Saúde: Para onde vamos?

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BOLETIM DA FEV/2017

SAÚDE:

PARA ONDE VAMOS?

NESTA EDIÇÃO: Inovação: A vacina contra a dengue; Novas indicações de medicamentos. Acesso: Saúde da população transgênero no Brasil.

A epidemia de febre amarela CT&I: Gasto público com pesquisa é investimento e deve gerar benefício para a sociedade.

e mais: eventos, oportunidades e novidades da UAEM.


Índice Editorial ................................................................................................................... 2 Notas .......................................................................................................................3 Cortes de verbas de CT&I ..........................................................................................6 A Vacina da dengue ................................................................................................ 14 A epidemia de Febre Amarela .................................................................................18 Novas Indicações .................................................................................................... 21 Você sabe como anda a saúde da população transgênero no Brasil? ......................... 24

Boletim UAEM Brasil

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EDITORIAL Em 2017 chegamos à 4ª edição do Boletim da UAEM Brasil sob este novo formato. As reflexões colocadas na primeira edição, em que perguntávamos “Por que a saúde do SUS é importante para a SUA saúde?” ainda são profundamente relevantes. Nesta edição, procuramos focar em pontos da política de saúde e CT&I que garantam que não apenas a SUA, mas a saúde de todos nós seja contemplada. Expomos os riscos do corte de investimentos em ciência, tecnologia e inovação, que podem levar a uma desestruturação do que o país vem construindo como a que se testemunhou no passado. Procuramos olhar para o futuro e pensar que novas tecnologias poderão surgir, como podemos inovar e, mais importante, quem será beneficiado por essa inovação. Finalmente, observamos como o país lida com os desafios que enfrenta atualmente na área do acesso ao tratamento adequado que englobe as necessidades de toda a população. Boa leitura. ——————————Se você gosta do nosso trabalho, divulgue! Se quiser escrever para o nosso boletim, entre em contato! Acesse a página da UAEM Brasil em http://uaem-br.org e o nosso facebook em http://fb.com/uaembr. Se você está em uma universidade (professores, pesquisadores, alunos…) e quer se envolver na UAEM ou levá-la para lá, entre em contato conosco em contato@uaem-br.org. Acompanhe os vídeos da UAEM Brasil no YouTube: http://bit.ly/uaemtube As edições antigas do boletim estão em: https://issuu.com/uaembr

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NOTAS

pat ent es sobre o medicament o

Patente do truvada negada

eficaz no tratamento da tuberculose

sutezolid. O medicamento se mostrou

O INPI indeferiu o

em ensaios, mas a

pedido de patente da

pesquisa não

combinação tenofovir

progrediu. Com a

+emtricitabina, que

licença, novas

tem o nome comercial

pesquisas poderão

d e Tr u va d a ® . I s t o

ser realizadas

s i g n i fi c a

sobre

que

o

suas

medicamento está em

aplicações e

domínio público e

combinações. A

versões genér icas poderão ser

decisão é fruto de pressão da

produzidas. A combinação é um

sociedade civil, incluindo a UAEM,

importante tratamento contra o HIV e

que enviou petição à universidade

pode ser usado como profilaxia pré-

para que levasse em consideração o

exposição (PrEP). O GTPI realizou

impacto de sua pesquisa biomédica

longa luta pela recusa da patente,

sobre a saúde das populações.

enviando subsídios ao exame do INPI

O acordo “tem o potencial de

e conduzindo a campanha

melhorar muito as opções de

#TruvadaLivre em 2016 (leia notícia

tratamento disponíveis atualmente,

sobre a decisão no site do GTPI). A

mas só será efetivo se os tratamentos

UAEM Brasil noticiou a decisão do

criados forem acessíveis para pessoas

INPI em nossa página do facebook.

vivendo com tuberculose em todo o mundo” afirmou Judit Rius Sanjuan,

JHU e o MPP firmam licença voluntária

Diretora para os Estados Unidos da

A Universidade Johns Hopkins (JHU)

Campanha de Acesso de Médicos

assinou licença voluntária com o Medicines Patent Pool (MPP) das suas Boletim UAEM Brasil

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Sem Fronteiras (MSF). Leia mais sobre

em Belo Horizonte, e quem estiver por

o tema no site da UAEM Global.

lá pode aparecer e participar. Mais informações em breve no facebook da

Participação da UAEM Brasil em audiência em Brasília

UAEM Brasil.

A UAEM Brasil e outras organizações

Leituras recomendadas:

que compõem o GTPI estiveram em

Kaushik Sunder Rajan, Pharmocracy. Value, Politics, and Knowledge in Global Biomedicine, Duke University Press, 2017.

Brasília para participar de audiência pública sobre acesso a medicamentos para o tratamento de HIV/AIDS. Destacamos em vídeo alguns pontos importantes levantados durante a discussão e a percepção dos participantes sobre o que levamos de positivo do encontro.

Reunião anual da UAEM Brasil A UAEM Brasil está preparando a sua Reunião Anual. A programação inclui

Celso Luiz Nunes Amorim, A política internacional da saúde: A UNITAID e o

mesas de debate sobre o futuro da

acesso a medicamentos, Mural International

pesquisa biomédica no Brasil e do

2016.27034.

v. 7, n. 1 (jan-jun, 2016), doi: 10.12957/rmi.

SUS e convidados da academia e do

Franzen Samuel R. P., Chandler C., Lang T.,

ativismo por acesso a medicamentos.

Health research capacity development in low and middle income countries: reality or rhetoric? A systematic meta-narrative review

Será no dia 17 de Março na UFMG,

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of the qualitative literature, BMJ Open 2 0 1 7 ; 7 : e 0 1 2 3 3 2 . d o i : 1 0 . 11 3 6 / bmjopen-2016-012332. Lia Hasenclever et al., Inovação no contexto de convergência tecnológica em biotecnologia: um estudo de caso, Anais do 1º ENEI, ago/2016. …mais recomendações de leitura no blog do editor.

