Boletim da UAEM Brasil - Transparência na regulação do preço de medicamentos

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Transparência na regulação do preço de medicamentos

Boletim da UAEM Brasil 2020 - Volume 2


UNIVERSALIDADES ALIADAS POR MEDICAMENTOS ESSENCIAIS. Boletim da UAEM Brasil: Transparência na regulação do preço de medicamentos. Rio de Janeiro, 2020, 36p.


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EDITORIAL

É domingo de manhã. Você acorda numa fome danada e vai à padaria. A rua está vazia e só tem aquela ali aberta. Você entra. E o cheirinho de pão saindo do forno faz o buraco em seu estômago aumentar. Você pega o pão quentinho, já imaginando o momento de felicidade ao satisfazer a sua necessidade. Mas quando você chega no caixa, vem a surpresa: R$ 47 por um pão. Um aumento de 100 vezes em relação ao preço do último domingo. “É que a inflação aumentou e todos os ingredientes estão mais caros, assim como os impostos e o salário do padeiro”. Você fica se questionando as razões para um aumento tão grande e qual seria o preço justo para se cobrar por aquele pão. Você pega o celular e decide fazer uma busca. Mas não encontra informações sobre o preço da farinha, do ovo, do salário médio de um padeiro, a inflação, nada. Você acha uma notícia de que o pão, na cidade vizinha, é vendido a R$ 2 - por que será? Você não pode ir até a cidade vizinha. Você não tem informações para negociar um preço justo - afinal, como definir o que é justo? Você está com fome. Esta é a única padaria aberta. E aí, o que você faz? Se sairmos do exemplo hipotético da padaria e adentrarmos o mundo real farmacêutico, veremos que a situação acima não parece tão bizarra. Indivíduos, famílias e até sistemas de saúde estão, o tempo todo, comprando medicamentos sem ter informações adequadas que indiquem se os preços praticados são justos. Se negociar às cegas, em qualquer situação, é complicado, imagina negociar por algo que pode salvar a sua vida. E o que temos visto é, cada vez mais, medicamentos lançados a preços exorbitantes. No Brasil, um país desigual em que o gasto com medicamentos impacta significativamente o orçamento das famílias mais pobres, o direito à saúde é mandamento constitucional e cabe ao SUS garantir o acesso universal a medicamentos essenciais. E como fazer isso em um contexto de subfinanciamento do sistema de saúde e aumento dos preços de medicamentos? Luiza Pinheiro, em relatório do Instituto de Estudos Socioeconômicos sobre os recursos federais destinados à assistência farmacêutica, mostra que, de 2008 a 2018, o gasto federal com medicamentos praticamente dobrou. E os preços de medicamentos têm pressionado não só SUS, mas todos os sistemas de saúde do mundo. E como definir qual seria o preço justo desses medicamentos se não sabemos quanto foi gasto na sua pesquisa? Se não sabemos o quanto de sua pesquisa foi financiada com dinheiro público?

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Se não conhecemos os testes que provaram que o medicamento era eficaz? Se não sabemos quais impostos estão incluídos no preço? Se não sabemos quanto os países pagam por eles? Quando o assunto é acesso a medicamentos, transparência é fundamental. E é por isso que transparência é tema da campanha global da UAEM já há algum tempo. Na América do Norte e na Europa, mostramos como a transparência da evidência científica é fundamental se quisermos defender uma Medicina Baseada em Evidências. Já aqui no Brasil, desenvolvemos uma campanha voltada à conscientização sobre a urgência de se entender os preços de medicamentos e sua regulação. Como fruto desse esforço, lançamos, hoje, este Boletim com o intuito de fornecer elementos que levem novos cidadãos a se unirem à luta global por transparência para a ampliação do acesso a medicamentos. No Brasil, a criação de nossa Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) foi um importante avanço para o controle dos preços de medicamentos. E, no primeiro texto deste Boletim, Beatriz Kaippert, líder da campanha global da UAEM no Brasil, nos conta como era a vida antes da CMED. Já Brenna, Marianne e Gabrielle, da UAEM em Fortaleza, abordam a atuação da CMED. Em menos de duas décadas de existência da CMED, falhas e potencialidades foram observadas e Clara Alves, autora convidada do Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual (GTPI), conduz uma ótima discussão sobre isso. Seguindo a discussão proposta pela Clara, Alan Rossi, da UAEM no Rio de Janeiro, e Luciana Lopes, Diretora Executiva da UAEM Brasil, exemplificam falhas da regulação de preços ao explorar o caso do sofosbuvir medicamento para o tratamento da Hepatite C - no Brasil. Logo após, Francisco Viegas, autor convidado da Iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas (DNDi), nos leva a um aprofundamento da discussão sobre transparência ao introduzir o debate sobre gastos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) de medicamentos. Após levantarmos e discutirmos vários problemas em relação à falta de transparência de preços e de gastos quando o assunto é medicamentos, Magno Maciel-Magalhães, da UAEM no Rio de Janeiro, em conjunto com membros das UAEM Colômbia e Argentina, traz uma comparação entre os países para refletirmos sobre a importância de defender a CMED e uma precificação de medicamentos mais transparente em toda a América Latina. Temos, ainda, a oportunidade de recordar as ações da UAEM Brasil relacionadas a transparência e outros temas em 2019. Para finalizar, na nossa tradicional seção “diz que é verdade, que tem saudade”, a Mariana Paiva, da UAEM em Pouso Alegre, entrevistou a Priscilla César, nossa primeira coordenadora da UAEM no Brasil. Em um momento da história em que nos sentimos bombardeados com tanta informação, precisamos refletir sobre a falta da informação correta. No âmbito do acesso a medicamentos e à saúde, transparência é fundamental para a tomada de decisão e para a plena realização das políticas públicas. Esperamos que este Boletim ajude o leitor a refletir sobre a importância de nos mobilizarmos por mudanças estruturais que garantam maior controle social sobre as tentativas do mercado de tratar nossa saúde, nosso direito, como uma simples mercadoria. Boa leitura! Luciana M. N. Lopes Diretora Executiva da UAEM Brasil

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A VIDA ANTES DA CMED A regulação de preço de medicamentos é uma dificuldade que o Brasil enfrenta desde a década de 40, tendo o controle alternado entre muito alto e baixo, com, inclusive, congelamento de preços. Essa regulação tinha um caráter temporário, uma vez que estava sempre associada com a intenção de auxiliar no controle da inflação [1]. Nessa montanha russa de padrões de regulação, alguns períodos são emblemáticos, como os anos 70 a 80, os anos 90 e a partir dos anos 2000 [2]. Começando pelos anos 70, o período era de ditadura militar, com arrocho salarial, aumento da desigualdade social e começo do fim do “milagre econômico” nem tão milagroso. Cenários assim costumam carregar consigo piores índices de saúde, a exemplo do alto número de mortes de crianças por causas evitáveis: 1.417.500 entre 1972-1976. E vamos lembrar que não existia o Sistema Único de Saúde (SUS) na época, então as pessoas que não tinham carteira assinada não tinham acesso a consultas, exames, cirurgias e eram atendidas em instituições filantrópicas - sendo tratadas como indigentes - e hospitais universitários. Já quem tinha carteira assinada tinha acesso a esquemas de assistência à saúde (consultas, exames, cirurgias) e benefícios como aposentadoria, entretanto esse acesso era difícil por conta das grandes filas nos institutos de assistência [3]. Os medicamentos representavam - e ainda representam - uma grande proporção dos gastos familiares. Nesse cenário de caos, foi criado, em 1968, o Conselho Interministerial de Preços (CIP), que realizava um controle direto no preço dos medicamentos. Porém, tal controle contribuiu para que ocorresse, em vários momentos, escassez de produtos no mercado brasileiro. A fim de driblar essa situação, os produtores passaram a realizar cobrança de ágio, ou seja, para aumentar seus lucros, as empresas passaram a fazer pequenas modificações para cobrar um valor mais caro do que era permitido. Essas modificações iam desde a mudança de embalagem, incentivo à venda casada, adicional de frete, até a falsificação de autorizações de aumentos - lembrando que transparência e combate à corrupção não eram o forte do governo militar, facilitando a ocorrência de fraudes. Em 1971 foi criada a Central de Medicamentos (Ceme), de gestão centralizada, para promover acesso a medicamentos à população em maior situação de vulnerabilidade social. Além da função de organizar as ações assistenciais para essa população, a Ceme tinha como objetivo coordenar a distribuição e a venda de medicamentos no país, avaliar a capacidade de produção dos laboratórios farmacêuticos e identificar indicadores de saúde [4]. A CEME auxiliou na implementação de uma iniciativa de financiamento em conjunto à secretaria de Tecnologia Industrial do Ministério da Indústria e Comércio, que incentivou o desenvolvimento de tecnologias pelas empresas farmacêuticas nacionais para produção de insumos importados. As indústrias nacionais privadas farmacêuticas cresceram nesse período, mas essa produção pouco influenciou nas taxas de importação, visto que os insumos produzidos eram de baixo valor agregado e já eram fabricados, em larga escala, por empresas multinacionais tradicionais e, com isso, era difícil ter uma competição de mercado/concorrência para se ter preços mais baixos [2]. Saindo do período da ditadura, nos anos 90, com o governo Collor, teve a criação do Plano Collor I que, ainda com a CIP, congelou os preços dos medicamentos devido à inflação descontrolada da época. No descongelamento, ocorreu a liberação de preços do setor e isso levou à prática de

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preços abusivos, o que levou os preços dos medicamentos a serem congelados novamente. Então, foi criado o Plano Collor II, em que houve a instalação de câmaras setoriais - com participação da iniciativa privada e do Estado, a exemplo da Câmara Setorial da Indústria Farmacêutica [2]. Essa câmara iniciou uma fase lenta de reajustes dos preços setor, porém esses não foram efetivos, visto que os preços dos medicamentos atingiram patamares tão exorbitantes que, mesmo reajustados, ainda eram caros. Para se ter uma idéia, estudos conduzidos pelo Núcleo de Assessoramento Econômico em Regulação (Nurem) da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), com dados de índice de preços do IBGE, mostram que, entre janeiro de 1990 e janeiro de 2000, ocorreu uma variação percentual real acumulada superior a 220%, significando aumento de preços dos produtos farmacêuticos 220% superior à inflação geral [1]. Porém, nem tudo é tristeza. Por exemplo: em 1988 foi criado o SUS, que deu acesso à população a serviços de prevenção e assistência médica e hospitalar. Depois, em 1998, foi implementada a Portaria do Ministério da Saúde nº 3.916 [5], que aprovou a Política Nacional de Medicamentos (PNM). As ações da PNM buscavam promover a garantia da segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos, a promoção do seu uso racional e acesso da população a medicamentos considerados essenciais. Suas diretrizes são: 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8.

