivemos a tudo. Estamos todos em cada pedra da cidade, em cada canto dos imaginários, em cada poema do cotidiano. O passado é um exemplo, o futuro, uma esperança, e o presente é um puta pé no saco!
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Elegâncias sutis sem escândalos, sem ciúmes... Perfumes de Paris... Arys! Bofetadas líricas no Trianon... Algodoal!... São Paulo! Comoção de minha vida... Galicismo a berrar nos desertos da América! Todos os cabritos berram!!! (o bom cabrito não berra) Na parte inferior da Praça das Artes, um foco de luz recai sobre Cida Moreira e seu piano. Os participantes do Cortejo descem a rampa em sua direção para a apresentação musical final.
TARSILA DO AMARAL (para o Cortejo)
A cultura é forte. Nós somos a cultura, nós somos fortes. E hoje, somos muitos. Viva a arte e a cultura! Viva a memória de São Paulo! MÁRIO DE ANDRADE Pauliceia Desvairada São Paulo! Comoção de minha vida... Os meus amores são flores feitas de original... Arlequinal!... Traje de losangos... Cinza e ouro... Luz e bruma... Forno e inverno morno...
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Em busca da Imaterialidade do Patrimônio Urbano Por Rodrigo Pissara, psicólogo, desenhista-projetista e técnico em museologia.
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Dentre tantas possibilidades que a Jornada do Patrimônio deste ano nos ofereceu, o Grande Cortejo da Memória Paulistana fez aparecer os fantasmas que habitam a cidade desde a sua fundação. Alguns apareciam nas sacadas de edificações históricas, outros se juntavam ao Cortejo, fazendo uma festa em torno da riqueza que descobrimos ao longo do trajeto, desde o Pátio do Colégio até o Largo do Paissandu. Descobrir o patrimônio da cidade por meio de sua materialidade, isto é, suas edificações, ruas, praças, nos fez descobrir um outro patrimônio, um imaterial que não aparece nas linhas arquitetônicas dos edifícios, mas precisa ser resgatado do imaginário urbano, que nem sempre é visível. Acompanhar o Grande Cortejo fez lembrar de algumas lendas urbanas, como aquela de que haveria um túnel que ligava o Solar da Marquesa ao Museu Paulista, para que ela encontrasse com o príncipe regente fora do alcance dos olhares da população. Uma estória certamente, porque demandaria uma engenharia estruturalmente complexa para ligar o centro histórico ao bairro do Ipiranga, isto se a gente não considerar que o Museu nunca foi residência da Família Real e Imperial. Mas nos entretém com um quotidiano que não vivemos, faz pensar no que era a vida na cidade de São Paulo. E foi isto que se pôde viver naquele passeio e ouvir dos personagens que habitavam a Vila de São Paulo de Piratininga, como se estabeleceram aqui, desenvolveram suas carreiras, viveram suas amizades e amores, e morreram. As linhas que formam as edificações, assim
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como as linhas que criam o traçado urbano do município, são representativas das pessoas que passaram por aqui, porque no conjunto de seus costumes, se pôde desenhar um urbanismo é um viver urbano. Engenharia e arquitetura juntas construindo os sonhos e desejos de uma sociedade. As edificações se sobrepuseram umas às outras, algumas permaneceram, seu estado de conservação nem sempre é o mais agradável de se ver, mas isto fala da maneira como nos apropriamos do patrimônio imaterial construído por aqui. Aquele patrimônio material é resultado da imaterialidade aceita ou rejeitada pelos que vivem na cidade, mas que é resgatado por eventos como este Cortejo da Memória Paulistana. Por detrás das linhas emergem as formas, que o tempo deixa sua marca, criando um conjunto pictórico para as linhas que um dia estiveram numa prancheta. É a imaterialidade do patrimônio que faz enxergar através delas, da decadência dos edifícios, que nem sempre é agradável de ser ver, de enxergar quem fomos, para compreender quem somos. O futuro pertence à coletividade paulistana que desenha e redesenha suas linhas, suas formas para tentar adequar o traçado urbano aos seus sonhos e desejos. Erramos e muitas vezes surgem ruídos na paisagem, como denominou o geógrafo Milton Santos, como consequência de nossas ações, mas estes ruídos urbanos são parte do conjunto, fazem parte de sua história, está com “h” e “i”, e que se juntam aos fantasmas de nosso passado urbano. Reconstruir o patrimônio imaterial é um exercício quotidiano, que foi apenas eliciado
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pelo Grande Cortejo da Memória Paulistana, nos sensibilizando para ele. E a partir daí pensarmos sobre a materialidade do patrimônio, sua representação em nosso imaginário e sua preservação, integrando-o ao crescimento enlouquecido e desordenado que todos nós paulistanos conhecemos e aprendemos a gostar. Compreender as dimensões dessas duas formas de patrimônio é assumir todas as suas características, mesmo, e principalmente, as que nos desagradam, porque inclui as possibilidades e perspectivas do viver em São Paulo, permitindo que se construa um futuro mais inclusivo. Os fantasmas podem, então, voltar aos seus túmulos, tranquilos de que seu legado está em boas mãos.
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Para celebrar a abertura da Jornada do Patrimônio 2019, convidamos a festa Pratododia All Stars para ocupar o Beco do Pinto, com muito reggae, ritmo registrado como Patrimônio Cultural Mundial pela Unesco. Para o encerramento, promovemos uma ocupação cultural em outro ponto emblemático da capital paulista, o Mirante 9 de Julho, com duas atrações especiais. A festa DISCOPÉDIA, que trouxe uma mistura de ritmos brasileiros para o público; e, na sequência, realizamos uma sessão de cinema ao ar livre, exibindo o filme “São Paulo Sociedade Anônima”, de Luiz Sérgio Person.
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Abrindo as atividades da Jornada do Patrimônio 2019Memória Paulistana, foi realizada, no dia 03 de agosto de 2019, a 3ª Expedição Fotográfica Globo. Nesta edição, 350 pessoas participaram da caminhada fotográfica que percorreu o Triângulo SP. O passeio foi conduzido por Walter Pires, arquiteto do Departamento do Patrimônio Histórico, e contou com a colaboração de diversos profissionais e pesquisadores da Secretaria Municipal de Cultura, como Xis, coordenador do Mês do Hip Hop, a socióloga Fátima Antunes, a historiadora Paula Nishida, dentre outros que ajudaram a recontar a história da cidade a partir desse território, colaborando para que fotógrafos amadores e profissionais capturassem particularidades da arquitetura e da paisagem urbana durante o passeio. Boa parte desses diferentes olhares foi apresentada na exposição “#Expedição Globo na Jornada do Patrimônio”, instalada na Praça do Patriarca entre os dias 17 e 31 de agosto de 2019.
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FOTO: Rafael Gushi
“Pensar em Patrimônio agora é pensar com transcendência, além das paredes, além dos quintais, além das fronteiras. É incluir as gentes, os costumes, os sabores, os saberes. Não mais somente as edificações históricas, os sítios de pedra e cal. Patrimônio também é o suor, o sonho, o som, a dança, o jeito, a ginga, a energia vital e todas as formas de espiritualidade da nossa gente. O intangível, o imaterial”.
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Patrimônio Vivo “Neste pensar de “jornada”, na perspectiva de Neste pensar de ‘jornada’, na perspectiva de caminhada e ‘expedição’, é que colocamos luz no Patrimônio Imaterial e promovemos a vivência com todas estas gentes: indígenas, quilombolas, caiçaras e caipiras, com o sagrado e o profano e, como palco, o patrimônio edificado da cidade de São Paulo, estabelecendo uma conexão entre esses dois mundos, o material e o imaterial. E é nesta cidade cosmopolita, influenciada pelos povos do mundo todo e que sistematicamente vive um processo de modernização contínua, encontramos as identidades culturais, as “tribos” e as comunidades, cada qual com suas referências de pertencimento e, ao mesmo tempo, dinamizadas, integradas aos territórios. Esses espaços, entrecortados por linhas afetivas, não estão segmentados, mas entrelaçados e, apesar dessa interligação, as identidades são muito bem definidas e caracterizadas, entre tantas, pelo rural, pelo bucólico, nos quais o sagrado e profano se alternam continuamente, abrigando bens culturais imateriais vivos - os festejos, as danças, o samba, a culinária, entre muitos outros que se manifestam e permeiam a vida da cidade durante o ano todo, tornando-o vivo. Mais do que a selva de pedras, essa gente tão diversa expressa a alma dela. A Jornada do Patrimônio 2019, junto com a Expedição Fotográfica Globo, promoveu um grande encontro de rituais e manifestações artísticas com o evidente objetivo de revelar o que não se enxergava, de ressignificar o que parecia comum, estimulando os paulistanos a conhecerem sua própria história, a sua cara, o seu jeito, por meio da fotografia. As pessoas
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beberam na fonte da sua ancestralidade, comungam com comunidades e tradições populares e comeram na mesa farta das culturas que manifestaram pelo corpo que dança, que corteja, que reza e que se relaciona com o mundo nas mais diversas formas. E no percurso desta imersão pudemos nos encantar com a aldeia indígena Wassu Cocal, no Pátio do Colégio, que, por meio de seus cachimbos, ervas e danças, expressou sua identidade, ancestralidade e sua rica maneira de se relacionar com o sagrado. Na Praça da Sé, ecoou a força do samba de bumbo, reconhecido Patrimônio da Cultura Imaterial paulista, herança dos devotos das festas religiosas de Pirapora do Bom Jesus, onde tradicionalmente ocorre em agradecimento ao santo festivo e que influenciou fortemente o samba da capital e os sambistas Geraldo Filme e Dionísio Barbosa. E como não ser contagiado pela magia do samba rock, reconhecido como patrimônio imaterial paulistano e que não poupou energia para a celebração da vida por meio dos giros, rodopios e manobras com os braços, forte reflexo da cultura negra paulistana. Sim, uma verdadeira exaltação à vida e às diferentes maneiras de relacionarmo-nos com ela. Assim, desejo aos leitores deste registro, que possam perceber e sentir o Patrimônio Vivo, aquele que está conectado à nossa vida, resistindo, sonhando, dançando e ‘festejando’ nesta cidade tão plural e fértil, onde o novo e o velho se percebem parte um do outro, se percebem essência.
Diego Dionísio
Gestor do Patrimônio Imaterial e Pesquisador Cultural. Curador Artístico da Expedição Globo
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Museu de Rua: resgaste de um projeto
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A reativação dos programas curatorial do Museu da Cidade de São Paulo, descontinuados nos últimos anos, ocupou lugar de destaque nas diretrizes de programação da atual gestão. Entre eles, figura o Museu de Rua, projeto realizado há 42 anos pelo museólogo Julio Abe Wakahara, que marcou uma importante inovação na museologia brasileira ao propor ações extramuros, com a exposição em praças de grande circulação de pedestres. O Museu de Rua foi concebido para propiciar que os indivíduos se identifiquem com sua cidade e possam vir a ter com a mesma uma relação mais criativa e consequente, valorizando suas próprias memórias e com elas a memória e a história de São Paulo. A nova edição do Museu de Rua foi organizada como parte da Jornada do Patrimônio 2019, o que deu um significado especial ao resgate desse importante projeto após quatro décadas, colocando-o no contexto de um enorme e diverso conjunto de ações voltadas à valorização da memória paulistana. A partir de fotografias históricas dispostas em 18 painéis da exposição ‘Trajetos Comparativos’, exibidos nos vértices do imaginário Triângulo Histórico, no centro, os transeuntes foram estimulados a reconhecer as transformações da paisagem entre a Praça da Sé, Viaduto do Chá e Largo São Bento. O resgate do projeto marca o compromisso da instituição com a democracia e o acesso à cultura, à memória e aos processos de identificação e pertencimento da sociedade paulistana. Sua execução demonstrou a acolhida do público e levou ao planejamento de mais duas edições em 2020.
Marcos Cartum
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Diretor do Departamento dos Museus Municipais da Cidade de São Paulo
FOTO: Juan Quintas
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Anhangabaú de 1862 a 1934
O ano de 1862 marca o início do registro fotográfico das ruas e arredores da cidade de São Paulo por iniciativa de Militão Augusto de Azevedo (Rio de Janeiro, 1837 - São Paulo, 1905). As imagens registradas a partir daquele ano revelaram o panorama da cidade e geraram, por análise visual, conhecimento sobre a sociedade e seu cotidiano — o que anteriormente era apenas descrito em raras ilustrações ou imaginado a partir da leitura de textos e da transmissão oral. A ideia de uma cidade moderna e cosmopolita, impulsionada pela nova fase econômica e por correntes migratórias, demandava a construção do Viaduto do Chá, ligando o núcleo original da cidade aos novos bairros que surgiam a oeste, como República, Consolação, Higienópolis, Vila Buarque e Campos Elíseos. Previsto no plano de melhorias e embelezamento da região central idealizado por Jules Martin, o viaduto foi inaugurado em 1892, propiciando a afluência dos paulistanos e favorecendo o deslocamento do comércio e dos serviços. Nas décadas seguintes, a população de São Paulo testemunhou a transformação do ambiente rural do vale no parque Anhangabaú. O surgimento dos teatros São José e Municipal impulsionou a construção dos palacetes simétricos do conde Prates e o prédio projetado para sua residência, bem como o edifício da Associação Comercial. A convergência das fachadas para o Anhangabaú conferiu grande beleza à paisagem, formando um
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dos mais importantes cartões-postais da cidade. A intensificação do tráfego não previsto de veículos e bondes pesados comprometeu a estrutura de metal do primeiro Viaduto do Chá, forçando a Prefeitura a buscar um novo projeto. A proposta selecionada teve autoria do arquiteto Elisiário da Cunha Bahiana, e o novo viaduto foi inaugurado em 1938. Nos anos seguintes, a parte ajardinada do Anhangabaú foi reduzida para a implantação do plano viário desenhado por Prestes Maia, interligando as regiões norte e sul. As demolições dos palacetes, ocorridas em 1935 e 1970 para a elevação de prédios na margem da antiga cidade, originou importantes debates sobre a paisagem em São Paulo, suscitando ações de preservação do patrimônio edificado e a elaboração de políticas públicas guiadas pela cautela com o caráter efêmero do cenário urbano.
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Largo São Bento de 1862 a 1934
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Na região da colina em que a vista alcançava a várzea dos rios Anhangabaú e Tamanduateí, no antigo lugar onde morou o cacique Tibiriçá, foi erguida, em 1598, a capela dedicada a São Bento. Em 1650, foi edificada a igreja que existiu até os primeiros anos do século XX, demolida para a construção do colégio, do claustro e da basílica Nossa Senhora da Assunção, que, a partir de 1914, formaram o conjunto conhecido como Mosteiro de São Bento. O largo e a rua São Bento concentraram uma parte importante dos serviços de hotelaria e de restaurantes disponíveis na cidade no fim do século XIX, possivelmente devido à movimentação de passageiros na Estação da Luz. Em 1904, a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos (Igreja do Rosário) foi demolida para a formação da Praça Antônio Prado — local privilegiado do cenário cosmopolita que predominou na cidade naquele momento. A partir das décadas seguintes, a verticalização ganha impulso com a construção dos Edifícios Martinelli e Altino Arantes (antigo Banespa, hoje Farol Santander), transformando para sempre a paisagem da Rua São Bento.
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Praça da Sé de 1862 a 1975
Acredita-se que o surgimento do Largo da Sé tenha se dado em data próxima à do surgimento do Pátio do Colégio. Sabe-se que em 1593, no terreno de uma antiga capela, começou a ser construída a primeira Igreja Matriz, demolida em 1745, e algumas residências foram erguidas ao seu redor. A construção da Catedral da Sé, que está registrada nas fotografias de 1962, iniciou-se em 1745, quatro anos depois do início das obras da Igreja de São Pedro dos Clérigos, situada perpendicularmente a ela. As duas igrejas do largo se articulavam com outras próximas na constituição de um calendário de festividades religiosas, o que reforçou o desenho imaginário do perímetro que ficou conhecido como Triângulo Histórico. As melhorias executadas na segunda metade do século passado conferiram um aspecto urbanizado ao Largo da Sé. Os antigos lampiões a querosene fixados na fachada das casas foram substituídos pelos modelos a gás dispostos sobre postes de metal, implantados em 1872. Nos anos seguintes, todo o espaço recebeu calçamento de pedras e foi executado o alinhamento das calçadas. Dispostos ao lado da Catedral, tílburis de aluguel transportavam a população, e foram instalados pontos de parada para os bondes que se deslocavam para bairros mais distantes. Na esquina com a Rua Direita, o Café Girondino se destacava como local de sociabilização. Por iniciativa do poder público, uma obra de grande impacto foi realizada em 1911 com a demolição da Igreja Matriz e de toda a quadra à sua
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volta, expandindo o antigo largo para uma ampla praça com novos prédios — o terreno do antigo Teatro São José foi reservado para a construção da atual Catedral da Sé. A operação possibilitou o surgimento de uma paisagem consonante com a valorização da capacidade empreendedora paulistana que predominou na primeira metade do século passado, culminando com os festejos do IV Centenário de Fundação de São Paulo, em 1954. A atual aparência da praça foi desenhada na década de 1970, quando foi construída a estação do Metrô, obra que exigiu a demolição da Praça Clóvis Beviláqua e dos prédios situados à direita da Catedral. Inaugurada em 1978, a Estação Sé propiciou o acesso de milhares de usuários à praça que, a partir daquele momento, ampliou-se com a integração da Clóvis Beviláqua.
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O educativo da Jornada do Patrimônio 2019 – Memória Paulistana surge para criar relações de pertencimento da população com os bens protegidos nos diversos territórios da cidade de São Paulo e promove formação e conscientização de maneira lúdica. Organizadas a partir de uma seleção de bens representativos das cinco regiões da cidade (centro, norte, sul, leste e oeste), cada caixa contém um jogo da memória sobre imóveis tombados e um dominó sobre obras de arte e monumentos em espaços públicos. Complementam essas caixas dez cartões com perguntas sensibilizadoras, que estimulam os jogadores a pensar sobre suas memórias e seu lugar na cidade; e 22 cartões de pesquisa com fotografias e textos explicativos referentes aos bens culturais de cada região. É uma ferramenta que (re)apresenta o patrimônio histórico e cultural da cidade para novos públicos, em especial para os frequentadores das bibliotecas, centros culturais, casas de cultura e museus da Secretaria Municipal de Cultura. Esses jogos foram criados com o objetivo de entreter, divertir e, principalmente, informar sobre alguns bens que formam o patrimônio cultural da cidade de São Paulo. Mas o que pode ser considerado “patrimônio cultural”? Toda manifestação cultural que representa um grupo social ou a sociedade como um todo, que foi produzida e criada no passado, é uma herança que pode ser considerada como patrimônio cultural dessa mesma sociedade. Essas heranças do passado apresentam significados reconhecidos pelas pessoas por conta de muitos valores, entre eles o histórico, o afetivo, o artístico e o paisagístico. Esses bens podem ser tanto materiais (edifícios, espaços urbanos, objetos,
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obras de arte etc) como imateriais (danças, músicas, manifestações religiosas, festas, feiras etc). Quando esses bens são considerados importantes para uma parcela da sociedade, esta, por meio de instituições públicas oficiais, reconhece seu valor, aplicando medidas legais que os valorizam, protegem e preservam. Essas ações podem ser o tombamento, o registro, o zoneamento especial, entre outras. A organização e difusão de acervos que fazem parte de museus, arquivos históricos, bibliotecas e coleções também são formas fundamentais para a proteção e divulgação dos bens culturais. Tão ou mais importante que essas medidas oficiais de preservação, é o reconhecimento desses valores pelas próprias comunidades onde esses bens se localizam ou são produzidos e usufruídos. Isto por conta da importância dos valores afetivos e de memória que tais manifestações propiciam para esses grupos sociais. E por que é importante preservar esses bens culturais? Porque o acesso às referências de memória e às manifestações culturais de uma comunidade é um direito fundamental de qualquer cidadão. E esses bens do passado, mesmo em constante mudança, expressam a diversidade e a riqueza de se pensar e representar a vida, o mundo e a própria sociedade. A proposta é que, ao se entreter com estes jogos, a população possa conhecer e se reconhecer nos diferentes bens do patrimônio cultural, distribuídos pelos bairros e regiões de São Paulo.
Walter Pires
Arquiteto do Departamento do Patrimônio Histórico da Cidade de São Paulo
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educativo da jornada do patrimônio
(Re)conheça seus Bens Culturais
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Como desdobramento do educativo da Jornada do Patrimônio 2019 – Memória Paulistana, foi desenvolvida a mostra “(Re)Conheça Seus Bens Culturais”, abrangendo cinco exposições em diversas estações metroviárias da cidade. Em parceria com o Metrô de São Paulo, a Viaquatro e a Via Mobilidade, a mostra apresentou imóveis tombados e monumentos organizados nas cinco regiões macro da cidade, com objetivo de criar relações de pertencimento entre a população e os bens protegidos nos diversos territórios.
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educativo da jornada do patrimĂ´nio
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119 FOTO: Juan Quintas
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imรณveis histรณricos
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HISTร RICOS
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Vila Itororรณ. FOTO: Vicente Sisla Zeron
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imóveis históricos
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arquivo
HISTÓRICO MUNICIPAL O Arquivo Histórico Municipal ocupa, desde 2000, o Edifício Ramos de Azevedo, localizado na Praça Coronel Fernando Prestes. Inaugurado em 1920, este edifício serviu como sede do Gabinete de Eletrotécnica da Escola Politécnica. Em 1987, o prédio foi adquirido pela Prefeitura e, em 1999, paulatinamente, setores do Arquivo Histórico começaram a ser transferidos para o edifício.
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oficina: “Memórias de São Paulo – Fotografia Ecológica” (FOTO), por Fabiana Ferreira Rocha.
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imóveis históricos
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biblioteca
MÁRIO DE ANDRADE Fundada em 1925 como Biblioteca Municipal de São Paulo, é a maior biblioteca pública da cidade e a segunda maior do País, superada, apenas, pela Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro. Foi inaugurada, em 1926, na Rua 7 de Abril, com uma coleção inicial formada por obras que se encontravam em poder da Câmara Municipal de São Paulo, em cujo prédio a Biblioteca funcionava. Em 1937, incorporou a Biblioteca Pública do Estado e, a partir de então, importantes aquisições de livros, muitos deles raros e especiais, enriqueceram
seu acervo. O crescimento deste e dos serviços oferecidos ocasionou a mudança da Biblioteca para o atual edifício, localizado na Rua da Consolação. Inaugurado em 1942, o novo edifício, projetado pelo arquiteto francês Jacques Pilon, é considerado um marco da arquitetura moderna em São Paulo. oficina: “Paulicéia Desvairada – Por Dentro da Biblioteca Mário de Andrade”, por Melissa Szymanski.
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espaços culturais
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biblioteca
MONTEIRO LOBATO A Biblioteca Infantil Municipal foi criada em 14 de abril de 1936 como parte de um amplo projeto de incentivo à cultura elaborado por um grupo de intelectuais liderado por Mário de Andrade, então diretor do Departamento Municipal de Cultura. É a mais antiga biblioteca infantil em funcionamento no Brasil e precursora de outras similares, tanto no município como no interior
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do estado de São Paulo, graças à educadora Lenyra Camargo Fraccaroli, que, além de dirigir a biblioteca até 1960, também incentivou e supervisionou a construção de bibliotecas infantis em vários bairros da capital. oficina: “Memórias Paulistanas de Tatiana Belinky” por Thais Matarazzo Cantero.
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imóveis históricos
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casa
DE DONA SEBASTIANA O casarão que abriga a atual sede da Superintendência Paulista do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) foi construído na primeira década do século XX para ser residência de Dona Sebastiana de Sousa Queirós. Localizado na Avenida Angélica, nº 626, em Santa Cecília, apresenta-se como exemplar
remanescente da arquitetura civil paulista do período republicano.
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imóveis históricos
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casa
DE DONA YAYÁ Um dos últimos exemplos das chácaras que circundam a região central da cidade, a Casa é conhecida pela história de Sebastiana de Mello Freire, a Dona Yayá. Órfã, herdeira da fortuna da família, foi diagnosticada como doente mental. Passou a receber tratamento em casa, morando lá de 1920 até sua morte, em 1961. O imóvel foi adaptado para
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os padrões hospitalares, funcionando como um sanatório particular onde Dona Yayá ficava isolada. Bem cultural e lugar de memória, a Casa hoje é sede do Centro de Preservação Cultural da Universidade de São Paulo.
