Apostila de soteriologia TPT

Page 1

SOTERiologia

Prof.ยบ Lucas Roberto

Facebook.com/TeologiaparaTodostt


Sumário Unidade 1 – Deus e a queda ................................................. 01 -

Introdução O Éden A Queda A Justiça de Deus A Salvação no Antigo e Novo Testamento

Unidade 2 – A cruz ............................................................... 06 -

A justiça divina Duplo castigo da cruz Propiciação, Expiação, Redenção e Reconciliação A eficácia da morte de Cristo

Unidade 3 – Novo Nascimento ................................................12 - Nascemos mortos - Chamado externo e Chamado eficaz - Graça e Fé

Unidade 4 – Ordo Salutis ...................................................... 21 -

As Alianças A corrente de Ouro Eleição Chamado externo Regeneração (chamado interno) Conversão Justificação Adoção Santificação Perseverança Glorificação


Unidade 1 – Deus e a queda Introdução Seja bem-vindo ao nosso estudo de soteriologia. Antes de iniciarmos, falaremos um pouco dessa área da teologia. A palavra soteriologia é constituída de dois termos gregos: salvação + conhecimento. Ou seja, nosso foco será o estudo da salvação, apesentada na Bíblia. As Escrituras falam da salvação em mais de uma maneira. Estamos acostumados a usar a palavra salvação ou falarmos em “ser salvo” no sentido de ser redimido por Deus para a eternidade. Num sentido, a grande calamidade da qual somos salvos é Deus mesmo; ou seja, somos salvos de ter de encaráLo em sua ira no dia do juízo. Deus é, ao mesmo tempo, o Salvador e aquele de quem somos salvos. Para compreendermos por que somos salvos da ira de Deus, precisamos voltar ao início de tudo, no jardim do Éden. O Éden Nos dois primeiros capítulos de Gênesis, Moisés nos conta que Deus criou todas as coisas em 6 dias e no sétimo Ele descansou. No sexto dia Adão e Eva são criados à imagem e semelhança de Deus. Tal conceito de imagem e semelhança, integra todas as partes do homem: ser, senso moral de certo e errado, as faculdades mentais (o processo de raciocínio lógico), e o papel do homem no mundo, estando acima de toda a criação, cuidando dela para a glória de Deus. Colocados num jardim plantado por Deus, chamado de Éden (que significa planície), Deus realiza um pacto de obras com o casal humano, se eles não comessem o fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal, estariam sempre na presença de Deus e viveriam eternamente. Porém, influenciada pela serpente, Eva desobedece a Deus comendo do fruto e o dando a seu marido, que também o come. A partir deste ato de desobediência, há o que chamamos de “queda” da humanidade. A Queda Quando Adão e Eva pecam contra Deus, eles morrem de duas formas: Espiritualmente: Esta morte foi instantânea, onde eles foram separados de Deus e tornaram-se inimigos de Deus (Rm 3:23; Ef 2:1-3). Fisicamente: Não foi instantâneo, mas a estrutura do corpo humano foi mudada, pois passou a haver dor, sofrimento e, por fim, morte corporal. Nesta queda, a imagem de Deus, presente no homem, foi distorcida (não totalmente). O pecado corrompeu todas as áreas humanas: sentimentos, pensamentos, moralidade, espiritualidade etc. O homem deixou de ser humano e se afastou de Deus. Durante seu tempo de “provação” no jardim, Adão tinha tanto a capacidade de pecar, como a capacidade de não pecar. No entanto, faltava a Adão o estado exaltado da incapacidade de pecar que Deus desfruta. A incapacidade de Deus de pecar está baseada não em uma falta de capacidade interior de fazer o que Ele quer, mas no fato de que Deus não tem nenhum

1


desejo interior para pecar. Visto que o desejo para pecar é totalmente ausente em Deus, não há razão para Ele escolher pecar. Antes da queda, Adão não tinha a perfeição moral de Deus, mas também não era escravo do pecado. Porém, ele escolheu exercer a capacidade de pecar e, assim, mergulhou a raça humana em ruína, por ser o representante legal (no sentido de leis) dela. A queda não afetou apenas Adão e sua esposa, mas toda essa deformação da imagem de Deus, passou para seus descendentes. A humanidade está debaixo da ira justa de Deus, pois todas as obras do homem se resumem em idolatria e afronta a Deus. O homem teve todo o seu ser corrompido. Essa corrupção humana é também chamada de “pecado original”, não se referindo ao pecado feito por Adão, mas ao estado caído que nascemos. Pecamos porque nascemos corruptos e não o contrário. O apóstolo Paulo retrata o estado em que a humanidade se encontra: “Como está escrito: Não há um justo, nem um sequer. Não há ninguém que entenda; não há ninguém que busque a Deus. Todos se extraviaram, e juntamente se fizeram inúteis. Não há quem faça o bem, não há nem um só.” (Rm 3:10-12). Isto não significa que não podemos fazer qualquer coisa que se conforme exteriormente com a lei de Deus. Podemos guardar externamente a lei. Como ilustração, imagine um homem que se alegra em dirigir seu carro a 90 km/h. Seu carro tem um bom desempenho nessa velocidade. E ele se sente seguro e confortável, mesmo quando outros o ultrapassam na rodovia, indo a mais de 100 km/h. Um dia, um policial o manda encostar e lhe dá um elogio por dirigir com segurança. O homem obtém uma compensação por sua obediência. O policial segue o seu caminho, e o homem volta à rodovia. Eventualmente, ele dirige por uma área escolar em que o limite de velocidade é 30 km/h, mas ele continua dirigindo a 90 km/h, porque esta é a velocidade em que ele ama dirigir. Seu desejo nunca foi obedecer à lei. O fato de que ele fez isso na rodovia foi uma circunstância fortuita. Isso é o que os teólogos chamam de “virtude cívica”. Para uma ação ser considerada boa por Deus, ela tem de satisfazer duas exigências primárias. A primeira é que a ação tem de corresponder exteriormente com as exigências da lei. A segunda, a motivação interior para a ação tem de proceder de um coração que é totalmente disposto para a glória de Deus. É a segunda dimensão, a dimensão espiritual de motivo, que impede muitas de nossas obras de serem avaliadas como boas. Uma pessoa de corrupção profunda pode fazer atos que se conformam exteriormente com as exigências da lei. Todavia, a motivação interior é de interesse egoísta um motivo que não está em harmonia com o Grande Mandamento: “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento.” (Mt 22:37). Nossos atos exteriores podem corresponder às exigências exteriores da lei, enquanto, ao mesmo tempo, nosso coração está muito longe de Deus. No que diz respeito a fazer escolhas, o homem caído ainda tem a capacidade natural e as faculdades necessárias para fazer escolhas morais. O homem ainda pode pensar, sentir e desejar. Todo o equipamento necessário para fazer

2


escolhas permanece. O que o homem caído não tem é a disposição moral, o desejo ou a inclinação para a retidão. Em palavras simples, o homem ainda tem a capacidade de escolher o que quer, mas não tem o desejo pela verdadeira retidão. Ele é naturalmente livre, mas é moralmente escravizado a seus próprios desejos corruptos e ímpios. O homem ainda é livre para escolher, mas, entregue a si mesmo, o homem nunca escolherá a retidão, exatamente porque ele não a deseja. A Justiça de Deus A justiça de Deus, no momento da queda, exigiu a morte e a destruição de Adão e Eva, devido seu pecado de desobediência e quebra da aliança. Mas Deus já sabia que a queda ocorreria, por isso, antes de toda a Criação, houve um acordo entre a Santíssima Trindade de que o Filho, a segunda pessoa da divindade, viria em um tempo determinado e tomaria sobre Si a nossa punição. Em Gênesis 3:15, durante a maldição que Deus profere sobre a serpente, surge uma promessa de esperança, que é chamada de protoevangelho (ou primeiroevangelho): “E porei inimizade entre ti (serpente) e a mulher, e entre a tua semente (da serpente) e a sua semente (da mulher); esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar.”. Temos a primeira promessa sobre a vinda de Cristo, como nosso substituto, que iria ferir a cabeça da serpente. A partir de então, visto que o pacto de obras havia sido quebrado, Deus institui um novo pacto, o pacto da graça, onde Ele propõe reconciliar a Si mesmo com os homens. Adão e Eva, após pecarem, percebem que estão nus e fazem roupas para si com folhas de figueira (Gn 3:7); mas o próprio Deus lhes dá roupas feitas de peles de animal (Gn 3:21), sendo este o primeiro sacrifício, mostrando que o salário do pecado é a morte (Rm 6:23) e que eles precisam de um substituto, que os veste com roupas de justiça. A Salvação no Antigo e Novo Testamento A partir de então, Deus, durante todo o Antigo Testamento, anuncia de diversas formas que haveria um tempo em que o substituto, o segundo Adão, viria para restaurar o relacionamento de Deus e os homens, rompido pelo pecado. Os sacrifícios são instituídos para mostrar que haveria um tempo em que o perfeito sacrifício – o cordeiro de Deus – viria e satisfaria a justiça e a ira de Deus, de uma vez por todas. Todo o processo cerimonial, dado a Moisés, apontava para algo maior do que ele próprio. Em Jesus de Nazaré, se concretiza a promessa de redenção. No Antigo Testamento, a palavra correspondente à salvação, yasha, é empregada num sentido geral, isto é, como o ato e o efeito de tirar e livrar do perigo ou ruína, tanto natural, como política ou espiritual. Isto é evidenciado na salvação do Egito (Ex 14:13; 15:2), da Babilônia (Is 46:13; 52:10-11), de adversários (Dt 20:4; SI 106:10), da opressão (Jz 3:31), da decadência social (Os 1:7), implicando assim em benção e misericórdia divinas. Também podemos destacar a salvação messiânica, que engloba o livramento político, nacional e

3


espiritual (2 Sm 7:4-17; Jr 31:27-40; Ez 40:1-48; Jl 3; Zc 13, 14; Lc 1:69, 71, 77). Vemos que Deus escolhe para si um povo, Israel, para que, através dele, Deus fosse revelado aos demais povos. Porém, vemos que a nação de Israel falhou miseravelmente, demonstrando que o coração do homem está tão cego para a luz de Deus que, nem mesmo vendo milagres fenomenais, consegue crer e cumprir os mandamentos do Senhor. Em meio à idolatria de Israel e correção de Deus, novas promessas são feitas da parte de Deus, indicando um tempo em que Ele trocaria os corações (Ez 36:26), estendendo sua salvação aos gentios (não-judeus) (Is 11:10; 65:1). No Novo Testamento, soterion (empregado quatro vezes) e soteria (empregado 45 vezes) incluem a ideia de salvação de uma ameaça séria ou perigo mortal, assim como do poder e dos efeitos do pecado. O sentido geral, como no Antigo Testamento, é preservar ou livrar de perigos ou aflições: da doença, da possessão demoníaca (Mt 9:22; Lc 8:36; At 4:9) e da morte (Mt 14:30; Jo 12:27; At 27:20; Hb 5:7). Esta palavra também aponta para a salvação messiânica de Israel (Lc 1:69-77; At 1:6; Rm 11:26-27). Por isso, em um sentido teológico, salvação significa liberdade tanto dos efeitos quanto das consequências do pecado, sendo sempre representada como resultado da livre graça de Deus. Vemos que o propósito da Lei não era um meio para se salvar, mediante obras, mas desmascarar o coração corrupto do homem, que não pode fazer nada além de pecar contra a santidade de Deus. Em Cristo são cumpridas as Leis (pois Ele foi o único capaz de obedecê-las) e as cerimônias perderam seu valor, pois eram apenas sombras que apontavam para Cristo. Conceitos do Antigo Testamento, como: “redenção”, “propiciação” e “expiação”, “justificação”, e “conversão”; são ampliados no Novo, de forma que vemos um cumprimento total em Jesus, mediante a cruz. A salvação individual só pode ser recebida por meio da fé no evangelho de Jesus Cristo, que concede ao pecador as riquezas da graça divina. A partir do significado da palavra (com suas variações), podemos, então, falar dos três tempos da salvação: Em primeiro lugar, a palavra remete-nos ao passado — fomos salvos (2 Tm 1:8-9). Quando confiamos em Jesus Cristo como nosso único salvador, somos juridicamente perdoados, de uma vez por todas (Rm 5:9; Ef 1:7). A nossa natureza humana é tirada da corrupção hereditária e renovada com o novo nascimento em Cristo por meio do Espirito. Este significado é encontrado especialmente, mas não de forma exclusiva, nos escritos de Paulo. Em segundo lugar, a palavra lembra-nos de nossa presente posição — estamos sendo salvos (Tg 1:21; 1 Pe 1:9). Agora podemos experimentar, em parte, a libertação do poder do pecado, refletindo a realidade e qualidade da nova vida em Cristo, em submissão ao Espirito Santo e a Palavra de Deus (Lc 9:23; Rm 5:10; Gl 5:16, 25; Fp 2:12-13). Este significado é encontrado especialmente nos evangelhos sinóticos, e nas epístolas de Tiago, Hebreus, Pedro e Judas. E, em terceiro lugar, a palavra remete-nos ao futuro — seremos salvos (Rm 13:11). Antecipamos a libertação completa de nosso ser dos efeitos do pecado e a nossa glorificação com Cristo (Fp 3:20; Gl 1:4; 1 Pe 1:5; 3:20-21).

