RECUPERAR O CORPO 2021

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TIAGO VIEIRA ODETE

MARIA DUARTE E JOÃO RODRIGUES

CARLOTA LAGIDO SÓNIA BAPTISTA RITA SÓ E MÓNICA CALLE TIAGO BARBOSA

30 OUT - 14 NOV 2TE0AT2RO1/DANÇA A CLASSIFICAR PELA CCE

© bonneville

RECUPERAR O CORPO DIREÇÃO ARTÍSTICA

MIGUEL BONNEVILLE


RECUPERAR O CORPO Miguel Bonneville

os esquecer, como dedicatória – mas também como forma de me confundir com eles; de fazer parte deles, de ser também eles. Há em mim a necessidade arrebatadora de os celebrar enquanto estão vivos. Recuperar o Corpo faz ainda parte de um processo: o de procurar pensar outras formas de comunidade; não necessariamente uma comunidade em que estejamos todos de acordo ou na qual esteja envolvida uma ideia simplista de caridade, mas uma comunidade na qual cada um não tenha de se reger pelas mesmas normas e, mesmo assim, consiga reconhecer no outro as suas fragilidades. Acredito que é mais através das nossas fragilidades do que das nossas conquistas que nos unimos. Pensar, portanto, numa comunidade de vozes individuais. Carlota Lagido, Maria Duarte e João Rodrigues, Odete, Rita Só e Mónica Calle, Sónia Baptista, Tiago Barbosa, e Tiago Vieira. Sete solos. Sete formas distintas de olhar para o particular como abertura para o universal. Os espectáculos a solo foram sem-

Para concretizar este ciclo, foi necessário descrever um longo caminho de intenções que nunca se materializaram. Começou com a ideia de construir um arquivo – um arquivo pessoal de artistas. Esse arquivo deveria ser disponibilizado de forma livre e aberta, como forma de manter esses artistas presentes, fora de uma determinada obscuridade. Começou como uma forma de combater a dificuldade que existe em fazer circular espectáculos neste país. Começou como uma forma de combater a resistência obstinada em inscrever mais do que alguns ínfimos artistas na história de arte deste país. Um arquivo é contra o esquecimento, este ciclo também. Seguindo uma lógica interna, Recuperar o Corpo é uma ramificação de outros espectáculos, alguns dos quais apresentados no São Luiz: A Importância de Ser António de Macedo, A Importância de Ser Georges Bataille, MB#6. Espectáculos que são não só homenagens a artistas que são importantes para mim – como forma de os partilhar com os outros, de não 2

diversidade que a natureza insiste em criar, como se as formas que já existem nunca fossem suficientes, e como se as suas múltiplas manifestações fossem inesgotáveis. O corpo é o corpo do intérprete, o corpo do criador, mas também o corpo do espectáculo – são indissociáveis. A obra é o corpo. E esse corpo está para lá da insuficiência do ser humano. Corpos que falam, corpos eróticos, corpos que se desinstrumentalizam. Corpos que não se explicam. Recuperar o corpo é recuperar o enigma. Estes sete solos levam-me de volta ao essencial. Provocam uma expansão do conhecimento. São como marcos recordatórios para não me desviar do caminho. Obrigam-me a repensar, uma e outra vez, o que é arte. Obrigam-me a ver como se fosse a primeira vez. Esta foi a forma que encontrei de continuar a demonstrar a importância de certas obras e certos artistas na minha vida. Foi a forma que encontrei de poder retribuir, contribuir, nutrir – o que não se alimenta, morre. E eu gostava que eles vivessem para sempre.

pre aqueles que mais me marcaram. Há neles qualquer coisa de heróico – tanto de corajoso como de escandaloso – e qualquer coisa de íntimo. Aquilo que mais me faz vibrar nos espectáculos é a sua anti-espectacularidade. Quando não perdem tempo a explicar, e simplesmente são. Quando não procuram agradar. Quando não há diferença entre pensamento e acção. É o que vejo nestes solos. É sobretudo o que sinto nestes solos. Isso, a resistência a um virtuosismo histriónico, e a habilidade no refreamento – quando se põe de parte o supérfluo, o essencial é-nos revelado. São espectáculos que são quadros, esculturas, músicas, livros, uma cor ou uma corrente. Revejo-me nessa forma de criar, de actuar, que foge à lógica da representação clássica. Actuar como se se pintasse ou como se se esculpisse. Actuar como se o actuar em si não existisse; ser-se, só isso. Actuar não necessariamente como um humano a fazer coisas humanas, a pretender uma naturalização do gesto. É um actuar que engloba toda a 3