Adoção da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) Regulamentação Sanitária e padronização de medicamentos Reorientação da assistência farmacêutica Promoção do uso racional de medicamentos Desenvolvimento científico e tecnológico Promoção da produção nacional de medicamentos Garantia da segurança, eficácia e qualidade dos medicamentos Acompanhamento e Avaliação Política.

Essas diretrizes tiveram como fruto, em 1999, a criação da ANVISA [6], e a política de medicamentos genéricos (Lei nº 9.787/99) [7], que além de estimular a produção de genéricos nacionais, também visava controlar os preços dos medicamentos por meio do aumento da competição de mercado, buscando romper com a hegemonia das indústrias líderes multinacionais. E, de fato, com a entrada dos genéricos no mercado, o preço dos medicamentos referência diminuiu e os genéricos chegaram a um valor quase que 80% menor que o tradicional, ampliando o acesso aos medicamentos. Porém, esta política não era suficiente para controlar o preço dos medicamentos, visto que não é todo medicamento que tem um genérico respectivo e a Lei de Genéricos, em sí, não regula o preço da entrada de medicamentos no mercado [8]. E nesse cenário de variações constantes de preços, tentativas de regular o mercado e o surgimento de importantes atores da saúde pública como SUS e ANVISA, chegamos nos anos 2000, quando foi instaurada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre medicamentos

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que tinha como objetivo principal a necessidade de reduzir a escalada de preços de medicamentos. Durante o inquérito, os laboratórios farmacêuticos e as distribuidoras foram solicitados a enviarem informações sobre o aumento de preços praticados. Dessa forma, foram descobertos diversos cartéis envolvendo laboratórios e distribuidoras com a finalidade de dominar o mercado de medicamentos e forçar o aumento ou manutenção de preços. Também encontraram muita falsificação de medicamentos e existência de crimes contra a economia popular e relações de consumo, que significa prejudicar a livre concorrência, aumentar arbitrariamente os lucros ou impor preços excessivos. E concluíram que, apesar do número grande de laboratórios farmacêuticos no mercado, apenas uma minoria respondia pela maior parte do faturamento total e havia especial concentração em relação a oferta de princípios ativos com grande dependência de importação [2]. Outros dados apresentados pela CPI mostraram que entre 1990 e 1998, houve um aumento de 300% nos preços dos remédios. Nesse período, apesar da produção de medicamentos ter se mantido estável - em torno de um bilhão e 600 milhões de unidades - o faturamento do setor passou de três bilhões e quatrocentos milhões de dólares para dez bilhões e trezentos milhões de dólares [9] Em outras palavras, todos os esforços anteriores feitos para controlar os preços foram ineficientes e, dessa forma, duas medidas foram tomadas [10]: 1. Desoneração da tributação dos medicamentos pelo PIS/Cofins (Programa de Integração Social/Contribuição para Financiamento da Seguridade), que reduziu imediatamente os preços em 10% e transformou o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) no principal imposto sobre medicamentos no País. 2. Estabelecer uma legislação para desindexar os preços de medicamentos de índices de correção pela inflação. A Lei nº 10.213/2001 tinha vigência restrita a 2001 e criava a Câmara de Medicamentos (Camed) [11], encarregada de definir reajustes e acompanhar o mercado. O teto anual para Reajuste Médio de Preços (RMP) seria baseado na Evolução Média de Preços (EMP) e em um Índice Paramétrico de Medicamentos (IPM), definido pelo Grupo de Trabalho de Regulação do Setor Farmacêutico. Dessa forma, o terreno foi todo armado e fundamentado para que, em 2003, fosse implantada a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) [12], que é considerada um marco regulatório econômico para o mercado farmacêutico, que permanece até os dias de hoje. Autora: Beatriz Kaippert, farmacêutica, membra do comitê de coordenação da UAEM Brasil, líder do projeto de transparência em preços de medicamentos e representante da UAEM Brasil no Comitê Executivo da UAEM global.

Referências:

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1. Preço de medicamentos no Brasil. Um guia rápido para profissionais da saúde pública. Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP). Fundação Oswaldo Cruz.Rio de Janeiro, 17 2. Fernanda Pires Vieira, Camila Fracalossi Rediguieri e Carolina Fracalossi Rediguieri ”A Regulação de Medicamentos no Brasil” Artmed Editora. 01Jan2013 ISBN: 9788565852685 3. Maíra Mathias “Antes do SUS: Como se (des)organizava a saúde no Brasil sob a ditadura” EPSJV/Fiocruz; 10 Abril 2018 https://cee.fiocruz.br/?q=antes-do-sus 4. OLIVEIRA, L. C. F.; ASSIS, M. M. A.; BARBONI, A. R. Assistência Farmacêutica no Sistema Único de Saúde: da Política Nacional de Medicamentos à Atenção Básica à Saúde. Ciênc. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v.15, supl. 3, p. 3561-3567, nov. 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141381232010000900031&lng=en&nrm=iso>. Acesso em dez. 2017. 5. BRASIL. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Portaria nº 3.916, em 30 de outubro de 1998 que “Dispõe sobre a aprovação da Política Nacional de Medicamentos” Diário Oficial da União,Brasília, DF, de 10 de novembro de 1998 pág. 18 a 22. 6. BRASIL, Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Lei nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999. “Define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, cria a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e dá outras providências.”Brasília, DF, de 27 de janeiro de 1999, pág 1. 7. BRASIL, Ministério da Saúde. Gabinete do Ministro. Lei nº 9.787, de 11 de fevereiro de 1999 que “Altera a Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976, que dispõe sobre a vigilância sanitária, estabelece o medicamento genérico, dispõe sobre a utilização de nomes genéricos em produtos farmacêuticos e dá outras providências.” Diário Oficial da União, Brasília, DF, de 11 de fevereiro de 1999, pág 1. 8. João Policarpo R. Lima e Paulo Fernando Cavalcanti Filho “Indústria farmacêutica: A evolução recente no Brasil e o caso de Pernambuco.” Revista Brasileira de Estudos Regionais e Urbanos. 9. Especial das CPIs - CPI dos Medicamentos - ( 08' 13" ) https://www.camara.leg.br/radio/programas/258260-especial-das-cpis---cpi-dos-medicamentos----08--13--10. Leticia Lucia dos Santos Dias, Maria Angelica Borges dos Santos e Cláudia Du Bocage Santos Pinto Regulação contemporânea de preços de medicamentos no Brasil - uma análise crítica”; Saúde debate vol.43 no.121 Rio de Janeiro Apr./June 2019 Epub Aug 05, 2019 http://dx.doi.org/10.1590/0103-1104201912120 11. BRASIL, Poder legislativo Lei nº 10213, de 27 de março de 2001 que “Define normas de regulação para o setor de medicamentos, institui a Fórmula Paramétrica de Reajuste de Preços de Medicamentos - FPR, cria a Câmara de Medicamentos e dá outras providências.” Diário Oficial da União, Brasília, DF, de 28 de março de 2001, pág 1. 12. BRASIL, Presidência da República. Lei n°10742, de 06 de outubro de 2003 que “Define normas de regulação para o setor farmacêutico, cria a Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos - CMED e altera a Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976, e dá outras providências.” Diário Oficial da União, Brasília, DF, de 7 de outubro de 2003, pág 1. 13. Fonte da imagem 1: https://www.abrasco.org.br/site/outras-noticias/opiniao/sobre-ocontrole-de-precos-de-medicamentos-artigo-de-reinaldo-guimaraes/44739/ 14. Fonte da imagem 2: http://1.bp.blogspot.com/VTTsk3pFyAg/Ugtmzhy8wBI/AAAAAAAACnk/-UtHoBB8rr0/s1600/medicamentos-tile.jpg

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NASCE A CMED – COMO É SUA ATUAÇÃO? A Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED) foi criada pela Lei nº 10.742, de 6 de outubro de 2003. A CMED é um órgão interministerial composto por cinco ministérios: Ministério da Saúde, Ministério da Casa Civil, Ministério da Fazenda, Ministério da Justiça e Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços. Ela é responsável pela regulação econômica do mercado de medicamentos no Brasil, enquanto a Anvisa exerce o papel de Secretaria-Executiva da Câmara. A CMED tem como objetivos a adoção, implementação e coordenação de atividades relativas à regulação econômica do mercado de medicamentos, voltadas a promover a assistência farmacêutica à população, por meio de mecanismos que estimulem a oferta de medicamentos e a competitividade do setor. Isso ocorre, por exemplo, com a autorização de preços de entrada de medicamentos novos no mercado brasileiro, com o monitoramento do mercado e com a autorização de reajustes de preços para medicamentos já comercializados. A partir da criação da CMED, a regulação do setor farmacêutico passou a pautar-se em um modelo de teto de preços, regido por mecanismos que estimulem a oferta de medicamentos e a competitividade do setor. A estratégia objetiva aumentar a concorrência no setor farmacêutico para reduzir a concentração e a capacidade das empresas de imporem preços, criando incentivos à introdução de novos produtos e definindo uma fórmula de reajuste de preços em que medicamentos de segmentos com menos concorrência recebem reajustes menores. A CMED atua com estratégias pautadas em práticas internacionais, dentre elas, o referenciamento externo e interno de preços e Avaliação de Tecnologias em Saúde (ATS) para promover o equilíbrio no mercado farmacêutico. Ressalta-se, ainda, que os preços publicados em listas correspondem aos preços máximos que podem ser praticados e que esses preços podem ser negociados em níveis abaixo desses valores. A ATS é o processo contínuo de análise e síntese dos benefícios para a saúde, das consequências econômicas e sociais do emprego das tecnologias, consistindo na comparação entre duas tecnologias – a exemplo dos medicamentos – com mesma indicação e levando em conta critérios como eficácia, efetividade, segurança e custo-efetividade. Seu objetivo é subsidiar decisões quanto à incorporação e o monitoramento da utilização de tecnologias nos sistemas de saúde, além de orientar os profissionais de saúde e usuários em relação a sua segurança, benefícios e custos. Para a CMED, a ATS facilita a análise de impacto orçamentário das tecnologias em saúde e sua aplicação no mercado. Assim, a ATS passa, a partir de 2004, a ser aplicada à tomada de decisão relativa aos preços de novos medicamentos Os ajustes de preços dos medicamentos no Brasil também devem ser aprovados pela CMED uma vez ao ano, de acordo com fórmula pré-estabelecida em norma. A fórmula da variação percentual do preço anual dos medicamentos (VPP) é: VPP = IPCA - X + Y + Z. Onde:

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O Fator Y – denominado na fórmula da CMED “Fator de ajuste relativo entre setores” – incorpora variáveis especificamente relevantes para os custos de produção da indústria farmacêutica. Inclui custos da indústria farmacêutica no uso de insumos de outros setores, como os de tarifas públicas, e os relacionados às importações, traduzidos nas variações das taxas de câmbio. O Fator X é definido a partir do Índice de Produtividade do Setor Farmacêutico utilizando um modelo econométrico e é relativo ao setor farmacêutico em sua totalidade. Corresponde a uma razão entre o Índice de Produção Física do Setor Farmacêutico (que considera tanto os produtos farmacêuticos como os produtos farmoquímicos) e o total de horas trabalhadas no setor farmacêutico. ● O Fator Z – denominado “fator de ajuste relativo intrassetor” – resume-se a uma segmentação dos produtores de medicamentos em três níveis de concentração de mercado que são definidos pelo Índice Herfindahl-Hirschman (IHH).

