Livro Reportagem Parto Humanizado

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p a r t o humanizado

Historias reais de nascimentos /


Pontifícia Universidade Católica de Goiás Escola de Comunicação Social Curso de Jornalismo Trabalho de Conclusão de Curso - 2018/1

Autora Aline Costa Bezerra Orientadora Maria Carolina Giliolli Goos Capa Ketllyn Fernandes de Deus Diagramação Thereza Sanvés Fotos Arquivo Pessoal

p a r t o humanizado

Historias reais de nascimentos /

Aline Bezerra


Agradeço a minha mãe, que com seu exemplo, me fez forte. A minha amiga Carolina Goos que me guiou nessa empreitada tão enriquecedora. As minhas irmãs que são exemplo de mulheres para mim, a psicóloga Ranielly Lopes que me auxiliou em meu processo de autodescoberta e para aqueles que mesmo de forma indireta me ajudaram na realização desse projeto. Dedico a todas as mulheres que tiveram seus partos roubados e para aquelas que, diariamente lutam por suas escolhas.


“Viver, Catarina, é rearranjar nossos cacos e dar sentido aos nossos pedaços, os novos e os velhos, já que não existe a possibilidade de colar o que foi quebrado e continuar como era antes.” Eliane Brum


Sumário

Prefácio

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O propósito

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Assembleia Legislativa de Goiás

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Uma escolha diária

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O ato de compreender

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Herança para os filhos

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No embalanço do amor

68

O nascimento de uma guerreira

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Dona de suas escolhas

84

A força que vem do medo

92

Memórias

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Posfácio

127


A escolha de Aline Prefácio

A

função que cada atividade humana desempenha na sociedade deveria servir, em princípio, para uma causa nobre. Essa sempre está associada a alguma ação de serviço ao próximo, de atendimento a necessidades reais da sociedade. É assim que, se pensa, o médico ajuda a curar, o engenheiro constrói viadutos que unem regiões da cidade, o empresário gera empregos e faz a roda da economia andar, o policial protege, o artista compartilha criatividade, o ídolo do esporte promove projeções de emoções. E o jornalista? A pergunta ronda as cabeças dos profissionais de vez em quando. Mesmo dos veteranos, mais dos novatos inquietos pelo senso de justiça e valor de muitos que estão entrando na profissão. Para que ação nobre serve o jornalismo? Quem embarca nessa angústia de questionamento existencial acaba descobrindo que na nossa civilização 13


dual toda profissão – como todo ser humano – tem o seu lado luminoso e o seu lado sombrio. Há profissionais que se afinam com a polaridade positiva, do aspecto mais nobre da atividade, há os que descambam para a polaridade sombria que mancha a imagem do que sua profissão de escolha representa. Existem os advogados que salvam da injustiça o inocente sem recursos levado à barra dos tribunais, assim como há os que na maior falta de caráter manipulam as curvas tortas da nossa justiça imperfeita para livrar da merecida pena o mais patife dos nossos criminosos do colarinho branco. Há as professoras que estimulam e amparam a timidez de aprendiz de crianças pequenas noviças na escola, como há as que sem o mínimo de tato lhes batem com a régua na cabeça, humilhando-as diante da classe por não saberem a tabuada do três. É o mesmo com o jornalismo. As reportagens e notícias podem gerar um efeito sutil na psique do receptor da mensagem. Conforme sejam trabalhadas, dependendo da intenção e da postura do emissor da mensagem, podem produzir o que na psicologia social Dante Moreira Leite caracterizou, há muito tempo, de

pensamento produtivo ou pensamento destrutivo.

Honram e dignificam o leitor, quando honram e dignificam as pessoas sobre as quais os jornalistas escrevem. Desrespeitam e desonram o leitor quando o tratam – e às pessoas em seus textos, reportagens, comentários e notícias – com desdém, preconceito, maledicência. A escolha de qual caminho seguir está, muitas vezes, nas mãos do profissional. No jornalismo, quando a opção tomada é pela via da luz, o profissional tem às 14

mãos o mais importante e diferenciado instrumento de ação dessa atividade, que é a arte de contar histórias centrada num profundo respeito pelos protagonistas de suas narrativas. É dar voz a quem não tem. É buscar compreender o semelhante da maneira a mais empática que o jornalista for capaz. É construir um elo entre seu protagonista e todos nós, irmãos de jornada da existência. É permitir que as histórias vividas e apreendidas na interação honesta e sincera com ambientes, casos e pessoas igualmente sensibilizem o receptor da mensagem, abrindo-lhe novas maneiras de dar sentido ao mundo. É registrar as experiências de viver dos nossos semelhantes, as mesmas que nos conectam a eles e a nós próprios. Movida por esse rasgo de humanidade próprio, Aline Bezerra embarca na sua viagem pelo mundo do parto humanizado. Apoiada pela orientadora que igualmente se revela disposta a abrir para a orientanda sua condição de também mãe, a professora Carolina Goos, mergulha nas histórias de mulheres valorosas que em Goiânia enfrentam o desafio de trazer dignidade a esse momento potencialmente tão sublime da espécie, o nascimento. Sublime, mas vilipendiado muitas vezes pelo pavor da ignorância social quanto à fragilidade e a majestade do ato de nascer, rudemente agredido por aqueles da atividade médica que cospem no seu Juramento de Hipócrates, esquecem do compromisso com o amor ao próximo e ao respeito, partem para a surda violência obstétrica, escolhem infligir a dor e o horror. Agridem a mulher, agridem a mãe, agridem o bebê, violentam a vida, mesma. A autora se revela sintonizada com a polaridade 15


construtiva e sadia do ofício de contar histórias. Seu entusiasmo pelo poder das palavras, despertado pela graciosa condução criativa da professora, é a melhor promessa de que se lança para a profissão disposta a fazer valer, de maneira luminosa, o talento potencial que aqui desabrocha suas primeiras flores. Edvaldo Pereira Lima (Escritor, jornalista, professor universitário) www.edvaldopereiralima.com.br

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O propósito Capítulo 01

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D

izem que tudo na vida existe uma finalidade, e as pessoas que atravessam seu caminho fazem parte dela. A escolha do tema deste livro veio de uma ruptura em uma terça-feira à noite, em 2013. Era um dia comum em uma turma do curso de jornalismo. Os alunos ocupavam cadeiras azuis escuras, que estavam enfileiradas nas laterais da sala de aula e algumas outras espalhadas. De repente as conversas paralelas cessaram, uma mulher entrou na sala, e como era início de semestre, logo desconfiei que seria a professora nova da disciplina de produção de texto. Não era uma aula tão aguardada, afinal, quem sonhou um dia em ficar ofuscado por palavras? Todos ali, admitindo ou não, já se imaginaram, ao menos uma vez, com os holofotes da TV, de estarem ocupando uma bancada enorme no lugar daqueles que víamos todos os dias anunciando as mais diversas notícias dentro de nossas casas, mesmo sem estarem lá. Ela logo se apresentou. Falou um pouco da carreira, mas já foi informando o que esperaria de nós. Um 19


vestido alegre com bolinhas iluminava por onde passava e sua experiência nos fez pensar que sim, o jornalismo era além do glamour da televisão. Ao fim da aula, todos estavam ansiosos pelo que surgiria dali em diante. Um dia, após explicar o conteúdo, ela nos fez olhar para uma janela e dizer o que víamos. A princípio todos se olharam e pensaram: “- O que ela está falando?” Era óbvio o que tinha lá. Havia um prédio já com cores desbotadas, embaixo tinham vários alunos, alguns sentados, outros andando e no céu, quase não tinham estrelas. Mas para minha surpresa, ela começou a falar o que via. No começo pensei que não passavam de devaneios, mas aos poucos tudo começou a fazer sentido, pois a professora, via histórias, enxergava a subjetividade em cada detalhe, em cada rosto, em todas as chuvas que caíram para tirar a tinta daquelas paredes, em cada pessoa que as gotas molharam, em cada traço de fôlego que passou por ali. Ao longo das semanas, fui me surpreendendo, em como um olhar sensível poderia mudar tudo a nossa volta. Naturalmente o texto e a escrita, começaram a fluir. Pude acessar cada sentimento dentro mim e descobrir outros tantos. Um dia, tivemos uma aula externa, no auditório do Oscar Niemeyer, na saída de Goiânia. Na época não tinham tantos condomínios horizontais em volta, então o local era de difícil acesso e meio deserto. Eu trabalhava do outro lado da cidade, então já cheguei em cima da hora. Já não haviam cadeiras disponíveis, eu e meu amigo Luiz, sentamos no chão mesmo. A nossa frente, em um palco simples, a jornalista Eliane Brum estava sentada, esperando o sinal para começar, então ela leu. Apenas leu. Naquele momento, com as palavras da jornalista, pude imergir em mim para conseguir enxergar o outro. Dia marcante na minha vida. Após aquela noite, comecei a amar a escrita, o 20

semestre acabou, mas sempre continuei em contato com a professora, a verdade é que nos tornamos amigas. Passados alguns meses, a grande notícia: estava grávida. Uma bebezinha estava a caminho para agitar o mundo aqui fora, e com isso continuou inspirando e ensinando, mas dessa vez, fora da sala de aula. Em 2016, tive que escolher o tema do trabalho de conclusão de curso, optei por fazer algo que tinha envolvimento, e o parto humanizado se aproximou de mim e se tornou uma possibilidade de pesquisa a ser explorada. Já estava em contato com toda militância da professora mesmo quando ainda estava com sua bebezinha em seu ventre, e por mais que eu não estivesse esperando um filho ou uma filha, senti nitidamente que a luta também me pertencia. Aquele ano, o cenário em Goiânia era outro, quando se falava em Parto Humanizado, as pessoas já concluíam que se tratava exclusivamente de mulheres que queriam parir no meio do mato. Mas era além disso. Ainda é.

Alma Gêmea Fui conhecendo outras mulheres, suas histórias, partos traumáticos, lutas, conquistas, dores, lágrimas e suas alegrias. Sinto que tive o privilégio de vivenciar essas experiências, mas por uma escolha muito pessoal, quando minha mãe passou por problemas sérios de saúde e precisou parar de trabalhar, tive que assumir todas as despesas de casa, que até então eram divididas. Dei um tempo no projeto, pois naquele momento optei por trabalhar em dois empregos. Eu me via com milhões de responsabilidades e sentia que devia isso a minha mãe. Ela que me ensinou desde meus primeiros anos sobre lutar quando a vontade era de desistir, sobre acolher e não abandonar, sobre o 21


que uma mulher negra era capaz de conquistar em um mundo dominados por brancos. Eu a escolhi porque

há vinte e seis anos ela havia me escolhido.

Nos meses que fiquei afastada do projeto, a professora sempre esteve presente. Ela que tornou a maternidade sua militância, nasceu prematura por uma cesariana, já que sua mãe teve sangramento. Mas em sua memória, não havia nada que lembrasse histórias de partos. Quando ela engravidou, se aproximou ainda mais das ideias de empoderamento do corpo, agregado a isso ela fazia pilates, natação, hidroginástica, pequenas caminhadas com sua cachorrinha Amora e às vezes se permitia até uma corridinha no bairro. Mas também conheceu histórias de mulheres que sofreram diversas violências obstétricas e outras que lutaram por um parto humanizado. O medo por qualquer tipo de cirurgia, por mais pequena que fosse, sempre a distanciou da cesariana, por isso buscou formas de fazer um parto natural, da forma que tinha sonhado. Sua rotina foi de pesquisas, leituras de artigos e relatos de mães que viveram essa experiência. Viu que todas as fases deviam ser vivenciadas, inclusive o nascimento, tanto para ela quanto para a bebê. Uma preparação financeira foi necessária, já que na época e ainda hoje, em Goiânia, poucos profissionais seguem essa linha de pensamento e trabalham com formas mais humanizadas. Mesmo longe de casa, já que sua família é de Araraquara, no interior de São Paulo, seu círculo de pessoas foi fundamental para sua estrutura emocional. Ela tinha um companheiro, amigos e profissionais que ela confiava ao seu lado. Foi no pré-natal que ela descobriu que sua filha tinha um nó no canal do xixi, então era necessário ficar sempre em observação. Com 39 semanas de gestação foi 22

detectado uma dilatação na região urinária da neném, um dos médicos que fazia seu acompanhamento, imediatamente sugeriu uma cesariana, mas tinha outra orientação, de outro médico que também a acompanhava, depois de uma análise bastante criteriosa, foi confirmado que se poderia esperar pelo parto natural. Confiante esperou. Na companhia acalentadora de sua mãe, de sua cachorrinha que dormia em cima de sua barriga e de seu companheiro simplesmente esperou. Doutor Luiz Carlos Pinheiro, o médico que despertou nela desde o primeiro momento uma paz sem medida, que respeitava suas limitações e expandia sua liberdade. E nesse momento de preocupação soube orientar ela de forma eficaz. Quando ela completou 40 semanas, fizeram uma indução do parto e lá se foram várias horas trabalho de parto. Era uma tarde de sábado, 9 de agosto de 2014. A Maternidade Modelo, localizada no setor Sul de Goiânia estava tranquila: era apenas ela e mais uma futura mamãe, o que a deixou sossegada. A exaustão a fez pedir analgesia, pois não suportava mais as dores, queria vivenciar aquele momento da melhor forma. Tanto que levou para o quarto vários itens que a deixaria mais à vontade. Um abajur foi usado para que o quarto ficasse com uma luz mais aconchegante. Durante a gravidez, pediu para suas amigas de São Paulo enviarem músicas para ela. Na hora do parto, aquelas canções as uniam de alguma forma. Para a ocasião, um vestido de praia foi escolhido porque ele expressava tranquilidade. A sua bola de pilates foi usada para exercícios de relaxamento do corpo, além banhos quentes. Seu companheiro, o tempo todo ao seu lado, vivenciando o parto com ela e de alguma forma o dele mesmo. 23


A inquietude de seu corpo não a deixava parar de imaginar como seria vê-la a primeira vez. Por muito tempo ela idealizou aquele momento. O instante que a luz da sua vida chegaria ao mundo. Tudo que ela escolheu anteriormente era para aquele momento e ela pagou o preço. Após 25 horas, ela nasceu em um domingo, às quatro e quinze da tarde, era Dia dos Pais, e uma luz iluminava a sala de parto azul assim como o rosto da neném. Ela logo foi para seu colo. O momento mais mágico de vida. Aquela bebezinha agora do lado de cá estava quentinha, úmida e brilhava, brilhava e brilhava.

