Ciganos

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SALVADOR DOMINGO 3/7/2011

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#170 / DOMINGO, 3 DE JULHO DE 2011 REVISTA SEMANAL DO GRUPO A TARDE

LUCINHA ARAÚJO BICICLETA ELÉTRICA ALMOFADAS «

Ângulo da

RESISTÊNCIA Antropólogo e fotógrafo, Rogério Ferrari retrata, em exposição e em livro, a vida dos ciganos em 40 municípios baianos

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MILA CORDEIRO /AG. A TARDE

VIDA CIGANA O fotógrafo e antropólogo Rogério Ferrari lança em agosto livro e exposição do trabalho Ciganos, quem são eles?, um mergulho na história deste povo

Texto TATIANA MENDONÇA tmendonca@grupoatarde.com.br

O fotógrafo e antropólogo Rogério Ferrari

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MILA CORDEIRO /AG. A TARDE

VIDA CIGANA O fotógrafo e antropólogo Rogério Ferrari lança em agosto livro e exposição do trabalho Ciganos, quem são eles?, um mergulho na história deste povo

Texto TATIANA MENDONÇA tmendonca@grupoatarde.com.br

O fotógrafo e antropólogo Rogério Ferrari

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s traços severinos talvez os fizessem passar por simples sertanejos, mas nem seus quase iguais os veem assim. No interior da Bahia ou em qualquer outro canto do mundo, quem nasce cigano tem, desde o princípio, que se acostumar com o olhar da diferença, revezando-se os costumeiros insultos – ditos ou imaginados – entre vagabundos e ladrões, ladrões e vagabundos. O antropólogo e fotógrafo Rogério Ferrari, 46, nunca pensou assim. Na loja de tecidos do seu pai, em Ipiaú, desde pequeno via os ciganos comprando como os demais fregueses. De alguns, o pai tornou-se amigo, volta e meia visitavam sua casa. Não é que de menino tenha pensado em correr o Estado buscando descobrir quais eram os jeitos que os faziam assim tão singulares, mas foi justamente o que aconteceu. Entre outubro do ano passado e maio deste ano, percorreu 40 cidades de todas as regiões da Bahia. “Por conta dessa primeira percepção, de ter uma compreensão de que

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o estigma sobre eles não era uma coisa correta, resolvi fazer um trabalho que pudesse estabelecer um contraponto, mostrar uma visão além dessa generalização que ocorre muitoporcontadaignorânciadaspessoas, de não conhecer o povo, a cultura”. O projeto Ciganos, quem são eles? foi financiado pelo programa de Demanda EspontâneadoFundodeCulturadaBahia,da Secretaria de Cultura, e integra a série Existências-Resistências, que Ferrari desenvolve há 15 anos com o propósito de documentarpovosemconflitoaoredordomundo. Para quem já fotografou curdos e palestinos em luta por território e dignidade, os ciganos não são certamente uma escolha óbvia. “Num Brasil padronizado, eles

mantêm uma identidade própria e isso, de certa forma, é uma resistência”. A experiência será registrada num livro com fotografias e depoimentos, que deve ser lançado em agosto, acompanhado por uma exposição – algumas das imagens, inéditas, dão vida a esta reportagem.

DESCOBERTAS Quando saiu pela Bahia buscando ciganos, Ferrari já sabia mais ou menos para onde ir. Começou por Camaçari, por ouvir dizer que a comunidade de lá era grande. Logo descobriu que do ponto de vista econômico somos mais que parecidos. Há os ricos, os classe média, os pobres, mantendo-setambémaproporçãodeseremospri-

meiros poucos e os demais tantos. Os mais pobres permanecem vivendo em acampamentos nas periferias das cidades, mas a maioria já está morando em casas, num avançado processo de sedentarização. “O mito do cigano como nômade é questionávelepodeserentendidopelaimpossibilidade que eles tinham de permanecer nos lugares, sendo, na maioria das vezes, escorraçados. Não era, propriamente, uma vocação cultural”. Foi justamente essa perseguição que fez com que os ciganos chegassem ao País, expulsos de Portugal. A deportação deve ter começado, regularmente, a partir de 1686, como indica o pesquisador Rodrigo TeixeiranolivroHistóriadosciganosnoBra-