4


É importante compreendermos a relação entre Lei e Graça. A Escritura é unificada, uma vez que única é a Palavra de Deus, único é o projeto salvífico de Deus e única a inspiração divina dos dois Testamentos. O Antigo Testamento prepara o Novo e o Novo dá cumprimento ao Antigo; os dois iluminam-se mutuamente. Segundo Lutero: “A lei descobre a doença; o evangelho dá o remédio”; Samuel Bolton diz: “Os homens não conheceriam a doçura de Cristo se não tivesse provado primeiro a amargura do pecado”; ainda Stephen Charnock ressalta: “A lei é o martelo que nos quebra; o evangelho é o óleo que nos cura”. Assim como temos dois sacramentos (meios físicos que simbolizam graças divinas que nos são dadas espiritualmente): batismo e ceia; Deus instituiu sacramentos no Antigo Testamento, apontando para a vinda do Messias e a salvação que Ele traria. Calvino fala a respeito disto, da seguinte forma: “Estes sacramentos, segundo as diversas épocas, têm sido diversos conforme à dispensação que o Senhor teve por bem mostrar aos homens de um ou outro modo. Ora, a Abraão e sua posteridade foi ordenada a circuncisão (Gn 17:10), à qual, mais tarde, foram pela lei mosaica acrescentados purificações, sacrifícios e outros ritos (Lv 1-15). Estes foram os sacramentos dos judeus até a vinda de Cristo; uma vez anulados esses, foram instituídos dois sacramentos, dos quais agora se serve a Igreja Cristã: o Batismo e a Ceia do Senhor. [...] Os sacramentos mosaicos visavam ao mesmo propósito que os nossos; a saber, encaminhavam os homens a Cristo e os levavam a Ele como que pela mão; ou, melhor, como imagens o representavam e projetavam para ser conhecido. Porque, [...] eles são como que selos com que são seladas as promessas de Deus; e é certo que nenhuma promessa de Deus se propôs aos homens senão em Cristo (2 Co 1:20). Portanto, para que os sacramentos nos proponham alguma promessa de Deus, é necessário que nos mostrem a Cristo. A isto se refere aquele modelo celeste do tabernáculo e do culto sob a lei que fora mostrado a Moisés no monte (Ex 25:9, 40; 26:30). Só há uma diferença entre esses sacramentos: aqueles prefiguravam a Cristo prometido, como fosse ainda esperado; estes o apresentam já outorgado e manifesto.” (Institutas da fé cristã – Livro IV – Cap 14 – João Calvino)

A questão é que o homem estava caído e precisava de redenção; Deus, sendo santo e justo, tinha de punir com Sua ira (o inferno) os pecadores, mas sendo misericordioso, Ele providenciou a cruz.

5


Unidade 2 – A cruz A cruz é o centro e o coração do cristianismo. Nela se encontra o cumprimento das promessas do passado, e a garantia das promessas futuras. Quando queremos dizer que um determinado assunto é de suma importância, dizemos que ele é “crucial”, este termo vem da palavra “cruz”, nos dando a dimensão da importância da cruz para o cristão. Muitas vezes somos simplistas sobre o que aconteceu com Jesus na cruz, durante aquelas 6 horas torturantes. Naquele madeiro não houve apenas o sofrimento físico, mas algo infinitamente maior, espiritualmente. Contas estavam sendo acertadas, e o Cordeiro de Deus estava sendo moído (Is 53:10). A justiça divina Para entendermos a cruz, é necessário que tenhamos em mente 3 atributos de Deus: santidade, justiça e amor. Os atributos de Deus não são isolados, mas cada um influencia o outro, por exemplo, o amor de Deus é um amor justo e santo, a santidade de Deus é justa e amorosa, e a justiça de Deus é santa e amorosa. Não há isolamento nem conflito entre os atributos. Assim que o pecado adentou na criação, por meio da desobediência do homem, ocorreu o rompimento de comunhão entre Deus e os homens, além disso toda a humanidade estava condenada ao inferno que é a ira de Deus sobre o pecador. Muitos não estão acostumados com a imagem de um Deus irado, e alguns até protestam dizendo que isso não é justo, pois não veem a gravidade do pecado como Deus o vê. Para exemplificarmos isso, pense num jovem, filho de um juiz ricaço, que é mimado, tendo tudo de mão beijada. Certa noite, após beber excessivamente e usar drogas, ele pega seu carro possante e sai pelas ruas da cidade desrespeitando sinalizações e chega a atropelar alguns pedestres, dentre eles uma mãe com um carrinho de bebê, os quais morrem na hora. Além disso, por estar tão drogado, ele vê uma moça de 16 anos e a força sexualmente, assassinando-a logo após. Ainda nessa madrugada, a polícia registra os crimes e o prende. No dia de seu julgamento, ele é acuso por cinco homicídios, além do estupro de menor seguido de homicídio. Para sua surpresa, o juiz que o julgará será seu próprio pai, que dá a sentença devida: pena de morte. Porém, ocorre algo estranho, assim que o juiz bate o martelo, ele desce de sua posição e se submete à sentença no lugar do filho; ou seja, ele seguiu o que a lei determinava, sendo justo, mas substituiu o réu, sendo misericordioso. Outro exemplo simples que podemos dar para mostrar que o ódio de Deus para com o pecado não contradiz seu amor e bondade. Uma pessoa que é considerada boa e amável deve, necessariamente, ter ódio e aversão a crimes hediondos, como pedofilia, infanticídio, agressão à mulher etc. Assim é Deus, por ser bom e amoroso, Ele tem de odiar o mal e o pecado. Deus não poderia deixar impune os pecados da humanidade, se não, Ele deixaria de ser Deus, pois seria injusto. Outra questão que muitos não compreendem é sobre as boas obras. Nos consideramos justos e santos, pois temos como padrão nosso vizinho, chefe ou algum criminoso. Não cometemos crimes hediondos, como matar, roubar nem

6


estuprar. A questão é que as leis de Deus não se resumem a isso. Mentir também é pecado, odiar, cobiçar, não amar a Deus de todo nosso ser, são pecados que, aparentemente, não são tão graves, mas para um Deus santo, que é tão puro de olhos, que não pode ver o mal (Hc 1:13), estas coisas são tão repulsivas quanto colocar fogo numa criança viva. Deus não pode aturar o mal. Nos tempos antes da vinda de Cristo, Deus institui o sacrifício de animais para mostrar que o salário do pecado é a morte (Rm 6:23) e que sem derramamento de sangue não há remissão (Hb 9:22). Porém, é impossível que o sangue dos touros e dos bodes tire os pecados (Hb 10:4), pois a justiça de Deus exige a morte do pecador (Ez 18:20). Este é o motivo de Jesus ser verdadeiro homem, pois apenas alguém da raça humana estava apto para satisfazer a justiça de Deus. Duplo castigo da cruz Na cruz, Cristo sofre dois castigos: o físico e o espiritual. Seu sofrimento físico se inicia no jardim do Getsêmani, onde, devido ao nível elevado de estresse, Jesus sua gotas de sangue. Após o julgamento forjado, Ele é açoitado até sua carne ficar dilacerada. Uma coroa feita de espinhos, com cerca de 30 cm, lhe é colocada, perfurando seu crânio. Mesmo com exaustão muscular e tendo grandes traumas em todo seu sistema nervoso, ainda é obrigado a carregar a parte horizontal da cruz – apesar do esforço de andar ereto, o peso da madeira somado ao choque produzido pela grande perda de sangue, é demais para Ele. Ele tropeça e cai. As lascas da madeira áspera rasgam a pele dilacerada e os músculos de seus ombros. Ele tenta se levantar, mas os músculos humanos já chegaram ao seu limite, entrando em colapso. O centurião, ansioso para realizar a crucificação, escolhe um observador norteafricano, Simão, um Cirineu, para carregar a cruz. Jesus segue ainda sangrando, com o suor frio de choque. A jornada de mais de 800 metros da fortaleza Antônia até Gólgota é então completada. O prisioneiro é despido - exceto por um pedaço de pano que era permitido aos judeus. Recusando beber vinho com mirra, que era um leve analgésico, Jesus tem seus pulsos perfurados por grandes pregos; após isso, seus pés são sobrepostos e um prego perfura os dois. Ao ser levantada a cruz, Jesus começa a escorregar, pois não há onde se apoiar, e isso lhe causa dificuldades para trazer ar aos pulmões (este é o propósito da crucificação, matar lentamente por asfixia). Enquanto Ele escorrega para baixo aos poucos, com mais peso nos cravos dos pulsos, a dor insuportável corre pelos dedos e para cima dos braços para explodir no cérebro. Quando Ele se empurra para cima para evitar este tormento de alongamento, Ele coloca seu peso inteiro no cravo que passa pelos pés. Novamente há a agonia queimando do cravo que rasga pelos nervos entre os ossos dos pés. Neste ponto, outro fenômeno ocorre. Enquanto os braços se cansam, grandes ondas de cãibras percorrem seus músculos, causando intensa dor. Com estas cãibras, vem a dificuldade de empurrar-se para cima. Pendurado por seus

7


braços, os músculos peitorais ficam paralisados, e o músculos entre as costas incapazes de agir. O ar pode ser sugado pelos pulmões, mas não pode ser solto. Jesus luta para se levantar a fim de fazer uma respiração. Finalmente, dióxido de carbono (CO2) é acumulado nos pulmões e no sangue, e as cãibras diminuem. Raramente, Ele é capaz de se levantar e expirar e inspirar o oxigênio vital. Ele passa horas de dor sem limite, ciclos de contorção, câimbras nas juntas, asfixia inconstante e parcial, intensa dor por causa das lascas enfiadas nos tecidos de suas costas dilaceradas, conforme ele se levanta contra o poste da cruz. Então outra dor agonizante começa. Uma profunda dor no peito, devido uma bolsa d’água se formar em volta de seu coração (a qual é rompida pela lança do soldado que a perfura, causando o jorrar de sangue e água, descrito em João 19:34). Agora está quase acabado - a perda de líquidos dos tecidos atinge um nível crítico - o coração comprimido se esforça para bombear o sangue grosso e pesado aos tecidos - os pulmões torturados tentam tomar pequenos golpes de ar. Os tecidos, marcados pela desidratação, mandam seus estímulos para o cérebro. O corpo de Jesus chega ao extremo, e Ele pode sentir o calafrio da morte passando sobre seu corpo. Vindo a óbito. Não podemos desmerecer este sofrimento extremo que o Senhor Jesus sofreu, mas não devemos pensar que este foi o maior ou o único castigo sofrido por Ele, pois muitos cristãos foram mortos por Seu nome, com mortes piores que a crucificação. O que torna o sofrimento de Cristo único e superior aos demais, são os sofrimentos espirituais. Seu sofrimento espiritual que causou o suor de sangue, no Getsêmani. Quando Jesus está orando, Ele faz um pedido peculiar, para que Deus, se possível, livrasse-O de beber do cálice. O “cálice” muitas vezes é símbolo da retribuição divina ou da ira de Deus. De tal copo, pessoas iníquas, cidades ou até povos e nações poderiam beber (Sl 11:6; 75:8; Is 51:17, 22; Jr 25:12-29; 51:7; Lm 4:21; Ap 14:9, 10; 16:19; 18:5-8). A figura é retirada das práticas de beber vinho no mundo antigo. Quando você produz vinho, ele vem em cerca de 16 graus GL, isto é, cerca de 15% de álcool. Pode variar um pouco. Mas não é um produto destilado, onde você pode controlar o teor alcoólico, é um processo de fermentação, então depende do açúcar, da temperatura, do tipo de barril, etc., mas é cerca de 16 graus GL. 15 % de álcool. No mundo antigo, era muito comum diluir o vinho na água mais ou menos uma parte para dez; uma parte de vinho para dez de água; e três para uma. Então a maioria dos vinhos de mesa que as pessoas bebiam no mundo antigo eram diluídos. Em Cristo, o vinho da ira de Deus é derramado em força total. Toda manifestação da ira de Deus que você já viu até agora… o exílio, por exemplo, pragas no Antigo Testamento, doenças, guerras, todas essas coisas que você viu como horríveis manifestações da ira de Deus, era a forma diluída. Agora sim a ira de Deus é derramada com força total sobre o Filho. Essa é a causa do grande temor de Jesus, que chegou no nível tão elevado de estresse a ponto de suar gotas de sangue.