A ruptura

Para aqueles que acreditam em almas gêmeas, as duas foram feitas uma para a outra.

Ali nasceram duas vidas. Uma nova mulher surgia dentro dela, alguém inimaginável. Ela entendeu que a dor fazia parte do nascimento. E quando a professora Carolina, agora mãe, pegou em seus braços sua Elis, entendeu que tudo que ela tinha vivido na vida era para aquele momento, naquele instante de vida. A ruptura na vida de Carol se assemelha com as minhas. Mal sabia eu, que olhar por aquela janela me traria para onde estou hoje. Ela conheceu sua alma gêmea há quase quatro anos, e eu, estava ao lado da minha por vinte e seis anos, mas só agora me dei conta disso. Ainda não sou mãe, mas através deste livro, pude viver ao menos um pouco do que elas viveram. Mulheres que assim como a minha mãe, não se calaram, não desistiram de lutar por algo que elas idealizam. Não sou mãe, mas sou filha, mulher e aprendi a contar histórias reais. 24

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Assembleia Legislativa de Goiás, 27 de abril de 2018. Capítulo 02

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ara muitas mulheres era apenas uma tarde comum, mas para as mães que estavam sentadas no auditório Solon Amaral naquela terça-feira, era um dia significativo. Presidida por um homem, um deputado que justificou sua ação por ter vivenciado através de sua mãe práticas negligentes, causando sequelas em seu irmão. A mesa que compunha a audiência pública era composta por mulheres representando a sociedade da Associação das Doulas do Estado de Goiás, Secretaria Cidadã de Goiânia, Secretaria de Saúde, OAB Goiás. Ao fundo, haviam mulheres da Associação das Surdas do Estado de Goiás e uma intérprete de libras para se comunicar com elas.

A Pauta: violência obstétrica.

O local é dividido ao meio. Na parte de frente várias mesas e cadeiras para aqueles que iriam falar ao longo da audiência. Na parte de trás várias mulheres com suas crianças, algumas ainda pequenas. Era possível ver que elas seguravam três faixas com os seguintes dizeres: “Associação das Doulas do Estado de Goiás”, 27


“Meu corpo minhas regras” e “Violência obstétrica, Violência contra a mulher”.

Nos olhos, um pesar enorme que demonstrava que algo muito terrível tinha acontecido, mas em nenhum momento esmoreciam, porque sabiam que o futuro poderia mudar e toda dor sentida um dia poderia ser a última se nunca mais outra mulher sofresse. Os relatos começaram, e eu que nunca pari uma criança senti tanto medo, não da dor do parto, mas do que o ser humano é capaz de fazer. A primeira mulher a expor o que tinha vivido, Maria, que havia dado à luz no dia 31 de março e mesmo com toda as dificuldades para sair de casa com um recémnascido, todas as dores físicas e psicológicas que ela sentia, estava presente. Com o filho nos braços se levantou para contar o horror que viveu. Sua gravidez foi de risco e seu filho nasceu prematuro na Maternidade Fêmina em Goiânia. Sentiu durante um mês inteiro contrações fortes e quando foi para a maternidade se viu abandonada. Sua doula era sua única companhia

e não a permitiram entrar. Foi tratada de forma desumana desde a recepção. Enquanto agonizava de dor, um segurança quis obrigar que ela saísse do corredor porque ali não era permitido ficar. Por 24 horas ela tentou o parto normal até que vencida pela exaustão, decidiu pela cesariana, (os exames de toque eram feitos em intervalos curtos o que se configura violência uma vez que não há necessidade desse excesso e outros procedimentos menos invasivos poderiam ser utilizados com a mesma finalidade, para saber a posição do bebê e o quanto a mulher dilatou). Colocada nua em uma maca fria à força, após o anestesista gritar para que ela 28

mesmo deitasse, pois, ele não teve paciência de esperar uma mulher com fortes dores se acomodar sozinha. A cada toque em seu corpo ela gritava de dor. Estava muito sensível, viera de uma gestação complicada, é mãe solo, além da síndrome do pânico que faz com que tudo que ela sente fosse ampliado, então por conta do barulho que Maria fazia, a ameaçaram amarrar na maca. Implorava pela sua doula e não a deixaram entrar. Após todo o procedimento cirúrgico, ela relatou que ficou sozinha e só pegou seu filho no colo após uma hora de espera. Passados aqueles momentos tão tenebrosos, quando pôde voltar sua rotina, foi acolhida por aqueles que a amam e revisitou tudo que viveu dentro daquela Maternidade, e decidiu por processá-la. Posterior ao primeiro depoimento, várias mulheres no auditório se sentiram encorajadas e começaram a relatar toda violência sofrida ao longo de suas gestações. A primeira-dama de um dos municípios de Goiás que estava presente, relatou que há dezenove anos seu irmão foi tirado a força da barriga de sua mãe. Com o auxílio de uma intérprete de libras, Silvia, uma mãe da Associação das Surdas do Estado tornou pública sua história. Quando sua bolsa rompeu, munida do cartão do plano de saúde foi para o Hospital Jardim América. Para compor o início de mais uma história de violência, no hospital não havia uma funcionária sequer apta a se comunicar com ela, todas usavam máscaras na boca o que impossibilitou que ao menos ela fizesse leitura labial. Foram momentos angustiantes, ela tentava reclamar da dor, mas ninguém fazia a mínimo esforço de entendê-la. Não deixaram sua mãe entrar para que ao menos fosse ponte de comunicação. Marilia, outra mulher surda, relatou que quando foi ter sua filha, em sua segunda gestação, a mãe combinou com o médico de fazer uma laqueadura sem ela saber, 29


quando quis ter mais filho foi que descobriu. Aos 26 anos, Vanessa engravidou. Com intuito de não ter surpresas, fez todo o planejamento do parto no Hospital Jardim América. Sua bolsa rompeu no sétimo mês de gravidez e informaram para ela nesse Hospital que precisariam de uma UTI Neonatal, mas o local não tinha esse serviço. Naquele momento ela foi tomada por um desespero e foi pra Maternidade pública Dona Iris, lá foi atendida em quinze minutos, ficou vinte e seis horas em trabalho de parto, não sentiu dor, seu filho não precisou de UTI e ainda foi registrado na própria Maternidade. Uma enfermeira que também atua como doula, Fernanda expôs sobre a importância do assunto. Também foi vítima de violência obstétrica em sua segunda gestação. O profissional que fez seu parto realizou um procedimento chamado descolamento de membrana, que é quando o médico estimula a bolsa amniótica para induzir o parto, sem informála. A enfermeira só soube porque sentiu bastante dor e sangrou muito. A situação a deixou com bastante medo.“A violência obstétrica, é um tipo de violência

que marca muito a mulher, pro resto da vida, algumas mulheres sofrem tanta violência que não querem nem engravidar de novo” narrou.

A presidenta da Associação das Doulas do Estado, Michele Cristina de Oliveira fez um discurso informando sobre a importância do tema, que é necessário primeiro identificar a violência, pois muitas mulheres não sabem que foram vítimas. A violência não é apenas na área médica, mas de todos que influenciam direta ou indiretamente no processo, ou seja, da recepção até o momento de alta dessa mãe. Além disso, a Associação reivindica um local para denúncias, que hoje no Estado 30

não existe, uma cartilha com informações de fácil acesso em todas as maternidades públicas e particulares, além de propagandas interativas. A advogada militante das causas em defesa da mulher e integrante da Comissão OAB-Mulher, Valéria Eunice Mori Machado, também explanou sobre assuntos relacionados a violência obstétrica. Para ela, essa luta não deveria nem existir pois são direitos óbvios, não se trata de favores, mas sim de obrigações que qualquer profissional deve ter. A fim de coibir qualquer agressão, a advogada sugere inclusão de filmagens nos partos, aprovação de leis estaduais com as diretrizes do Ministério da Saúde, planos de partos padrões e seguidos fielmente. Ao final da audiência, instituíram uma comissão para decidir as demandas sobre o assunto. Entre eles a criação de um disque-denúncia, uma cartilha com informações incluído todas as leis nacionais, estaduais e municipais sobre o direito da gestante e determinar que na segunda-feira da segunda semana do mês de maio será comemorado o dia contra a violência obstétrica. Ainda há muita luta, mas uma vitória pôde ser comemorada: no 25 de abril de 2018 foi aprovado na Assembleia Legislativa do Estado, o projeto de lei que permite a presença de doulas em hospitais públicos e privados de Goiás. Vetado pelo Governo do Estado anteriormente, dessa vez o autógrafo¹ de lei n° 521/16 foi votado e por 24 votos à 3 o texto se tornará lei. Os deputados entenderam que a atuação das doulas 31


proporciona apoio psicológico e moral às gestantes. Michel Odent, médico obstetra, precursor do parto humanizado no mundo, na década de sessenta, relata em seu livro, O Renascimento do parto, que a medida que sua prática adotada mudou a configuração dos nascimentos no Hospital de Pithiviers, no interior da França, as atitudes também foram alteradas. A partir do momento que conhecia suas pacientes como indivíduos e não como casos médicos, sua abordagem mudava para algo que realmente correspondia todas as necessidades daquela gestante. Goiânia segue para conquistas no campo do parto humanizado, mesmo que os acontecimentos sejam tardios, é preciso se espelhar em modelos de sucesso para que seja feita uma mudança real e que altere a realidade de tantas mulheres. Ao longo desse livro, você vai conhecer a história de pessoas que mudaram suas práticas, modificando a realidade própria e a dos outros.

¹É o documento oficial com o texto da norma aprovada em definitivo por uma das Casas do Legislativo ou em sessão conjunta do Congresso, e que é enviado à sanção, à promulgação ou à outra Casa. *O nome das mães, cujo relatos foram descritos nesse texto, foram alterados a fim de evitar exposição.

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Uma escolha diária Capítulo 03

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ara compreender o diferencial de alguns médicos obstetras foi necessário entender e conhecer um profissional. Doutor Luiz Carlos Pinheiro, médico obstetra em Goiânia, o único na capital que atende por plano de saúde da linha humanizada. Ao chegar em seu consultório já se percebe o modo como encara sua profissão. O lugar mais parecia uma sala de meditação, com luzes mais baixas e uma música que fazia qualquer uma relaxar só de estar lá. No canto da parede uma estante com uma infinidade de lembrancinhas de nascimento, a sensação é que carinho e gratidão tinha forma e cor. Tons de rosa e azul claro bem delicadinhos de todo tipo de formato e tamanho: ursinhos, lacinhos, bebezinhos, bebezinhas, corações, fraldinhas, mamadeiras, aviões, leãozinhos. Aquela estante conta mil histórias por si só. Por todo lugar haviam porta-retratos familiares e o lugar transbordava afeto. A sala tinha cheiro de aconchego e as cores, de tons neutros, passava uma sensação de equilíbrio. As poltronas eram espaçosas e confortáveis. 35


A sensação que tive quando sai da recepção e entrei em sua sala, foi que estava em outro lugar, como um portal mágico que me levaria a outra dimensão. A curiosidade maior era saber como aquele homem, dentre tantos médicos com a mesma formação, tinha um posicionamento tão diferente da grande maioria. Eu imaginava que após anos de experiência, ele pensou em tentar de outra forma, mas não foi assim. A história se inicia quando ele ainda era estudante de medicina na Universidade de Brasília. Pinheiro teve a sorte de ter aulas com um professor já aposentado que fazia e ensinava tudo de maneira diferente. Era comum as mulheres ficarem de jejum durante o trabalho de parto, habitualmente deitadas e tanto os médicos como os residentes não sabiam o nome das pacientes. Elas eram tratadas pelo número do leito que ocupavam. Doutor Luiz lembra que quando as mulheres passeavam pelos corredores, os residentes entravam em pânico, pois imaginavam que os bebês iriam nascer ali mesmo no corredor, mas o professor conversava com elas pelo nome, dava água, tudo para tranquilizá-las. Naquela época ainda nos anos noventa, não tão diferente de hoje, era consenso que a cesárea tinha que ser logo feita. E esse professor ensinava o contrário. Ele criava um laço com aquelas mulheres. Todo esse novo modelo de comportamento despertou algo em Luiz. Seguia o professor por todo canto e aprendeu a tratar as pacientes do modo que considerava ser o mais adequado. Logo depois, ele iniciou sua residência médica em Goiânia, no Hospital das Clínicas. Agregado à essa experiência em Brasília, no segundo ano, uma professora chegou no Hospital e passou a mostrar para os alunos as práticas desumanas que eles praticavam, como deixar as mulheres entrarem para terem seus filhos sozinhas em um momento tão 36

importante da vida delas. Faziam exame de toque sem trocar uma palavra com a paciente, não deixavam elas comerem, o que tornava aquele momento algo realmente ruim. Quando o bebê nascia, para os médicos era só mais um. Ele então começou a se questionar sobre tudo que aprendeu, como agia frente as suas pacientes, se lembrou de tudo que o professor aposentado tinha lhe ensinado. Ao final de sua residência, ele passou uma semana em Ceres, no interior de Goiás, e aprendeu ainda mais sobre humanização, pois o hospital já era referência neste tipo de atendimento. Doutor Luiz passou um tempo em Minaçu trabalhando como Clínico Geral, quando voltou a Goiânia conheceu o médico Sebastião Moreira, que trabalhava na Maternidade Nascer Cidadão. Nessa época, em meados de 2000, Doutor Sebastião queria introduzir acompanhante na sala de parto e os pais/ companheiros passaram a participar dos partos. Como era algo muito novo, já que antes, os pais iam ver seus filhos horas depois já com a mãe, houve um certo estranhamento, pois eles não sabiam como realmente funcionavam as coisas, viam a forma que os bebês nasciam e ficavam horrorizados, então foi um pouco difícil até introduzir isso na comunidade. Em seu consultório, desde o início já praticava o atendimento humanizado. Com os colegas de profissão, o médico diz que foi até apelidado como ‘maníaco do parto’ pois todos considerava estranha tanta liberdade para as parturientes. Houve maternidades que convidou o médico a se retirar já que os trabalhos de partos duravam horas e isso não era nada interessante, pois enquanto acontecia um parto normal, várias cesáreas eram realizadas, e isso é bem mais rentável. Ele que até hoje não é muito aceito, fala que já criaram boatos de todas as dimensões, mas que aos poucos foi conquistando 37


seu espaço. Em vinte anos de carreira, Doutor Luiz já fez mais de cinco mil partos e avalia a importância do acompanhamento da mulher de forma eficaz. O parto normal exige uma dedicação maior, essa mulher precisa ser acompanhada para ver se o seu estado de saúde, físico e psicológicos estão bem. Quando questionado sobre cesariana, ele é categórico em dizer que é importante não vilanizar a cirurgia, uma vez que é um procedimento que mais salva vidas, e que seu problema é o excesso.