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«O mito do cigano como nômade é questionável e pode ser entendido pela impossibilidade que eles tinham de permanecer nos lugares» Rogério Ferrari


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s traços severinos talvez os fizessem passar por simples sertanejos, mas nem seus quase iguais os veem assim. No interior da Bahia ou em qualquer outro canto do mundo, quem nasce cigano tem, desde o princípio, que se acostumar com o olhar da diferença, revezando-se os costumeiros insultos – ditos ou imaginados – entre vagabundos e ladrões, ladrões e vagabundos. O antropólogo e fotógrafo Rogério Ferrari, 46, nunca pensou assim. Na loja de tecidos do seu pai, em Ipiaú, desde pequeno via os ciganos comprando como os demais fregueses. De alguns, o pai tornou-se amigo, volta e meia visitavam sua casa. Não é que de menino tenha pensado em correr o Estado buscando descobrir quais eram os jeitos que os faziam assim tão singulares, mas foi justamente o que aconteceu. Entre outubro do ano passado e maio deste ano, percorreu 40 cidades de todas as regiões da Bahia. “Por conta dessa primeira percepção, de ter uma compreensão de que

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o estigma sobre eles não era uma coisa correta, resolvi fazer um trabalho que pudesse estabelecer um contraponto, mostrar uma visão além dessa generalização que ocorre muitoporcontadaignorânciadaspessoas, de não conhecer o povo, a cultura”. O projeto Ciganos, quem são eles? foi financiado pelo programa de Demanda EspontâneadoFundodeCulturadaBahia,da Secretaria de Cultura, e integra a série Existências-Resistências, que Ferrari desenvolve há 15 anos com o propósito de documentarpovosemconflitoaoredordomundo. Para quem já fotografou curdos e palestinos em luta por território e dignidade, os ciganos não são certamente uma escolha óbvia. “Num Brasil padronizado, eles

mantêm uma identidade própria e isso, de certa forma, é uma resistência”. A experiência será registrada num livro com fotografias e depoimentos, que deve ser lançado em agosto, acompanhado por uma exposição – algumas das imagens, inéditas, dão vida a esta reportagem.

DESCOBERTAS Quando saiu pela Bahia buscando ciganos, Ferrari já sabia mais ou menos para onde ir. Começou por Camaçari, por ouvir dizer que a comunidade de lá era grande. Logo descobriu que do ponto de vista econômico somos mais que parecidos. Há os ricos, os classe média, os pobres, mantendo-setambémaproporçãodeseremospri-

meiros poucos e os demais tantos. Os mais pobres permanecem vivendo em acampamentos nas periferias das cidades, mas a maioria já está morando em casas, num avançado processo de sedentarização. “O mito do cigano como nômade é questionávelepodeserentendidopelaimpossibilidade que eles tinham de permanecer nos lugares, sendo, na maioria das vezes, escorraçados. Não era, propriamente, uma vocação cultural”. Foi justamente essa perseguição que fez com que os ciganos chegassem ao País, expulsos de Portugal. A deportação deve ter começado, regularmente, a partir de 1686, como indica o pesquisador Rodrigo TeixeiranolivroHistóriadosciganosnoBra-

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«O mito do cigano como nômade é questionável e pode ser entendido pela impossibilidade que eles tinham de permanecer nos lugares» Rogério Ferrari


