Coração selvagem aun é uma pequena cidade ao noroeste de Botsuana, país africano que tem quase 70% de sua superfície coberta pelo deserto do Kalahari. É esse cenário, onde a natureza resiste a fazer concessões, que a fotógrafa Janaina Matarazzo escolheu como morada. Escolheu para viver a liberdade, para enfileirar-se ao lado daqueles que desejam ver a natureza preservada, para usar a fotografia como instrumento de resistência.
A força dessa oposição está na beleza, na urgência em expor em cada ponto de suas imagens a imponência do mundo natural. E não se engane. Ao compartilhar conosco paisagens oníricas, Janaina quer nos seduzir, pretende despertar em cada um de nós o desejo de conhecer a África e assim, fortalecendo o turismo, ampliar as chances de sobrevivência da fauna e da flora. Em 2008, aos 30 anos, Janaina decidiu que era hora de deixar São Paulo e abraçar o sonho de conhecer a África. Optou por Botsuana pela
F OTOG R A F I A
A natureza está ali tão explícita, nua, que chega a ser surreal. Na rotina de Janaina Matarazzo o amor pela fotografia e pelos animais se une para fascinar o observador e convencê‑lo de que tudo aquilo merece ser preservado. Tânia Galluzzi
rusticidade, e partiu. A sintonia imediata com a natureza da reg ião resgatou sua vontade de fotografar, embotada desde os tempos de faculdade. Rapidamente engajou-se no projeto Water For Life, depois chamado de Conservation Safaris, que oferece aos turistas estad ias mais longas em troca de ajuda nos projetos sociais com a comunidade e de conservação da natureza. Depois de cinco meses, Janaina voltou para a capital paulista apenas para organizar-se e retornar para Botsuana. Seguiram-se então quase quatro anos de intenso aprendizado sobre a re gião e a vida selvagem. Morando em um safari camp, não faltavam possibilidades para fotografar, e Janaina aproveitava todos os momentos. PARTICIPAÇÃO ATIVA JANAINA MATARAZZO www.janainamatarazzo.com
Já estabilizada no país, que da colonização inglesa herdou entre outras coisas a organização, Janaina abriu sua empresa, atuando hoje
74 REVISTA ABIGR AF setembro /outubro 2015
em três frentes: a fotografia autoral, cujo braço avançado em São Paulo, o Fine Art Studio, cuida da impressão de tiragens limitadas e ilimitadas; a fotografia de publicidade, voltada para o mercado reg ional, sobretudo para o fomento da atividade turística; e sua própria agência de turismo, a Travel For Conservation. “Sem o turista não há futuro para a natureza em Bot suana. A economia aqui está baseada na extração do diamante e do cobre e, principalmente, na pec uár ia, que disputa espaço com as reservas e parques nacionais. Se o fluxo de turistas cai, aumenta a pressão pela expansão das áreas ocupadas pelo gado”. Lutando para manter essa gangorra equilibrada, pelo menos uma vez por mês Janaina junta suas tralhas e parte sozinha em seu 4 × 4 para duas ou três noites acampando em uma reserva. Imersa nas entranhas da África mer idio nal — cheia de cores na estação das chuvas, selvagem e rude no per íodo da seca —, a fotógrafa busca o movimento em suas composições, espreita momentos onde a luz possa conferir um caráter de sonho às imagens, transformando- as em cenas quase surreais. “Quero encher os olhos do meu espectador”. A magia desses cenár ios encantou o Museu da Imagem e do Som (MIS), em São Paulo, que produziu a exposição Mundo à Parte, em cartaz até o fim de outubro. Com curadoria de André Sturm, diretor do museu, a mostra é composta por 19 imagens, revelando instantes únicos da vida dos animais, como a fuga das zebras quando atacadas por uma leoa, enquanto urubus aguardam o desfecho nos galhos das árvores. A exposição deve seguir para outras cidades, e para 2016 Janaina pensa em editar um livro.