Por que humanizar? Para o Doutor, a expressão ‘Parto Humanizado’ tem sido mal-empregada. Para muitos essa expressão é sinônimo de parto de cócoras, para outros é o parto na água ou parto normal sem anestesia. Ele alega que não, que parto humanizado é o profissional dar seu melhor, oferecer aquilo que há de melhor para a mãe e para o bebê sem deixar de lado a família, que também tem um papel muito importante e atuante em todo o processo. Ressalta que é importante reconhecer que a escolha sempre é da mãe dentro daquilo que é seguro. O médico está ali para atuar dando liberdade para que a mulher possa escolher o que é melhor para ela e para sua filha ou filho, sempre com segurança e sem intervenções desnecessárias. Ele afirma que também é importante se desvencilhar do radicalismo, muito presente hoje em dia. Quando intervenções são necessárias devem sim ser feitas, isso não torna o parto desumanizado. Nisto exemplifica casos de mulheres que rompem a bolsa e não entram em trabalho de parto, mas se negam a usar algum tipo de medicamento como ocitocina. Isso passa a ser um 38

risco para o bebê, uma vez que pode contrair algum tipo de infecção. Então o radicalismo torna o processo perigoso. Doutor Luiz observa que quando se deixa a parturiente livre, se movimentando da forma que diminuam as dores, evita uma série de intervenções como um corte, que consequentemente possibilita uma infecção. O parto da mulher passa a ser uma experiência mais prazerosa quando se está ao lado de uma pessoa que lhe traz mais segurança como a doula ou o companheiro. Vários médicos forçam as contrações das mães para que o parto aconteça depressa e isso é muito perigoso já que o uso excessivo de ocitocina pode levar sofrimento fetal, afirma o Doutor. Já a cesariana, a mulher corre risco de ter hemorragia que pode se estender as próximas gestações. A mãe que opta pelo parto normal, muita das vezes produz uma quantidade certa de ocitocina, e poderá ter mais facilidade em ter leite o que facilita a amamentação.

“Quando o bebê passa pelo canal vaginal inúmeras bactérias benéficas fazem com que ele tenha mais resistência a doenças na infância. Ao amamentar ele recebe anticorpos da mãe. Na cesariana isso não acontece, pois, a primeira flora bacteriana que o bebê recebe é do obstetra, do enfermeiro e não da mãe, causando até diabetes na primeira infância”, afirma ele. Conta que “existem estudos que mostram que

cidades com o mesmo nível socioeconômico e que há muitas cesarianas agendadas existe mais violência, já que quando você tira um bebê da barriga na hora que ele menos espera, tiram o líquido da bolsa, corta o oxigênio dele através do cordão umbilical, tudo isso 39


também é uma violência já nos primeiros instantes de vida daquele bebê. No parto normal isso é diferente, ele trabalha para nascer, assim como a mãe ele também passa por um processo”.

Sobre o processo, o Doutor conta que as horas que a mãe passa em trabalho de parto também a ensinam sobre ser mãe. Como os partos duram de duas até doze horas em média, essa mulher está aprendendo a ter paciência, a cuidar do filho após seu nascimento, uma vez que na maternidade não há nada programado. O bebê não sabe qual é a hora do seu almoço, a hora de um compromisso, então a mãe precisa parar tudo e alimentá-lo. E isso começa no parto normal. Quando você não agenda a hora que seu filho ou sua filha vai nascer. “A maternidade tem o poder de interromper você”, afirma o médico. Doutor Luiz pondera que as mães que marcam cesariana não são menos mães que as outras, mas que se elas soubessem o mal que essa cirurgia faz quando utilizada sem nenhuma necessidade, elas optariam pelo parto normal. Burocracia pra nascer

“No Brasil, as mulheres são convencidas a fazer uma cesariana, e isso por muitas razões”, explica o médico. Os convênios por exemplo pagam o mesmo valor para o profissional por uma cesariana e por um parto normal, a diferença é que a cirurgia é feita em quarenta minutos quando o parto normal leva horas. Ele avalia que o próprio sistema faz com que os profissionais façam essa escolha. Em outros países, as mulheres são assistidas por um médico e uma enfermeira, quando 40

as mães entram em trabalho de parto, elas vão para o hospital, lá são acompanhadas pelos profissionais de plantão, quando os turnos deles se encerram, outros profissionais continuam o atendimento. Aqui no Brasil não é assim, afirma ele, as pessoas são ligadas ao próprio médico, como alguém insubstituível, e quando, por vários motivos, a mulher não consegue entrar em contato com o profissional isso acaba em processo pois ela se sente desamparada porque aquela pessoa em si, quando na verdade há uma gama. de profissionais tão bom quanto. Ele entende que essa estrutura da mulher ser muito apegada ao médico facilita a cesariana, já que os médicos não são onipresentes. Outra profissional muito importante nesse processo na visão de Luiz, são as doulas. Elas fazem toda assistência a parturiente e esse trabalho aumenta em muito as chances de um parto normal, pois fazem um trabalho específico para cada gestante e atende as necessidades de cada tipo de mulher e suas limitações. Doutor Luiz é claro em dizer que o trabalho das doulas quando bem desempenhado é importantíssimo em todo o processo. Sob o olhar clínico é possível constatar os benefícios: diminui o uso de analgesias, as mulheres ficam mais tranquilas e conseguem passar pelo parto de forma mais enriquecedora, tanto fisicamente quanto psicologicamente.

Intervenções Os recursos utilizados durante o parto são muitos, há opções naturais e farmacológicas. Para o Doutor Luiz todos esses métodos trazem melhorias quando utilizados de maneira coerente. A analgesia por exemplo, ela pode reduzir em até 80% a intensidade das dores, mas só deve ser administrada quando os recursos 41


naturais não forem suficientes, como relaxamento, respiração, movimentação, banhos mornos. O uso é indicado quando a dor está insuportável para a futura mãe. Esse artifício pode retardar ou acelerar o parto. Quando é administrado no início do parto corre o risco de se transformar em uma cesariana. Já quando a mulher está muito nervosa e não consegue relaxar de forma alguma, a analgesia vai ajudar com que ela fique mais tranquila, e pode até acelerar o processo do parto. Neste caso, o malefício é que uma intervenção acaba puxando a outra. Com o uso de analgesia as contrações são diminuídas, por isso é necessário romper a bolsa artificialmente, nisto usa-se ocitocina para que as contrações voltem. Como o efeito da analgesia é de no máximo três horas, essa mulher terá que tomar cada vez mais e isso afeta diretamente o bebê. No caso da ocitocina, ela faz com que as contrações aumentem e quando utilizada em doses altas, pode levar sofrimento ao bebê. Ela é benéfica quando a mãe não entra em trabalho de parto. Quanto a episiotomia, o Doutor explica que hoje ela é usada em 5% dos casos. Pode acelerar os nascimentos, é utilizada quando o bebê está nascendo e fica com a cabecinha presa, para evitar uma laceração entre o reto e a vagina, o profissional acaba optando pelo método. Quando utilizada de forma desnecessária, além da mulher herdar uma cicatriz imensa, pode causar dores na atividade sexual.

Caminho das pedras Assim que uma mãe o procura, ela se depara com uma série de etapas. Ele conta que suas consultas são divididas em três pontos: examinar essa mulher, solicitar exames e um espaço para tirar todas as dúvidas que ela tem e as que vão surgindo. Ao longo das 42

consultas ele vai explorando temas como: atrasos da gravidez, que esse bebê pode atrasar ou adiantar já que cada caso é um caso. Fala sobre a importância do parto normal, da amamentação, como essa mulher vai saber que está em trabalho de parto, como ela vai interpretar as contrações, como ela pode evitar as dores, quais as intervenções e o que elas provocam, sobre as posições de parto, sobre o que pode ocasionar uma cesariana. O

médico avalia que o mais importante em todo esse processo é a informação e que todos os dias

ele escolhe ser um profissional diferenciado a fim de auxiliar mulheres a se tornarem mães da melhor forma possível.

Há quem o chame de “O bom parteiro” Talvez o médico não se lembre exatamente como foram cada um dos cinco mil partos que ele já realizou até agora, mas com certeza cada mulher que pôde vivenciar um parto Humanizado com o Doutor Luiz como obstetra, se lembra e aqueles que a acompanham também. Um companheiro que vivencia com a mulher esse momento, consegue deixá-la mais segura, aquela pessoa que compartilha tantos momentos bons e ruins ao longo da vida, tem a oportunidade de vivenciar isso de forma mais intimista. Naquele instante a mulher se transforma e o companheiro também, da sua forma, dali em diante até o modo ver a mulher será diferente. Abaixo a carta de um pai que acompanhou o parto de sua filha com o obstetra Luiz Carlos:

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O bom parteiro Doutor Luiz é um homem simples de pensamento complexo, sabe que medicina não é uma ciência exata e que sua profissão precisa ser recheada de humanismo. Compreende que a saúde não deve ser vista como mercadoria. Tem a sabedoria para entender que as mulheres grávidas são, acima de tudo, portadoras de vida e que as vidas delas estão em suas mãos. Minha esposa é sua paciente. Fez o pré-natal com dr. Luiz. Para o nascimento foram 25 horas de trabalho de parto, nenhum minuto sem a presença do padroeiro. Demos entrada na maternidade no sábado, finzinho de tarde. A bebezinha, minha maravilha, nasceu às 16h15 do dia seguinte, Dia dos Pais. Foram horas duras para minha esposa, vivemos momentos de quase desespero com as contrações. Mas fomos orientados permanentemente pelo doutor Luiz. Ele chegou um pouco antes da gente no hospital e só saiu depois de constatar que tudo estava em ordem, que minha filha mamava bem, que sua mamãe se recuperava com certa tranquilidade. Médicos assim são raros, infelizmente. A lógica do capital, do mercado, do lucro e da rentabilidade predomina na medicina brasileira. O parto humanizado demanda tempo e no mundo capitalista “tempo é dinheiro”. No caso, mais gastos para os planos de saúde e menos dinheiro para os médicos que podem fazer várias cesáreas numa manhã de dia útil. Mas minha bebê quis nascer no final de semana e deu sinais bem antes. Menos dinheiro, porém mais vida. Nasceu saudável, serelepe, no tempo certo, da maneira correta para situações normais. Dinheiro é importante sim, mas a profissão para ele é uma vocação. Tem paciência, disposição, disponibilidade para esperar a hora em que o bebê está pronto para chegar. É a vida dentro da mãe que decide e não o obstetra. Essa lógica exige também humildade. Flávio Munhoz Sofiati – Goiânia – GO(08/09/14) Texto originalmente publicado o jornal O Popular.