Complicada, né?! De cara, é possível ver que os reajustes de preços de medicamentos estão vinculados ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) que são definidos pelo IBGE. Nota-se que a inflação pode ter uma grande influência no preço dos medicamentos exatamente por estar relacionado a um índice de cálculo de inflação. Já o Índice Herfindahl-Hirschman (IHH) - descrito no fator Z - considera o mercado como um todo, não somente o mercado varejista, mas também as vendas hospitalares e compras públicas. O método IHH classifica os medicamentos em três classes, com base em dados de comercialização do ano anterior e a partir dos dados do Sistema de Acompanhamento do Mercado de Medicamentos (SAMMED): 1. Concentrados - Os concentrados abrangem 21,57% dos medicamentos regulados e terão um maior reajuste, pois possuem maior concorrência e, por isso, tendem à manutenção dos preços mais baixos. 2. Moderadamente concentrados - Os moderadamente concentrados correspondem a 26,7% do total. 3. Altamente Concentrados - O grupo “altamente concentrados” corresponde a uma parcela de 51,73% dos medicamentos regulados; esses sofrerão o menor reajuste, uma vez que são produtos de maior custo, de baixa concorrência e alta tecnologia. Em fevereiro de 2015, a CMED oficializou um novo instrumento para o monitoramento do mercado farmacêutico – SAMMED. Este sistema tem o objetivo de programar e coordenar tarefas relacionadas à regulação econômica do mercado de medicamentos com a finalidade de assegurar a assistência farmacêutica, a oferta de medicamentos e a competitividade do setor. Os relatórios semestralmente disponibilizados pela indústria passaram a ser enviados para essa

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nova plataforma com distinção dos compradores; dessa forma, será possível identificar cada cliente. Além desse monitoramento, outras atividades auxiliam a fiscalização da Câmara, como o envio de denúncias ou investigações ativas e, quando há indícios de infrações às normas estabelecidas, instauração de processo administrativo com possibilidade de aplicação de penalidades. A CMED disponibiliza no Portal da Anvisa os documentos da Avaliação de Impacto Regulatório – AIR, que permite o envio de contribuições (Formulário e-participa) e, à medida que as discussões vão avançando, novos documentos são adicionados para um completo acompanhamento social, salvo os dados e informações sigilosas, nos termos da Lei de Acesso à Informação. Esse instrumento surgiu a partir da observação da CMED sobre o cenário tecnológico, o qual deixou evidente, para a ela, a necessidade de adequar os critérios de precificação e dar previsibilidade e sustentabilidade ao setor regulado e ao sistema de saúde, sem gerar efeitos nocivos ao mercado e à sociedade. A CMED representou um avanço em matéria de regulação de preços no Brasil. Cobrar por transparência e mecanismos de controle social é importante para o fortalecimento da Câmara e, consequentemente, seu bom funcionamento na regulação de preços de medicamentos no Brasil. Em menos de duas décadas de existência da CMED, falhas e potencialidades foram observadas e serão tratadas no próxima seção. Autoras: Brenna de Oliveira Gadelha, Marianne Santos Florêncio e Gabrielle Karen Almeida Rocha, integrantes do capítulo de Fortaleza da UAEM. Referências:

1. 2. 3. 4. 5. 6. 7.

http://portal.anvisa.gov.br/perguntas-e-respostas-preco-cap http://portal.anvisa.gov.br/cmed/apresentacao http://portal.anvisa.gov.br/cmed/air http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_gestao_tecnologias_saude.pdf https://doi.org/10.1590/0103-1104201912120 http://portal.anvisa.gov.br/informacoes-tecnicas Preço de medicamentos no Brasil. Um guia rápido para profissionais da saúde pública. Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca. Fundação Oswaldo Cruz.Rio de Janeiro , 2017. 8. Fonte da imagem 1: https://www.mypharma.com.br/blog/tabela-cmed/ Acesso em 29 de fev 2020 9. Fonte da imagem 2: Cartaz diagramado pela Luana Gonçalves Corrêa, 23 anos, graduanda de Jornalismo no Centro Universitário de Brasília - UniCEUB

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CMED: FALHAS E POTENCIALIDADES Nos últimos anos, tanto países em desenvolvimento como países desenvolvidos têm enfrentado problemas com o alto preços de medicamentos. Nesse contexto, a regulação de preços de produtos farmacêuticos é uma estratégia importante para lidar com os problemas de acesso a medicamentos, tendo em vista seu potencial de fazer frente aos elevados preços praticados pelas empresas farmacêuticas. Conforme dito anteriormente, no Brasil, foi criada, em 2003, a CMED, resultado da implantação de um marco regulatório econômico para o mercado farmacêutico. Recomendado pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre medicamentos, em meados de 2000, esse marco regulatório previa assegurar preços médios baratos e estáveis de medicamentos [1], fundamentais para a garantia do direito à saúde e para a sustentabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS). Entretanto, a CMED enfrenta alguns problemas que colocam em xeque o alcance da sua proposta. Mesmo depois de 17 anos da sua criação, seu formato não passou por transformações essenciais que aprimorassem a regulação de preços de medicamentos no Brasil. Sendo assim, diante dessas questões, internas e externas à sua estrutura regulatória, faz-se essencial refletir sobre o trabalho que a CMED vem travando, de modo a compreender suas falhas e potencialidades. O atual modelo e suas falhas Como apontado anteriormente, A CMED é responsável pela fixação e reajuste de preços de medicamentos no Brasil. O valor máximo fixado para medicamentos que ainda não existem no mercado nacional é denominado Preço de Fábrica (PF). Os medicamentos são divididos em produtos inovadores, com ou sem ganho terapêutico (Categorias I e II), e demais medicamentos com novas apresentações, novas formas, novas associações e genéricos (Categorias III a VI).

No caso de medicamentos inovadores, se utiliza como referência preços internacionais, Preço de Referência Externo (PRE), de uma cesta de nove países desenvolvidos. São eles: Austrália,

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Canadá, Espanha, Estados Unidos, França, Grécia, Itália, Nova Zelândia e Portugal. O preço proposto no Brasil pela empresa fabricante do medicamento não pode ser superior ao menor preço praticado nos países da cesta e no país de origem do produto [2]. Esse critério é utilizado, majoritariamente, por países de renda alta, que possuem características semelhantes às referências de suas cestas. Porém, as referências brasileiras não se aproximam da realidade econômica e de saúde do país. Consequentemente, essa cesta leva a CMED a fixar PF muito altos, incoerentes à renda e poder de compra do Brasil. Além do mais, esse modelo, utilizado por vários outros países, incentiva lançamentos antecipados de medicamentos inovadores em países que praticam preços mais altos, retardando a entrada desses produtos no mercado de países que pagam menos [3]. O preço dos demais medicamentos (Categorias III a VI) é estabelecido tendo como referência as versões que os antecedem. A partir da fixação do PF, é calculado mediante fórmula aritmética o Preço Máximo ao Consumidor (PMC) e o Preço Máximo de Venda ao Governo (PMVG). Em relação ao PMC, existe também uma notória disparidade entre o seu valor e os preços praticados nas farmácias e drogarias do Brasil [4]. Assim como o PF, o PMC é muito elevado, demonstrando quão inofensiva é a interferência da Câmara na determinação dos preços de parte expressiva dos medicamentos no país. O teto estabelecido pela regulação não influencia os preços verdadeiramente praticados pela indústria farmacêutica, prejudicando os consumidores, que ficam a mercê de reajustes bruscos inesperados. Em relação às vendas ao governo, a regulação do preço também enfrenta dificuldades. A CMED determina um desconto obrigatório de aproximadamente 24% [5], o Coeficiente de Adequação de Preços (CAP), para compras governamentais custosas ao SUS, como é o caso de medicamentos do componente especializado da assistência farmacêutica, dos hemoderivados e dos medicamentos indicados para o tratamento de IST/AIDS e câncer [6] e as compras para atendimento a ações judiciais. Já nos primeiros anos da criação da CMED, o preço CAP foi questionado judicialmente pela Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma), representação das multinacionais farmacêuticas no Brasil. Na época, em 2007, por decisão unânime, o plenário da 1ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça (STF) julgou a ação improcedente e acatou todos os argumentos apresentados pelo Ministério da Saúde, considerando o coeficiente como uma contribuição para fazer cumprir o papel do Estado em efetivar a saúde pública no país [7]. Mesmo diante da defesa do STF, na prática, muitos laboratórios deixam de considerar esse desconto e, quando obrigados a pagá-lo, muitos também deixam de participar de licitações públicas. A maioria dos casos de pagamento de sobrepreço não chega ao conhecimento da CMED, demonstrando a dificuldade de articulação entre os órgãos públicos e a deficiência jurídica da Câmara ao não prever instrumentos de fiscalização da aplicação do CAP [8]. Todas essas questões geram prejuízos para o acesso a medicamentos no Brasil. Por outro lado, esse mesmo cenário se mostra muito vantajoso para a indústria farmacêutica que, na prática, determina os seus próprios preços. A atuação inócua da Câmara acaba por servir aos interesses das empresas, em detrimento do interesse público de promover a assistência farmacêutica. Essa dinâmica não é recente, trata-se de um cenário de “captura corporativa” [9], quando instituições

