edição especial | DEZEMBRO DE 2015
Parcerias e ações em rede fortalecem a agricultura familiar
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Editorial Em 2016, a Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (REDE) completará 30 anos de existência, marcados pela contribuição nas lutas e conquistas da agricultura familiar e pela afirmação da importância da agroecologia para o desenvolvimento sustentável no campo e na cidade. Na Região Leste do estado de Minas Gerais, esta história começa a ser traçada em meados da década de 1990 e, desde então, vem ganhando novos capítulos, inspirados na ação local desenvolvida pela instituição em parceria com agricultores e agricultoras familiares e outras organizações que representam e/ou apoiam esta categoria. E é no marco da comemoração de seus 30 anos que a Rede de Intercâmbio publica esta edição especial da revista Agroecologia no Leste de Minas. Em suas páginas, você poderá conhecer um pouco do processo de construção da agroecologia na região, ao ler o artigo que traz um breve resumo de fatos e momentos que foram determinantes para consolidação de uma proposta sustentável de desenvolvimento rural no Leste de Minas. Para ilustrar a diversidade de práticas e conhecimentos presentes nas comunidades rurais dos municípios, selecionamos algumas iniciativas voltadas ao manejo agroecológico na produção de alimentos, à agroindustrialização, à comercialização de produtos da agricultura familiar e às metodologias de trabalho e organização social. As ações que buscam enfrentar e reduzir as desigualdades de gênero ganham destaque nesta edição da revista principalmente nas matérias que apresentam as experiências de auto-organização e os empreendimentos econômicos conduzidos pelas mulheres. A juventude rural também é foco de esforços específicos de instituições no Leste de Minas, como pode ser conferido na entrevista com estudantes da Escola Família Agrícola Margarida Alves e nos exemplos de jovens agricultores que vêm aumentando seu protagonismo na comercialização da produção familiar. Por fim, importante destacar que esta publicação se dá no âmbito do Projeto Sustentar, patrocinado pela Petrobras, por meio do Programa Socioambiental. Nas últimas páginas da revista, é possível verificar alguns resultados que indicam como o Projeto Sustentar apoiou o desenvolvimento de várias iniciativas agroecológicas no Leste de Minas, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida e a sustentabilidade da agricultura familiar na região. Desejamos a todas e todos uma boa leitura!
Bruno Moreno Diretor Geral Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas
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Agroecologia no Leste de Minas
• 20 anos de parcerias e ações pelo fortalecimento da agricultura familiar
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Rede Agroecológica do Leste de Minas
• Intercâmbio de experiências e construção de conhecimentos a favor do desenvolvimento rural sustentável
entrevista
• Estudantes da Escola Família Agrícola Margarida Alves falam sobre educação do campo
Manejo Agroecológico
• Agricultores dão dicas de sistemas agroflorestais com base no café • Abelhas nativas sem ferrão beneficiam lavouras de café e aumentam sua produtividade • Adeus mau cheiro! O reaproveitamento na criação de galinhas
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Empreendedorismo e inovação
• Agricultoras e agricultores geram renda com diversificação da produção • Sacolão na porta de casa: agricultor inova com feira móvel
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COOPERATIVISMO
• Cooperação supera competição: Coorpol completa nove anos com cerca de 100 cooperados
Controle Social
• Grupo de Produtores Orgânicos colhe resultados de 12 anos de trabalho com barraca na Feira de Caratinga
mulheres na agroecoLogia
• Organizadas em grupos produtivos, mulheres investem em beneficiamento de produtos da agricultura familiar • Vida de comunidade rural muda com oportunidades criadas pelo trabalho da associação
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Juventude
• Empreendimentos familiares estimulam filhos/as de agricultores/as a continuar no campo
Projeto Sustentar
• Qualidade de vida e sustentabilidade para a agricultura familiar no Leste de Minas