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O ato de compreender Capítulo 04

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S

ob o olhar da psicologia, o trabalho na Maternidade Nascer Cidadão, é guiado. Fundada em 2000, região noroeste de Goiânia, é pioneira em parto humanizado. O local é distante da movimentação da cidade, em uma área grande e calma. Por todos os lados haviam bancos arredondados. Um jardim interno traz serenidade ao local. Nas suítes, um bercinho móvel ao lado da cama, bem próximo das mães e cadeiras para os acompanhantes. Deivis Villaça, psicóloga da maternidade, me recebeu em uma sala pequena, com duas poltronas largas. Nas paredes, tons de bege claro e branco. A profissional explicou que de forma geral, a psicologia já era bem humana, que seu papel é fortalecer as pessoas de dentro para fora assim elas poderiam lidar com os desafios da vida. Quando o conceito se voltava para mulheres, para o parto, era da mesma forma. Revigorar essas mulheres para que elas pudessem enfrentar todos os desafios que viriam a partir do momento que se vissem grávidas. 47


Dentro da Maternidade Nascer Cidadão, trabalhavam isso em forma de reuniões com as gestantes, geralmente grupos de nove, dez mulheres. No grupo faziam trocas de informações, experiências, fazendo com que cada mulher se sentisse mais segura pois se enxergavam umas nas outras mulheres. No início era preciso que uma enfermeira obstetra que prescrevesse exercícios para as reuniões, mas com o tempo, as próprias psicólogas começaram a determinar atividades, assim desde o início as parturientes viam na psicologia um trabalho conjunto. Não havia mais a necessidade de esperar o médico dizer o que elas tinham que fazer e quando fazer. Devis, afirma que assim o parto voltou a ser dessas mulheres e o médico faz mais um trabalho de auxílio. A psicóloga conta que o atendimento delas é geral, tratam de tudo, já que o ser humano é um todo, um ser atuante. Existem inúmeras questões que interferem na rotina dessa mulher e o trabalho delas como agentes humanizadoras é de respeitar e ajudar a atravessar toda a gestação da melhor forma possível. Esse trabalho também se estende até à equipe. Por exemplo: quando a mulher está em trabalho de parto, e percebem que ela está com dificuldades, está gritando muito ou não está ajudando, ou até mesmo, que naquele momento ela não quer aquele bebê por qualquer motivo que seja, as psicólogas atuam com a equipe de enfermeiras e obstetras, no sentido de fazer com que esses profissionais entendam aquela mãe, o que ela tem vivenciado, pois na maioria das vezes, na

gestação, muitas coisas vêm à tona, significados adquiridos durante a vida que podem não ser percebidos com tanta clareza por outras pessoas. 48

Quanto aos métodos farmacológicos na maternidade, ela explicou que o procedimento é sempre evitar qualquer tipo de intervenção, mas acima de tudo evitar extremos. Devis ressaltou que até então havia um padrão, em que as mulheres eram tratadas como doentes, eram hospitalizadas, injetavam ocitocina, sempre ficavam deitadas, o problema, segundo ela, é chegar ao outro extremo, do tipo, ter o bebê no quintal de casa sem nenhum tipo de acompanhamento. A psicóloga conta que vê muitas mulheres hostilizando mães que tiveram uma cesariana, e que humanizar também é isso, respeitar cada decisão. Explica que o acompanhamento do médico também é necessário, que as mulheres são ensinadas a fazer métodos de respiração, caminhadas, o uso da bola, tudo para não acelerar o parto, mas que o médico tem uma outra percepção e vai poder intervir caso seja necessário. “O

que não dá para generalizar, e dizer que porque houve intervenção também houve violência obstétrica”,

segundo ela. Há mulheres que ao conhecer o que cada método faz, ela opta por utilizar em determinado momento do parto. Então é importante não demonizar tudo. O parto é um momento muito delicado, as parturientes são expostas a uma gama de sentimentos, e que quando está com a ideia fixa que não deve acontecer nenhuma intervenção farmacológica, em alguns casos, pode gerar um estresse maior para essa mãe, e o que era para ser algo prazeroso algo que a aproxima do filho ou filha, acaba causando um distanciamento, um trauma. Mesmo em um local assim, Deivis explica que enfrentam várias barreiras. A luta para permitir que haja acompanhante na hora do parto, acaba perdendo força por ser hospital público em que às vezes não tem vestimenta adequada, e os profissionais que não concordam com essa prática, 49


utilizam disso como pretexto para impedir que outra pessoa permaneça na sala de parto. Deivis afirma que a tarefa é diária. As mulheres que buscam essa maternidade são de baixa renda, trabalham exaustivamente para criar seus filhos e filhas, muitas vezes não tem a ajuda do pai, então precisam conciliar o emprego as reuniões. Para ela, o grande diferencial feito nessa maternidade é ajudar essas gestantes a ter a melhor experiência possível já que na vida as experiências, nem sempre foram tão boas. Trazer essa realidade sofrida, trabalhar a humanização dentro da perspectiva e oportunidades que essas mulheres têm nem sempre é fácil, mas é justamente o papel delas naquele lugar, explica a psicóloga.

Doulagem e Psicologia O trabalho de psicologia também está inserido fora das maternidades. Lívia Sebba, também é psicóloga e conta que a profissão a ajudou a melhorar seu atendimento como Doula. Seu trabalho começa bem antes do parto. Afirma que as mudanças são infinitas para a mulher, não só no corpo, mas o pensamento, a realidade, mesmo que ainda não tenha um filho de fato em seus braços. A insegurança sobre algo novo amedronta até aquelas que já tiveram outros filhos. Livia considera que a psicologia a ajuda na capacidade de ouvir e ajudar as mulheres, e nesse momento ela passa todo tipo de informação, para que essa mãe saiba tudo que era irá viver e como elas irão enfrentar esse desafio, que é a maternidade. O acompanhamento de doulagem insere também os familiares e os companheiros dessas mulheres, já que a mudança acontece para todos que estão em volta dessa mulher. Explica que não se trata de um trabalho terapêutico, 50

mas um aprofundamento no auxílio a essas mães. Muitas delas trazem consigo dramas adormecidos que nesse momento vêm à tona.

Quando ela percebe a necessidade de um trabalho diferente ela encaminha para sessões com outros psicólogos. A psicóloga e doula, percebe que ao longo de seus 240 partos, que existe uma ideia romantizada sobre nascimento e é preciso de forma cautelosa e sábia, explicar como é o processo de forma geral, já que cada mulher tem sua fisiologia. Por isso, a necessidade de fazer um trabalho com a família, para que na hora, eles compreendam o que é normal e o que não é, para assim poder dar apoio. Além de todo o desafio que a maternidade traz, as mulheres enfrentam a escassez de profissionais humanizados em Goiânia, e quando encontram, enfrentam a dificuldade financeira. Mulheres empoderadas e certas do que querem para seus partos facilita o enfretamento das dificuldades impostas pela sociedade. Ela lembra que certa vez, uma paciente vendeu cachorro quente na porta de casa e conseguiu o dinheiro para o parto da forma que queria, outras fizeram empréstimos, tudo em prol de um objetivo claro para essas mães. Quando você tem uma mulher que sabe o que quer, fica um processo mais tranquilo, por elas saberem exatamente o que fazer. Esse conhecimento não é só sobre as coisas boas, é importante deixar essa mãe ciente que haverá dores, afinal é um nascimento. Dentro ou fora da maternidade, a psicologia tem auxiliado as mulheres nesse processo de nascimento. Entender questões internas e externas proporcionam uma melhor experiência para a parturiente. 51


Herança para os filhos Capítulo 05

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Q

uando cheguei a sua casa, em uma noite quente, já fui recebida por duas crianças, animadas para saber quem estava à porta. O gato também logo apareceu em busca, talvez, de um petisco. Ela me convidou para entrar enquanto deixava as crianças a vontade com alguma brincadeira, comecei a pensar em tudo que me levou até aquele lugar. Nossa heroína de hoje, se chama Aline. A coincidência de ter o mesmo nome que eu, me deixava entusiasmada. A conheci uns anos antes e eu era sempre recebida por um: - ‘E aí, xará?! E um grande sorriso naquele rosto tão branco, que mesmo sem vergonha alguma ficava vermelho. Quando contei que seguiria a mesma profissão que a dela, ficamos vários momentos trocando informações sobre o mundo jornalístico. Agora, além de sermos xarás, seriámos colegas de profissão. Segui com minha vida acadêmica e tínhamos contato apenas por redes sociais. Descobri sua militância pelas mulheres através da internet, e quanto mais me aproximava dela mais 53


via sua causa, nossa causa (das mulheres). Ela sempre despachada, começou a me contar toda sua história sem hesitar. Eu sabia que ela tinha feito um parto em casa, mas na época que soube, era coisa de outro mundo para mim, e imagino que para muitas pessoas também. Hoje, Aline era doula, e eu queria entender como chegou a esse lugar. Nascida de uma cesariana, ela é a caçula de três mulheres. O primeiro parto de sua mãe foi extremamente violento, sua irmã era muito grande e com essa justificativa, uma cesárea foi feita. Na segunda gravidez, sua mãe viveu mais uma violência obstétrica, dessa vez, em um parto normal. Quando foi a vez dela, a cesariana foi escolhida por sua mãe. Ela conta que foi a “cesariana do machismo” já que supostamente uma mulher com três filhas iria fazer uma laqueadura para não ter mais gestações, e isso era sinônimo de cesariana. Nesta época, nos anos setenta, oitenta, não havia diálogos para que buscassem outras opções para não se ter filhos, a mulher devia optar por isso. Época em que uma vasectomia - cirurgia pouco invasiva para os homens - não era nem cogitada. A mãe de Aline apesar de ser cesarista, como ela titulou, sempre acreditou no parto normal, mas no sentido de que se for para ser será, como se fosse algo do destino e isso é deixado nas mãos do médico.

Primeira gestação Aline morava em Campinas, São Paulo, quando teve a primeira gestação. Quem à acompanhava aqui em Goiânia era uma ginecologista que a tratava desde os quinze anos, havia entre elas uma grande intimidade. Antes de engravidar, ela leu um livro da Cornelia Enning, O Parto na Água, então veio seu desejo de ter 54

o parto dessa forma. Quando demonstrou sua vontade a médica, ela alegou a falta de estrutura para que acontecesse de fato, mas disse que o parto normal ela poderia tentar, se Aline conseguisse. A médica pediu a ela que pensasse em enxoval, coisas para o bebê e que o parto fosse deixado a cargo dela, então não haveria com o que se preocupar. Diante disso, Aline não se preparou para seu parto, afinal aquela mulher que ela tanto confiava lhe tranquilizou. Ela se mudou para Campinas pois seu marido fazia doutorado e ela foi convidada para fazer uma reestruturação no curso de rádio e tv na cidade para a aprovação do Ministério da Educação - MEC. Ela dava aula em todos os horários no período noturno além de ser coordenadora do curso. Toda a grade acadêmica foi organizada, um estúdio de rádio e tv local foram construídos e finalmente os alunos estavam envolvidos. Todo esse trabalho foi realizado durante três anos. Após o objetivo de a faculdade ter se cumprido, começaram a descartar seu trabalho. Ela viveu dias de angústia na cidade. Tentaram despedi-la em pleno gozo de suas férias, porém ela engravidou e tiveram que voltar atrás na decisão. Diminuíram sua carga-horária em noventa por cento, agora ela dava apenas uma aula por semana, sua renda foi drasticamente alterada. De dois mil e seiscentos reais que ela passou a receber duzentos reais mensais. Como na tentativa de demitila eles depositaram seu acerto trabalhista em sua conta, ela ficou seis dos nove meses de gestação sem receber absolutamente nada.

Diante da situação complicada que ela estava imersa, a diretora da faculdade ironicamente sugeriu que Aline abortasse. Começaram a difamála com a ajuda de uma aluna, e por fim, a ameaçaram de morte. Com tudo isso, ela teve síndrome do pânico, 55


sua gravidez foi ofuscada por toda violência sofrida. O sonho de uma gestação virou um pesadelo. Longe de casa, de sua família, sozinha em uma cidade que queria tanto seu mal. Seu horário de entrada no trabalho eram às cinco da tarde, todos os dias às três ela sentava em frente ao seu portão, e lá ficava durante duas horas que mais pareciam uma eternidade, tentando se mover, criando coragem para voltar ao lugar que a feriu. Todos os dias era uma guerra, e não era neste caos que ela queria trazer ao mundo sua filha. Em busca de segurança para seu bebê e para si mesma, ela quis voltar pra casa, mesmo nas últimas semanas de gestação, enfrentou quatorze horas dentro de um carro para chegar em solo goianiense. Ligou para sua médica, informou que havia chegado e foi fazer uma ultrassonografia. No resultado havia suspeita de sofrimento fetal pelos baixos batimentos cardíacos da bebê. Aline chegou por volta das onze da manhã no consultório da médica com seu companheiro, desesperada, afinal ela trazia consigo um exame que mostrava que sua filha, sua pequena filha, estava morrendo e ela não poderia mais ter o parto normal, pois sua bebê tinha que ser salva. Entregou o laudo para uma enfermeira e pediu que levasse imediatamente a médica, imaginava que a Doutora visse exame iria atendê-la imediatamente. Foram quatro horas de espera, a médica atendeu todo o consultório e deixou ela lá, agonizando por quatro longas horas. Às três horas da tarde a médica saiu do consultório e conversou com ela, confirmou que a neném estava em sofrimento e por isso precisava de uma cesárea. A cegueira causada pelo pânico, a preocupação em proteger sua cria não a deixou perceber que, se realmente a filha estivesse morrendo, a cesárea teria sido feita há horas. 56

Após a cesárea ela não se conformava, tudo que ela tinha feito para ter seu parto foi em vão, acreditava que a culpa era dela, pois a médica jamais faria algo assim, afinal a conhecia há anos. Só enxergava defeitos em si mesma, jamais naquela querida médica. Sua confiança era tão grande na profissional que quando Aline engravidou novamente, foi na mesma obstetra com a esperança de tudo dar certo dessa vez. Partos domiciliares ainda eram muito poucos explorados no Brasil. Ela desejava o parto em casa, justamente pela resistência de profissionais em fazerem partos naturais. Com receio de cair em uma cesárea ela preparou tudo para ter seu filho onde tudo funcionária da forma dela.