SÓ NA PERDA SE RECONQUISTA: CORPOS PERDIDOS SÃO CORPOS RECUPERADOS Pedro Arrifano

arte e ao atribuir-lhe o papel de “grande razão”, não contrapondo a paixão à razão, fornece um conjunto de insights… Simplesmente mostra que o corpo, ao assumir funções de comando – bem visível na nossa vida quotidiana –, age como um tipo de razão. Pensamento profundamente pós-moderno sobre o corpo, onde este, na sociedade atual, é quem lidera os processos sociais, é quem dá regras estéticas para substituir regras morais. Basta olharmos para complexidade geral dos centros de estética, ginásios, engenharia genética, moda, televisão, para compreendermos que faz sentido pensar o corpo como a “grande razão”. No seu todo, o conjunto de artistas aqui “convocados” por Bonneville a falar, estão conscientes de que há funções na arte que dependem de uma abordagem do corpo. Actualmente, a compreensão do corpo como peça manipulável, foi ampliada para uma análise e condição do “si-mesmo” – máquina autómata munida de “eu” – daí a importância do “recuperar do corpo” para Bonneville e para este colectivo de artistas convidado. Este recuperar não é trazer algo que está esquecido pela bruma do tempo, mas antes algo que se esgotou…que se esvaziou até à última gota…o corpo foi esvaziado. O corpo artístico não segue consensos. A unanimidade é sinónima de

Perder…perder tudo… a quantificação, a qualificação, a nomeação…assumir a entrega ao instante…esquecer… apagar… Será que se consegue esquecer de si mesmo? Assim num instante? Esquecer-se que se é mulher, que se é homem? Que se é? Esquecer-se… pura e simplesmente, para depois recuperar o resto de um todo tantas vezes totalizado…e esperar o momento para, de seguida, perdê-lo e recupe rá-lo? Miguel Bonneville mostra no seu trabalho que não há necessidade de sujeito. É nos seres outros que se recupera e se encontra. Seja no discurso do outro, no caminhar do outro, no tocar do outro, no olhar do outro, no ser-corpo do(s)outro(s). E recupera…o seu e os outros corpos. Reintroduz o corpo no âmbito da subjectividade para mostrar que ele, o corpo, não fornece nenhuma ajuda para a sustentação da noção de sujeito, na medida em que a própria noção de sujeito é um erro. Não é que queira extirpar o sujeito, mas sim desinflacioná-lo. A forma com que esvanece a noção de sujeito na arte que realiza, passa por uma reconsideração do corpo a que chama de recuperação. Na história do corpo nem sempre coube o corpo… este foi muitas vezes relegado para uma alma…infinita. Bonneville, ao usar o corpo na sua 4

por implicar uma precaridade da nossa existência geradora de angústia e dor. Em Heidegger encontramos essa mesma preocupação. Esta angústia, sentida, como sinal de sentimento autêntico da condição humana. A amargura do mundo, encerrada nos estreitos limites de um corpo que se expressa na arte que irradia, pode ser uma forma de apaziguar a dor dessa solidão congénita que habita em nós. Uma espécie de aprendizagem sobre a decepção, o desengano, o desespero, sem contudo, abraçar a resignação ou o silêncio. Na verdade, existem circunstâncias em que o ser-humano tem de se apressar a viver se não quiser correr o risco de perder a vontade de viver. Em todos estes artistas é possível perceber a ocorrência de uma violência, de uma dor no momento em que se pretende interpretar, decifrar, traduzir, o sentido de um olhar, um gesto, uma palavra, uma prática: um signo/um encontro. Uma palavra: Amar. Eles amam. E na verdade amar não se trata de se apropriar de um outro, mas dar-se ao outro. É aqui que se situa Miguel Bonneville e estes restantes artistas… só quando se perdem em algo/alguém é que se encontram.