8


Durante aquelas seis horas crucificado, Jesus sofria em Seu espírito as dores do inferno (que nada mais é do que a ira santa de Deus). Sobre Cristo, nossos pecados foram lançados e a ira de Deus, que era destinada aos pecados de Sua Igreja, foi derramada em Jesus. Era necessário que Ele fosse homem para poder receber nossos pecados - não que Ele tenha pecado, mas sofreu pelos nossos (2 Co 5:21). E era necessário Ele ser O Deus Eterno, para suportar o castigo eterno que era destinado à Igreja. Propiciação, Expiação, Redenção e Reconciliação Na teologia, usamos 4 termos para expressar os benefícios conquistados na cruz – embora seja impossível compreendermos exaustivamente Seu sacrifício. Propiciação: é tornar Deus propício ou favorável a nós. Quando Adão pecou, um abismo infinito foi posto entre Deus e os homens. Éramos por natureza filhos da ira de Deus (Ef 2:3), merecedores do castigo eterno. Mas, pelo sacrifício de Cristo, o favor de Deus nos alcança. A propiciação lida com a ira de Deus. Isso não significa que houve duas vontades entre Deus Pai e Deus Filho, onde o Pai estava irado e o Filho conseguiu acalmá-lo de Sua ira. Não. Ambos, o Pai e o Filho, providenciaram a propiciação. A famosa passagem de João 3:16 diz que o amor que Deus tem pelo mundo O levou a enviar Seu único Filho. Expiação: é o ato pelo qual o pecado é cancelado. É anulado. Apagado do registro. Deus não poderia simplesmente fingir que não houve pecados, pois Ele seria injusto e teria de deixar de ser Deus, o que é um absurdo. Assim como todo o crime deve ser punido devidamente, todo o pecado tem como consequência a morte. Tendo Cristo morrido, como substituto, em nosso lugar, a misericórdia de Deus nos alcança, pois Sua ira e justiça foram satisfeitas. A expiação lida com a culpa do pecado. Redenção: Em seu sentido mais básico, a redenção está relacionada a algum tipo de compra, uma transação comercial em que algo é comprado de outrem. O próprio Cristo faz referência à redenção de seu povo envolvendo um alto preço, ou seja, Seu próprio sangue. Na cruz, no fim de seu sofrimento, Ele clamou: “Está consumado” (Jo 19:30); este era um termo comercial, usado quando alguém fazia um pagamento final numa série de prestações, assim como poderíamos carimbar “Totalmente Pago” em uma fatura final. Intimamente relacionada ao aspecto de transação comercial, há a ideia de preço de uma noiva, do Antigo Testamento. O livro de Êxodo estabelece as normas e regulações para aqueles que entravam em casamento e para servos contratados. Para um homem ganhar a aprovação de casar, tinha de pagar um dote ao pai da noiva, principalmente para mostrar ao pai da noiva que tinha condições de sustentar uma esposa e filhos, que resultariam da união. Semelhantemente, quando alguém se vendia como escravo para quitar uma dívida, se trouxesse consigo esposa e filhos, quando chegasse o tempo de sua liberdade, poderia levar consigo a esposa e os filhos. Mas, se entrasse na

9


servidão como um homem solteiro, casasse com uma serva e tivesse filhos durante a servidão, não lhe era permitido levar a esposa e os filhos na ocasião de sua liberdade. A lei não tencionava ser cruel; tencionava garantir que o preço da noiva fosse pago. O significado teológico é que Cristo tem uma noiva – a Igreja – e o Novo Testamento, em seu ensino sobre a redenção, afirma que Cristo comprou sua noiva. Ele pagou o preço da noiva. De modo semelhante, Ele pagou um preço para redimir escravos. O apóstolo Paulo escreve: “Ou não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo, e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus.” (1 Co 6:19-20). O conceito de compra é central ao entendimento bíblico da redenção, lidando com a escravidão do pecado. Reconciliação: se trata do processo pela qual a comunhão entre Deus e o homem é restaurada. As escrituras relatam que essa comunhão foi quebrada e que os dois encontravam-se separados por causa da santidade de Deus e do pecado do homem. Através do sacrifício de Cristo, os pecados da humanidade são expiados e a ira de Deus é aplacada. O próprio Deus “nos reconciliou consigo mesmo por Jesus Cristo” (2 Co 5:18). A reconciliação lida com a separação de Deus. A eficácia da morte de Cristo Compreendido estes 4 pontos, precisamos fazer ainda mais uma observação a respeito da morte de Jesus. Espero que seja óbvio para você que a morte de Cristo tem poder suficiente para redimir TODA a humanidade. Porém a questão é: a cruz é eficaz para todos? Antes de responder precipitadamente, pense nas consequências de sua resposta. Se respondermos “sim”, caímos numa antiga heresia camada “universalismo” que diz que, no fim, Deus salvará todas as pessoas, não importando se são cristãos ou não; algo contrário à Bíblia (Mt 25:46; Jo 3:16, 36; 14:6; At 4:12; 1 Tm 2:5). Se a Bíblia diz que nem todos serão salvos e que haverá pessoas condenadas ao inferno, então temos de pensar: Cristo morreu por eles? Se Cristo tivesse morrido por eles, então Deus seria injusto por punir duas vezes o mesmo pecado (em Cristo, na cruz, e o pecador, no inferno eterno). Logo, concluímos que o sacrifício de Jesus é eficaz apenas para Sua Igreja, o povo que Ele comprou com Seu sangue e os chamou das trevas para a luz. (A “Igreja” que me refiro não é qualquer denominação ou congregação específica, por isso que ela está com “I” maiúsculo, pois se trata de todos os salvos, em todas as épocas, os quais são chamados de Igreja invisível, pois apenas Deus conhece os verdadeiros cristãos) Jesus não trouxe uma reconciliação potencial e condicional, uma possibilidade de obter salvação abrindo uma porta de misericórdia, para que quem cumprisse algum requisito exigido entrasse por ela, pois então a eficácia da morte de Cristo

10


dependeria inteiramente de nós, havendo a possibilidade de ninguém ser salvo; pelo contrário, Cristo nos reconciliou efetivamente e incondicionalmente (Rm 5:10; 11:6; 2 Co 5:18), nos comprou com Seu sangue, Seu sacrifício foi suficiente e totalmente eficaz. Vejamos 3 exemplos bíblicos: • “Eu sou o bom Pastor; o bom Pastor dá a sua vida pelas ovelhas. [...] Assim como o Pai me conhece a mim, também eu conheço o Pai, e dou a minha vida pelas ovelhas. [...] Mas vós não credes porque não sois das minhas ovelhas, como já vo-lo tenho dito. As minhas ovelhas ouvem a minha voz, e eu conheçoas, e elas me seguem; e dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de perecer, e ninguém as arrebatará da minha mão.” João 10:11, 15, 26-28 (leia a passagem completa para entender o contexto). Nesta passagem, Jesus se refere à Sua Igreja como “ovelhas” e afirma que dá Sua “vida pelas ovelhas”. Porém ele diz aos judeus, que O questionou ser Ele o Messias ou não, que eles não eram suas ovelhas, pois não criam n’Ele. Se eles não faziam parte das ovelhas de Cristo, e Ele morreu apenas pelas ovelhas, logo Ele não morreu pelos demais incrédulos. •

Na oração sacerdotal de Jesus, antes de Sua crucificação, Ele intercede exclusivamente por aqueles que creriam e se beneficiariam de Sua morte, a Igreja: “Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus. E não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela tua palavra hão de crer em mim.” João 17:9, 20 (leia a passagem completa para entender o contexto).

Paulo, instruindo os maridos diz: “Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela” Efésios 5:25 (leia a passagem completa para entender o contexto). Perceba que ele afirma ter Cristo se entregado por Sua Igreja, e não pelo mundo todo, incluindo os ímpios. Há dezenas de passagens que expressam a mesma questão. Caso queira saber mais o que a Bíblia diz a respeito, deixarei algumas referências para consulta posterior: Is 53:11-12; Mt 1:21; Mt 20:28; Mt 26:28; Mc 14:24; Jo 3:16-18; At 18:9-10; At 20:28; Rm 4:25; Rm 5:8; Rm 8:32-34; 1Co 2:12; Gl 2:20; Tt 2:1314; Hb 2:10-14; Hb 5:9; Hb 9:28; Hb 10:10-14; 1Jo 4:9-10; Ap 1:5; Ap 5:9. Palavras como “mundo” e “todos”, expressões como “cada um” e “todo homem” nem sempre significam, nas Escrituras, todos os membros da raça humana. O que tais passagens ensinam é que Cristo morreu por todos os homens sem distinção, não por todos os homens sem exceção. Em outras palavras, tais passagens ensinam que Cristo morreu por todos os tipos de homens (1 Tm 2:1-6), por todos que estão n’Ele (1 Co 15:22), ou pelo “mundo” de seu povo, isto é, pelos salvos pertencentes a todas as nações (compare Jo 3:16 e 17:9). Sendo assim, concluímos que: o sacrifício de Cristo é suficiente para todos, mas eficaz apenas para a Igreja.

11


Unidade 3 – Novo Nascimento “Jesus respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus. O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito. Não te maravilhes de te ter dito: Necessário vos é nascer de novo.” João 3:3, 6, 7 Vimos na unidade anterior o significado da morte de Cristo e os benefícios conquistados nela, mas como eles se aplicam a nós? O novo nascimento também é chamado de regeneração, que significa gerar novamente. A passagem citada acima nos conta de um episódio interessante que aconteceu com Jesus, um homem bem-conceituado, estudante das Escrituras (o Antigo Testamento), vai ao encontro de Jesus durante a noite. Nicodemos inicia o diálogo elogiando a Cristo, reconhecendo que Deus era com Ele; Jesus, porém, diz, sem rodeios, que Nicodemos precisava nascer de novo para ver o reino de Deus. Entenda que Jesus estava falando com um homem que estudou as Escrituras por toda a sua vida. Se víssemos Nicodemos, teríamos certeza de que ele era um cristão exemplar; mas Jesus viu o coração dele. Por fora havia ar de piedade, porém por dentro existia um inimigo de Deus que precisava ser regenerado. Nascemos mortos As Escrituras nos diz que através da desobediência de nossos primeiros pais (Adão e Eva), seduzidos por Satanás (Gn 3:13; 2 Co 11:3), o pecado entrou no mundo rompendo a comunhão com Deus (Gn 3:6-8; Ec 7:29; Rm 3:23) e corrompendo completamente todas as virtudes do corpo e da alma (Tt 1:15; Gn 6:5; Jr 17:9; Rm 3:10-18), inclinando o coração humano à toda sorte de males, tornando-os mortos em seus pecados (Gn 2:17; Ef 2:1). Com a queda, toda humanidade estava sendo representada por Adão e com ele caiu, sendo assim, toda sua descendência nasce com o pecado original (Rm 5:12, 15-19; 1Co 15:21,22,49; Sl 51:5; Gn 5:3; Jó 14:4; Jó 15:14), logo não há mais vontade de se fazer o bem, muito menos buscar a Deus, pois está morta moralmente e é, por natureza, filho da ira de Deus (Rm 3:10-12; Rm 5:6; Rm 8:7; Ef 2:1-3; Cl 1:21). Todas as transgressões que procedem do coração humano são causadas pelo fato do homem estar inteiramente inclinado a todo tipo de mal (pois está separado da comunhão com Deus) (Gn 6:5; Gn 8:21; Rm 3:10-12, 23); tais pecados – tanto o original quanto os cometidos durante a vida – são transgressões contra a santidade de Deus, os quais o homem, justamente, é culpado (1 Jo 3:4; Rm 2:15; Rm 3:9,19); como consequência desses pecados, a ira de Deus e a maldição da lei estão sobre o pecador (Ef 2:3; Gl 3:10), portanto exposto à morte (Rm 6:23) juntamente com as misérias espirituais (Ef 4:18), temporais (Rm 8:20; Lm 3:39) e eternas (Mt 25:41; 2Ts 1:9). Isso não significa que o homem é mal o máximo possível, pois a graça comum de Deus limita as maldades humanas num nível que seja possível a coexistência

12


e sobrevivência da humanidade; até os piores homens que pisaram na Terra, como Hitler, mesmo eles, não atingiram seus níveis máximos de corrupção e maldade. Embora os ímpios possam realizar obras de caridade e obras que ao nosso ver são boas, devemos lembrar que “pecado” é tudo aquilo em que Deus não é glorificado como deveria; sendo assim, tais obras, aparentemente boas, possuem motivações egoístas, portanto ainda são pecaminosas. George Withefield fala que a própria natureza, em sua revolta contra o homem, evidencia o pecado original: “Tenho pensado muitas vezes, quando eu estava no exterior, que se não houvesse nenhum outro argumento para provar o pecado original, o ataque de lobos e tigres contra o homem, ou mesmo o latido de um cão contra nós, é uma prova do pecado original. Tigres e leões não se atreveriam a levantar-se contra nós, se não fosse pelo primeiro pecado de Adão; pois quando as criaturas se levantam contra nós é o mesmo que dizer: Você pecou contra Deus, e “nós compramos a briga de nosso Mestre”. Se olharmos para dentro de nós, veremos o suficiente de luxúria e oposição contra Deus. Existe orgulho, malícia e vingança nos corações de todos nós; e esta condição não pode vir de Deus; vem do nosso primeiro pai, Adão, que depois de abandonar a Deus, caiu sob o domínio do Diabo” (George Withefield, sermão “O método da graça” - The Method of Grace). Confira outros textos bíblicos que falam a este respeito: 1 Rs 8:46; Sl 14:1-3; Sl 53; Sl 58:3; Sl 143:2; Is 64:6; Jr 13:23; Jo 3:19-21; Jo 5:40; Jo 8:44; Rm 3:9-23; Rm 5:8, 12, 18; Rm 7:14-25; 1 Co 2:14; Cl 2:13; Tg 3:2; 1 Jo 1:8-10; 5:19. Chamado externo e Chamado eficaz A Bíblia não diz que o homem caiu de 1 metro de altura e torceu o pé, ela fala que o homem caiu de 4 mil metros de altura sem paraquedas, ou seja, está morto espiritualmente. Sendo assim, é necessário um agir sobrenatural, da parte de Deus, para que o homem possa reviver. O ato de reviver o homem, espiritualmente, é chamado de regeneração. A regeneração se dá através de dois chamados: externo e interno. O chamado externo consiste na proclamação do evangelho. Quando Cristo ordena o “Ide” (Mt 28:19-20; Mc 16:15), torna-se responsabilidade da Igreja anunciar o evangelho a todos os povos. Isto se relaciona com a graça comum, que é chamada “comum” pois é universal. É a graça que Deus dá a todas as pessoas sem discriminação. Graça comum é a misericórdia e a bondade que Deus estende à raça humana. A Bíblia diz que, em sua providência, Deus envia chuvas sobre justos e injustos (Mt 5:45). A graça comum é um meio que Deus usa para limitar a maldade do coração dos homens, para que seja possível a convivência em sociedade; além disso, todas as verdades, conhecimentos e capacidades que o homem não-cristão obtém, provém de Deus e isso é graça.