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EXISTÊNCIASRESISTÊNCIAS Há 15 anos, o antropólogo e fotógrafo baiano Rogério Ferrari viaja o mundo documentando povos que lutam por autodeterminação. O projeto, que já rendeu quatro livros, foi batizado de Existências-Resistências » Zapatistas em Chiapas, no México (1996/1998) » Palestinos sob ocupação israelense (2002) » Curdos na Turquia (2002/2003) » Movimento dos Sem-Terra no Brasil (2006/2007) » Refugiados palestinos no Líbano e na Jordânia (2008) » Refugiados Saarauis no deserto do Saara e nos territórios ocupados pelo Marrocos (2008) » Ciganos na Bahia (2010/2011)

sil. “Desde o século 15 a palavra “cigano” é utilizada como um ‘insulto’”, escreve. Se no Brasil o afugentamento abrandou-se, o mesmo não pode ser dito da Europa, especialmente da França, que expulsou – entre 2009 e 2010 – quase 20 mil ciganos do seu território. Movendo-se pelo mundo nas mais variadas direções, os ciganos constituíram um grupo bem diverso, tornando difícil a tarefa de apontar características que os definam. Mas procurando bem, sempre se encontra. As mais visíveis, diz Ferrari, são a língua (ele aprendeu duas palavrinhas, sob a condição de não repeti-las a toa por aí) e o modo como se vestem. As mulheres, a partir da primeira menstruação, só podem usar saias e vestidos. Dentre os rituais, o casamento é o mais comemorado. “É uma celebração muito importante porque é pelo casamento en-

dógeno que a cultura se mantém”. As cerimônias acontecem cedo para os padrões atuais. Os rapazes costumam ter 16 anos e as meninas, 13. “É para que elas não se envolvam com brasileiros”, diz a sociólogaeprofessoradaUnebMiriamGuerra,queestudaciganos sertanejos há vinte anos, especialmente os de Jacobina e Miguel Calmon. Ela conta que os casamentos são “acontecimentos” que reúnem todos os grupos da região. “Geralmente duram dois dias. O pai da noiva paga o dote, mata o boi... As famílias vão chegando, bebem, negociam, arranjam novos casamentos. É uma festança para toda a cidade”. Quando se casam, os ciganos deixam a escola. “Os meninos, como eles dizem, já nascem formados em matemática, pela habilidade com o negócio”, lembra Ferrari. Historicamente associados à venda de animais, eles foram aos poucos modificando suas atividades econômicas, mantendo, no entanto, o secular tino para o comércio.

AGIOTAGEM Os homens passam o dia nas praças, negociando ou envolvidos com outros “movimentos”. “A maioria tem como prática o empréstimo, conhecido como agiotagem. Nós estigmatizamos essa prá-


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EXISTÊNCIASRESISTÊNCIAS Há 15 anos, o antropólogo e fotógrafo baiano Rogério Ferrari viaja o mundo documentando povos que lutam por autodeterminação. O projeto, que já rendeu quatro livros, foi batizado de Existências-Resistências » Zapatistas em Chiapas, no México (1996/1998) » Palestinos sob ocupação israelense (2002) » Curdos na Turquia (2002/2003) » Movimento dos Sem-Terra no Brasil (2006/2007) » Refugiados palestinos no Líbano e na Jordânia (2008) » Refugiados Saarauis no deserto do Saara e nos territórios ocupados pelo Marrocos (2008) » Ciganos na Bahia (2010/2011)

sil. “Desde o século 15 a palavra “cigano” é utilizada como um ‘insulto’”, escreve. Se no Brasil o afugentamento abrandou-se, o mesmo não pode ser dito da Europa, especialmente da França, que expulsou – entre 2009 e 2010 – quase 20 mil ciganos do seu território. Movendo-se pelo mundo nas mais variadas direções, os ciganos constituíram um grupo bem diverso, tornando difícil a tarefa de apontar características que os definam. Mas procurando bem, sempre se encontra. As mais visíveis, diz Ferrari, são a língua (ele aprendeu duas palavrinhas, sob a condição de não repeti-las a toa por aí) e o modo como se vestem. As mulheres, a partir da primeira menstruação, só podem usar saias e vestidos. Dentre os rituais, o casamento é o mais comemorado. “É uma celebração muito importante porque é pelo casamento en-