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FOTO: Bruno Andrade
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FOTO: Bruno Andrade
casa
RANZINI O arquiteto Felisberto Ranzini ergueu sua residência na então Rua Santa Luzia, nº 3. O imóvel foi concluído em 1924. Atualmente, abriga uma associação com a missão de preservar, estudar e divulgar o patrimônio histórico, artístico e arquitetônico da cidade. A foto ao lado é da oficina “Sob Cores das Aquarelas de Thomas Ender”, que analisou as produções do artista austríaco enquanto viajava
pela cidade de São Paulo sob a luz do formalismo acadêmico, dando destaque para os aspectos da pintura de paisagem, e propôs a produção de aquarelas a partir da referência estética. oficinas: “Bordando Patrimônio: Casa Ranzini”, “Bordado
e Memória na Casa Florentina”, “Sob as Aquarelas de Thomas Ender”, por Laura Carneiro Pereira Tirapeli
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imóveis históricos
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FOTO: Bruno Andrade
castelinho
DA RUA APA O Castelinho da Rua Apa, construção concluída em 1917, faz parte da primeira ocupação urbana do bairro de Santa Cecília, sendo um dos poucos remanescentes do início do século XX no município de São Paulo que reflete a realidade da belle époque paulistana. Tombada pelos órgãos de preservação por sua relevância histórica, cultural e arquitetônica. A imagem ao lado é um retrato da oficina
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“Caderno de Memórias”, que fez parte das atividades programadas para a Jornada do Patrimônio 2019. oficinas: “Caderno de Memórias” (FOTO), “Imãs Patrimoniais”, “Stickers Territoriais”, por Nayara Patente; e “O Inventário como Recurso da Educação Patrimonial”, “São Paulo das Estórias, Lendas e ‘Causos’”, por Aline de Cássia Martins.
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centro cultural
BANCO DO BRASIL O Centro Cultural Banco do Brasil São Paulo (CCBB SP) ocupa o prédio construído em 1901 na Rua Álvares Penteado, n° 112, esquina com a Rua da Quitanda. Localizado no coração histórico da cidade, numa via hoje de pedestres, o edifício foi comprado em 1923 pelo Banco do Brasil. Em 1927, após uma reforma projetada pelo arquiteto Hippolyto Pujol, tornou-se o primeiro prédio próprio do Banco do Brasil na capital. A construção foi inteiramente reformada para abrigar o CCBB SP. Os elementos originais foram restaurados, mantendo assim as linhas que o tornam um dos mais significativos exemplos da arquitetura do início do século. oficina: “Cartografia dos Fluxos”, por Cauê Donato;
“Estilos Arquitetônicos no Centro Histórico”, por Genebaldo Ferreira Lima.
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FOTO: Bruno Andrade
chácara
LANE
A Chácara Lane – imóvel tombado em 2004 pelo Conpresp (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo) – é remanescente de uma antiga chácara paulistana construída no final do século XIX e uma importante referência histórica para a memória dos assentamentos urbanos na cidade. Naquele final de século, os moradores mais abastados possuíam, além da sua moradia
no núcleo urbano central, chácaras localizadas em áreas próximas ao centro da cidade ou nos seus arrabaldes para o lazer familiar.
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conjunto franciscano
DO LARGO SÃO FRANCISCO A Igreja das Chagas do Seráfico Pai São Francisco da Venerável Ordem Terceira de São Francisco da Penitência de São Paulo é uma igreja colonial localizada no Largo São Francisco, no Centro Histórico de São Paulo, que, juntamente à Igreja de São Francisco, é uma construção de enorme importância dentro do quadro urbanístico da antiga Vila de São Paulo de Piratininga.
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oficinas: “Caminhada Cultural – As Mais Belas
Pinturas das Igrejas Coloniais de São Paulo”, “Visita Monitorada ao Conjunto Franciscano” (FOTO), “Tebas, o Arquiteto - Protagonismo Negro no Triângulo Histórico de São Paulo”.
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FOTO: Ana Lucia Armigliato
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FOTO: Ana Lucia Armigliato
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“Pelo fato de morar no centro da cidade e coordenar uma igreja histórica, Igreja de São Francisco, no Largo de mesmo nome, participei das últimas edições das Jornadas do Patrimônio promovidas pela Prefeitura. Sempre fui um entusiasta da história e da vida social do centro de São Paulo. Creio que o ‘centrão’ guarda segredos a serem ainda revelados. No meu ponto de vista, a edição deste ano foi um verdadeiro espetáculo de organização e investimento. Desde o material de divulgação, até os eventos externos, como ‘O Grande Cortejo’, por exemplo, foram pensados e realizados com maestria. Meu desejo é que as próximas Jornadas sejam deste nível para melhor”.
Frei Alvaci Mendes da Luz
Proponente da Visita Monitorada ao Conjunto Francisco do Largo São Francisco e Imóveis Portas Abertas
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d’ouro
ANTIGO
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Loja de móveis e objetos antigos, com 90 metros quadrados, localizada na parte térrea de um dos quatro blocos de prédios que formam um conjunto arquitetônico, construído em 1940, com projeto assinado pelo arquiteto Rino Levi. Em frente está o Castelinho da Rua Apa.
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edifício
MARTINELI Primeiro arranha-céu da América Latina, o Edifício Martinelli está localizado no centro de São Paulo, entre as Ruas São Bento, Avenida São João e Rua Líbero Badaró. O Edifício foi projetado em 1924 por seu idealizador, o italiano Giuseppe Martinelli, e simbolizou o progresso da cidade. Mais de 600 operários trabalharam nas obras. Com 20 andares, a construção foi iniciada em 1924, e a inauguração ocorreu em 1929.
Com o passar dos anos, novos pisos complementam a construção. O objetivo de Martinelli, contudo, era chegar aos 30 andares. A obra gerou muita polêmica, pois até então não havia nenhum prédio em São Paulo com grande altura. Na época, edifícios com mais de dez andares eram considerados muito altos.
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estação
DA LUZ
O prédio da Estação da Luz foi inaugurado em março de 1901 como São Paulo Railway Station. O projeto arquitetônico, com referências ao Big Ben e à Abadia de Westminster, ambos em Londres, é de Charles Henry Driver, e suas estruturas foram importadas da Inglaterra. Além da estação de trem, ele abriga, desde 2006, o Museu da Língua Portuguesa, que atualmente passa por
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obras de restauro e reconstrução, após um incêndio em dezembro de 2015. oficina: “Patrimônio Construído da Luz”, por Maria Beatriz
Andreolli, e “Patrimônio Industrial e Urbanização nos Bairros da Luz, Bom Retiro e Campos Elíseos“, por Luana G. Vieira da Silva.
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FOTO: Walter Pires
igreja
EVANGÉLICA LUTERANA A Igreja, inaugurada em 1908, possui arquitetura neogótica, com o altar pintado à mão pelo artista plástico Miguel Anselmo; e os vitrais originais feitos por Conrado Sorgenicht, mesmo vitralista do Mercado Municipal. Após queda do Edifício Wilton Paes de Almeida, em 2018, a Igreja foi parcialmente destruída e, na Jornada, foi
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possível acompanhar o andamento das obras de reconstrução e restauração.
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FOTO: Walter Pires
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igreja da ordem terceira
DE NOSSA SENHORA DO CARMO A Igreja da Ordem Terceira do Carmo foi fundada na segunda metade do século XVII por um grupo de leigos, a maioria bandeirantes, como uma capela contígua à Igreja de Nossa Senhora do Carmo, inaugurada em 1592 e demolida em 1928. A edificação atual foi erguida em taipa de pilão, entre 1747 e 1758. Entre 1772 e 1802, foi ampliada e ganhou um novo frontispício, executado por Joaquim Pinto de Oliveira,
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o “mulato Tebas”, escravo do mestre de obras Bento de Oliveira Lima, responsável por outras obras da arquitetura religiosa da São Paulo colonial. Em 1929, o templo passou por uma ampla reforma, sendo parcialmente reconstruído. oficina: “Caminhada Cultural – As Mais Belas Pinturas das Igrejas Coloniais de São Paulo”.
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FOTO: Bruno Andrade
palacete
CONDE DAS SARZEDAS O Palacete Conde de Sarzedas foi construído em fins do século XIX pelos descendentes do 5º conde de Sarzedas. A família viveu no local até 1939 e passou alugar o imóvel, sendo precariamente conservado após esse período. Por meio da Resolução nº 15/2002, o Conselho Municipal de
Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp) tombou a edificação que, atualmente, abriga a sede do Museu do Tribunal de Justiça.
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museu
DA SANTA CASA Situada na Vila Buarque, a Santa Casa de Misericórdia tem sua história atrelada ao desenvolvimento da cidade de São Paulo a partir de 1560. Considerada o hospital mais antigo da capital, teve seu conjunto arquitetônico tombado no ano de 2010.
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oficinas: ““Contação de Histórias Paulistanas”, “Roda dos Expostos de São Paulo”, ambas por Thais Matarazzo Cantero.
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MUMBI O imóvel tombado é sede do MUMBI (Museu Memória do Bixiga), que tem o objetivo de preservar o patrimônio material e imaterial das diferentes populações que ocuparam e ocupam o histórico bairro da Bela Vista, popularmente conhecido como Bixiga.
oficinas: “Fotografias & Afetos: Preservação Digital das Memórias Familiares”, por Ingrid Hötte Ambrogi; “Criação de Narrativas de Patrimônio”, por Bruna Donegá Alves; e “Roteiro dos Equipamentos de Cultura do Bixiga”, por Edison Hitoshi Hiroyama.
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FOTO: Vicente Sisla Zeron
vila
ITORORÓ A Vila Itororó é um conjunto arquitetônico idealizado por Francisco de Castro, com mais de dez edificações construídas ao longo do século XX para fins residenciais e de lazer. A Vila está localizada na encosta do Vale do Itororó, na divisa entre os bairros da Liberdade e da Bela Vista, na região central da cidade de São Paulo, e ocupa uma área de cerca de 6 mil metros quadrados, no miolo de uma quadra.
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oficinas: “Conservação de Madeiras - Técnicas de
Conservação e Manutenção Baratas e Viáveis”, por Clark dos Santos Alves; “Prospecção Estratigráfica na Vila Itororó”, por Mariana Victor de Faria; “O Tempo e o Cão - Documentário Cênico em Canteiro Aberto”, por Marcos Marcelo Soler; “Leitura Crítica da Cidade de São Paulo“, “Literatura Negra e Memória Paulistana”, ambas por José Abílio Ferreira; e “Xilo na Vila”, por Luciano Favaro.
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reintegração
DE POSSE
FOTO: Alicia Peres
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imóveis históricos
A construção da Vila Itororó teve início em 1909, mas nunca foi concluída conforme a vontade de Francisco de Castro, seu proprietário e idealizador, morto aos 55 anos de idade, em dezembro de 1932. Ela nasceu no terreno onde também nasce o riacho do qual herdou o nome tupi (queda d’água), hoje encoberto pela Avenida 23 de Maio. A longa e prosaica escadaria, circundada por estranhas edificações, dá acesso ao pátio central de paralelepípedos que se abre muito abaixo do nível da Rua Martiniano de Carvalho, no Bixiga. O emblemático conjunto de moradias se estende quase até a margem esquerda do riacho Itororó, que servia de esconderijo para negras e negros rebelados contra o regime escravista. Quase quatro décadas depois da morte de Castro, nasceu nesse mesmo espaço a família negra formada pelo poeta Jorge, sua mãe (personagem sem nome) e sua irmã Zefa, interpretados, respectivamente, pelos atores Zózimo Bulbul, Cléa Simões e Léa Garcia, no único filme produzido e dirigido por Antunes Filho, “Compasso de Espera” (1969). Mais alguns anos e vem ao mundo, também na Vila Itororó, por meio do conto “A Casa de Fayola”, publicado pela primeira vez no 8º volume (1985) da antologia anual “Cadernos Negros”, o casal negro Fayola e Alexandre. Em 2008, atraído pelas luzes das casas da Vila, aportou por ali, para nunca mais sair, o grupo de teatro Impulso Coletivo. Aquilombarse na luta dos moradores rebelados contra o processo de desapropriação que a partir de 2013 transformaria a Vila, de lugar de moradia, em espaço público de animação cultural. Na construção da resistência, o grupo criou a peça “Cidade Submersa” (2010), um documento
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poético teatral dessa experiência de derrota. Agora, por ocasião da 5ª edição da Jornada do Patrimônio (2019), o mesmo Impulso Coletivo materializou Fayola e Alexandre nas dependências da Vila Itororó, adaptando o conto para o teatro e encenando-o, juntamente com uma nova apresentação de “Cidade Submersa” e uma exposição iconográfica no Galpão do, agora já consolidado, espaço de animação cultural Vila Itororó Canteiro Aberto. O título – REINTEGRAÇÃO DE POSSE – da intervenção de dois dias, recupera as formulações de Beatriz Nascimento e de Erica Malunguinho para marcar a nossa posição: este não é o modo mais justo de habitar a Vila ou qualquer outro espaço com história e vocação de moradia.
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FOTO: Alicia Peres
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FOTO: Alicia Peres
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espaços
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centro de memórias
DO CIRCO
oficinas: “Largo do Paissandu, Onde o Circo se Encontra”, “Arquitetura Nômade Circense”, “Bordados Circenses”, “Cenografia com Materiais Reciclados”, “Demonstração de Pinturas de Circo” (primeira foto à direita), “Demonstração de Desenho de Circo” (segunda foto à direita), “Demonstração de Tabuletas Circenses”, “Malabares” (FOTO).
O circo sempre inspirou diversos artistas na produção das mais variadas obras de arte. Um pintor e um desenhista usam o circo como inspiração e o Largo do Paissandu como cenário para a composição de uma obra e oferece materiais para o público registrar suas
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próprias impressões da interação entre o circo e a cidade. A foto acima é de uma das oficinas de malabares, uma das artes de circo, praticada desde a antiguidade, podendo ser realizada com diversos aparelhos diferentes, com bolas, claves, aros, bambolê, contato etc. Os artistas ofereceram ao público a oportunidade de assistir e aprender o malabarismo com bolas, com claves e o de contato.
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o andar oficina:
“Caderno de Colagem com Memórias Paulistanas” (FOTO), por Sofia Lemos Tomaz de Aquino.
Cortes e retalhos da vida podem ser deixados de lado e uma nova vida pode ser construída, ou seja, uma nova colagem. Por meio da colagem, pode-se desenvolver um pensamento plástico de desconstrução do real e, com isso, formar novos conteúdos e caminhos poéticos. Na oficina, foi
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proposta a confecção de um diário de memórias de cada participante no cenário paulistano.
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espaços culturais
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FOTOS: Marcelo Hashimoto
ocupação
9 de julho
oficina: “Cartografia da Experiência: Ocupando e
Construindo o Território” (FOTO), por Mariana Amália de Carvalho Castro e Silva.
O espaço público é um lugar ocupado, não apenO espaço público é um lugar ocupado, não apenas pelos prédios, comércio, praças ou patrimônios culturais, mas pelas pessoas. Cada um que circula pelo território da cidade imprime em sua memória, um pedaço de si. A vivência na cidade é importante na prática da diversidade social.
A socióloga Mariana Amália, o ativista André Chiarati e a Ocupação 9 de Julho convidaram a população de São Paulo a mapear lugares e experiências no território da cidade de São Paulo, pois todos são atores que dão sentido ao espaço. Em uma cartografia coletiva, aliada a imagens do patrimônio cultural, atores históricos e imaginação própria, construiu-se em conjunto um mapa da experiência na cidade.
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imóveis históricos
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roteiros
DE MEMÓRIA
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Viaduto Santa Ifigênia. FOTO: Letícia de Caroli
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centro
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a cidade
E OS CORTIÇOS O percurso buscou resgatar essa que foi, historicamente, a forma de moradia popular no centro: os cortiços. Para refletir sobre o viver na região central, foram traçados paralelos entre essa tipologia e as dificuldades de permanência de sua população, desde o levantamento dos cortiços de Santa Ifigênia para o “Relatório da Comissão de Exame e Inspecção das Habitações Operárias”, em 1983, até as diferentes formas de ocupar a região nos dias atuais. Organizado por Giovanna Strengari Nanci Fluminhan.
afluentes do Anhangabaú
ENTRE HISTÓRIAS E CANTOS A proposta deste roteiro de memória foi transmitir informações sobre a história dos afluentes do Rio Anhangabaú, como os córregos (atualmente canalizados) Saracura, Itororó e Bexiga. Para realizar esse objetivo, foram apresentados aspectos sociais, curiosidades, ‘causos’ e mistérios, alternados com cantos e poesias. Organizado por Vanessa Cristina de Novaes.
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FOTO: Matheus do Val
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roteiros de memória
centro
arquitetura de preservação
PEQUENAS VISITAS A GRANDES EDIFÍCIOS
O Centro de São Paulo guarda edifícios que são ícones arquitetônicos, sendo possível encontrar diferentes estilos um ao lado do outro. Há o clássico de Jacques Pilon, o moderno de Niemeyer e Oswaldo Bratke, e a mistura moderna, nouveau, clássica e déco de Artacho Jurado. Como fazer a gestão desse acervo? Os edifícios Louvre, Linneu Gomes e São Luís abriram as portas de suas áreas comuns, e o Copan encerrou o roteiro no seu terraço, numa conversa sobre o cotidiano da gestão desses bens. O roteiro fez parte da mobilização de síndicos de tombados do Centro por políticas públicas de preservação. Organizado por Vivian Moreno Barbour.
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roteiros de memória
centro
avenida paulista:
UMA HISTÓRIA ALÉM DOS BARÕES DO CAFÉ
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Até onde é verdade que a Avenida Paulista era apenas o lugar de moradia dos barões do café em São Paulo? É um espaço de luta e contradições, em que também passaram imigrantes, operários, antigos escravos e outros personagens, além daqueles que sempre são lembrados: os barões do café. O roteiro abordou as várias modificações arquitetônicas que a avenida passou em seus mais de 120 anos de existência, além de destacar os projetos urbanos que o poder público e a iniciativa privada realizaram para formar uma das vias mais conhecidas e emblemáticas da cidade. Organizado por Renata Geraissati Castro de Almeida.
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roteiros de memória
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artistas italianos
NAS PRAÇAS DE SÃO PAULO O roteiro abordou trabalhos de escultores italianos e sua importância para a identidade cultural da cidade. Iniciando a caminhada no Vale do Anhangabaú, na obra do artista Luigi Brizzolara, um conjunto de esculturas em homenagem ao compositor Carlos Gomes, e a obra do artista Amadeo Zani representando o músico Giuseppe Verdi. Seguiu-se para o Pátio do Colégio com outra obra de Zani, relatando a fundação da cidade de São Paulo. Finalizaram o passeio com a singela obra “O Engraxate e o Jornaleiro”, do artista Ricardo Cipicchia, na Praça João Mendes. Organizado por Diego dos Santos Veiga Silva.
bike
TOUR Com roteiros passando pela Avenida Paulista, Parque Ibirapuera, centro velho e Vila Madalena, o Bike Tour SP convidou os participantes para uma redescoberta dos locais, passando por pontos turísticos marcantes da cidade, patrimônios culturais e históricos paulistanos, como centros culturais, bares, restaurantes e museus. Organizado por Daniel Moral Ramos.
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roteiros de memória
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caminhos da arquitetura moderna
NO CENTRO NOVO
Embalado pelo movimento mais humano– andar a pé–, o roteiro teve como objetivo resgatar a identidade cultural paulistana e fortalecer o sentimento de pertencimento à cidade. Após mapear os edifícios hoje tombados do período moderno de São Paulo (1930 a 1968), foi montado um percurso com 18 prédios – de edifícios modernos à arquitetura eclética. Organizado por Wanessa Spiess.
da literatura de Alcântara Machado
PARA O PATRIMÔNIO EDIFICADO PAULISTANO Com o olhar histórico e geográfico, o roteiro transcende os limites da obra. Saindo do Bixiga, caminhou-se na reflexão, observando a construção de condomínios e das moradias. Na Escola de Samba Vai-Vai, houve um debate sobre a presença negra na região que muitas vezes não é lembrada. Percebeu-se as tensões da valorização imobiliária, o que modificou e vem modificando na região principalmente com a chegada do metrô e de outros empreendimentos. Por fim, chegando à área mais nobre do Bixiga, onde a obra se consagra na paisagem urbana, mas com suas transformações e diversidades. Organizado por Aline de Cássia Martins e Ulysses Melo Carvalho.
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em busca dos modernistas:
HISTÓRIA, ARTE E LITERATURA PELAS RUAS DO CENTRO Este roteiro propõe resgatar a memória e influência dos Modernistas nas transformações ocorridas na cidade durante as primeiras décadas do século XX. Passaram por locais onde Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Tarsila do Amaral, Anita Malfatti, Menotti Del Picchia, entre outros, frequentaram e fizeram história, seja com seus encontros profissionais, artísticos e até mesmo amorosos. Organizado por Mariana Mantovani.
lavapés O Cambuci é um bairro rico em memória, com histórias marcantes ao longo de seu desenvolvimento. A Capela Nossa Senhora de Lourdes, erguida pela devota Eulália Assumpção e Silva, em 1870; A instalação do museu do Ipiranga em 1890, e a inauguração da linha de bonde que atravessava o Cambuci, contribuíram para a valorização do bairro. Organizado por Diego dos Santos Veiga Silva.
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roteiros de memória
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FOTO: Virgínia Talaveira Valentini Tristão
jardim da luz:
MEMÓRIA, IDENTIDADE E PATRIMÔNIO CULTURAL PAULISTANO Primeiro parque público da cidade, o Jardim da Luz é um ponto de referência de significativos acontecimentos que deixaram suas marcas na história e contribuíram para a formação da identidade da cidade de São Paulo. Esse parque cheio de encantos é um território que guarda a memória da urbanização da capital.
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Para encerrar a jornada, foi identificada em uma árvore genealógica importantes personagens que fizeram parte da história do território. Organizado por Virgínia Talaveira Valentini Tristão.
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roteiros de memória
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patrimônio industrial e urbanização
NOS BAIRROS DA LUZ, BOM RETIRO E CAMPOS ELÍSIOS Com enfoque na industrialização e urbanização da região que abrange os bairros da Luz, Bom Retiro e Campos Elíseos, o roteiro percorreu o conjunto das antigas instalações da Escola Politécnica, chaminé da Usina Elétrica da Luz, Estação da Luz, Pinacoteca, Parque da Luz, Estação Pinacoteca, Estação Júlio Prestes e Museu da Energia. Organizado por Luana Gonçalves Viera da Silva.
pernaltada
TURÍSTICA
A caminhada com pernas de pau leva a enxergar e sentir a cidade de outra forma: as variações de solo são mais notadas, as perspectivas visuais são alteradas, relacionar-se a partir de um ponto elevado gera novas conexões consigo mesma/o. Nesses roteiros, a verticalidade da perna de pau faz um paralelo com a verticalização da cidade de São Paulo, ao mesmo tempo que leva as pessoas, que já estão acostumadas com o centro, a serem despertadas para um novo olhar. Organizado por Rachel Monteiro dos Santos. FOTO: Guilherme Ribeiro Awazu
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roteiros de memória
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patrimônio construído
DA LUZ
O Bairro da Luz encontra-se na região central da cidade de São Paulo, bastante heterogêneo no que diz respeito ao aspecto patrimonial. Concentrando diferentes edificações de períodos históricos distintos, torna-se um lócus simbólico para a discussão da memória da cidade. Desta forma, o roteiro buscou passar por edifícios do patrimônio presentes no bairro:
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Pinacoteca do Estado de São Paulo, Jardim da Luz, Estação da Luz, Estação Pinacoteca, Sala São Paulo e Estação Júlio Prestes. O intuito foi apresentar um panorama geral do património construído neste bairro, seus edifícios e histórico, discutindo quais questões estão colocadas sobre o patrimônio neste local.
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roteiros de memória
“O “Roteiro de Memória – Patrimônio Construído da Luz” foi pensado para ser realizado a pé, passando por importantes edificações patrimoniais que compõem a paisagem deste lugar. Iniciou-se a visita a partir da elucidação sobre a urbanização e consolidação da ocupação da região, apontando importantes eixos de transporte que marcam o desenho deste território. A presença das linhas férreas Sorocabana e São Paulo Railway modificou de forma radical a organização do tecido urbano e compuseram, junto da Avenida Tiradentes, importantes eixos de circulação da cidade. A vinda da ferrovia trouxe consigo uma ocupação do entorno e que hoje é marcado por um esvaziamento. É ainda um espaço emblemático de disputa de diversos atores, com os projetos previstos para “revitalização” da área, alavancados pela valorização dada pelos equipamentos culturais e infraestrutura urbana instalada em contraposição à diversidade de habitantes e movimentos de luta por moradia.