Eventos e oportunidades Chamada Universal da FAPEMIG com inscrições abertas até 20 de março: http:// bit.ly/2kDYI12 Fellowship da Open Society Foundations (envio até 1º de Março): https://osf.to/ 2lCYN4F Bolsas Marisa Letícia Lula da Silva de apoio à formação acadêmica de mulheres latinoamericanas: http://bit.ly/2meF7kk 69ª Reunião Anual da SBPC (16 a 22 de Julho, UFMG): http://bit.ly/2lmvxMR FORTEC (16 a 19 Maio, Fortaleza): http:// bit.ly/2lmHxOs World Hepatitis Summit (1 a 3 de Novembro, São Paulo): http://bit.ly/2lyXJ1k I Encontro Rede TT->INOVA (16 e 17 de Março, Tecpar, Paraná): http://bit.ly/ 2kEfAEH I I C o n g r e s s o B r a s i l e i r o d e Po l í t i c a , Planejamento e Gestão em Saúde (01 a 04 de Maio, Natal): http://bit.ly/2kE8Uq0 V Seminário Anual Científico e Tecnológico de Bio-Manguinhos (02, 03 e 04 de Maio, Rio de Janeiro): http://bit.ly/2m0vFF3

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na condução da ciência e tecnologia

CORTES DE VERBAS DE CT&I

é crucial. O Brasil de amanhã que se constrói dependerá das decisões a

"Que o Orçamento Geral da União destine 2% [do PIB] para a ciência (...) O Brasil precisa de mais recursos, até porque os recursos públicos são fundamentais para a pesquisa. (...) Hoje nós vemos aqui o Brasil de amanhã"1. As palavras são do atual Ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab, durante a Expo T&C, evento que integrou a 68ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Ministro Gilberto Kassab na abertura da 68ª Reunião Anual da SBPC, em Porto Seguro (BA). Fonte: MCTIC, https://flic.kr/p/JMDXM6 CC-BY.

A reflexão a que nos convida o Ministro pode se aprofundar até os

respeito de que ciência se pretende

fundamentos do que imaginamos

incentivar no país hoje: a ciência a

como o papel do Estado na condução

serviço da sociedade, que introduz

da vida pública e na normalização

avanços tecnológicos que transpõem

das expectativas em nossa sociedade.

as agruras da população e reduzem

Se o Brasil precisa de mais recursos, e

desigualdades, ou a ciência a serviço

recursos públicos aplicados à área de

dos interesses do capital privado

pesquisa, é porque o papel do Estado

internacional?

SBPC 2016 – 2% do Orçamento Geral da União para ciência, defende Kassab. Youtube: https:// youtu.be/XnW10HUUtLs. 1

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Pensar o Estado como condutor da

outras tecnologias de saúde, depende

c i ê n c i a e t e c n o l o g i a s i g n i fi c a

de decisões a respeito de o que se

reconhecer que sua atuação é

pesquisar, como tratar os frutos da

fundamental para a concretização dos

pesquisa e

direitos sociais garantidos pela

distribuir. Estas decisões deverão

Constituição. É um pensamento que se

priorizar o interesse público refletido

alinha a estudos históricos e

no acesso a medicamentos.

evidências contemporâneas a respeito

A partir daí, podemos pensar qual o

do papel dos investimentos públicos

arranjo melhor estruturado para esta

no desenvolvimento dos avanços

priorização. "[T]odo esforço para

científicos mais impactantes para a

isolar a economia das instituições

sociedade. É, também, um projeto que

s o c i a i s e p o l í t i c a s d e s t r u i rá a

vem sofrendo graves baixas nos

sociedade humana"2 , cita Gøsta

últimos anos e depende da vigilância

Esping-Andersen ao falar de Karl

da sociedade civil para tornar-se

Polanyi. Podemos conjecturar que

realidade.

essa proeminência da economia seria,

como se produzir e

"Todo esforço para isolar a economia

na área da pesquisa biomédica,

das instituições sociais e políticas

equivalente a confiar ao mercado

destruirá a sociedade humana”.

aquelas decisões fundamentais enunciadas anteriormente. Esta ideia

Especialmente na área da saúde há

de que o mercado é capaz de sanar

um ev i de n t e fio -co n du t o r e n t re

as necessidades de uma sociedade de

pesquisa e desenvolvimento,

forma eficiente, com a distribuição

inovação, investimentos públicos e a

ótima de recursos em função de oferta

garantia do direito à saúde. A efetiva

e demanda, não se concretiza no

realização deste direito, em seu

campo da ciência e tecnologia.

aspecto de acesso a medicamentos e

2

As três economias políticas do welfare state, por Esping-Andersen, tradução de Dinah de Abreu Azevedo: http://ref.scielo.org/mz39tb.

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Po r u m l a d o , m u i t o s i n v e n t o s

financeiro a p&d setorial, levaram a

relevantes só são possíveis atualmente

consequências drásticas3:

por causa do investimento público

1. Aumento das importações com

dire t o ou da infraestr utura de

modesto crescimento das

pesquisa instalada pelo Estado e os

exportações;

pesquisadores a seu serviço. As

2. Aquisições de empresas nacionais

farmacêuticas brasileiras começaram

por estrangeiras;

um processo de investimento em

3. Aumento significativo dos preços;

inovação há pouco tempo, após a

4. D e s v e r t i c a l i z a ç ã o

introdução da lei de genéricos que

e

especialização produtiva;

deu nova força ao setor no país, e a pesquisa que realizam é

5. Estagnação da produção nacional

majoritariamente interna, voltada

e mesmo contração da produção

p a r a g a n h o s d e e fi c i ê n c i a n a

em alguns segmentos.

produção. A parceria entre empresas Esta ideia de que o mercado é capaz

e institutos públicos de pesquisa

de sanar as necessidades de uma

representa um importante mecanismo

sociedade de forma eficiente, com a

para a inovação substancial na área.

distribuição ótima de recursos em

Por outro lado, não são poucas as

função de oferta e demanda, não se

crises que revelam a insuficiência de

concretiza no campo da ciência e

um sistema de p&d que não priorize o

tecnologia.

investimento e a participação estatal.

Outro indicador é a balança

As reformas realizadas na década de

comercial em produtos da saúde, que

1990 no Brasil, como a introdução da

a partir dos anos 2000 viu um déficit

atual lei de patentes, a redução de

crescente que atingiu mais de 10

tarifas aduaneiras e do suporte

3

Sistemas Setoriais de Inovação e Infraestrutura de Pesquisa no Brasil. Fernanda De Negri e Flávia de Holanda Schmidt Squeff (orgs.): http://bit.ly/2lKZjgO.