13


Estudos mostram que onde o evangelho é pregado, mesmo não havendo convertidos, há a diminuição de crimes. Isso faz parte da graça comum. Mas a função primária do chamado externo é ser o principal meio para que ocorra o chamado eficaz (ou chamado interno). O homem está morto espiritualmente, sendo assim, ele não responde a estímulos, pois não está apenas cego, surdo e mudo, ele está morto! Para que possa responder ao evangelho, há uma transformação radical no homem, e essa transformação é feita unicamente por Deus, que tem o poder de dar vida. Deus precisa mudar todo nosso ser, que é inclinado a todo tipo de mal. Tal mudança é tão violenta e complexa, que tal mudança é continuamente relatada na Bíblia, sob vários emblemas e figuras. Ezequiel identifica-a por “E lhes darei um só coração, e um espírito novo porei dentro deles; e tirarei da sua carne o coração de pedra, e lhes darei um coração de carne” (Ez 11:19; 36:26). O apóstolo João algumas vezes a chama por “nascido de Deus”, outras vezes por “nascido de novo" e, ainda, por "nascido pelo Espírito" (Jo 1:13, 3:3, 6). O apóstolo Pedro, em Atos, chama de “arrependimento e conversão” (At 3:19). A epístola aos Romanos fala sobre ela como sendo “vivos dentre os mortos” (Rm 6:13). A segunda epístola aos Coríntios chama de “nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (2 Co 5:17). A epístola aos Efésios fala sobre a regeneração como a ressurreição juntamente com Cristo: “E vos vivificou, estando vós mortos em ofensas e pecados” (Ef 2:1); também ordena “vos despojeis do velho homem, que se corrompe pelas concupiscências do engano; e vos revistais do novo homem, que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade.” (Ef 4:22, 24). A epístola dos Colossenses chama por “pois que já vos despistes do velho homem com os seus feitos, e vos vestistes do novo, que se renova para o conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou” (Cl 3:9, 10). A epístola de Tito chama de “lavagem da regeneração e da renovação do Espírito Santo.” (Tt 3:5). A primeira epístola de Pedro fala sobre isso como “daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1 Pe 2:9). E a segunda epístola, como “participantes da natureza divina” (2 Pe 1:4). A primeira epístola de João diz que “passamos da morte para a vida” (1 Jo 3:14). Todos estes termos são usados para expressar a profundidade da mudança que ocorre no ser do homem. Essa é a única maneira pela qual uma pessoa responderá ao chamado externo, à fé e ao arrependimento, espontaneamente. Deus intervém para torná-la disposta, recriando sua alma. Deus ressuscita pessoas da morte espiritual e lhes dá vida espiritual, para que não somente possam querer e queiram a Cristo, mas também façam isso espontaneamente. Por trás da regeneração, há a mudança de coração pela qual os indispostos são tornados dispostos pelo Espírito de Deus. Na regeneração, aqueles que odiavam as coisas de Deus recebem uma disposição totalmente nova, um novo coração. Isso é exatamente o que Jesus disse – se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus, nem entrar nele (Jo 3:1-5).

14


A graça de Deus não viola a vontade humana, mas triunfa docemente sobre ela. Nunca haverá alguém arrastado para o céu pelas orelhas, todos estarão lá por vontade própria. Portanto, o chamado eficaz é compatível com a pregação e o testemunho que convida o pecador a crer no evangelho e se arrepender de seus pecados. Deus usa o ministério da Palavra para realizar essas mudanças sobrenaturais no coração. E essas mudanças produzem o arrependimento e a fé. Graça e Fé A pergunta que fica é: por que alguns são alvos do chamado eficaz divino e outros apenas ouvem o chamado externo e não se convertem? Antes da fundação do mundo, nos tempos eternos, Deus decretou tudo o que haveria de acontecer (Ef 1:11; Rm 11:33; Hb 6:17; Rm 9:15, 18); porém Ele não é o autor do pecado (Tg 1:13, 17; 1Jo 1:5) – Deus o permitiu, segundo o beneplácito de Sua vontade, para sua própria glória (Rm 11:32) – nem é violentada a vontade e responsabilidade humana (At 2:23; Mt 17:12; At 4:27, 28; Jo 19:11; Pv 16:33). Para Sua glória, por meio de Seu decreto, foram predestinados, antes da fundação do mundo, alguns homens e anjos para vida eterna e outros predestinados para o castigo eterno (1 Tm 5:21; Mt 25:41; Rm 9:22, 23; Ef 1:5, 6; Pv 16:4). O número daqueles que serão salvos consequentemente daqueles que serão condenados – é imutável, está definido sendo impossível aumentar ou diminuir (2 Tm 2:19; Jo 13:18). Deus predestinou, antes da fundação do mundo, aqueles que desfrutariam da vida eterna, baseado unicamente na Sua livre vontade (Ef 1:4, 9, 11; Rm 8:30; 2 Tm 1:9; 1 Ts 5:9), não em uma fé previamente conhecida, boas obras ou algo na criatura que O movesse a tal escolha (Rm 9:11, 13, 16; Ef:1, 4, 9). Aqueles que foram preordenados à salvação em Cristo, o foram devido ao secreto conselho de Deus, baseado em Sua livre graça, amor e misericórdia, no Seu eterno propósito de Ser glorificado através da salvação dos eleitos em Cristo (Ef 1:6, 12). Mesmo os eleitos são achados caídos em Adão, devido a isso, Deus preordenou os meios pelos quais Sua graça os redimiria (1 Pe 1:2; Ef 1:4,5; Ef 2:10; 2Ts 2:13), sendo chamados pelo Espírito, no seu devido tempo, dandolhes a fé em Cristo e o arrependimento por seus pecados, tornando-os justificados, sendo adotados como filhos de Deus, santificados e guardados por Seu poder, através da fé salvífica (Rm 8:30; Ef 1:5; 2 Ts 2:13; 1 Pe 1:5). Aos demais que não foram preordenados lhes é dado, como justiça pelos seus pecados, a desonra e a ira de Deus, o qual recusa ou concede misericórdia a quem quer, segundo o beneplácito da Sua vontade (Mt 11:25, 26; Rm 9:17, 18, 21, 22; 2 Tm 2:19, 20; Jd 4; 1 Pe 2:8). Para compreendermos essa verdade, temos de distinguir entre graça e justiça. Justiça é algo que merecemos ou ganhamos por nossas obras. Quando Paulo escreve sobre a salvação, deixa claro que, se a salvação é pelas obras, então não pode ser pela graça, mas, visto que é pela graça, não é por meio de obras (Rm 11:6). Justiça está relacionada a um padrão de mérito. Em contraste, graça

15


é imerecida; ou seja, não é merecida nem conquistada. Em vez disso, graça é dada espontaneamente por Deus. Ele não está obrigado a dá-la, nem sob a exigência de fazer isso. O apóstolo Paulo, prevendo que muitos diriam que Deus é injusto (Rm 9:14), cita o que Deus disse a Moisés: “Compadecer-me-ei de quem me compadecer, e terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia.” (Rm 9:15). Graça é sempre um presente divino, nunca uma exigência. É crucial que entendamos isto, porque somos inclinados a pensar que Deus nos deve algo. Cremos frequentemente que, se Deus fosse realmente bom, Ele nos daria uma vida melhor, de alguma maneira; mas, se pensamos que Deus nos deve algo, estamos realmente pensando sobre justiça, porque a graça nunca é devida. Deus não está obrigado a dar graça a nenhuma criatura. A definição clássica de graça é “favor imerecido”. Quando Deus age de maneira favorável para conosco, quando por nosso mérito não temos nenhum direito a isso, essa atitude de Deus é sempre graça. Esse é um dos pilares da Reforma chamado de Sola Gratia (Somente a Graça), ou seja, na salvação somos resgatados da ira de Deus unicamente pela Sua graça. A obra sobrenatural do Espírito Santo é que nos leva a Cristo, soltando-nos de nossa servidão ao pecado e erguendo-nos da morte espiritual à vida espiritual. Negamos que a salvação seja em qualquer sentido obra humana. Os métodos, técnicas ou estratégias humanas por si só não podem realizar essa transformação. A fé não é produzida pela nossa natureza não-regenerada. Confira o infográfico abaixo:

Para esclarecer, pense conforme está exposto neste infográfico. Há duas esferas, justiça e não-justiça, na esfera justiça há ira, na de não-justiça há a parte de misericórdia e injustiça. Àqueles que Deus elegeu “nele [Cristo] antes da fundação do mundo” (Ef 1:4) e que “estão escritos no livro da vida do Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo” (Ap 13:8) receberam misericórdia, os demais recebem ira, que é justiça. Ninguém recebe injustiça. Sabemos que tais conceitos são chocantes e, em muitas partes, misteriosos, mas o que não podemos dizer é que tais conceitos não são bíblicos (confira as diversas referências bíblicas citadas).

16


Como diz Tim Keller: “Deus adora trabalhar de uma forma que confunde a ideia de grandeza do mundo”. Todas religiões colocam méritos humanos, como condição para a salvação. O cristianismo não faz isso. A passagem de Efésios 2:8-9 é essencial para compreendermos a forma que Deus nos chama, “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie”. Na estrutura gramatical deste texto, o antecedente da palavra isto é a palavra fé. Assim como a graça, a fé é um dom de Deus e o meio pelo qual somos justificados em Cristo - recebendo a justiça que Cristo cumpriu durante Sua vida sem pecado e os benefícios conquistados na cruz. Esta doutrina é outro pilar da Reforma, pela qual a Igreja permanece de pé ou cai, Sola Fide (Somente a Fé), ou seja, somente a fé em Cristo nos justifica dos nossos pecados perante Deus, nos imputando a justiça do Cordeiro imaculado; não havendo nenhuma prática vinda de nós mesmos que pode nos limpar, se não, a fé no perfeito sacrifício realizado por Cristo em nosso favor, proporcionando-nos as bênçãos resultantes deste sacrifício. (Gn 15:6; Jo 3:16; Jo 6:28-29; At 15:7-9; At 26:16-18; Rm 1:16-17; Rm 3:21-4:25; Rm 5:1-2; Rm 10:4-11; Gl 2:16; Gl 3:8, 11-14, 22-26; Gl 5:1- 6; Ef 2:8-9; Ef 3:1719; Fp 3:9; 2 Ts 2:13; 1 Tm 1:16; Hb 10:38-39; Hb 11:1-40; 2 Pe 1:1) Muitos dizem que têm fé ou que não deixam morrer sua fé, mas não têm nenhum compromisso com Jesus e a Bíblia. A Bíblia nos fala de fé, mas essa fé possuiu, pelo menos, três elementos essenciais. Elementos essenciais da fé salvadora Fé, de acordo com a Bíblia, não é irracional ou “boba”. Não é um comprometimento cego ou um sentimento aleatório de proximidade com Deus. Essas coisas não são fé, do mesmo modo que não é fé um homem escolher, de olhos vendados, uma pessoa em meio a uma multidão, e pedir a ela que lhe faça uma cirurgia cardíaca. Isso não é fé de maneira alguma; é tolice, pura e simples. O que, então, é fé? Historicamente, o cristianismo respondeu essa a questão distinguindo três principais elementos que, juntos, compreendem a fé salvífica. Falando de maneira geral, três palavras latinas foram usadas para identificar esses três elementos: notitia, ou “conhecimento”; assensus, ou “assentimento”; e fiducia, ou “confiança”. Notitia se refere ao conteúdo da fé, as coisas que cremos. Em outras palavras, ela deve ter conteúdo intelectual. Ela não pode ser vazia ou cega, mas deve ser baseada no conhecimento de certas verdades fundamentais. Nós vemos isso por toda a Bíblia nas passagens que são distintas pela expressão “crer que”, seguida por uma proposição doutrinária de alguma natureza. Bons exemplos incluem Romanos 10:9, que afirma que “se... creres que Deus o ressuscitou [Jesus] dentre os mortos, serás salvo”, e João 20:31 que diz: “Estes [sinais], porém, foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome”. Em cada caso, nós vemos que há um conteúdo doutrinário para a fé. Fé significa crer em certas proposições; nos exemplos citados acima, as proposições são “que Deus ressuscitou Jesus dentre os mortos” e “que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus”.