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Durante a visita, foi pontuado o histórico de cada edificação, sua solução formal e de uso/reuso/restauro, sugerindo aos participantes do roteiro uma reflexão acerca das diferenças de materiais novos/antigos, das especificidades de apropriações, os diferentes públicos e usos. Essa reflexão também se deu a partir da perspectiva dos programas adotados em cada um destes edifícios, cuja maioria se destina ao uso cultural, que, no caso das estações de trem, convivem com seu uso original. Os participantes foram envolvidos na discussão e parecem ter se atentado para a diversidade de camadas que permeiam a discussão patrimonial, com resultado bastante positivo”.
Maria Beatriz Andreotti
Proponente do Roteiro de Memória “Patrimônio Construído da Luz’’
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territórios negros
NA SANTA IFIGÊNIA O roteiro percorreu alguns territórios negros que fazem parte da história da cultura negra em São Paulo. Saindo do largo que abrigava a Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, demolida em 1903 para dar lugar à atual Praça Antônio Prado, seguiram em direção à Basílica de Santa Efigênia, passando pelo Mosteiro São Bento, importante marco da contribuição do famoso mestre-pedreiro Tebas, negro escravizado que realizou obras fundamentais na cidade. Posteriormente, passaram pelo o Largo do Zunega, que em 1953 foi
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renomeado como Largo do Paissandu. Visitaram ainda locais de antigas pontes que concentravam lavadeiras, quituteiras, vendedores de ervas, entre outros, como a Ponte do Acu. Por fim, percorreram a Rua Formosa em direção ao Largo do Piques, onde eram comercializados os escravizados em São Paulo e também local de muitas lutas e resistências. Organizado por Edimilsom Peres Castilho.
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trilhando o minhocão,
POR QUÊ NÃO?
O centro de São Paulo sempre foi espaço de intensa circulação. Caminhar por uma via destinada ao trânsito motorizado, contemplando a paisagem e refletindo sobre as transformações presentes, pode ser uma experiência única. O polêmico Minhocão, que alterou profundamente a dinâmica da região, é um território cheio de urbanidades que merece ser desvendado a pé, pois nele há de tudo um pouco. O roteiro da trilha, que se iniciou na Praça Roosevelt, revelou as transformações do centro velho, patrimônios culturais, o verde urbano, novos usos da
cidade, rios invisíveis, manifestações culturais e outros elementos que compõem a identidade paulistana. Organizado por Guilherme Leite Gaudereto.
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FOTO: Guilherme Ribeiro Awazu
vivências negras
NA METRÓPOLE
O centro de São Paulo sempre foi espaço de intensa circulação da população negra nos primórdios da abolição. Ali, viviam e trabalhavam e foram sendo expulsos em nome do progresso, mas deixaram suas marcas visíveis nas memórias de suas ruas como uma forma de resistência, que este roteiro buscou recuperar. Organizado por Fábia Barbosa Ribeiro.
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FOTO: Bruna Morandi
vozes feministas
NO CEMITÉRIO DA CONSOLAÇÃO
O roteiro teve como objetivo revelar o universo feminino no Cemitério da Consolação de modo a apontar as mulheres de maior vulto pelas posições de destaque que alcançaram na história, como também algumas anônimas, permitindo aos participantes promover uma reflexão quanto ao papel da mulher na sociedade. Organizado por Angela Maria Arena.
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SPcine
NA JORNADA
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A Spcine integrou a programação da Jornada do Patrimônio 2019 – Memória Paulistana, da Secretaria Municipal de Cultura, com sessões de cinema do Circuito Spcine e a visita guiada ‘São Paulo Audiovisual’. Realizado nos dias 17 e 18 de agosto, o evento contou com sua maior edição desde a criação, celebrando histórias, memórias, pessoas e lugares que traduzem o nosso patrimônio histórico e cultural. Um dos destaques da programação da Spcine na Jornada do Patrimônio 2019 foi a visita guiada “São Paulo Audiovisual”, no sábado (17). Conduzida por mim e pela equipe da São Paulo Film Commission, a atividade disponibilizou 50 vagas e recebeu o dobro do público previsto. Cem pessoas acompanharam o roteiro, que partiu do centro de São Paulo para apresentar a cidade e seu espaço público como um grande cenário. Ao todo, foram percorridos 20 pontos icônicos utilizados como locações para gravação de novelas, séries, videoclipes e filmes. Nesses locais, por exemplo, foram gravadas produções nacionais e internacionais, entre elas o longa-metragem “Ensaio Sobre a Cegueira”, de Fernando Meirelles, e a série premiada “Black Mirror”, da Netflix. A programação inovadora oferece ainda mais de 40 sessões de cinema do Circuito Spcine, com documentários realizados com investimento da Secretaria da Cultura para o programa “História dos Bairros de São Paulo”. As atividades contemplaram todas as salas dos CEUs e do Centro de Formação Cultural Cidade Tiradentes, na semana de 15 a 21 de agosto, e contaram com mais de 1.800 espectadores. Todas as sessões de cinema do Circuito Spcine na Jornada do Patrimônio 2019 foram abertas com a exibição de um curta ganhador do edital
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Histórias dos Bairros de anos anteriores. Quinze títulos de curta-metragem, sempre relacionados ao bairro no qual a sala está localizada ou a outros vizinhos, integraram a programação: “Uma Cidade Chamada Tiradentes”, “Itaquera em Movimento”, “A Cidade que Nasce na Luz”, “Jabaquara - Terra dos Contrastes”, “Capão Redondo - Sintonia da Quebrada”, “Jaçanã e o Adoniran”, “Guaianases - Expresso Ururaí - Lajeado”, “Santa Efigênia e Seus Pecados”, “Na Trilha de São Miguel”, “Perus, Uma História Feita de Ferro, Cimento e Amor”, “Ermelino é Luz”, “7 Voltas - Histórias do Parque Dom Pedro II e Mercado Municipal”, “Grajaú: Onde São Paulo Começa”, “Jaraguá - Terra sem Mal” e “Parelheiros - Extremo Sul”. Também foram realizadas duas sessões no Cine Olido, exclusivamente com curtas das “Histórias dos Bairros”: “Os Tempos da Aclimação”, “Vale do Anhangabaú - Sala de Visitas de São Paulo”, “Bixiga: a Bela Vista do Palco Brasileiro”, “25 de Março: Caixa Mágica”, “Doces Lembranças - Histórias Saborosas do Pari”, “Pompeia e Vila Romana - A Geografia de Caminhos Diferentes”, “Santa Efigênia e seus Pecados” e “Santana em Santana”.
Laís Bodanzky
Diretora-presidente da Spcine
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memória paulistana
Entre os inúmeros motivadores da criação do Triângulo SP havia o destaque de ser um quadrante com inúmeros patrimônios materiais tombados nas esferas municipal, estadual e até federal. Além de congregar a história do nascimento da capital e do seu desenvolvimento ao longo de mais de 460 anos. Mas somente isso não seria um fator de atração turística, ainda que compreendido, principalmente na academia, que identidade, memórias, patrimônios imateriais ou materiais, e mesmo imaginários culturais típicos, sejam fatores bem relevantes na decisão da experiência turística. E pensando na experiência do turista, a Secretaria Municipal de Turismo de São Paulo (SMTUR) passou a fomentar ações que valorizassem o território e o desenvolvesse economicamente, socialmente e culturalmente, surgindo então o recente Triângulo SP. Desde 2018, ano de criação da SMTUR, implantamos e fomentamos eventos diversos que valorizassem a região, que tivessem interseccionalidade com outras áreas e, principalmente, que respeitassem e valorizarem a diversidade e multiplicidade de culturas. E aí surgiram o Festival de Natal de São Paulo, o Históricos de São Paulo, o Festival do Café no Triângulo SP, o Poesia no Centro, e apoiamos eventos que temos um carinho muito grande, como, por exemplo, a Jornada do Patrimônio. Cada ano pensamos em como evidenciar esta história, tradição, imaginários e culturas presentes e confluentes na região central da cidade. A Jornada do Patrimônio cumpre muito essa função de resgatar e evidenciar o preciosismo da história e memória paulistana. E que sejam longos e duradouros os anos deste precioso evento.
Vander Lins
Coordenador de Eventos da Cidade Secretaria de Turismo da Cidade de São Paulo
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É a nossa história!
Por Ana Melo, voluntária e participante da Jornada do Patrimônio 2019
A Jornada do Patrimônio tem um significado muito especial para mim. Desde que vim morar em São Paulo, eu participo como voluntária, e nesse ano, com a possibilidade de poder escolher como eu poderia contribuir com o evento, decidi vivenciá-lo como o público geral, estar do outro lado da experiência, podendo ainda colaborar com ela. A princípio, eu iria conhecer os quatro cantos da cidade, pelo menos um lugar em cada canto, mas como participei do Cortejo no sábado, me restou somente o domingo para conhecer os demais prédios. Esse era realmente o passeio que eu mais queria fazer, pois não sei você, mas eu passo em frente a um edifício e já tenho vontade de entrar para ver como é por dentro. Admito que sou muito curiosa. Comecei minha jornada pelo Museu da Imigração, e que lugar incrível, um local realmente fantástico. Em tempos de xenofobia, o Museu nos lembra que somos todos imigrantes nessa terra tão grande que é o Brasil, e principalmente que São Paulo recebe ainda hoje muitos estrangeiros. O Museu é enorme e merece ser visitado, eu passei umas boas duas horas lá dentro, vendo tudo com muita atenção. Esse fato me fez desistir de ir aos quatro cantos da cidade, e acabei optando por me dirigir ao centro, onde haveria muito mais prédios relativamente próximos uns dos outros. E devo admitir que o Cortejo me fez querer entrar em cada
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um dos edifícios que havíamos passado em frente. Desci na Sé e fui visitar o Solar da Marquesa de Santos, uma casa que ainda preserva muitas de suas características originais, como a banheira que a própria marquesa utilizava. Instalações podiam ser vistas no local: “Monumento Nenhum” e “Chacina da Luz”. Assim que eu vi, pensei que eram destroços de alguma guerra, e era essa ideia de massacre que a obra queria passar, da falta de cuidado que se tem com o patrimônio público. Outra exposição ocupava a sala, “Tombo”, em que a discussão era a respeito da mudança de pensamento analógico para o digital. Já no andar de cima, havia uma exposição falando sobre o IV Centenário da cidade, mostrando diversos fatos do evento e as origens da cidade. Em seguida, desci o Beco do Pinto, que servia de passagem para muitas pessoas, e que fica entre o Solar e a Casa nº 1. O imóvel ganhou esse nome por ter sido a primeira casa da Rua do Carmo a receber numeração oficial. Ela abriga o acervo iconográfico da cidade, no qual pode-se ver a evolução da metrópole em mais de 700.000 mil fotografias. No dia da minha visita, havia duas exposições: a primeira delas chamava-se “Não Oficial”, uma série de fotos relatando eventos da alta sociedade, que são atemporais. Se não fossem as datas nas fotos, eu confundiria os anos que ocorreram, percebi que poucos costumes mudaram. A outra mostra era “Cara/Corpo/Voz”, uma obra extremamente sensível no que tange à representação de transexuais, apresentando uma série de fotografias que retrata as mais diferentes pessoas trans, como é essa transformação e aceitação. Acredito que, de todas as exposições, essa foi a que mais me prendeu. Não consigo relatar
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a sensação ao observar aquelas pessoas que têm mais coragem que qualquer um, para conseguir sair nas ruas do país que mais mata transexuais. Todos esses três espaços fazem parte do conhecido Museu da Cidade. Em seguida, dirigi-me até o Centro Cultural Banco do Brasil, onde estavam montando a exposição sobre May Ray, portanto só consegui visitar o edifício. É maravilhosa a possibilidade de poder entrar em tantos imóveis antigos, ver sua decoração e descobrir o tanto de histórias que se escondem neles. Devo ter entrado em uns três prédios por engano nessa empolgação, até chegar ao Palácio do Comércio, fundado em 1902, sob o nome de Escola Prática do Comércio, a primeira turma teve cerca de 200 alunos. Atualmente, é conhecida como Fecap, e o prédio abriga as turmas de pós-graduação e mestrado. O imóvel possui diversos itens importados e de luxo, como os azulejos portugueses, o piso Belga e as escadarias de Mármore Carrara. Lá se formaram diversas personalidades, como Ruth Cardoso e Moreira Salles. Um prédio realmente importantíssimo não só para a história da cidade, como para a história da educação e, principalmente, da contabilidade no País. De lá, parti para a Igreja das Chagas, que é da Ordem Franciscana, por essa razão possui um cemitério interno, onde estão enterradas pessoas importantes da época, como Brigadeiro Luís Antônio, além dos três homens que estão retratados atrás de Dom Pedro I no quadro “Independência ou Morte”, de Pedro Américo. O coração do Padre Feijó se encontra preservado no local. Além disso, eles estão juntando peças para fazer um pequeno museu, mostrando os artefatos
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antigos da igreja. É possível encontrar lá o primeiro órgão de tubos da capital, que foi montado em 1801. Uma igreja muito bem restaurada e lindissimamente decorada. Uma das coisas que mais me encanta nesse evento é o quão expressivo ele é no sentido de dar voz a coisas que são sufocadas no dia a dia. Ao abrir o patrimônio da cidade, são reveladas as diversas “são paulos” que existem, não é uma São Paulo de direita ou de esquerda, de héteros ou do público LGBTQIA+, de índios ou dos imigrantes… É uma São Paulo de todas essas pessoas juntas, é uma caldeirão cultural que ferve 24/7. É uma cidade que grita por ser vista, que precisa ser escutada. É uma cidade que precisa parar, olhar para ela mesma, entender sua história, e isso significa reconhecer seus erros, e evoluir como cidade. Alguns até brincam que não é terra de ninguém… Mas São Paulo é terra de todos que possuem a mínima vontade de batalhar por ela, que têm o desejo de transformá-la no melhor para quem nela vive. Todos deveriam conhecer pelo menos um pouco do lugar onde habitam, para entender o que o torna tão único, qual é esse motor que impulsiona a cidade. A Jornada não pode ser descrita, ela precisa ser vivenciada, pois como o nome diz é a jornada de cada um, descobrindo a própria história, descobrindo onde se encaixa em todo esse cenário complexo de estátuas, prédios, ruas e, principalmente, histórias.
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O Cortejo de Memória da Leste percorreu o Centro Histórico da Penha, criando um grande roteiro para celebrar manifestações culturais, memória, lugares e pessoas da zona leste da capital paulista. Em parceria com o Grupo Ururay - Patrimônio Cultural, o espetáculo a céu aberto integrou o Festival Tombamento, um dos eventos mais importantes de valorização do patrimônio histórico e cultural da região. A programação do Cortejo evidenciou artistas e personagens que apresentam um recorte importante da memória regional e revelou as particularidades históricas, contemporâneas e suas conexões com a memória paulistana. Grupos expressivos da região conduziram o espetáculo. Cordão Folclórico de Itaquera Sucatas Ambulantes, Cordão Carnavalesco Dona Micaela, Kambaia, Folia de Reis do Oriente da Vila Nhocuné, Jongo dos Guaianás e Cordão Sucatas Ambulantes retrataram a região, que é o maior polo (i)migrante do País.
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Ações culturais na Zona Leste
Pelo Grupo Ururay Patrimônio Cultural
Os anos de 2018 e 2019 configuraram um momento interessante na história das ações culturais na zona leste de São Paulo, acompanhando um movimento maior na cidade que apontou, nesses últimos dois anos, um aumento nos trabalhos relacionados às temáticas do patrimônio cultural, cidade e a questão da história local. Panorama bastante diferente daquele encontrado nos anos que antecederam à formação do Grupo Ururay, pelo qual atuamos e que teve seu surgimento em 2014. Por volta desse ano, a discussão da cultura na chave do patrimônio histórico-cultural ainda era incipiente nas regiões periféricas, havia poucos grupos e pesquisadores, que atuavam de maneira dispersa nos territórios. Na época, temos como referências na região a identificação do Grupo de Memória da Zona Leste, atrelado aos esforços de moradores e da comunidade de Ermelino Matarazzo; e o Movimento Cultural da Penha, que tinha em uma de suas linhas de ação a articulação com a Comunidade do Rosário dos Homens Pretos da Penha de França. Esses dois grupos foram responsáveis pela produção dos primeiros Seminários sobre os Patrimônios Históricos da Zona Leste (2014). Hoje, seis anos depois, vemos a região virar um expoente de diferentes coletivos e linhas de trabalho, com ações da Cohab II a Ermelino, da Penha a São Miguel, de Guaianases a São Mateus, do Brás ao Carrão. Grupos formados em universidades
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públicas e privadas, outros articulados dentro de equipamentos educativos e culturais, grupos de professores de redes de ensino, coletivos culturais, centros de memória, entre outros, cuja maioria tem à frente moradores, estudantes, ativistas e demais trabalhadores nascidos, criados e com vínculos de pertencimento nessas regiões. As inúmeras formas de trabalho nessa área permitiram também reflexões que levaram a uma maior diversidade de linhas de ações por parte de coletivos, como roteiros educativos, atividades de produção cultural, organização de acervos e projetos na linha do turismo de base comunitária, uma opção de desenvolvimento local e envolvimento comunitário amplamente difundida pelos moradores de diferentes bairros da zona leste. Em 2015, dentro desse processo, o Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) inaugurou a Jornada do Patrimônio, que hoje está em sua 5a edição. O evento foi identificado pelos grupos, pesquisadores e coletivos como uma importante iniciativa pública de incentivo ao desenvolvimento de atividades de valoração do patrimônio histórico-cultural, que neste ano reuniu mais de 93 ações somente na região leste, diretamente ligadas ao patrimônio material e imaterial (oficinas, exibições de filmes, bate-papos e roteiros). A Jornada do Patrimônio possibilitou a identificação de uma demanda muitas vezes não associada às periferias e regiões não centrais, revelando o interesse de indivíduos e comunidades nos debates de direito à memória, das relações de pertencimento e identidade, do reconhecimento do seu território como referência de narrativas contra-hegemônicas, de debates sobre as complexidades territoriais, de pensar a respeito de
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seus referenciais históricos, da relação entre novas e antigas manifestações culturais, além de outros aspectos presentes na construção do bairro e da vida de seus moradores. Na Penha, o Grupo Ururay vinha de dois anos (2018-2019) de articulação e ações com grupos locais, escolas e professores, apoiadas pelo projeto “Heranças Periféricas”, contemplado pelo edital de Fomento à Cultura da Periferia, conquista dos grupos de cultura periféricos paulistanos. Na Jornada, o Grupo tinha como proposta desenvolver uma ação cultural chamada Festival Tombamento, atividade pensada para o fortalecimento das relações com os patrimônios históricos e suas relações com a comunidade, experiência que desenvolvemos na Capela de São Miguel Paulista, em articulação com seu museu e na Casa de Cultura Raul Seixas, na Cohab II, no bairro de Itaquera, cuja principal proposta foi despertar olhares para os patrimônios materiais por meio do patrimônio imaterial, envolvendo dinâmicas que informem e reflitam sobre o território em questão. A partir do convite e copatrocínio do DPH e da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, a proposta incluiu a ação Cortejo de Memória, realizada em outros pontos da cidade de São Paulo, trazendo para a zona leste como ponto de discussão as relações em torno da Igreja do Rosário dos Homens Pretos da Penha de França, patrimônio reconhecido não só pelos órgãos de preservação municipal e estadual de São Paulo, como também pela comunidade afro-brasileira presente na Penha e em bairros adjacentes, pessoas que há 19 anos realizam um trabalho de salvaguarda, formação, afirmação de comunidade e atividades no campo da memória.
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A atividade foi dividida em dois momentos: uma apresentação dos grupos de cultura dentro do patrimônio, envolvendo debate e trocas de experiências sobre tradições e renovações de suas práticas, somando à proposta do DPH de um Cortejo de Memória, que passou pelas principais ruas do bairro, recentemente reconhecidas também no tombamento do outeiro histórico do bairro da Penha. Também tivemos uma feira afro com o coletivo Meninas Mahin, e gastronomia com a barraca da Comunidade do Rosário, somados à Feira dos Povos Andinos, que todos os domingos está presente no Largo do Rosário. Entre grupos mais velhos e mais jovens, a curadoria do evento na zona leste foi desenvolvida de forma autônoma, na qual buscamos envolver algumas manifestações que possuem uma relação ou diálogo com o bem em questão. Dentro disso, pudemos dividir os grupos em três eixos: religioso, da cultura popular e voltado às presenças mais recentes no bairro. Diretamente ligados ao catolicismo popular, tivemos como representantes o Grupo Cambaia, de Mogi das Cruzes, com o Mestre Silvio Antônio, presente desde a primeira edição da Festa do Rosário após sua retomada, que trouxe apresentações de moçambique de bastão vindas de uma tradição familiar; e a Companhia de Reis Estrela do Oriente da Vila Nhocuné. Há mais de 40 anos, o grupo dá continuidade a tradições mineiras, bastante ativas na época de reis, visitando casas em um extenso território que abrange bairros como Aricanduva, Sapopemba e Penha, na zona leste, e também de outras regiões da cidade, cumprindo com a tradição rural mesmo em território urbano, e tendo à frente a Dona Rosinha e o Mestre Ditão.
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Ligado à cultura popular, realizando pesquisas e resgate de manifestações populares brasileiras, seja de patrimônio cultural ou ambiental, o Cordão Folclórico de Itaquera veio configurando-se como o grupo mais jovem entre os convidados, renovando e explorando práticas tradicionais. Também nessa linha, o Jongo dos Guaianás, que há mais de dez anos desenvolve pesquisa na região de Guaianases, tem com prática a manifestação afro-brasileira que evoca as ancestralidades por meio do batuque, tambu, caxambu e outras manifestações. A aproximação com os dois grupos visou comunicar a respeito de elementos fortemente presentes na cultura paulistana, sendo ela influência para a formação de outros gêneros bastante conhecidos, como o samba rural e samba de umbigada. Nascido e composto por membros da Comunidade do Rosário dos Homens Pretos da Penha de França, outro grupo presente foi o Cordão da Dona Micaela Vieira, cujo convite não só visava contemplar uma comunidade já constituída e atuante no território, mas também atrair olhares para a proposta do Cordão, que celebra e debate a memória de uma mulher negra, parteira do bairro, homenageada com o nome de uma praça na Penha. A partir de sua história, o Cordão da Dona Micaela debate questões como o parto humanizado, o nascimento, o uso de ervas na medicina popular e a importância da memória daqueles pouco representados pela história oficial. Por fim, o Grupo Saya Afro Integración Bolívia tomou parte da programação devido a um fato recente: há cinco anos, o Largo do Rosário recebe aos fins de semana a Feira Andina, com forte presença de bolivianos, chilenos e peruanos. A experiência foi singular por ser a primeira vez
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que este grupo afro-boliviano realizava uma apresentação junto a brasileiros, uma vez que normalmente somente bolivianos participam. A aproximação com o grupo permitiu refletir sobre as ocupações recentes e elementos culturais que dialogam com as culturas locais, tendo inclusive reverberado em um desdobramento direto, que foram os Encontros Afro-Latinos, realizados em novembro e dezembro do mesmo ano, contando com artistas, barracas de gastronomia e artesanato de bolivianos e brasileiros a partir de uma curadoria com participação das duas comunidades. Em um balanço dessa ação cultural, destacamos quatro pontos essenciais, compatíveis com a metodologia de trabalho do Ururay e que também se alinham com a articulação junto ao DPH e à Secretaria de Cultura com seu Cortejo de Memória: 1. Acionar grupos que são atuantes nos territórios, de forte vínculo com o patrimônio da região que recebeu a programação da Jornada; 2. Fortalecer o diálogo entre grupo e público, no qual foi possível conhecer as diferentes culturas dos povos originários e da cultura brasileira e paulistana, em diferentes fases de pesquisa; 3. Fornecer e estruturar uma produção para os grupos, que contemplasse o custeio do seu transporte, alimentação e que fortalecesse seus trabalhos junto a sua comunidade (compra de instrumentos, manutenção de equipamentos, estruturação, remuneração de componentes, entre outras possibilidades que ficaram a cargo dos grupos);
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4. Realizar um intercâmbio entre os integrantes dos grupos, propiciando um maior tempo de troca de experiências. A atividade garantiu uma disponibilidade durante todo o dia e promoveu dinâmicas, nas quais os grupos puderam se assistir durante o Cortejo, tal como falar sobre suas práticas cotidianas e perspectivas no campo da continuidade dessas tradições.