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bilhões de reais em 20134 . Além das

companhias privadas – o recente

consequências para a indústria

anúncio de uma nova vacina contra a

interna, as evidências globais da

febre amarela desenvolvida pela

ineficiência de um sistema sujeito

Fiocruz é um exemplo, bem como a

fundamentalmente aos interesses

vacina contra a dengue desenvolvida

empresariais são contundentes. A

no Instituto Butantan. São estes

epidemia de ebola alguns anos atrás,

centros, construídos em torno da ideia

a ameaça global do vírus Zika desde

da pesquisa a serviço da saúde

o ano passado, a crise de resistência

coletiva, que se ocupam de

antimicrobiana, entre outros, são

populações e territórios

todos exemplos de um sistema que

negligenciados5 – aqueles que não

falhou na otimização do bem-estar.

despertam o interesse da indústria farmacêutica e, em consequência, não

São estes centros, construídos em

têm investimento em novas

torno da ideia da pesquisa a serviço

tecnologias.

da saúde coletiva, que se ocupam de populações e territórios

Em resumo, pode-se adotar visões

negligenciados – aqueles que não

distintas a respeito do papel do

despertam o interesse da indústria

Estado na condução da produção

farmacêutica e, em consequência, não

científica de um país. Por um lado,

têm investimento em novas

pode-se atribuir-lhe um papel restrito à

tecnologias.

garantia do direito de propriedade material e imaterial e a facilitação do

Enquanto isso, dos institutos públicos

comércio interno e internacional. Esta

de pesquisa vêm os avanços de que

era a perspectiva que imperava

grandes populações necessitam, mas

quando da promulgação da atual lei

que não são desenvolvidos por

O déficit comercial da saúde. Álvaro Antônio Louzada Garcia: http://carta.fee.tche.br/article/odeficit-comercial-da-saude/. 4

5

Saúde e inovação: dinâmica econômica e Estado de Bem-Estar Social no Brasil. Carlos Augusto Grabois Gadelha e Patrícia Seixas da Costa Braga: http://ref.scielo.org/27j3nb.

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de patentes brasileira, que é ainda

d. Formação de profissionais de

mais severa na proteção da

excelência nas universidades

propriedade industrial do que o

brasileiras e por meio do

Tratado que lhe deu origem, o TRIPS,

i n t e rc â m b i o , i m p l e m e n t a n d o

exigia. Foi a mentalidade que levou a

re s s a l va s c o n t ra a f u g a d e

um cenário de esvaziamento da

cérebros.

estr utura nascente de pesquisa

Também poderia se materializar em

biomédica no Brasil, que começou a

ações como:

ser reconstruída apenas anos depois.

a. Reforma de uma lei de patentes

Por outro lado, pode-se imaginar um

excessivamente restritiva, de modo

Estado presente por meio de

que a propriedade intelectual não

incentivos diretos e indiretos e de

c o n fi g u r a s s e e m p e c i l h o à

atuação concreta no campo da

concor rência genér ica ou à

pesquisa. Isto se materializa em ações

introdução de novos produtos no

como:

mercado;

a. Formação de uma infraestrutura

b. Intervenção concorrencial sobre

de pesquisa biomédica de

práticas abusivas de companhias

excelência no país;

farmacêuticas que atuassem com a

b. Direcionamento da pesquisa em

única razão de evitar a entrada de

institutos públicos norteado pelo

concorrentes em um mercado;

planejamento de medicamentos

c. Garantia de contrapartidas em

estratégicos e da integração com

contratos de licenciamento da

as demandas do SUS;

propriedade intelectual derivada

c. Os incentivos fiscais da Lei do Bem

de pesquisas em instituições

às empresas que realizem p&d

públicas não apenas por meio de

dentro do país;

royalties, mas também em salvaguardas em relação ao preço do produto final para o SUS e o

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controle severo dos casos em que

palavras, e voltando à reflexão de

o licenciamento exclusivo fosse

Polanyi, estar ia a economia

autorizado.

necessariamente integrada e sujeita às

Esta segunda abordagem se adequa

instituições políticas e sociais.

ao objetivo de garantia do bem-estar

A par tir desta reflexão inicial,

social porque posiciona o lócus

podemos partir a uma análise sobre

decisório a respeito de pesquisa,

sua efetividade real. De fato, apesar

desenvolvimento, produção,

de planejamentos e estudos, ou talvez

patenteamento e licenciamento no

utilizando-os como artifícios, a política

Estado, que, apesar das complicações

serve como empecilho à realização

da política, é logicamente fundado no

de um plano de desenvolvimento

interesse público.

preocupado holisticamente com saúde, ciência, tecnologia e inovação.

Neste plano, da retórica, vale

Isto se reflete, como muito do que se

lembrar as controversas declarações

constrói e destrói na política

do atual Ministro da Saúde quando

brasileira,

assumiu o cargo, cuja representação

em

dotações

mais resumida foi sua declaração de

orçamentárias, reser vas de

que seria necessário "repactuar o

contingência, cor tes de gastos.

SUS”.

Também se traduz em retórica e em projetos que desvirtuam o sistema de

Ou seja, ao tornar estas decisões

proteção social que se imaginou em

questões de interesse público, estaria

1988.

minimamente resguardada a sua

Neste plano, da retórica, vale lembrar

necessária fundamentação na

as controversas declarações do atual

garantia dos direitos sociais que a

Ministro da Saúde quando assumiu o

Constituição Federal institui, aí

cargo, cuja representação mais

incluído o direito à saúde. Em outras

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resumida foi sua declaração de que

congelamento das contas públicas, vá

seria necessário "repactuar o SUS"6 .

se reduzir a menos de 1%8.

Esta ideia de que diante do

Há ainda o perigo do novo regime

desequilíbrio das contas a solução é

orçamentário ser reproduzido nos

diminuir a cobertura de direitos

estados, piorando a situação já crítica

permeia uma série de ações e

das fundações estaduais de amparo à

projetos do novo governo, como a

pesquisa9 . A FAPERJ já lida há algum

ideia dos planos de saúde populares

tempo com o problema e teve

e o congelamento das contas

recentemente o golpe mais duro –

públicas.

uma redução de 30% do seu

Tratando de orçamento, é

orçamento por meio de decreto10. Em

preocupante passar em revista as

São Paulo, tentou-se fazer o mesmo

notícias dos últimos dois a três anos

com a FAPESP com um corte de 120

sobre investimentos em CT&I. O valor

milhões de reais de seu orçamento,

de

indicado

reduzindo-o para um valor abaixo do

reiteradamente como um mínimo

mínimo exigido pela constituição do

necessário, não passou muito de

estado11 . Após grande comoção, o

1,2%7 e há previsões de que, com o

governo do estado voltou atrás12.

2%

do

PIB,

Tamanho do SUS precisa ser revisto, diz novo ministro da Saúde. Folha de S. Paulo: http:// bit.ly/2lLcNJq. 6

Parlamentares lutam para evitar contingenciamento em 2017. Jornal da Ciência: http://bit.ly/ 2lFmKrE. 7

Por que o Brasil precisa de CT&I fortes durante o período de vigência da PEC 241. Jornal da Ciência: http://bit.ly/2lLiNSv. 8

9

Presidente da SBPC diz que cortes no orçamento da educação não combinam com pátria educadora. Jornal da Ciência: http://bit.ly/2lFfH20. 10

Carta Aberta do Conselho Superior em Defesa da FAPERJ: http://bit.ly/2l7ykIU.