dógeno que a cultura se mantém”. As cerimônias acontecem cedo para os padrões atuais. Os rapazes costumam ter 16 anos e as meninas, 13. “É para que elas não se envolvam com brasileiros”, diz a sociólogaeprofessoradaUnebMiriamGuerra,queestudaciganos sertanejos há vinte anos, especialmente os de Jacobina e Miguel Calmon. Ela conta que os casamentos são “acontecimentos” que reúnem todos os grupos da região. “Geralmente duram dois dias. O pai da noiva paga o dote, mata o boi... As famílias vão chegando, bebem, negociam, arranjam novos casamentos. É uma festança para toda a cidade”. Quando se casam, os ciganos deixam a escola. “Os meninos, como eles dizem, já nascem formados em matemática, pela habilidade com o negócio”, lembra Ferrari. Historicamente associados à venda de animais, eles foram aos poucos modificando suas atividades econômicas, mantendo, no entanto, o secular tino para o comércio.

AGIOTAGEM Os homens passam o dia nas praças, negociando ou envolvidos com outros “movimentos”. “A maioria tem como prática o empréstimo, conhecido como agiotagem. Nós estigmatizamos essa prá-


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tica, por conta da cobrança de juros e tudo mais, mas perdemos de vista a usura praticada pelos banqueiros, que levam milhares de famílias à falência. Eles costumam dizer que não vão oferecer dinheiro, as pessoas é que os procuram...”, diz Ferrari. Não são raros os casos de prefeitos clientes do serviço, tendo havido o absurdo – onde mais, se não na Bahia? – de um gestor municipal (José Mauro de Oliveira Filho) que até “doou” uma praça para agradar um cigano a quem muito devia. O fato aconteceu em Queimadas, em 2008. A ‘atividade’ comercial volta e meia os faz parar nas páginas de jornal, já que os meios de cobrança das dívidas nem sempre são ortodoxos. A parte isso, Ferrari percebeu que as relações entre os ciganos e os demais moradores das cidades são, na maioria das vezes, tranquilas, com aquele resquício do preconceito de quem erradamente toma um por todos. A troca das antigas barracas por casas fez com que eles se inserissem na comunidade, e assim a vida vai melhorando. “Eles dizemqueanteseraumasituaçãodemuita dificuldade, de ir de um lado a outro na intempérie,comasmulheresparindonomato... Hoje estão numa condição melhor, embora alguns sintam falta da dinâmica das viagens”. Para estar perto das pessoas que retratou, Ferrari algumas vezes teve que “forçar a barra”. É que os ciganos não entendiam sua insistência em estar por ali. Mas, para ele, tratava-se de transpor primeiras impressões. “O grande lance é poder fazer o trabalho cujo sentido não seja só para mim. Entendo que não deva haver uma separação entre a criação estética e uma posição diante da realidade. Como fotógrafo, não busco um tema exótico que propicie imagens espetaculares, justamente para não reproduzir estereótipos. Os ciganos

são exemplo de um povo forte que, depois de séculos de opressão, manteve uma identidade, saindo por meios próprios de uma situação de penúria”.

VISIBILIDADE Em A História dos Ciganos no Brasil, Teixeira revela que em 1718 foram enviados de Portugal para a Bahia “diversas famílias de ciganos”. Dom João V mandou, com os degredados, um recado: de que os baniu “devido ao seu escandaloso procedimento neste reino” e que por aqui também deveriamserproibidosdeusarsualíngua,como ele já havia feito por lá. Teixeira conta que Salvador tornou-se rapidamente ”a mais importante cidade para os ciganos do Bra-

sil”. Eles viviam principalmente na Mouraria, tendo depois migrado para o bairro do Santo Antônio Além do Carmo. Nenhuma instituição sabe precisar quantos ciganos vivem hoje no País. O primeiro levantamento do IBGE a esse respeito foi feito em 2009 e registrou 290 acampamentos. A Bahia é o Estado que reúne o maior número deles, 51 no total. Para a professora Miriam Guerra, apesar de Lula ter criado em 2006 o Dia Nacional dos Ciganos, comemorado em 24 de maio, as políticas públicas para esse grupo não avançaram. “Nunca demos sequer visibilidade a um grupo que ajudou a construir a história do nosso País”. Ela defende que sejam estabelecidas cotas para ciganos nas universidades e que sejam criados cursos de alfabetização para ciganos adultos, que antes viviam como nômades e não costumavam frequentar as escolas. A política mais importante, no entanto, não precisa passar por burocracias e gabinetes. Reconhecer a igualdade na diferença já é de grande valia. «