Segunda gestação

“A mulher consegue voltar cegamente pro instrumento de violência obstétrica. A sociedade é conduzida a acreditar em tudo que o médico diz, e quando você tenta mudar esse paradigma, quando você convida a mulher a ser protagonista do seu parto e não deixar a cargo do médico, as pessoas entram em conflito porque é algo enraizado, ensinado culturalmente” afirmou. Quando ela convicta, falou

para a médica que dessa vez o parto normal daria certo, a médica afirmou que a situação devia ser analisada com cuidado porque ela já tinha passado por uma cesariana e isso seria um empecilho. As palavras ditas reforçaram a sensação de fracasso, porém ela não desistiu. Em exames de rotinas foi apontado um pequeno descolamento de placenta. Devido a isso ela foi orientada a ficar de repouso absoluto além de medicação. Durante uma semana ela cumpriu 57


exatamente tudo que foi prescrito, se privou de tudo, só saia da cama para ir ao banheiro. Chegando o dia do exame, o resultado apontou que o deslocamento estava maior. Seu desespero a fez lembrar de tudo que tinha passado até ali. Ela ligou em angustiada para a profissional e em nenhum momento, sem nem hesitar, respondeu que perderia perder o bebê e que a esperava no consultório para conversarem. Ao retornar ao consultório a gestante foi tratada como uma adolescente irresponsável, o discurso da médica foi de acusá-la o tempo todo. Ela passou outro tratamento mais intenso, só que agora a profissional pediu para que o companheiro voltasse com notícias dela. Ignorando todo seu aparato de mulher, mãe, dona de si, acusando-a de negligenciar sua gravidez. Essa situação foi a gota d´água, Aline saiu do consultório decidida a procurar outro médico mesmo na reta final da gravidez. Através de um grupo de apoio na internet em que participavam pessoas de todo o Brasil, compartilhou sua experiência da primeira gravidez e que estava ali em busca de outro médico para o segundo filho, pois sua médica não lhe apoiaria no parto normal. Inúmeras pessoas relataram experiências semelhantes afirmando que elas, também haviam sofrido violência obstétrica. Quando ela compartilhou o exame – aquele em que afirmava que sua filha estava em sofrimento fetal – todos explicaram a ela que estava tudo bem, que mais três dias ela entraria em trabalho de parto naturalmente. Acabou compreendendo que horário que ela fez o exame coincidiu com o momento em que sua filha costumava dormir dentro de sua barriga e isso alterou o resultado, dando a desculpa perfeita para a cesárea. Tudo isso caiu como uma bomba para Aline, aquela mulher que era tão íntima havia lhe roubado o parto 58

de sua filha, e ainda pior, à deixou acreditando durante tanto tempo que o erro, a culpa, era toda dela, que ela era fraca, estragada, incapaz. Em um fórum em uma rede social, 27 pessoas espalhadas por o Brasil, indicaram a ela um médico conhecido em Goiânia. Com todo medo e dores vivenciadas anteriormente, ela procurou por esse obstetra e fez a ele todo tipo de pergunta a fim de assegurar que seria a escolha certa para acompanhar seu parto. Ela lhe contou sobre seu desejo de parir na água e o médico disse nunca havia feito, mas que poderiam sim tentar. Pouco tempo antes de parir, ela e sua família haviam se mudado para uma nova casa. No processo de compra se decidiram pela casa principalmente por ter uma banheira dentro do quarto do casal. Ali ela enxergou a possibilidade de ter seu filho e levou esse desejo ao seu médico. Como obstetras não possuem autorização para partos domiciliares, ele indicou sua esposa, que tinha formação como enfermeira-obstetra e autorização pelo Ministério da Saúde de exercer partos domiciliares. A enfermeira foi atualizada de tudo que Aline tinha vivenciado e sobre seu desejo de ter o filho em casa, apesar da pouca experiência, ela procurava um apoio profissional caso ocorresse alguma emergência. Poucas pessoas sabiam do desejo dela ter seu filho em casa, nem mesmo seus pais e irmãs, justamente para evitar represálias e estresses. Quando chegasse a hora, o interfone da casa seria desligado para não serem interrompidos por ninguém. Aline entrou em pródromo¹ às oito da manhã de uma sexta-feira, como tinha vivido a gestação totalmente ativa, no dia, ela agiu normalmente. Fez todas as atividades como costumava. Até às onze da noite daquele dia, as contrações foram normais até que ela 59


entrou em trabalho de parto e chamou toda a equipe que faria o acompanhamento. Por volta das cinco da manhã, ela estava com seis centímetros de dilatação, ela entrou na banheira. Sua sensação era de entrega total, sabia que estava no lugar certo e na hora certa. Tudo estava da forma que ela idealizou. E às nove da manhã, seu filho nasceu, sem nenhuma intervenção, totalmente natural e respeitada durante todo o processo. Para ela foi o momento mais transformador de sua vida, seu empoderamento foi tão grandioso que nada mais a fazia temer, afinal ela pariu seu filho, dali pra frente ela enfrentaria qualquer obstáculo por ele. Seu parto foi o primeiro em domicílio realizado em Goiânia no de 2013. Ela explica que esse sentimento é roubado diariamente das mulheres quando não permitem que ela tenha seu parto da forma que idealizaram, não as deixam lutar, não as deixam nascer com aquele filho. Aline não foi acompanhada por uma doula durante a gestação, somente durante o parto. Só depois foi que ela entendeu toda a importância dessa profissional que tem se tornando cada dia mais comum nas gestações. Foi assistida por dois enfermeiros obstetras. Era o primeiro parto fora de uma maternidade e talvez, pra ela um grande aprendizado já que quando o filho de Aline nasceu ele não chorou. Foi um grande espanto, mas graças à experiência do outro enfermeiro nada saiu errado. Bebês que nascem na água, não choram na maioria das vezes, já que o ambiente é semelhante ao útero da mãe e ele respira por algum tempo pelo cordão 1– Pródromo – São contrações que indicam que o trabalho de parto está próximo, mas em cada mulher, ou em cada gestação, os pródromos se manifestam de forma diferente. Para algumas mulheres os sinais são imperceptíveis, e para outras, podem ser bastante desconfortáveis.

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umbilical. Ele saiu do líquido para outro líquido direto para os braços de Aline, então ele estava bem. Como a enfermeira nunca tinha presenciado isso, e vendo que o bebê não chorava, ela imediatamente tentou fazer massagem cardíaca e o outro enfermeiro, a impediu para que esse momento tão único não fosse interrompido. Para Aline, essa atitude foi a mais humanizada que ela já havia vivido. Parto humanizado, tão respeitoso que seu filho não chorou. Ela relata que quando seu filho nasceu foi como um filme na sua cabeça mostrando tudo que ela tinha vivido até chegar àquele momento e que o fato dele não chorar, foi sua maior recompensa. Aline nascia junto com seu filho, ela nascia junto com seu Levi. Enquanto Levi

nascia, Aline renascia.

No pós-parto da primeira gravidez Aline sobreviveu, já no segundo ela viveu, existe uma grande diferença no prazer da maternidade nessas duas situações. A realização como mulher é outra, e roubar isso das mulheres por praticidade e lucro, para ela, é desumano. E quando a sociedade atesta isso como normal porque um médico sentenciou deveríamos encarar isso como

CRUELDADE. Enquanto doula Aline então chama minha atenção para a estrutura de maternidades particulares no Brasil que não possuem equipe de plantão para atender emergência de partos. 61


Diferente das maternidades públicas, que possuem plantonistas, nas instituições privadas isso não acontece. Em caso de emergência, o atendimento não acontece imediatamente, ou seja, se uma mulher precisar de um anestesista, por exemplo, o procedimento não acontecerá com tanta agilidade, já que não encaram o parto como situação de urgência. Além do custobenefício para ter esse tipo de serviço. Quando começamos a entender que existe comércio, que o tempo dos médicos valem muito dinheiro, que trabalho de parto é longo, que planos de saúde remuneram mal esse profissional, aí podemos perceber porque a cesárea é tão praticada no Brasil. Enquanto um profissional acompanha um parto por cinco, seis, doze, vinte horas, neste tempo inúmeras cesarianas são feitas, sem susto, sem mudar agenda, sem sair de casa em algum feriado. Diante de tantos fatos, ela enfatizava a importância da doula. Explica que quando a mulher é bem informada, acompanhada por quem tem experiência com partos, que tem um cuidado exclusivo à essa mãe, dificilmente ela irá para uma clínica quando começar a ter sinais de que irá parir. Toda a preparação é feita por essa profissional com técnicas para deixar essa mãe tranquila, tanto física quanto psicologicamente. Dessa forma, as mulheres não precisam correr para a maternidade onde existe um médico atendendo inúmeras mulheres de uma vez, isso evitará estresse e consequentemente a diminuição de violência obstétrica por n motivos. A doula tem a capacidade de ajudar a quebrar uma série de barreiras que irão possibilitar o parto humanizado. Enquanto a mãe se recupera de todo o processo, o bebê vai para um berçário, recebe um ácido no olho, injeções, um banho com escova dura para tirar o vérnix², colocam roupa e o deixam sozinho no berçário. Esse é 62

o início da vida dessa criança e é considerado aceitável, o certo. O errado e respeitar a fisiologia do corpo, é ir pra um ambiente seguro, familiar para a mãe. A grande militância da humanização do parto é mostrar às mulheres que existe outra opção. Nesta situação é que se pode gerar, naturalmente, o hormônio do amor, a ocitocina, quando se tem uma cesárea sem informação essa oportunidade é roubada da mulher. Esse hormônio capaz de gerar força para essa mãe enfrentar toda mudança que virá dali pra frente. Aline exemplifica essa situação quando se lembra do pós-parto da sua primeira filha. O amor que ela sente é totalmente igual com os dois filhos, mas se ela lutou por um nascimento melhor para seu segundo filho, se ela luta por uma realidade diferente é para que um dia o parto de sua filha não seja roubado. Para quando chegar a hora dela, as coisas não sejam tão difíceis e não sofrer o que ela sofreu. A luta para que outras mulheres vivam esse momento é uma declaração de amor que Aline faz diariamente à filha. A relação de amor com Beatriz seria igual se Aline tivesse vivido seu parto, mas com certeza a relação dela com ela mesma seria diferente. O processo inicial com sua filha teria sido mais prazeroso. Diante disto tudo, a sensação que ela sente é de revolta, pois diariamente esse prazer, esse amor, são roubados das mulheres. Diariamente médicos são formados sem saber como agir em um parto normal. Após vivenciar tudo isso, Aline queria mais, ela desejava sentir tudo aquilo sempre, só que para isto ela teria que ter um filho por ano – ela conta isso entre 2 – Vernix - O vérnix é uma substância branca e gordurosa que recobre a pele do recém-nascido logo quando ele nasce, tem como função manter a impermeabilidade da pele, protegendo contra microorganismos do líquido amniótico ou no ambiente externo. Também tem função hidratante, termorreguladora e antibactericida.

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risos- então decidiu se tornar doula. Foi a maneira que ela encontrou de experimentar constantemente essa sensação maravilhosa.

optou pelo parto natural em casa. Alguns encararam como atitude irracional, porém o apoio de uma doula foi fator determinante para o acontecimento de fato.

Ainda há muita luta

“A mulher não tem ideia do que é um trabalho de parto até viver um, a dor ali transforma a mulher”, relatou.

O parto humanizado não é rótulo para partos naturais, além do que, parto cesáreo também deve ser humanizado, há profissionais humanizados que, realizam sim cesarianas, quando essa é uma manifestação do desejo da mãe. Há outros que são conhecidos por realizarem sempre partos naturais e, só são procurados por mães que já possuem esse desejo. Para Aline, o preparo para o parto é 70% psicológico e 30% fisiológico. A mulher precisa de um auxílio para parir, em decorrência da sociedade que fomos criadas. Uma sociedade em que a mulher tem que ter pudor com a vagina, que tem que ter vergonha do seu corpo exposto, ensinadas que a vagina é um órgão de reprodução e de diversão do marido. Quando essa mulher se vê grávida, e uma séries de fatores externos fazem com que ela não se sinta protagonista dessa gestação, uma parte dessa mulher não vai para o parto, e isso influencia de maneira direta do processo do nascimento. “O parto é um mergulho no escuro de cabeça”, disse Aline para mostrar a importância do preparo psicológico da mulher. O medo do desconhecido é natural, então para viver essa experiência é preciso de apoio de si mesma e dos outros. Como doula, ela já presenciou momentos em que mulheres estava prestes a ter dilatação total, mas que uma frase desmotivadora do marido por exemplo, a fizeram travar, mudando o curso dessas experiências. “Não somos ensinadas a parir”, afirmou ela, que recorda da gestação do segundo filho, em que 64

Chega um momento em que a mulher afirma para si mesma que não consegue mais, e é nessa hora que é preciso ter uma equipe preparada para dar todo suporte, apoio, motivação para perceber que a mulher não está sozinha, que tudo está sob controle, e principalmente, lembrá-la que ela pode parir. Frases como: “- Olha você chegou até aqui”, “Estamos orgulhosos de você”, podem mudar o rumo do parto, essa mulher encontra dentro de si, inspiração para lutar, para vencer o desconhecido, para superar o medo, a dor, a insegurança. Aline acompanhou uma moça que entrou em pródromo trinta e seis horas antes do trabalho de parto. Durante as idas e vindas do hospital para as verificações, o marido da moça sempre repetia a frase: “-Eu não quero mais perder um filho”, dito isso várias e várias vezes, essa mãe começou a questioná-lo sobre essas indagações já que se tratava do primeiro filho do casal. O marido então confessou que durante sua gestação ele teve um relacionamento extraconjugal com uma outra pessoa resultando em uma gravidez, e que ele havia pedido um aborto, ou seja, esse seria o filho perdido. A moça travou, e não conseguiu entrar em trabalho de parto. A mulher precisa estar cercada de pessoas que lhe proporcione confiança. Na sociedade é o oposto, estamos cercadas de desconfiança e insegurança. São mães, avós, tias, amigos, amigas, pais, maridos, médicos. Pessoas próximas que possuem um papel primordial na vida dessas mulheres e que, infelizmente, mudam 65


o curso dos acontecimentos. E é essa pressão que os profissionais humanizados precisam estar preparados para enfrentar, junto com essa mulher, que traz consigo toda uma bagagem que se quer romper, mas que às vezes não consegue sozinha. Em outro momento, Aline acompanhou uma gestante que entrou em trabalho de parto à uma da manhã, às três, sua dilatação já estava completa, porém o bebê não descia, e durante oito horas essa mãe lutou para parir. O profissional que fez o acompanhamento não sugeriu em nenhum momento uma cesariana, somente quando o batimento do bebê começou a cair e correr risco de entrar em sofrimento fetal. Somente neste momento esse profissional interviu. Aline reflete que se fosse outro em seu lugar, já teria perdido as rédeas da situação e partido imediatamente para uma cesárea. O sucesso do parto vai muito da equipe que está fazendo esse acompanhamento, saber que o natural não tem hora e não tem limite quando tudo está bem com a saúde da mãe e do bebê. Aline já presenciou momentos incríveis ao lado de profissionais que não encostaram a mão na mulher e que seu papel ali, foi simplesmente assegurar-se de que tudo corria bem e ajudar essa mãe a superar todos os desafios impostos e embarcar na aventura da “Partolândia”. Outra qualidade destacada por ela é quanto ao tratamento, as pacientes são atendidas igualmente, independentemente da situação econômica, cansaço.