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públicas assumem uma orientação corporativa na sua atuação. Esse fenômeno não representa casos isolados na área de medicamentos, mas sim um comportamento sistêmico, que influencia não apenas a regulação de medicamentos, mas todo o sistema de saúde. Falta de recursos, privatização, terceirização e outros ataques ao SUS são estratégias de priorização de benefícios às empresas que exemplificam esse cenário maior de captura. Nesse sentido, a regulação de preço de medicamentos deve caminhar no sentido de reverter essa realidade. Oportunidades A CMED vive hoje uma oportunidade de corrigir as questões apresentadas. Desde o início de 2019, a Câmara passa por um processo de revisão da Resolução n 2/2004, que aprova os critérios para definição de preços máximos permitidos para comercialização de medicamentos novos e novas apresentações [10], reconhecendo a necessidade de adequar os critérios de precificação. Já em 2018, a CMED iniciou uma série de consultas sobre a revisão. Aconteceram reuniões de diálogos setoriais, em larga medida com o setor regulado, quais sejam, associações representativas da indústria farmacêutica, clínicas e hospitais [11]. Nesse ínterim, outras mudanças foram colocadas em prática, como, por exemplo, o fim do preço-teto para medicamentos isentos de prescrição médica, alteração questionada por organizações da sociedade civil uma vez que a medida não garante que as variações de preço desses medicamentos não serão abusivas para o consumidor [12]. No final de 2019, foi criado um Grupo de Trabalho para propor novos critérios para a precificação de medicamentos que trazem inovação incremental [13]. Essa agenda, fortemente defendida pela indústria farmacêutica nacional, também tem recebido críticas de associações de profissionais de saúde [14]. Embora previsto no Plano de Participação Social, a CMED ainda não lançou uma Consulta Pública sobre seu processo de revisão, o que leva a crer na priorização do diálogo com o setor regulado. Do ponto de vista do interesse público e em defesa das políticas públicas de acesso universal e gratuito a medicamentos, esse importante processo de revisão deve ser acompanhado pela implementação de estratégias de transparência, as quais levariam a CMED a acessar informações necessárias ao estabelecimento de preços justos, garantindo a sustentabilidade do SUS. Para tal, é fundamental levar em consideração as propostas contidas na mais recente resolução da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre transparência no mercado de medicamentos, vacinas e outras tecnologias relacionadas à saúde, co-patrocinada pelo Brasil [15]. O processo de negociação dessa resolução, seguida pela aprovação pela Assembléia Mundial de Saúde em 2019, desencadeou a repercussão do tema na agenda internacional, desencadeando e aprofundando debates essenciais ao acesso a medicamentos. Um dos principais tópicos elencados pela temática é a necessidade de reivindicar transparência para além dos preços das tecnologias de saúde, mas também nos outros processos desse mercado, como pesquisa clínica, Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e patenteamento. A revisão da regulação da CMED, assim como todo o marco regulatório brasileiro do mercado farmacêutico, deve considerar as questões que o atual modelo tem enfrentado e enfrentá-los, de

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modo a reverter o cenário de captura da instituição. Ademais, o caminho para tornar a atuação da CMED coerente com sua proposta passa pela adoção de estratégias de transparência que garantam o acesso a medicamentos e a sustentabilidade do SUS. Autora: Clara Alves Silva é mestranda em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), assistente de projetos do Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI) na Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA).

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A INEFETIVIDADE DA CMED E O CASO DO SOFOSBUVIR NO BRASIL Atualmente, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 71 milhões de pessoas estejam cronicamente infectadas pelo vírus da hepatite C (VHC) em todo o mundo e que a epidemia dessa doença tem sido responsável por cerca de 400 mil mortes por ano.[1] Somente no Brasil, a estimativa é que existam aproximadamente 700 mil pessoas cronicamente infectadas por essa enfermidade[2] e que, entre os anos 2000 e 2017, dos 70.671 óbitos por causas básicas e associadas às hepatites virais, 53.715 (76%) estejam associadas à hepatite C.[3] Diante desse grave cenário, a “Estratégia Global para as Hepatites Virais”, apresentada pela OMS em 2016, definiu como metas que 90% das pessoas infectadas pelo VHC sejam diagnosticadas e que 80% delas sejam tratadas até 2030.[4] Nesse mesmo sentido, o “Plano para Eliminação da Hepatite C no Brasil”, apresentado pelo Ministério da Saúde em 2018, prevê o tratamento de 657 mil pessoas até 2030 e, consequentemente, a eliminação da doença como problema de saúde pública no país.[5]

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Para se alcançar esses ambiciosos objetivos, entretanto, um dos maiores desafios a serem enfrentados é garantir amplo acesso aos tratamentos com Antivirais de Ação de Direta (AAD), que, além de apresentarem taxas de cura acima de 90%, possibilitam a realização de tratamentos orais, mais seguros e de curta duração, em comparação às alternativas terapêuticas que existiam antes de sua introdução. O preço exorbitante cobrado por essa nova classe de medicamentos pode ser considerado o principal obstáculo ao acesso da população à cura da hepatite C, sujeitando diretamente milhões de pessoas ao risco de insuficiência hepática e câncer.[6] Como exemplo mais emblemático deste problema, no final de 2013, o tratamento de 12 semanas com o medicamento sofosbuvir, tido como a espinha dorsal dos tratamentos com AAD atuais, foi lançado no mercado estadunidense por aproximadamente USD 84 mil, o que correspondia a mil dólares por comprimido e a um valor cerca de 67 vezes mais alto que o seu peso equivalente em ouro. Nesse contexto, graças à titularidade dos direitos de patente sobre o sofosbuvir e à falta de regulação de preços de medicamentos nos Estados Unidos, a companhia biofarmacêutica Gilead Sciences Inc. (Gilead) se viu completamente livre para fixar os preços que maximizam o lucro de seus acionistas, mesmo que isso tornasse o tratamento severamente inacessível para a população em geral. [7] Embora mais de 6 anos tenham se passado desde o primeiro lançamento do sofosbuvir no mercado e, de fato, o preço do medicamento tenha se reduzido consideravelmente por diversos fatores, o acesso ao tratamento para hepatite C continua sendo bastante restrito. No Brasil, ao se considerar as compras públicas realizadas no período entre 16/01/2015 e 22/06/2019, o preço médio por comprimido dos medicamentos que contêm sofosbuvir como princípio ativo e que são registrados pela Gilead (Epclusa, Harvoni e Sovaldi) chegou a R$ 986,57, durante o período de monopólio formal dessa companhia no país. Esse quadro se mostra ainda mais grave quando se calcula o custo total de um tratamento de 12 semanas com algum desses medicamentos, que pode chegar a um preço médio de até R$ 82.871,88.[8] Além de possibilitar a prática de preços exorbitantes no mercado brasileiro, os direitos patentários concedidos à Gilead também possibilitam que a companhia altere abruptamente o preço sobre os seus medicamentos. Antes da concessão da patente, período em que havia concorrência entre Gilead e Blanver/Farmanguinhos (02/07/2018 até 15/01/2019), o preço médio por comprimido dos medicamentos que contêm o sofosbuvir chegou a ser R$ 64,84. Entretanto, após a concessão do privilégio patentário para Gilead (15/01/2019), em um intervalo de apenas 43 dias (16/01/2019 a 28/02/2019), ocorreu uma elevação de 1.421,55% no preço unitário médio desses medicamentos, os quais passaram a custar, em média, R$986,57 por comprimido.[8] Diante desse contexto, surge uma questão importante: considerando que no Brasil, diferentemente dos Estados Unidos, existe um teto de preços estabelecido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED),[9] como é possível que os preços dos medicamentos que contêm o sofosbuvir possam ser tão altos e possam variar tanto no mercado?

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Uma pista para responder a essa questão pode ser encontrada ao se verificar o teto de preços mais baixo estabelecido pela CMED para compras públicas desses medicamentos em 2019, isto é, os Preços Máximos de Venda ao Governo (PMVG) por comprimido, isentos de ICMS, do Epclusa (R$ 705,57), do Harvoni (R$ 1.474,18) e do Sovaldi (R$ 1.596,07).[10] Os tetos de preço podem ser considerados tão elevados que, nem mesmo os preços mais altos pagos pelo Estado brasileiro por cada um desses medicamentos em 2019 – embora pudessem ser considerados excessivos – ultrapassaram os limites de preços fixados pela CMED.[11] Nesse sentido, no caso dos medicamentos registrados pela Gilead e que possuem o sofosbuvir como princípio ativo, os preços máximos estabelecidos pela CMED são tão elevados que não são capazes de impedir a fixação e nem a variação exorbitante de preços pela indústria farmacêutica, configurando-se como uma política pública inefetiva para promover a assistência farmacêutica e, portanto, incapaz de alcançar os seus propósitos iniciais estabelecidos por lei.[11] Assim, embora seja verdade que no Brasil exista uma política de controle de preços de medicamentos e que ela possa ser considerada historicamente um avanço regulatório, dada a sua inefetividade prática, ela não tem se mostrado capaz de limitar o exercício abusivo dos direitos de patente e nem de ampliar o acesso da população aos medicamentos que contêm o sofosbuvir como princípio ativo. [11] Diante deste preocupante cenário, no dia 21 de outubro de 2019, a Defensoria Pública da União (DPU) e mais 9 organizações (entre elas, a UAEM Brasil), protocolaram uma representação junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), na qual denunciam a prática de preços abusivos e o abuso de posição dominante praticado pela Gilead, assim como objetivam corrigir esta grave distorção do mercado concorrencial brasileiro. No âmbito desta representação, essas entidades pedem a aplicação da pena de multa à companhia e a imposição do licenciamento compulsório da patente sobre o sofosbuvir.[12] O acionamento do Cade, neste caso, além de estar perfeitamente alinhado à missão institucional da autarquia [13] e complementar à atuação da CMED, apresenta-se como uma medida inovadora e extremamente importante para garantir o acesso da população ao sofosbuvir. Afinal, como demonstrado, a união entre um sistema favorável à concessão de patentes farmacêuticas e uma política inefetiva de regulação de preços de medicamentos pode resultar em uma combinação letal para o orçamento público nacional e, sobretudo, para milhares de brasileiros que estão condenados a sofrer as duras penas de uma doença curável. Autores: Alan Rossi Silva, membro do capítulo do Rio de Janeiro da UAEM, doutorando em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e Luciana de Melo Nunes Lopes, Diretora Executiva da UAEM Brasil e doutoranda em Saúde Pública pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

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TRANSPARÊNCIA IMPORTA – POR QUE É SAUDÁVEL SABER O CUSTO DA PESQUISA E DESENVOLVIMENTO DE MEDICAMENTOS? A Organização Pan-Americana da Saúde[1] considera o acesso aos medicamentos, inclusive os de alto custo, como de extrema relevância para salvar vidas. No entanto, os altos preços praticados podem aumentar extraordinariamente o risco de empobrecimento das pessoas que precisam adquiri-los e comprometer a sustentabilidade dos sistemas de saúde. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU) enfatizaram como uma de suas prioridades a necessidade de atingir as metas de saúde, inclusive por meio da proteção da população “do risco financeiro (...) o acesso a medicamentos e vacinas essenciais seguros, eficazes, de qualidade e a preços acessíveis”. Neste contexto, é importante perguntar: por que muitos medicamentos são tão caros?