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Agroecologia no Leste de Minas 20 anos de parcerias e ações pelo fortalecimento da agricultura familiar O enraizamento da agroecologia na Região Leste de Minas Gerais é resultado de um trabalho que vem sendo desenvolvido há mais de 20 anos por famílias, grupos comunitários, associações, sindicatos e instituições de assessoria à agricultura familiar. Hoje, mais do que experiências agroecológicas e melhoria da renda dos agricultores e agricultoras, existe um contexto de articulação e colaboração entre os grupos organizados da região, que percorreram uma longa caminhada de lutas, trabalhos e conquistas até constituírem a Rede Agroecológica do Leste de Minas. Um resumo dessa história Em meados da década de 1990, a Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (REDE) e a Organização do Povo Que Luta (OPL), em parceria com outras instituições e grupos de Caratinga (MG), iniciaram um trabalho de incentivo à produção sustentável de alimentos como forma de contrapor as práticas agropecuárias que causavam impactos negativos no meio ambiente e na saúde de agricultores e agricultoras (como as monoculturas e o uso de agrotóxicos). Era o início dos trabalhos de agroecologia na região que, naquela época, ainda era chamada de agricultura alternativa. Ao mesmo 4 | Agroecologia no Leste de Minas
tempo, em Caratinga (MG) e também em outros municípios do Leste de Minas, diversas iniciativas foram apoiadas pelas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) e pelos Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs), com o objetivo de questionar e construir alternativas aos projetos de desenvolvimento que provocavam desastrosas consequências sociais e culturais. No âmbito agrícola, as primeiras ações realizadas naquele período buscaram identificar e resgatar algumas iniciativas positivas que já eram desenvolvidas na região, com a intenção de divulgá-las e promover o intercâmbio entre os agricultores e agricultoras. Simultaneamente,
outras experimentações participativas de diversificação da produção e utilização de tecnologias alternativas eram incentivadas, como o uso de sementes crioulas, adubação verde, compostagem, caldas naturais, entre outras. Também foram apoiadas ações de promoção do associativismo, da industrialização e da comercialização da produção. Como exemplo, pode-se citar um projeto desenvolvido no início dos trabalhos em Caratinga (MG), que resultou na construção de um sistema de secagem de frutas para criar alternativas de renda para as famílias, aproveitar melhor a mão de obra disponível e promover a difusão dos sistemas agroflorestais.
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As ações desenvolvidas em Caratinga (MG) nas décadas de 1990 e 2000 visaram a diversificação produtiva para que as famílias não dependessem somente da renda do café. No entanto, deve-se destacar que a busca de alternativas para a produção de café em bases agroecológicas também resultaram em importantes aprendizados para os agricultores e agricultoras, com a experimentação de variedades, técnicas e formas de manejo relacionadas à produção sustentável em termos ambientais, sociais e econômicos.
A partir dos anos 2004 e 2005, a atuação de entidades, famílias, grupos e organizações se espalha nos municípios do Leste de Minas e, aos poucos, forma-se uma articulação regional a favor do fortalecimento da agricultura familiar e da promoção da agroecologia. Inseridos neste cenário, dois processos realizados nos anos 2006 e 2007 tiveram grande influência no planejamento das ações coletivas implementadas na região: o Diagnóstico Rural Participativo, que contou com o envolvimento de lideranças e jovens em todas as etapas; e o I Encontro Regional da Agricultura Familiar: construindo a agroecologia e celebrando a cultura popular no Leste de Minas. O ERAF, organizado conjuntamente por várias entidades sociais, aconteceu em abril de 2007, na cidade de São João do Manhuaçu (MG), e teve a participação de 150 lideranças representando 10 municípios da região.
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Intercâmbio e oficina de compostagem na sede da OPL, em São João do Jacutinga, Caratinga (MG), no ano de 2009.
