COLECÇÃO SUI GENERIS
O PRANTO DO CISNE AVENTURAS DE UM FOTÓGRAFO DESINIBIDO
COLECÇÃO SUI GENERIS Obras colectivas: A BÍBLIA DOS PECADORES – Do Génesis ao Apocalipse O BEIJO DO VAMPIRO – Antologia de Contos Vampirescos VENDAVAL DE EMOÇÕES – Antologia de Poesia Lusófona GRAÇAS A DEUS! – Antologia de Natal NINGUÉM LEVA A MAL – Antologia de Estórias Carnavalescas SEXTA-FEIRA 13 – Antologia de Contos Assombrosos SALOIOS & CAIPIRAS – Contos, Causos, Lendas e Poesias TORRENTE DE PAIXÕES – Antologia de Poesia Lusófona Obras individuais: AMARGO AMARGAR – Isidro Sousa ALMAS FERIDAS – Suzete Fraga MAR EM MIM – Rosa Marques O PRANTO DO CISNE – Isidro Sousa DECIFRA-ME... OU DEVORO-TE! – Guadalupe Navarro
ISIDRO SOUSA
O PRANTO DO CISNE AVENTURAS DE UM FOTÓGRAFO DESINIBIDO
EDIÇÕES SUI GENERIS EDITORA EUEDITO PORTUGAL
Textos © ISIDRO SOUSA 2016 EDIÇÕES SUI GENERIS http://letras-suigeneris.blogspot.pt www.facebook.com/letras.suigeneris letras.suigeneris@gmail.com Título: O Pranto do Cisne – Aventuras de Um Fotógrafo Desinibido Autor: Isidro Sousa Prefácio: Marcella Reis Revisão e Paginação: Isidro Sousa Capa (design): Isidro Sousa Fotografias do autor: Dado Goes Editores: Paulo Lobo e Isidro Sousa 1ª Edição – Novembro 2016 ISBN: 978-989-99670-6-9 Depósito Legal: 415447/16 EDITORA EUEDITO geral@euedito.com www.euedito.com Impressão Print On Demand Liberis
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«“Vais ter saudades de piças, Simon. Quem já experimentou uma preta, nunca mais volta atrás. E quem já teve uma piça na boca, mal pode esperar pela seguinte. Vais voltar, é o meu prognóstico”, tinha-me dito num meio-tom álacre» JOHN RAMSTER Louco Por Saias, Edições Asa
«Aqueles que amam homens e sentem prazer em deitar-se com homens e em ser abraçados por homens são também os rapazes mais formosos e jovens, e – naturalmente – os mais masculinos. Os que os acusam de falta de vergonha, mentem; não fazem tal coisa por falta de vergonha, e sim abraçam o que é como eles por pura valentia, por pura virilidade. Uma prova clara disso nos é dada pelo facto de que, uma vez adultos, são os únicos que se comportam como homens em suas carreiras públicas.» DISCURSO DE FEDRO O Banquete, de Platão (416 a.C.)