17


Assensus é a convicção de que o conteúdo de nossa fé é verdadeiro. Uma pessoa pode saber a respeito da fé cristã e, apesar disso, crer que tal conteúdo não é verdadeiro. Podemos ter uma dúvidas em alguns pontos de nossa fé, mas precisa haver certo nível de afirmação e convicção intelectual, para sermos salvos. Antes que uma pessoa possa crer realmente em Jesus Cristo, ela tem de crer que Cristo é realmente o Salvador, que Ele é quem afirmou ser. A fé genuína diz que o conteúdo, a notitia, é verdadeiro. Nós vemos esse elemento de fé retratado em passagens bíblicas como Jo 5:46-47; 8:31-38, 45-46; 10:37-38. Fiducia se refere à confiança e dependência pessoal. Saber e crer no conteúdo da fé cristã não é suficiente, pois até os demônios fazem isso (Tg 2:19). A fé é eficaz somente se o indivíduo confia pessoalmente apenas em Cristo para a salvação. Uma coisa é alguém dar assentimento intelectual a uma proposição, mas outra coisa bem diferente é colocar sua confiança pessoal em tal proposição. Podemos dizer que cremos na justificação somente pela fé, mas, apesar disso, continuarmos pensando que iremos ao céu por causa de nossas realizações, nossas obras ou nosso esforço. É fácil introduzirmos a doutrina da justificação somente pela fé em nossa mente, mas é difícil coloca-la no coração de modo que nos prendamos somente a Cristo para salvação. Há outro elemento em fiducia além de confiança, e esse elemento é afeição. Uma pessoa não regenerada nunca virá a Jesus, porque não quer a Jesus. Em sua mente e coração, ela está fundamentalmente em inimizade com Deus. Enquanto uma pessoa é hostil para com Cristo, ela não tem nenhuma afeição por ele. Satanás é um caso assim. Satanás conhece a verdade, mas odeia a verdade. Ele não tem nenhuma inclinação para adorar a Deus porque não ama a Deus. Somos assim por natureza. Somos mortos em nosso pecado. Andamos de acordo com os poderes deste mundo e satisfazemos as concupiscências da carne. Até que o Espírito Santo nos mude, temos um coração de pedra. Um coração não regenerado é um coração sem afeições por Cristo; é tanto sem vida quanto sem amor. O Espírito Santo muda a disposição de nosso coração para que vejamos a doçura de Cristo e o abracemos. Nenhum de nós ama a Cristo perfeitamente, mas não podemos amá-lo se o Espírito Santo não mudar o nosso coração de pedra e transformá-lo num coração de carne. Esse tipo de fé é visto em passagens que falam sobre crer “em” Jesus (por exemplo, Jo 3:15-16; Rm 9:33; 10:11) e em passagens que falam de “inclinar-se” ou “repousar” sobre Jesus (Sl 71:5-6; Pv 3:5-6), “olhar” para ele (Jo 6:40; Hb 12:1-2), e “comprometer-se” com Ele (Sl 37:5; Mt 11:28; 2 Tm 1:12). Considere a seguinte ilustração. Imagine que quatro pessoas são lançadas sem comida ou água no meio de um campo muito extenso cheio de bombas terrestres. Suponha que um dos indivíduos cegamente escolha um caminho pelo campo e siga naquela direção sem hesitar. Esse não é um exemplo de fé, mas é mais como aquela tolice da qual falamos anteriormente. Fé genuína não é cega; é baseada em conhecimento. Mas suponha que um helicóptero apareça sobre os três homens que restaram, e do helicóptero, uma parte interessada anuncia o caminho pelo campo minado. Um dos homens confia na palavra da parte interessada e caminha de uma vez pelo campo minado. Isso também não é um exemplo de fé. Sim, as ações do homem são baseadas em conhecimento (o testemunho da parte interessada) e

18


consentimento (o homem considera o testemunho como verdadeiro e benéfico em atender as suas necessidades). Mas a sua ação ainda é cega, pois é baseada em conhecimento insuficiente (isto é, o testemunho incerto de um completo estranho). Ela também carece do mais importante elemento da fé: confiança pessoal naquele que fala. Suponha, contudo, que os dois homens restantes façam certas perguntas à parte interessada para discernir como ele veio a conhecer o caminho correto do campo, por que ele quer ajudá-los e o quão certo ele está de que pode guiá-los seguramente através das minas terrestres. Suponha que eles também peçam referências da parte interessada para ver se ele conhece alguém que eles conheçam ou a quem sejam relacionados. Suponha que eles até mesmo tentem testar as suas instruções, lançando objetos na direção que ele sugere para ver se parece estar livre de minas. Ao fazer tais coisas, os dois homens restantes estão reunindo conhecimento suficiente para decidir se podem confiar no indivíduo do helicóptero. Essa confiança (fiducia), que é edificada sobre um conhecimento (notitia) e consentimento a tal conhecimento (assentus), é do que se trata a fé. Tal fé não é “boba” de maneira nenhuma, mas completamente razoável. Quando todos os três elementos da fé estão presentes, eles necessariamente se manifestarão em boas obras. Se considerarmos a ilustração acima, podemos ver que os dois homens restantes demonstram a genuinidade da sua fé (ou a falta dela) por aquilo que fizeram. Se eles escolhem ficar onde estão e se recusam a seguir instruções do homem no helicóptero, ou se eles seguem em sua própria direção, eles demonstrarão que não creem de verdade. Mas se eles genuinamente confiam no homem no helicóptero, eles seguirão na direção para a qual ele aponta. Eles seguirão suas instruções (como em Jo 14:15). As suas ações vão demonstrar a genuinidade de sua fé. Quando notitia, assensus e fiducia estão presentes juntos, há verdadeira fé. E quando há verdadeira fé, boas obras necessariamente seguirão. Boas obras não são parte da fé; elas fluem da fé. É somente a fé que recebe o dom de Deus da justificação, mas fé que justifica nunca estará sozinha; ela sempre se manifestará em boas obras. Juntamente com a Fé, a regeneração que Deus opera em nós nos dá a conversão e o arrependimento, que são representados pelas palavras epistrophe e metanoia, que descrevem uma atitude de meia volta no pensamento e no viver. O vocábulo epistrophe também “inclui uma mudança de senhores”. A pessoa que estava sob o domínio de Satanás começa a viver sob o senhorio de Cristo (Ef 2:1). Há conversão da vontade humana para Deus. Já metanoia é usada com o significado de “dar uma meia volta”, não só nos pensamentos, mas em todos os aspectos da vida. Arrependimento é uma graça salvadora pela qual o pecador, tendo um verdadeiro sentimento do seu pecado e percepção da misericórdia de Deus em Cristo, se enche de tristeza e de horror pelos seus pecados, abandona-

19


os e volta para Deus, inteiramente resolvido a prestar-lhe nova obediência. A conversão, então, inclui tanto o arrependimento como a fé. No Salmo 51, podemos ver 4 formas como o Espírito trabalha o verdadeiro arrependimento. 1) Abre nossos olhos para a necessidade de lamentarmos o nosso pecado. A lamentação bíblica começa com um novo senso da pecaminosidade do pecado. Nos versículos 1-2, Davi usa três termos diferentes para falar de seu pecado: transgressões (rebelião contra a autoridade suprema de Deus), iniquidade (impiedade interior que perverte a nossa alma), pecado (errar o alvo de glorificar a Deus e servir o nosso próximo). O Espírito Santo já abriu seus olhos para lhe ver como você de fato é através do espelho da lei de Deus? Davi viu (veja o v. 4) 2) Move nossos corações para confessar pecados específicos. Crimes de sangue (v. 14) significavam pecados de sangue que mereciam a pena de morte (que incluía o pecado de adultério e assassinato). Davi confessou especificamente seus pecados e confessou toda a culpa de seus pecados. Ele não colocou a culpa nos outros ou nas circunstâncias. O verdadeiro arrependimento não esconde nada de Deus e entrega tudo à Sua justiça. 3) Redireciona nossos pés para abandonarmos o pecado. O arrependimento contém emoções, mas se não passar de emoções não é verdadeiro arrependimento. Muitas pessoas podem lamentar as consequências do pecado, mas não estar verdadeiramente arrependimento. Davi ora para que Deus o lave completamente do seu pecado (v. 2), não só uma lavagem exterior. O verdadeiro arrependimento não é algo rápido, mas uma dor sincera no coração que nos leva a modificar nossas vidas e redireciona a nossa vontade. O arrependimento tem um lado negativo (afastar-se do pecado) e um positivo (olhar para Cristo e aproximar-se de Deus). 4) Libera nossas línguas para clamarmos por misericórdia A fé sempre está junta com o arrependimento verdadeiro e ela leva a pessoa arrependida a olhar para Cristo, a fim de que não caia em desespero. O verdadeiro arrependimento não é como o de Esaú, que buscou com lágrimas, mas não confiou em Deus. O arrependido nunca se esconde de Deus, mas, como Davi, confia na graça: “um coração quebrantado e contrito não desprezarás, ó Deus.” (v. 17). O arrependimento trabalhado pelo Espírito é sempre a restauração trabalhada pelo Espírito por causa de Jesus Cristo. Finalizo com a frase de Robert Murray McCheyne: “Somente um coração quebrantado pode receber um Cristo crucificado”.

20


Unidade 4 – Ordo Salutis “Ordo Salutis” é o correspondente latim para “a ordem da salvação”, que se refere à sequência de etapas conceituais envolvidos na salvação do cristão. É uma sequência lógica, e não cronológica; algumas etapas ocorrem sequencialmente, enquanto outras instantaneamente e simultaneamente. Antes de falarmos propriamente do Ordo Salutis, vejamos sobre as alianças que Deus fez ao longo da história. As Alianças Em termos gerais, os teólogos falam em três grandes alianças na Escritura: a aliança de redenção, a aliança de obras e a aliança de graça. Atualmente, ouvimos muito pouco na igreja sobre a aliança de redenção, mas ela é um dos aspectos mais importantes da teologia. Deus não fez uma aliança de redenção com seres humanos; em vez disso, Ele a fez consigo mesmo. É um acordo pactual que foi feito na eternidade passada entre as três pessoas da Divindade. No drama de redenção, vemos a atividade do Pai, do Filho e do Espírito Santo; e a própria criação é uma obra da Trindade. Deus, o Pai, trouxe o mundo à existência, mas, quando produziu ordem a partir das trevas, isso aconteceu porque o Espírito de Deus pairava sobre as águas e trouxe as coisas à existência (Gn 1:2). O Novo Testamento está repleto de referências a Cristo como o agente por meio do qual o Pai criou todas as coisas. Por exemplo: “Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez.” (Jo 1:3). A criação envolveu o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Os teólogos fazem uma distinção entre os membros da Divindade. O Pai iniciou o plano de redenção; isso significa que o Pai está por trás dos decretos eternos de salvação, e Ele enviou o Filho ao mundo para realizar a nossa redenção. O Filho realizou a redenção por nós. Finalmente, a redenção é aplicada à nossa vida pessoal por meio do Espírito Santo. Como a obra de Cristo nos torna pessoas redimidas? O Espírito nos regenera, ou seja, Ele nos vivifica, compartilhando vida espiritual e criando fé em nosso coração. O Espírito também nos santifica e nos glorificará no céu. Esta é a obra de redenção e envolve todos os três membros da Trindade que agem em concordância. Anos atrás, surgiu uma controvérsia entre teólogos alemães que pressupunha uma luta entre o Pai e o Filho. Hipoteticamente, em seu ministério terreno, o Filho persuadiu o Pai a retroceder de sua ira para com a raça humana. Isso foi um grave afastamento do entendimento bíblico a respeito de como a redenção acontece. A aliança de redenção indica que o Pai, o Filho e o Espírito Santo estavam em concordância completa quanto à salvação do homem. O Filho não veio relutantemente ao mundo. Pelo contrário, o Filho se agradou em cumprir o plano do Pai e se encarnar. No jardim do Getsêmani, na véspera de sua morte expiatória, Jesus orou e suou gotas de sangue em agonia. Ele disse: “Pai, se queres, passa de mim este cálice; todavia não se faça a minha vontade, mas a tua.” (Lc 22:42). Em essência, Jesus disse: “Eu preferiria qualquer outro caminho, mas estou em concordância contigo, Pai, em qualquer que seja a tua vontade”.

