HISTÓRIA VIVA
fazendeiro. Além da conf iança num futuro melhor, Enrique trouxe a habilidade na confecção de lantejoulas. Após alguns percalços, ele conseguiu estabelecer-se e em 1963 criou oficial mente a Málaga Produtos Metalizados Ltda., tendo hoje os filhos como sócios. “Sou um fuçador, estou sempre atrás de uma solução”, conta Francisco. “Comprávamos o acetato de celulose para fazer as lantejoulas e um dia, quando fui retirar o mater ial, vi num caminhão sacos com o nome Rhod ialite. Fui até a Rhodia e descobri que o acetato custava menos de 1/4 do que pagávamos. Cheguei em casa e disse para o meu pai que tínhamos de fazer nosso próprio acetato”. Meses mais tarde a primeira extrusora estava pronta. Detalhe: Francisco nunca estudou Engenharia. “Em três, quatro dias fabricávamos o mater ial necessário para a produção
Francisco Málaga é o que nossas avós costumavam chamar de azougue. Inquieto, curioso, tenaz, abraçou as paixões de infância e soube fazer delas os motores de sua vida. Tânia Galluzzi
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Francisco Málaga A fé não costuma falhar
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stamos conversando há mais de duas horas e as histórias continuam a se desdobrar como um mapa. Nesse mapa, os tesouros são as lembranças de Francisco Málaga. Elas surgem vivas, brilhantes, espalhando luz pelas trilhas percorridas por esse empresário-engenheiro-aventureiro que em janeiro completou 71 anos. Pistas estão por todo
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1 Francisco e seu torno platô reconstruído, com diâmetro até 2,60 m, no qual foram usinadas peças das suas metalizadoras desde 1973.
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o lado. Numa caixa de papelão deixada sobre um antigo bufê, em recortes de jornal decorando as paredes, no próprio entusiasmo de Francisco em contar passagens de sua vida, que lhe vêm salpicadas, ordenadas pelo prazer de repeti-las e não por qualquer linha cronológica. Indo e voltando no tempo, Francisco Málaga, um dos principais fabricantes de substratos metalizados do Brasil, relata que o gosto pela engenhosidade das máquinas, apesar de ter sido incentivado pelo pai, é culpa de sua mãe. Em vez de livros infantis, Dona Maria dava ao filho edições da revista Hobby. Assim, o menino desenvolveu habilidades que ajudaram o pai, Enrique, na montagem da fabriqueta de lantejoulas em um dos quartos da casa da família no bairro de Vila Romana, em São Paulo. E boa parte das metalizadoras usadas pela empresa em 50 anos de atividade foram projetadas e construídas por ele. Os Málaga emigraram da Espanha para o Brasil em 1951, na esperança de terem a mesma sorte de um parente que aqui se tornara
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de passagem, e por dez meses mergulhou na tecnologia. Com a ajuda do professor, conquistado pela tenacidade do rapaz, um ano depois, sem nunca ter visto a máquina de perto, Francisco estava com o projeto de uma metalizadora nas mãos, concretizada em 1974. Um ano e meio depois a segunda metalizadora ficou pronta e a Málaga pôde ampliar sua atuação produzindo papéis para presente, filmes metalizados para confecção de árvores de Natal e a chamar a atenção da indústria de embalagens, passando a metalizar para terceiros. A empresa evoluiu rapidamente — uma nova fábrica foi aberta em Osasco —, no mesmo ritmo em que Francisco montava outros equipamentos. Ao todo foram 12 metalizadoras, sendo que algumas ainda estão em operação.
2 Francisco e os filhos, com os quais divide o comando da Málaga. Simone, diretora comercial, e Flávio, diretor financeiro 3 Francisco e o pai Enrique Málaga 4 Umas das quatro laqueadoras projetadas e construídas por Francisco
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mensal de lantejoulas e o excedente passamos a vender para floriculturas, para a Lenços Presidente, que usava o acetato em suas embalagens, e até como fitas de acetato ponteiras de cordões para calçados. Não dávamos conta, tamanha a demanda”. A extrusora foi montada em 1966, ano em que Francisco casou-se com Adiba, com quem teve três filhos: Soraya, Simone e Flávio. A empresa crescia e Francisco só pensava numa coisa: tornar-se independente da importação de acetato já metalizado. Ele sabia que a chave do processo de metalização era o alto-vácuo. Em 1970 achou um curso sobre o assunto na USP, só frequentado por engenheiros, diga-se
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