«Como águia, se apresentou Zeus a Ganimedes, semelhante a um Deus; como cisne, à mãe de Helena, a de loiros cabelos. De modo que não há comparação entre ambas as coisas; uma personagem gosta de uma, a outra gosta de outra; quanto a mim, gosto de ambas.» ANTOLOGIA GREGA (1,65)
ÍNDICE
Prefácio .............................................................................................................. 9 Os amantes ...................................................................................................... 15 A força do desejo ........................................................................................... 31 O rapaz das minhas dúvidas ......................................................................... 53 Cumplicidade perversa .................................................................................. 63 O novo inquilino ............................................................................................ 87 O autor .......................................................................................................... 105 Edições Sui Generis ..................................................................................... 111
PREFÁCIO
Antes de começar a prefaciar esta obra, tenho de dizer que fiquei muito surpresa ao receber este convite do colega das letras e amigo Isidro Sousa. Tudo porque o acho fantástico como ser humano, como autor, como coordenador e organizador de Antologias e Projectos e como divulgador de toda a Lusofonia (e isso tem demonstrado com louvor, através da colecção que criou, a Sui Generis, onde em parceria com a Chancela EuEdito publicou, publica e publicará diversas Antologias com temáticas variadas: desde textos e poesias sobrenaturais, religiosas e campesinas à prosa e poesia erótica). Falámos ao telefone. Ele explicou-me a história e o seu enredo no geral para que a pudesse ler e depois prefaciar. Compreendi mais ou menos, mas de pronto fiquei excitada e entusiasmada para ler a obra intitulada por “O PRANTO DO CISNE”, um nome poético, significativo e enigmático que poderia ser uma história romântica, clássica e dramática. Não, mas não é apenas isso! E paradoxalmente é tudo isso também, só que não é nem um contozinho erótico de fadas com o qual a sociedade e alguma parte da “maltinha” da escrita e leitura erótica actual estão acostumados a escrever ou a ler. Os textos desta obra são contos muito realistas e sem o menor pudor de o ser. São fictícios, mas roçam a realidade de uma forma tão pavorosa, provocadora, lasciva e frenética, tal qual como o sexo de Valero, personagem principal do livro, roçou o seu sexo e o seu coração desesperado e quente nos mais variados encontros e desencontros casuais e descasuais que tivera na sua vida e numa trama narrada arduamente por Isidro Sousa com maestria e absoluta licença de dizer na íntegra, e sem proibição, o que se quer e tem para se dizer atra9
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vés de palavras recheadas de ricos cenários, cheiros, sons, temperamentos, cores e espaços específicos magnetizados por uma energia sugadora. Sim! É uma obra em que nalgumas partes são retratadas as vidas atípicas e comezinhas invulgares da sociedade portuguesa, escondidas em sarjetas e emergidas em aparências falsificadas e relapsas da “real society”, das chamadas tias de Cascais, do escândalo enrustido na promíscua cordialidade do mundo futebolístico, jornalístico, da fotografia, da moda e do meio artístico em geral. Das aparências nefastas estampadas nas revistas cor-de-rosa quando a podridão é escondida por debaixo do tapete persa e da riqueza sublimada pela bajulação à qual a personagem de Valero não se rende em nenhum momento. Valero se rende pura e simplesmente apenas à sua busca incondicional de prazer sexual com os homens que o vão atraindo como um modo de esquecer a tragédia familiar que envolve o assassinato de seu pai cometido pela sua própria mãe: a fútil e vingativa Natália que Valero acaba por descobrir ser casada com o jogador Tádzio Madjer, amante do seu pai, Vanderlão, com o qual também pai e filho acabam por protagonizar um bizarro triângulo amoroso. Mas o que Isidro Sousa traz com as suas palavras nuas, desvestidas de corpetes apertados a fingir uma falsa cintura... O que o autor traz com as palavras ora nada asseadinhas e nada higienizadas com sabão neutro ora perfumadas de amaciador azul-neón