Nesta breve avaliação, identificamos que a Jornada dos Patrimônio, somada às iniciativas desse novo contexto histórico-cultural, revela diversas possibilidades, seja para levar o debate do patrimônio para um número maior de pessoas, seja para refletir como os próprios grupos culturais vêm contribuindo ao debate público e o desenvolvimento de ações na perspectiva da memória, da história e do patrimônio, como potentes agentes da criação e consolidação de narrativas que venham a incluir, democratizar e pluralizar a história da cidade de São Paulo.
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FOTO: Ana Karina Fazza
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A Vila Maria Zélia é um conjunto arquitetônico, inaugurado em 1917, que foi construído para abrigar trabalhadores de uma fábrica têxtil, a Companhia Nacional de Tecidos e Juta. Tinha em torno de 198 casas, duas escolas, creche, jardim da infância, farmácia, armazéns, capela, campo para práticas esportivas, consultórios médicos e salão de festas. Foi tombada em 1992 pelo Condephaat e pelo Conpresp por tratar-se de um bem cultural de interesse histórico, arquitetônico, econômico e social.
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SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA
A oficina “Centro História de Itaquera - História e Memória” propôs uma breve apresentação sobre o processo de formação local, a ocupação territorial e a atual disposição geográfica. Também foi realizada uma visitação do lado externo do prédio da Biblioteca e da Casa da Memória, espaços em processo de tombamento pelo órgão competente.
casa de cultura
HIP HOP LESTE
A oficina “Da Cabaça aos Sons do Xequerê” deu-se por meio das histórias da cabaça, sua utilização nas civilizações africanas e afro-brasileiras. Ao longo de três etapas de construção do instrumento, foram contadas as histórias da cabaça e os cuidados com o corpo para tecer o instrumento. Também contou com a oficina de danças africanas como patrimônio imaterial do Brasil. As matrizes africanas acreditam que um corpo que cede aos movimentos sagrados e históricos dos orixás é um corpo saudável. Trata-se de ceder ao sagrado, curar-se, ficar leve e flutuar ao som dos atabaques e cantos africanos. Neste processo, a dança tem papel nuclear, mas não se dança para o outro ou para fora. Dança-se para dentro e para honrar a África Ancestral.
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espaços culturais
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biblioteca
HANS CHRISTIAN ANDERSEN oficinas: “Caminhando e Lembrando pelo Tatuapé”, por Laércio Cardoso de Carvalho; “Livre de Desenho Arquitetônico” (FOTO), por Karen Viegas.
“Foi a minha primeira experiência na Jornada do Patrimônio, oferecendo a oficina “Livre de Desenho Arquitetônico”. Diferente das outras vezes que apliquei a oficina, para a Jornada decidi fazer um encontro para todas as idades. Para a minha surpresa, o público foi na maioria crianças, nos dois encontros! Fiquei muito feliz e emocionada ao ver os pequenos observando a arquitetura da Biblioteca e expressando em seus
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desenho o espaço construído, despertando o olhar, criando vínculo e pertencimento à arquitetura, junto com seus familiares, que também puderam experimentar o desenho livre do espaço. Essa experiência reafirmou minha vontade de trabalhar a questão do direito à cidade com as crianças por meio do desenho de arquitetura. E aproveitando, agradeço a parceria da Biblioteca Hans e toda a equipe que nos recepcionou com muito carinho!”.
Karen Viegas
Proponente da Oficina Livre de Desenho
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espaços culturais
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biblioteca
RAIMUNDO DE MENEZES oficina: “Retalhos da Cidade: Partilhando Quem Eu Sou! Meu
Bairro, Minha Biblioteca, Minha Cidade!” (FOTO), por Jeane Aparecida da Silva.
“Na Praça Padre Aleixo Mafra, São Miguel Paulista, frente à Capela dos Índios, patrimônio histórico, trocamos histórias, os idosos trouxeram um pouco de si, aliado ao progresso da cidade: sabe ali, foi onde eu casei, sabe lá, eu dei o meu primeiro beijo, sabe acolá... não posso contar...Caminhamos
ao encontro de personagens que trouxeram sua relação com esta cidade, e a Biblioteca Raimundo de Menezes foi apresentada por quem fez história com ela, funcionários há mais de duas décadas em um vídeo de minutos, contando sobre os espaços por onde passou no bairro, até a sua chegada no local em que está hoje”.
Jeane Silva
Proponente da Oficina “Retalhos da Cidade: Partilhando quem eu sou! Meu Bairro, minha Biblioteca, minha Cidade!”
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biblioteca
VICENTE DE CARVALHO oficina:
“Conjunto José Bonifácio- História e Memória” (FOTO). A oficina “Conjunto José Bonifácio - História e Memória” propôs uma breve apresentação sobre o processo de formação local, a ocupação territorial e a atual disposição geográfica. Foram utilizados recursos audiovisuais (fotos, livros, jornais, revistas e filmes), seguidos de esclarecimentos junto ao público presente. Finalizando a apresentação, foi realizada uma visitação ao lado externo do prédio da Biblioteca, à Igreja Santa Terezinha, ao Parque Raul Seixas e ao Casarão Sabbado D’ ngelo. Algumas dessas construções estão em processo de tombamento pelo Patrimônio Histórico.
FOTO: José Carlos F. Lima
casa de cultura
DE SÃO MATEUS oficina: “A História do Parque São Rafael contado em Prosa e Poesia”, “Dread e a Difusão do Movimento Reggae/Rastafari” (FOTO) e “Memórias d@s Sambistas de São Mateus”.
A oficina ”Dread e a Difusão do Movimento Reggae/Rastafari” visou incentivar pessoas a conhecerem a cultura reggae que hoje é patrimônio intangível da humanidade reconhecido pela Unesco. Suas raízes estão nas culturas africanas, como a rastafari, e trazem uma mensagem transformadora de paz e de amor, que se torna uma grande ferramenta de transformação social, ainda mal utilizada e pouco compreendida.
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2019
espaços culturais
zona leste
centro cultural
DA PENHA
oficina: “Nanquim Impressões da Penha”, por José
Wilson Magalhães.
O objetivo da oficina “Nanquim Impressões da Penha” foi realizar um workshop de desenho a nanquim retratando o próprio bairro da Penha, sua rotina, sua arquitetura, sua história, seus personagens e sua alma,
por meio de técnicas com tinta nanquim, pincel e outros materiais. Usando a linguagem artística das histórias em quadrinhos e ilustrações em preto e branco, desenhou-se a cena patrimonial e cultural da Penha.
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zona leste
espaços culturais
2019
CEU
SÃO MATEUS oficinas: “Desenho Criativo”, por Larissa Silva de Souza;
“Fotografia Documental” (FOTO), por Erick Teixeira Novais Dos Santos. A oficina de “Fotografia Documental” propôs um roteiro pelo bairro Jardim da Conquista, tendo desenvolvido o exercício do registro documental ao
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mesmo tempo que conheceu-se o bairro e suas histórias. Na “Saída Fotográfica”, foi passado para os alunos(as) que cada um(a) tiraria cinco fotos com pensamentos por trás. O importante era contar uma história e fazer um exercício do olhar por meio da fotografia.
2019
espaรงos culturais
zona leste
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fábrica de cultura
PARQUE BELÉM
oficinas: “Como Construir Sua Árvore Genealógica”, por Silvia Cristina Botelho; “De Lá pra Cá, Chegamos ao Belenzinho”, por Fabrizio Pereira Franco; “Memória Afetiva - Bairro do Belém”, por Renato Riani.
Apresentou-se o bairro do Belém e toda sua trajetória histórica na cidade de São Paulo, desde seu início com grandes fazendas a períodos industriais e capítulos mais recentes de seu desenvolvimento. O público passeou pelo entorno do Parque Belém, tendo contato com moradores antigos e/ou comércios que resistiram ao tempo pelo crescimento do centro de São Paulo. Foram captados pequenos relatos via celular para montagem de um vídeo entrevista sobre essas memórias afetivas de pessoas que são parte integrante do bairro.
fábrica de cultura
SAPOPEMBA
oficinas: “Danças Folclóricas da Nossa Arte e Cultura da Capoeira” (FOTO), por Júlio César Cândido Pontes; “Poesia e Memórias Marcantes do Seu Bairro”, por Marcelo Gonçalves Silva Torres.
A atividade teve como objetivo mostrar a essência e ensinamentos da capoeira, demonstrando como a musicalidade pode determinar o ritmo e o estilo do jogo que é realizado durante a roda. A música é composta de instrumentos e de canções, podendo o ritmo variar de acordo com o toque de capoeira, de bem lento (Angola) a bastante acelerado (São Bento Grande).
2019
espaços culturais
zona leste
sociedade
AMIGOS DA DALMÁCIA oficinas: “Como Achar Eslavos em São Paulo?”, “Crie a Sua História Imigrante, Recrie Seus Laços com a Cidade”; “Lumblija - O Pão da Memória da Croácia”, por Milan Puh.
A partir da experiência de realização da exposição sobre os 60 anos da comunidade croata Sociedade Amigos da Dalmácia, foi realizada uma oficina visando apresentar e discutir procedimentos e exemplos de aproximação entre o conjunto material, imagético e patrimonial de comunidades de migração e formas contemporâneas da exposição de suas coleções. Além disso, foi mostrado o patrimônio eslavo que se estabeleceu na cidade de São Paulo, evidenciando os que já existiram e os que continuam presentes por meio de análises de materiais documentais, imagens, mapeamentos que possibilitaram uma maior visibilidade deste grupo étnico pouco conhecido. A ênfase foi aguçar o olhar para a diversidade e a interconexão do processo imigratório na cidade a partir de um grupo de imigrantes, cujas contribuições ainda estão por serem valorizadas.
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roteiros
DE MEMÓRIA
4
zona leste
roteiros de memória
2019
a casa da minha vó
CAÇA AOS TESOUROS ARQUITETÔNICOS NO BAIRRO DA MOCCA O bairro da Mooca, foco deste roteiro, conserva seus ares de cidade do interior pelas moradias antigas ainda existentes. Construídas no início do século XX, as “casinhas de vó” aparecem com certa frequência em diversas ruas e despertam um sentimento nostálgico por manterem o cenário da época. Essas construções, embora não sejam bens tombados, configuram a paisagem da região e formam parte da identidade do
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local. Durante uma manhã de caminhada pelo bairro, um jogo de caça ao tesouro integrou crianças e adultos, que, por meio de fotos e ilustrações, (re)descobriram alguns imóveis marcantes da região. Organizado por Raisa Ribeiro da Rocha Reis.
2019
roteiros de memรณria
zona leste
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zona leste
roteiros de memória
2019
caminho
LESTE
Foi proposta uma conversa sobre o perímetro entre a estação de trem Ermelino Matarazzo e a Ocupação Mateus Santos, destacando a Avenida Paranaguá e a Praça Benedito Ramos. Os participantes receberam fotos antigas de pontos específicos desse percurso com o objetivo de observar a paisagem urbana, notando o que foi modificado ou o que foi mantido, com
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os mais velhos compartilhando suas lembranças com os outros participantes. Organizado por Marina Amaral Gouveia.
de lá pra cá
CHEGAMOS AO BELENZINHO “Olhar para a história do passado a partir dos registros da cidade é lidar com uma história do presente repleta de ausências e em ritmo acelerado de transformação. A Jornada do Patrimônio 2019 – Memória Paulistana trouxe no cerne de sua temática exatamente este desafio. Foi a terceira vez em que colocamos nas ruas este roteiro e chegamos ao Belenzinho, na maior edição do evento. Ficamos felizes em dividir o território com diversas atividades paralelas, fortalecendo o movimento de preservação da Memória Operária na Zona Leste”.
Fabrizio Franco e Beatriz Silvério, Proponentes do Roteiro de Memória “De lá pra cá chegamos ao Belenzinho”
memórias do lajeado:
OUTRAS NARRATIVAS
Este roteiro perpassou lugares do bairro de Lajeado, observando sua narrativa histórica a partir da estrada dos tropeiros, da antiga pensão que abrigava os viajantes e atual cemitério, assim como foram resgatadas as memórias da igreja Santa Quitéria, antiga igreja Santa Cruz do Lajeado, onde foi rezada a missa que fundou o bairro, assim como a relação dos trabalhadores com o Vale do Ribeirão e Olarias na região. O percurso mostrou a dinâmica de transformação do lugar pelo processo de ocupação e urbanização, ressaltando os movimentos sociais e culturais que trazem outra narrativa de luta e construção social. Organizado por Renata Adriana de Sousa.
zona leste
roteiros de memória
2019
pelas ruas
DA VILA MARIA ZÉLIA O roteiro iniciou com a projeção de um trecho do vídeo “São Paulo tem História”, seguida por explanação sobre a história da Vila Maria Zélia (o contexto de sua construção no início do século XX, sua relação com a industrialização e transformação urbana da cidade de São Paulo; seus processos de ocupação, mudanças de propriedade, modificações, tombamento e degradação). Após isso, foi feito um percurso pelas ruas da Vila,
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destacando aspectos significativos de sua arquitetura e história (chalés, armazéns, farmácia, escolas de meninos e de meninas, antigo alojamento dos solteiros, antigo quarador, Capela de São José). Organizado por Rosemari de Almeida.
2019
roteiros de memória
zona leste
“Participo da Jornada desde sua primeira edição em 2015. No ano 2019, trabalhei como pessoa física pela primeira vez e também pela primeira vez estive em outra atividade que não aquela em que estivesse trabalhando. Participei do Grande Cortejo na região central e achei maravilhoso. Chamou minha atenção o número de pessoas que procuraram pelo roteiro organizado por mim, “Pelas Rua da Vila Maria Zélia”. Foi o maior público em relação às edições anteriores. E também em relação ao interesse e à participação das pessoas durante o roteiro, com questões pertinentes e que nos chamavam à reflexão. Nos tempos atuais, a Jornada do Patrimônio tem sido um evento cada vez mais necessário e importante para a cidade e para o País”.
Rosemari de Almeida
Proponente de Roteiro de Memória “Pelas Ruas da Maria Zélia”
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zona leste
roteiros de memória
2019
movimentos de luta e resistência
NA PENHA DE FRANÇA
Tendo como ponto de partida o Memorial Penha de França, o roteiro passou pela Basílica Nossa Senhora da Penha, onde em 17 de setembro de 1977, durante a vigência da Ditadura Militar, recebeu o Ato Ecumênico por Justiça e Libertação. O segundo ponto de reflexão foi a Igreja Nossa Senhora dos Homens Pretos da Penha de França, cuja história remonta ao século XIX, com o processo de consolidação da Irmandade dos
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Homens Pretos, ligada à história de homens e mulheres escravizadas no bairro, ocupada atualmente pela Comunidade do Rosário a fim de ativar este patrimônio histórico da cidade. Organizado por Sophia Castellano.
2019
roteiros de memória
zona leste
rota
ENCONTRO DE POETAS Roteiro que se iniciou no Ponto de Cultura Casa de Luiz Poeta, local que reúne um grande acervo de fotos e imagens raras da formação do bairro de São Mateus e que recebe poetas, músicos e artistas da região local, onde ocorre um evento voltado ao encontro de repentistas. Passou também pela biblioteca do CEU São Mateus, que leva o nome de um antigo morador do bairro, Camilo Pedro Reis, um dos primeiros escritores
da região. Foi realizado um sarau de poesias voltado à história do bairro Parque Boa Esperança e também de toda a região de São Mateus. Organizado por Luiz Carlos Florentino Silva.
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roteiros de memória
2019
FOTO: Sylvia Masini
zona leste
rumo fotográfico
VILA MARIA ZÉLIA “O meu projeto foi levar dois grupos a conhecer a Vila Maria Zélia para fotografar esse conjunto arquitetônico que foi inaugurado em 1917 com o objetivo de abrigar os trabalhadores de uma fábrica têxtil. Hoje, infelizmente, os principais prédios, que pertencem ao poder público, estão abandonados e a natureza que invade os espaços transforma a arquitetura em um ambiente estético de muita beleza. A Associação Cultural Vila Maria Zélia, formada pelos moradores, faz um trabalho gigante para tentar manter as característica que ainda restam da época. Eles me deram todo apoio nesse projeto.
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Foram dois dias muito legais. Entre os participantes, tinham amigos, fotógrafos e pessoas que se interessaram pelo tema. Caminhamos pela Vila, fotografamos, visitamos a antiga escola, os armazéns, conversamos com alguns moradores. Esse contato com a história nos fez voltar para o passado e valorizar a cidade onde vivemos”.
Sylvia Masini,
Proponente do Roteiro de Memória “Rumo Fotográfico Vila Maria Zélia”
2019
roteiros de memรณria
zona leste
FOTO: Sylvia Masini
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FOTO: Sylvia Masini
226 FOTO: Juan Quintas
2019
jornada do patrimônio
zona leste
Celebrando a diversidade Por Uriel Barbosa Lira Cunha, articuladora e produtora cultural.
A Jornada do Patrimônio 2019 - Memórias Paulistanas simboliza a relação que quero ter e venho construindo com a zona leste e a cultura do território na qual estou me encontrando. O sábado foi dedicado aos roteiros de memória, espaços de troca com a cidade e as pessoas por meio de conversas e olhares questionadores das narrativas históricas e dos processos de ocupação da cidade. Na parte da manhã, o roteiro “Caminho Leste” me permitiu conectar o hoje com um período bastante diverso, de uma São Paulo em expansão, com moradias muito afastadas do centro, num processo promovido em particular por uma pessoa símbolo da cidade ainda hoje, Francisco Matarazzo. A região de Ermelino é diretamente decorrente do seu empreendimento e sua influência é inegável, e exatamente por isso deve também ser refletida de forma crítica. Na parte da tarde, participei do roteiro “Cultura Cohab Tour 2”, realizado no bairro onde moro, Itaquera, em que pude desfrutar de uma continuidade da experiência da manhã. Com uma abordagem mais atual, sem dissociar o contexto de ocupação do território, que sofreu um processo diferente, pude refletir sobre estas relações e sobre a apropriação e uso dos espaços públicos pelas pessoas. Assim, questionando decisões do poder público sobre os usos de prédios públicos, finalizamos a caminhada na Casa de Cultura Raul Seixas, espaço institucional, mas que representa de forma positiva a relação que estes equipamentos devem ter com a comunidade. Um bom exemplo é que encontrei diversas pessoas conhecidas, participando de outras atividades da Jornada e da programação da Casa.
Já o domingo me trouxe uma experiência mais participativa, pois junto ao grupo Cordão Sucatas Ambulantes tive a honra de tocar no Cortejo de Memória da Zona Leste no Largo do Rosário, compartilhando com diversos grupos o espaço e podendo conhecer um pouco mais da história dos mestres e das tradições da cultura paulista, isso dentro da Igreja Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, um lugar que inspira história e tradição. Neste dia, celebramos a diversidade da tradição, permitindo que o hoje se conectasse com a ancestralidade de forma mais nítida, visível para todos que se dedicaram a ver. Hoje me lembro com cada vez mais felicidade destes momentos, compreendendo o quanto minha região é rica em cultura e tradição, e o quanto hoje devo me permitir fazer cada vez mais pontes e conexões, dando continuidade aos movimentos que constroem a memória, a cultura e a nossa compreensão de patrimônio. Além disso, as reflexões não se esgotam, e, ao ver tudo isso (muito pouco perto do todo, eu sei), me pergunto: de que forma nossa história vêm fazendo parte da memória da cidade?
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cortejo de memรณria
DA NORTE
1
FOTO: Walter Pires
2019
cortejo de memória da norte
zona norte
Na Freguesia do Ó, coração da zona norte, o Cortejo de Memória da Norte evidenciou as manifestações tradicionais do território. A intervenção artística evocou e jogou luz sobre a importância de grupos e artistas para a preservação da memória paulistana. A programação foi das obras do artista plástico Salvador Ligabue, que compõem a Igreja Nossa Senhora do Ó; às memórias litúrgicas da Folia de Reis e Festa do Divino, que fazem parte da história do bairro, ruas e do seu entorno. Para celebrar o samba paulistano, patrimônio imaterial da cidade de São Paulo, foi realizada uma roda de choro com Fê Braga, e o Bando Bom encerrou o Cortejo com show na Casa de Cultura da Freguesia do Ó - Salvador Ligabue.
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cortejo de memรณria da norte
zona norte
FOTO: Walter Pires
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2019
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cortejo de memĂłria da norte
zona norte
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zona norte
2
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imรณveis histรณricos
2019
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imóveis históricos
zona norte
imóveis
HISTÓRICOS
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Igreja Matriz de Nossa Senhora do Ó
zona norte
imóveis históricos
2019
casa de cultura
DA VILA GUILHERME A Casa de Cultura da Vila Guilherme – Casarão é um equipamento da Secretaria Municipal de Cultura (SMC), inaugurado em 11 de junho de 2016 e localizado naquele bairro da zona norte. Construído em 1924 para abrigar o Grupo Escolar de Vila Guilherme, que depois veio a se chamar Grupo Escolar Afrânio Peixoto, o prédio funcionou como escola até 1970. Em 1977, tornou-se sede da Subprefeitura Vila Maria/Vila Guilherme e, em 2016, passou a integrar os equipamentos culturais da SMC. A proposta da oficina de “Cianotipia”, realizada na Casa de Cultura, foi apresentar o processo de gravação de fotografias em folhas emulsionadas por meio de
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imagens em transparência de patrimônios históricos da cidade de São Paulo, . Além de desenvolver a criatividade, capacidade artística e a liberdade de expressão, aprimora e sensibiliza para um novo olhar em relação aos Patrimônios Culturais espalhados pela cidade. oficina: “Cianotipia do Patrimônio”(FOTO) por Andréa Ferres Valverde.
2019
imóveis históricos
zona norte
FOTO: Andréa Valverde
FOTO: Andréa Valverde
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zona norte
imóveis históricos
2019
museu florestal
OCTÁVIO VECCHI O Museu Florestal foi concebido no fim da década de 1920 pelo então diretor do Serviço Florestal, Octávio Vecchi. O edifício, construído entre 1928 e 1930 e inaugurado em 1931, foi projetado especificamente para receber o acervo, bem como laboratórios de pesquisa que funcionaram no piso inferior entre as décadas de 1930 e 1960. A oficina “Xilogravura no Museu Florestal” se
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inspirou no acervo da instituição. Murais pintados por Antonio Paim, aquarelas do artista Alfredo Norfini, além do “Tríptico”, de Helios Seelinger, que interpreta três episódios da história de São Paulo, são exemplos das obras apreciadas pelos visitantes. Baseados neste acervo e revivendo a história, os participantes realizaram uma xilogravura e conheceram as matrizes dos alunos da Escola da Xilografia do Horto, que
2019
imóveis históricos
zona norte
FOTO: Carol Grespan
funcionou de 1940 a 1950, com a orientação do gravador alemão Adolf Kohler. Além disso, com a proposta de dialogar com o acervo de espécies nativas do Museu, foi realizada uma oficina de “Monotipia” com plantas desidratadas, uma forma de memória botânica impressa.
oficinas: “Monotipia com Plantas” e “Stêncil Botânico”, ambas por Carolina Grespan Carvalhães; “Trem das 11 - Estação Pedra Branca”, por Sergio Barbosa Braga; “Xilogravura no Museu”, por Maura de Andrade Novo.
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zona norte
imóveis históricos
2019
igreja matriz
DE NOSSA SENHORA DO Ó Em 1796, foi inaugurada a igreja dedicada a Virgem do Ó, construída onde hoje se situa o Largo da Matriz Velha, tornando-se paróquia pelo alvará de constituição de 15 de Setembro de 1796, concedido pela Rainha de Portugal. Essa igreja foi destruída em 1896, quando o sacristão acidentalmente a incendiou ao tentar espantar com fogo um enxame de abelhas na torre. A atual igreja foi inaugurada em 1901, construída em local próximo
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da anterior, na Praça da Matriz, que lembra muito uma cidadezinha do interior. Existem construções antigas, anteriores ao século XX, que, permeadas das novas construções, criam um misto de nostalgia e progresso. oficinas: “Caminhos do Ó”, por Gilberto Tomé; “Percorrendo os Coretos de Dominó da Freguesia do Ó”, por Ricardo Silva.
sítio
MORRINHOS Localizado na Rua Santo Anselmo, no Jardim São Bento, o Sítio Morrinhos é um conjunto arquitetônico composto pela casa sede, construída no início do século XVIII, por diversas construções anexas datadas da segunda metade do século XIX e outras do início do século XX. Todo o conjunto está implantado no centro de uma extensa área verde, formada por árvores frutíferas e ornamentais.
oficinas: “Memórias da Penumbra - Uma Experiência Sensorial com Lamparinas”, por Ana Cristina Chagas dos Anjos; “Observação do Céu”, por Beatriz Barcellos Machado.