aceitação… espécie de consentimento para que o corpo se banalize num acto qualquer. Bonneville e a comunidade de vozes individuais que escolheu “são” um corpo que vibra na direcção de outros corpos. É nesse movimento que eles os recuperam…a vibração tem este dom: resgatar corpos passados e presentes. A sobrevivência do corpo está ameaçada pelo domínio do narcisismo que provoca a desaparição do outro. É, pois, importante para resgatar o corpo, resgatar o outro. O extremo altruísmo e o extremo narcisismo são aqui necessários. A arte que expressam estes actores-performers surge ligada à verdade. Naturalmente não procuram uma verdade que provocasse dor, como defende Gilles Deleuze, quando afirma que só procuramos a verdade quando estamos determinados a fazê-lo em função de uma situação concreta, como quando sofremos uma espécie de violência que nos leva a essa busca. E que verdade é essa que procuram nas suas performances? Aquela que nos coloca a todos perante a nossa própria infelicidade: a de ser sempre mais do que se é aqui, embora não seja ainda o que será. Sartre dirá que o ser não é o que é, e que é o que não é. O que querem desvelar é esta primitiva precaridade da nossa contingência, que acaba

Os autores escrevem segundo o antigo acordo ortográfico. 5


30 e 31 outubro

6 e 7 novembro

JULIETA BEBE UMA CERVEJA NO INFERNO

ANITA ESCORRE BRANCO

TIAGO VIEIRA

ODETE

Sala Mário Viegas sábado e domingo, 19h30 Duração: 50 min. A classificar pela CCE; €7

Sala Bernardo Sassetti sábado e domingo, 20h Duração: 40 min. A classificar pela CCE; €7

Texto, Encenação, Dramaturgia coreográfica, Figurino, Cenário: Tiago Vieira; Apoio: Teresa Machado; Agradecimentos: Latoaria, Teresa Machado, Tânia Guerreiro e a todos aqueles que ao longo dos anos programaram Julieta Bebe uma Cerveja no Inferno

Criação: Odete; Maquilhagem: Beatriz Neto aka Sibila

6 e 7 novembro

6 e 7 novembro

(2018)

(2018)

A BALADA DE AMOR E MORTE NOTFORGETNOTFORGIVE (1999) DO PORTA ESTANDARTE CARLOTA LAGIDO CHRISTOPH RILKE Janelão Sala Bernardo Sassetti sábado, 21h30; domingo 17h Duração: 25 min. A classificar pela CCE; €7

(2018)

MARIA DUARTE E JOÃO RODRIGUES Sala Luis Miguel Cintra (palco) sábado e domingo, 18h30 Duração: 1h. A classificar pela CCE; €7

Conceção e Interpretação: Carlota Lagido

10 e 11 novembro

13 e 14 novembro

HAIKUS

A GRANDE SOMBRA LOIRA

SÓNIA BAPTISTA

TIAGO BARBOSA

Sala Bernardo Sassetti quarta e quinta, 21h Duração: 50 min. A classificar pela CCE; €7

Sala Bernardo Sassetti sábado e domingo, 21h Duração: 1h20 A classificar pela CCE; €7

Conceção, Escrita e Interpretação: Sónia Baptista; Vídeo: Rui Ribeiro; Desenho de luz: Pedro Machado; Apoio técnico (2021): Raquel Melgue; Produção: Bomba Suicida; Coprodução: Danças na Cidade

Texto: Florbela Espanca (Sonetos); Encenação, Dramaturgia e Interpretação: Tiago Barbosa; Assistência pontual: Nuno Gil e Vera Mantero; Adereços: Guilherme Garrido e Tiago Barbosa; Luz: Maria Antonia Blanquer e Nuno Gil; Residências: ZDB- Negócio, ON’OFF – Residências Sweet & Tender Collaborations (Guimarães 2012), Centro de Criação de Candoso, Demimonde, Espaço Sou; Agradecimentos: Ana Chhaganlal, Box Management Artístico, António Pedro Lopes, Carla Carreira, Cláudio da Silva, Félix Lozano, Flávia Gusmão, Helena e Rui Donas, Isabel Moura, João Nuno Barbosa, Maria Joana Figueiredo, Martim Pedroso, Miguel Moreira, Pedro Pires, Rita Almiro, Vânia Rovisco; Coprodução: ZDB / Negócio