11

Deputados tiram R$ 120 milhões da Fapesp. Estadão Ciência: http://bit.ly/2lnXSUF.

Governo e Fapesp fecham acordo para remediar corte no orçamento. Estadão Ciência: http:// bit.ly/2mlthVu. 12

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Ainda este ano, o governo federal

efetivamente empenhados) em 2016.

tentou, na lei orçamentária de 2017,

É importante lembrar que isto é

transferir uma parte significativa dos

apenas uma parte do quadro geral, já

recursos direcionados a ciência e

que o Complexo Econômico-Industrial

tecnologia para a fonte 900. Isto

da Saúde e o sistema de pesquisa e

significaria que cerca de 1,7 bilhão de

desenvolvimento em saúde envolvem

reais, sendo cerca de 1 bilhão

ações de outras pastas, como a Saúde

direcionado ao CNPq, não teriam

e a Educação.

mais como fonte o Tesouro Nacional,

A partir de suas contrapartidas à

13

e sua execução seria incerta . Neste

sociedade, garantem a realização do

caso, também, após movimentação contrária o governo voltou

direito fundamental à saúde com

atrás14.

todos os seus desdobramentos sistêmicos para o desenvolvimento

Ao menos, é preciso garantir que

nacional e a redução da

esses investimentos não sofram

desigualdade.

reduções, que programas não sejam cortados, que as bolsas de estudo e

É necessário garantir uma trajetória

pesquisa estejam garantidas.

ascendente de investimentos em

O orçamento do MCTIC viu um

pesquisa, formação de pesquisadores,

período de significativo crescimento

infraestrutura, interações com o

entre 2005 e 2013, quando atingiu

empresariado nacional sob a égide

por volta de 9 bilhões de reais. No

do interesse público e incentivos à

entanto, desde então vem se

p&d biomédica. Ao menos, é preciso

reduzindo, chegando a pouco menos

garantir que esses investimentos não

de 6 bilhões (pela lei, mas com

sofram reduções, que programas não

apenas pouco mais de 3 bilhões

13

Correio Braziliense: http://bit.ly/2kZ6U79 e Estadão Ciência: http://bit.ly/2lFcaRl.

Executivo retorna verbas da CT&I à Fonte do Tesouro na LOA 2017. Jornal da Ciência: http:// bit.ly/2m7wSKy. 14

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sejam cortados, que as bolsas de

produção de riqueza em escala

estudo e pesquisa estejam garantidas.

global. Em consequência, levando em

A administração eficiente destes

consideração a dimensão da

recursos passa necessariamente por

população e do mercado brasileiro,

reconhecer que são investimentos. A

as estratégias para o desenvolvimento nacional podem

par tir de suas contrapar tidas à

simultaneamente adensar o tecido

sociedade, garantem a realização do

produtivo e direcioná-lo de modo a

direito fundamental à saúde com

compatibilizar a estrutura de oferta

t o d o s o s s e u s d e s d o b ra m e n t o s

com a demanda social de saúde”.

sistêmicos para o desenvolvimento nacional e a redução da

Para t anto, é fundament al a

desigualdade; e alavancam a ciência

transparência sobre as contas públicas

do país, reafirmando o Brasil como

e o direcionamento estratégico do

player global e abrindo novas

governo, bem como a vigilância e o

oportunidades de negócio e

ativismo constantes por parte da

cooperação internacional. Como

sociedade civil.

muito bem colocado por Gadelha e

—————————————

Braga15:

WALTER BRITTO GASPAR É FORMADO EM DIREITO PELA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS E MESTRANDO EM SAÚDE COLETIVA PELO IMS/UERJ.

“Com efeito, ao mesmo tempo em que a saúde se materializa como um

A VACINA DA DENGUE

dos pilares do Estado de Bem-Estar Social, se qualifica como um sistema produtivo crítico para a dinâmica contemporânea de produção e

DO INSTITUTO BUTANTAN

inovação, visto que suas atividades

Vo c ê c o n h e c e v a c i n a 10 0 %

são intensivas em conhecimento e

brasileira? Além de termos a vacina

representam parcela importante da

contra Febre amarela que Oswaldo

15

Saúde e inovação: dinâmica econômica e Estado de Bem-Estar Social no Brasil. Carlos Augusto Grabois Gadelha e Patrícia Seixas da Costa Braga: http://ref.scielo.org/27j3nb.

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Cruz desenvolveu, temos também a

de Amparo à Pesquisa do Estado de

vacina contra dengue que hoje é

São Paulo (Fapesp). Essa parceria

desenvolvida pelo Instituto Butantan.

toda começou quando uma pequena

Esta vacina é o resultado do tipo de

produção de vacina com os 4 vírus

ciência transdisciplinar produzido no

atenuados foi feita nos EUA pelo NIH

Lançamento do teste da vacina de combate a dengue do Instituto Butantã. Brasília, 21/12/2016. Foto: Erasmo Salomão/MS, https://flic.kr/p/QqEacP, CC-BY-NC-SA.

Instituto. É fruto de parcerias com o

para avaliar sua segurança nas

NIH (National Institutes of Health), o

pessoas. Com a segurança

Instituto Adolfo Lutz, o Hospital das

com provada, esses vír us f oram

Clínicas da Faculdade de Medicina da

encaminhados ao Instituto Butantan

Universidade de São Paulo

que ficou responsável por aprimorar e

(HCFMUSP) – Instituto Central e

produzir a vacina; além de

Instituto da Criança e do fomento do

posteriormente realizar os estudos

Banco Nacional de Desenvolvimento

clínicos. Adicionalmente, o instituto

Econômico (BNDES) e da Fundação

desenvolveu uma técnica para que a

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vacina durasse mais de um ano e

(AM), Porto Velho (RO), Boa Vista

pudesse ser usada como qualquer

(RR), Aracaju (SE), Recife (PE),

outra vacina.