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zona norte
espaรงos
CULTURAIS
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imรณveis histรณricos
2019
2019
imรณveis histรณricos
zona norte
3
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zona norte
espaços culturais
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biblioteca
ÁLVARES DE AZEVEDO oficinas: “Amor Tombado”, “Caça Tombo” (FOTO), “Caça Noturno”, todas por Luana Andreia Malavasi dos Santos; e “Mão no Barro”, por Priscila Poltoniere.
O coletivo Akangatu realizou uma oficina artística que ilustrou a evolução da Biblioteca Álvares de Azevedo, patrimônio histórico da cidade, e da região em que se localiza, por meio da arte do graffiti. Pensando
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na difusão cultural, serão disponibilizadas ao público técnicas dessa arte urbana para destacar diferentes aspectos de visualizar um patrimônio histórico.
2019
espaços culturais
zona norte
CEU
JAÇANÃ oficina: “Escavação Arqueológica Simulada”, “Réplicas de Fósseis”, ambas por Luís Gustavo Pereira Ferreira.
O CEU Jaçanã realizou duas oficinas: a primeira teve como objetivo transmitir aos participantes uma ideia precisa das condições necessárias para a formação dos fósseis na natureza e de como são feitas as escavações arqueológicas que permitem as descobertas que nos levam
a reconstituir o passado da Terra e da humanidade. A segunda recriou pigmentos e técnicas das sociedades da pré-escrita, levando ao público uma noção básica do universo da arte rupestre e proporcionado o contato com as dificuldades enfrentadas, as formas de registros usadas e com algumas das imagens rupestres mais populares nos dias atuais.
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zona norte
espaços culturais
2019
mirante
DA FREGUESIA DO Ó oficina: “Ó: Miradas da Freguesia” (FOTO), por Mariana Kimie da Silva Nito.
Na oficina “Ó: Miradas da Freguesia” foram identificados locais que são parte da história do crescimento de São Paulo em direção oeste e norte a partir do Mirante, utilizando cartões para focar a visão e apresentando imagens e textos de diferentes contextos
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históricos, referenciando-os aos lugares identificados nessa paisagem. O objetivo foi reiterar a importância estratégica da Freguesia como mirante e marco referencial da história da cidade.
2019
FOTO: José Pedro da Silva Neto
espaços culturais
zona norte
terreiro de candomblé
SANTA BÁRBARA
oficinas: “Memória do Terreiro de Candomblé Santa Bárbara: de Mona para Mona” e “Patrimônios Afro-Brasileiros em São Paulo” (FOTO), ambas por José Pedro da Silva Neto; e “Por Que Patrimonializar Terreiros?”, por Vagner Gonçalves da Silva.
As oficinas do Terreiro trouxeram a discussão sobre a necessidade de políticas públicas de patrimonialização que enfoquem os bens culturais de origem africana no Brasil. Nelas, foram relatadas a experiência de elaboração dos laudos antropológicos que subsidiaram os pedidos de
tombamentos de seis comunidades afro-brasileiras: Axé Ilê Obá, Terreiro de Candomblé Santa Bárbara, Casa de Culto Dâmbala Kuere-Rho Bessein, Ilê Afro Brasileiro Odé Lorecy, Ilê Olá Omi Axé Opô Araka e o Santuário Nacional da Umbanda. Com isso, discutiu-se esses territórios tradicionais – terreiros - vistos simultaneamente como instituições religiosas e forças civilizatórias na formação da cultura nacional.
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Mukuiu N’zambi, por Camila Spolon
“O solo sagrado que desce o orixá é caloroso e receptivo. É o abrigo aos corações angustiados, a coragem para os destemidos e a sabedoria para os que buscam a ancestralidade”.
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Mukuiu N’Zambi! “Que Deus te abençoe!”, diz a saudação da Nação Bantu a que pertence o Terreiro de Candomblé Santa Bárbara. A Rua Ruiva, localizada no bairro da Vila Brasilândia, guarda um dos maiores tesouros da zona norte da capital paulista, o primeiro terreiro de candomblé que se tem registro na cidade, fundado pela Mãe Mam’etu Manaundê, e atualmente dirigido pela Mãe Pulquéria. Uma baiana, filha de escravizados, chega a São Paulo na década de 50, abrindo seu terreiro no ano de 1962. Julita Lima da Silva faleceu em 2004, com aproximadamente 97 anos (não se sabe ao certo quanto tempo depois de nascida Julita foi registrada, por isso sua idade é aproximada). Ela tem um longo legado dentro da religião, sendo uma das sacerdotisas mais antigas dos povos tradicionais de matriz africana. Com seu falecimento, o terreiro permaneceu fechado por um período, tempo este necessário para cumprir as cerimônias fúnebres. “De mona para mona, a mulher começou, a mulher continua”, dizia mãe Manaundê ao demonstrar a vontade de que sua sucessora fosse uma outra mulher. Em 2014, após um período fechado, o terreiro foi reaberto sob a liderança de Mãe Pulquéria, uma das filhas de Mãe Manaundê e herdeira do cargo, como forma de realizar o desejo de sua mãe. Com 57 anos de existência, o terreiro enfrentou a intolerância religiosa e obras públicas que ameaçavam a sua construção e memória, sendo necessário um estudo em caráter emergencial sobre a importância de preservação, e o reconhecimento do terreiro como sítio arqueológico em 1997 pelo Iphan, como forma de valorizar e evitar tal atrocidade. No mesmo ano de sua
2019
espaços culturais
reinauguração, uma nova ameaça de obra pública põe em risco a sua existência, e um pedido para registro do terreiro como patrimônio imaterial do Estado de São Paulo é instaurado no Condephaat. As atividades produzidas pela Jornada do Patrimônio no terreiro Santa Bárbara contaram com a presença do professor doutor da USP Vagner Gonçalves da Silva, do cientista social PUC-SP Pedro Neto, da diretora técnica do Condephaat Elisabeth Mitiko, da Mãe Pulquéria e da comunidade local, que esteve presente, compartilhando suas experiências e histórias acerca do assunto. O Terreiro Santa Bárbara exemplifica o sentido de tradição, pois há mais de meio século a prática do candomblé se mantém viva, passada de geração em geração e sobrevivendo ao ritmo frenético das grandes cidades. A importância da tradição é tamanha, que há um conjunto de leis e decretos, reconhecidos inclusive pela Unesco, que preservam as práticas das comunidades e grupos que foram recebidos pelos seus ancestrais e repassadas a seus descendentes, são esses os patrimônios imateriais. No Brasil, há mais de 30 práticas reconhecidas pelo Iphan e que estão salvaguardadas pelo Estado, tendo seus registros divididos nas seguintes obras: “Livro de Registro dos Saberes” (relacionados à cultura, memória e identidade de um grupo social), “Livro de Registro das Celebrações” (reúne a ritualística das festas, comidas, trajes etc); “Livro de Registro das Formas de Expressão” (abrange as manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdica) e “Livro de Registro dos Lugares” (onde se realizam as práticas culturais coletivas, como praças e santuários). Falar de tradição é relembrar práticas que
zona norte
reforçam nossos valores, tais como liberdade, fé, integridade, educação, responsabilidade, ética e moral. As religiões de matriz africana estão intimamente ligadas a essa prática. Religiões que trazem os seus ensinamentos na oralidade e que dependem da boca de quem conta a história, mas principalmente dos ouvidos de quem sabe ouvir para mantê-la viva. Na África, os contadores de história recebem o nome de griots. É de responsabilidade deles passar para as novas gerações as técnicas, os mitos e principalmente as tradições. Utilizando instrumentos como o agogô e o akoting, os contadores de história se tornavam atrações por onde passavam. Muito tem a se refletir sobre tradições, mas basta fechar os olhos e encontrar o patrimônio imaterial mais importante: a sua história. Reviva os passos que construíram sua jornada, valorize as conquistas e reconheça a importância dela para a construção da sua família e comunidade. Axé!
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zona norte
roteiros
espaços culturais
DE MEMÓRIA
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Pátio do Corredor (Estação Ecologia)
2019
2019
espaรงos culturais
zona norte
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zona norte
roteiros de memória
2019
FOTO: Milena Cattini
caminhos
DO CARANDIRU Foi realizada uma caminhada no Parque da Juventude para relacionar o território, a cultura e a memória local, visitando os principais pontos nas áreas esportiva, de lazer e institucional do parque, que inclui a Biblioteca São Paulo, as Escolas Técnicas Estaduais do Centro Paula Souza e o Espaço Memória Carandiru. O objetivo foi construir um diálogo com o visitante
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por meio da história do bairro, com depoimentos de ex-moradores do Carandiru. Organizado por Nádia Sílvia Lima.
2019
roteiros de memória
zona norte
caminhos
DO Ó
“Caminhos do Ó” propôs percorrer a pé um dos primeiros acessos ao bairro da Freguesia do Ó, datado do século XVII: a atual Avenida Santa Marina. A caminhada revelou marcos históricos da urbanização de São Paulo, partindo da Água Branca e abordando o início da industrialização na cidade, os movimentos operários e o futebol de várzea. Durante o trajeto, entre memórias e
prédios, surgem imponentes vistas do Núcleo Original da Freguesia do Ó, importante referencial na paisagem paulistana e nosso ponto de chegada. Organizado por Gilberto Tomé.
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roteiros de memória
2019
zona norte
FOTO: Milena Cattini
construindo
MEMÓRIAS
Por meio de um passeio pelo Parque da Juventude, tendo como temática a “Memória da Arquitetura”, pretendeu-se a criação de um diálogo sobre a arquitetura da antiga Casa de Detenção Professor Flamínio Fávero e as transformações de sua configuração e do seu uso com a implantação do Parque da Juventude e das Escolas Técnicas Estaduais no local. Organizado por Milena Cattini Maximiano.
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zona norte
roteiros de memória
2019
ferro
TREKKING A antiga Estrada de Ferro Perus Pirapora (E.F.P.P.) é um patrimônio histórico, paisagístico e turístico tombado pelo Condephaat e mantido pelo Instituto de Ferrovias e Preservação do Patrimônio Cultural, sendo a primeira ferrovia integralmente tombada como patrimônio histórico e cultural no Brasil, com o maior acervo do mundo de material rodante de bitola de 60 centímetros. Começando pela antiga Fábrica de Cimento Perus, a caminhada seguiu pelo leito
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férreo até a chegada à antiga Vila Triângulo (Vila dos Trabalhadores da Fábrica), sempre margeando o Rio Juquery até o Pátio do Corredor (Estação Ecologia), onde se localiza o Museu de Arqueologia Industrial da E.F.P.P., com seu acervo de locomotivas, troles e carros de passageiros e de serviço, contando ainda com uma grande área verde dentro do Parque Anhanguera. Organizado por Ricardo Silva.
2019
roteiros de memรณria
zona norte
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zona norte
roteiros de memória
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percorrendo os coretos de dominó
DA FREGUESIA DO Ó
Foi realizada uma caminhada de aproximadamente 1 quilômetro entre os dois mais populares coretos de dominó existentes no bairro da Freguesia do Ó, documentando a importância individual e coletiva destes equipamentos públicos via relatos e experiências dos próprios usuários, enquanto jogam partidas de dominó, atividade que fortalece vínculos com a comunidade e ocupa as praças. A importância desses locais para a qualidade de
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vida e vínculo cultural prioritariamente entre o público da terceira idade é bastante significativa para a comunidade em geral. Preservar e promover esta herança cultural era o intuito desta atividade, que visou coletar e documentar os dois dias de atividades realizadas para a produção de um curta-metragem. Organizado por Ricardo Silva.
2019
roteiros de memรณria
zona norte
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roteiros de memória
zona norte
trilha
DA MEMÓRIA QUEIXADA O objetivo do roteiro foi resgatar a memória de resistência e luta dos queixadas, trabalhadores da primeira fábrica de cimento do Brasil. A luta dos operários da Fábrica de Cimento Portland Perus reivindicava o pagamento de salários atrasados e melhorias nas condições de trabalho. O Movimento Queixada, como ficou conhecido, gerou a greve mais
longa do Brasil (sete anos), finalizada com a vitória dos trabalhadores. Organizado por Clebio Ferreira de Souza.
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FOTO: Lucila Poppi
zona norte
FOTO: Lucila Poppi
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espaรงos culturais
2019
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espaรงos culturais
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cortejo de memรณria
DA OESTE
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espaรงos culturais
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cortejo de memória da oeste
zona oeste
O processo de criação do Cortejo de Memória da Oeste, realizado durante a Jornada do Patrimônio em 2019, foi uma realização pensada e discutida em conjunto da Secretaria Municipal de Cultura. A proposta previu incluir e criar um trajeto entre o Parque da Previdência e a Casa de Cultura do Butantã, além de contemplar artistas que atuam na região. Diversas intervenções ocorreram ao longo do caminho, e também foram incluídos no trajeto do cortejo os blocos Arriano Suassunga, Pilantragi e Vai Quem Quer. Este último, em especial, possui 30 anos de história, sendo um dos blocos pioneiros no Carnaval de Rua de São Paulo. Toda a movimentação de trajeto e apresentações incluiu no mapa cultural o Parque da Previdência, que já realiza diversas atividades socioeducacionais durante todo o ano. Diversos moradores, surpresos e emocionados com essa movimentação em uma área residencial, abraçaram e se divertiram neste pequeno “carnaval fora de época” promovido pelos blocos participantes do cortejo. Olhar e realizar na descentralização dessas atividades é incluir e prestigiar não só o artista, que tem seu trabalho valorizado em sua região; mas também os moradores, que tem à sua porta acesso e consumo cultural mais próximo de seus lares, além da economia local que movimenta o pequeno produtor, incentivando eventos gratuitos ao longo do ano nos equipamentos e locais públicos.
Danilo Leite
Curador do Cortejo de Memória da Oeste Coordenador da Casa de Cultura do Butantã
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FOTO: Lucila Poppi
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"A Jornada Do Patrimônio 2019 foi uma edição que me surpreendeu muito. Já havia participado em outras edições e não esperava que teria a proporção que tomou. Sou fã do evento, acredito muito no seu potencial e fiquei orgulhosa de ver a cidade sendo tão amada e valorizada como foi. As pessoas estão aprendendo a reconhecer o patrimônio, valorizar o que é nosso e fazer parte da nossa história. Este ano não fui voluntária mas pude contribuir ainda mais como proponente. Em minhas oficinas, pude multiplicar saberes, difundir um pouco da história da cidade, provocar memórias afetivas, falar sobre arquiteturas, patrimônio… enfim, tive espaço para conversar com diversos públicos sobre vários assuntos, tudo em uma grande brincadeira de fazer arte”.
Nayara Patente
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HISTร RICOS
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DO SERTANISTA A Casa do Sertanista foi construída em taipa de pilão, preservada e restaurada, e é remanescente do período colonial brasileiro, datada de meados do século XVII. A oficina “Laboratório de Bioconstrução” teve como objetivo disseminar o conhecimento sobre bioconstrução e permacultura, valorizando o resgate das técnicas tradicionais a partir de uma abordagem histórica. Como resultado, possibilitou a criação de um vínculo histórico e arquitetônico com o lugar, além de tornar possível compreender desde a escolha e
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acesso aos materiais, o modo de produzir e construir, contribuindo para a sustentabilidade dos ambientes e, numa perspectiva histórica, demonstrando modos ancestrais de construção que influem na permanência da vida e cultura. oficina: “Laboratório de Bioconstrução” (FOTO), por Thaís Cabral Monteiro.
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jockey
CLUB
A primeira sede do Jockey Club foi fundamental para o desenvolvimento da região da Mooca. Apenas alguns meses após sua fundação, foi implantada uma linha de bondes denominada Mooca-Centro, para transportar o já crescente número de aficcionados do turfe. O conjunto arquitetônico foi tombado pelos órgãos de preservação municipal e estadual por sua importância histórica para São Paulo, sendo, com sua
monumentalidade, importante referência na paisagem da cidade e também referencial simbólico da elite cafeeira que o erigiu. oficina: “A Luta Comunitária para a Constituição do Parque Chácara do Jockey” e “Formação de uma Rede de Pesquisadores”, ambas por Alexandre Kishimoto; “Ferreira é Patrimônio!” (FOTO), por Ana Lúcia Aurélio.
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museu
DA IMAGEM E DO SOM Criado em 1970, o Museu da Imagem e do Som tem como principal objetivo registrar e preservar o passado e o presente das manifestações ligadas às áreas de música, cinema, fotografia, artes gráficas e tudo que diz respeito à vida contemporânea brasileira. O acervo do MIS tem hoje mais de 200 mil imagens, distribuídas em coleções temáticas de conteúdo diversificado; mais de 1.600 fitas de vídeo nos gêneros ficção, documentário
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experimental e musical; e ainda 12.750 títulos distribuídos em super 8 e 16mm. O MIS conta também com uma programação mensal de shows, mostras, festivais de cinema e vídeo e exposições.
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tendal
DA LAPA O Centro Cultural Tendal da Lapa, antigo entreposto de carne, tornou-se um território de grande agitação cultural da região, com oficinas, shows e diversas apresentações. A oficina, na qual os participantes foram convidados a fazer um registro poético do território, teve como objetivo evidenciar a importância do local como protagonista em proporcionar fruição ao seu público e na difusão do patrimônio cultural e
artístico da cidade de São Paulo, além de dar escuta ao público e, desta forma, integrar diferentes culturas. oficinas: “Lapa: das Fábricas aos Dias Atuais”, por Dayane Cristine de Moraes José; “Territórios de Fruições” (FOTO), por Renato Henrique Renda.
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FOTO: Bruno Andrade
SESC
POMPEIA Durante a Jornada, o Sesc Pompeia abriu suas portas para uma visita patrimonial abordando a questão de gênero em diálogo com a produção arquitetônica e urbana. Valendo-se da biografia de Lina Bo Bardi, a atividade problematizou o papel das mulheres dentro de uma discussão mais ampla de direito à cidade e resistências. Além disso, realizou uma oficina sobre as memórias dos diversos agentes na concepção do projeto,
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execução e manutenção do Sesc Pompeia, incluindo o trabalho dos operários da antiga fábrica de tambores, da construção da unidade e seus trabalhadores atuais, bem como o da arquiteta Lina Bo Bardi e sua proposta de autoria compartilhada.
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FOTO: Bruno Andrade
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“Por eu ser conservadora/restauradora, a Jornada do Patrimônio tem uma grande importância. Nas minhas oficinas, abordei a conservação preventiva e curativa e, com essas ações, salvaguardamos o patrimônio cultural tangível, assegurando que a história e a memória sejam de acesso às gerações presentes e futuras. Participei em 2018 com oficinas de “Conservação em Imagens Sacras de Gesso”. Em 2019, participei com duas oficinas, “Conservação Preventiva e Conservação Curativa sobre Talhas de Madeira”. Concluo que a Jornada do Patrimônio é uma ação de cunho cultural e que deve ser preservada e continua.”
Iranildes de Melo Rolim Bufalo
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CULTURAIS
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BUTANTÃ
oficinas: “Ambiente Fluvial ou Espaço de Circulação?” e “Caminho do Peabiru, Parque da Fonte e Lagos da Vila Sônia”, por Alexandre Kishimoto; “Cantinho do Samba Rock” (FOTO), por Débora Regina Boaventura de Souza; “Capoeira”, por José Oliveira de Jesus; “O Significado do Peabiru, do Morro do Querosene e do Parque da Fonte para a Cidade de São Paulo”, por Maria Cecília Pellegrini Góes.
“Foi uma experiência incrível, superou minhas expectativas. Realizei a oficina de “Samba Rock” dia 17, no Centro Cultural do Monte Kemel e, no dia 18, a
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mesma oficina na Casa de Cultura do Butantã também teve uma grande adesão. Foi muito gratificante poder passar um pouco do meu conhecimento e experiência no samba rock. Agradeço a oportunidade e espero repetir novamente no ano que vem”.
Débora Regina Boaventura de Souza
Proponente da Oficina “Cantinho do Samba Rock”
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instituto
ROGACIONISTA O Instituto Rogacionista, tombado pelo Conpresp em 2009, recebeu durante a Jornada do Patrimônio 2019 a oficina “Inventário Participativo das Referências Culturais no Território da OUC Água Branca” (FOTO). A atividade ofereceu a capacitação técnica e social da comunidade e demais interessados para o uso do método do Inventário Participativo de Referências Culturais (IPRC), reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O estudo de caso foi o
território da Operação Urbana Consorciada Água Branca (Oucab), que passa por significativas transformações. A atividade compreendeu uma rápida apresentação de conceitos e legislação, seguida de uma roda lúdica com debate aberto sobre o que os participantes entendem que são as suas referências culturais nesta região. Ao final, a participação de vários olhares constrói um mosaico preliminar dos bens que poderiam serem preservados como patrimônio pelo poder público.
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É PATRIMÔNIO O Butantã possui uma história secular, que começa como rota de passagem de bandeirantes e jesuítas a caminho do interior do País. Embora não percebido na correria do dia a dia, o local guarda diversos testemunhos dessa longa história. Buscou-se lançar um olhar sobre esse passado a partir de um roteiro fotográfico para registrar os vários tempos presentes
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nesse território e (re)conhecer os elementos que lhe dão identidade: edifícios, ruas, paisagens, personagens. Organizado por Ana Lúcia Aurélio.
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DO CORUJAS “Decidimos resgatar um pouco da memória do bairro Vila Beatriz, na zona oeste, tendo como ponto de partida o Córrego das Corujas, que corta o território e é um dos poucos que corre a céu aberto na cidade. Para preparar a caminhada, buscamos informações em jornais antigos e livros. Mas o que deu um tom super especial, foram os relatos de antigos moradores que entrevistamos, gente que vive no
bairro há cerca de 70 anos. Muitas histórias divertidas e emocionantes surgiram e foram transformadas em cartazes, que compuseram uma pequena exposição no final do roteiro”.
Neiva Otero
Proponente do Roteiro de Memória “No Vale do Corujas”
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FOTO: Paula Skromov
sabe qual é a banda mais antiga da cidade?
A DA LAPA!
Uma breve caminhada pelas origens da centenária Corporação Musical Operária da Lapa, mais conhecida como a Banda da Lapa - a mais antiga da cidade, segundo seus músicos. Foram visitados lugares que guardam as memórias da urbanização, industrialização e da cultura da gente que povoou o bairro. Com partida e chegada à sede autoconstruída (e tombada como patrimônio cultural de São Paulo), esta pequena viagem musical se encerrou com a apresentação da Banda da Lapa em grande estilo.
o 17 de Agosto de 2019. A pequena sede da Banda da Lapa estava colorida, cheia de fitas, bexigas, cartazes, visitas. Os músicos acharam que ia ter menos gente, queriam até receber as pessoas com salgadinho e guaraná, mas combinamos de fazer uma festa de portas abertas para a banda tocar do lado de fora. E assim foi. Os metais sopraram para longe o esquecimento, e a veterana Banda da Lapa, com seus 138 anos, reuniu e empolgou gente de todas as idades. Foi a primeira Jornada e que venham muitas mais”.
“Durante a oficina “Sabe Qual é a Banda mais Antiga da Cidade? a da Lapa!” (veja acima), me deparei com um sábado de Sol e de música. Que dia especial foi
Proponente do Roteiro de Memória “Sabe qual é a Banda mais antiga da Cidade? A da Lapa!“
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Paula Skromov
FOTO: Paula Skromov
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FOTO: Fรกbio Gomes
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DA SUL
1 FOTO: Fรกbio Gomes
FOTO: Fรกbio Gomes
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zona sul
O Cortejo de Memória da Sul percorreu o Centro Histórico de Santo Amaro com um grande roteiro de memória, conduzido pelo ator Camilo Torres representando Paulo Eiró. A intervenção artística trouxe grupos de manifestações culturais importantes da região, personagens e artistas que se dedicam à valorização do patrimônio histórico e cultural do sul da cidade de São Paulo. Com direção artística de Antonia Andrea de Souza e textos de Inez Garbuio Peralta, o evento resgatou elementos importantes que ressaltavam aspectos históricos e contemporâneos da região, com as participações do grupo Maracatu Ouro do Congo, das romarias tradicionais de Santo Amaro e do Kunumi Mc. Uma alusão aos anos 20 foi marcada pela presença de artistas de sopro da Orquestra de Metais e Percussão Armando Arruda, na Praça do Coreto. O Cortejo contou com um boneco gigante criado pelo artista plástico Ricardo Cruz em homenagem ao grande escultor e pintor paulistano Júlio Guerra, nascido em Santo Amaro e consagrado pela criação de diversos monumentos que suscitam a memória da cidade em diversas regiões.