Entidades e agricultores da região organizaram, em 2007, o I Encontro Regional da Agricultura Familiar: construindo a agroecologia e celebrando a cultura popular no Leste de Minas. |5
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Outra ação importante que cresce em relevância no Leste de Minas a partir de 2006 refere-se ao fortalecimento dos grupos de mulheres e jovens que vêm se organizando associativamente para a produção e comercialização. As mulheres participam de todas as organizações da agricultura familiar na região, porém ainda lutam para conquistar e ampliar espaços nas tomadas de decisão, tanto nas organizações econômicas quanto de representação política. De 2006 a 2010, destacam-se também os projetos de incentivo às práticas ambientais no meio rural que, além de darem atenção à produção, focaram na proteção de nascentes e cursos de água e na recuperação de áreas degradadas, com o plan-
tio de árvores nativas e frutíferas e a formação de sistemas agroflorestais (SAFs). O período de 2009 a 2012 foi marcado pelas atividades de promoção e articulação das iniciativas já existentes, com a participação mais intensa de diversos atores sociais em torno da proposta de desenvolvimento territorial orientada pelos princípios agroecológicos. Além dos resultados alcançados no campo produtivo, como os trabalhos com abelhas nativas, plantas medicinais e horticultura orgânica, este período significou um importante avanço na gestão participativa das ações desenvolvidas na região, com o fortalecimento de um coletivo para planejamento e avaliação das atividades, constituído por representantes das entidades da Rede Agroecológica.
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1. Mutirão de recuperação de nascentes em São João do Manhuaçu (MG), em 2010. 2. Troca de experiências sobre Abelhas Nativas realizada na propriedade do agricultor familiar Geraldo de Assis (na foto, à direita), em Simonésia (MG), no ano 2011.
Em 2012, ressalta-se o estímulo e apoio dado a associações comunitárias para apresentação e gestão de projetos coletivos financiados por instituições nacionais, como o Fundo Nacional de Solidariedade e a Fundação Luterana de Diaconia. O exercício de gestão democrática dos recursos representou um grande aprendizado para as associações, na perspectiva de ampliar a autonomia dos agricultores e agricultoras na mobilização e captação de recursos. Os projetos tiveram foco no incentivo ao associativismo, à agroecologia e à autonomia das mulheres agricultoras, garantindo a soberania alimentar, criando novas oportunidades de geração de emprego e renda e favorecendo a permanência das famílias no campo, especialmente de jovens e mulheres.
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Beneficiamento e Comercialização
Educação do Campo
Integradas às ações de manejo agroecológico da agrobiodiversidade, desde a década de 1990, as iniciativas de apoio ao beneficiamento e à comercialização da produção estiveram presentes nas estratégias de desenvolvimento rural que tinham como foco a sustentabilidade e a reprodução social da agricultura familiar do Leste de Minas.
Na concepção da Educação do Campo, em 2008 foi criada a Associação Regional Escola Família Agrícola Margarida Alves (AREFAMA) e implantada a primeira EFA na região, para atender alunos do ensino fundamental. Para criação da EFA, foi importante tanto a mobilização e participação de lideranças das entidades parceiras quanto de organizações governamentais atuantes nos municípios do Leste. Atualmente, a região conta com duas EFAs, que recebem estudantes de 14 municípios. A escola de Ensino Fundamental está sediada em Conceição de Ipanema (MG) e a de Ensino Médio em Simonésia (MG).
Entre os principais resultados dos trabalhos com associativismo, agroindustrialização e comercialização, ressalta-se a criação, em 2006, da Cooperativa Regional Indústria e Comércio de Produtos Agrícolas do Povo que Luta (Coorpol). A cooperativa é resultado do esforço de famílias associadas à OPL e à Associação dos Agricultores Familiares Orgânicos e Terapeutas Naturalistas de Manhuaçu e Região (Agrifom) que, com histórico de compromisso e responsabilidade socioambiental, possibilitou à Coorpol, já nos primeiros anos, comercializar o café de seus associados nos mercados Orgânico e Fair Trade. Recentemente, além do café, a cooperativa vem apoiando os agricultores nas iniciativas de produção e comercialização de diversos produtos nos mercados institucionais, principalmente para a alimentação escolar.
5. Mutirão para construção de estufa na EFA Margarida Alves, em 2010. 6. Produção de mudas por alunos da Escola Família Agrícola (EFA) Margarida Alves, em Conceição de Ipanema, no ano 2012.