Fortaleza (CE), Campo Grande (MS),

É impor tante lembrar que para

São Paulo (SP), São José do Rio Preto

produzir uma vacina é necessário um

(SP) , Porto Alegre (RS), Brasília (DF),

processo rigoroso de desenvolvimento

Cuiabá (MT), Recife (PE) e Belo

e testes antes de disponibilizá-la à

Horizonte (MG).

população. Antes de ser oferecida à

“Podemos ter a resposta daqui a um

população, a vacina é estudada em

ano, mas vamos acompanhar esses

modelos animais (estudos pré-clínicos)

indivíduos por cinco anos porque

e, posteriormente, com resultados

queremos saber como eles vão se

f a vorá veis, ela é utilizada em

comportando nesse período: se ainda

humanos (estudos clínicos).

estarão protegidos contra a dengue e se haverá necessidade de uma dose

Os estudos clínicos são realizados em

de reforço no futuro”

três fases: a fase I consiste em demonstrar que a vacina está apta e

Caso queiram contribuir para a

segura para ser utilizada em

ciência e auxiliar a pesquisa, as

humanos; na fase II, é avaliada a

pessoas devem cumprir os seguintes

capacidade da vacina em estimular o

requisitos: voluntários saudáveis, que

sistema imunológico para a produção

já tiveram ou não dengue em algum

de anticorpos; por fim, na fase III,

momento da vida e que se enquadrem

busca-se a comprovação de que a

em três faixas etárias: 2 a 6 anos, 7 a

pessoa vacinada está protegida

17 e 18 a 5 9 . T o d o s s e r ã o

contra a infecção.

acompanhados pela equipe médica

Esta última já está em curso em

por um período de cinco anos para

d i ve r s a s c i d a d e s b r a s i l e i r a s e

ver ificar q uant o t em po dura a

envolverá no total 17 mil pessoas. As

proteção oferecida pela vacina. De

cidades envolvidas são: Manaus

acordo com o diretor do instituto em

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entrevista à agência Brasil, Dr. Kalil,

atenuados. Isso significa que os vírus

“Podemos ter a resposta daqui a um

foram modificados para que a pessoa

ano, mas vamos acompanhar esses

desenvolva anticorpos contra os

indivíduos por cinco anos porque

quatro sorotipos da dengue sem

queremos saber como eles vão se

desenvolver os sintomas relacionados

comportando nesse período: se ainda

a eles.

estarão protegidos contra a dengue e

O Brasil já tem disponível

se haverá necessidade de uma dose

comercialmente uma vacina contra

de reforço no futuro”.

dengue desenvolvida pelo laboratório

Esse acompanhamento prolongado é

farmacêutico francês Sanofi-Pasteur, a

padrão em todos os ensaios clínicos e

Dengvaxia. Nenhuma das vacinas

Vacina contra dengue - Butantan

Dengvaxia – Sanofi Pasteur

Eficácia

entre 80% e 90% (estimada, pois os testes clínicos ainda estão ocorrendo)

Por volta de 66%

Número de doses

1 dose

3 doses semestrais

Custo por dose

Distribuição pelo SUS

entre R$ 132,76 e R$ 138,53

Proteção viral

Contra 4 tipos (tetravalente)

Contra 4 tipos (tetravalente)

Faixa etária recomendada

2 a 59 anos

9 a 45 anos

enquanto os testes são realizados, o

possui efeito sobre os vírus da zika e

Butantan ganhou uma nova fábrica

da chikungunya, apenas atuam contra

dedicada à produção da vacina

os vírus da dengue. Mas, já que

contra dengue equipada e preparada

temos uma vacina contra a Dengue

para a produção em larga escala

que é produzida pela empresa

(nacional) da vacina.

farmacêutica francesa, qual seria a

A vacina do Butantan é feita com os

diferença entre ela e a vacina do

próprios vírus da dengue, porém

Butantan? A tabela na página anterior

Boletim UAEM Brasil

17

Fevereiro de 2017


ilustra as principais diferenças entre

Dessa forma, uma ação conjunta de

elas.

investimento em saúde e saneamento

É relevante frisar que a dengue é na

básico é essencial.

verdade um problema de saúde

Fontes:

pública, uma vez a falta de

Dengue: desafios para uma vacina. Instituto Butantan: http://bit.ly/2mllKGn.

saneamento leva à cr iação de

Instituto Butantan terá fábrica de vacina de dengue até fim do ano. O Globo: http://glo.bo/2lFwOAU.

criadouros de mosquitos transmissores de doenças. Este inseto (Aedis

Instituto Butantan começa a testar vacina contra a dengue em todo o país. EBC: http://bit.ly/2kLTzUH.

Aegypti, o principal transmissor) só adquire os vírus após picar uma

Butantan testa vacina contra dengue em 1,2 mil pessoas. Portal Brasil: http:// bit.ly/2lLkShw.

pessoa contaminada. Eles são capazes de conviver com o vírus e

—————————————

ainda transmitir para uma pessoa não contaminada.

BEATRIZ KAIPPERT É FARMACÊUTICA PELA UFRJ, CURSA MESTRADO PROFISSIONAL EM TECNOLOGIA DE IMUNOBIOLÓGICOS EM BIOMANGUINHOS E FAZ PARTE DA EQUIPE DE FARMACOVIGILÂNCIA DA ASSESSORIA CLÍNICA DE BIOMANGUINHOS.

A vacinação é importante, pois se uma pessoa for picada por um

A EPIDEMIA DE FEBRE AMARELA

mosquito contaminado, o seu próprio organismo não permitirá o desenvolvimento do vírus, pois já terá

O aumento do número de casos de

anticorpos para combater a doenças.

f e b r e a m a r e l a ( FA ) e m 2 017

Assim, reduz-se os vírus em

despertou a atenção das autoridades

circulação, “eliminando” a doença.

em

Entretanto, perceba que esta é a

no

país,

e

consequentemente a divulgação na

ponta do iceberg, a base do

mídia causa preocupação na

problema mesmo é a f alt a de

população, aumenta a possibilidade

saneamento. Uma ação sem a outra

de sensacionalismo e propagação de

não irá eliminar a doença em si, mas

boatos. De acordo com o Ministério

sim evitar que novos casos aconteçam.

Boletim UAEM Brasil

saúde

da Saúde, até o último dia 18, foram 18

Fevereiro de 2017


confirmados 230 casos de febre

febre amarela circula em áreas

amarela, sendo 1.258 casos suspeitos

florestais, é picada pelo mosquito

notificados. Destes, 882 permanecem

infectado, e contrai a doença. Se essa

e m i n v e s t i g a ç ã o e 113 f o r a m

pessoa infectada circular no meio

descartados.

urbano, ela poderá ser picada pelo

Foram notificados 200 óbitos, sendo

mosquito Aedes aegypti, que então se

89 confirmados, 3 descartados e 108

tornará infectado e poderá transmitir

ainda sendo investigados. Os estados

o vírus para outra pessoa.

que possuem casos em investigação

É importante ressaltar que não há

são Minas Gerais, Espírito Santo, São

transmissão do vírus da FA de uma

Paulo, Bahia, Rio Grande do Norte e

p e s s o a p a r a o u t r a ( 2 ) . A FA é

Tocantins

conhecida desde o século XX e

(1)

.