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Os fatores são múltiplos e abrangem desde a existência de monopólios por motivos de patentes até processos regulatórios complexos que envolvem exigências de comprovação de qualidade e registros em cada país. Além disso, há a famosa vinculação do custo de pesquisa e desenvolvimento (P&D) a ser recuperado nas vendas futuras da inovação com o preço dos medicamentos, isto é, o argumento de que o preço final é fruto da necessidade de recuperar economicamente o investimento realizado. Segundo o Relatório do Painel de Alto Nível da ONU sobre Acesso a Medicamentos[2], há uma diferença abismal entre os valores dos custos de P&D de novos medicamentos, pois existem poucos estudos e a informação disponível é escassa. PricewaterhouseCoopers, Pharma e o Tufts Centre for the Study of Drug Development (EUA) apontam custos de desenvolvimento para inovação radical (um novo medicamento) que oscilam, respectivamente, entre US$ 4,2 e US$ 2,6 bilhões, enquanto a DNDi (Iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas) e a Light and Warburten apresentam valores abaixo dos US$ 250 milhões, ou seja, dentre eles há uma variação de 1800%. Apesar de métodos diferentes de cálculo utilizados e da pouca transparência dos dados referentes ao custo da P&D, o que essas variações representam, na prática, para as pessoas que precisam de medicamentos de alto custo e para os sistemas de saúde que os fornecem? Significam que a negociação para a aquisição de medicamentos ocorre sem o conhecimento do custo do seu desenvolvimento, ainda que estimado, e, portanto, sem nenhum elemento basilar à compreensão do seu valor razoável de comercialização. Exemplos da falta de transparência na área farmacêutica são o desconhecimento de: quanto custa a matéria prima, produção, quanto foi investido em pesquisa pelo setor privado, quanto da pesquisa prévia ao lançamento do produto foi realizada por instituições públicas (recursos já pagos pela população por meio de impostos) e a que preço o mesmo tratamento está sendo ofertado aos outros países do mundo. Em outras palavras, as negociações de preços de medicamentos essenciais para a vida das pessoas ocorrem diariamente às cegas, sem qualquer evidência sobre a razoabilidade do preço praticado. Ademais, cabe recordar o fato de que os medicamentos não são “bens” que podemos optar por não consumir, pois são essenciais para o gozo de uma saúde plena. Isto ocasiona que o indivíduo e/ou o sistema de saúde, regra geral, estejam dispostos a pagar praticamente qualquer preço para poder acessá-los. A possibilidade de abusos de preços em um cenário de falta de transparência se agrava pois, muitas vezes, os laboratórios farmacêuticos possuem direitos exclusivos de comercialização de um determinado produto em decorrência da patente vigente. A prática de preços exorbitantes é,

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assim, facilitada pela falta de disponibilidade de alternativas terapêuticas (medicamentos concorrentes) no mercado. Um relatório técnico da Organização Mundial de Saúde (OMS)[3], ao analisar os medicamentos para câncer, corrobora esse argumento ao destacar que “ os custos de P&D e produção podem possuir pouca ou nenhuma relação com a forma como as indústrias farmacêuticas definem os preços dos medicamentos para câncer. Indústrias farmacêuticas definem os preços de acordo com as metas comerciais e com o foco de extrair o máximo de recursos que o comprador está disposto a pagar pelo medicamento. Essa abordagem de precificação torna os medicamentos para câncer inacessíveis, impedindo que o benefício completo desses medicamentos seja concretizado.” Existem algumas iniciativas e organizações que buscam realizar pesquisa e promover o acesso de forma alternativa à prática vigente, dentre elas, foi criada a DNDi. Trata-se de uma organização sem fins lucrativos para P&D orientada pelas necessidades dos pacientes, que desenvolve tratamentos seguros, eficazes e acessíveis para milhões de pessoas em situação vulnerável que são afetadas por doenças negligenciadas, em particular a doença de Chagas, as leishmanioses, a doença do sono, o HIV pediátrico, a Hepatite C, as filarioses e o micetoma.A DNDi se diferencia tanto no que faz - criar tratamentos urgentemente necessários para populações negligenciadas quanto em como faz: testar um modelo alternativo de P&D, baseado não na maximização do lucro, mas nas necessidades do paciente, promovendo o compartilhamento mais amplo possível de dados e os conhecimentos de pesquisas, por meio de uma abordagem colaborativa, no intuito de garantir inovação e acesso a tratamentos novos e aprimorados, desenvolvendo medicamentos como bens públicos, sempre que possível. No intuito de fomentar o debate sobre a transparência, a DNDi tem elaborado publicações informando o custo de P&D dos medicamentos que trabalha. Incluindo a taxa de falha da pesquisa (atrito), a DNDi estima, baseado nos desenvolvimentos que liderou nos últimos 15 anos, que pode desenvolver e registrar novas combinações ou formulações de medicamentos já existentes por €4-32 milhões e uma entidade química inteiramente nova (novo medicamento) por €60-190 milhões[4].Destaca-se o exemplo do Fexinidazole, primeira nova entidade química da DNDi, que foi revolucionária por qualificar-se como o primeiro tratamento oral (dez dias de comprimidos vs tratamento anterior que exigia hospitalização, tratamento intravenoso e punção lombar para o diagnóstico) para a cura da Doença do Sono cujo custo de desenvolvimento foi estimado no valor de €55 milhões de euros. Ademais, a publicação dos resultados dos seus ensaios clínicos é um elemento-chave da política da DNDi, pois é essencial para avançar no conhecimento e na tecnologia, uma vez que o progresso científico é baseado na divulgação dos resultados da pesquisa e aprendizado cumulativo. A necessidade de maior transparência dos custos de P&D foi incluída progressivamente na agenda internacional por meio de importantes relatórios e resoluções da OMS[5], da OPAS[6] e da ONU. No entanto, somente em 2019 os Estados-Membros da OMS aprovaram uma Resolução[7] com compromissos voluntários para maior transparência dos custos de P&D. A resolução

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também aportou avanços ao recomendar maior transparência dos preços dos medicamentos adquiridos pelos Ministérios da Saúde, muitas vezes cobertos por acordos de confidencialidade. Um aspecto importante de ressaltar é que tal proposta de resolução sobre transparência foi feita por um país desenvolvido (Itália), igualmente afetado pelo crescente alto custo dos medicamentos. Ademais, a proposta de resolução[8], posteriormente modificada pela Assembléia Mundial de Saúde com vistas a obter consenso, era significativamente vanguardista ao exigir que as indústrias farmacêuticas que solicitassem o registro de medicamentos tivessem a obrigação de submeter informações relacionadas aos custos de P&D, incluindo custos dos ensaios clínicos, marketing, lucros das vendas e subsídios públicos recebidos para o desenvolvimento do produto. Embora a proposta original da Itália não tenha prosperado, ela serviu como um importante marco para organizações da sociedade civil advogarem pela adoção de medidas semelhantes nas legislações nacionais dos seus respectivos países, assim como para desenvolverem “checklists”[9] para que se possa verificar se os países ou organizações são suficientemente transparentes. Houve, desde então, importantes avanços, dentre os quais, destaca-se a Declaração dos Ministros[10] da Saúde de Malta, Chipre, França, Itália, Grécia, Portugal e Espanha, em julho de 2019, que manifestaram preocupação com as disparidades dos preços de medicamentos apresentados pela indústria farmacêutica, afirmando tratar-se de um desafio compartilhado. Destacaram também a importância de realizarem negociações conjuntas e transparentes para a aquisição de medicamentos. Um dos encaminhamentos da referida declaração, baseada na Resolução de Transparência da OMS, foi de encaminhar essa proposta para o Parlamento Europeu. Por fim, há muito a avançar nessa agenda. Com os recentes desdobramentos internacionais sobre o tema e a consolidação da evidência das disparidades dos custos de P&D hoje disponíveis, aliados ao crescimento exponencial dos preços dos novos tratamentos, torna-se ainda mais necessária a adoção de políticas mais transparentes na área farmacêutica. A DNDi traz uma singela contribuição ao debate ao gerar evidência e tornar transparente os seus custos de P&D. Na América Latina, há amplo espaço para a implementação desta política, pois a região é severamente impactada com as assimetrias de preços de medicamentos. Nesta área, o Brasil encontra-se particularmente bem posicionado para ser uma liderança na implementação de maior transparência dos custos de P&D, tendo em vista ser um dos maiores adquirentes de medicamentos do mundo pelo SUS, por ter apoiado a Resolução de Transparência da OMS e por já possuir uma Câmara Técnica que regula o preço de medicamentos (CMED). Tal medida pode ocasionar importante economia de recursos para o orçamento da saúde e, consequentemente, também viabilizar que tal economia seja utilizada para ampliar a aprimorar o acesso a medicamentos no país. Autor: Francisco Viegas Neves da Silva – Advogado. Mestre em Direito pela UFSC e Consultor de Policy Advocacy da DNDi – Iniciativa Medicamentos para Doenças Negligenciadas