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Zona Sul na Jornada do Patrimônio 2019Edição Ícone! Santo Amaro, o bairro planeta de todas as migrações e imigrações, de histórias ímpares em toda cidade. O único que já foi município, o único que tem um Centro de Tradições. O bairro que tem o maior monumento da cidade, que data de 1963 e mede 12,40 metros. Sim! Santo Amaro integrou o maior projeto de valorização do patrimônio histórico e cultural de sampa – edição 2019. Nosso fazer artístico/histórico santamarense, regado a entusiasmo, nos levou a pensar em um Cortejo de Memória da Sul que, percorrendo o eixo histórico cultural, trouxesse à apreciação e ao conhecimento do público nossas memórias, tradições e manifestações de contemporaneidade. E como Santo Amaro – Terras de Cayubi – é toda poesia, convocamos nosso poeta-mor Paulo Eiró (vivido pelo ator Camilo Torres), quem, como arauto, guiava o Cortejo enquanto proclamava a todos as singularidades do torrão nascido às margens do Rio Jurubatuba, pelo então noviço José de Anchieta, em um tempo dito e acreditado dois anos antes da cidade de São Paulo. Lá estavam as representatividades em suas diversidades, compondo com potência o cortejo: as mulheres amazonas – uma vertente das romarias –, a contribuição envolvente e percussiva da ancestralidade africana que migrou do nordeste: o maracatu; a arte popular em forma de bonecos gigantes trouxe e fez andar, no alto da beleza de seus 3 metros, o nosso celebrado artista plástico
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Júlio Guerra e um casal de alemães, representando a primeira colônia de imigrantes a se instalar nas terras das águas férteis. O instigante trio de bonecões parecia conduzir o rico e eclético cortejo. E, como em Santo Amaro a parceria é para a excelência, a Diretoria Regional de Educação trouxe a leveza da arte da música instrumental, que era referência entre as décadas de 20 e 50 nos bucólicos “jardins”, hoje Praça Floriano Peixoto. Em seu lírico coreto, apresentou-se a fanfarra da Emef Armando Ferreira. Então, a história, memória, tradição e contemporaneidade desfilaram em grande estilo, compondo a icônica edição 2019 da potente Jornada do Patrimônio. Prazer todo nosso em assinar a direção artística de tão robusta ação!!! A CULTURA EM AÇÃO É O HORIZONTE SENDO AMPLIADO!
Antônia Andréa Sousa
Coordenadora Geral do Centro Cultural Santa Amaro
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“Reconhecer e evidenciar o patrimônio cultural e histórico local é revelar ao seu habitante, e também àqueles que passam pelo bairro, a produção material que seus antecessores, seus ancestrais construíram. Acredito que é necessário conhecer para respeitar e valorizar”.
Inez Garbuio Peralta
Autora dos textos do Cortejo de Memória da Sul
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“A proposição de eventos para a Jornada do Patrimônio é uma experiência enriquecedora, pois nos permite compartilhar com a comunidade nossas vivências e conhecimentos no campo cultural, principalmente os aspectos do patrimônio e da memória paulistanos, áreas nas quais ações do poder público não são corriqueiras. Esta escassez de ações em patrimônio e memória acaba por criar uma demanda reprimida, gerando interesse pela atividade que propusemos, principalmente entre o público infantojuvenil”.
Luís Gustavo Pereira Ferreira
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FOTO: Fรกbio Gomes
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HISTร RICOS
Casa Artigas. FOTO: Vicente Sisla Zeron
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BELMONTE A biblioteca infantil de Santo Amaro foi construída onde havia uma grande chácara no centro do bairro. A iniciativa partiu da administração municipal, que compreendeu a necessidade de incentivar a cultura e se preocupava em aumentar os alicerces da educação infantil na região de Santo Amaro, então em franca expansão, com muitas escolas públicas e particulares. Foi inaugurada em 25 de janeiro de 1953, durante as
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comemorações do 399º aniversário da cidade de São Paulo. Em 1973, passou a chamar-se Benedito Bastos Barreto e, em 2005, o nome foi alterado para Belmonte, seu pseudônimo. oficina: “Minha TV”(FOTO) por William de Oliveira Araújo.
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imóveis históricos
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FOTO: Bruno Andrade
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ARTIGAS A Casa Vilanova Artigas foi projetada em 1949 pelo arquiteto João Vilanova Artigas (1915-1985), um dos principais nomes da arquitetura moderna brasileira, para ser sua própria moradia. Com fachada toda em vidro e amplo jardim projetado originalmente por Burle Marx, é um dos exemplares da chamada Escola Paulista (de arquitetura). Totalmente restaurada em 2017, sob o comando da arquiteta e urbanista Talita De Nardo Missaglia e do paisagista Luis Carlos Orsini, o imóvel hoje é ocupado pelo Instituto Casa Vilanova Artigas, um centro cultural voltado para a manutenção
do patrimônio histórico, arquitetura, design e arte. Com a exposição “A Casa como Cidade”, os visitantes têm a oportunidade de conhecer os projetos das residências no bairro do Campo Belo sob o viés pessoal: a vivência na casa, influências políticas, convivências com estudantes, intelectuais e artistas renomados, trazendo o conceito de moradia da família e reflexões sobre uma arquitetura mais integrada à cidade.
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MODERNISTA A Casa Modernista da Rua Santa Cruz, de autoria do arquiteto ucraniano Gregori Warchavchik (1896– 1972), projetada em 1927 e construída em 1928, é considerada a primeira obra de arquitetura moderna implantada no Brasil. Em 1984, o Condephaat tombou o conjunto, seguido pelo Iphan e, posteriormente, pelo Conpresp. Devido a diversos processos judiciários, o imóvel permaneceu abandonado, resultando daí um rápido processo de
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deterioração. Em 2000, foram realizadas obras para a sua recuperação. Em 2008, a Prefeitura de São Paulo passou a ser permissionária do imóvel, sendo a responsável por seu uso e manutenção. oficina: “Casa Modernista- Da porta pra dentro, da porta pra fora” por Elidayana da Silva Alexandrino.
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imóveis históricos
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“Quem disse que não dá para voltar no tempo? Na oficina “Da Porta pra Dentro, da Porta pra Fora”, nós do Coletivo Sacripantas redefinimos a rota e embarcamos diretamente para a década de 30. Nosso ‘meio de transporte’: diversos documentos históricos e reproduções de obras de arte espalhados dentro e fora da Casa Modernista. Os participantes reviveram a efervescência intelectual e cultural da Casa. Teve discussão do contexto social e político do Brasil; exposição e cantoria de inesquecíveis músicas da era do rádio, relembrando o clima festivo da Casa com um sarau no jardim”.
Elidayana Alexandrino
Proponente da Oficina “Casa ModernistaDa Porta pra Dentro, da Porta pra Fora”.
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FOTO: Rodrigo Moura
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DE SANTO AMARO oficina: “Conhecendo o Universo Musical do Samba” (FOTO), por Rodrigo Moura Ribeiro.
A oficina “Conhecendo o Universo Musical do Samba” teve como objetivo apresentar e desenvolver debates acerca do samba paulistano, envolvendo duas esferas do patrimônio cultural e histórico: o samba e a Casa de Cultura de Santo Amaro, sede da Comunidade
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do Samba da Vela, reduto de cantores, instrumentistas e compositores que defendem e mantêm o gênero musical há 19 anos.
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imóveis históricos
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FOTO: Rodrigo Moura
centro cultural
SANTO AMARO
oficinas: “Contando a História de São Paulo através dos Discos”, “O Choro de São Paulo” (FOTO); “Quebrando a Cabeça com Obras de Júlio Guerra”.
Duas atividades foram realizadas no Centro Cultural Santo Amaro. A primeira, proposta pelo coletivo Sarau do Vinil, teve como objetivo proporcionar um flashback aos participantes por meio de lembranças e memórias da época dos discos, além de ser um espaço
lúdico de troca de conhecimentos e informações a respeito de São Paulo e seus patrimônios históricos e culturais. Já o grupo de estudos e pesquisas de choro Terça Maior realizou um recital, executando obras de compositores como Bonfiglio de Oliveira e Copinha e enaltecendo músicos como Luizinho 7 Cordas e Isaías do Bandolim, ilustrado na foto.
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FOTO: Ana Mikaela
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espaços culturais
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biblioteca
MARCOS REY A oficina pretendeu evidenciar a importância dos territórios como protagonistas em proporcionar fruição ao seu público e na difusão do patrimônio cultural e artístico da cidade de São Paulo; dar escuta ao público da Biblioteca Marcos Rey e do Centro Cultural Tendal da Lapa e, desta forma, integrar diferentes culturas; propor o aprendizado de uma técnica artística (técnicas mistas) de forma lúdica e espontânea, sem preocupações
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de rigor estético ou acadêmico; valorizar a palavra dos participantes transformando-a em uma arte pulsante. A memória afetiva de cada um pôde ser traduzida por meio de um desenho, da confecção de um fanzine ou ainda de uma colagem, materializando experiências, vivências e emoções que tiveram ao longo de suas vidas dentro desses espaços.
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DE PARELHEIROS oficina: “Capoeira Luz Divina”, por Jaqueline Targino Silva dos Santos.
“Capoeira Luz Divina” foi uma oficina voltada a iniciantes que quiseram aprender a arte e a cultura dessa expressão. Teve como objetivo passar conceitos básicos, como preparação física, ginga, movimentos e golpes diversificados, ensinamentos de respeito, hierarquia e
disciplina. Conceitos de toques de berimbau, pandeiro, atabaque, agogô, reco-reco e de canto, como chulas, ladainhas e corrido; de samba de roda, maculelê e de peças teatrais com contextos que remetem à ancestralidade.
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HIP HOP SUL
oficinas: “Contando a História de São Paulo através dos Discos“, por Rodrigo Moura Ribeiro; “Hip Hop Dj Timeline do Brasil”, por Luiz Lobato da Silva; ”Influência da Música Brasileira na Urbanização do Território“, por Michel Nascimento Cabral; “Mc” (FOTO), por Johnny Domingos.
Durante a Jornada do Patrimônio, uma oficina de Mc teve como conteúdo abranger o conhecimento não só musical, com um programa para além do rap, que contemplou, em especial, o uso de gramáticas, composição, dinâmica musical e conteúdo poético. Foram apresentados autores brasileiros, como Abílio Soares, Basílio da Gama, Bento Nascimento, Cecília
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Meireles, Chico Buarque de Holanda, Machado de Assis, Manuel Bandeira, Olavo Bilac e Vinicius de Moraes. A meta foi atingir um nível musical periférico mais organizado, moldando futuros talentos da música ao fomentar o interesse do aprendiz pela estrutura corporal e mental, bem como potencializar o conteúdo individual e em grupo, dando o suporte necessário para que possam dar continuidade aos seus sonhos. Dessa forma, pôdese contribuir com músicas de qualidade e conteúdo, desafiando o jovem aprendiz a se capacitar e avançar no sentido dos grandes mestres da música brasileira.
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espaços culturais
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“Desde que cheguei a São Paulo imediatamente fui atraído pela sua enorme variedade cultural. Decidi então que deveria conhecê-la mais a fundo. A melhor forma de não me sentir estrangeiro numa cidade feita por migrantes seria me apropriar culturalmente de tudo aquilo que me circundava e de conhecer a história daqueles que, antes de mim, tinham vindo para esta cidade. Poder apresentar isso em forma de roteiro foi incrivelmente importante para mim e me fez sentir mais autenticamente paulistano”.
Giuliano Orlando
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“Participar da Jornada do Patrimônio 2019 trouxe um impulso motivador para a realização de um trabalho no bairro onde moro há 20 anos, Vila São Pedro, zona sul. Por volta de Junho de 2018, reuniram-se em grupo jovens interessados em se aperfeiçoar no mundo do samba e em compreender os papéis sociais e culturais desse gênero musical genuinamente brasileiro, assim surgiu a Comunidade Samba da Vila São Pedro, com apoio da Casa de Cultura Hip Hop Sul. A Jornada fomentou ainda mais esse engajamento do Samba da São Pedro com as questões do bairro. Afinal, o que é? Onde fica? Como surgiu a Vila São Pedro? Comecei a procurar informações sobre as histórias e memórias do local e não encontrei. Diante desta situação, propus uma oficina intitulada “Histórias e Memórias da Vila São Pedro”. Este
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trabalho movimentou toda a comunidade em prol de resgatar informações, histórias de vidas, relatos, fotos, enfim, todo o tipo de registro histórico, e foram aplicadas entrevistas abertas com moradores antigos e agentes culturais e sociais do bairro, resultando em um registro em áudio e vídeo que está disponível no YouTube com nome homônimo. Um trabalho como este, com diversas razões sociais, trouxe impactos significativos para todo o bairro que carece de identidade, cultura local, patrimônios históricos materiais e imateriais. Após essa pesquisa exploratória da oficina “Memórias da Vila São Pedro”, que integrou a programação da Jornada 2019, surgiu a demanda de uma pesquisa científica mais aprofundada e um documentário com maior qualidade técnica e artística sobre essa localidade”.
Rodrigo Moura
Proponente da Oficina “Contando a História de São Paulo através dos discos”
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oficinas: “Fotografias da Comunidade” por Henrique Vinicius Silva de Lima, “Graffiti nos Muros, nas Casas e na Ponte” por Michel Juneo de Freitas e “Vivências e Convivência através da circularidade na Roda de Capoeira”(FOTO) por Jonas Gariglio Barbosa.
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oficinas: “A Capoeira entre Templos e Terreiros, um Patrimônio Cultural”; por Alexandre Soares Miranda.
A partir de uma conversa inicial, os participantes da oficina “A Capoeira entre Templos e Terreiros, um Patrimônio Cultural” foram convidados a se entregar à experimentação tátil da argila a partir de elementos da sua própria trajetória de vida, dando atenção às relações
que se estabelecem entre a vida, a memória a história e a ancestralidade no fazer artístico. Além disso, por meio de uma oficina de capoeira, o multiculturalismo existente nessa cultura, que transita por movimentos corporais, ritmos e batucadas do legado de povos africanos no Brasil, trouxe à tona a importância de preservar aquele patrimônio imaterial.
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FOTO: Ana Mikaela
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NOSSA SENHORA DA CONCEIÇÃO oficinas: “Desenhar Possibilidades com a Comunidade para uma Área Subutilizada” (FOTO), por Fernanda Eiras Rubio; e “Lavapés”, por Diego dos Santos Veiga Silva.
Próximo ao Largo Nossa Senhora da Conceição, há uma área verde subutilizada há 19 anos, onde uma pré-escola funcionou até 2000. Hoje, resta sua estrutura
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circular em ruína -parte do projeto arquitetônico de Paulo Mendes da Rocha, de 1976-, em processo de tombamento. A oficina “Desenhar Possibilidades” criou a possibilidade da comunidade trazer ideias e sugestões para o local, projetando e desenhando, levando em consideração a história e o contexto atual do espaço e arredores.
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FOTO: Ana Mikaela
FOTO: Ana Mikaela
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“A experiência da oficina “Desenhar Possibilidades com a Comunidade para uma Área Subutilizada” (veja acima), que ocorreu no Largo Nossa Senhora da Conceição, proporcionou o contato, debate e a oportunidade de conhecer as diferentes ideias das pessoas que frequentam a região sobre quais as possibilidades de reestruturação do espaço público, conhecido como Queijinho, ao lado da EE Caetano de Campos (Aclimação). Assim, foi possível que adultos de diferentes formações e crianças vislumbrassem, por meio de desenhos, a perspectiva de construção de um espaço público que atenda às demandas da região”.
Fernanda Eiras Rubio
Proponente da Oficina“Desenhar possibilidades com a Comunidade para uma Área Subutilizada”
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praça
FLORIANO PEIXOTO oficinas: “Capoeira: Identidade do Povo“, por Renato Freitas Souza; e “Seguindo os passos de Júlio Guerra”, por Inez Garbuio Peralta.
A oficina “Capoeira: Identidade do Povo”, realizada na Praça Floriano Peixoto, teve como objetivo resgatar a memória e trajetória de pessoas que foram escravizadas durante quase quatro séculos. A atividade foi realizada de forma lúdica, trazendo reflexões
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históricas do período escravocrata, apresentando os instrumentos criados e utilizados pelos negros, que contribuíram para a construção do País, e também uma introdução aos toques de berimbau, pandeiro e atabaque, seguindo com a parte prática da capoeira, que incluiu a diversidade de idades, etnias e gêneros
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espaรงos culturais
zona sul
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cortejo de memรณria da sul
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cortejo de memĂłria da sul
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roteiros
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zona sul
roteiros de memória
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as 12 maravilhas
DO IPIRANGA
Instituições assistenciais e de ensino situadas ao longo da Avenida Nazaré, que testemunham a primeira ocupação do bairro do Ipiranga, na antiga colina histórica, estão em terrenos que eram de propriedade do Conde José Vicente de Azevedo e foram doados com a finalidade única de ajudar e dar educação àqueles que mais necessitavam na época: órfãs, ex-escravos, filhos de imigrantes, crianças pobres e cegos. O passeio começou no Museu Vicente de Azevedo, antigo Asilo de
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Meninas Órfãs, passando pelo antigo Noviciado Nossa Senhora das Graças, antigo Grupo Escolar São José, Instituto de Cegos Padre Chico, Seminário Central (PUC), antiga Clínica Infantil do Ipiranga (Hospital Dom Alvarenga) e Instituto Sagrada Família. Organizado por Ana Silvia Bloise.
ipiranga
MUITO ALÉM DO MUSEU No passeio a pé pelo bairro, o grupo passou pelo Memorial Santa Paulina e conheceu a emocionante história da madre que se tornou a primeira santa brasileira; o Museu de Zoologia, que surpreende com seus animais pré-históricos; os casarões da Família Jafet, que dão um charme especial ao bairro; a Cripta do Monumento à Independência, que guarda os restos mortais de D. Pedro I, Dona Leopoldina e Dona Amélia; e a Casa do Grito, uma típica casa de taipa de pilão do século XIX. Organizado por Eliane Gastaldello.
FOTO: Elaine Gastaldello
o ibirapuera
QUE NINGUÉM VÊ O Ibirapuera, patrimônio da cidade, é um dos parques mais visitados da América do Sul, mas possui áreas pouco exploradas que guardam alguns segredos. O roteiro teve início na antiga serraria, próximo à Praça Burle Marx, seguindo pelo Bosque da Leitura, desvendando a biodiversidade presente no local. As memórias puderam ser vistas em tijolos de cerâmica no solo e numa cruz, indicando que aquele território abrigou no passado um hospital veterinário e um cemitério de animais. Organizado por Thamara Sauini.
zona sul
roteiros de memória
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rotas do patrimônio cultural negro
NO JABAQUARA
Este roteiro apresentou ao público dois lugares no bairro Jabaquara, reconhecidos pelo Condephaat como patrimônio histórico e cultural: o Sítio da Ressaca e o Terreiro Axé Ilê Obá. À luz destes locais históricos, o passeio deu vazão para discussões antirracistas sobre o passado e o presente, transformações e permanências associadas à identidade do bairro enquanto território e territorialidade da memória africana e afro-brasileira e
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sua relevância na relação com outros locais da cidade de São Paulo e entorno. Organizado por Fabio Guaraldo Almeida.
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roteiros de memória
zona sul
zona de impacto
DA ÁGUA DA BICA Passeio até a Bica da Linha do trem do Bairro da Colônia Alemã, localizada no distrito de Parelheiros, tendo como objetivo reforçar a importância da proteção e preservação da fonte. Em uma região com áreas de mananciais, cercada pela represa Billings, e de proteção ambiental (APA Bororé Colônia), a Bica também é de grande valor afetivo para os moradores da região que, em tempos de racionamento, tiveram como alento sua
água. De carro, bicicleta, carrinho de mão ou na cabeça, todos buscam esse bem precioso. Organizado por Carolina Souza dos Santos.
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memรณria paulistana
JORNADA NOS TEATROS
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jornada
DOS TEATROS
“Os teatros municipais levam o nome de artistas. Mas quem foram esses artistas? Quem conhece suas histórias? Pensando nessas questões, propus de contarmos essas histórias em videodepoimentos, convidando atores e dramaturgos para trazerem vida a essas figuras. O tom não era memorialista, mas de tentar trazer a oralidade, a conversa informal, como um bate-papo. Duas referências nos guiaram nesse processo: o programa televisivo “Ensaio”, de Fernando Faro; e as entrevistas com personagens históricos do programa “Retrovisor”, de Paulo Markun. Três importantes dramaturgos desta geração vasculharam a história dos artistas para então gravarmos na caixa preta um pouco da trajetória das pessoas que batizam nossos teatros. O jogo constante de luz que ora revela, ora esconde esses personagens, mostrando suas diferentes facetas, foi orquestrado com a trilha original de Fil Pinheiro, mantendo os atores em primeiro plano e permitindo que a história ganhasse vida para as plateias de nossos teatros”.
Pedro Granato
Coordenador do Núcleo dos Teatros e Centros Culturais da Cidade de São Paulo
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memória paulistana
alfredo mesquita
POR RAUL BARETTO (TEXTO DE JOSÉ FERNANDO PEIXOTO DE AZEVEDO) Diante da câmera, Alfredo Mesquita escuta alguém fora do quadro a fazer perguntas. Em tom de conversa, com alguma intimidade, ele inicia, depois de escutar a primeira pergunta:
ALFREDO MESQUITA O modelo do teatro, do verdadeiro teatro, nunca está no passado. Seu pacto secreto é com o futuro. Mesmo quando
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retomamos ou até copiamos algo de antes, é com o futuro que segredamos. É um segredo compartilhado entre os que fazem. Se eu tenho saudade do teatro que vi e vivi, isso não quer dizer que eu não saiba da evidência de ter me tornado um homem do passado. Então, o que para mim é memória, para vocês talvez seja história. E é bem provável que estejamos já aqui escrevendo uma história do esquecimento. Por
memória paulistana
que quem ainda lembra ou sabe do que estamos falando? Não há nisso qualquer rancor. Talvez um tanto de nostalgia. Mas a elegância não dispensa uma certa distância das coisas, gesto que cai muito bem a alguém que se tornou história. A história que me lança para o futuro é a da criação da Escola de Arte Dramática. Com ela, eu fiz um pacto com o tempo. A experiência dos amadores em São Paulo me fez compreender que, para uma verdadeira transformação do teatro, para a criação de um teatro verdadeiramente moderno, além da exigência evidente de formas de um patrocínio das práticas, era necessário estabelecer uma nova prática. Definitivamente, fazia-se necessário criar um novo ator. E eu me empenhei nessa tarefa, dando a ela uma vida. Eu vinha da experiência do Grupo de Teatro Experimental, criado em 1942. Veja, pela data, que fomos de fato pioneiros, ainda que as histórias oficiais do teatro entre nós insistam sobre um 1943 carioca mítico, com a estreia de “Vestido de Noiva”. Eu seria o primeiro a reconhecer a importância fundadora da peça, mas não posso ignorar o fato de que vínhamos desde antes empenhados, aqui em São Paulo, no trabalho de renovação da cena. Não era um trabalho fácil. A modernização
do teatro brasileiro foi um esforço de muitos. Deparávamos com condições mínimas, sempre sem o recurso que viabilizasse o salto. Um momento importante dessa trajetória, que certamente definiu para nós o sentido do que fazíamos e queríamos fazer, foi a estadia em terras brasileiras, durante todo 1941, de Louis Jouvet e sua companhia. Impedido de voltar à França , ele e seus atores permaneceram aqui e, conseguido um surpreendente apoio do governo brasileiro, ao cabo de um ano, vimos por aqui uma temporada que em nada devia ao que faziam em Paris! O impacto foi tremendo! Vi, entre outras coisas, uma “Escola de Mulheres”, de Molière, impecável, era como se estivéssemos na Comédie des Champs Elysées. O Grupo Experimental de Teatro durou de 1942 a 1943. Foi o empresário italiano Franco Zampari quem ouviu nosso apelo e se pôs a buscar ajuda para nossa empreitada. Pouco ou quase nada ele conseguiu. Mas, em outubro de 1948, o mesmo Zampari criou, aqui em São Paulo, o seu Teatro Brasileiro de Comédia, o TBC. Pouco antes, em maio desse mesmo ano, criamos também aqui em São Paulo a EAD. Sua finalidade era a de formar atores, mas também, em pouco tempo, dramaturgos, diretores, cenógrafos,
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memória paulistana
artistas que com base cultural sólida, conhecimentos técnicos aprofundados, tomados de uma verdadeira ética profissional, viessem a contribuir com o estabelecimento de um teatro verdadeiramente moderno entre nós. Essa experiência foi vivida com toda integridade que me cabia até os anos de 1960. Em 1966, iniciamos as tratativas para a anexação da Escola à Universidade de São Paulo. Fato que se consumou em 1968. O que se tornou a Escola depois dessa data não é resultado de um gesto meu, mas é certamente a continuação de algo que define toda um credo. Você me diga o que é o teatro do futuro. De minha parte, o que posso responder, é que empenhei uma vida no esforço de criar condições para um futuro digno para nossa cena. O futuro veio. É sentado ai, à minha frente, desse lugar chamado futuro, que você me faz perguntas. Eu sugeri no começo dessa conversa que o modelo secreto do teatro está no futuro. Talvez você pudesse me contrapor dizendo: o modelo secreto do teatro é a história. Mas o futuro que minha geração inventou não seria a história que a sua geração talvez já possa contar?