A febre amarela é uma doença

erradicada dos grandes centros

infecciosa causada por vírus e

urbanos desde 1942(3). Em entrevista

transmitida por um vetor, a picada do

publicada no por tal da Escola

mosquito fêmea infectado. O vírus

Nacional de Saúde Pública Sérgio

infecta mosquitos, o homem e outros

Arouca, o pesquisador José Fernando

primatas, e por isso a morte de

de Souza Verani afirmou enxergar

macacos é reconhecida como evento

com muita apreensão a situação atual

sentinela para febre amarela.

da FA no Brasil, de forma que atualmente podemos dizer q ue

No ciclo silvestre, o vírus da febre

vivemos um surto de febre amarela

amarela é transmitido pelo mosquito

em nosso país. Porém, ainda não há

Haemagogus. No meio urbano, o

configuração de caso da doença em

mosquito Aedes aegypti (mesmo

áreas urbanas.

mosquito transmissor da dengue) é o principal vetor. A infecção no meio

"Mudanças bruscas no ambiente

urbano acontece quando uma pessoa

provocam impacto na saúde dos

que não esteja imunizada contra

animais, incluindo macacos. Com o

Boletim UAEM Brasil

19

Fevereiro de 2017


estresse de desastres, com a falta de

Samarco, em novembro 2015. Em

alimentos, eles se tornam mais

entrevista ao Estadão (5) , Márcia

suscetíveis a doenças, incluindo a

Chame afirmou que "Mudanças

febre amarela"

br uscas no ambiente provocam impacto na saúde dos animais,

Verani considera que o número

incluindo macacos. Com o estresse de

elevado de casos confirmados de FA

desastres, com a falta de alimentos,

se relacionam à falta de investimentos

eles se tornam mais suscetíveis a

sociais. Apesar da transmissão ainda

doenças, incluindo a febre amarela”.

não ter se estabelecido nas áreas

A Fundação Renova, criada pela

urbanas, essa possibilidade é bastante

Samarco para coordenar as ações de

preocupante e isso reflete a falta de

reparação na área atingida pelo

cuidado com o saneamento e falta de

desastre, não se manifestou sobre o

medidas para conter a proliferação

tema.

do mosquito. A vacina é o instrumento de controle efetivo a curto prazo, mas

M a i s u m a ve z , v i ve n c i a m o s o

Verani não considera a vacinação em

ressurgimento de uma epidemia como

massa como melhor estratégia, e sim

reflexo da falta de investimentos

a vacinação de bloqueio, em que é

sociais e do planejamento ineficiente

possível romper a cadeia de

das

transmissão do vírus e ter cautela em

desconsideram as coletividades.

relação à pessoa que recebe a

Conforme citado, a curto prazo, as

vacina(4).

ações estão ar ticuladas para a

ações

de

saúde

que

imunização, com a finalidade de

Além da falta de investimentos sociais,

romper a cadeia de transmissão da

cabe a discussão proposta pela

febre amarela.

bióloga Márcia Chame da Fiocruz de que o surto de febre amarela pode ter

Referências:

relação com a tragédia de Mariana,

1- BRASIL. Ministério da Saúde, Agência Saúde, 2017. Ministério da Saúde atualiza casos notificados de febre amarela no país.

do rompimento da barragem da Boletim UAEM Brasil

20

Fevereiro de 2017


Cartilha da Fiocruz com orientações quanto à vacinação. Fonte: Agência Fiocruz de Notícias https://agencia.fiocruz.br/febre-amarela. Disponível em: http://bit.ly/2m7OshH. Acesso em 20 fev. 2017.

Mariana. Disponível em: http://bit.ly/ 2mlCg91. Acesso em 15 fev 2017.

2- BRASIL. Fundação Oswaldo Cruz, Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos BioManguinhos, 2017. Febre amarela: sintomas, transmissão e prevenção. Disponível em: http://bit.ly/2loF3R8. Acesso em 13 fev. 2017.

LETÍCIA PENNA BRAGA É FARMACÊUTICA GRADUADA PELA UFMG COM MESTRADO EM MEDICAMENTOS E ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA NA MESA UNIVERSIDADE. É LÍDER DO CAPÍTULO DE BELO HORIZONTE DA UAEM BRASIL.

—————————

NOVAS INDICAÇÕES

3- BRASIL. Fundação Oswaldo Cruz, Agência Fiocruz de notícias, 2017. Febre Amarela. Disponível em: <https://agencia.fiocruz.br/ febre-amarela>. Acesso em 17 fev 2017. 4- BRASIL. Escola Nacional de Saúde Pública - Fiocruz, 2017. Entrevista: 'Febre Amarela está relacionada à falta de investimentos sociais'. Disponível em: http://bit.ly/ 2loNKek. Acesso em: 17 fev 2017.

Que estamos todos em crise, isso já está mais que batido. Seja crise financeira, emocional, social, moral…

5- Jornal Estado de São Paulo. Estadão Saúde, 2017. Para bióloga, surto de febre amarela pode ter relação com tragédia de

Boletim UAEM Brasil

o fato é que o Brasil está passando 21

Fevereiro de 2017


por uma crise. Quem está sofrendo

avaliar segurança e eficácia. Esta

com ela somos nós, povo,

ultima etapa é a mais cara e a mais

principalmente na área da saúde. Esta

demorada de todo processo de

área que abrange não só assistência

desenvolvimento farmacêutico devido

básica de saúde, mas também a

ao rigor regulatório e sanitário.

produção de medicamentos pelos

Mesmo sendo a etapa mais cara e

laboratórios/produtores farmacêuticos

lenta, uma estratégia comum de

públicos.

inovação das empresas nacionais tem

Poucos investimentos a longo prazo

sido baseada justamente na

são feitos nesse setor industrial, e com

realização desses ensaios clínicos,

isso há uma alta taxa de importação

seja para buscar novas indicações de

de me dicame n t o s q ue leva ao

fármacos já conhecidos ou novas

aumento do déficit da balança

combinações de moléculas já no

comercial e consequentemente

mercado; para testar no Brasil

ameaça a continuidade das política

moléculas em parceria com empresas

sociais como o nosso SUS.

estrangeiras para serem usadas em

A indústria farmacêutica é um setor

território nacional e testar moléculas

que é baseado em ciência pelo papel

novas descobertas em centros de

representado pelas atividades de

pesquisa (ex.universidades).

pesquisa e desenvolvimento (P&D) na

Um fruto recente desse investimento

dinâmica de competição e inovação.

em pesquisa em novas indicações de

Essas atividades em P&D envolvem

medicamentos já comercializados é o

desde testes em laboratório com

caso do sofosbuvir, que é um

células e com animais para

medicamento usado para hepatite C.

efeitos

Seu uso está sendo estudado para

farmacológicos e tóxicos de uma

combater a infecção pelo vírus Zika.

compreender

os

determinada substância, até teste em

Mas ué, se é mais cara, por que se

humanos (ensaios clínicos) para

Boletim UAEM Brasil

investe/deveria investir-se mais em 22

Fevereiro de 2017


ensaios clínicos? Porque depois de

de segurança do medicamento e suas

anos da indústria multinacional

ações clínicas.

realizar e investir ensaios no Brasil,

O investimento em outras áreas de

passamos a ter centros mais

pesquisa, como o desenvolvimento de

capacitados, competentes e com uma

novas moléculas, deve ser continuado

estrutura bem desenvolvida para

e estimulado.

realizar os estudos de fase II e III. Além disso, uma equipe melhor

Um fruto recente desse investimento

capacitada consegue empreender e

em pesquisa em novas indicações de

executar projetos de maior interesse

medicamentos já comercializados é o

para o país, sem necessariamente

caso do sof osbuvir, q ue é um

estar ligada a uma empresa

medicamento usado para hepatite C.

multinacional.