estendidas no varal prontas para serem apanhadas e passadas a ferro por uma boa Amélia do lar... O que o autor traz com as suas palavras fortes e incontidas, “mundanas” e levianas, é uma verdade absoluta, e não obsoleta, de que essas mesmas palavras que dizem por aí serem feias e sujas, e que para muitos moralistas incondicionais não podem ser escritas e reveladas num livro como este, por exemplo, que tem como finalidade contar fidedignamente o que existe nesse mundão de Deus... é de que elas são faladas e vivenciadas todos os dias e por muitas pessoas no quotidiano. Isidro Sousa não lava as palavras e, quando o faz, ele lava a roupa suja com as mãos, sem máquina de lavar... e deixa as roupas quararem ao Sol e dobra-as sem as passar para que as pessoas, nós os leitores, as vistamos do mesmo jeito em que foram apanhadas e para que as usemos da maneira que bem 10
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entendermos. Os contos de “O PRANTO DO CISNE” não são tons de cinza e nem de sombras. São cores vivas de um amor que ficou na lembrança da maior desilusão de Valero: a de ter que conviver e sobreviver para sempre sem este amor e paixão avassaladora que ele sente pelo seu progenitor. Na obra encontrei palavras como Vernissages... Palavras como esta que não estão mais na moda, das quais quase não se ouve falar por aí, que nos levam a viajar pelo espelho do retrovisor de um carro antigo. Além do mais, o vocabulário do autor é deveras criativo para descrever uma simples transa de uma só noite ou de um só momento. São palavras encrustadas em situações e encaixadas de uma forma que se pode sentir e ver como num filme todo o acto sexual que está a acontecer no momento. «Creio que mantinham relações sexuais com bastante frequência sem tomarem precauções porque a gravidez apanhou-os de chofre, levandoos ao casamento.» Um aperitivo para a tesão que é ler todo o livro. O livro começa no mínimo com uma frase destas já na primeira página. Há o complexo de Édipo totalmente exposto na obra. A admiração pelo pai e o rancor guardado pela mãe que abandonara o lar e traíra o ser que ele mais amava, seu pai. O nome diferente das (duas) personagens Vanderlero demonstra a criatividade do autor. No início um nome estranho e a partir do momento em que vamos nos familiarizando com a história e com os “Vanderleros” o nome invulgar passa a ser comum e a soar mais normal. As alcunhas parecem caracterizar e representar a personalidade das personagens propositalmente ou por intuitividade. Vanderlão: o pai e sua virilidade. Vanderlito: o filho, “orfão” e carente de amor, até chegar ao poético e erótico nome que o próprio herói da trama se deu: Valero. Como se ele próprio se batizasse. Nome que soa como um piano aos ouvidos. A “lendária” estória do apanhar o sabonete e a velha conversa de café entre os amigos machões que troçam dos banhos em conjunto entre homens afinal sempre existiu e está na “novela” de Isidro Sousa. Sim. 11
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Poder-se-á chamar este trabalho de uma novela de Walcyr Carrasco não passada na TV aberta ou uma minissérie de Nelson Rodrigues, e até uma película ao bom e velho estilo Almodovariano. Apesar de o calão decorar quase todos os diálogos entre as personagens, a história é narrada com palavras... desde científicas até às mais emproadas, sem deixar de dar realidade e inteligibilidade aos cinco contos que constroem toda a obra. Há uma riqueza na descrição que não faz cansar o leitor. Sente-se o clima do vapor e da água tépida a cair no balneário, do frenesim que é o mundo do futebol, este mesmo mundo no qual o fotógrafo Valero cresceu e tem em torno de si, das festas das celebridades e todas as suas futilidades. Uma mulher que leia este livro pode ter a concreta certeza de como é ter um pénis entre as pernas e de como é usá-lo de todas as formas. Eroticidade narrada com verdade e que mergulha no realismo sujo da literatura com toda a cabeça sem deixar o corpo e a alma de fora. Isidro Sousa criou personagens muito reais e humanas. Elas acreditam piamente no autor que é o Deus delas. E este próprio autor surpreende-se com as suas criaturas e com o desenrolar dos acontecimentos, porque – como todo o excelente autor – lhes dá o livre arbítrio. É nesse âmbito que nunca, em circunstância alguma, dever-se-á culpabilizar o Isidro pela depravação explícita e pornografia executada