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Finding Nemo

SARA GALVÃO

Marlin, o peixe-palhaço sem jeito para contar anedotas, acabara de se mudar para uma anémona com vista para o oceano com a mulher e as suas 400 ovas quando a tragédia lhe bate à porta: uma barracuda ataca a família, deixando-o sozinho no mundo com o seu filho Nemo. Anos mais tarde, Marlin é um pai galinha que nunca deixa Nemo sair do seu radar super-protector e sufocante. Claro está, é só uma questão de tempo até que Nemo se revolte — numa fúria adolescente que infelizmente o leva a ser capturado por uns mergulhadores e a acabar dentro de um aquário dum dentista em Sydney. Marlin é assim obrigado a enfrentar os seus piores pesadelos para, com a ajuda de Dory, um peixe com memória de, er, peixinho dourado, ir salvar o filho.

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Andrew Stanton escreveu o guião de À Procura de Nemo depois de ter dado por si a tornar-se na versão humana de Marlin, demasiado preocupado e ansioso com a segurança dos seus descendentes, de uma maneira sufocante e pouco construtiva. Talvez por isso o filme se torne, em típico estilo da Pixar, mais do que uma mera lição moral para as crianças que o vêem (tal como Nemo, têm de aprender a desembaraçarem-se sozinhos); é fácil ver na história um lembrete para os pais que, com a preocupação de proteger os filhos de todos os males possíveis e imaginários, os impedem de crescer como adultos competentes.

Esta lição é ilustrada não só pela atitude e estilo parental descontraído das tartarugas (que Marlin conhece depois de um encontro infeliz com alforrecas) mas também por Dory que, por ter problemas de memória, se parece esquecer de ter medo do desconhecido. É ela que, ausente de passado, ensina Marlin a viver no presente — mesmo que o presente seja assustador. E apenas juntos conseguem derrotar o verdadeiro “vilão” da história — o trauma de Marlin que o impede de ser um pai que ajuda o filho a crescer e a confiar nas suas próprias habilidades (falando em vilões, o filme também consegue justificar a realidade da biosfera de uma maneira despida de preconceitos: “peixes nadam, pássaros comem” — apesar de, claro está, haver quem escolha ver os peixes como amigos, não comida).

Se a história de Nemo é, por si, uma delícia narrativa, temos a acompanhála uma animação belíssima que nos mostra um fundo do mar garrido e cheio de diversidade (não deixa de ser interessante comparar este mundo com o de A Pequena Sereia, onde o fundo do mar não consegue competir com o mundo exterior), que não se coíbe de jogar com as nossas expectativas (olá, Tubarões Anónimos!) e polvilhar o drama com piadas q.b. (o cardume que ganharia qualquer jogo de charadas, as gaivotas idiotas e o estranho interesse de certos animais em medicina dentária). Acrescente-se a excelente banda sonora da autoria de Thomas Newmann, que captura na perfeição os sons discretos do ambiente submarino sem nunca se sobrepor à beleza das imagens ou da história que nos passa à frente dos olhos (ao contrário de outros, tosse tosse, Hans Zimmer). Tudo isto em menos de duas horas que passam a correr, qual corrente este australiana, sem que o interesse seja perdido, mesmo em visualizações repetidas. Não é por acaso que À Procura de Nemo destronou O Rei Leão como o filme de animação com mais sucesso de bilheteira — e rumores dizem que também é o responsável por Michael Eisner ter sido despedido da sua posição como presidente da Disney.

Intemporal, com personagens que regressarão em glória para a sequela em 2016, À Procura de Nemo consegue tocar os corações mais empedernidos, numa perfeição à qual a Pixar nos mal-habituou, sem que a magia da história se esgote com o passar dos anos.

Título nacional: À Procura de Nemo Realização: Andrew Stanton Elenco: Albert Brooks, Ellen DeGeneres, Alexander Gould Ano: 2003

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