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Referências: 1. OPAS. Estratégia de Acesso e Uso Racional dos Medicamentos e outras Tecnologias em Saúde Estratégicos e de Alto Custo. 2016. 55º Conselho Diretor. Washington, 26 a 30 de setembro de 2016. Acesso em: https://www.paho.org/hq/dmdocuments/2016/CD55-10-p.pdf 2. ONU. Painel de Alto Nível do Secretário- Geral das Nações Unidas sobre Acesso a Medicamentos pede por um novo acordo para eliminar a lacuna de acesso e inovação em saúde (2016). Disponível em: https://static1.squarespace.com/static/562094dee4b0d00c1a3ef761/t/596fed6d914e6b24d15ece 26/1500507506991/50923+-+HLP+Report+-+ENGLISH+-+web_v3.pdf Acesso em: 01 mar 2020. 3. OMS. Technical report: pricing of cancer medicines and its impacts: a comprehensive technical report for the World Health Assembly Resolution 70.12: operative paragraph 2.9 on pricing approaches and their impacts on availability and affordability of medicines for the prevention and treatment of cancer, 2018 World Health Organization. Disponível em: https://apps.who.int/iris/handle/10665/277190 Acesso em 01 mar 2020. 4. DNDi. 15 years of Needs-Driven Innovation for Access: Key lessons, challenges, and opportunities for the future. 2019. Disponível em: https://www.dndi.org/wpcontent/uploads/2019/10/DNDi_ModelPaper_2019.pdf Acesso em 01 mar 2020. 5. OMS. Research and development to meet health needs in developing countries: strengthening global financing and coordination: report of the consultative expert working group on research and development: financing and coordination, 2012. Disponível em:https://apps.who.int/iris/bitstream/handle/10665/254706/9789241503457eng.pdf?sequence=1 Acesso em: 01 mar 2020. 6. OPAS. Resolução CD55.R12. 2016. Disponível em: http://www.paho.org/hq/index.php?option=com_docman&task=doc_download&gid=36468&Itemid=270&lang=pt . Acesso em: 01 mar 2020. 7. OMS. Resolução WHA 72.8. Improving the transparency of markets for medicines, vaccines, and other health products, 2019. Disponível em: http://apps.who.int/gb/ebwha/pdf_files/WHA72/A72_R8-en.pdf Acesso em: 01 mar 2020. 8. KEI. Italy’s Draft WHO resolution: Improving the transparency of markets for drugs, vaccines and other health-related technologies. Disponível em: https://www.keionline.org/29721 Publicado em: 16 fev 2019. Acesso em: 01 mar 2020. 9. Observatorie de la transparence dans les politiques du médicament. Launch of the transparency check list. Disponível em: https://blogs.mediapart.fr/edition/transparence-dans-les-politiques-dumedicament/article/010919/launch-transparency-check-list Publicado em: 02 set 2019. Acesso em: 01 mar 2020. 10. DOI Malta. Press release by the Office of the Deputy Prime Minister and the Ministry for Health (PR191563), 2019. Disponível em: https://www.gov.mt/en/Government/DOI/Press%20Releases/Pages/2019/July/12/pr191563.aspx Acesso em: 01 mar 2020. 11. Fonte da imagem 1: https://www.slingshothealth.com/blog/2019/03/18/why-big-pharma-keepsraising-drug-prices/ Acesso em: 01 mar 2020. 12. Fonte da imagem 2: https://www.ft.com/content/935e6ebe-29a1-11e7-9ec8-168383da43b7 Acesso em: 01 mar 2020.

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SEM CMED A VIDA PODERIA SER PIOR - UMA COMPARAÇÃO DA REGULAÇÃO DE PREÇOS DE MEDICAMENTOS ENTRE BRASIL, ARGENTINA E COLÔMBIA Se depois de ler este Boletim você está achando que a precificação de medicamentos no Brasil está ruim com a CMED, saiba que poderia ser bem pior sem ela. Casos de países próximos, na América do Sul mesmo, já servem para demonstrar que a ausência de uma agência ou comissão reguladora de preços acarreta em diminuição no acesso a medicamentos. Em colaboração com a UAEM Colômbia e a UAEM Argentina, levantamos informações sobre como é o controle de preços nesses países, isso quando ele existe... O resultado pode te surpreender, te fazer gostar da CMED e inclusive te dar vontade de defendê-la com a gente. Na Colômbia existe a “Comisión Nacional De Regulación De Precios De Medicamentos Y Dispositivos Médicos”, responsável pela regulação no país. Foi criada em 1993, pela Lei número 100. Essa comissão surgiu ao mesmo tempo que o Instituto Nacional de Medicamentos e Alimentos, também descrito na mesma lei. Atualmente, a circular 03/2013 estabelece a metodologia de controle de preços de medicamentos a partir de referências internacionais, como demonstrado no infográfico abaixo, produzido pelo “Ministerio de Salud” da Colômbia.

Em resumo, os métodos de precificação de medicamento em vigor na Colômbia atualmente são: •

Regra Geral: Regime De Liberdade Vigiada. A determinação do preço ocorre de forma livre, ou seja, pela indústria farmacêutica, a menos que o medicamento conste no regime de liberdade regulamentada ou de controle direto. É responsabilidade da empresa fornecer informações verdadeiras e completas sobre sua comercialização. Desde que um determinado medicamento tenha substitutos (genéricos, por exemplo), a empresa pode cobrar o quanto quiser por ele. Porém há exceções... Exceção 1: Regime De Liberdade Regulamentada. Ocorre a fixação de um teto com metodologia de preço de referência internacional. Fazem parte deste método os medicamentos necessários para proteger a saúde pública - os ditos "essenciais" (uma

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lista padronizada no país, assim como no Brasil, onde temos a Rename), com alto índice de concentração de mercado e/ou que não possuem produtos substitutos. Exceção 2: Regime De Controle Direto. Define um limite máximo de preço de um determinado medicamento. Esse método pode ser utilizado, por exemplo, na forma de sanção (1 a 3 anos) para os produtores que não cumprem o dever de relatar informações verdadeiras e completas.

Agora você pode estar pensando que o caso da Colômbia não é de todo ruim, já que parte dos medicamentos acaba tendo seus preços regulados. O problema central, nesse caso, é que não se sabe muito bem como as regras são aplicadas. Apesar de existirem decretos editados acerca do tema, a falta de transparência está em como o Estado julga quais medicamentos são considerados para as exceções. • •

De acordo com nossos parceiros da UAEM Colômbia, as principais dificuldades que eles enxergam em relação à precificação de medicamentos são: Implementação às cegas: não existem estudos ou análises econométricas (como a Data Envelope Analysis) que permitam determinar com rigor o impacto dessas medidas (Caviedes & Lombana, 2016). A política de medicamentos deve ser abrangente: não há esforços significativos para implementar as políticas de uso racional de medicamentos, e não é comum o incentivo à prescrição e uso de genéricos. As doenças pesquisadas são majoritariamente as ditas “de primeiro mundo”: Apenas 3% dos ingredientes farmacêuticos ativos desenvolvidos entre 1975 e 2004 são destinados a doenças negligenciadas (OMS, 2013). Ausência de transparência na aplicação das regras descritas anteriormente.

Já no caso dos nossos “hermanos” argentinos, atualmente, o preço dos medicamentos está completamente isento de qualquer tipo de regulação por parte do Estado. Embora seja considerada um serviço público, não existe uma entidade estatal que controle esse aspecto, que não segue a taxa de inflação anual ou mensal. Até 2015, a “Secretaría de Comercio interior de la Nación” era a responsável pelo controle e monitoramento de preços. Essa, é uma secretaria do “Ministerio de Producción y Trabajo del Poder Ejecutivo Nacional”, originalmente criado no governo de Juan Domingo Perón em 1949 e que sofreu sucessivas mutações até sua denominação atual. A secretaria é responsável por projetar e executar planos relacionados à promoção da produção industrial do país e do comércio exterior. Até o referido ano, cada empresa tinha que apresentar sua lista de preços à secretaria, e o/a secretário/a tinha o poder de aprovar ou rejeitar as propostas. Atualmente, sua função consiste em “fortalecer os direitos dos consumidores e a segurança dos produtos vendidos. É a autoridade de aplicação da Lei de Defesa do Consumidor e Lealdade Comercial. Implementa políticas que promovem a transparência e a concorrência no mercado, simplificam o comércio e fornecem aos consumidores acesso a informações sobre bens e serviços”, conforme descrito em seu website oficial.

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No momento, as empresas farmacêuticas são as responsáveis por definirem o preço de venda ao público, os distribuidores por sua distribuição e as farmácias pela venda. Nessa cadeia, o preço de venda (inicialmente determinado pelos laboratórios) já inclui as porcentagens de lucro de cada ator. A Argentina está enfrentando uma inflação anual de cerca de 50%. Segundo um estudo do Observatório de Políticas Públicas da Universidade Nacional de Avellaneda (UNDAV), os medicamentos aumentaram em mais de 300% de 2015 a 2019. Ou seja, a ausência de regulamentação, por parte do Estado, deixou as condições liberadas para as empresas farmacêuticas operarem aumentos, que não são condizentes com as taxas de inflação, muito menos com os aumentos salariais, culminando em uma maior dificuldade de acesso a medicamentos, em comparação com anos anteriores. Como em muitos países, existe por lá a aplicação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA), sobre quase todos os produtos comercializados. No campo dos medicamentos, todos os produtos pagam IVA na saída do laboratório, representando 21% do seu preço de varejo. Não há diferença de preço entre regiões, apenas um preço de varejo sugerido para todas as farmácias do país, através do manual farmacêutico e do “vademecum Kairos”, independentemente do custo de vida em cada província. Em 11 de dezembro de 2019 tomou posse o atual presidente da Argentina, Alberto Ángel Fernández. Apenas cinco dias depois, o mesmo assinou um decreto congelando o preço dos medicamentos até o dia 15 de fevereiro de 2020. Ainda não se sabe quais novas políticas relacionadas a precificação serão tomadas, mas o governo atual já sinalizou que pretende reduzir os preços. Cenas para os próximos capítulos... Para melhorar a situação dos preços de medicamentos na Argentina, os membros da UAEM sugerem a criação de uma agência reguladora com a intervenção da Secretaria de Saúde, similar à CMED do Brasil, que controle e fiscalize a precificação, bem como a venda ao público. Outra função dessa agência pode ser a identificação dos custos de produção e rastreio do montante de verbas públicas empregadas em pesquisas de desenvolvimento e produção. Sugerem ainda a eliminação do IVA sobre medicamentos essenciais e medicamentos para doenças crônicas e uma intervenção de laboratórios públicos na produção de medicamentos essenciais em escala sustentável, permitindo o suprimento nacional. E então, que me diz? Depois desse panorama sobre a regulação de preços de medicamentos nos nossos vizinhos, especialmente no caso da Argentina, com os 300% de aumento, será que a CMED te parece ruim? Para nós, da UAEM Brasil, a CMED pode não ser perfeita (longe disso), mas tem muitos lados positivos e deve ser fortalecida. Nosso papel, enquanto membros da UAEM, e enquanto cidadãos brasileiros, é lutar pela ampliação e transparência das ações da câmara, e apoiar nossos hermanos em suas lutas, para juntos construirmos uma região com melhores condições de acesso aos medicamentos essenciais para a

