OS TRÊS IRMÃOS 2021

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ONLINE 1 A 4 ABRIL DANÇA

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© José Caldeira

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TEATROSAOLUIZ.PT


[Nota de abertura]

© Estelle Valente

Não trabalho com palavras, mas sim com movimentos, o que vai tornando progressivamente difícil escrever sobre os meus espectáculos. Mas uso muitas vezes as palavras como ponto de partida, como meio e até como fim. Acabo quase sempre por retirá-las da boca dos intérpretes, ou por calar os autores. Desta vez, não foi assim: as palavras do Gonçalo M. Tavares estão presentes em Os Três Irmãos. São o motor da acção e surgem no espectáculo para serem lidas, e não ditas. A força da sua presença é por isso diferente – são palavras que não se ouvem, mas que conduzem o espectador. Os Três Irmãos é um projecto de vontades: trabalhar com um elenco pequeno, depois de sucessivas criações com elencos de mais de dez intérpretes; trabalhar a partir de um texto do Gonçalo M. Tavares, autor em cujo universo sempre tive vontade de mergulhar; trabalhar o aqui e o agora. Acontece que nunca imaginei que o aqui e o agora fosse este que estamos a viver. Não sendo possível prever o futuro, em momento algum teria sido imaginável há um ano, por exemplo, a realidade dos dias de hoje. Ainda não sei bem se isto é realidade ou ficção, aliás. Foi também por isso que desafiei o Gonçalo M. Tavares a escrever sobre “assuntos de família” para os intérpretes Dinis Duarte, Paulo Mota e Valter Fernandes. Depressa concluímos que seria uma família de três irmãos e que a acção seria sobre este presente cheio de ausência. Por exemplo, a ausência de pessoas que entretanto morreram e de quem não pudemos despedir-nos. Não era minha vontade retratar esta realidade-ficção que vivemos, e talvez por isso tenha preferido ficar de algum modo no passado, quando o contacto e o toque ainda nos era possível. É também desse passado que nos fala Os Três Irmãos. Vivemos agora numa anomalia e não numa nova normalidade, e a família é o que temos de mais seguro e de mais frágil. Como escreveu Tolstói em Anna Karenina: “Todas as famílias felizes se parecem umas com as outras, cada família infeliz é infeliz à sua maneira”. Victor Hugo Pontes

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© Estelle Valente

UM EXCERTO DA PEÇA ORIGINAL DE GONÇALO M. TAVARES,

publicada integralmente no Caderno de Criação Os Três Irmãos 1. O que diz Abelard? O que diz Adler? O que diz Hadrian? Hadrian O pai? Adler A mãe? Abelard Não os encontro. Adler Não estão em casa. Hadrian Saíram? Adler Fugiram? Abelard (traça uma circunferência a giz no chão) O pai. (Depois traça outra a giz no chão, mesmo ao lado.) A mãe. Os três olham para as duas circunferências, como se os pais estivessem ali. E começam a andar à volta deles, como se os cercassem. Adler Não os devias diferenciar? Os três apagam o giz com os pés, apagam as duas circunferências. Abelard De novo. Abelard (de novo traça uma circunferência. E depois um quadrado ao lado.) O pai. (Aponta para a circunferência.) Adler O pai? Abelard A mãe. (Aponta para o quadrado.) Adler Não. O pai. (Aponta para o quadrado.) A mãe. (Aponta para a circunferência.) Hadrian (abana a cabeça) Não, não. Assim estamos a distinguir. Abelard traça duas circunferências, mas agora um pouco mais afastadas. Abelard Pai, mãe. Adler Estão demasiado juntos. Abelard apaga as duas circunferências e ainda as coloca mais afastadas. Nas duas extremidades do palco. Abelard E agora temos de escolher. (Aponta para as duas circunferências.) Abelard Pai. Mãe. Adler Vais para ali ou para ali? Os dois rodopiam entre as duas circunferências. Abelard Pai, mãe. Adler Pai, mãe. Hadrian Pai, mãe.

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© Estelle Valente

© Estelle Valente

UM EXCERTO DO TEXTO “O SILÊNCIO IMAGINADO”, DE TIAGO BARTOLOMEU COSTA,

publicado no Caderno de Criação Os Três Irmãos […] Que gestos são estes que se desenham e se espalham pelo palco, deixando marcas de água num solo inclinado? Que gestos são estes que desenham ondas no espaço, dialogando com uma partitura que se constrói sem hierarquizar com notas musicais ou sonoridades rudes, mais urbanas, que parecem vir de fora do palco? É verdade que não precisamos do texto para chegar às imagens. Elas nascem da nossa perceção, e às vezes da nossa imaginação; às vezes resultam de projeções que lançamos sobre a cena e os intérpretes, às vezes são processo de referências, outras vezes deixam-nos presos pela dobra que o coreógrafo propõe a uma imagem que sabemos saturada de história e herdeira de confusas impressões, por vezes apenas estéticas. Mas que jogo é este a que se prestam estas personagens? A que ética obedecerá este jogo de irmãos, de amigos, de amantes, de rivais, de desconhecidos, de homens solitários na cidade, de atores a representar papéis, de bailarinos a fazerem dos seus próprios gestos os discursos de todos? É porque a cena se vai sujando e enchendo de materiais — hipóteses de construção, como se fossem um Lego ou as marcas que apagamos daquilo que deixamos na vida adulta — que começamos a perceber o gesto como memória da intenção, e o jogo como forma de diálogo. Logo, o movimento como língua de inscrição. E então 6