Carina Santos
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Os mercados institucionais têm sido, inclusive, o destino da produção de muitas organizações desde o ano 2006. Por meio de assessorias e capacitações para elaboração e gestão de projetos, diversos empreendimentos conseguiram acessar o Programa de Aquisição de Alimentos com Doação Simultânea (PAA/Conab) e, mais recentemente, o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).
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Nas Escolas Família Agrícola, a formação para a juventude rural busca aliar a educação formal com a capacitação para a organização social, a agroecologia e o desenvolvimento da agricultu6 3. As feiras de produtos agroecológicos representam outra opção de comercialização da produção familiar no Leste de Minas, com destaque para a Feira Orgânica de Caratinga, criada em 2010 e que acontece semanalmente, aos sábados.
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4. Andréia de Melo, na agroindústria da Associação Comunitária de Estudos e Ação Social (Aceas): comercialização de alimentos da agricultura familiar em escolas públicas de Manhuaçu.
ra familiar. As EFAs conseguem estimular a reflexão crítica e a realização de ações baseadas na solidariedade e na sustentabilidade, além de oportunizar à juventude o exercício do papel de agente de desenvolvimento e de transformação social.
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Perspectivas Nas duas últimas décadas foram implementados vários projetos no Leste de Minas, tendo como fontes de financiamento agências de cooperação internacional e também recursos públicos e privados do Brasil. Os projetos viabilizaram uma série de atividades de promoção da agroecologia, como visitas técnicas, mutirões, cursos, oficinas, intercâmbios de experiências e encontros com a participação de agricultores e lideranças sociais. Seminário Regional realizado em Santana do Manhuaçu (MG), em 2015, discute agroindústria familiar com agricultores e agricultoras da região.
Ao longo desta trajetória de trabalho, foram elaborados diversos produtos de comunicação (como cartilhas, informativos, programas de rádio e vídeos) para dar visibilidade às iniciativas dos camponeses e suas organizações e ampliar o debate sobre a agroecologia, a agricultura familiar e o desenvolvimento sustentável.
Neste conjunto de ações já desenvolvidas na região participaram mais de 4.000 famílias, em atividades que abrangem a produção agropecuária, com orientação para a agroecologia; o associativismo, visando o processamento e comercialização dos produtos em sistema de economia solidária; e a mobilização e articulação para a incidência em políticas públicas. A organização em “redes sociais” permite que representações da agroecologia no Leste de Minas sejam expressas nas construções de políticas públicas e programas governamentais, como a Política e o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (Pnapo e Planapo), e construam capacidade organizativa para buscar e desenvolver projetos, como o Sustentar.
O Projeto Sustentar, patrocinado pela Petrobras e executado pela Rede de Intercâmbio, entra nessa história no ano de 2013, apoiando ações que buscam promover a permanência e a sustentabilidade das famílias em suas comunidades e garantir geração de renda e oportunidades de trabalho, por meio da produção e comercialização de produtos da agricultura familiar. As atividades do projeto beneficiaram, principalmente, agricultores e agricultoras dos municípios de Simonésia, São João Manhuaçu, Manhuaçu, Santana do Manhuaçu, Conceição de Ipanema, São José do Mantimento e Caratinga. De forma complementar e integrada, os projetos têm proporcionado o avanço e a consolidação das conquistas da agricultura familiar agroecológica da região. No entanto, novos projetos são buscados e novas estratégias de ação são permanentemente desenvolvidas com o objetivo de ampliar os resultados positivos para outras famílias e também para outras áreas da produção, da comercialização e da capacitação, possibilitando tanto a melhoria das condições sociais e ambientais das comunidades quanto o fortalecimento organizativo da Rede Agroecológica do Leste de Minas. 8 | Agroecologia no Leste de Minas
Agroecologia em Rede A Rede Agroecológica da Região Leste de Minas Gerais é um espaço de intercâmbio de experiências, construção do conhecimento, articulação e desenvolvimento de ações coletivas voltadas à promoção da agroecologia e ao fortalecimento da agricultura familiar. Conforme dito anteriormente, a origem dessa Rede está relacionada aos trabalhos iniciados em meados da década de 1990, como o resgate das sementes crioulas que os camponeses e camponesas da região vinham gradativamente deixando de utilizar. Mas foi nos anos 2000, com a intensificação das ações realizadas em âmbito regional, que a Rede Agroecológica começou a se consolidar. Desde então, diversas lideranças de grupos e empreendimentos da agricultura familiar, sindicatos e movimentos sociais se encontram periodicamente para debater suas necessidades e desenvolver estratégias de enfrentamento dos desafios encontrados na região. São grupos e entidades que discutem e praticam a agroecologia, com diferentes experiências e graus de transição, o que permite a troca de informações e aprendizados técnicos e de organização social. As atividades desenvolvidas conjuntamente incluem oficinas de capacitação e cursos de formação; seminários e encontros temáticos; visitas e intercâmbios de experiências entre as iniciativas dos integrantes da Rede Agroecológica ou com práticas de agroecologia em outras regiões do estado, do Brasil e até mesmo de outros países.