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Eu vivi uma infância de menino granfino. Minhas primeiras experiências no teatro foram cercadas por esse tipo de convívio que, não nego, definiu muito de meu gosto e minhas afinidades. Mas na Escola eu vi chegar todo tipo de gente jovem, ávida por saber e fazer. Não será muito dizer que a alegria ganhou forma ali. Levei para lá gente como Alberto D’Aversa, Antunes Filho, Clóvis Garcia, Decio de Almeida Prado, Dorothy Lerner, Gianni Ratto, Gilda de Mello e Souza, Haidé Bittencourt, Heleny Guariba, Leyla Coury, Maria José de Carvalho, Ruggero Jaccobi, Sábato Magaldi. Falar do alunos que ali passaram? Lembrarmos que alunos da primeira turma da Escola criaram o já mítico Teatro de Arena de São Paulo, talvez seja um bom início para descrever uma história de invenção. Mas é o que eu disse. Não é no futuro que está o que realmente interessa ao teatro? O meu futuro é o seu presente. Me conta você alguma coisa desse tempo que é o seu, e que foi para mim aposta e esperança
artur azevedo
POR CACÁ CARVALHO (TEXTO DE RUDIFRAN POMPEU) Artur Azevedo, com temperamento alegre e expansivo, escreve em uma escrivaninha (câmera aproxima em plano baixo rente à mesa, e ele olha para a câmera)
ARTUR AZEVEDO Porta aberta, o justo peca! (Levanta com a lapiseira/pena em punho!) A ocasião faz o ladrão!
(Câmera afasta e mostra ele em pé, falando o texto para os cantos como quem está criando e pensando nas falas para escrever nas folhas sobre a mesa)
Eu sou como São Tomé: ver para crer! Dize-me com quem andas, dir-te-ei as manhas que tens! (Câmera aproxima)
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Pelo dedo se conhece o gigante... Há de ser o que deus quiser: o casamento e a mortalha no céu se talham... (Corta para ele sentado, conversando com alguém que não aparece) ARTUR AZEVEDO: (fala como se explicasse ao ouvinte)
Aparentemente, esses “provérbios” são “coisicas” que emitem um ensinamento popular! São anexins, ditoches, ditados... Parêmias! (Câmera em close como se falasse para alguém)
OI? Paremias? Ah claro! Eu explico em pormenores! (ri) (Câmera afasta lentamente)
Parêmias são ditos que servem tecnicamente de fonte de ensinamento e conselhos, é uma espécie de matériaprima para críticas e paródias. Sou um teatrólogo! Um dramaturgo e é disso que me alimento, desde muito jovem! (Corta para ele falando de lado)
E se eu falar que quando eu tinha por volta de 8 anos, eu já escrevia umas coisas por aí?
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(Câmera corta para o outro lado dele)
ARTUR AZEVEDO
(um pouco exaltado)
Ora bolas! Eu escrevi “Amor por Anexins” aos 15 anos! Então, é mais um sinal que eu já me comunicava pela escrita, melhor do que me comunico pela fala, não é? A fala eu deixo para os atores e atrizes desse Brasil! (Câmera circula e fica frontal)
É verdade que lá no Maranhão eu aproveitava algumas coisas que a vida me oferecia... Eu sou filho do vicecônsul de Portugal e é claro que essa condição já me colocou num lugar mais privilegiado pra a leitura e o contato com a escrita... Porque uma coisa que tinha no consulado em São Luiz era livro, viu? Não à toa virei um dramaturgo, escritor, poeta e jornalista... E tudo isso, meio ao mesmo tempo, entende? (Corta para ele falando de frente)
ARTUR AZEVEDO
(como se falasse para alguém)
Dizem que eu sou meio encrenqueiro e coisa e tal! Na verdade, falam isso porque eu discordava de severas coisas na província e então resolvi fazer algumas sátiras contra as autoridades
memória paulistana
do governo, foi por isso que me demitiram de onde eu trabalhava! (Câmera aproxima em close)
Há males que vem para o bem... Foi aí que a “vidinha” deu um salto, pois que, “Deus ajuda, quem cedo madruga”! Como não sou besta nem nada, me adiantei e fiz um concurso de “amanuense” da Fazenda, e mudei para a capital federal, que naquela época era o Rio de Janeiro. Ah... A capital federal! Foi a melhor coisa que eu poderia ter feito! (Câmera fecha nele) ARTUR AZEVEDO
(respondendo para alguém)
Amanuense? Pois, creiam-me! É o mesmo que copista... É o camarada que copia textos e documentos à mão... Claro que pra vocês dessa geração, isso deve ser uma patacoada, mas lembremse “cultura e canja de galinha não fazem mal a ninguém...”. (Câmera afasta)
Bom... Meu pai chamava-se Davi e minha mãe, Emile Amália... Eu tenho entre meus irmãos e irmãs, um que possivelmente vocês já tenham escutado por aí... “Aluísio de Azevedo” que também é escritor... E juntos
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fizemos parte do grupo que criou a ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS! Meu nome de batismo é “Artur Nabantino Gonçalves de Azevedo”, mas nas artes e no jornalismo eu sou ARTUR AZEVEDO! (Câmera aproxima)
A minha mãe Emile Amália Pinto de Magalhães, era uma fortaleza! Para os senhores terem uma ideia de quem era minha mãe, ela separou-se de um comerciante com quem fora obrigada a casar e foi viver maritalmente com o meu pai, David Gonçalves de Azevedo, e isso tudo naquela época que não era fácil, não era bolinho, não!... Imaginem, então, a coragem dessa mulher?! (Câmera em plano americano)
Bom! Já que estamos minimamente apresentados, me deixem falar uma coisa que poucos sabem! Eu não tinha vida fácil, não, viu? Fiquei trabalhando na época no Ministério da Agricultura e também lecionava no Colégio Pinheiro, ministrando aulas de português! Nessa mesma época, comecei minha carreira como jornalista, e inclusive junto com o Machado de Assis, colaborei no periódico “A Estação”. Virei um ferrenho abolicionista e escrevi muitas peças e artigos sobre o tema, tive inclusive peça proibida pela censura imperial...
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memória paulistana
(Câmera circula e enquadra de perfil. Ele fala para a câmera)
Foi uma época muito boa na minha formação pessoal, e nessa minha caminhada por esse mundão, eu escrevi milhares de artigos sobre arte, e encenei mais de 100 peças no Brasil e em Portugal! Isso é importante, pois imagino que deve ser por isso que inventaram de botar meu nome nesse teatro, não é? (Câmera aproxima)
Eu, como artista e jornalista, carregava uma ideia de um mundo mais interessante e com mais arte e liberdade, tanto que quando eu estava no Rio de Janeiro, uma das coisas que mais me instigavam era escrever artigos, para pressionar o governo a aprovar uma lei, que previa a construção de um teatro municipal na cidade. (Câmera fecha no rosto dele)
Ora! Evidente que eu fui um entusiasta da ideia, pois as artes cênicas estavam numa penúria terrível! Imaginei que um teatro municipal seria um alento e uma salvação para as artes naquela época! Eu só sei que batalhei muito pra isso acontecer! Muito mesmo! (Câmera abre suavemente)
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Só tinha uma coisa que eu achava um horror na ideia toda... (PAUSA) Aquele pano de boca pintado pelo Eliseu Visconti era um horror! Eu morri criticando aquilo! Enfim... O Eliseu que me perdoe, mas aquilo era absurdamente horrível! Uma concepção artística equivocada e atrasada... Um vexame! (Pausa. Câmera se afasta um pouco e fica em plano americano)
O fato chato disso tudo, é que depois de brigar tanto para que tivéssemos um teatro municipal no Rio de Janeiro, eu não assistiria à sua inauguração em 14 de julho de 1909, pois morri e “deixei o combinado” nove meses antes... Mas não vou chorar o leite derramado e nem regatear pra nada! Para quê? “Mais tem deus para dar, do que o diabo para tomar.” (Câmera fecha nele)
Senhoras e senhores, muito prazer! Artur Azevedo ao seu dispor!
cacilda becker
POR LUAA GABANINI (TEXTO DE RUDIFRAN POMPEU) Cacilda Becker está em algum lugar, conversando com alguém que não se vê (câmera distante se aproximando em perfil).
coragem, e, isso, penso que nunca me faltou!
CACILDA BECKER
Falam que eu carrego um sotaque estranho, quer dizer... Mais pra esquisito, né? (Risos)
(Luaa Gabanini)
Falavam muito que eu tinha um nariz grande! (Risos) Até aí, tudo normal... Afinal, o que eu precisava era ter
(Câmera fica no rosto dela)
(Câmera afastada)
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Bom... Tem que saber que o meu pai... O seu “Edmondo Laconis” era um legítimo imigrante italiano! Daí não tem jeito, né? O sotaque vem mesmo... É uma questão hereditária... (Risos) E ainda por cima tem essa coisa de interior que gruda na gente e nunca mais sai, né? (Câmera cruza por trás dela e fica frontal)
CACILDA
(olha para câmera e sorri)
Prazer, Cacilda! (Plano vai para a mão e volta para o rosto)
CACILDA
(como se falasse para alguém)
É que eu nasci em Pirassununga! Isso deve ter provocado alguma influência no meu jeito de falar... (Risos) (Câmera permanece frontal)
Tem gente que pensa que eu sou natural do litoral, mas eu só fui morar em Santos depois da separação de meus pais... Na verdade, sou pé vermelho do interior mesmo... (Câmera recua lentamente) O Becker é de mamãe “Alzira Becker”, meu nome de batismo é “Cacilda
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Becker Yáconis”, mas no teatro sempre fui Cacilda! Cacilda Becker! (Câmera distancia lentamente)
Eu não sei bem quais as razões que levam alguém pra este ou aquele caminho, mas tem uma pulsão... Uma intensidade... Um “troço” que arrebata a gente pra essa coisa magnífica que é o teatro! Isso eu entendo bem! (Câmera aproxima lentamente)
Foi no palco que eu pude viver coisas que jamais pensaria, ou sequer imaginaria se ainda estivesse trabalhando na firma de seguros... (Pausa)
Sim, eu fui “escriturária numa firma de seguros” em São Paulo! Também tenho um diploma de professora, viu? O teatro foi um encontro que de fato já estava previsto na minha vida, é como eu penso e gosto de pensar. Tanto é que aos 20 anos, eu fui ao RJ pra ser aquilo que eu sempre, de alguma forma, quis ser... Atriz! (Câmera marca detalhes nela)
Nesse caminho artístico, eu trabalhei com muita gente, e o começo da minha trajetória como atriz foi em 1941 com o
memória paulistana
Raul Roulien, no Rio de Janeiro... O Raul era um ator e diretor de cinema e teatro importante naquela época... Aliás, um dos primeiros a fazer filmes para Hollywood! (Câmera aproxima em close)
Não... Eu não permaneci muito tempo “fixada” por lá, não! Tanto, que retornei pra São Paulo em 1943 e fiz radioteatro, trabalhei inclusive com o Décio de Almeida Prado... Eu fiquei meio que “chinelo de véio”, meio lá e meio cá, compreende? Mas claro que fiz muitas coisas importantes no Rio, trabalhei com Ziembinski, fiz “Vestido de Noiva”, do Nelson Rodrigues... Enfim muitas coisas, mas considero que me profissionalizei de fato aqui em São Paulo, onde inclusive lecionei interpretação na Escola de Arte Dramática e depois fui para o TBC Teatro Brasileiro de Comédia. onde me contrataram como atriz... (Câmera afasta em lateral)
Ah... Foi contrato mesmo! (Risos) E essa história tem um pano de fundo, que falando agora parece até engraçada, mas na época não era não... (Câmera aproxima)
A coisa aconteceu porque a Nydia Licia,
que era a atriz que eles pensaram, recusou o papel na peça “Mulher do Próximo”, do Abílio Pereira de Almeida, que estava sendo produzida pelo TBC. O caso é que ela só recusou o papel porque não queria dizer “amante” e nem queria beijar em cena, pois isto podia lhe custar o emprego numa loja da época... (Risos). Foi daí que me chamaram para substituí-la, e eu então exigi que me contratassem... Afinal tinha que parar com essa coisa de que artista é “diletante” e pode ficar ao sabor do vento, né? A gente precisava profissionalizar! (Câmera afasta por cima)
Por volta de 1955, o Teatro Brasileiro de Comédia começou a declinar, e os diretores europeus voltaram pra Europa, eu achei que estava na hora da gente andar com as próprias pernas, e eu, e o Walmor, que na época era meu marido, alugamos o teatro da Federação Paulista de Futebol, e criamos o TCB - Teatro Cacilda Becker, e junto conosco, veio trabalhar a minha irmã Cleyde Yáconis, que era atriz também, e o Ziembinski, que eu já conhecia há bastante tempo, e para inaugurar o teatro a gente montou o “Santo e a Porca”, do querido Ariano Suassuna... (Câmera aproxima em plano americano)
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memória paulistana
O nosso trabalho estava indo muito bem, mas eu resolvi dar uma breve parada na trajetória da companhia em 1968, para assumir a presidência da Comissão Estadual de Teatro, que em minha opinião era muito importante para a classe teatral, e muito por isso, é que fui ser uma espécie de mediadora entre o governo e os artistas, mas isso foi coisa de um ano, pois que em seguida eu retornei para o trabalho na cena. Claro que continuei na militância, mas de forma paralela ao meu ofício artístico... (Câmera percorre o corpo da atriz e se distancia devagar)
Depois da minha passagem pela Comissão Estadual de Cultura, eu recebi um convite desafiador... (Risos). E a gente gosta dessas coisas, né? O artista tem uma coisa de apreciação por ser provocado e de encarar as coisas, que é um negócio bonito de ver, né? (Pausa longa. Ela olha distante como quem lembra de algo muito importante, contemplativa)
Eu fui convidada e aceitei o desafio para interpretar, nada mais nada menos, do que o “Estragon” da peça “Esperando Godot”, do Beckett, com a direção do Flávio Rangel... Talvez eu imaginasse na época que esse seria um dos
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marcantes desafios da minha carreira, e acreditem... Foi! (Câmera aproxima dela) Nesse ano de 1969, eu que tinha sido casada com o Tito em primeiras núpcias, já estava separada do Walmor e já carregava quase 30 anos de carreira, com 68 peças encenadas entre Rio de Janeiro e São Paulo... Algumas telenovelas, uns três filmes além de outras participações em teleteatros… Como poderia imaginar que num dia qualquer, entraria no palco para o primeiro ato de um espetáculo, e depois não voltaria para receber os cumprimentos da plateia? E nem para despedida dos meus filhos, amigos e familiares? Às vezes esses são os mistérios e os desafios da vida da gente, né? É... Parece clichê, mas é bom saber que é preciso viver cada dia como se fosse mesmo o último, né? ... “a gente está na vida emprestado”! Bom... Muito prazer! Eu sou a Cacilda! Cacilda Becker! (Câmera afasta, sobem as legendas com jornal da época).
flavio império
POR ARTHUR MATTAR (RECORTE DE DEPOIMENTOS DE FLÁVIO IMPÉRIO COM INTERVENÇÕES DE PEDRO PIRES) FLAVIO IMPÉRIO (Arthur Mattar)
Nasci no Bexiga e lá me criaram, por certo, um dia, eu virei “arquiteto”, depois “professor”, depois “cenógrafo”, depois “pintor”, desenho desde criança.
o teatro me ensinou a vida, a arquitetura o espaço, o ensino a sinceridade, a pintura a solidão. o teatro me fez amigo da multidão, a arquitetura me fez amante da terra, da água, do ar, da lua, da cor, da matéria, do fogo, do som, o ensino me fez aluno da mansidão.
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a pintura é meu diário, sem segredos, da peça que sou atuante e autor. pinto só o que sinto, pinto só o que vejo com todos os meus sentidos, não pinto em vão, sonho com a hora de alguém sonhar junto, livre, o que quiser, como quando reconhece num canto o seu canto e canta. pinto pra me acompanhar, no fantástico show que a vida me dá. desde 1970 pinto mais constantemente, arquiteto meu quarto dentro do quarto que moro (ele é calmo e claro), arquiteto meu jardim sobre o piso de lajotas que alugo, barato, Arquiteto meu sonho de uma arquitetura simples e clara, e calma, com jardins de flores caipiras que, pelas estradas, não custa nada a muda, além de boa conversa e uns bons conselhos sobre a vida da plantinha, quebradinha que espera na minha mão. Ela não fica assustada. eu não mato, só planto. e o que colho? Ao longo do meu caminho, muitos agradecimentos, conselhos, bons tratos de gente que gosta de gostar das coisas que a terra dá. planto e colho prá plantar, prá rimar. meu pai: Domingos Império. minha mãe : Helena Fausto.
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filhos de tantos italianos que no Brasil procuraram novo céu. no Bexiga, 42 anos em dezembro, sob o mesmo céu escolhido por meus avós. “respirando o mesmo ar…” Meu nome? Flávio Império. É sei sim que virei o nome de um teatro. O que eu acho disso? Sei lá, depois que a gente morre, não pode achar mais nada. E o que achei na vida, procurei dividir com as pessoas que me cercavam. Acho que achei muita coisa boa na vida. Muita gente boa. Mas gosto de ele, o teatro, ser em Cangaíba. Por quê? Com 20 anos de idade, em 1956, fui dirigir um teatrinho com crianças numa comunidade operária orientada pelo frei dominicano João Batista Pereira dos Santos, na Estrada do Vergueiro. A Maria Thereza Vargas dirigia o grupo amador de lá, e eu, o teatro infantil da escolinha de arte. Então a Maria Thereza foi para o Rio para dirigir os “Cadernos de Teatro” (uma publicação que foi muito importante para o teatro). E eu assumi o grupo de teatro amador
memória paulistana
no lugar dela. Dirigi, fiz cenografia para o elenco amador adulto durante quatro anos. Saía da FAU às seis da tarde e ia diretamente até o Vergueiro, onde trabalhava religiosamente até 11 horas ou meia-noite. Aos sábados e domingos, em tempo integral. Esse período foi um dos mais ricos da minha vida por permitir uma convivência bastante íntima e afetiva com setores da população que só vim a encontrar depois, nas filas de ônibus, nos bares, mas sem nenhuma possibilidade de um convívio mais profundo no plano humano. Depois, e muito importante também para mim, foi ter viajado muito pelo Brasil. Sempre de ônibus. Então, como disse, gosto do meu nome ser o de um teatro por ele ser em Cangaíba. Por esse motivo. Esquecido entre os esquecidos. Ah, e gostei muito de saber do projeto que a Companhia Estável desenvolveu ali nos anos 2000. No tempo que ocupou aquele espaço. E trabalhou com e para a população da região. E, portanto, resgatou o teatro, ou melhor levou o teatro para aquela população. Para a vida deles. Durou pouco, mas fez uma diferença naquele momento.
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Gosto muito das pessoas daquela região. Mesmo sem conhecer, mas que já conheci. E gosto muito do pessoal da Estável sem tê-los conhecido. Eles fizeram uma diferença botando a mão na massa. E mão na massa é fundamental. Quando fui professor da FAU, da USP, fazia meus alunos colocarem a mão na massa. Porque pra mim o resultado mais sensível é o que vem da ideia e da mão na massa. O compromisso que integra o pensamento à ação, e isso o teatro me ensinou. Porque se fosse pra ser separado, uns nasceriam só com a cabeça e outros só com o corpo. Mas nascemos com os dois. A mão e a massa cinzenta. E daí, dessa conexão surge a estrutura, os movimentos, as formas as cores. A vida. É depois fui pro teatro chamado “profissional” Pro Arena, Pro Oficina. Trabalhei muito com eles e depois com outros que foram muito importantes para o teatro.
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Mas se puder escolher fico com as memórias da Estrada do Vergueiro e acrescento as do pessoal de Cangaíba. Quer mais um pouco? Então acrescento uma memória de 1965: (...)Sou filho de uma geração que lutou entre si para definir o mundo de nosso tempo. Recebi de herança um pacote muito bem embrulhado para presente. Dentro dele, uma pomba branca e uma granada. Recusei, recusamos, os dois. Preferimos o próprio mundo e suas contradições reais. Preferimos o perigo da realidade. Vivi, “vivemos num tempo de guerra”. Em tempo de guerra não se dá presentes, nem há tempo para se adotar símbolos esvaziados. Queremos saber e, aos poucos, descobrimos os significados da guerra. Construímos os nossos próprios símbolos a partir desses significados. Legal? Valeu!
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POR IVAM CABRAL (TEXTO DE JOSÉ FERNANDO PEIXOTO DE AZEVEDO) Diante da câmera, João Caetano escuta alguém fora do quadro a fazer perguntas. Em tom de conversa, com alguma intimidade, ele inicia, depois de escutar a primeira pergunta:
JOÃO CAETANO Eu sou um ator. Sobretudo um ator.
Talvez essa afirmação não signifique muito para vocês. Fico curioso de saber como vocês, daí de onde me veem, veem o que eu fui e o que eu fiz. Fui ator que entendeu desde cedo que, para ter o teatro que imaginava necessário, eu também precisaria ser o empresário, o professor. Para fazer do teatro uma instituição seria necessário começar do início, como dizem divertidos os que se sabem inventando as coisas. Então,
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quando digo que sou sobretudo um ator, inclua aí todas essas funções para dar à palavra ator a dimensão real que ela implicava num país como o nosso. Digo um país como o nosso, mas espero sinceramente que o meu país seja inteiramente passado em relação ao país de onde você me faz perguntas. Eu quero crer que o tempo corrige as coisas. Eu fundei a primeira companhia teatral brasileira em 1833. Alguém diria que meu ímpeto era por demais nacionalista. Certamente assim fui interpretado pelos artistas portugueses que costumavam aportar em nossas terras. Eu mesmo aprendi muito com eles. Pouco antes, em 1929, eu trabalhara no Teatro São Pedro, onde conheci Estela Sezefreda, com quem me casei. Vocês não sabem o que era ver Estela dançar! Mas voltando: a empreitada de 1833 tinha como fim libertar nossa cena da direção estrangeira. Não sei se o futuro tomou conhecimento de nossas lutas. Talvez as conquistas do tempo paguem o preço do esquecimento. Mas naquele ano eu fui tomado pelo ímpeto de escrever ao então Ministro Senhor Marquês de Olinda um ofício que fazia menção à “necessidade de uma escola dramática para ensino de pessoas
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que se dedicarem à carreira teatral, provando também a utilidade de um teatro nacional; bem como os defeitos e decadência” do então praticado. Se eu falava ali da falta de uma escola, insistia também sobre a necessidade de uma efetiva remuneração aos artistas e condições que garantissem a qualidade dos cenários e o conforto das salas. Com isso, meu propósito não era tanto excluir de nossa cena a presença do estrangeiro, mas antes, intentava garantir que entre nós um teatro de igual valor se erguesse e então pudesse conviver e receber os de fora, com a dignidade de um efetivo convívio. Vocês me dirão o que é o futuro. E o que um ator expressa sobre si, o mundo e o tempo quando diz “eu sou um ator”. Eu, por exemplo, escrevi livros que visavam estabelecer uma verdadeira ética para o artista da cena, fazendo saber que nem tudo é inspiração. Foram Lições e Reflexões Dramáticas que adaptavam para as nossas necessidades as técnicas que eram as mais visadas entre os artistas que nos serviam de modelo. Mas o teatro é uma arte do tempo. Eu poderia dizer que o meu teatro foi um teatro das transições interrompidas, o teatro de um tempo de transições que nem sempre foram levadas até o fim. Eu ousaria dizer que isso descreve um
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pouco do que éramos enquanto país. Mas eu sou um homem do passado. Eu morri em 1863. O que estaria acontecendo 100 anos depois de minha morte? Vi dois imperadores e muita luta. Não é o teatro esse lugar de onde falam os fantasmas? Eu vi e encarnei muitos. Meu maior esforço sempre teve a ver com a compreensão de que era preciso estabelecer algo partir de uma vida toda ela nova, inventar uma história que já nascia com a imposição de ser outra, pois o império era também o herdeiro dos males da colônia que, entre outras coisas, trazia na carne a marca do cativeiro. Com isso, não sou apenas um homem do passado, mas talvez tenha passado muito tempo buscando no passado algo que pudesse servir de base para o teatro que deveríamos fazer nascer ainda que à força.
aos embates, entendi que este grande vulto trágico quando falava devia trazer à ideia do espectador o rugido do leão africano, e que não devia falar no tom médio de minha voz, para ajustar todas as inflexões naturais e convenientes às variadas paixões que Otelo devia exprimir. Todos que vieram depois me quiseram imitar. Alguns dizem que eu gritava, e há quem diga quem meu personagem Otelo quase matou com as mãos a atriz que encarnava Desdêmona. Impressões exageradas de um efeito de verdade, talvez. Mas o tempo corrige as coisas, eu disse. Então fico imaginando e te pergunto: eu era um Otelo pintado, num país em que o negro não vinha de Veneza, mas era vendido e espoliado no Valongo – e no seu tempo, que é o meu futuro, é negro na carne e na presença o Otelo do seu teatro?