o cordão umbilical desse bebê com seu pulmãozinho cheio de ar. Ele é manipulado de mãos em mãos, sai de uma temperatura de trinta e oito graus para um lugar frio em que ele está pelado, molhado, com medo porque não consegue respirar, enfiam dentro do seu nariz um cano sem anestesia para tirar esse ar e ele poder respirar, batem nas costas dele, chacoalham ele, com barulhos agudos. Sem sua mãe, drogado porque tudo que deram para mãe antes de tirá-lo foi pra ele também, e assim que começa a vida de um bebê, desde seus primeiros instantes são submetidos a violência sem tamanho. E a sociedade enxerga isso com bons olhos. Toda essa violência com esse bebê enquanto a mãe está amarrada em uma mesa sem poder protegêlo”, enfatiza ela. Hoje, Aline vive um caminho que ela considera mais iluminado. Não que não existam lutas, ela tem consciência de que há muito ainda para se fazer, mas para mudar o mundo é preciso mudar primeiro a forma de nascer e isso ela fez com seu filho e hoje ajuda outras tantas mulheres a mudar o rumo de suas histórias.

“Diariamente bebês são retirados da barriga da mãe quando estão dormindo, não esperavam para nascer, com o pulmão ainda em formação porque essa mulher não entrou em trabalho de parto, eles são arrancados do seu ambiente confortável, cortam-se 66

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No embalanço do amor Capítulo 06

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o chegar na casa dela, simplicidade. A mulher que atualmente cuida de muitas crianças, tem filha e um filho vivo, um gato, um cachorro. Graduada em Educação Física, desde 2000, doula e mãe, Juliana Pigrucci tem uma história atípica com a maternidade. Paulista, natural de Franca, São Paulo, ela vive e cria suas crias em uma casa, em Goiânia. Desejosa de um parto normal, João, de 10 anos, nasceu de um parto cirúrgico, após a recomendação de seu médico. Fiquei impressionada com a revelação logo no início da entrevista. Mas, ela prosseguiu e explicou que foi traída pelo seu médico de confiança. Seu desejo sempre foi um parto normal e como isso não aconteceu, passou por um processo de reconstrução do desejo de ser mãe. Ela conta que seu primeiro filho nasceu morto. Juliana, tinha 28 anos na época. O primeiro parto de Jú, do filho Carlos, foi normal e induzido. Seu bebê não conseguia se alimentar dela. Ele não resistiu. Segundo o médico, o cordão umbilical estava enrolado em seu pescoço. 69


Sobre este primeiro parto, algo ficou aceso dentro dela. Ainda não era possível saber o quê. Ela colocou o filho morto em um potinho e levou pra casa. “A cena

mais marcante pra mim é colocar o meu filho no potinho e levar. É uma dor enorme, mas nunca perdi o desejo de ser mãe”. Ela acredita que

aquele momento, mesmo com o filho morto, poderia ter sido diferente, poderia ter pego esse filho no colo, o cheirado com animalidade maternal. Não foi possível por falta de informação, por tristeza e dor, pelo que ela sentia no momento. “Eu não perdi o romantismo

com a maternidade na minha primeira gestação, até porque o maior sentido pra mim era a vida. O meu obstetra era como um Deus pra mim”, afirmou. Jú optou por continuar com o mesmo médico. Com os partos dos próximos filhos, vieram mais decepções após a reconstrução da vontade de ser mãe. Ela ficou conflituosa entre o medo da morte e o nascimento de uma vida e passou pelo processo de se refazer como mulher. O segundo filho, João Augusto, hoje com 10 anos, nasceu de uma cesariana por determinação médica e por falta de questionamento dela. Sobre o pós-parto ela diz que foi incrível. “Foi lindo de viver,

já explodia leite na mesa de parto, minha família ficou toda comigo o tempo todo”. O espanto veio quando ela ficou novamente grávida, agora de Olívia, hoje com 6 anos.

Ela expressou ao médico sobre a sua vontade de ter um parto natural. Ele disse: - Impossível! Essa afirmação soou muito mal dentro dela. O médico a torturava lembrando sobre o primeiro parto e ela não discutiu o parto com 70

o obstetra. Apenas consentiu. “Em nenhum momento eu relutei, era pra ir pra cesárea, eu disse: - Vamos”. O médico permanece na vida de Jú e de suas crias. Sutilmente, segundo ela, o que ele quis dizer era: ou você faz a cirurgia ou a criança morre.

Sozinha na empreitada, ela não contou a ninguém o que acontecia dentro do consultório médico e dentro dela. Em Goiânia, ainda não havia nenhum movimento em torno da humanização na época. Ainda sobre o parto de Olívia, silenciosamente ela desejava um parto normal. Se preparou psicologicamente para que a menina nascesse naturalmente. Ela então telefona para a mãe, ainda residente em São Paulo, e avisa que: “a Olívia vai nascer”. Com a chegada da mãe, ela se sentia mais segura. Por dois dias ela sentiu contrações, depois é que foi para a maternidade. Lá não passou por nenhum exame e as contrações pararam. Quando o médico chegou,

veio a notícia: outra cesárea. Juliana sentia que a filha estava quase saindo pela vagina quando o médico puxou a menina, através de um corte na barriga.

Ferida e machucada, após o nascimento da bebê, Ju ficou introspectiva e com o extinto materno muito aflorado, um extinto quase “animal”, durante o primeiro mês com Olívia. Ela sentiu dores de um pesar, dores emocionais, por se julgar ter sido passiva. “Eu tenho

certeza de que ela poderia ter nascido de parto normal”. Pode jurar. Jú passava os dias na companhia de Olívia. Desnudas as duas se deitavam ao chão e dormiam. Ambas tinham acabado de nascer e estavam assustadas. 71


Houve um rompimento brutal entre as duas no momento daquele nascimento interrompido e elas precisavam reatar o que foi quebrado. O nascimento deixou as duas fragilizadas. O médico que cuidou da família dela a havia traído novamente. As duas se adaptam aos poucos às novas casas. A de Ju, era a própria Olívia. A de Olívia era a nova vida, fora do útero da mãe. Vários questionamentos sobre a maternidade permeavam a vida dela. A introspecção a levou a buscar ajuda. Uma amiga lhe ofereceu a luz que veio por meio da dança em que mães embalam seus filhos juntos ao corpo para conceber essa nova estética da alma. A estética de mãe. Um grupo de mulheres com questionamentos semelhantes se reúne para tirar dúvidas inquietantes.

O Embalanço No Embalanço, ela novamente foi ferida. Várias mães a culpava por essa cesárea que tanto a machucou, como se ela tivesse deixado acontecer, muitas vezes ela acreditou que era menos mães que outras mulheres

“Há doulas que acham que você deve parir como ela pariu”, alega.

Ela cita ainda a dor que passou neste momento, por não ter passado pela experiência de um parto humanizado. O atendimento que ela teve com uma doula, foi no pós-parto. Segundo ela, este acompanhamento foi fundamental. Por vontade própria ela começou a pesquisar sobre uma atividade que pudesse fazer com Olívia. As danças em grupo fizeram parte do empoderamento dela e das mulheres que ela atende nos dias atuais. Com o embalo e o acompanhamento da doula, ela passou a entender o processo pelo qual tinha passado. Ju buscou dar voz a seu corpo calado. “Para o pertencimento do corpo, a 72

mulher precisa estar pronta e se enxergar como mãe”,

diz. Ela foi convidada a participar do projeto de doulagem, passou a fazer acompanhamento com mulheres durante toda a gestação. Como doula, se fortaleceu, dando aulas de dança para as mães e seus filhos e filhas, ajudando-as a compreender e empoderar cada parte desse processo.

Doulagem Ju começou com o atendimento o pós-parto. Houve uma oportunidade de fazer um curso na Maternidade Dona Íris, em Goiânia. Ela foi a doula que acompanhou o primeiro parto na água na Maternidade, em 2014. Como voluntária, em regime de 24 horas, ela prestou atendimento na Unidade. Presenciou todo tipo de agressões ao corpo da mulher e violência obstétrica. “Ocitocina, a mulher chegava e já recebia

uma aplicação sem estar em trabalho de parto, a episiotomia. A manobra de Kristeller, quantas vezes eu já vi. Fui até induzida a fazer, a empurrar o bebê”,relata. Durante o trabalho na Maternidade ela conta que as mães não tinham nome. “Era tudo mãezinha”,

diz. E os bebês, da mesma forma. Bebês sem nome. Pensando por esse aspecto da proposta da humanização, havia uma falta de atenção 73


no atendimento. Por vários plantões ela trabalhou

com as salas cheias, e em outros não fez nenhum atendimento. O primeiro acompanhamento que ela fez resultou em uma cesárea. Todo o atendimento foi prestado, como de costume com as massagens e exercícios, mas houve a aplicação da ocitocina e a gestante foi encaminhada para uma cirurgia. “Foi um

dia em que eu chorei muito, o meu primeiro tapa na cara”, conta. Questionada se ela pensou em desistir a resposta é enfática: “NÃO”. Jú não pensou em desistir. Por ela, e pelas outras mulheres que viriam e que precisariam dela. “Nunca pensei em desistir, é agora que eu tenho que continuar”. Foi isso que a alimentou. Logo ela compreendeu o significado da palavra doula, a mulher que serve, quando em um único plantão de 6 horas, atendeu a 6 partos normais. Todos tiveram violência obstétrica, mas ela pôde agir de alguma forma e fazer o papel que era seu. Na doulagem e no Embalanço ela se encontrou, e hoje ajuda mulheres a terem voz e força para não serem traídas como ela foi, e ouvir seus corpos e respeitar cada movimento.

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O nascimento de uma guerreira Capítulo 07

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om a tecnologia cada dia mais avançada, hoje temos várias possibilidades com a internet. O acesso a diversos conteúdos, com pessoas viabilizaram um amplo conhecimento sobre qualquer tipo de assunto. E em uma dessas oportunidades trazidas pela internet e sua gama de possibilidades, pude conhecer a militância de várias mulheres que lutam por suas escolhas e pelas escolhas de outras mulheres. A luta pela forma que se quer trazer filhas e filhos ao mundo não seria diferente. E foi assim que conheci o trabalho da Michele. Uma mulher dedicada a proporcionar as escolhas de outras mulheres, uma doula apaixonada pela fotografia. Logo que entrei em contato e expliquei o porquê do meu interesse, já combinamos um encontro. Desde então fui tomada por uma pequena ansiedade, justamente por saber dos seus feitos na doulagem com outras mães. Quando cheguei a sua casa, ela buscou entender o que realmente eu queria dela. E logo aquela entrevista se tornou um bate papo muito bacana. Aos 16 anos de sua mãe, Michele nascia após uma 77


cesárea agendada, justificada pela idade e grande pressão por parte de sua avó, já que ela também havia sido mãe muito cedo e vivenciou partos traumáticos, então não iria querer algo ruim para sua filha. Por outro lado, na família paterna, o discurso era outro, suas tias defendiam o parto normal alegando ser algo mais fácil. Então acabou crescendo com essas duas referências totalmente opostas. Ela sempre foi envolvida com esporte, cuidados com o corpo no sentido saudável, então para ela optar pelo parto normal era algo natural e que era só questão de a mulher escolher e ponto. Como sempre viu as batalhas de sua mãe e foi ensinada assim, a lutar por algo que acredita e ser respeitada por isso, ela acreditava que em seu parto isso também aconteceria. Aos 25 ela engravidou, e seu pensamento sobre partos continuou. Quando sua mãe questionava quando seria o dia e hora, ela sempre respondia que seria quando o filho dela decidisse nascer, que não era possível marcar para isso acontecer. E assim foi, ela teve um parto normal, porém houveram inúmeras intervenções. Episiotomia, soro com ocitocina, ela não podia caminhar e nem se alimentar durante boa parte de sua internação. Quando aquilo acabou ela começou a se questionar do porque ela não sentia e nem enxergava toda aquela beleza que ela leu em vários relatos de partos. Aquele afago como seu bebê não aconteceu, ele nasceu e pronto. Diante da lacuna deixada por um parto normal, ela começou a fazer várias pesquisas e se deparou com o termo parto humanizado, e viu que, o que ela buscava era justamente aquilo. Sua militância começou em 2004 a partir desses estudos, que foram compartilhados em redes sociais havendo assim uma troca entre ela e outras mulheres. Na sua segunda gestação, em 2010, como ela já sabia exatamente o que queria, começou a fazer inúmeras 78

pesquisas e quando chegou no obstetra ela soube dizer e exigir tudo, até o que ela não queria. Seu parto dessa vez, foi de cócoras, usou analgesia, mas por decisão dela, foi acompanhada por uma equipe completa e que a respeitou em todos os momentos. Quando ela vivenciou tudo isso, conseguiu sentir todo o sentimento que não teve no primeiro parto e passou a defender que isso tinha que ser vivido por outras mulheres. Em 2012 fez um curso de doula e passou a viver e trabalhar nesse mundo da humanização. A partir desse trabalho, Michele começou a enxergar outras realidades e necessidades das mulheres. Como ela tinha plano de saúde, acesso a informação, exigir e saber o que era melhor em seu parto foi uma escolha fácil, mas quando se trata de outras mães com bagagem e condições diferentes, ela sentiu a necessidade de uma preparação mais profunda. Escolhas no pré-natal têm grande influência para um bom resultado lá na frente. Alimentação, rotina de exercício, conhecimento sobre o próprio corpo e parto, amamentação, tudo isso tinha que ser exposto para essas mães e para aqueles que a acompanhavam.