O perfil diverso e complementar das organizações que fazem parte da Rede Agroecológica do Leste de Minas é um importante fator que favorece a consolidação de uma proposta sustentável para o desenvolvimento rural na região. As cooperativas e associações da agricultura familiar cumprem um relevante papel na mobilização dos/as agricultores/as e na implementação de iniciativas socioambientais, seja a partir da qualificação da produção e comercialização de seus produtos, seja buscando políticas públicas que ajudem a alavancar este esforço das comunidades pelo próprio desenvolvimento. As Escolas Família Agrícola (EFAs) são os espaços prioritários de trabalho com a juventude rural, mesmo diante das diversas dificuldades para a manutenção desse sistema de ensino. As experiências de educação do campo, articuladas com a promoção da agroecologia e com a vitalidade das organizações camponesas, têm significado na região um conjunto de possibilidades que oportuniza aos jovens o acesso à educação, à interação com a sociedade e a outro paradigma de desenvolvimento que resgata e recria valores culturais, produtivos e econômicos. Os Sindicatos de Trabalhadores/as Rurais (STRs) têm priorizado as funções de representação e defesa dos direitos de sua categoria, apoiando os/as associados/as, principalmente, na garantia dos direitos trabalhistas e previdenciários e dos programas e políticas públicas para a agricultura familiar. Além de contribuírem com a promoção da agroecologia, os STRs integrantes da Rede Agroecológica também implementam ações de fortalecimento do associativismo, práticas de saúde popular, combate à violência contra a mulher e diversas outras ações de defesa dos camponeses. Outra importante diretriz para os trabalhos desenvolvidos pela Rede refere-se à redução das desigualdades de gênero. Esta orientação se expressa por meio do planejamento e implementação de iniciativas que buscam: ampliar o empoderamento e a auto-organização das mulheres; promover a sua autonomia econômica; superar a hegemonia masculina nos espaços de tomadas de decisão, sejam técnico-produtivos ou organizativos; e viabilizar a participação das mulheres nos processos de construção de políticas públicas. Principalmente em Simonésia (MG) e Santana do Manhuaçu (MG), ressalta-se também o trabalho de incidência política e formação das mulheres camponesas atuantes na Articulação de Mulheres da Zona da Mata e Leste de Minas.
Simonésia
Minas Gerais
A dinâmica de encontros e reuniões empreendida pela Rede Agroecológica tem privilegiado a discussão e definição de prioridades de ações a serem implementadas, assim como a reflexão e avaliação do que vem sendo executado na Caratinga região. Estes momentos têm sido importantes para legitimar e referenciar tanto a consConceição trução de projetos e propostas de ação, como de Ipanema a atuação dos representantes das entidades integrantes da Rede em espaços de articulação São José do da sociedade civil e de formulação e monitoMantimento Santana do ramento de programas e políticas públicas Manhuaçu
Manhuaçu
São João do Manhuaçu Mapa fora de escala, meramente ilustrativo.