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tica, por conta da cobrança de juros e tudo mais, mas perdemos de vista a usura praticada pelos banqueiros, que levam milhares de famílias à falência. Eles costumam dizer que não vão oferecer dinheiro, as pessoas é que os procuram...”, diz Ferrari. Não são raros os casos de prefeitos clientes do serviço, tendo havido o absurdo – onde mais, se não na Bahia? – de um gestor municipal (José Mauro de Oliveira Filho) que até “doou” uma praça para agradar um cigano a quem muito devia. O fato aconteceu em Queimadas, em 2008. A ‘atividade’ comercial volta e meia os faz parar nas páginas de jornal, já que os meios de cobrança das dívidas nem sempre são ortodoxos. A parte isso, Ferrari percebeu que as relações entre os ciganos e os demais moradores das cidades são, na maioria das vezes, tranquilas, com aquele resquício do preconceito de quem erradamente toma um por todos. A troca das antigas barracas por casas fez com que eles se inserissem na comunidade, e assim a vida vai melhorando. “Eles dizemqueanteseraumasituaçãodemuita dificuldade, de ir de um lado a outro na intempérie,comasmulheresparindonomato... Hoje estão numa condição melhor, embora alguns sintam falta da dinâmica das viagens”. Para estar perto das pessoas que retratou, Ferrari algumas vezes teve que “forçar a barra”. É que os ciganos não entendiam sua insistência em estar por ali. Mas, para ele, tratava-se de transpor primeiras impressões. “O grande lance é poder fazer o trabalho cujo sentido não seja só para mim. Entendo que não deva haver uma separação entre a criação estética e uma posição diante da realidade. Como fotógrafo, não busco um tema exótico que propicie imagens espetaculares, justamente para não reproduzir estereótipos. Os ciganos

são exemplo de um povo forte que, depois de séculos de opressão, manteve uma identidade, saindo por meios próprios de uma situação de penúria”.

VISIBILIDADE Em A História dos Ciganos no Brasil, Teixeira revela que em 1718 foram enviados de Portugal para a Bahia “diversas famílias de ciganos”. Dom João V mandou, com os degredados, um recado: de que os baniu “devido ao seu escandaloso procedimento neste reino” e que por aqui também deveriamserproibidosdeusarsualíngua,como ele já havia feito por lá. Teixeira conta que Salvador tornou-se rapidamente ”a mais importante cidade para os ciganos do Bra-

sil”. Eles viviam principalmente na Mouraria, tendo depois migrado para o bairro do Santo Antônio Além do Carmo. Nenhuma instituição sabe precisar quantos ciganos vivem hoje no País. O primeiro levantamento do IBGE a esse respeito foi feito em 2009 e registrou 290 acampamentos. A Bahia é o Estado que reúne o maior número deles, 51 no total. Para a professora Miriam Guerra, apesar de Lula ter criado em 2006 o Dia Nacional dos Ciganos, comemorado em 24 de maio, as políticas públicas para esse grupo não avançaram. “Nunca demos sequer visibilidade a um grupo que ajudou a construir a história do nosso País”. Ela defende que sejam estabelecidas cotas para ciganos nas universidades e que sejam criados cursos de alfabetização para ciganos adultos, que antes viviam como nômades e não costumavam frequentar as escolas. A política mais importante, no entanto, não precisa passar por burocracias e gabinetes. Reconhecer a igualdade na diferença já é de grande valia. «

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