“Quando a mulher se vê grávida, seu mundo fica de cabeça para baixo, não no sentido de bagunça, mas de mudanças. O aspecto emocional é o grande cursor das coisas. Essa mulher vê seu corpo mudar em uma cultura de padrão de beleza predominante. No início da gestação, que ainda não é perceptível a gravidez, ela é vista como gorda, deixa de ser filha, esposa, profissional para se tornar mãe. É uma ruptura muito grande em uma travessia melindrosa”, afirmou ela. Todos os aspectos físicos e psicológicos devem ser tratados com as parturientes. Ela deve compreender como será o trabalho de parto, saber que haverá alarmes 79


falsos, que nos últimos dias a rotina será exaustiva, que terá que ir várias vezes à maternidade, e quando se trata do SUS, isso pode ser ainda mais complicado já que será orientada a voltar somente quando as contrações começarem de fato e isso lhe causará muito medo por não entender todo o processo. Tornar questões técnicas acessíveis para as mães é uma forma de deixa-las mais seguras e confortáveis, para optar por aquilo que acha melhor para ela e para seu filho. Entender o que é episiotomia, ocitocina, analgesia, o que isso afetará no bebê, questões de direito da mulher como a lei do acompanhante. Tudo isso ela afirma que deve ser tratado, principalmente para as mães que utilizam maternidades públicas, pois para muitas, é um serviço gratuito e por isso não deve ser questionado, mas na verdade isso é pago através dos impostos. Quando o nascimento acontece e essas mães encaram o pós-parto, Michele explica que é de extrema importância elas saberem sobre as alterações hormonais. o puerpério¹ que influenciam no psicológico. Como ela irá lidar com essa nova realidade de ter um bebê em casa, como o círculo familiar será formado a partir de agora, tudo isso ajudará essa mulher a colocar tudo em ordem dentro e fora dela. A doula tem esse papel fundamental no acompanhamento dessas mães. A doula conta que mulheres que não vivenciam seus partos da forma que elas idealizaram, as chances de terem uma depressão pós-parto são muito maiores. Isso envolve muito seu acompanhamento com o obstetra. Quando essa mãe sofre violências, agressões verbais e até físicas, quando perde a confiança no 1 - O puerpério é o período pós-parto que abrange desde o dia do nascimento do bebê até a volta da menstruação da mulher, depois da gravidez que pode durar 45 dias, dependendo de como é feita da amamentação.

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profissional que aparentemente sempre esteve ao seu lado, esse quadro depressivo pode ser expressivamente piorado. Porque o pós-parto já é naturalmente uma fase mais melancólica da mulher, uma fase de extrema adaptação para todos a sua volta e principalmente para essa mãe. Por isso a importância de informar essa mulher para que ela possa se sentir segura e saber o que está acontecendo a sua volta. Saber quando dizer não a família, ao companheiro, aos profissionais que a acompanham. A humanização do parto não engloba só o fato da mulher parir, mas todo o trajeto que ela vai percorrer até se sentir confiante para caminhar mais segura. Se engana quem pensa que a humanização só deve acontecer em partos normais, pelo contrário, a escolha da mulher é primordial em qualquer aspecto. Michele lembra que já trabalhou como doula para mães que optaram pela cirurgia. Por mais que ela, sempre quisesse que as mulheres optassem pelo mais natural, ela também tem que respeitar todo o contexto que essa mãe está inserida. Ela exemplifica que em um caso, foi ajudar uma mulher que estava com 41 semanas de gestação e por todo cansaço que ela apresentava, para a doula, foi um momento de atuar como acolhedora. Por tempos Michele se cobrou por isso, achava que havia falhado, mas depois percebeu que existiam outros fatores que influenciaram essa mulher, como a obstetra alertar que depois de 41 semanas é algo perigoso, a família cobrando o nascimento do bebê, tudo isso gerou um enfraquecimento emocional e optar pela cesárea foi um alívio para essa mãe. E mesmo assim, ela conta que a tendência é sempre diminuir os danos, levar esse bebê para os seios da mãe no primeiro momento, proporcionar um contato mais íntimo com esse bebê que já foi muito idealizado e aguardado. 81


Para os companheiros, Michele também faz acompanhamentos. Ela explica que sempre pede que eles estejam em todos os encontros, pois também têm inseguranças, dúvidas, processo de adaptação e principalmente, também são informados sobre todo o processo, que a mãe e o bebê vão passar. Quando a questiono sobre o cenário em Goiânia, afirma que ainda é um trabalho vagaroso, de formiguinha mesmo. Na época em que esteve grávida, nem se conhecia o termo ‘doula’, haviam apenas duas mulheres na cidade que eram atuantes. Assim que o trabalho foi introduzido com a Maternidade Dona Iris, é que foi conhecido. Mesmo com a existência da Maternidade Nascer Cidadão que já praticava, mas por ser mais distante, em um bairro afastado, acabava dificultando o acesso. Então é um trabalho bem minucioso que exigem lutas diárias. Ela frisa que o debate sobre violência obstétrica deve acontecer para que as próprias mulheres possam reconhecer quando as sofrerem. Agressões não são apenas questões físicas, mas verbal, psicológica. O universo de mulheres que vivenciaram essa violência velada é muito grande e a sociedade precisa enxergar isso de uma forma séria, para que essa realidade mude.

É um trabalho de parceria, de união em que umas possam se apoiar nas outras e assim lutar contra tudo aquilo que ultrapassa o limite do respeito.

Hoje, Michele é a presidenta da Associação de Doulas em Goiás, que foi fundada em 2016 e em conjunto com outras profissionais, lutam pelo reconhecimento da profissão na sociedade, pelo total cumprimento dos direitos das mães e pela punição em face da justiça por toda violência obstétrica praticada diariamente. 82

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Dona de suas escolhas Capítulo 08

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onheci Lucyana quando seu filho ainda estava em sua barriga. Fui recebida em seu apartamento em uma noite quente de março 2016. Ela estava com 35 semanas aos 32 anos, finalizando seu mestrado em Pedagogia pela Universidade Federal de Goiás. Uma vida nada quieta. Enquanto ela me mencionava toda sua rotina de mulher, esposa, mestranda e agora mãe. Ficava imaginando todo o trajeto que a levou até esse momento. E minha grande curiosidade, era saber como ela queria que esse filho viesse ao mundo. Bem direta, Lucyana já disse: “- Quero parto normal”. Essa afirmação seria bem comum, já que muitas mulheres querem que seus filhos nasçam pelo método natural, mas para ela, o significado tinha um sentido maior por trás. E para saber qual sentido, era preciso começar a entender como foi o seu próprio nascimento. Para ela, parto normal foi, em boa parte da sua vida, algo traumático. Lucyana nasceu com praticamente cinco quilos em um parto bastante dolorido para sua mãe. Tanto a mãe quanto a tia, sofreram violência 85


obstétrica, já que não tiveram acompanhamento adequado, e elas atribuem isso as condições financeiras na época. Por isso, toda vida, essa mulher caminhou rumo a uma cesárea, era algo que já estava decidido antes mesmo dela querer ser mãe. A mudança veio a partir de uma conversa com sua amiga, Carolina Goos, quando foram de fato pensar em como seria uma cesariana, se deram conta, que até o mais leigo no assunto, sabe que é um corte profundo no útero. Essa informação, mesmo que superficial, fez com que ela começasse a fazer várias pesquisas, de como eram os nascimentos no Brasil, no mundo e percebeu que o parto normal era uma ótima opção, tanto para ela, quanto para seu filho, mas sempre com o pensamento de não se auto punir caso uma cesárea fosse realmente necessária. Até chegar a esse pensamento, ela passou por várias situações. Antes dessa gestação, Lucyana sofreu um aborto espontâneo. No mesmo ano, ela passou por uma grande decepção com o médico que a acompanhava há oito anos. Na época, ele informou que ela precisaria fazer um procedimento no útero e que este devia ser feito por fora do plano de saúde. O profissional não soube explicar o que era esse problema, desconfiada ela buscou uma segunda opinião, e o que temia aconteceu, ela não precisava fazer absolutamente nada. Ela saiu em busca de alguém que pudesse acompanhá-la. Para sua família, Lucyana deveria buscar um profissional do sexo masculino. Sua mãe sempre repetiu isso para ela, que ‘médico tinha que ser homem’. Ela descobre sobre sua primeira gravidez quando encontra uma médica, porém ela não era obstetra. Em meio isso, uma exigência da Associação de Medicina do Brasil passou a exigir que houvessem mais partos normais na rede particular e ela se sentiu acuada, não pela 86

exigência, mas porque os profissionais começaram a deixar de atender pelos planos de saúde, dificultando sua busca. Em meio a esses relatos, Lucyana conta como era a relação dela com sua família, se tratando de sua escolha de parto. Para eles, parir era algo inatingível, crianças vinham ao mundo apenas por cirurgia pois era algo moderno. Quando ela levava esse discurso aos médicos, era taxada como irresponsável, negligente. Ou seja, ela era bombardeada de críticas por todos os lados então, acabou optando em comentar com pouquíssimas pessoas do seu meio para evitar tanto desgaste. Ao relatar o parto de sua avó, em que dos cinco filhos, apenas um houve a necessidade de intervenção cirúrgica, ela justifica que devido aos hábitos modernos as pessoas desacreditam que uma mulher é capaz de parir seus filhos. Os hábitos diários são bem diferentes dos praticados antigamente, como por exemplo: antes uma mulher deveria descer o rio para lavar roupas, caminhavam por horas para chegar até algum lugar e hoje tudo isso é facilitado por coisas modernas. Outro fator que causou estranhamento nas pessoas a sua volta, foi pelo fato dela ter plano de saúde. Por muitas vezes as pessoas afirmavam que partos normais eram para mulheres atendidas na rede pública de saúde. Por isso para ela, a todo momento, era um desafio manter essa escolha. A dor do parto também foi muito questionada pelas pessoas a sua volta. Em vários momentos a reação de mulheres era taxar como louca por escolher algo tão difícil. Para muitas, o fato de ir para uma cama de hospital e deixar que o médico tirasse o bebê, fazia parecer uma opção mais simplista. Mas como ela mesma já havia pesquisado, o pós-parto a deixava muito mais insegura, no caso de se recuperar de uma cirurgia, do que não 87


enfrentar a dor do parto normal, que era algo que ela não tinha ideia de como seria. Lucyana conta que quando descobriu a gravidez, logo procurou por profissionais que a apoiassem sua escolha. A médica que fez seu acompanhamento, indicou a ela uma doula que também era fisioterapeuta, assim ela poderia fazer ao longo da gestação, exercícios que estimulassem o parto normal. Ao longo de sua preparação, ela foi aprendendo que a dor seria

sua aliada nesse processo de nascimento, tanto do filho quanto dela. Afinal se tornaria mãe.

A necessidade de falar com uma mulher grávida, era para entender justamente o que se passa em sua mente, qual influência que as pessoas têm nessa escolha, como seu cotidiano pode mudar o rumo das coisas. Lucyana completou 40 semanas no dia 23 de abril de 2016, ela ligou para sua médica, que pediu que ela fosse para a maternidade. Chegando lá, viram que seu bebê não estava encaixado o que dificultaria o parto normal, porém esse encaixe poderia se realizar naturalmente durante o trabalho de parto. Mesmo com 40 semanas completas não havia sinais de trabalho de parto e nesse momento houve uma conversa com a médica por telefone que acompanhou a gestação quanto a possível escolha de cesárea, caso não houvesse parto natural nas próximas 48h. Nesse momento a médica sugeriu um procedimento conhecido como deslocamento de bolsa, um processo bastante doloroso, mas que poderia levar ao trabalho de parto, caso o bebê estivesse pronto para o nascimento. Após esse procedimento levou apenas 2h para que o trabalho de parto se iniciasse. As 20h30 iniciaram as contrações, ainda sem ritmo. As 23h30 chegaram a acontecer ritmadas e a cada 5 minutos. O bebê conforto foi colado no carro e ligaram para médica que havia 88

orientado anotar tudo. Com base nas anotações ela pediu que se dirigissem à maternidade para verificar dilatação. Foram orientados a internar pois já estava de fato em trabalho de parto ativo. A noite toda Lucyana fez agachamento na bola cedida pela maternidade, exercícios aprendidos com a doula, banhos quentes, porém sem muito sucesso quanto a dilatação ou rompimento da bolsa. As 7h30 da manhã seguinte a médica disse que romperia a bolsa no centro-cirúrgico, para auxiliar no trabalho de parto. O procedimento foi realizado e por perceber que o bebê continuava alto a médica indicou caminhar, porém com cautela, pois poderia ocorrer prolapso de cordão, que é quando o mesmo sai antes do bebê, gerando grandes danos a ele. Como ela já havia feito várias pesquisas, ficou com receio continuar tentando o parto normal, já que havia risco de prolapso. Toda a situação, gerou muito medo, insegurança e com doze horas de trabalho de parto, ela optou pela cesárea. Felipe nasceu às nove e meia da manhã, em um domingo de abril, na Maternidade Modelo, em Goiânia. Lucyana não se arrependeu de suas escolhas. Assim que nasceu seu filho foi colocado em seus braços, não foi amarrada na cama. Foi um parto humanizado, mesmo sendo uma cesárea. A grande questão é que, quando bem informadas as mães conseguem lutar por aquilo que é mais adequado para suas crias. O desleal são profissionais que utilizam dessa falta de informação para amedrontar e acuar as 89


mulheres a fazerem o que eles julgam certo. Por muito tempo ela se sentiu frustrada porque sonhou muito com seu parto como normal, mas com o tempo viu que, ela não era menos mãe ou menos mulher por ter optado por cesárea e hoje, mesmo não desejando mais filhos, conta com orgulho de todo seu trajeto, de toda sua experiência e que acima de tudo, da sua felicidade por ter tido um parto tão consciente e tão respeitado por todos e por ela mesma.