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saúde da população. Vem com a gente nessa luta, sempre a favor do SUS, da saúde pública e do povo! Autores: Magno Maciel-Magalhães, farmacêutico, mestre em vigilância sanitária e líder do capítulo Rio de Janeiro da UAEM Brasil; Andrés Tabio, advogado e Jhonathan Venegas, farmacêutico, membros da UAEM Colômbia; Ivan Noal, estudante de direito e membro da UAEM Argentina. Referências: 1. CAVIEDES, Carolina & DIAZ LOMBANA, Felipe. (2016) Análisis de la eficiencia de la regulación de los precios de los medicamentos en Colombia entre 2008 y 2014. Bogotá D.C. Universidad Santo Tomás. 2. ORGANIZACIÓN PANAMERICANA PARA LA SALUD (2010) Guía para la implementación de estrategias de medicamentos genéricos en los países de américa latina y el caribe como mecanismo para mejorar el acceso a medicamentos. 3. http://www.paho.org/hq/documents/events/ciess08/Marco_Regulacion_Precios_MedicamentosArgentina-Catalina_Puente.pps - Acesso em fevereiro de 2020. 4. Mercado de medicamentos y regulación de precios en la Argentina Carlos Vassallo - Acesso em fevereiro de 2020. 5. Propuesta para una política de medicamentos en Argentina centrada en el acceso - Acesso em fevereiro de 2020. 6. Secretaría de Comercio - Acesso em fevereiro de 2020. 7. Informe económico de la UNDAV: los medicamentos aumentaron un 360% en menos de 4 años - Acesso em fevereiro de 2020. 8. http://undav.edu.ar/general/recursos/adjuntos/15881.pdf - Acesso em fevereiro de 2020. 9. Kairos Web Argentina - Buscador de precios de Medicamentos y Drogas - Acesso em fevereiro de 2020. 10. Medicamentos, precios y acceso - Acesso em fevereiro de 2020. 11. La millonaria (y descontrolada) industria de los remedios - Acesso em fevereiro de 2020. 12. Marco Lavagna está satisfecho pero es cauto con los datos de la inflación de enero - Acesso em fevereiro de 2020. 13. Tras dos meses de congelamiento, vuelven los aumentos de los medicamentos - Acesso em fevereiro de 2020. 14. Vuelven a aumentar los remedios ya los laboratorios el Gobierno solo les pide “moderación” Acesso em fevereiro de 2020. 15. Fonte da imagem 1: Ministerio de salud de Colombia – Como opera la regulación de precios de medicamentos en la cadena de distribuición. 16. Fonte da imagem 2: Walter Brito, advogado, membro da UAEM Rio de Janeiro.

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RECAPITULANDO: COMO FORAM AS AÇÕES POR TRANSPARÊNCIA E MAIS DA UAEM BRASIL EM 2019 O ano de 2019 foi muito especial para a UAEM Brasil. Realizamos diversas atividades e todos os capítulos se empenharam em ações com a finalidade de promover nossas campanhas na luta pela saúde pública, em uma clara defesa de que ‘‘Saúde não é mercadoria’’. As atividades deram início no mês de janeiro, quando membros da UAEM estiveram presentes no Centro de Pesquisa em Direito Sanitário da USP (CEPEDISA/USP) para conversar sobre a organização e as possibilidades de parceria na defesa do SUS e do acesso universal a medicamentos. Em fevereiro, aconteceu a Reunião de Lideranças da América do Norte, que reuniu as Diretoras Executivas da UAEM Brasil, Europa e América do Norte. Foi um final de semana estratégico para planejamentos e troca de experiências. Em Pouso Alegre, também aconteceu uma reunião da UAEM com os membros do Centro Acadêmico de Medicina da Univás, para apresentação da organização e planejamento da retomada das atividades no capítulo daquela cidade. Em março, o Rio de Janeiro foi palco da Reunião Anual da UAEM Brasil, com o tema Direito e inovação: Acesso a medicamentos no contexto político atual. Na primeira mesa de discussão, foi abordado o tema "Direito à saúde e barreiras de acesso: SUS em tempos conservadores". Contamos com a participação de Eloan Pinheiro, uma das maiores apoiadoras da UAEM, consultora internacional em políticas públicas de saúde, produção e tecnologia farmacêutica, Jorge Bermudez e Vera Lúcia, pesquisadores do Núcleo de Assistência Farmacêutica da ENSP/FIOCRUZ. Na segunda mesa, Vitória Ramos (analista em assuntos humanitários do programa Médico Sem Fronteiras Brasil), Carolina Batista (consultora em saúde global) e Andrea Marchiol (gerente do projeto de acesso em Chagas DNDI) estiverem conosco debatendo as falhas do sistema de inovação biomédico em atender às necessidades em saúde das populações. Artur Custódio (coordenador nacional do MORHAN - Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase) e Alessandra Ninis, assessora técnica do Observatório de Territórios Saudáveis e Sustentáveis da Bocaina (FIOCRUZ), também deixaram sua contribuição com o tema Desigualdade social e determinantes sociais em saúde: Desafios na política atual. A reunião contou com a presença dos membros dos capítulos e convidados, marcando um momento muito especial no calendário UAEM Brasil. Foi a primeira vez que tivemos um encontro de representantes de todos os países em que a UAEM estava inserida na América Latina: Brasil, Colômbia e Argentina.

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Em abril, a UAEM esteve presente na Conferência Livre "Saúde e Educação", em Belo Horizonte, de onde tirou uma delegada para a Conferência Estadual de Saúde de Minas Gerais. A Diretora Executiva da UAEM também conversou com estudantes de Biomedicina e Farmácia sobre "Barreiras de acesso a tecnologias em saúde" na VI Jornada Farmacêutica e III Jornada Biomédica da Faculdade Santa Rita (FASAR), em Conselheiro Lafaiete/MG. No mesmo mês, a UAEM Brasil organizou o seminário "DIREITO E INOVAÇÃO: O DESAFIO DO ACESSO A MEDICAMENTOS NO BRASIL"na Faculdade de Direito da USP, buscando levar o debate e o conhecimento sobre a organização àquela universidade. Entre os dias 26 a 28 de abril, duas estudantes da UAEM Brasil participaram, na cidade de Hamburgo/Alemanha, da Conferência da UAEM Europa. O tema central foi "pesquisas públicas para as necessidades públicas: o papel das universidades". Durante os três dias houve diversos workshops que discutiram qual deveria ser o papel dos estudantes no ativismo acadêmico, quais são as principais necessidades em saúde, como elas se relacionam com a pesquisa em saúde e de quem é a responsabilidade de decidir sobre isso. Em maio, a UAEM marcou presença na Marcha pela ciência em defesa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e dos recursos destinados à pesquisa no Estado. No dia 15 de maio, UAEM marcou presença, em diferentes cidades, na paralisação nacional em defesa dos investimentos na pesquisa pública brasileira. Aconteceu também o GLAM 2019 - o Encontro Anual de Lideranças da UAEM Global. O GLAM é o momento em que o Conselho Global de Governança da UAEM discute e toma decisões sobre a estratégia de fortalecimento da organização no mundo. Este ano, ele aconteceu em Berlim, na Alemanha. Duas pessoas representaram a UAEM Brasil: Luciana (Diretoria Executiva da UAEM Brasil) e Beatriz Kaippert (Comitê de Coordenação da UAEM Brasil e representante da UAEM Brasil no ComEx, o Conselho Executivo do Conselho Global de Governança da UAEM). Entre os dias 3 e 5 de junho, Rafael, o líder do projeto de enfrentamento à resistência a antimicrobianos (AMR) da UAEM, participou de um encontro em Genebra para discutir estratégias de enfrentamento ao problema. A reunião foi organizada a partir de uma parceria entre o South Centre, a REACT (Action on Antimicrobial Resistance) e a Third World Network. Estiveram presentes diversos representantes de organizações da sociedade civil e pesquisadores internacionais.Os principais objetivos da reunião foram discutir a implementação dos planos de enfrentamento ao problema nos diferentes países, debater as recomendações feitas pela Secretaria Geral da ONU sobre o tema e pensar novas estratégias para o enfrentamento à AMR. Ainda em junho, a UAEM esteve presente na Faculdade de Farmácia da UFMG, na disciplina de Farmacoeconomia, para discutir o preço como uma das barreiras de acesso a medicamentos. E membros da UAEM de Belo Horizonte participaram da 9ª Conferência Estadual de Saúde de MG.

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Além de participarem como facilitadores dos Grupos de Trabalho, Daniela Pena, que havia saído delegada da Conferência Livre Saúde e Educação, foi selecionada como delegada para a Conferência Nacional de Saúde. Em julho ocorreu o quarto encontro do Fórum Social Brasileiro de Enfrentamento das Doenças Infecciosas e Negligenciadas no MedTrop, na UFMG, em que diversos membros da UAEM estiveram presentes. O projeto "Acesso a antibióticos e a resistência a antimicrobianos" realizou ainda um webinar com o tema "Como salvar nossos antibióticos? A AMR e a ameaça à saúde pública". Em agosto, lançamos a primeira edição do Boletim da UAEM Brasil em 2019. Em diferentes textos, com diferentes focos, abordamos a importância do investimento público em pesquisa. Também em agosto, membros da UAEM participaram da 16ª Conferência Nacional de Saúde, a 8ª + 8, e somaram forças aos atos em defesa do SUS. Importante destacar a aprovação de uma moção proposta pelo GTPI, do qual a UAEM faz parte, demandando o licenciamento compulsório de importantes medicamentos para o SUS. Na UFMG, foi realizada uma roda de conversa na faculdade de Farmácia com o tema “Investir em pesquisa pública é desenvolver o Brasil”, em que diversos alunos, de diferentes cursos, participaram como Atividade Complementar da UFMG. Tivemos também a oportunidade fantástica de estar no XXXVIII Simpósio Acadêmico de Estudos Farmacêuticos da UFMG. Esse é um evento acadêmico que é realizado por estudantes desde 1971. Na oficina "Saúde como mercadoria", conversamos sobre o quanto essa percepção de saúde está enraizada em nosso sistema de inovação biomédico, em nossos serviços de saúde, em nossas demandas por medicamentos, em nossa sociedade. Em setembro, a coordenadora de projeto Mariana Bicalho participou da 18ª Reunião Extraordinária da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A Audiência Pública teve como finalidade debater os impactos causados nas universidades e nos institutos federais pela implementação do programa Future-se, anunciado pelo Ministério da Educação.Tivemos a honra de participar de um evento organizado por discentes de Farmácia: a VII Jornada Farmacêutica da UFVJM, em Diamantina, Minas Gerais. Na palestra de abertura, intitulada "O papel do farmacêutico no sistema setorial de inovação brasileiro", nossa Diretora Executiva, Luciana Lopes, falou sobre a importância de analisarmos o sistema de inovação biomédico a partir do olhar de um profissional do cuidado.