Seu uso está sendo estudado para combater a infecção pelo vírus Zika.

Okey, e como podemos nos beneficiar

Em ambas as doenças os patógenos

disso para sobreviver à crise? Uma

apresentam similaridades em sua

saída é investir na pesquisa em

estrutura. Uma delas é a enzima

medicamentos já conhecidos para

chamada RNA polimerase,

novas indicações. Os estudos Fase II e

responsável pela multiplicação do

III, que são as fases em que os centros

vírus e que é onde o Sofosbovir atua.

de pesquisa brasileiros são melhores

Os estudos mostraram que o

capacitados, podem ser aplicados

medicamento conseguiu bloquear a

para avaliar novas drogas ou novas

multiplicação e eliminar o vírus em

indicações para drogas já liberadas

modelos de células e em minicérebros

para outros usos. Dessa forma, a

(modelo aprovado para estudar

pesquisa e o lançamento das novas

microcef alia). Há ainda outros

indicações desses fármacos ocorrem

exemplos que já foram citados em

de forma acelerada e menos cara,

edições anteriores deste Boletim (ex.

uma vez que já é conhecido o perfil

Boletim UAEM Brasil

cloroquina para tratamento de Zika). 23

Fevereiro de 2017


É importante frisar que o investimento

alter nativa de f azer/estimular

VOCÊ SABE COMO ANDA A SAÚDE DA POPULAÇÃO TRANSGÊNERO NO BRASIL?

pesquisa em saúde perante o cenário

Do final do mês de janeiro ao começo

econômico limitado. Espera-se que

do mês de fevereiro deste ano de

estes estudos para novas indicações

2017, foi celebrada em alguns Estados

avancem e atuem de forma

brasileiros a semana da visibilidade

satisfatória nos ensaios clínicos.

transgênero, quando, através de

em outras áreas de pesquisa, como o desenvolvimento de novas moléculas, deve ser continuado e estimulado. Esta matéria apenas apresentou uma

eventos culturais, pode-se discutir e

Fontes:

apresentar para a sociedade civil

Remédio para hepatite C é a aposta da Fiocruz para tratar zika. Globo.com: http:// glo.bo/2m7Crc5.

necessidades básicas e direitos que a comunidade LGBTTTs tem e precisa

QUENTAL, C. M.; FILHO, S. S. Ensaios Clínicos em Medicamentos:capacitação nacional para apoio a inovação farmacêutica. In: Medicamentos no Brasil: inovação & acesso. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2008. p. 437.

para levar uma vida digna. Infelizmente, muitos dos direitos assegurados pela Constituição Federal

Remédio antimalária dá resultado contra zika. Estadão Saúde: http://bit.ly/2luP9yp.

de 1988 em seu artigo 5° não se

GOLDIM,J.R. Avaliação ética da investigação científica de novas drogas : a importância da caracterização adequada d a s f a s e s d e p e s q u i s a . R e v H C PA 2007;27(1).

estendem, na prática, para a

——————————

O Brasil é o país que mais mata e

população transgênero – e isso inclui o direito à saúde.

BEATRIZ KAIPPERT É FARMACÊUTICA PELA UFRJ, CURSA MESTRADO PROFISSIONAL EM TECNOLOGIA DE IMUNOBIOLÓGICOS EM BIOMANGUINHOS E FAZ PARTE DA EQUIPE DE FARMACOVIGILÂNCIA DA ASSESSORIA CLÍNICA DE BIOMANGUINHOS.

discrimina pessoas transexuais e travestis segundo a organização Transgender Europe[1] (TEGEU), demonstrando a negação de direitos humanos para essas pessoas em

Boletim UAEM Brasil

24

Fevereiro de 2017


várias dimensões da vida. Para

Falar de travestilidade e

superar essa violência são necessárias

transexualidade na perspectiva do

condutas não só por par te da

Sistema Único de Saúde (SUS) é

população em conscientização, mas

trazer à tona questões que há bem

um diverso aparato de políticas

pouco tempo eram bastante

públicas

desconhecidas por grande parte de

para

superar

a

discriminação.

acadêmicos e da população em geral.

Algumas conquistas já foram

Os termos travestilidade e

alcançadas, como o nome social por

transexualidade foram criados e

exemplo, mas precisamos ir além para

introjetados pelo movimento social

que de fato essas pessoas sejam

organizado para dizer que a questão

reconhecidas de acordo com sua

dessa população é uma questão de

i d e n t i d a d e d e g ê n e ro e a s s i m

identidade e de modo de viver.

conseguirmos alcançar a equidade

Portanto, nunca é demais lembrar que

nas atividades do dia a dia.

travestis e transexuais são ainda as

Dessa forma, o Ministério da Saúde

populações mais distanciadas dos

passou a viabilizar demandas

serviços de saúde, e isso ocorre

e s p e c í fi c a s d a s p o p u l a ç õ e s d e

especialmente por falta de

travestis e transexuais por meio de

mecanismos específicos que venham a

atos normativos internos, como o que

facilitar o acesso dessa população

instituiu e regulamentou o Processo

aos serviços públicos.

Transexualizador[2], no âmbito do

Observamos que a existência de

SUS. Travestis e transexuais são vistas

políticas públicas e de legislações não

pela medicina como seres portadores

é garantia de efetivação dos direitos

de patologia e de uma Classificação

humanos e sexuais das pessoas trans.