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A força que vem do medo Capítulo 09

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ssombrada pela morte, Marina só queria dar vida a sua. Dessa vez um parto pélvico decidiria seu futuro. Em outubro de 2012 ela conheceu a morte perdendo um filho com 7 semanas de gestação, um ano depois ela engravidou, acompanhada do medo, mas ciente de todas as suas escolhas. Foram duas horas de conversa, e quando eu olhava para aquela mulher se abrindo para uma estranha, falando de momentos tão íntimos, percebi que a força também vem do medo. Qual o peso de uma frase dita em um momento melindroso pode causar nas pessoas? A que mais amedrontava Marina era: “- Seu bebê pode morrer”. Dizer isso para uma mulher que nem pensa em ter filhos é como informar que cigarro causa câncer para uma pessoa que não fuma, mas dizer isso para uma mulher grávida vai além do desespero humano. Ela sempre quis um parto humanizado, quando engravidou de Helena, Marina já conhecia o termo pois na mesma época sua irmã estava grávida em 93


São Paulo e fazia acompanhamento por uma equipe humanizada. Mesmo conhecendo e optando por algo mais humanizado, por um parto normal, Helena estava sentada. Seu obstetra então informou que os riscos de um parto pélvico eram grandes e que neste caso, uma cesárea era mais indicada, mesmo que os riscos fossem praticamente os mesmos. Quando a neném está nesta posição, ela pode ficar presa, pois só dá para saber se a cabecinha vai passar quando ela chegar no encaixe, e isso só vai acontecer depois de passar todo o corpinho. Caso a cabeça não passe, o bebê morre. Após essas informações, Marina descartou o parto normal, mesmo com chances mínimas de acontecer. Seu obstetra é da linha humanizada em Goiânia, então ele explicou os riscos da situação, informou sobre os perigos da cesárea, mas para Marina, ir para um parto normal sabendo dos riscos que sua bebezinha corria, era psicologicamente impossível para ela. No Brasil parto pélvico é sinônimo de cesárea e em todo canto que ela pesquisava, não tinha nada que falasse o contrário. Ela não tinha estrutura para passar por aquilo sabendo de tudo que ela perderia caso acontecesse o pior.

Sua escolha foi tornar aquela cesárea a mais humanizada possível. Esperou entrar em trabalho de parto, estourar a bolsa, entrar da fase o expulsivo e depois fazer o procedimento. Na hora tiraram o pano de sua barriga para ela ver a neném, a colocaram em seu colo, foi amamentada após tomar banho. Ela foi respeitada, foi possível criar um elo com sua filha já nos primeiros momentos. Mesmo assim, foi um processo muito doloroso escolher a cesariana. Para ela, 90% dos obstetras do país 94

optam por cesárea, então acredita que foi induzida a fazer essa escolha. Além disso, a mãe conta que se sentiu mal assistida no processo. Como ela ia fazer cesariana, não insistiu em ter o acompanhamento com uma doula, pela frustração. Então não houve ali uma ligação maior com seu médico. Na terceira gestação, em 2016, foi em vários médicos. Ela já havia tido uma experiência com médicos humanizados na primeira gestação e agora foi em busca de sanar as lacunas que foram deixadas das outras vezes. Já no início, descobriu um descolamento de placenta, então optou por um obstetra que fosse mais presente, já que o aborto do primeiro filho sempre a amedrontava. Com 20 semanas ela descobriu que estava com diabetes gestacional e quando foi atrás de seu médico não teve nenhum retorno, o que a deixou bastante apreensiva. Por fim a secretária foi quem passou um recado, dizendo para procurar uma endocrinologista com urgência. Isso caiu como uma bomba para Marina, não entendia o que aquela palavra significava. Logo começou a pedir indicação de endócrinos em todos os meios que ela tinha, e em um grupo de mães ela conseguiu um. Uma médica que a tranquilizou sobre o problema, pediu que diminuísse os carboidratos e continuasse com a alimentação normal. Ela continuou a dieta que sua nutricionista havia passado, pois antes de engravidar, estava acima do peso. O momento pior foi quando buscou uma profissional que mais uma vez optou em utilizar de forma brusca a palavra morte. Dessa vez com diabetes gestacional, uma médica disse que sua bebê poderia morrer a qualquer momento e que deveria esquecer a ideia de um parto normal, que com 38 semanas eles tinham que tirar a neném da barriga. Ela foi orientada a tomar insulina, se 95


sentia como uma bomba relógio, muito insegura com a forma que foi tratada com todos os profissionais que ela passou até aquele momento. Ao longa da gestação, ela fez tipo de exame para se certificar que tudo corria bem. A neném ainda estava pélvica, e a médica insistia que ela não poderia ter um parto normal. A bebê começou a virar para a alegria da mãe, mas viu que com a profissional que estava, nem assim conseguiria fazer o parto normal. Novamente se viu insegura com tudo que ela sabia e a forma que os profissionais tratavam diabetes gestacional. Insistiram com a insulina, mas ela sabia que se usasse não poderia ter um parto normal já que durante o processo há picos da glicemia por conta das oscilações. O atendimento humanizado foi primordial para ela fazer as escolhas que lhe cabiam naquele momento. De um lado, profissionais que só diziam que sua filha iria morrer, que ela tinha que ser medicada a todo custo, que faziam com que ela se sentisse uma irresponsável. Do outro, um profissional que a deixava tranquila e aliviada, sem intervenções que lhe custariam o tão sonhado parto normal, que era um processo bom, tanto para a bebê quanto para ela. E assim ela foi vivendo um dia de cada vez, percebeu que não dava para controlar tudo, que era preciso ver o que é belo no que de fato é seu e não naquilo que imaginou que seria. Marina foi aos poucos se tranquilizando, se munindo de conteúdos sobre parto e encontrando forças dentro dela para superar barreiras que só ela poderia quebrar.

38 semanas e seis dias Quando ela completou 38 semanas e dois dias, não 96

havia nenhum sinal que indicasse o início do trabalho de parto, então seu médico disse que deveriam esperar as 39 semanas. No sexto dia das 38 semanas, entrou em trabalho de parto após seis horas de dores intensas e devido diabetes foi de imediato para o hospital com seu companheiro e sua doula, Livia Sebba. Ao chegar, foi examinada e não tinha nenhuma dilatação, ela não entendia o porquê de tanta dor. “Eu pensei mesmo em

desistir. Porque foi só no trabalho de parto que eu entendi o porquê que as pessoas fazem cesárea, sabe? É muito assustador você virar mãe. E eu tive toda a experiência assustadora de virar mãe com a Helena no colo. Foi muito difícil”, afirmou.

Aquelas horas em trabalho de parto fazia com ela também passasse por um processo de nascimento, que na cesariana não foi possível, “já que você já está ali

com uma criança nos braços para cuidar enquanto seu corpo se recupera”.

Naquele momento estava subindo degrau por degrau da maternidade até a chegada de sua filha. A cada contração ela se descobria, em sua mente havia uma guerra travada para lidar com aquela dor e sua escolha. Sabia que naquele momento era ela com ela mesma. Todo aquele momento foi planejado, músicas foram escolhidas. Ela imaginava cenas e cenas românticas nos braços do seu amor, mas na hora foi tudo muito diferente. Com as dores que estava sentindo tudo que queria era silêncio, já que dentro dela, em sua mente já haviam muitos diálogos sobre tudo que a levou para aquele instante. Entre uma contração e outra, adormecia. O lugar mais confortável que ela encontrou foi o vaso sanitário. Então para sua doula e seu companheiro, tudo estava bem tranquilo, mas por dentro, ela guerreava. 97


Ela sabia que quando completasse cinco sentimentos ela podia pedir anestesia, então focou nisso. Seu cansaço a fez se concentrar no próximo passo que seria cessar essa dor. Nisto, ela se questionou várias vezes, pensava em como convencer a doula e o marido a usar anestesia, se perguntava porque ela não poderia usar, se aquilo era uma prova para alguém ou para a sociedade. Quando alcançou os sete centímetros, o médico ainda não estava no local, então avisou que iria tomar e não foi questionada. Nesse momento Marina fez as pazes com várias questões suas. Ela percebeu que não havia um caminho certo para a maternidade, que tudo que ela estava passando era importante para sua filha, mas não era o principal. Viu que todo aquele processo era mais para ela. Quando se levantou dizendo que iria tomar a anestesia, sentiu algo diferente e uma dor tomou conta do seu corpo, não conseguia nem andar. Então entrou na ‘Partolândia’ que é um universo particular, um estado de interiorização que muitas mulheres vivenciam durante o trabalho de parto. Marina fala que até aquele momento, nunca tinha conseguido meditar em nada, era sempre tomada por vários pensamentos, mas neste, conseguiu se desligar e imaginou um lugar branco, era como se estivesse boiando. Após isso iniciou o processo de expulsão e sentiu uma ardência enorme, com mais algumas forças, sentiu a cabeça de sua filha e ela nasceu. Beatriz nasceu após 17 horas de parto. Seu pai cortou o cordão umbilical e ela ficou o tempo todo no colo da mãe sendo beijada e acalentada. Diferente de Helena, que mesmo com uma cesárea humanizada, Marina só conseguiu pegar de fato sua 98

filha no colo após o término de todo medicamento em decorrência da cirurgia, dessa vez ela pôde sentir sua filha de todas as formas. A mãe fala que todo esse processo é muito empoderador para as mulheres, que aquelas que sonham com isso, devem sim vivenciar. Que a dor do parto é bem diferente da dor causada por seres humanos que praticam violência obstétrica.

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E

ela me fez “dançar pra dentro”! Revisitar as experiências dos partos - meus e das mulheres às quais doulei. Sob o olhar atento, o coração querendo bater fora do peito (acredito que ela tem um coração que abraça) e buscando o fôlego nas entrelinhas de nossas histórias, Aline nos trouxe uma oportunidade de via dupla: “entrar pra dentro” pra deixar ecoar nossas vozes no cenário da humanização do parto na cidade de Goiânia. Suas entrevistas semiestruturadas embalançaram memórias de corpos falantes; de corpos gritantes. Seja por experiências bem-sucedidas no parto e outras que deixaram feridas eternas, a “jornalista de coração que abraça” nos conduziu para espaços de reflexão. Esse livro reportagem, deu voz às “mulheres que cuidam” (significado de Doula em grego) e às mulheres que foram cuidadas (douladas); aos “doutô” do parto humanizado e às ações que tem movimentado esse nascer e parir com respeito. É com muito respeito e embalançando as mulheres de corpo inteiro, de desejos e escolhas próprias, que considero essa obra, um passo importantíssimo para que ações de âmbito público e privado sejam assimiladas e incentivadas por um coletivo humanizado e afetivo. ...e ela me fez (re)nascer pra dentro!

Memórias

Juliana Pigrucci - Mãe e doula

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Aline Willik

Fotรณgrafa: Silvia Helena

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Michele Oliveira Fotรณgrafa: Aline Willik

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Lívia Sebba Arquivo Pessoal

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Deivis Vilaรงa

Maternidade Nascer Cidadรฃo Arquivo pessoal


Marina Nori Arquivo Pessoal

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Juliana Pigrucci Arquivo Pessoal


Lucyana Moraes Arquivo pessoal Meire Martins

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Carolina Goos Arquivo Pessoal

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Luiz Carlos Pinheiro Arquivo pessoal


Embalanรงo Arquivo Pessoal

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Associação das Doulas do Estado de Goiás Arquivo pessoal


Audiência Pública sobre Violência Obstétrica

Fotos: Denise Xavier


E

Posfácio

ela me fez “dançar pra dentro”! Revisitar as experiências dos partos - meus e das mulheres às quais doulei. Sob o olhar atento, o coração querendo bater fora do peito (acredito que ela tem um coração que abraça) e buscando o fôlego nas entrelinhas de nossas histórias, Aline nos trouxe uma oportunidade de via dupla: “entrar pra dentro” pra deixar ecoar nossas vozes no cenário da humanização do parto na cidade de Goiânia. Suas entrevistas semiestruturadas embalançaram memórias de corpos falantes; de corpos gritantes. Seja por experiências bem-sucedidas no parto e outras que deixaram feridas eternas, a “jornalista de coração que abraça” nos conduziu para espaços de reflexão. Esse livro reportagem, deu voz às “mulheres que cuidam” (significado de Doula em grego) e às mulheres que foram cuidadas (douladas); aos “doutô” do parto humanizado e às ações que tem movimentado esse nascer e parir com respeito. É com muito respeito e embalançando as mulheres de corpo inteiro, de desejos e escolhas próprias, que considero essa obra, um passo importantíssimo para que ações de âmbito público e privado sejam assimiladas e incentivadas por um coletivo humanizado e afetivo. ...e ela me fez (re)nascer pra dentro! Juliana Pigrucci - Mãe e doula

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