21


Somos tendentes a pensar na redenção como a reaquisição do paraíso que Adão e Eva perderam, mas esse é um entendimento errôneo. A redenção não é uma restauração ao lugar em que Adão e Eva estavam antes da queda, e sim uma promoção ao estado que eles teriam atingido se tivessem sido bemsucedidos em obedecer os termos da aliança. A segunda aliança foi a das obras, que Deus fez com Adão. O termo era simples, não comer do fruto proibido, Adão quebra essa aliança. Então Deus institui a terceira aliança, da graça. Um entendimento errado procede do modo como identificamos as duas alianças. Visto que a primeira é chamada “a aliança de obras” e a outra, “a aliança de graça”, somos tendentes a pensar que a primeira aliança não continha graça. Mas entrar Deus em aliança com uma criatura e fazer-nos qualquer promessa sob qualquer condição é, em si mesmo, um ato de graça. Deus não tem a obrigação de prometer qualquer coisa a suas criaturas. Na aliança da graça, Deus toma para Si toda a responsabilidade de cumprir a lei, em Jesus. Cristo não apenas morreu pela Sua Igreja, mas viveu por Ela; pois durante Sua vida Ele cumpriu toda a Lei que nos era devida, mas impossível de se cumprir. De novo, a aliança de graça não anula a aliança de obras; pelo contrário, ela cumpre os termos da aliança de obras. Somos salvos pelas obras de Cristo. A corrente de Ouro Os teólogos chamam a Ordo Salutis de “corrente de ouro da salvação”, essa corrente é apresentada pelo apóstolo Paulo em Romanos 8:28-30: “E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito. Porque os que dantes conheceu também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou a estes também chamou; e aos que chamou a estes também justificou; e aos que justificou a estes também glorificou.” Há uma corrente aqui, uma sequência, que começa com pré-conhecimento. Em seguida, vem predestinação, chamada, justificação e glorificação. Em cada estágio, está subentendido a palavra “todos”. Os sujeitos que Deus préconheceu são os mesmos que são, por fim, glorificados. Na unidade anterior já abordamos alguns destas etapas, as quais relembraremos e desenvolveremos as demais. Eleição Antes da criação, por causa de sua soberana e boa vontade, Deus escolhe algumas pessoas para serem salvas (Rm 8:29-30; 9:1-25; Ef 1:3-14; 2 Ts 2:1213). Essa doutrina é tão misteriosa que precisa ser tratada com cuidado e humildade, porque pode ser facilmente distorcida ao ponto de obscurecer a integridade de Deus. Se abordada de maneira errada, a doutrina pode fazer Deus parecer um tirano que brinca com suas criaturas, que lança os dados, por

22


assim dizer, com respeito à nossa salvação. Distorções desse tipo são muitas, e, se você tem dificuldade com esta doutrina, não está sozinho. Romanos 9 nos esclarece sobre este ponto. Falando sobre Jacó e Esaú, Paulo diz o seguinte “Porque, não tendo eles ainda nascido, nem tendo feito bem ou mal (para que o propósito de Deus, segundo a eleição, ficasse firme, não por causa das obras, mas por aquele que chama), foi-lhe dito a ela: O maior servirá ao menor. Como está escrito: Amei a Jacó, e odiei a Esaú. Assim, pois, isto não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus, que se compadece.” (Rm 9:11-13, 16). Quando Deus considerou uma raça de seres humanos caídos e corrompidos em rebelião contra Ele, decretou que concederia misericórdia para alguns e justiça para outros. Esaú recebeu justiça; Jacó recebeu graça; nenhum dos dois recebeu injustiça. Deus nunca pune pessoas inocentes, mas redime pessoas culpadas. Deus não redime todas elas, e não está sob nenhuma obrigação de redimir qualquer delas. A coisa maravilhosa é que Ele redime alguns. Chamado externo Deus convoca pessoas para Si mesmo através da proclamação humana do evangelho, e eles respondem com fé salvadora. O Espírito Santo está ligado diretamente à Palavra de Deus, por isso, Deus propôs a pregação do evangelho como o meio pelo qual Ele alcança os eleitos. Não cabe a nós distinguirmos quem são ou não os eleitos, mas devemos pregar a TODO ser humano. O mais magnífico é que Deus escolheu nos usar, vasos de barro (homem), para levarmos as boas-novas (evangelho) da graça, por isso, não negligenciemos este ministério tão essencial. O apóstolo Paulo enfatiza a necessidade da pregação e de missões em Romanos: “Porque não me envergonho do evangelho de Cristo, pois é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê; primeiro do judeu, e também do grego. [...] Porque todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo. Como, pois, invocarão aquele em quem não creram? e como crerão naquele de quem não ouviram? e como ouvirão, se não há quem pregue? E como pregarão, se não forem enviados? como está escrito: Quão formosos os pés dos que anunciam o evangelho de paz; dos que trazem alegres novas de boas coisas.” Rm 1:16; 10:13-15. O próprio Senhor Jesus disse que nem todos que ouvem o chamado do evangelho serão salvos, pelo contrário “muitos são chamados, mas poucos escolhidos.” (Mt 22:14). Regeneração (chamado interno) Deus, secreta e soberanamente, concede vida espiritual àqueles que foram chamados (os escolhidos ou eleitos). Deus muda a inclinação maléfica do coração deles para total submissão a Ele, trocando-lhes o coração de pedra, insensível ao Espírito, pelo de carne (Ez 36:26). Agostinho de Hipona (354 – 430 d.C.) retrata seu chamado da seguinte forma:

23


“Tarde te amei, Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei! Eis que estavas dentro de mim, e eu lá fora, a te procurar! Eu, disforme, me atirava à beleza das formas que criaste. Estavas comigo, e eu não estava em ti. Retinham-me longe de ti aquilo que nem existiria se não existisse em ti. Tu me chamaste, gritaste por mim, e venceste minha surdez. Brilhaste, e teu esplendor afugentou minha cegueira. Exalaste teu perfume, respirei-o, e suspiro por ti. Eu te saboreei, e agora tenho fome e sede de ti. Tocaste-me, e o desejo de tua paz me inflama.” A regeneração cria aquilo que o chamado externo ordena. Se diz: “Vive!”, ela cria a vida. Se diz: “Arrependa-se!”, ela cria o arrependimento. Se diz: “Creia!”, ela cria a fé. Se diz: “Siga-me”, ela cria a obediência. Todos aqueles que são chamados neste sentido não mais consideram a cruz como loucura e, em vez disso, consideram-na como o poder de Deus. Não vêm a Cristo por coerção. Agem livremente, com base no que valorizam como infinitamente precioso. Isso é o que acontece com eles. Sua resistência à cruz foi vencida porque o chamado de Deus rompeu a cegueira espiritual deles e lhes fez ver a cruz como sabedoria e poder. Não é que o Espírito Santo arraste pessoas chutando e gritando contra a sua vontade para vir a Cristo, mas o que o Santo Espírito faz é mudar a inclinação e disposição dos nossos corações. Estávamos anteriormente indispostos a abraçar a Cristo, agora estamos dispostos, e mais do que dispostos! Não somos arrastados para Cristo, corremos para Cristo! E O abraçamos alegremente porque o Espírito mudou nossos corações. Conversão Conversão é o fruto imediato da fé, pois a conversão, considerada como arrependimento (metanóia), é uma mudança da mente, e, portanto, também da vontade. Pelo poder da fé, tanto a mente como a vontade são mudadas do pecado para a justiça, e postas em direção ao Deus Vivo em Cristo. Por essa mudança de mente e vontade, por meio da fé, a mente observa e julga de uma forma radicalmente diferente a culpa e o pecado. Assim, o homem passa a se condenar diante de Deus e chega ao verdadeiro arrependimento. Pela fé os desejos da vontade são postos numa direção diferente, a direção de Deus em Cristo, e o homem chega à fome e sede de justiça. O velho homem é mortificado, e o novo homem vivificado. Pela fé a conversão do homem é realizada em princípio, uma conversão que continua por toda a sua vida. Voluntariamente respondemos ao chamado do evangelho, arrependendo do pecado e colocando a fé em Cristo para a salvação. Quando isso ocorre, somos selados pelo Espírito Santo, como propriedade exclusiva de Deus (2 Co 1:22; 5:5, Ef 1:13-14; 4:30). Tornamo-nos habitação de Deus, templos do Santo Espírito. Ninguém pode violar essa propriedade que Deus comprou com o sangue do Seu Filho. Ninguém pode nos arrancar das mãos daquele que deu Sua vida por nós. Estamos seguros em Deus, Ele é a nossa cidade de refúgio. Este selo

24


serve para nos garantir que a boa obra que Ele começou será aperfeiçoada até o dia de Jesus Cristo (Fp 1:6). Justificação A doutrina da justificação diz respeito ao cenário mais grave dos seres humanos caídos – sua exposição à justiça de Deus. Deus é justo, mas nós não somos. Como Davi orou: “Se tu, Senhor, observares as iniquidades, Senhor, quem subsistirá?” (Sl 130:3). É óbvio que esta é uma pergunta retórica; ninguém pode resistir à investigação divina. Se Deus tomasse a Sua régua de justiça e a usasse para avaliar a nossa vida, pereceríamos, porque não somos justos. A maioria de nós pensamos que, se nos empenharmos para sermos pessoas boas, isso será suficiente quando comparecermos diante do julgamento de Deus. O grande mito da cultura popular, que entrou na igreja, é que pessoas podem ganhar por mérito o favor de Deus, embora a Escritura afirme claramente que, por obras da lei, ninguém será justificado (Gl 2:16). Somos devedores que não podem pagar sua dívida. Em última análise, a justificação é um pronunciamento legal feito por Deus. Em outras palavras, a justificação só pode ocorrer quando Deus, que é Ele mesmo justo, se torna o justificador por decretar que alguém é justo aos olhos d’Ele. A justificação é um ato de Deus. É uma declaração legal na qual Deus perdoa o pecador de todos os seus pecados, aceita e considera o pecador como justo diante de si mesmo. Deus declara o pecador justo no exato momento em que o pecador deposita a sua confiança em Jesus Cristo (Rm 3:21-26; 5:16; 2 Co 5:21). A perfeita obediência de Cristo e plena satisfação pelo pecado são o único fundamento em que Deus declara o pecador justo (Rm 5:18-19; Gl 3:13; Ef 1:7; Fp 2:8). Não somos justificados por nossas próprias obras; somos justificados unicamente com base na obra de Cristo em nosso favor. Essa justiça é imputada ao pecador. Em outras palavras, na justificação, Deus coloca a justiça do seu Filho sobre o pecador, como vestes de justiça. Assim como meus pecados foram transferidos para Cristo, ou postos sobre Ele na cruz, assim também a Sua justiça é considerada como minha (2 Co 5:21) e isso é chamado de dupla imputação. Dessa forma, é como se Deus visse em nós o próprio Cristo. Os pecadores são justificados somente pela fé, quando confessam a sua confiança em Cristo. Não somos justificados por qualquer bem que fizemos, fazemos ou faremos. A fé é o único instrumento de justificação. A fé não acrescenta nada ao que Cristo fez por nós na justificação. A fé simplesmente recebe a justiça de Jesus Cristo oferecida no evangelho (Rm 4:4-5). O pecador que, por natureza, é inimigo de Deus, sendo justificado pela fé em Cristo pode desfrutar de uma completa e perfeita paz e harmonia com Deus (Rm 5:1). Assim que cremos, somos declarados legalmente justos, isso não é um processo (a santificação é), é instantâneo. Por isso que Lutero disse que a justiça pela qual somos justificados é extra nos, que significa "para além de nós" ou "fora de nós." Ele também a chamou de "justiça alheia", não uma justiça que pertence adequadamente a nós. Ela vem de fora da esfera do nosso próprio

25


comportamento. Com esses dois termos, Lutero estava falando sobre a justiça de Cristo que nos é dada. Lutero também disse que somos simul iustus et peccator, que significa “ao mesmo tempo justo e pecador”. Ele estava dizendo que uma pessoa justificada é simultaneamente justa e pecadora. Somos justos por virtude da obra de Cristo, mas ainda não fomos aperfeiçoados, por isso, ainda pecamos. Adoção Em sua primeira epístola, o apóstolo João faz uma afirmação de admiração apostólica: “Vede quão grande amor nos tem concedido o Pai, que fôssemos chamados filhos de Deus. Por isso o mundo não nos conhece; porque não o conhece a ele. Amados, agora somos filhos de Deus” (1 Jo 3:1-2). O fato de que somos filhos de Deus é algo que tendemos a considerar normal, mas a igreja primitiva nunca fez isso. Ao contrário da crença popular, a Bíblia não diz que todos os homens são filhos de Deus, ela diz que todos os homens são filhos da ira de Deus e que Ele elegeu alguns dentre eles para serem filhos da graça. No Novo Testamento, vemos que em quase toda oração que Jesus pronunciou, Ele se dirigiu a Deus de maneira direta chamando-O de “Pai”. A atitude de Jesus em dirigir-se a Deus como “Pai” era um afastamento radical do costume judaico, um fato que enfureceu os fariseus, porque a consideraram como uma afirmação de divindade (Jo 10:30, 33). Ainda mais admirável é o fato de que Jesus, ao ensinar a Oração do Pai Nosso, instruiu seus discípulos a dirigirem suas orações ao Pai (Mt 6:9). Portanto, Jesus não somente se dirigia a Deus como “Pai”, Ele estendeu o privilégio aos seus discípulos. Somos filhos de Deus por adoção, que é fruto de nossa justificação. Quando somos reconciliados com Deus, Ele nos traz à Sua família. A Igreja é uma família que tem um Pai e um Filho, e todos os demais que estão na família são adotados. Esta é a razão por que olhamos para Cristo como nosso irmão mais velho. Fomos feitos herdeiros de Deus e coerdeiros com Cristo. O verdadeiro Filho de Deus torna disponível tudo que Ele recebeu em Sua herança. Ele compartilha com Seus irmãos e irmãs todo o Seu legado. Isso é algo que nunca devemos considerar normal. Sempre que oramos “Pai nosso”, devemos tremer com admiração de que nós, dentre todas as pessoas, somos chamados “filhos de Deus”. Não há membros de segunda classe na família de Deus. Distinguimos corretamente entre o Filho de Deus natural e os filhos de Deus adotados; mas, quando a adoção acontece, não há nenhuma diferença no status dos membros da família de Deus. Ele dá a todos os seus filhos plena medida da herança que pertence ao seu Filho natural. Em nossa adoção como filhos, desfrutamos também da união mística com a pessoa de Cristo. Quando descrevemos algo como “místico”, estamos dizendo que ele transcende o natural e, em certo sentido, o indescritível. Podemos entender isso por meio de um estudo de duas preposições gregas, en e eis, que são, ambas, traduzidas por “em”. A distinção técnica entre estas duas palavras é importante. A preposição en significa “em” ou “dentro de”, enquanto a preposição eis significa “para dentro de”. Quando o Novo Testamento nos chama