percebemos que esses que se fazem passar por animais, em movimentos entre o profano e o premeditado, entre o mal e o bem […], são corpos em busca do silêncio de uma resposta. Procuram um corpo e por isso desenham-no no chão, refletem-no no espelho, lavam-no na água de outros corpos, escavam esse mesmo chão, dobram-se nas sombras, expostos e nus, como se o regresso a um ideal de liberdade pudesse recuperar esse por quem procuram. […] O silêncio em Os Três Irmãos não é o da palavra não-dita, mas o da palavra suprimida, da palavra invisível porque se demora a formar, que se apaga e que ressurge no gesto, em silêncio. Um silêncio que nos cabe imaginar, compor, fixar, inquirir, identificar. Um silêncio que nos pede que lhe atribuamos uma forma, um som, e limites para que possa deixar de existir apenas como fantasma. Um silêncio que, para se provar concreto, carece que se lhe desenhe um círculo, e que depois essas marcas, incompletas, sejam ainda mais finitas e apagadas, até só restar uma cor ocre, castanha, de tijolo que fixa o silêncio ao chão e que faz desses limites, desses corpos, o nosso olhar. Um olhar lançado, porque conduzido, sobre o que já não vemos e já não temos. […] A comovente inadaptação dos corpos à ideia de ausência é o mais próximo da fé que Victor Hugo Pontes conseguiu chegar, seja uma fé profana e pagã, seja temente a um Deus impiedoso: Os Três Irmãos ocupa um lugar entre Ícaro e São João Baptista, entre Estragon e São Tomé, entre Krapp e São Mateus, entre uma ideia de filho e uma ideia de pai, entre ideais, valores e utopias, entre materializações, contrastes e solavancos da vida. Tiago Bartolomeu Costa

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em paralelo

IRMÃOS, o documentário (2021)

Um filme de Miguel C. Tavares que acompanha o processo de criação do espetáculo OS TRÊS IRMÃOS, de Victor Hugo Pontes 8 a 11 abril quinta a domingo, às 19h (disponível até às 24h) gratuito

OS TRÊS IRMÃOS, o caderno de criação (ed. Nome Próprio)

Lançamento online com a presença dos autores do caderno de criação, numa conversa com moderação de Madalena Alfaia, transmitida 10 de abril sábado, às 18h em direto na página de Facebook da Nome Próprio

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1 a 4 abril 2021 dança online

OS VICTOR TRÊSHUGOIRMÃOS PONTES TEXTO ORIGINAL DE GONÇALO M. TAVARES Disponível online em saoluiz.bol.pt Quinta a domingo, às 19h (até às 24h) Duração: 1h30; m/12; €3 Direção artística: Victor Hugo Pontes; Texto original: Gonçalo M. Tavares; Interpretação: Dinis Duarte, Paulo Mota, Valter Fernandes; Música original: Joana Gama, Luís Fernandes; Cenografia: F. Ribeiro; Desenho de luz e direção técnica: Wilma Moutinho; Figurinos: Cristina Cunha, Victor Hugo Pontes; Consultoria artística: Madalena Alfaia; Operação de luz: Cláudia Valente; Operação de som: João Monteiro; Operação de legendagem: Mariana Lourenço; Direção de produção: Joana Ventura; Produção executiva: Mariana Lourenço; Apoio à residência: O Espaço do Tempo, Circolando, Instável – Centro Coreográfico, Centro Cultural Vila Flor Coprodução: Nome Próprio, Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão, Teatro Municipal do Porto, Teatro Viriato, Cineteatro Louletano e São Luiz Teatro Municipal

© Estelle Valente

A Nome Próprio é uma estrutura residente no Teatro Campo Alegre, no âmbito do programa Teatro em Campo Aberto, e tem o apoio da República Portuguesa — Ministério da Cultura / Direção-Geral das Artes.

O Teatro São Luiz/EGEAC é parceiro no Projeto Europeu Inclusive Theater(s) Rede de desenvolvimento de novos públicos através de ações inclusivas para pessoas com necessidades específicas Direção Artística Aida Tavares Direção Executiva Ana Rita Osório Assistente da Direção Artística Tiza Gonçalves Adjunta Direção Executiva Margarida Pacheco Secretária de Direção Soraia Amarelinho Direção de Comunicação Elsa Barão Comunicação Ana Ferreira, Gabriela Lourenço, Nuno Santos Mediação de Públicos Téo Pitella Direção de Produção Mafalda Santos Produção Executiva Andreia Luís, Catarina Ferreira, Tiago Antunes Direção Técnica Hernâni Saúde Adjunto da Direção Técnica João Nunes Produção Técnica Margarida Sousa Dias Iluminação Carlos Tiago, Ricardo Campos, Sérgio Joaquim Maquinaria António Palma, Miguel Rocha, Vasco Ferreira, Vítor Madeira Som João Caldeira, Gonçalo Sousa, Nuno Saias, Ricardo Fernandes, Rui Lopes Operação Vídeo João Van Zelst Manutenção e Segurança Ricardo Joaquim Coordenação da Direção de Cena Marta Pedroso Direção de Cena Maria Tavora, Sara Garrinhas Assistente da Direção de Cena Ana Cristina Lucas Camareira Rita Talina Bilheteira Cristina Santos, Diana Bento, Renato Botão

www.teatrosaoluiz.pt


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