CAIO REISEWITZ - Fotografia - Revista Abigraf 282

Page 1

F OTOG R A F I A

Um olhar sobre o Brasil

C

aio Reisewitz gosta de equilibrar-​­se entre o real e o ar­ti­f i­cial. E o faz construindo imagens por meio da colagem, ora apro­prian­ do-​­se de fo­to­g ra­f ias e crian­do no­ vas leituras a partir delas, ora combinando suas pró­prias cria­ções. A discussão dos dramas so­ ciais não é explicita e o uso de uma luminosida­ de despojada resulta em registros que evocam o silêncio e a reflexão, como já assinalou o fotó­ grafo Eder Chio­det­to. Isso não abranda a críti­ ca de Caio sobre problemas como a degradação am­bien­tal, a crise hídrica, a desigualdade so­cial e as cor­roí­das estruturas de poder. No início de sua carreira, Caio ficou conhe­ cido por um trabalho mais documental. Foi as­ sim logo em sua primeira ex­pe­r iên­cia com a fo­ tografia. Paulista, deixou a capital em 1989, aos 22 anos, logo depois de formar-​­se em comu­ nicação vi­sual pela Fundação Armando Álva­ res Pen­tea­do (FAAP). Com uma Canon na mão, partiu de navio para a Alemanha — “não tinha

dinheiro para a passagem de ­avião” —, terra de seus avós. Contratado para limpar a ferrugem do navio, documentou os 40 longos dias que o separavam de seu destino (10 a mais do que o normal por conta de uma greve no Porto de San­ tos). Estabeleceu-​­se em Darmstadt, onde tinha fa­mi­lia­res, frequentando a Escola Su­pe­r ior de Artes da cidade. A es­pe­cia­li­za­ção em fotografia aconteceu em Mainz, na Universidade Johan­ nes Gutenberg, entre 1992 e 1997, sendo que nesse pe­r ío­do também estagiou em um estúdio de fotografia publicitária e de moda. A fotografia co­mer­cial ainda o acompanhou por um tempo. De volta a São Paulo em 1997, Caio começou a colaborar com a DBA Editora, fotografando sobretudo in­dús­t rias. O traba­ lho pes­soal não parou e em 1997 e 1999 ga­ nhou o Prêmio Aquisição no 4º e no 6º Sa­ lão do Museu de Arte Moderna da Bahia. Dois anos depois venceu o II Prêmio Cultural Sér­ gio Motta, possibilitando a publicação de seu primeiro livro, Periferia.

As artes plásticas compõem seu campo de militância. A fotografia é o seu instrumento. As questões sociais, fontes inesgotáveis das quais bebe para verter seu talento. Caio Reisewitz é hoje um dos fotógrafos de destaque no Brasil, acumulando prêmios e participações em bienais aqui e no exterior. Tânia Galluzzi

Caio Reisewitz 72

73 março /abril 2016  REVISTA ABIGR AF


igrejas barrocas. Outros livros vie­ram, como Parece Verdade, de 2010, fruto da exposição de mesmo nome com registros dos deslocamentos do artista pelo Brasil e por cidades estrangeiras; e Água Escondida, de 2014, que se apoia na força das imagens para investigar a relação das cida­ des com sua hidrografia, lançado pela Bei Edi­ tora em parceria com o Instituto Moreira Salles. Enquanto as exposições e participações em eventos nacionais e internacionais se intensifi­ cam, o tempo da arte mantem-​­se sereno. O fo­ tógrafo continua fiel ao processo analógico e às câmeras de grande formato. “É um processo pre­cio­so. Demora uns 15 minutos para montar o tripé e po­si­cio­nar a câmera, dando mais tem­ po para que eu observe o que vou fotografar.

74

CAIO REISEWITZ caio@comum.com REVISTA ABIGR AF  março /abril 2016

Em 2004 aconteceu o primeiro grande salto em sua trajetória como artista plástico, quan­ do foi convidado para participar da 26ª Bie­nal In­ter­na­cio­nal de São Paulo com a série Autoridade, abordando a vio­lên­cia po­li­cial. No ano se­ guinte representou o Brasil na 51ª Bie­nal de Ve­ neza com fo­to­g ra­f ias que discutem o poder por meio da arquitetura brasileira, alternando ima­ gens de obras de Oscar Nie­me­yer em Brasília e

E a imagem só é revelada depois. Gosto da pro­ ximidade que esse procedimento tem com a pintura de paisagem”, afirma Caio. A aquare­ la é inclusive uma técnica que o artista vem explorando cada vez mais. Depois de expor no In­ter­na­t io­nal Center of Photography, em Nova York, na Maison Eu­ ro­péen­ne de la Photographie, em Paris, e no Huis Marseille, Museum voor Fotografie, em Amsterdã, no ano passado, Caio está de ma­ las prontas para um workshop em Lima, no Peru. Depois virá a feira Photo Basel, em Ba­ sel, na Suí­ç a, e a PhotoEspaña, na cidade de Múrcia. Entre uma via­gem e outra, o artista tem montado sua ­Linhof Technika 4 × 5 dian­ te de caixas eletrônicos arrombados. “A estéti­ ca do que sobra é interessante. Tem tudo a ver com o Brasil de hoje.”


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.