26


a crer no Senhor Jesus, somos chamados não somente a crer em algo a respeito d’Ele, mas também a crer “em Ele”. Se estamos fora de um edifício, para entrarmos, temos de passar por uma porta. Quando fazemos a transição, cruzando a porta, indo do lado de fora para o lado de dentro, estamos no interior do edifício. Entrar é o eis, e, uma vez que estamos dentro, estamos en. A distinção é importante porque o Novo Testamento nos diz que não somente devemos crer em Cristo, mas também que aqueles que têm fé genuína estão em Cristo. Nós estamos em Cristo, e Cristo está em nós. Há uma união espiritual entre cada crente e o próprio Cristo. Além disso, todos somos parte da comunhão mística dos santos. Esta comunhão mística é o fundamento para a comunhão espiritual transcendente que cada cristão desfruta com todos os outros cristãos. E tem um impacto restringente em nós. Se você e eu estamos ambos em Cristo, a união que compartilhamos transcende nossas dificuldades relacionais. Isto não é apenas um conceito teórico; o vínculo dessa família é um vínculo mais forte do que o que desfrutamos com nossa família biológica. Este é o fruto de nossa adoção. J. I. Packer diz: “Englobamos todo o ensinamento do Novo Testamento em uma só frase se falarmos dele como a revelação da Paternidade do santo Criador. Do mesmo modo, resumimos toda a religião do Novo Testamento se a descrevermos como o conhecimento de Deus, nosso santo Pai. Se quiser julgar até que ponto uma pessoa entendeu o que é cristianismo, descubra que valor ela dá ao fato de ser filha de Deus e de ter a Deus por Pai. Se este pensamento não dominar e controlar suas orações, adoração e toda a sua atitude perante a vida, isso demonstra não ter entendido bem o cristianismo. Pois tudo o que Cristo ensinou – o que torna o Novo Testamento novo e melhor que o Antigo, tudo o que é distintamente cristão, em oposição ao judaísmo – está englobado no conhecimento da paternidade de Deus. “Pai” é o nome cristão para “Deus”.” (J. I. Packer – Evangelical Magazine 7, p. 19,20)

Santificação As boas novas da fé cristã nos dizem que somos não somente justificados pela justiça de outra Pessoa, mas também que não temos de esperar até que sejamos totalmente santificados para que Deus nos aceite em Sua presença. A santificação, por mais parcial que seja nesta vida, é real. É o processo pelo qual aqueles que são declarados justos são tornados santos. Nosso status diante de Deus se baseia tão somente na justiça de outra Pessoa; mas, no momento em que somos justificados, uma mudança real é efetuada em nós pelo Espírito Santo, de modo que somos levados crescentemente à conformidade com Cristo. A mudança de nossa natureza em direção à santidade e à retidão começa imediatamente. Notamos antes que a justificação é somente pela fé, mas não pela fé que é sozinha. Em outras palavras, se a verdadeira fé está presente, há uma mudança

27


na natureza do crente que se manifesta em boas obras. O fruto de santificação é tanto uma necessidade quanto uma consequência inevitável da justificação. Esta verdade serve como uma advertência para aqueles que sustentam o ponto de vista de que é possível uma pessoa ser convertida a Cristo e, ainda assim, nunca produzir bom fruto ou mudança de comportamento. Esta é a ideia do “crente carnal”. É claro, em certo sentido, que cristãos são carnais durante sua vida; ou seja, nesta vida nunca vencemos completamente o impacto da carne. Temos de lutar com a carne até entrarmos na glória. No entanto, se alguém está completamente na carne, de modo que não há nenhuma evidência de mudança em sua natureza, este indivíduo não é um cristão carnal e sim um ímpio carnal. A própria presença da nova natureza – a presença e o poder do Espírito Santo habitando em nós – indica que somos realmente mudados e que somos pessoas que estão mudando. Ao mesmo tempo, a santificação não progride em uma linha uniforme desde o começo da conversão até que cheguemos ao lar, na glória. Para a maioria de nós, há um crescimento permanente na vida cristã, mas há picos e vales. Pode haver ocasiões em que um cristão tem uma queda radical em pecado detestável. De fato, os cristãos podem cair em pecados ofensivos que os levam a sofrer a disciplina da igreja e talvez a excomunhão. Às vezes, esse último passo de disciplina, a excomunhão, é necessário para restaurar à fé um crente que caiu em pecado. Havendo dito isso, à medida que nos movemos da infância espiritual para a maturidade espiritual, os picos e vales tendem a ficar suaves. Nossos altos espirituais são menos intensos, como o são também nossos mergulhos às profundezas. Ficamos, por assim dizer, mais estáveis em nosso crescimento e comunhão cristã. Há ocasiões em que todo cristão se pergunta: “Como posso ser um cristão se ainda luto com minha carne?” Se temos andado com Deus por longo tempo, podemos achar conforto em olhar para o decorrer de nossa vida cristã e reconhecer que Deus nos tem moldado e nos tem dado progresso real na fé cristã. Todavia, ser moldado e levado à maturidade espiritual é uma experiência de longa duração. Tendemos a buscar satisfação instantânea. Queremos saber como podemos ser santificados em três passos fáceis, mas não existem três passos fáceis. A santificação é um processo que dura a vida toda e envolve uma enorme quantidade de trabalho intenso. Paulo escreveu: “De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade.” (Fp 2:12-13). Ele não queria dizer que devemos ficar num estado de ansiedade paralisante. Em vez disso, estava descrevendo uma atmosfera em que devemos desenvolver nossa salvação. Não podemos simplesmente relaxar na busca da santificação, deixar-nos levar enquanto o Espírito Santo nos leva. Devemos tentar agradar a Deus. As boas novas, como Paulo destaca, é que podemos fazer isso, porque Deus está operando em nós tanto o querer como o

28


efetuar. Esta é uma arena em que há uma genuína cooperação. A santificação é um processo cooperativo em que Deus opera e nós operamos. Uma das principais tarefas do Espírito Santo é a aplicação de nossa redenção; Ele produz em nossa alma o fruto de nossa justificação. O Espírito Santo trabalha em nós para mudar nossa natureza, e nós cooperamos com Ele. Não devemos confundir justificação e santificação, embora elas possam parecer semelhantes. Nossa justificação é um ato completo e consumado. A justificação indica que todo crente é completa e finalmente livre da condenação e da ira de Deus (Rm 8:1, 33-34; Cl 2:13b-14). A santificação, porém, é uma obra contínua e progressiva em nossas vidas. Embora cada crente seja tirado de uma vez por todas da escravidão do pecado, não somos aperfeiçoados imediatamente. Não seremos completamente libertos do pecado até que recebamos nossos corpos ressuscitados no último dia. Confira na tabela abaixo a diferença entre Justificação e Santificação. Justificação Santificação A justificação é uma ocorrência A santificação é um processo que instantânea, que se completa em um exige toda uma vida para se instante. O pecador é declarado completar, e não será concluída perfeitamente justo no momento em enquanto o cristão não chegar ao que crê em Cristo e no evangelho. céu. A pessoa ou é justificada, ou não é. A É possível ser mais ou menos justificação acontece pela declaração de santificado. Ou seja, há diferentes Deus de que um homem é justo, com graus de santificação, mas não de base nos méritos de Jesus Cristo. justificação. A santificação é uma transformação A justificação é uma questão judicial. A real do caráter e da condição do retidão que recebemos mediante nossa homem. A retidão alcançada por justificação não é propriamente nossa, meio da santificação é nossa própria mas é a perfeita retidão do nosso retidão, gerada em nós pelo Espirito mediador, Jesus Cristo, a nós atribuída Santo, embora misturada com somente por meio da fé. debilidade e imperfeição. A justificação é uma obra objetiva, um A santificação é uma obra subjetiva, ato de Deus a nosso respeito, que afeta uma obra de Deus em nós, que afeta nossa condição perante Deus, nosso nosso interior. relacionamento com Ele. Na santificação, somos libertos da Na justificação, somos libertos da culpa. corrupção. Nossas obras são importantes na Nossas obras não desempenham santificação. Deus ordena que qualquer papel na justificação. lutemos, vigiemos e nos esforcemos no caminho da santificação. A santificação torna-nos adequados A justificação confere-nos o direito de ir para habitar no céu, capacitando-nos para o céu, bem como a ousadia de para usufruir do lar celestial quando ingressar nas mansões celestiais. ali estivermos habitando. Retirada de Franklin Ferreira, Teologia Sistemática.

29


Cristo comprou tanto a justificação quanto a santificação para o seu povo. Ambas as graças se referem à fé em Jesus Cristo, mas de maneiras diferentes. Na justificação, nossa fé resulta em sermos perdoados, aceitos e considerados justos diante de Deus. Na santificação, essa mesma fé aceita ativa e zelosamente todos os mandamentos que Cristo deu ao crente. Não ousamos separar ou fundir a justificação e a santificação. Nós as distinguimos. E, em ambas as graças, participamos da riqueza e alegria da comunhão com Cristo por meio da fé n’Ele. Ainda assim, há 2 pares de heresias, relacionadas à doutrina da santificação, que devemos rejeitar, são eles: Ativismo e quietismo: Ativismo é a heresia de justiça própria em que pessoas tentam obter a santificação por seus próprios esforços. Já os proponentes do quietismo sustentam que a santificação é exclusivamente a obra do Espírito Santo. Os cristãos não precisam se exercitar quanto à santificação; precisam apenas ficar quietos e sair do caminho, enquanto o Espírito Santo faz toda a obra. Certamente há tempos em que é importante ficarmos quietos. Se nos apegamos estritamente à nossa força e não dependemos da ajuda do Espírito Santo, então, é tempo de ficarmos quietos. Mas não devemos abraçar um tipo de quietismo que procura deixar Deus fazer toda a obra. Legalismo e antinomianismo: Os legalistas veem a lei de Deus como tão importante para a santificação que fazem acréscimos à lei. A fim de auxiliarem a sua santificação, eles tentam estabelecer leis em áreas da vida nas quais Deus nos deixou livres. Tendem a criar regras e normas, tais como proibir os cristãos de dançar ou de assistir a filmes. Nas áreas em que Deus não estabeleceu leis, os legalistas colocam os outros em algemas e substituem inevitavelmente a genuína lei de Deus por leis criadas por homens. O outro extremo é o antinomianismo, o qual afirma que a lei de Deus não tem nenhuma importância para a vida cristã. Os antinomianos dizem que, porque os cristãos estão sob a graça, não têm nenhuma necessidade de obedecer à lei de Deus. Esta heresia é muito abundante. De fato, vivemos numa época de antinomianismo predominante na igreja. Uma pessoa verdadeiramente piedosa entende que não está mais em servidão à lei, mas, apesar disso, ama a lei de Deus e medita nela dia e noite, porque encontra ali o que é agradável a Deus e o que reflete o seu caráter. Em vez de fugir da lei, aquele que é diligente na busca de retidão e santidade se torna um estudante sério da lei de Deus. Perseverança Aqueles que Deus aceitou em Cristo, eficazmente chamou e santificou pelo Seu Espírito, não podem decair do estado da graça, nem total, nem finalmente; mas, certamente perseverarão nesse estado até o fim e serão eternamente salvos (Fp 1:6; 2 Pe 1:10; Jo 10:28,29; 1 Pe 1:5, 9; 1 Jo 3:9). Esta perseverança (ou preservação) não é devido ao livre-arbítrio dos eleitos, mas pelo decreto eterno

30


de Deus que é imutável, que procede do livre e imutável amor de Deus Pai (2 Tm 2:18, 19; Jr 31:3), dos méritos e intercessão de Jesus Cristo (Hb 10:10,14; Hb 13:20,21; Hb 9:12-15; Rm 8:33-39; Jo 17:11,24; Lc 22:32; Hb 7:25) do selo do Espírito e da semente de Deus neles (Jo 14:16,17; 1 Jo 2:27; 1 Jo 3:9) e da natureza do pacto da graça (Jr 32:40); de todas estas coisas vêm também a sua certeza e incapacidade em falhar (Jo 10:28; 2 Ts 3:3; 1 Jo 2:19). Contudo, eles podem cair em graves pecados e continuar neles (não permanentemente), devido às tentações do maligno, do mundo, à corrupção que ainda resta em nossos corpos e a negligência dos meios de preservação (Mt 26:70, 72, 74; Sl 51); desagradando a Deus (Is 64:5, 7, 9; 2 Sm 11:27), entristecendo Seu Espírito Santo (Ef 4:30) e, de algum modo, sendo privados de Suas graças e confortos (Sl 51:8, 10, 12; Ap 2:4; Ct 5:2-4, 6), tendo os corações endurecidos (Is 63:17; Mc 6:52; Mc 16:14) e as consciências machucadas (Sl 32:3, 4; Sl 51:8), trazendo escândalo e prejuízo aos demais (2 Sm 12:14); atraindo, assim, juízos temporais sobre si (Sl 89:31, 32; 1 Co 11:32); porém não se perderão, mas voltarão a desfrutar da comunhão e da graça de Deus, pois têm seus nomes escritos no Livro da Vida, que não podem ser apagados (Rm 8:28-39; Ap 3:5; Ap 13:8). Portanto, Deus chama aqueles que predestinou, justifica e por fim glorifica (Rm 8:30), sem que nenhum se perca dentre aqueles que Cristo comprou com Seu sangue (Mt 18:14; Jo 6:39; Jo 18:9), porque nada pode os separar do amor de Cristo (Rm 8:35-39). Referências bíblicas: Dt 30:6; Ez 36:27; Jo 5:24; Jo 6:39-40; Jo 10:26-29; Jo 14:3; Jo 17:12; Rm 5:17; Rm 11:25-29; Rm 14:4; Rm 16:25; 1 Co 1:8-9; 1 Co 10:13; 2 Co 1:22; 2 Tm 1:12; Hb 6:17-20; Hb 10:23; 1 Pe 1:1-9; 1 Pe 5:10; Jd 24 Temos dois intercessores na Trindade: O Espírito Santo intercede em nós e Cristo intercede por nós junto ao trono da graça. Cristo pode nos salvar totalmente porque morreu por nós, ressuscitou para a nossa justificação e está à destra de Deus Pai, intercedendo em nosso favor. Ele é o nosso grande Sumo Sacerdote. Charles Spurgeon diz o seguinte sobre esta doutrina tão importante: “Minha esperança de ser preservado até o fim se baseia no fato de que Jesus Cristo pagou caro demais por mim para deixar-me escapar. Cada crente custalhe o sangue do seu coração. Vá ao Getsêmani e ouça seus gemidos: depois, aproxime-se e observe o suor de gotas de sangue, e diga-me, Ele perderá uma alma em favor de quem sofreu assim? Contemple-O pendurado na cruz, torturado, zombado, carregado com um terrível fardo e então escondido da face de seu Pai pelo eclipse; você acha que Ele sofreu tudo aquilo e ainda assim permitir que aqueles em favor de quem suportou isso sejam jogados no inferno? Ele será um perdedor maior que eu se eu viesse a perecer, pois Ele perderá o que Lhe custou a Sua própria vida. Aqui está a sua segurança - você é a porção do Senhor, e sua herança não lhe será roubada".”

