INÊS BONDUKI Diálogos com a metrópole Revista Abigraf 289

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F OTOG R A F I A

com a metrópole

origem do envolvimento de Inês Bonduki com a fotografia e com a capital paulista está na arqui‑ tetura. Formada pela Faculda‑ de de Arquitetura e Urbanis‑ mo, FAU‑USP, em 2010, logo no início do curso comprou uma câmera analógica, ini­cian­do suas conversas com o caos urbano. “Cheguei a es­ ta­g iar em escritório de arquitetura, mas des‑ cobri que preferia estar na rua e experimen‑ tar a arquitetura da cidade a ficar projetando e pensando sobre ela.” A opção foi lançar-​­se ao mercado, atuan­do como assistente de fotografia. Depois de uma passagem de um ano no estúdio de Gal Oppi‑ do, também cria da FAU, trabalhou primeiro como assistente de edição e depois como edi‑ tora de fotografia da Revista sãopaulo, da Folha. Deixou o jornal para dedicar-​­se a sua veia auto‑ ral, canalizada pelo mestrado que resultaria no livro Linha Vermelha. Impressa pela Ipsis e lan‑ çada em maio pela Editora Tempo d’Imagem, a obra é fruto de dois anos dedicados a incontá‑ veis via­gens na Linha Vermelha do Metrô em seus ho­rá­r ios de pico, a mais longa das linhas na malha me­tro­v iá­r ia da cidade, que liga a pe‑ riferia às re­g iões mais centrais. Com um celu‑ lar na mão, Inês procurou “vi­ven­ciar e tentar 5

fotografar a intensidade corporal e emo­cio­nal dessa ex ­pe­r iên­cia co­ti­d ia­na de três milhões de paulistanos”. Nesse ínterim, fotografou por 10 dias um grupo de dança que usa a técnica de contato e improvisação, na qual a interação cor‑ poral se dá de forma expansiva. “Tinha a intui‑ ção de que com a dança conseguiria aprofun‑ dar o discurso que estava construindo na Linha Vermelha, mas levou meses para que isso acon‑ tecesse. Quan­do uni os registros percebi que eles eram muito próximos, como se tivessem sido feitos no mesmo am­bien­te.” Vencedor da segunda edição do Prêmio Foto em Pauta, o livro ma­te­r ia­l i­za outro foco de in‑ teresse de Inês. Em 2015, a fotógrafa passou uma temporada no Vi­sual Stu­d ies Workshop, em Nova York, pesquisando sobre sequência vi­sual no suporte livro, que nada mais é que a edição. “A edição é a construção do discurso. Se você não domina essa etapa, não domina o discurso que quer passar para o outro. Mas, com a disseminação da cultura do livro na fo‑ tografia, está ficando claro para os fotógrafos que a edição é parte da linguagem. Com a cap‑ tura digital e a altíssima profusão de imagens, o fotógrafo tem o papel não só de produzir imagens, mas de saber olhar para sua produção e pensá-​­la criticamente.”

Foto: Bel Ruas

Diálogos

Inês Bonduki é uma caminhante. Em suas primeiras experiências com a fotografia, esquadrinhar São Paulo foi a forma encontrada para aprofundar sua prática na captação das imagens. A intensidade do retorno provocou o desejo de não mais parar, levando-​ a­ a incorporar o pedestrianismo como mote de seu trabalho e meio de apropriação da cidade. Tânia Galluzzi

1 a 5 Fotografias do livro Linha Vermelha

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6 Foto da série São Paulo Corpo‑a‑Corpo, projeto autoral produzido em 2009/10 7 Retrato do artista João Indio no Paço das Artes, para a revista sãopaulo (Folha de S. Paulo) – fevereiro 2016 8 Foto de divulgação do CD Algorritmos da Banda Filarmônica de Pasárgada – julho 2016 9 Sede da Associação Brasileira de Restauro Ferroviário, para matéria da revista sãopaulo (Folha de S. Paulo) – novembro 2014

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QUESTIONAMENTO

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INÊS BONDUKI www.inesbonduki.com REVISTA ABIGR AF  maio /junho 2017

O interesse de Inês sobre São Paulo permanece. A fotógrafa dá agora continuidade a um projeto ini­cia­do antes do Linha Vermelha, denominado Catadores. “Comecei a acompanhar a longa lo‑ comoção de pes­soas que moravam em re­g iões

distantes na volta do trabalho para casa. Eu dor‑ mia na casa dessas pes­soas e no dia seguinte vol‑ tava caminhando. Acabei estabelecendo uma relação com os bairros da periferia e a perceber como eram vá­r ias cidades dentro da mesma.” A fotógrafa acabou se juntando ao grupo de ca‑ minhada Arquipélagos Urbanos, cria­do pelo ar‑ tista Renato Hofer. Ao lado dele e da também artista Edith Derdyk, em fevereiro deste ano percorreu 220 km ao redor da cidade em 15 dias. “É uma ex­pe­r iên­cia que ultrapassa a fotografia. Sentimos na pele o que é essa cidade, que não é feita para o pedestre e sim pensada a partir da lógica dos carros. O caminhar virou quase um ato político, de estarmos na cidade com o nos‑ so corpo, questionando por que ela não é feita para nós.” Entre outras ações, o resultado desse exercício certamente caberá em um livro.


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