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As primeiras curtas da Pixar

FILIPE LOPES

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Depois do primeiro filme da saga Star Wars, hoje intitulado Star Wars: Episódio IV – Uma Nova Esperança (1977), George Lucas decidiu entrar no mundo da animação computorizada. A Lucasfilm (empresa que fundara em 1971) criou mesmo uma câmara de movimento controlada por computador, mas isso não bastava para chegar ao próximo patamar de evolução na indústria cinematográfica. O que ele pretendia era chegar a um nível de tecnologia que lhe permitisse concretizar ideias impossíveis à luz da tecnologia cinematográfica existente. Para isso, convidou Edwin Catmull, um especialista em ciências da computação, e criou uma divisão da Lucasfilm a que deu o nome de Graphics Group, cujo objectivo era inventar meios de produção digital que preenchessem o vazio do que até então era impossível de fazer no cinema. Catmull recrutou uma equipa dos mais talentosos “cientistas dos computadores” que havia para construir as ferramentas futuristas de que Lucas necessitava. Era uma equipa versátil, formada por pessoas de vários quadrantes que iam desde a Arquitectura e a Arte até à informática ou à ciência pura e dura, e constituíam uma espécie de grupo rebelde dentro da própria Lucasfilm, “o que até era divertido porque estávamos a fazer todas estas coisas de que ninguém entendia o valor”, como disse o próprio George Lucas. No entanto, o grande sonho deste grupo de artistas informáticos, mais do que colaborarem em filmes de imagem real com efeitos visuais credíveis, era o de realizarem uma longa-metragem de animação totalmente feita

em computador, algo que lhes parecia impossível na altura. A grande viragem dá-se quando John Lasseter, acabado de ser despedido da Disney por estar a planear juntar animação tradicional com animação por computador, é convidado para a equipa por Ed Catmull. Pela primeira vez, a equipa poderia contar com um verdadeiro animador nas suas fileiras. “O nosso grupo adorava a animação e sabíamos muito de animação. Não sabíamos animar bem, mas conseguíamos entendê-la”, refere, a propósito, Alvy Ray Smith. Rapidamente é lançado o desafio para uma pequena animação totalmente feita em computador que terá o próprio Ray Smith como realizador, mas com a animação a cargo de Lasseter. Este diz ter sido inspirado ao ver as limitações daquilo que tinham para trabalhar, já que o que podiam fazer implicava a utilização obrigatória de formas geométricas para fazer construções mais complexas. John desafiou a equipa a criar novos programas que lhe permitissem animar os movimentos de esmagar e esticar que tinha aprendido na animação tradicional. Esta primeira curta, As Aventuras de André e Wally B. (1984), tem a duração de dois minutos, e a acção consiste, basicamente, num encontro, não muito cordial, entre uma simpática e engraçada personagem chamada André e um zangão chamado Wally B.

O sonho deste grupo comandado por Ed Catmull era o de fazer uma longa-metragem de animação totalmente em computador, e Lucas, que estava bem ciente disso, conversou com eles e disse-lhes que para isso necessitariam do investimento de 30 ou 40 milhões de dólares, que ele não tinha. Em 1986, pouco depois de George Lucas, Ed Catmull e Alvy Ray Smith terem mudado o nome da divisão para Pixar, Ed partilha com Steve Jobs, de visita à Lucasfilm, o seu sonho, e faz com que este acredite nesse sonho. Rapidamente Jobs compra a Pixar a Lucas por cinco milhões de dólares e investe mais dez milhões para lançar a empresa. É então que mais um desafio é feito por Catmull a John Lasseter: realizar um pequeno filme de animação que demonstre o que é a Pixar. Daqui nasce Luxo Jr. (1986), a história de um candeeiro de escritório da marca Luxo que observa o seu filho Luxo Jr. a brincar com uma bola.

Pela primeira vez na história, um filme de animação 3D é candidato ao Óscar de Melhor Curta-Metragem de Animação. A Pixar ganha o seu símbolo, que se mantém até hoje, e uma estrela que entrará em mais três curtas de animação (todas realizadas pelo mesmo John Lasseter): Luxo Jr. in 'Front and Back' (1991), Luxo Jr. in 'Surprise' and 'Light & Heavy' (1991) e Luxo Jr. in 'Up and Down' (1993). Desta fase da empresa, Lasseter recorda o facto de só terem um computador, que usavam à vez de forma non-stop; das longas noites e dias em que dormitavam num pequeno espaço do escritório ou no carro, ou que não dormiam de todo, sempre a trabalhar para tentar chegar mais longe, onde ainda ninguém

havia chegado. É deste período que são todas as primeiras curtas após As Aventuras de Andre e Wally B. A seguinte é O Sonho de Red (1987), que nos apresenta a um monociclo que nunca ninguém quis comprar, colocado a um canto de uma loja de bicicletas. O seu sonho é, um dia, actuar num circo… Red’s Dream é um marco na história da Pixar porque, pela primeira vez, um filme aí produzido não tem um final feliz.

De uma curta para a outra, a equipa desenvolve novo software, ganha mais experiência, é mais capaz do que na curta anterior. Lasseter segue à frente, inspirando e desafiando todos à sua volta, e no ano seguinte realiza a curta que dá à Pixar o seu primeiro Óscar, bem como o primeiro Óscar de sempre a um filme de animação feito por computador, Tin Toy (1988). Considerado por muitos como o antecessor de Toy Story, o pequeno filme de cinco minutos relata a relação entre um bebé e os seus brinquedos, nomeadamente um boneco de corda que toca vários instrumentos e que dele foge, recusando-se a brincar com ele. Quando se arrepende e quer voltar atrás, já o bebé está com a atenção virada para outro lado.

Embora some êxitos, a vida da produtora encontra-se, por esta altura, em risco, já que dá prejuízo ano após ano, apesar dos seus programas inovadores e as suas animações e efeitos visuais em filmes de imagem real cada vez mais bem conseguidos. Faltava, de facto “a tal” longametragem exclusivamente feita por computador, bem como uma empresa que tivesse vontade em associar-se à Pixar nesse objectivo. Como todos sabemos, a empresa acabou por ser a Disney e “a tal” primeira longa de animação digital, foi mesmo Toy Story (1995). Mas isso é uma história para ser contada noutro local desta revista. Neste artigo, falta-nos apenas falar de Sunny Knicks Knacks (1989), novamente realizado por John Lasseter, e em que um boneco de neve aprisionado num globo de água com farripas de neve artificial pretende aproveitar os raios solares de Miami junto às belezas plastificadas que ocupam a mesma prateleira de souvenirs que ele. A luta para sair do globo assume proporções épicas e tudo aponta para um desfecho cor-de-rosa… Será?

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