pelas personagens da trama. E nunca se culpa, também, um autor por amar as personagens que criou e por as ter criado. Mesmo que estas sejam assassinas sanguinárias, mesmo que cometam um incesto ou amem o seu filho ou pai como cônjuges. Mesmo que estas personagens sejam invejosas farsantes ou racistas... Mesmo que elas façam o diabo a quatro e deixem o Diabo ficar de quatro! Pois que... culpabilizar o autor que as criou pelo erro que a criatura comete, seria como culpar Deus por ter nos criado e mesmo assim nos amar com todas as nossas escolhas erradas e falhanços. No momento em que Ele nos cria, já não tem mais controle sobre nós e sobre as nossas vidas e decisões tomadas. Assim é a escrita de Isidro Sousa, que se deixa levar pela trama e pelas consequências causadas pelos intérpretes 12
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e por isso cada conto tem, de facto, algo que nos prende e que nos é verdadeiramente sui generis, erótico e realista, nos presenteando com o cheiro da pele humana no seu mais intrínseco suor, odor e asperidade. Desse modo, devo dizer que apesar de o autor Isidro Sousa ter me preparado e precavido de que estas “AVENTURAS DE UM FOTÓGRAFO DESINIBIDO” têm um teor erótico pesado, com “calões” e cenas de sexo totalmente explícitas, a obra apanhou-me de surpresa. As cenas contadas com veracidade deixaram-me duas noites de olhos arregalados. Assustaram-me a alma, empurrando-a para fora de mim, dando espaço ao meu corpo para que esse pudesse se emprestar a sensações do misterioso e cheio de mister Valero. Posto isto, “O PRANTO DO CISNE” é uma obra que os leitores que a lerem no comboio, no banco de uma praça ou ao ar livre perto de uma multidão, podem correr o risco de se sentirem com receio ou vergonha e vão olhar para os lados para terem a certeza de que não estão a ser observados e apanhados no delito que cometem ao espiar as quatro paredes de um rapaz devasso que, ao fim e ao cabo, só quer amar e ser amado e a Odisseia de prazer em que ele acaba fulgurando é apenas a busca pela Epopeia de amor que almeja e que quer climaxizar em sua vida. Cá não há eufemismos! O único eufemismo que se encontra na obra está no título. Valero não é um cisne. É o patinho feio abandonado pela mãe, apesar de muito badalado e de belo por fora. E o pranto desse Cisne é um Tsunami que não é vertido em lágrimas. Ele as derrama simbolicamente através dos seus gozos, do prazer ao qual ele se rende e deixa os outros renderem-se como forma de vingança para livrar-se da própria dor que espezinha a sua alma de menino e o seu corpo de homem. Valero capta através da lente dos seus olhos os homens interessantes que vão aparecendo em sua vida como flashs, homens que foram fortemente marcados por um relacionamento ou estão num relacionamento no presente, voltando assim à posição inicial da reconstrução de um triângulo amoroso tal qual tivera e vivera ao lado de seu pai no passado. Por isso tudo, resta-me dizer-vos, caros leitores, de que este não foi um prefácio. Muito pelo contrário: foi um “predifício” tanto pela consi13
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deração que tenho pelo trabalho metódico e cuidado que é genuíno do escrevente, quanto pela pessoa a quem pertence a obra e por esta ser brilhante e fantástica na matéria do erotismo e no campo das letras. Bem-vindos à leitura de uma viagem sexual sem moral nenhuma, mas que nos deixa uma moral escondida no psicológico do apaixonante Valero, que é tocante e de suma importância: não importa o quanto você sofre. Ninguém nunca se importará com a sua dor e o seu sofrimento, a não ser que você transforme a sua dor em prazer e lhes ofereça este prazer em troca.
Marcella Reis Sintra, 20 de Setembro de 2016
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OS AMANTES
O meu pai havia sido um craque do futebol num dos maiores clubes nacionais. O seu maior sonho era ser estrela do Real Madrid. Porém, um grave acidente de viação anos atrás, quando se encontrava no apogeu da sua carreira, impediu-o de voltar a jogar. Destroçado, afastou-se do meio futebolístico. Abriu um ginásio na sua cidade natal, mas as novas actividades que exercia não o satisfaziam. Decorrido algum tempo, aceitou um convite para ser treinador num clube da segunda divisão, numa localidade próxima de Lisboa. E eu... há dois anos que o acompanhava sempre que ele treinava os jogadores nos relvados.
