F OTOG R A F I A
Arte e fotojornalismo
A
Tuca Vieira
té 2050, mais de 70% da popu lação mund ial viverá em cida des, segundo a ONU. Na Améri ca Latina, esse percentual já bate os 80%. Em São Paulo, verticali zação e adensamento explicam a explosão imo biliár ia: em cinco anos a capital ganhou nada menos do que mil préd ios residenciais. Para Tuca Vieira isso é matéria-prima, mas sa disforme e caótica a ser lapidada por sua câ mera. A arquitetura das cidades o inspira en quanto ele usa a fotografia como instrumento para sobreviver dentro delas. Como descreveu o também fotógrafo Marcelo Coel ho no prefá cio do livro As Cidades do Brasil: São Paulo, pu blicado em 2005, “as lentes de Tuca Vieira se multiplicaram como os cristais de um caleidos cópio, conseguindo captar, num contraponto de imagens que se renova e surpreende a cada página, tudo o que a cidade tem de extrema do, de conflitivo, de inquietante — e de bonito”. Tuca, nascido em São Paulo em 1975, come çou cedo a construir esse caleidoscópio. As pri meiras peças lhe foram apresentadas pelo tio, Cláudio Feijó, fotógrafo e criador da escola Ima gem-Ação, referência no estudo da fotografia em São Paulo. Aos 16 anos partiu para sua pri meira exper iência de impacto. Um mochilão de dois meses pela Europa serviu para que Tuca visse na fotografia o seu meio de vida. Os anos seguintes foram preenchidos com cursos de fotografia e o emprego de laborato rista no Museu da Imagem e do Som (MIS).
A atração pela rua encaminhou-o para o fo tojornalismo, e o desejo de ter uma formação humanista para o curso de Letras na USP. De pois de passagens rápidas por revistas e jornais como Diár io do Comércio e Estadão, fixou-se na Folha, onde trabalhou de 2002 a 2008. “Foi a ex per iênc ia exata: suf ic iente para me tornar um fotojornalista prof issional e não tão lon ga a ponto de me acomodar”. Guiado pela von tade de se aprofundar em alguns temas, Tuca tornou-se fotógrafo independente. Ao sair da Folha partiu para Berlim. De lá, em três meses trouxe um trabalho planejado, conceitual, mais próximo do mundo das artes plásticas, que ren deu exposição em São Paulo e Nova York e en trevistas para revistas internacionais de arte e fotografia como a Domus e a Elephant. Hoje a senda de Tuca é essa: dividir-se entre os trabalhos encomendados por revistas e jor nais e os projetos pessoais. “Os artistas acham que eu sou fotojornalista e os fotojornalistas dizem que sou artista. Desisti de tentar me definir”. Nem o rótulo de fotógrafo de cidades ele quer. “Fotografo onde estou. Como vivo em uma cidade é ela que retrato, mas se estiver no mato é lá que irei fotografar”.
Tuca Vieira usa a fotografia como um instrumento de convivência com o espaço em que vive, uma forma de apropriar‑se da cidade e transformá‑la em beleza. Tânia Galluzzi
PERTENCIMENTO
Vamos dizer então que Tuca está fotógrafo de cidades. Mais especificamente de uma cidade, e assim deve continuar pelo menos por mais 12 meses. Objetivando afastar-se da dicotomia tra balho comercial/trabalho pessoal, ele pretende
1 ( página ao lado) São Paulo, 2007 2 ( página ao lado) Minsk, Bielorrússia, 2013 3 Uyuni, Bolívia, 2008
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3 REVISTA ABIGR AF julho /agosto 2014
julho /agosto 2014 REVISTA ABIGR AF
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4 Minsk, Bielorrússia, 2013 5 Cracolândia, São Paulo, 2012 6 Rua Augusta, São Paulo, 2009 7 Marabá, Pará, 2013
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✆ TUCA VIEIRA Tel. (11) 2371-1862 www.tucavieira.com.br REVISTA ABIGR AF julho /agosto 2014
engajar-se num projeto de fôlego e passar um ano clicando São Paulo, um assunto sem fim para o fotógrafo. O encanto pela capital Tuca explica com a sensação estranha e fascinante, que acomete vár ios paulistanos, de morar num lugar desconhecido. “Às vezes me sinto um es trangeiro em São Paulo e não posso me confor mar com isso. Acho que a vontade de retratar a cidade vem de uma necessidade de pertenci mento”. Nas suas mãos, a fotografia é igualmen te capaz de transformar a megalópole dura, feia e difícil em algo interessante e belo.
Mergulhadas nesse tema, das imagens que emergem da obra de Tuca chama a atenção a au sência das pessoas, o quase absoluto privilégio à arquitetura. “A exigência da presença da figu ra humana é coisa da fotografia brasileira, la tino-a mericana. Mas olhando a fotografia no mundo, desde os primórd ios, isso não aconte ce”. Para Tuca, o lugar onde se vive e suas cons truções contam muito sobre os que lá habitam. “É possível falar do paulistano sem mostrá-lo. Os lugares têm personalidade, temperamento, têm história como as pessoas”. Argumentando que São Paulo, quando comparada a outras gran des cidades, foi pouquíssimo fotografada, Tuca diz que seu objetivo é documentá-la, revelar um espaço que continua a surpreendê-lo.