31


No entanto, queremos dizer mais do que isso quando falamos na doutrina da perseverança dos santos. Queremos dizer que os santos têm de perseverar e perseverarão na fé e na obediência que procede da fé. A eleição é incondicional, mas a glorificação não o é. Nas Escrituras, há muitas advertências de que aqueles que não se apegam a Cristo podem se perder no final. Nossa fé tem de permanecer até ao fim, se devemos ser salvos. O evangelho é o instrumento de Deus na preservação da fé, bem como o instrumento que gera a fé. Não agimos com um tipo de indiferença arrogante para com o chamado à perseverança apenas porque uma pessoa professou a fé em Cristo, como se pudéssemos, baseados em nossa perspectiva, ter certeza de que agora ela está além do alcance do Maligno. Há um combate da fé a ser realizado. Os eleitos realizarão esse combate. E, por meio da graça soberana de Deus, eles vencerão o combate. Temos de permanecer na fé até ao fim, se devemos ser salvos. A obediência, que evidencia a renovação interior realizada por Deus, é necessária para a salvação final. Isto não significa que Deus exige perfeição. Todavia, o Novo Testamento exige que sejamos moralmente diferentes e andemos em novidade de vida. John Piper argumenta sobre esta doutrina da seguinte maneira: “Às vezes, eu pergunto às pessoas: por que você crê que acordará como um cristão amanhã de manhã? Por que acha que terá a fé salvadora quando acordar amanhã? Pergunto isto para testar o tipo de opinião da pessoa quanto à perseverança. A resposta bíblica não é: sei que escolherei crer amanhã de manhã. Estou comprometido com Jesus. Essa é uma confiança muito frágil. A resposta se acha em todos estes textos. Deus é fiel. Deus agirá em mim. Deus me guardará. Deus completará a sua obra até ao final. A resposta é o agir contínuo de Deus e não o meu compromisso constante. Quando faço esta pergunta, estou sondando se a pessoa tem a opinião de que a segurança eterna é como uma vacinação. Recebemos nossa vacina quando fomos convertidos e não podemos mais pegar a doença de incredulidade. Essa é uma analogia enganadora porque subentende que o processo de preservação é automático, sem a obra contínua do grande médico. A perseverança não é como uma vacinação, e sim como um programa de terapia vitalício em que o grande médico nos acompanha durante todo o tratamento. Ele nunca nos abandonará (Hb 13:5). Essa é a maneira de perseverarmos. É a maneira pela qual temos segurança.” O apóstolo Pedro nos dá uma última exortação sobre perseverarmos: “Portanto, irmãos, procurai fazer cada vez mais firme [ou confirmar] a vossa vocação e eleição; porque, fazendo isto, nunca jamais tropeçareis. Porque assim vos será amplamente concedida a entrada no reino eterno de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.” (2 Pe 1:10-11). É como se Pedro nos dissesse: “trabalhai para que realmente fique provado que não fostes chamados nem elegidos em vão”. Esta esta doutrina deve ser tratada com zelo e cuidado, para que ninguém

32


pense que por ser predestinado está livre para cometer toda sorte de pecados, longe disto (Rm 6:15), a evidência da eleição é atender à vontade de Deus revelada nas Sagradas Escrituras e obediência a ela – a própria predestinação é para o viver em santidade, para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas (Ef 2:10), temendo ao Senhor com humilde diligência e reverência, obedecendo sinceramente o Evangelho, pois a árvore boa dá bons frutos (Rm 11:5, 6, 20; 2 Pe 1:10; Rm 8:33; Lc 10:20; Gl 5:22; Mt 7:17, 18; Tg 3:10-13); apenas por esses frutos podemos ter a certeza de nossa salvação, caso contrário, a certeza da salvação será, apenas, falsa segurança baseada em fatores aleatórios. Glorificação Os corpos dos homens, depois da morte, retornam ao pó e veem corrupção (Gn 3:19; At 13:36), mas suas almas (que não morrem nem dormem), por serem substâncias imortais, imediatamente retornam para Deus, o doador delas (Lc 23:43; Ec 12:7); as almas dos santos, tendo sido aperfeiçoadas em santidade, são recebidas no mais alto dos céus, onde contemplam a face de Deus, em luz e glória, aguardando a completa redenção de seus corpos (Hb 12:23; 2Co 5:1,6,8; Fp 1:23; At 3:21 e Ef 4:10) (a Bíblia não se refere a um estado intermediário entre céu e inferno, chamado purgatório) . No último dia, aqueles que forem achados vivos, não morrerão, mas serão transformados (1 Ts 4:17; 1 Co 15:51, 52); e todos os mortos ressuscitarão com seus próprios corpos, não com de outros, embora com diferentes qualidades que serão unidas, novamente, com suas almas, para sempre (Jó 19:26, 27; 1 Co 15:42-44). Os corpos dos eleitos, pelo Espírito Santo, ressuscitarão para a honra; e serão conformados à semelhança do corpo glorioso de Cristo. (At 24:15; Jo 5:28, 29; 1Co 15:43; Fp 3:21). Adão, antes da queda, tinha a possibilidade de pecar ou não; quando ele cai, e com ele toda a humanidade, não há mais a possibilidade de não pecar. Quando somos regenerados, o Espírito Santo nos restaura a possiblidade de não pecarmos, embora ainda permaneçamos num corpo corrompido pelo pecado e inclinado ao mal. Em nosso estado glorificado, seremos não apenas sem pecados, mas também incapazes de pecar. Porém nossa incapacidade futura para o pecado não se dará porque Deus nos fará divinos, mas porque Ele nos preservará em um estado de perfeição. Com relação a isto, o céu não será simplesmente uma questão de Paraíso recuperado. O céu será um lugar melhor do que aquele que Adão gozou no Éden antes da queda, pois não haverá mais a maldição do pecado (Ap 21:4-5) e nem o risco de uma segunda queda em rebelião contra Deus. A Ele seja toda a glória, amém! Na tabela abaixo há um resumo do que foi dito nesta apostila, mostrando a mudança ocorrida, mediante a obra de Cristo na cruz, de nossa velha posição, mortos em pecado, para nossa nova posição, vivos em Cristo.

33


NOSSA VELHA POSIÇÃO 1. Sob juízo, condenados, sem substituto 2. Escravos do pecado, presos, sem direitos 3. Por causa do pecado, sob a santa ira de Deus 4. Declarados pecadores no tribunal divino 5. Éramos inimigos de Deus 6. Condenados sob a Lei 7. Espiritual e eternamente mortos, sem esperança 8. Escravos da nossa natureza pecaminosa

A OBRA DE CRISTO ATRAVÉS DA CRUZ Jesus nos substituiu, morreu em nosso lugar Cristo nos redimiu, pagou o preço e nos tirou da escravidão Jesus nos propiciou, satisfez o caráter justo de Deus Ele nos justificou, imputou a nós Sua justiça Cristo nos reconciliou com Deus Ele nos livrou da Lei Jesus libertou a graça do Espírito, nos deu o Espírito e a vida eterna Ele quebrou o poder dominador da velha natureza do pecado

9. Estrangeiros, alienados da família de Deus

Cristo nos preparou para a adoção do Pai

10. Sem meios de perdão como crentes

Ele providenciou a base do perdão

11. Subjugados ao pecado, à morte e a Satanás

Cristo derrotou o pecado, a morte e Satanás Ele é o primogênito na 12.Sem esperança futura, ressurreição, ascensão e aguardando juízo e o inferno glorificação Retirada de Franklin Ferreira, Teologia Sistemática.

NOSSA NOVA POSIÇÃO O castigo do pecado foi removido Somos remidos, libertos, e temos novo Senhor Somos livres da santa ira divina, propiciados Declarados juridicamente justos Agora temos amizade com o Deus Triúno Livres da Lei, pela fé Nascidos de novo, regenerados, selados, habitados pelo Espírito, vida eterna Somos libertos para viver obedientes a Deus Filhos, herdeiros para a adoção do Pai, maduros, com todos os direitos Perdoados, restaurados na comunhão com Deus quando confessamos Libertos do medo e o poder do mesmo Seremos como Ele, ressurretos, arrebatados e glorificados

Deus é o autor e realizador da salvação, pois pela Sua graça recebemos a fé. Tudo foi criado por Ele e está sob Seu controle, única e exclusivamente para Sua glória. Assim, é dever do cristão glorificar a Deus em tudo o que fizer, pois este é o propósito de toda criação: Deus ser glorificado através da vida de seus santos. (Sl 24:7-10; Sl 57:5; Is 6:1-3; Is 48:11; Rm 11:36; Rm 16:27; 1Co 10:31; Gl 1:3-5; Ef 2:8-9; Ef 3:20-21; Fp 4:20; 2Tm 4:18; Hb 13:21; 1Pe 4:11; 2Pe 1:2-3; 2Pe 3:18; Jd 25; Ap 1:5-6; Ap 4:11; Ap 5:12-14) Este é um dos pilares da Reforma, Soli Deo Gloria (Glória Somente a Deus). Portanto, reafirmamos que, como a salvação é de Deus e realizada por Deus, ela é para a glória de Deus e devemos glorifica-Lo sempre. Devemos viver nossa vida inteira perante a face de Deus, sob a autoridade de Deus, e para Sua glória somente. Finalizo este trabalho citando uma oração puritana chamada A Trindade, a qual devemos nos apropriar dela e nos apresentarmos diante de Deus com tais palavras em ação de graças pela poderosa salvação que recebemos.

34


TRÊS EM UM, UM EM TRÊS, DEUS DA MINHA SALVAÇÃO, Pai celestial, Filho bendito, Espírito eternal, Eu te adoro como único Ser, única Essência, único Deus em três Pessoas distintas, por trazeres pecadores ao teu conhecimento e ao teu reino. Oh Pai, tu me amaste e enviaste Jesus para me redimir; Oh Jesus, tu me amaste e assumiste a minha natureza, derramaste teu sangue para lavar meus pecados, operaste justiça para cobrir a minha indignidade; Oh Santo Espírito, tu me amaste e entraste em meu coração, lá implantaste a vida eterna, revelaste-me as glórias de Jesus. Três Pessoas e um só Deus, bendigo-te e louvo-te, por amor tão imerecido, tão indizível, tão maravilhoso, tão poderoso para salvar os perdidos e elevá-los à gloria. Oh Pai, rendo-te graças, pois em plenitude de graça Tu me deste a Jesus, para ser d’Ele ovelha, joia, porção; Oh Jesus, rendo-te graças, pois em plenitude de graça Tu me aceitaste, me esposaste, prendeste-me a ti; Oh Espírito Santo, rendo-te graças, pois em plenitude de graça apresentaste-me Jesus por minha salvação, implantaste a fé dentro em mim, subjugaste meu coração contumaz, fizeste-me um com Ele para sempre. Oh Pai, tu estás entronizado para ouvir as minhas orações, Oh Jesus, tuas mãos estão estendidas para receber as minhas petições, Oh Espírito Santo, tu estás pronto para socorrer-me em minhas fraquezas, para mostrar-me a minha necessidade, me suprires de palavras, orares dentro em mim, para fortalecer-me de sorte que eu não desanime de suplicar. Oh Trinitário Deus que comandas o universo, tu me ordenaste pedir por essas coisas concernentes ao teu reino e à minha alma. Faz-me viver e orar como alguém batizado em teu triplo Nome.

Bibliografia A cruz de Cristo – John Stott Cinco Pontos – John Piper Finalmente Vivos – John Piper O que é fé? – R. C. Sproul O que é arrependimento? – R. C. Sproul

35


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.