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Os meus pais não passavam de dois adolescentes quando se casaram, escassos meses antes de eu ter nascido. Ele acabara de completar dezasseis anos de idade; a minha mãe tinha dezassete. Ele dava ainda os primeiros passos no mundo do futebol; ela não passava de uma menina rica, mimada pelos papás, que fazia dele o seu capricho favorito. Não se amavam; sentiam apenas atracção física. Aos olhos do meu pai, ela era uma boazona sedutora com quem se divertia sexualmente. Exibia-a aos amigos, acompanhava-a às festas do Jet Set, pavoneava-se com ela nas colunas sociais. Era, acima de tudo, alguém com quem se poderia afirmar publicamente, já que a família dela fazia parte do tão badalado Jet Set 15
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nacional. Não obstante a atenção que a imprensa especializada lhe começava a dedicar, a ela tudo isso agradava porque deixava de ser fotografada unicamente ao lado dos pais para agora ostentar com vaidade o namorado como se ele fosse um troféu; por sinal um belo rapaz, elegante, gracioso, aparentemente mais velho do que ela e, ainda por cima, um craque da bola de quem se vislumbrava uma carreira fulgurante. Creio que mantinham relações sexuais com bastante frequência sem tomarem precauções porque a gravidez apanhou-os de chofre, levando-os ao casamento. Nunca foram felizes juntos. A minha mãe vivia preocupada com futilidades banais, passava o tempo todo com as amigas nos cabeleireiros, a fazer compras nos centros comerciais mais sumptuosos da cidade ou a tomar chazinhos com as tias de Cascais. Marcava sempre presença nas estreias de espectáculos, ia a todas as vernissages, nunca perdia os lançamentos de colecções dos costureiros e ficava fula da vida quando alguém se esquecia de a convidar para qualquer evento social. Raramente parava em casa. Eu sentia-me abandonado por ela; era como se fosse uma pedra no seu sapato. Ignorava-me, deixando-me aos cuidados de uma ama. Já o meu pai dedicou-me sempre mais atenção: preocupava-se comigo, davame o amor de que um filho necessita. Entre os meus dez e onze anos de idade, comecei a desconfiar de que a minha mãe traía o meu pai. Várias vezes atendi chamadas de um desconhecido à sua procura e, quando ela falava com ele, notava demasiada intimidade no seu tom de voz. Passava tempos infinitos grudada ao telefone: cavaqueavam como se fossem velhos amigos. As minhas suspeitas de ela ter um amante não tardaram a confirmar-se quando, alguns meses após o meu pai ter sofrido o fatídico acidente que o impossibilitou de voltar a jogar, ela fugiu com outro homem. Deduzi que fosse o mesmo que lhe telefonava. Passaram-se mais de seis anos e eu jamais tornei a vêla. O meu relacionamento com ela nunca fora sadio, ao contrário daquele que eu mantinha com o meu pai. Ele era o meu ídolo. Desde que me lembro, levava-me regularmente ao futebol, aos treinos, ao cinema, à praia e a acampar. Sentia-me muito bem com ele e, apesar de magoado, não estranhei quando a minha mãe nos abandonou, deixando-nos sozi16
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nhos. Tanto eu como o meu pai chamamo-nos Vanderlero. A partir da adolescência passei a ficar mais parecido com ele, ao ponto de algumas pessoas nos confundirem. A ele chamavam-no Vanderlão; a mim, Vanderlito. Todavia, eu adoptei um diminutivo que achava mais engraçado: Valero. O meu pai gerou-me aos dezasseis anos de idade; assim sendo, quando atingi a maioridade ele só tinha trinta e quatro. Era ainda um bom pedaço de homem, atraente, sedutor, no esplendor da sua jovialidade! Completei o ensino secundário aos dezasseis anos e larguei logo a escola. Foi aí que passei a viajar com o meu pai sempre que o clube ia jogar a outras cidades ou mesmo ao estrangeiro. No princípio, ele não queria. Insistia que eu deveria frequentar um curso superior. Mas ao ver a minha determinação desistiu de me pressionar e aceitou a minha companhia. Nessa altura, eu já havia descoberto a minha paixão pela fotografia. Enquanto ainda estudava, fiz um curso de iniciação à fotografia. Mais tarde, após o meu pai ter-me oferecido uma máquina fotográfica semiprofissional como presente de aniversário, frequentei outro curso mais intensivo. Em paralelo, ia aperfeiçoando os conhecimentos e a técnica fotográfica nos estádios, quando assistia aos treinos dos jogadores. Fiz a minha primeira exposição aos dezassete anos, subordinada ao tema do futebol. O presidente do clube, ao vê-la, extasiou-se com a beleza das imagens. Sabendo que eu desistira dos estudos, convidou-me para ser o fotógrafo oficial do clube. Deslumbrado com a ideia de não ter de arranjar mais subterfúgios para acompanhar o meu pai aos relvados, nem hesitei. Aceitei de imediato o convite. Algum tempo transcorrido, fui contratado por um jornal desportivo para colaborar como repórter fotográfico.