(2002)

(2013)

13 e 14 novembro

INTERIOR (2004)

RITA SÓ E MÓNICA CALLE Sub-palco Sala Luis Miguel Cintra sábado e domingo, 19h e 20h30 Duração: 1h. A classificar pela CCE; €7

conversas 14 novembro

CONVERSA COM ARTISTAS E PUBLICAÇÃO

Espetáculo de: Rita Só e Mónica Calle

Sala Luis Miguel Cintra domingo, 16h Entrada livre sujeita à lotação da sala, com levantamento prévio de bilhetes

Encenação e interpretação: Maria Duarte; Conceção plástica: João Rodrigues; Tradução: Bruno C. Duarte; Agradecimentos: Ana Rita Osório, Carolina Duarte, Paulo Pranto, João Grosso, José Leite e Lúcia Pires

Com: Miguel Bonneville, Carlota Lagido, Maria Duarte e João Rodrigues, Odete, Rita Só e Mónica Calle, Sónia Baptista, Tiago Barbosa e Tiago Vieira

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30 outubro a 14 novembro 2021 teatro / dança

RECUPERAR O CORPO MIGUEL BONNEVILLE Sala Luis Miguel Cintra Sala Mário Viegas Sala Bernardo Sassetti A classificar pela CCE; €7 30 e 31 outubro

JULIETA BEBE UMA CERVEJA NO INFERNO (2018) TIAGO VIEIRA

10 e 11 novembro

HAIKUS (2002) SÓNIA BAPTISTA

13 e 14 novembro

6 e 7 novembro

INTERIOR (2004)

MARIA DUARTE E JOÃO RODRIGUES ANITA ESCORRE BRANCO (2018) ODETE NOTFORGETNOTFORGIVE (1999) CARLOTA LAGIDO

TIAGO BARBOSA

A BALADA DE AMOR E MORTE DO PORTA ESTANDARTE CHRISTOPH RILKE (2018)

RITA SÓ E MÓNICA CALLE

A GRANDE SOMBRA LOIRA (2013) 14 novembro

CONVERSA COM ARTISTAS E PUBLICAÇÃO

Direção do Projeto: Miguel Bonneville; Direção Técnica: Nuno Patinho; Textos: Pedro Arrifano; Design/Publicação: Ilhas; Produção Executiva: Carina Lourenço; Apoio: Direção Geral das Artes e Câmara Municipal de Lisboa Coprodução: Teatro do Silêncio e São Luiz Teatro Municipal

Direção Artística Aida Tavares Direção Executiva Ana Rita Osório Assistente da Direção Artística Tiza Gonçalves Adjunta Direção Executiva Margarida Pacheco Secretária de Direção Soraia Amarelinho Direção de Comunicação Elsa Barão Comunicação Ana Ferreira, Gabriela Lourenço, Nuno Santos Mediação de Públicos Téo Pitella Direção de Produção Mafalda Santos Produção Executiva Andreia Luís, Catarina Ferreira, Marta Azenha, Tiago Antunes Direção Técnica Hernâni Saúde Adjunto da Direção Técnica João Nunes Produção Técnica Margarida Sousa Dias Iluminação Carlos Tiago, Cláudio Marto, Ricardo Campos, Sérgio Joaquim Maquinaria António Palma, Miguel Rocha, Vasco Ferreira, Vítor Madeira Som João Caldeira, Gonçalo Sousa, Nuno Saias, Ricardo Fernandes, Rui Lopes Operação Vídeo João Van Zelst Manutenção e Segurança Ricardo Joaquim Coordenação da Direção de Cena Marta Pedroso Direção de Cena Maria Tavora, Sara Garrinhas Assistente da Direção de Cena Ana Cristina Lucas Camareira Rita Talina Bilheteira Cláudio de Castro, Cristina Santos, Diana Bento

teatrosaoluiz.pt


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