Internacional de Doenças (CID)[3] que

Em seu cotidiano, elas esbarram na

lhes identifica.

falta de preparo das(os) profissionais de Saúde, na estrutura física pouco

Boletim UAEM Brasil

25

Fevereiro de 2017


sensível à necessidade de mitigar a

autoras apontam que, na perspectiva

e s t i g m a t i z a ç ã o , n o fl u x o d e

dos direitos humanos e da equidade,

atendimento dos serviços e na falta de

deve-se chamar a atenção para os

aceitabilidade dos serviços a suas

elementos que, tradicionalmente,

vivências, suas experiências e seus

estão fora do âmbito do setor da

modos de vida. Isso porque, ao se

Saúde e da formação das(os)

partir do pressuposto de que a

profissionais.

legislação, as políticas públicas, as

Por exemplo, as desigualdades de

ações em Saúde, os serviços de

poder associadas ao machismo, à

Saúde, são formulados e efetivados,

heteronormatividade, ao racismo e a

encarnados por pessoas, as normas

outras formas de discriminação, bem

regulatórias de gênero também são

como a má qualidade da

determinantes para o aumento, a

infraestrutura disponível e a falta de

reprodução ou a diminuição da

p r o fi s s i o n a i s d e v i d a m e n t e

vulnerabilidade no campo

capacitadas(os).

programático.

Com isso, podemos compreender que

Assim, ter profissionais qualificados

para a sobrevivência e existência

para atender às demandas das

digna de toda a população trans que

pessoas trans é de grande

vive à margem da descriminalização

importância para o acesso destas à

no Brasil é preciso quebrar os velhos

saúde integral. Braveman e Gruskin

paradigmas sociais, pois o nosso

(2003) afirmam que o acesso e a

papel como cidadãos do mundo é

qualidade devem ser considerados em

ajudá-los a ter voz para que assim

conjunto, pois a baixa qualidade é um

possamos ouvi-las e ouvi-los com

problema que gera uma barreira ao

clareza, livre de preconceito. A saúde

uso dos serviços de saúde disponíveis.

é um direito de todos e para todos

Entre os fatores que contribuem para

independentemente da identidade de

a baixa qualidade no atendimento, as

gênero.

Boletim UAEM Brasil

26

Fevereiro de 2017


Devido à importância do assunto

emprego, não podia pagar pelos

tentamos elaborar um texto mais

hormônios, estava num período de

crítico político social tendo em vista a

dois anos e meio de espera

dificuldade que se é falar sobre a

angustiante, sem perspectiva de

trajetória hormonal de uma pessoa

começar. Então, no fim do ano passado soube que o ambulatório

trans. Assim, pensamos em abrir um

trans daqui de Curitiba, o Cpatt,

espaço para depoimentos, com todo o

estava dando acesso a hormônios

respeito que temos pelas pessoas e

de graça. Comecei a terapia

movimentos sociais.

hormonal um mês depois”.

Segue o depoimento de Fabiana

UAEM BR: A hormonioterapia é

Brantes, 41 anos. Fabiana vive em

traçada de acordo com as

Curitiba e é uma mulher transexual.

necessidades de cada paciente.

Começou sua hormonioterapia no

No seu caso quais remédios foram

começo de novembro de 2016 no Centro

indicados?

de Pesquisa e Atendimento

Fabiana: “Dos remédios, um é

para Travestis e Transexuais de

responsável por diminuir a

Curitiba – CPATT, que é uma grande

produção de testosterona. Eu no

conquista não só para Fabiana mas

caso tomo o acetato de

para o movimentos sociais curitibanos.

Ciproterona 50mg, marca

UAEM BR: Para você quais as

Prostman. Tomo um comprimido por

maiores dificuldades encontradas

dia. O outro é minha fonte de

para se realizar o tratamento

hormônio feminino. O princípio

hormonal no Brasil?

ativo é o valerato de Estradiol, marca Primogyna. Eu tomo dois

Fabiana: “São poucos os lugares no

comprimidos de 2mg por dia”.

Brasil, raros na verdade, em que é possível ter acesso pelo SUS. Então

UAEM BR: Esses remédios são

dependemos de iniciativas locais.

disponibilizados pelo SUS?

Eu, como há alguns anos estou sem

Boletim UAEM Brasil

27

Fevereiro de 2017


e acesso com respeito aos serviços do SUS, desde o uso do nome social, passando pelo acesso a hormonioterapia, até a cirurgia de adequação do corpo biológico à identidade de gênero e social. Disponível em: http:// bit.ly/2mlyPiO.

Fabiana: “O Cpatt tem fornecido os hor mônios, tanto os femininos quanto os masculinos, desde 2015”. UAEM BR: Na sua perspectiva o que

[3] OMS caminha para tirar identidade transgênero de manual de doenças. Disponível em: http://bit.ly/2mc4LGT.

poderia ser melhorado no direito à saúde para as pessoas trans?

——————————

Fabiana: “O acompanhamento

CLARISSA PAIVA É LÍDER DO CAPÍTULO DE POUSO ALEGRE DA UAEM BRASIL E CURSA DIREITO NA FACULDADE DE DIREITO DO SUL DE MINAS.

médico da terapia hor monal deveria ser mais constante, mas acredito que não seja possível justo pela falta de profissionais especializados. Essa falta é fruto tanto da falta de formação acadêmica em questão de saúde de travestis e transexuais, quanto do próprio desinteresse generalizado dos profissionais em nos atender”. Referências: Manual de Comunicação LGBT: Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais. Disponível em: http://bit.ly/2m7Kkyc. Orientações sobre identidade de gênero: Conceitos e termos. Guia técnico sobre pessoas transexuais, travestis e demais transgêneros, para formadores de opinião. Disponível em: http://bit.ly/2lLl6oU. Portal Saúde: http://bit.ly/2mluIDw. Transexualidade e Travestilidade na Saúde. Disponível em: http://bit.ly/2lLx41u. [1] Disponível em: http://bit.ly/2lLvEnY. [2] O Processo Transexualizador realizado pelo SUS garante o atendimento integral de saúde a pessoas trans, incluindo acolhimento

Boletim UAEM Brasil

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Fevereiro de 2017


EXPEDIENTE A UAEM BRASIL É UMA ORGANIZAÇÃO NÃO GOVERNAMENTAL SEM FINS LUCRATIVOS QUE EMPODERA ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS PARA ASSUMIREM PAPEL DE PROTAGONISMO NO ACESSO A MEDICAMENTOS A NÍVEL LOCAL E GLOBAL.

CAPA: WALTER BRITTO GASPAR, BASEADO NA FOTOGRAFIA “GLOBES” DE TUP WANDERS DISPONÍVEL EM: HTTPS:// FLIC.KR/P/82KA5, CC-BY.

PARTICIPA DA NOSSA PRÓXIMA EDIÇÃO! ENVIE UM E-MAIL PARA:

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NÚCLEO DE COMUNICAÇÃO DA UAEM BRASIL. EQUIPE: WALTER BRITTO GASPAR CLARISSA PAIVA LETÍCIA PENNA BRAGA BEATRIZ KAIPPERT

Boletim UAEM Brasil

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Fevereiro de 2017


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