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A minha relação com o meu pai não era de pai e filho. Nós éramos o melhor amigo um do outro: confidentes, irmãos. Às vezes, ele falava-me 17
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sobre as mais variadas coisas da vida, sobretudo de mulheres. Mas eu nunca me interessava por esses assuntos. Preferia a emoção dos relvados, desde um simples treino dos jogadores a uma boa partida de futebol. Fascinavam-me a fotografia, os estádios, as viagens, os ginásios, os hotéis, os balneários, tudo o que estivesse ligado ao meio futebolístico. Eu já me masturbava há imenso tempo e curtia muito o meu corpo. O meu pénis respondia ao menor toque, enchumaçando-me os calções, e eu batia as minhas solitárias punhetas com tremenda frequência. Adorava vê-lo crescer e endurecer à medida que o tesão aumentava, e como os testículos subiam e se colavam à face interna das coxas. E gostava de ejacular abundantemente contra o espelho, o meu fetiche favorito. Enquanto isso, surpreendia-me constantemente a pensar nos futebolistas e, algumas vezes, até no meu próprio pai. Nas minhas fantasias, dificilmente fodia com raparigas.
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Durante uma tarde sombria, quase a anoitecer, tomava um banho num pequeno estádio de uma cidade do Interior. Apesar de colectivos, os balneários eram minúsculos e, nesse dia, havia pouquíssima luz, pois a lâmpada queimara. Tomava o meu duche na penumbra. Ensaboava o corpo quando a porta se abriu. Entrou um jogador moreno, que imediatamente reconheci. Nunca tínhamos falado e ele não fazia parte do círculo de amizades do meu pai. Contudo, alguns minutos antes, enquanto me dirigia para os balneários, avistei-o a falar com o meu pai. Conversavam animadamente. Parecia haver entre eles uma estranha intimidade que me intrigou. Porém, ao verem que eu me aproximava, interromperam bruscamente a conversa. O gajo retirou-se e eu, achando o seu procedimento estranho, perguntei ao meu pai quem era ele e sobre o que falavam. O rapaz chamava-se Tádzio Madjer, viera do Leste europeu em busca de melhores condições de vida e ingressara no clube daquela cidade, contra o qual o nosso jogara nessa tarde. Entretanto, o meu 18
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pai esquivou-se, dizendo que apenas discutiam o jogo que acabara de se realizar. Agora, esse fulano apresentava-se dentro do balneário, mesmo à minha frente, já em tronco nu. Dizia-me: – E aí, Vanderlão, como está esse meu velho cavalo? Não respondi porque não sabia ao que se referia. Todavia, um pensamento trespassou-me logo: Ele está a confundir-me com o meu pai! O Tádzio aparentava uns vinte e nove, trinta anos de idade. Não lhe daria mais. E tinha o corpo atlético dos deuses olímpicos, cabelos negros e olhos castanhos. O seu rosto era másculo. Parecia um daqueles garanhões algarvios que andam permanentemente com as garras afiadas para saltarem à pinha das belas estrangeiras solitárias e endinheiradas, que buscavam sempre uma qualquer patuscada amorosa nos areais escaldantes do Sul lusitano. Continuou a despir-se, tagarelando sempre comigo. Eu evitava falarlhe, respondendo somente com monossílabos. No entanto, através do seu palavreado, deduzi que conhecia o meu pai há muito tempo e que se dirigia a ele com demasiada intimidade. Porque é que o meu pai me enganou acerca deste sujeito?, interrogava-me, bastante cismado. Quando ficou completamente nu, enfiou-se debaixo do chuveiro ao lado do meu. Percebi que observava intensamente o meu corpo, detendo o olhar, de um modo bem explícito, no meu sexo. Atrapalhei-me todo e deixei o sabonete escorregar-me das mãos. – Deixa lá – murmurou. – Eu apanho-o. Ao baixar-se, colocou-se entre as minhas pernas. Pude sentir, sem ver, os seus dedos tocarem no meu pénis, puxando-me o prepúcio para trás, e a sua língua perscrutar a glande. Aos poucos, o meu membro foi entrando na sua boca até os meus pêlos púbicos lhe roçarem o nariz. Enquanto isso, as suas mãos massajavam-me os testículos. Passou então a mamar vigorosamente no meu falo. Acariciava-me as coxas, deslizando as mãos pelas minhas nádegas abaixo. Em determinado momento, retirou a verga da boca e balançou-a à sua frente. – Estava a precisar disto, meu capitão – sussurrou, aparentemente extasiado. – Um bom caralho de um belo macho como tu! ( continua ) 19
ESTE LIVRO TEM 128 PÁGINAS
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