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MULHERES NA AGROECOLOGIA
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Organizadas em grupos produtivos, mulheres investem em beneficiamento de produtos da agricultura familiar
Formado por cinco mulheres, o Grupo Força e União vem produzindo uma grande variedade de produtos que inclui: doce de leite com amendoim, doce de leite com menos açúcar, doce de leite com coco e doce de banana, tudo feito com ingredientes de propriedades da agricultura familiar. Dois vendedores amigos ficam encarregados de distribuir os produtos aos clientes. Enquanto testam e desenvolvem receitas novas, o Grupo Força e União vem buscando meios de construir uma agroindústria comunitária – seguindo a legislação sanitária – para ampliar a produção e acessar novos mercados. 20 | Agroecologia no Leste de Minas
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Em Santana do Manhuaçu (MG), dois grupos de mulheres têm provado que é possível se organizar para produzir de forma coletiva. Reunindo-se semanalmente há mais de um ano, as mulheres se encontram para produzir quitandas, doces e artesanatos.
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O que a gente gosta é de trabalhar juntas e conversar. Se fôssemos fazer sozinhas em casa não era a mesma coisa. Faz bem pra cabeça da gente. Viviani Crisóstomo, integrante do grupo Força e União
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MARINA UTSCH
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Com a padaria, pretendemos incentivar as pessoas a plantarem e vamos usar os produtos colhidos como ingredientes para as receitas. Mara Rúbia, integrante do grupo Raízes e Sabores da Terra
Outro grupo formado no mesmo município, o Raízes e Sabores da Terra, tem investido no artesanato com palha de café e já se prepara para abrir uma “padaria agroecológica” com produtos feitos a partir de ingredientes da roça. “No artesanato, estamos reutilizando materiais que seriam jogados no lixo, como garrafas e potes”, revela a agricultora familiar Mara Rúbia, integrante do grupo. Já em São João do Manhuaçu (MG), os doces de frutas são o foco da agroindústria pertencente à Associação Conselho Comunitário de Boa Esperança, Bom Jardim e Jatobá (CCMJB). Por meio de um projeto, o grupo conseguiu todos os equipamentos e infraestrutura necessários para a construção da agroindústria e, agora, investe na criação de rótulo para levar os produtos às prateleiras dos mercados.
1. Mulheres do Grupo Força e União se beneficiam com o trabalho coletivo.
2. No Grupo Raízes e Sabores da Terra, a palha de café é usada para decorar cestas e outros utensílios.
3. As agricultoras Maria Zenilda e Elaine de Oliveira produzem doce na Agroindústria da Associação CCMJB.
4. Grupo de Mulheres do CCMJB se reúne para discutir a organização da produção de doces.
5. A agricultora familiar Maria de Lourdes Oliveira, em parceria com outras agricultoras da Aceas, comercializa verduras pelo PNAE.
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Exemplos que inspiram As experiências dos outros grupos e os encontros de formação com a REDE já começaram a inspirar, na comunidade de Dom Lara, em Caratinga (MG), um movimento de união e de reflexão sobre a construção social dos diferentes papéis exercidos por homens e mulheres na sociedade. “A mulher faz muitas coisas ao mesmo tempo e, como muitas vezes trabalha em casa, seu serviço não é valorizado. Se fosse pagar alguém para fazer o que a mulher faz nas propriedades rurais, ficaria claro como o nosso trabalho vale muito. Aprendemos a anotar numa cadernetinha até mesmo aquilo que plantamos e colhemos para consumo próprio e, assim, temos mais noção do valor de nosso trabalho”, afirma a agricultora familiar Vanilda do Rosário. Para o futuro, as perspectivas são otimistas, como observa Glória Moraes: “Ao invés de sair para trabalhar fora, a gente prefere continuar com nosso trabalho e aproveitar para gerar renda investindo na nossa organização em grupo”.
Mulheres da comunidade de Dom Lara, Caratinga (MG), se reúnem buscando formação para o fortalecimento do associativismo na comunidade.