Pus à cena autores nossos como Gonçalves Magalhães e Martins Pena, do drama histórico à comédia, mas também clássicos do mundo, como o mouro Otelo, de Shakespeare. Havia um ator francês, Talma, amigo de Napoleão, que me foi sempre a inspiração. Seus gestos iam além da impostação falsamente nobre. Lembrome que quando me encarreguei do papel de Otelo, depois de ter dado a este personagem o caráter rude e um filho do deserto, habituado às tempestades e
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paulo eiró
POR PEDRO PIRES (TEXTO DE PEDRO PIRES) PAULO EIRÓ (Pedro Pires)
E aí mano, beleza? Meu nome (...) Paulo Eiró. Sou eu mesmo. Ué mano, vocês me chamaram aqui, pra essa mesa branca, então eu vim.
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E estou falando assim, na linguagem do hoje de vocês, que é pro pessoal aí me entender. Se eu falasse que nem falava, nos mil e oitocentos, ia ficar mais difícil. Ia parecer aquele cara que foi meio presidente. É, como é mesmo o nome dele? Isso o Temer. O “temerável” Temer. Aí a turma ia encher o saco e não ia se
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ligar. Tá ligado. Na minha época... Não, não tinha presidente. Tinha imperador. O Pedro Segundo. Eu, eu era contra ele, era REPUBLICANO. Por quê? Porque depois da inconfidência mineira, da revolução francesa, a gente não acreditava mais nessa de imperador. Do cara que mandava até morrer. Queria liberdade. Queria democracia. Queria poder escolher quem governava. E não deixar o cara sentar no trono porque deus queria. E ficar lá para sempre. Sente só o que escrevi na época: “Tambores da República tocando nas praças o rebate Oh sonho mais querido o mais dourado dos meus sonhos VATE”. Sentiu? A levada é boa, não acha. Tem umas inversões na fala. A gente usava muito, era a tradição, o jeito da época. Acha difícil? Depois que o ouvido acostuma, fica fácil. Que nem Rap. Acostuma com a linguagem e daí fica fácil.... VATE? Significa profecia. No poema
quer dizer o que eu quero pro futuro, o que eu espero que chegue. Eu escrevi muita poesia. Era a nossa linguagem. Era o jeito de pôr pra fora o que a gente sentia por dentro. Pra pôr pra fora o que a gente via de errado do lado de fora. Arte é sempre isso. Botar pra fora o que te incomoda. O teatro? Escrevia peças também. Bom, desde pequeno brincava de teatro. Depois comecei a escrever peças. Gostava. Até cheguei a fazer um teatro aqui em Santo Amaro. Pro pessoal daqui poder ver. Aqui não tinha. Em São Paulo, tinha. Tinha as companhias brasileiras da corte, do Rio de Janeiro, e tinha as portuguesas que vinham pra cá. Apresentavam no teatro São Paulo. É pra elite. Aí fiz um aqui pro pessoal daqui poder ver. E pra falar das nossas coisas. Dos que eu escrevi vocês só conhecem um texto. “O Sangue Limpo”. O resto se perdeu. Da poesia ficou mais. Mas do teatro só uma. Falava da ESCRAVIDÃO. Eu era contra. Era Abolicionista, mano. Achava um absurdo a escravidão. Coisa de louco. Eu via aquilo e achava um absurdo. Eu morri cedo. Com 36. Nasci em 1836 e morri em 71. Mas eu era branco da
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classe intermediária. Tive sorte de não ter nascido negro. É sorte mano. Ou você escolhe onde nasce. Mas os pretos morriam mais cedo ainda. Porque era judiado. Apanhava, comia mal. Mas no hoje de vocês não mudou muito, né. Os pretos, a moçada das quebradas vive menos. É a turma que tá por aí no corre. Ralando. Entregando comida de bike, zanzando por aí de moto, fazendo bico de intermitente. Na minha época era tudo preto. Porque o trabalho “denegria” o homem branco. Era coisa de preto. Depois da libertação mudou. Melhorou um pouquinho. Mas se pensar que passaram quase 200 anos e só melhorou um pouquinho, então (noves fora) Piorou Né. São 200 anos e a maioria virou escravo. Porque trabalhador de hoje é o escravo de ontem. Só que tem que procurar um dono né. Pô mano, tá de brincadeira. Sente só: A maioria passa a vida trabalhando, ralando, só pra sobreviver. Esse negócio de que o trabalho enobrece o homem é truque pra fazer os cara ficarem 4 horas no busão 8 horas trampo e ainda dar graças a deus que não tá desempregado.
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Se eu tô injuriado? Injuriado (...) não eu tô é triste, sempre fui triste. O pessoal dizia que eu era loco, mas eu era triste porque eu via, via como era a vida – na real. E não me conformava. Sempre fui curioso. Por quê? Porque era curioso pela vida. Pra ver a vida de perto e de longe. Eu via a vida andando por ela. Era andarilho. Conheci o Brasil andando por ele. Andando e vendo. Saía andando por aí. Fui conhecer outros lugares. Tudo a pé. Ficava um par de meses fora. Fui pro Rio, Pra Minas - a pé. Ia pra ver a vida. Andava via e escrevia. No fim da minha vida? O que aconteceu? Me puseram num manicômio. Num hospício. Diziam que eu era loco. Tinha umas crises. Mas como eu disse era de tristeza e de inconformismo injuriado. Morri lá no manicômio. O quê? Você tá com minha peça aí. A legal. Quer que eu leia um pedaço. Tá Manda aí o livro. Sente só:
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“(...) O Brasil é uma terra de cativeiro. Sim todos aqui são cativos. Os negros trabalham seminus ... o índio que, por um miserável salario, é empregado na feitura de estradas e capelas; o selvagem, que fugindo a colonização, vaga de mata em mata; o pardo a quem apenas se reconhece o direito de ser esquecido; o branco, enfim, que sofre de má cara a insolência dos mais ricos e o desdém do governo. Quando caírem todas essas cadeias, quando esses cativos todos se resgatarem há de ser um belo e glorioso dia!”. Sentiu? É atual? Não mudou muito, né?
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A realização deste vídeo foi uma vivência muito rica e completa, uma maneira diferente de conhecer a capital paulista. Foram alguns dias de gravação, por toda cidade, acompanhados do ator Pascoal da Conceição caracterizado de Mário de Andrade, personagem de destaque na Jornada do Patrimônio 2019. Antes de realizarmos as gravações, foi feita uma pesquisa e levantamento dos mais diversos lugares, tombados pelo Departamento do Patrimônio Histórico, que representassem a diversidade patrimonial e cultural da cidade de São Paulo. Dessa maneira, tentamos contar uma história na qual a personagem (Mário de Andrade) pudesse, em pouco tempo, passear por esses importantes lugares, que, por meio de seus contextos históricos, arquitetura, personagens e personalidades, também contassem a história da nossa cidade. E, assim, acabamos que fazendo a nossa própria Jornada, conhecendo e reconhecendo espaços e locais que fazem parte da nossa memória, da nossa relação com a cidade, nos proporcionando não só contar essas memórias, mas também criá-las.
Juan Quintas Rodrigues
Filmmaker Diretor do vídeo da Campanha Publicitária da Jornada do Patrimônio 2019
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390 SESC Pompéia. FOTO: Dalmir Ribeiro Lima
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SESC
NA JORNADA
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Cinemateca.FOTO: Mayra Vergotti
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SESC na jornada do patrimônio
lembrar em coletivo A consistência de uma parceria está relacionada à qualidade da relação que ela expressa. Quando as instituições envolvidas num diálogo desenham trajetórias convergentes, essa relação torna-se um desdobramento coerente do trabalho já realizado por cada uma delas. Em 2015, o Sesc São Paulo estreitou sua proximidade junto ao Departamento do Patrimônio Histórico (DPH), da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo, ao participar da Jornada do Patrimônio. A sinergia entre os propósitos do evento e as ações de Turismo Social ficaram evidentes, pois perceber o espaço urbano tecido por camadas de memórias a serem visibilizadas é uma das características da ação do Sesc na área. Isso se dá principalmente por meio de passeios que são oferecidos regularmente por diversas unidades, tendo como foco de interesse a complexidade histórica das cidades. Outras atividades, como palestras, bate-papos e oficinas, ajudam a contextualizar determinados aspectos, como a invisibilização das memórias de certos setores da sociedade e a conexão entre patrimônio cultural e cidadania. A cada ano, uma seleção de ações sintonizadas com os recortes temáticos propostos pelo DPH constitui a participação do Sesc na Jornada do Patrimônio. Para sublinhar o viés educativo das proposições, materiais gráficos específicos, elaborados com a colaboração de especialistas, têm sido anualmente produzidos, dando maior perenidade para a iniciativa. O incremento da parceria entre Sesc e DPH, além de refletir a complementaridade dos papéis
de ambos, testemunha a centralidade da questão do patrimônio na atualidade. Trata-se de um debate pleno de paradoxos, consequência de modelos de desenvolvimento urbano que em geral desconsideram o potencial inerente à preservação das marcas do passado. O Sesc tem enfrentado esse tema em diversos campos, dentre os quais o trabalho em Turismo Social merece destaque. Para estar à altura dessa circunstância, discussões e processos formativos envolvendo as equipes são instâncias fundamentais, sem as quais corre-se o risco de abordagens simplificadoras da realidade. Nesse sentido, os técnicos do DPH por diversas vezes ajudaram a qualificar o repertório dos funcionários do Sesc encarregados de propor programações, tornando ainda mais orgânica a relação entre os parceiros. Os cidadãos são protagonistas em diversos momentos desses processos. Em termos da concepção, grupos e coletivos organizados da sociedade colaboram com o Sesc, construindo propostas de passeios cujo destaque é a leitura crítica do mundo. No que diz respeito à recepção, as pessoas são convidadas a participar das ações e interpretar as camadas de tempo da metrópole. A pertinência da Jornada do Patrimônio sugere a continuidade desse trabalho nos próximos anos. A pauta da memória parece ocupar definitivamente seu devido espaço, constituindo uma espécie de contrapeso num cenário de futuro incerto. Cabem às instituições comprometidas com políticas culturais democráticas responder à altura a essa situação, evidenciando que a compreensão aprofundada do já-vivido é pressuposto para a ampliação dos futuros possíveis.
SESC São Paulo
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passaporte jornada
passaporte
JORNADA
memória paulistana
Na Jornada do Patrimônio 2019 - Memória Paulistana, os participantes tiveram um novo estímulo para apreciar as atividades. Com o passaporte da Jornada, o público conquistou recompensas enquanto visitava imóveis históricos tombados nas cinco regiões da cidade. Ecobags, botons históricos das Jornadas, convites para teatros e pratos típicos paulistanos foram
oferecidos por estabelecimentos comerciais gastronômicos com o Selo de Valor Cultural. Para participar, bastou colecionar carimbos ao aventurar-se pela cidade, conhecendo as histórias e memórias dos imóveis históricos.
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Arqueologia do Projeto
“Uma vez uma amiga disse: ‘a Jornada do Patrimônio é o projeto mais bonito da Cidade de São Paulo!”
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Ao assumir a coordenação da Jornada, ainda às vésperas da edição de 2018, me deparei com o enorme potencial do projeto que almejava maior visibilidade. Afinal, estamos tratando da memória da maior cidade da América Latina e o desafio é imensamente proporcional. Iniciamos então um planejamento de gestão que resultou na maior edição da Jornada desde sua criação. Por essência, o projeto existe através da participação da sociedade civil, principalmente na proposição de palestras, oficinas e roteiros de memória, mas essas ações necessitavam de uma ação mais ampla de engajamento e democratização para criar pertencimento. Para transformar e potencializar o caráter democrático do projeto com a política pública que lhe é inerente, o passo inicial foi elaborar o que viriam a ser os primeiros editais regulamentados para a sociedade civil. O resultado dessa ferramenta foi visivelmente consolidado com o sucesso de inscrições que geraram a maior participação de interessados nos três principais eixos da Jornada: Imóveis Históricos, Oficinas e Roteiros de Memória. Junto a essa ação, outras duas foram construídas para fortalecer e engajar, motivando essas participações. A primeira foi a criação de fotolivros digitais que apresentavam um resumo de cada edição da Jornada do Patrimônio. Essa ferramenta foi fundamental para que novos agentes culturais pudessem conhecer e participar do projeto, muitos pela primeira vez. A segunda foi o envio de cartas convites aos cerca de três mil proprietários de imóveis tombados na capital paulista. Dessa forma, conseguimos construir uma base sólida e democrática que se concretizou nas mais de 1.000 atividades por todos os cantos da cidade.
memória paulistana
O resultado direto foi a ampla participação dos agentes culturais da periferia, destacando-se a atuação de representantes da comunidade e da cultura afrodescendente na cidade. Essas ações contribuíram, também, para o fortalecimento da política pública que torna a Jornada do Patrimônio o principal evento de valorização do patrimônio cultural na cidade de São Paulo. O tema “Memória Paulistana” trouxe para o projeto uma forma mais abrangente de dialogar com a cidade, a partir de ações que jogaram luz sobre lugares de memória e grupos associados a manifestações culturais simbólicas nos diversos territórios da cidade. Também proporcionou a valorização do conhecimento trazido pelos moradores antigos dos bairros por meio de diversas ações desenvolvidas nas oficinas e roteiros de memória. Nessa perspectiva o projeto trouxe o reconhecimento aos espaços culturais não tombados, mas que são importantes lugares que desenvolvem e fomentam a cultura, principalmente na periferia, como os CEUs e as Fábricas de Cultura, que participaram pela primeira vez da Jornada. Dentro do projeto de calendário integrado implantado em 2019 na SMC, conseguimos engajar a participação de todos os equipamentos culturais da pasta, tombados ou não, com programações diversas voltadas para a valorização da memória e do patrimônio histórico e cultural. A curadoria artística pautou-se, especialmente, nas edições do projeto “Patrimônio em Debate”, que promoveu seis encontros regionais entre técnicos e pesquisadores do Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) com agentes culturais dos territórios da cidade, em uma ação também inédita na história
do Departamento, que completou 45 anos em 2020. As contribuições coletadas ao longo desses seis encontros estimularam e forneceram conteúdo para a criação dos Cortejos de Memória, espetáculos a céu aberto que trouxeram personagens históricos e grupos de manifestações culturais de cada região da cidade, dialogando com as paisagens culturais e imóveis históricos nas cinco macrorregiões paulistanas. O destaque dessa edição foi O Grande Cortejo da Memória Paulistana, construído a partir de memórias relacionadas com o centro histórico da capital e trouxe grandes nomes da dramaturgia brasileira para interpretar personagens icônicos que recontaram parte da história da cidade de São Paulo. A 5ª edição da Jornada do Patrimônio foi um convite para celebrar todos os cantos da cidade de São Paulo, através de histórias, memórias, pessoas e lugares que constroem nosso patrimônio cultural e refletem a identidade diversa e plural da capital paulista através de iconografias, personagens e paisagens culturais. O objetivo foi compartilhar e fortalecer iniciativas de valorização do patrimônio cultural paulistano que procuram trabalhar seus distintos territórios, evidenciando as particularidades históricas e aspectos contemporâneos das cinco regiões da cidade: centro, norte, sul, leste e oeste.
Higor Advenssude
Coordenador Geral da Jornada do Patrimônio 2019
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créditos O GRANDE CORTEJO DA MEMÓRIA PAULISTANA ELENCO E GRUPOS PARTICIPANTES Ailton Graça Beth Araújo Cassio Scapin Fernando Sampaio Kelly Campelo Laila Garin Leopoldo Pacheco Letícia Coura Marcelo Drumond Pascoal da Conceição Raul Barreto Back Spin Crew Bloco Afro Afirmativo Ilu Inã Escola de Samba Vai-Vai Nega Ziza Teatro Oficina
CONCEPÇÃO E CURADORIA
Higor Advenssude e Lindsay Castro Lima
DIREÇÃO ARTÍSTICA
Georgette Fadel e Paula Klein
ASSISTENTE DE DIREÇÃO
Laura Fajngold e Sarah Lessa
DRAMATURGIA
Bernardo Galegale
PRODUÇÃO EXECUTIVA Mariana Mantovani
PESQUISA E CONTEÚDO Walter Pires
PRODUÇÃO GERAL
Gabrielle Araújo, Solange Santorsula, Viviane Bezerra e Zé Lima
EXPEDIÇÃO FOTOGRÁFICA GLOBO ATRAÇÕES ARTÍSTICAS
COORDENAÇÃO GERAL
Comunidade Indígena Wassu Cocal (Toré) Grupo Treze de Maio- Samba do Cururuquara (Samba de Bumbo) Comunidade de Samba Rock de São Paulo (Samba Rock)
COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO
CURADORIA
PRODUÇÃO ARTÍSTICA
Diego Dionísio
Daniela Matarazzo, Leslie Arias, Stephanie Genesini Bianca Temple
PRODUÇÃO
Aleteia Beller, Camila Thomaz, Jade Massaranduba, Juliana Nunes, Thamara Mssaramduba Gabriela Carrara, João Perreka
MUSEU DE RUA DIRETOR DO DEPARTAMENTO DOS MUSEUS MUNICIPAIS DE SÃO PAULO Marcos Cartum
CURADORIA
Henrique Siqueira
EDUCATIVO DA JORNADA DO PATRIMÔNIO 2019 ORGANIZAÇÃO
DESIGN GRÁFICO
PESQUISA E CONTEÚDO
ILUSTRAÇÃO
Higor Advenssude Alice Almeida, Fátima Antunes e Walter Pires
Leila Zelic
Augusto Figliaggi
REINTEGRAÇÃO DE POSSE CONCEPÇÃO E PRODUÇÃ GERAL
CONCEPÇÃO DA EXPOSIÇÃO
REGISTRO AUDIOVISUAL DA EXPOSIÇÃO
GESTÃO GERAL DO PROJETO
Abilio Ferreira e Jorge Peloso Sidnei Paixão e Natália Pilati
Abilio Ferreira, Alicia Peres e Jorge Peloso Soraia Ferreira
CIDADE SUBMERSA ELENCO
DRAMATURGIA
CONCEPÇÃO
DIREÇÃO DE ARTE
DIREÇÃO
CONCEPÇÃO MUSICAL
Jorge Peloso e Marília Amorim Impulso Coletivo Jorge Peloso
Dorberto Carvalho e Equipe Vivianne Kiritani, com colaboração de Melissa Rudalof Verlúcia Nogueira e Equipe
A CASA DA FAYOLA ADAPTAÇÃO DO CONTO E CONCEITO Camila Andrade e Jorge Peloso
CORTEJO DE MEMÓRIA DA LESTE GRUPOS PARTICIPANTES Cordão Carnavalesco Dona Micaela Kambaia Cordão Folcórico de Itaquera- Sucatas Ambulantes Folia de Reis do Oriente da Vila Nhocuné Jongo dos Guaianas
CONCEPÇÃO
Higor Advenssude
CURADORIA
Grupo Ururay- Patrimônio Cultural
PRODUÇÃO
Liana Crocco
PRODUÇÃO GERAL Mariana Perin
PRODUÇÃO EXECUTIVA Patrícia Freire de Almeida
REALIZAÇÃO
Movimento Cultural Penha
CORTEJO DE MEMÓRIA DA NORTE GRUPOS PARTICIPANTES Bando Bom Roda de Choro com Fê Braga
CONCEPÇÃO
Higor Advenssude
PRODUÇÃO
Escritório de Ideias
CURADORIA
PRODUÇÃO EXECUTIVA
APOIO INSTITUCIONAL
PRODUÇÃO GERAL
Luiz Carneiro
Paróquia Nossa Senhora do Ó
Claudia Monteiro, Paula Venancio e Raissa Couto Mariana Perin
CORTEJO DE MEMÓRIA DA OESTE GRUPOS PARTICIPANTES Bloco Carnavalesco Arrianu Suassunga Bloco Carnavalesco Pilantragi Bloco Carnavalesco Vai Quem Quer Caixeiras do Divino Espírito Santo da Família Menezes Catador de Canções Cia Brasílica Cia de Artes do Baque Bolado Coletiva Juremas Tambor de Crioula Sarrabulho
PRODUÇÃO
Guto Rodrigues
ASSISTENTES DE PRODUÇÃO
Frederico Torres e Gabriel Gonçalves Ribeiro
COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO Lucila Poppi
PRODUÇÃO GERAL Mariana Perin
CONCEPÇÃO
DIREÇÃO TÉCNICA
CURADORIA
PRODUÇÃO TÉCNICA
Higor Advenssude Danielo Leite, Deca Madureira e Lucila Poppi
Zé Lima
Isaac Ramos
CORTEJO DE MEMÓRIA DA SUL ATORES E GRUPOS PARTICIPANTES
COORDENAÇÃO E CONCEPÇÃO
Camilo Torres Ricardo Cruz
CURADORIA
Kunumi MC Maracatu Ouro do Congo
Orquestra de Metais e Percussão Armando Arruda Romarias Tradicionais de Santo Amaro
Higor Advenssude
Antonia Andrea de Souza
PESQUISA E CONTEÚDO Inez Garbuio Peralta
PRODUÇÃO GERAL
Américo Correia e Marília Almeida Gama
PRODUÇÃO EXECUTIVA Inês Rosa de Oliveira
DIREÇÃO ARTÍSTICA Mariana Perin
DIREÇÃO TÉCNICA Zé Lima
JORNADA DOS TEATROS ELENCO Arthur Mattar Cacá Carvalho Ivam Cabral Luaa Gabanini Pedro “Carcarah” Pires Raul Barreto
COORDENADOR DO DEPARTAMENTO DE TEATROS E CENTROS CULTURAIS Pedro Granato
DRAMATURGIA
José Fernado Peixoto de Azevedo, Pedro Pires e Rudifran Pompeu
PREFEITURA DA CIDADE DE SÃO PAULO PREFEITO
Bruno Covas
SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA SECRETÁRIO
Hugo Soveral Possolo
JORNADA DO PATRIMÔNIO 2019 Memória Paulistana COORDENADOR GERAL
SECRETÁRIA-ADJUNTA
Higor Advenssude
CHEFE DE GABINETE
Walter Pires e Fátima Antunes
Regina Silvia Pacheco Tais Ribeiro Lara
ASSESSOR DE GABINETE Maurício Garcia
CONTEÚDO E PESQUISA FOTO E VÍDEO
Juan Rodrigues Quintas
IDENTIDADE VISUAL Paulo Vinícius Macedo
COORDENADORIA DE PROGRAMAÇÃO CULTURAL
DESIGN E DIAGRAMAÇÃO
COORDENADORA
Gabrielle Araújo, Mariana Perin, Solange Soltoursula, Viviane Bezerra e Zé Lima
Gabriela Fontana
DEPARTAMENTO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO DIRETOR
Marco Antônio Cilento Winther
SECRETARIA MUNICIPAL DE TURISMO
Bruno Andrade
PRODUTORES EXECUTIVOS
FOTOLIVRO JORNADA DO PATRIMÔNIO 2019 Memória Paulistana ORGANIZAÇÃO
Higor Advenssude
IDENTIDADE VISUAL E PROJETO GRÁFICO Victor Henrique Fidelis
SECRETÁRIO
PRODUÇÃO
SECRETÁRIO-ADJUNTO
REVISÃO ORTOGRÁFICA
Miguel Calderaro Giacomini Rodolfo Marinho
CHEFE DE GABINETE Vicente Rosália
COORDENADOR DE EVENTOS DA CIDADE Vander Lins
Bruno Andrade Luiz Quesada
AGRADECIMENTOS
Alê Youssef e Carlota Mingolla
sĂŁo paulo, dezembro de 2020