Bruta [TRECHO]

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adĂŠlia danelli



Edição Themis Lima e Aureliano Medeiros Revisão Andrea Paulino Fotografias Pedro Andrade Projeto gráfico Themis Lima Nesta edição, respeitou-se o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Catalogação na Publicação (CIP). D185b Danielli, Adélia. Bruta. / Adélia Danielli. - Natal, RN: Tribo, 2016. ISBN 978-85-67781-12-9 1. Literatura brasileira. 2. Poesia. I. Título. RN/TRIBO/HTLS

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Dedico a mainha e painho, Cleo e Joca. E a todas as mulheres, brutas. "quando dói, grito ai, quando é bom, fico bruta. As sensibilidades sem governo". Adélia Prado "sou todas elas. Escrever me fez suportar todo incêndio toda quimera". Marize Castro "não quero esmeraldas nem diamentes meu fetiche é ser bruta". Marina Rabelo


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prefácio

déa paulino

Simples e preciso, sem excessos: Bruta. O título remete à dureza poética que materializa a realidade áspera de quem procura a sobrevida em mergulhos feitos de escuro, mas é inevitável pensar também na quase-leveza tropicálica dos quereres - entre si, tão desiguais - registrados na pele e na carne urgente materializada nos registros do primeiro livro da Adélia. Sangue de ovários e útero, muito mais poderoso que o clichê do sangue nos olhos, a reunião de uma pequena parte da poesia parida pela experimentada poeta estreante, arredonda-se madrugada adentro e, pontuada pelos registros de imersões em tantas outras artes, arde na areia da praia de 8


onde costuma fugir quando o sol começa a imensar. Bruta e flor, os quereres dos poemas aqui reunidos passam do batom vermelho às feridas e fraturas expostas que podem, inesperadamente, desabrochar com a fúria de uma margarida amarela saltando do centro da fresta do asfalto em brasa. Infinitivamente pessoal, há, em Bruta, uma passagem pelo nosso tempo, que é breve, embora eterno e quase sempre cruel. Tal qual as rosas que carrega no ombro, com espinhos cravados entre o sonho e a pele, Adélia inscreve-se inteira em cada uma das páginas nas quais encontramos, além dela, espelhos do deslumbre doloroso que as palavras nos fazem passar. 9


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toda errada rasgada queimada enviesada ao avesso desgastada desbotada acabada manchada mais do que uma camiseta uma autobiografia (nĂŁo autorizada)

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não ignoro a natureza de sangrar ter ventre e enlouquecer em lua cheia faço-me altar e palco para ato de todo dia ser mulher

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sou dessas sou daquelas de quem falam mal que xingam que chutam as canelas incomodo não me calo não me conformo não engulo choro voz ou ato desfaço o papel que me mandaram interpretar respaldo em minha liberdade o desejo de não ser lapidada sou bruta mulher pedra flor e luta 15


o que estรก feito desfaรงo como um bordado

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que jรก acabado


morre num puxar de linha des-faço e morro centímetro a cen

tĂ­

metro

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com música americana começa o dia e pareço ter ares de boa moça pareço estar de acordo com o céu tímido nublado mas eu rumo querendo o mundo todo como ele é (para mim descabido) para anunciar tempestades

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há perfumes que me banham sem que eu peça é que absorvo delicadezas

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minha rebeldia nunca foi declarada nĂŁo queria ser do contra sĂł queria ser amada

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de plรกstico nem as flores carrego minhas rosas nos ombros

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eu sou o surto de Piaf pela morte de Marcel a angústia de Elena e o palco para sempre vazio sou o desejo do esquecimento de uma mente sem lembranças

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a Garota Interrompida em Paris, Texas o amor em coma que nรฃo despertou

As Horas de uma loba e duas mulheres a necessidade da escrita o Nome Prรณprio o ventilador do Palhaรงo e a esperanรงa nas Medianeras

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