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TEATRO/ESTREIA

28 OUTUBRO A 8 NOVEMBRO 2020

M/12

© Filipe Andrade

AUÉÉÉU - TEATRO

TEATROSAOLUIZ.PT


Dois textos a propósito deste espetáculo

Texto-brinquedo

infração por coaching, cometida por Williams e o seu treinador Patrick Moratoglou. Esta infração acontece quando um atleta recebe instruções do treinador. No ténis, o treinador só pode dirigir-se ao atleta para o motivar; são proibidas todas e quaisquer indicações técnico-tácticas, mesmo que por gestos. Apesar de os árbitros nem sempre detetarem este tipo de infração ou mesmo quando se apercebem dela, não punirem o jogador, no calor dessa noite de verão, Carlos Ramos admoestou a campeã. Ouve-se no microfone: “Mrs Williams has been given a warning by coaching violation” (“A Senhora Williams recebeu uma advertência por receber uma instrução do treinador”). Depois desta frase seguiu-se um diálogo pouco amigável entre ambos. Williams disse que Ramos estava a mentir, o que lhe valeu uma segunda advertência e a consequente atribuição de um ponto sem disputa à adversária, neste caso, Naomi Osaka. O jogo prosseguiu, mas para Serena Williams o árbitro português roubou-lhe aquele ponto. Mais tarde as reações são tremendas e a notícia correu mundo. Muitas vozes surgiram a criticar a atitude do árbitro, lançando um debate intenso sobre os direitos das mulheres e a forma como se sentem descriminadas em comparação com os atletas do circuito masculino. Outros acusaram a atleta de desonestidade e obstinação face a uma infração que “todos viram”. Serena Williams perdeu por 6-2 / 6-4, e detém o record de vitórias daquele torneio - 6.

Uma cadeira assente numa estrutura metálica semelhante a um escadote. Uma cadeira de juíz-árbitro de ténis. Daquela posição, o árbitro obtém uma visão privilegiada, é ele o mais apto para decidir se uma bola toca o solo dentro ou fora das linhas de jogo. Raramente descem ao terreno. Mas podem fazê-lo sempre que um dos atletas, por exemplo, contesta a decisão de um juiz de linha, que está ao nível dos jogadores, muito perto deles. Num Grand Slam, prova máxima do ténis, chegam a ser onze juízes-de-linha. Há regras para tudo no ténis. E tudo no ténis é fiscalizado ao pormenor. A cadeira usada em palco, cedida pelo Clube de Ténis do Estoril, foi a cadeira onde se sentou, pela primeira vez, como árbitro profissional, o português Carlos Ramos, um dos melhores do mundo da atualidade. Ele foi o primeiro árbitro estrangeiro a arbitrar uma final do torneio mais antigo do mundo, o Grand Slam de Wimbledon, e é o único árbitro-de-cadeira do mundo a arbitrar as quatro finais do Grand Slam (Wimbledon, Roland Garros, Australian Open, US Open) e a final masculina dos Jogos Olímpicos de 2016, no Brasil. No dia 9 de setembro de 2018, em Flushing Medows, durante a final do quadro feminino do US Open, Carlos Ramos foi acusado, pela lendária Serena Williams, de ser “mentiroso” e “ladrão”. Em causa estaria a alegada 2


Tempo

nós online? Não se trata de fazer julgamentos, para isso há entidades competentes para o fazerem. Uma comissão de inquérito? Uma world wide web comissão de inquérito, poderia ser a forma para se apurar verdades e mentiras. Se bem que a legislação na rede não seja a mesma da que regula a vida real. Teremos de nos colocar esta pergunta: qual vida real? Os Irvings, Elmyrs e os Beltracchis já existiam fora do virtual. A internet, denominação mais comum, era uma pequena célula.

Os diários eram pequenos livros de confissões. Eram folhas onde, maioritariamente, raparigas na préadolescência partilhavam os seus segredos mais íntimos. Partilhavam, num sentido estreito, com as linhas e a caneta. Todos esses pequenos diários eram acompanhados de aloquetes. Prenúncio de algo precioso, não partilhável. No fundo, eram um lugar de encontro com o eu, um não lugar de liberdade e mistério. Joana, após uma aula de geometria descritiva partilha com Beatriz o seu diário. O diário, no entanto, manteve-se para Beatriz e Joana uma memória da adolescência. Quero deixar claro que estas duas personagens são ficcionais, não se trata de uma história baseada em factos reais. Beatriz e Joana eram pequenas autoras, sem o saberem, anónimas. Gosto de pensar que elas despertaram a vontade de se tornarem escritoras. Os diários transformaram-se em pó; talvez vivam numa arrecadação, ou num lixo de cor azul reciclável ou simplesmente perdidos no tempo. Os diários mudaram bruscamente com o tempo, tornaram-se em enormes redes sociais; lugares onde acontecimentos, memórias, se tornam partilháveis no imediato, num clique supersónico. Os cadeados abriram-se, as linhas dos diários desvaneceram-se. O eu migrou e já não existe eu. Não existe eu, nem ser ou pertença de ser. Ser ou não ser, eis a questão. Mas que seres ou não seres seremos