Parceria produtiva No Córrego do Sossego, em Simonésia (MG), as agricultoras Claudineia Ramos e Sônia Barraque formaram uma parceria para cuidar de uma estufa, onde produzem tomate orgânico e hortaliças. Com a diversificação da produção e das formas de comercialização, a renda das famílias de Claudineia e Sônia não está mais restrita à venda do café. “Vendemos para os vizinhos e também para escolas por meio dos programas PAA e PNAE”, explica Sônia Barraque.
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Sônia destaca ainda a importância da Associação no apoio às novas atividades econômicas das famílias. “Foi por causa da nossa participação como associadas que conseguimos organizar a documentação necessária para fazer parte do PNAE”. Claudineia Ramos e Sônia Barraque: parceria na produção de tomate e hortaliças em estufa.
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Vida de comunidade rural muda com oportunidades criadas pelo trabalho da associação Em Manhuaçu (MG), no Córrego dos Diniz, a experiência da Associação Comunitária de Estudos e Ação Social (Aceas) é exemplo de organização coletiva e distribuição do trabalho. No total, mais de 50 famílias da comunidade entregam produtos da agricultura familiar para o mercado institucional (escolas, creches, asilos, entre outros). Um benefício que foi conquistado com as políticas públicas como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Com esse nível de organização da produção, algumas perspectivas se abriram para agricultoras como Maria José Alves, uma das 20 mulheres que formam o grupo responsável pela gestão da agroindústria de doces que pertence à Associação. Segundo Maria José, a agroindústria significou novas possibilidades de trabalho e geração de renda, tanto para as mulheres envolvidas no beneficiamento de alimentos, como para outras pessoas da comunidade. Ela citou o exemplo de algumas agricultoras que, quando vão trabalhar na agroindústria, contratam outras pessoas para cuidar das crianças e, às vezes, fazer faxina. “Esse trabalho foi gerando oportunidades que vão mudando a dinâmica da comunidade. Novos serviços vão aparecendo.” Na lista de produtos, uma variedade grande de doces, todos com aproveitamento das frutas da época e produtos locais. Além da agroindústria de doces, a Aceas conta com o grupo de 13 mulheres que produzem quitandas. O próximo passo é investir nas polpas de frutas, num projeto que contempla também os jovens.
Produção de quitandas por agricultoras familiares na agroindústria coletiva da Aceas, no Córrego dos Diniz, Manhuaçu (MG).
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Agroecologia no Leste de Minas Edição especial | DEZEMbro de 2015 A revista Agroecologia no Leste de Minas é uma publicação da Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (REDE), elaborada no âmbito do Projeto Sustentar com o patrocínio da Petrobras, por meio do Programa Socioambiental.
Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (REDE) Rua Tamboril, 248 - Bairro Concórdia CEP 31110-640 - Belo Horizonte - MG Tel.: (31) 3421.4172 Av. Governador Valadares, 6 - sala 304 - Centro CEP 36930-000 - Simonésia - MG Tel.: (33) 3336.1114 contato@redemg.org.br redemg@redemg.org.br
Conselho Diretor : Bruno Moreno, Glória Regina Perpétuo, Rosely Carlos e Antônia Mendes Ferreira Coordenação Executiva: Anadélia de Souza, Lorena da Paixão e Marcos Jota Coordenação Projeto Sustentar: Jésus Brasilino Equipe do Leste de Minas: Célia Paulino, Denise Perígolo, Fernando Gentil, Jésus Brasilino, José Carlos da Fonseca (Zeca), Luana Carvalho, Marcos Jota, Marina Freitas e Raynan Nunes
Revista Agroecologia no Leste de Minas Edição: Marcelo Almeida Matérias (páginas 10-25): Marina Utsch Textos: Denise Perígolo, Jairo Bosa, Jésus Brasilino, Marcelo Almeida e Marcos Jota Revisão: Raynan Nunes Projeto Gráfico e Diagramação: Sylvia Vartuli Foto Capa: Sylvia Vartuli
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