Apurar verdades e mentiras. Deus, o virtual, o real ou o “quem é quem” são territórios bastante pantanosos. São linhas muitos estreitas, muito semelhantes às de um caderno de música. Mas muitas vezes as linhas, ou o traço característico, são o que diferenciam um bom pintor de um mau pintor. Será? Elmyr mentia com o pincel, Irving com a caneta. Alguém fala por mim? Deus? Porque é que eu não posso dizer o que quero dizer? Tudo aquilo que eu digo foi-me dado. Declaro também que se alguém disser que fui eu que escrevi isto não se preocupe, é provisório. Escreveu Joana no seu diário. No entanto Joana e Beatriz vivem fora dos seus diários. Serão ainda amigas? Há quem diga que sim, há quem diga que não. Em que se tornaram? A nossa capacidade de imaginação é o nosso terreno mais fértil.

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Caríssimas senhoras e senhores do público, apelamos à vossa ajuda: ao momento presente, um outro espetáculo denominado F, com a mesma assinatura que este, está a ser apresentado noutra sala desta cidade. É necessário alertar publicamente para o esquema ilícito e de má fé que os restantes ex-membros da companhia lamentavelmente decidiram levar a cabo, sem qualquer tipo de autorização ou consentimento da nossa parte, vendendo este espetáculo ao Teatro Nacional Dona Maria II sob a nossa assinatura. Esta atitude condenável e de contornos perversos levanta questões sobre os limites éticos e filosóficos da autoria, sobre a verdade, autenticidade e identidade, sobre as ratoeiras políticas do mercado da arte, sobre os argumentos teológicos da criação como ato original.

Teatro / Estreia 28 outubro a 8 novembro 2020

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AUÉÉÉU – TEATRO Sala Mário Viegas Quarta a sábado, 19h30; domingo 17h30 Duração: 1h40 aprox. M/12 €12 com descontos Criação e Texto: auéééu - Teatro; Com: Joana Manaças, Jean Louis Silva, Miguel Cunha, Beatriz Brás, Filipe Velez, João Santos, Sérgio Coragem; Produção: auéééu - Teatro; Residência de coprodução: O Espaço do Tempo; Residência de produção: Largo de Residências; Cartaz: Filipe Andrade; Desenho de luz e vídeo: João Cachulo; Cenografia: auéééu - Teatro; Construção de cenografia: João Dourado; Apoio à criação: Joana Silva; Participação (vídeo): Siegfried Stüber, Aida Tavares, Tiago Rodrigues; Apoio à pesquisa (Inúteis Conversas): David Antunes e Francisco Luís Parreira; Apoios: AGECOP / SPA, Clube de Ténis do Estoril, Ginásio Clube Português, Marcial ArtSports Coprodução: Teatro Nacional D. Maria II e São Luiz Teatro Municipal Agradecimentos: Tiago Durão, José Brás, Raquel Matos, Livraria Ferin, Vítor Pinto da Fonseca, TransboavistaVPFArtEdifício, Isabel Teles de Menezes, Ana Vidigal, Maria Teresa Gonçalves, Pedro Faro, Fernando Roussado, Patrícia Portela, José Maria Vieira Mendes, António Feijó, Aurora Pinho, Gonçalo M. Tavares, Luís Miguel Cintra

Direção Artística Aida Tavares Direção Executiva Ana Rita Osório Programação Mais Novos Susana Duarte Assistente da Direção Artística Tiza Gonçalves Adjunta Direção Executiva Margarida Pacheco Secretária de Direção Soraia Amarelinho Direção de Comunicação Elsa Barão Comunicação Ana Ferreira, Gabriela Lourenço, Nuno Santos Direção de Produção Mafalda Santos Produção Executiva Andreia Luís, Catarina Ferreira, Tiago Antunes Direção Técnica Hernâni Saúde Adjunto da Direção Técnica João Nunes Produção Técnica Margarida Sousa Dias Iluminação Carlos Tiago, Ricardo Campos, Tiago Pedro, Sérgio Joaquim Maquinaria António Palma, Miguel Rocha, Vasco Ferreira, Vítor Madeira Som João Caldeira, Gonçalo Sousa, Nuno Saias, Ricardo Fernandes, Rui Lopes Operação Vídeo João Van Zelst Manutenção e Segurança Ricardo Joaquim Coordenação da Direção de Cena Marta Pedroso Direção de Cena Maria Tavora, Sara Garrinhas Assistente da Direção de Cena Ana Cristina Lucas Camareira Rita Talina (TBA) Bilheteira Cristina Santos, Diana Bento, Renato Botão

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