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Em outubro, participamos, a convite dos companheiros do Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual (GTPI), de um treinamento internacional sobre oposição a patentes. Nossa diretora Executiva, Luciana, teve a oportunidade de apresentar o seminário "Medicamento: bem social ou produto?" para os alunos da especialização em Direito Sanitário da Escola de Saúde Pública de MG e público externo. No dia 04 de outubro, no Rio de Janeiro, participamos de um seminário para discutir os desafios do acesso a medicamentos no Brasil. Membros da UAEM Rio de Janeiro conversaram com os participantes sobre o nosso trabalho em defesa da pesquisa pública no Brasil e sua relação com o acesso da população a medicamentos essenciais - incluindo os impactos em doenças negligenciadas e também AMR. Também tivemos a Conferência da UAEM América do Norte 2019, na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), Estados Unidos, com participação de duas pessoas do Brasil e outras da Colômbia. Em novembro, UAEM esteve presente na semana de Farmácia da UFRJ falando sobre temas muito importantes da nossa atualidade: a resistência a antimicrobianos e transparência em preços de medicamentos. Realizamos, também, a Semana de Acesso a Medicamentos 2019, com uma campanha sobre a transparência de preços medicamentos em nossas redes sociais e nos nossos capítulos. Entre os dias 2 e 9 de Novembro, na Cidade do Cabo - África do Sul, Luciana participou do curso "A luta pela saúde e pelo acesso a medicamentos", organizado pela Universidade Internacional pela Saúde dos Povos (IPHU), um projeto do Movimento pela Saúde dos Povos (People's Health Movement - PHM). O capítulo da UAEM em Fortaleza realizou, na Universidade Federal do Ceará, uma ação voltada para a conscientização sobre a falta de transparência dos preços e gastos dos medicamentos. Nayla Rochele, líder do capítulo da UAEM na Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, participou do programa "Café com Democracia", da rádio Atitude Popular. Ainda em novembro, Daniela Pena, líder do capítulo de Belo Horizonte, participou de uma mesa sobre defesa do SUS no 3º Congresso Vertentes da Psicologia, em São João Del Rei, Minas Gerais. Em dezembro, realizamos nossa primeira Reunião de Lideranças! Foi um final de semana estratégico com os jovens líderes da UAEM Brasil, quando se discutiram importantes assuntos para fortalecimento de lideranças e movimentos sociais. Para fechar o ano, realizamos nossa campanha de financiamento coletivo.

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Esse foi o resumo de um ano cheio de conquistas e desafios, em que a UAEM Brasil permaneceu unida e forte para lutar por ideais e direitos da nossa população. Ao ano que se inicia, levaremos muitas experiências que foram adquiridas em 2019. E seguimos na luta. Vem com a gente? Autoras: Brenna de Oliveira Gadelha, Marianne Santos Florêncio e Gabrielle Karen Almeida Rocha, integrantes do capítulo de Fortaleza da UAEM.

“DIZ QUE É VERDADE, QUE TEM SAUDADES...” É com muito orgulho que apresentamos nossa entrevistada da vez nesta tradicional seção para matar a saudade de pessoas que passaram pela UAEM: Priscilla Maria Dias Guimarães César, a primeira coordenadora da UAEM no Brasil. Contatos: priscilla.cesar@mail.mcgill.ca / primdgc@gmail.com Conte-nos sua história na UAEM, por favor. Meu nome é Priscilla César e fui a primeira coordenadora nacional (diretora executiva) da UAEM Brasil (2010-2012). Sou bacharel em Direito e mestre em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) e atualmente estou concluindo meu doutorado na Faculdade de Direito da Universidade McGill em Montreal, Canadá. Propriedade intelectual (PI), inovação, saúde global, acesso a medicamentos, direitos humanos, direito ao desenvolvimento e teoria de sistemas são as áreas pelas quais me apaixonei e que guiaram minha experiência profissional e acadêmica. Também foram essas áreas que me levaram a descobrir e participar da UAEM. Conheci o trabalho da UAEM em 2009 em uma Conferência sobre acesso a medicamentos na Universidade de Toronto. Estava no Canadá como pesquisadora visitante na Universidade McGill e escrevendo meu mestrado. Durante a Conferência, ao ouvir sobre o trabalho e história da UAEM, a dedicação dos estudantes e, após, ao conversar com a Rachel Kiddell-Monroe, tive certeza que gostaria de participar da UAEM e iniciar discussões semelhantes no Brasil. Sabíamos que a UAEM deveria

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ser repensada e adaptada à realidade e necessidades brasileiras para se tornar um projeto autêntico e respeitado. O que aconteceu ao longo dos anos por meio da dedicação de estudantes (no Brasil e ao redor do mundo), diretores executivos, instituições parceiras e apoiadores! Quando retornei ao Brasil em julho de 2009, continuei em contato com a UAEM Internacional e procurei alguns amigos e colegas no Brasil que trabalhassem e tivessem interesse em discutir o papel da universidade e centros de pesquisa em acesso a medicamentos e tecnologias médicas especialmente desenvolvidas com financiamento público. Monica Guise, Carolina Rosini, Prof. Ana Célia Castro, Ernesto Esteves, e Rachel (além de vários outros apoiadores) foram os companheiros da empreitada para a organização de uma Conferência Internacional (“Direito à Saúde: O Papel da Universidade no Acesso a Medicamentos Essenciais”) na Faculdade de Direito da USP para lançamento do projeto e ideias da UAEM no Brasil em novembro de 2010. Os trabalhos e ampliação da rede de contatos e apoiadores da UAEM Brasil continuaram após a conferência, bem como o contato com UAEM Internacional sobre a importância do Brasil em saúde global e como um ponto focal para a ampliação da UAEM como iniciativa local em outros países em desenvolvimento e de menor desenvolvimento relativo. A UAEM Internacional sempre teve uma preocupação e cuidado ao garantir que a UAEM Brasil tivesse sua autenticidade e autonomia como projeto e instituição local, enquanto mantida colaboração com outros capítulos ao redor do mundo. Era claro o alinhamento sobre a missão e metas da UAEM, mas havia uma flexibilidade e certeza de que a UAEM Brasil e seus estudantes deveriam ser empoderados para que encontrassem sua própria voz e papel na sociedade brasileira. Em 2011, a UAEM Brasil recebeu financiamento pelo período de um ano da Fundação Open Society, o que possibilitou a minha contratação formal como primeira coordenadora nacional. As metas iniciais da UAEM Brasil foram: (i) a ampliação da rede de contatos e apoiadores da UAEM no Brasil; (ii) divulgação do trabalho da UAEM Brasil no Brasil e internacionalmente; (iii) captação e empoderamento de estudantes para a formação de capítulos e projetos em diversas universidades e centros de pesquisa brasileiros; (iv), mapeamento de políticas e práticas em PI em universidades e centros de pesquisa brasileiros e de pesquisas desenvolvidas na área

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biomédica; (vi) monitoramento de possíveis projetos e temas de interesse para a atuação da UAEM Brasil; (vii) captação de recursos, financiamento e planejamento estratégico, e organização para a abertura e formalização da UAEM como uma ONG no Brasil. Foi um momento de intenso aprendizado sobre as dificuldades e possibilidades para o projeto no Brasil. Nesse período, o apoio de várias instituições, dentre elas ONGs (DNDi, MSF, ABIA e Conectas) e militantes que trabalham e lutam pelo direito à saúde, direitos humanos e acesso a medicamentos no Brasil foi essencial para que UAEM ocupasse seu espaço e contribuísse com o debate nacional e internacional. O time da DNDi América Latina foi o principal apoiador dos primeiros passos da UAEM no Brasil como um projeto e após, como ONG. É na figura do Eric Stobbaerts que agradeço toda a generosidade e apoio da sociedade civil brasileira que tem bravamente lutado pelo acesso a medicamentos no Brasil e que acolheu a UAEM nessa família. São essas pessoas e suas histórias que nos inspiram e fortalecem a crença de que um mundo melhor e mais justo é possível. São as posturas, comprometimento ético e história de ativistas, pesquisadores, professores e estudantes que lutam e perseveram por aquilo que acreditam que fazem iniciativas como a UAEM possíveis. Agradeço a todos que inspiram aqueles que iniciam sua caminhada na área de acesso a medicamentos e ativismo na figura de Eloan Pinheiro (que tem sido uma inspiração e apoiadora da UAEM Brasil ao longo dos anos). De 2010 a 2012, fiquei baseada entre São Paulo e Rio de Janeiro e viajando para divulgação, ampliação do projeto e empoderamento de estudantes sob supervisão de Rachel Kiddell-Monroe, a quem agradeço todos os ensinamentos e generosidade. Foram muitos desafios, conversas, reuniões, conferências e aprendizado além de conhecer pessoas incríveis que me inspiraram, ajudaram e ensinaram nessa jornada. Vários são os desafios ao se iniciar um projeto como a UAEM no Brasil que abrange temas tão complexos e multidisciplinares, além do crescimento pessoal e aprendizado que coordenar uma iniciativa como essa envolve. É um trabalho diário que nos mostra a necessidade de comemorar pequenas vitórias e continuar lutando pelo que se acredita. Dentre os desafios para a UAEM Brasil, o envolvimento a longo prazo, treinamento, aprendizado e empoderamento de estudantes, tendo em vista a realidade e cultura brasileira, foram sempre objeto de muita atenção e cuidado. Em 2011, iniciamos um grupo de estudos entre as Faculdades de Direito, Medicina e Saúde Pública da USP para que os estudantes da UAEM Brasil nessas instituições (e em outras com capítulos menores) tivessem o espaço para discutir ideias e pensar projetos abertamente, bem como estudar temas que se relacionam à atuação da UAEM. O apoio do Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário (CEPEDISA) da Faculdade de Saúde Pública (meu agradecimento especial a Profa. Sueli Dallari e Rachelle Balbinot) para as atividades do grupo de estudo e outros projetos foi essencial para a formação e captação de estudantes, bem como de outros professores como Prof. Calixto Salomão Filho. Outro ponto que sempre nos chamou atenção para o trabalho da UAEM no Brasil foi a possibilidade de gerar

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mudanças na base do sistema de PI e inovação biomédica ao influenciar e participar das políticas e práticas em PI de universidades e centros de pesquisa brasileiros. Tais instituições têm a defesa e promoção do interesse público como parte de sua missão. Promover práticas e políticas de PI que considerem acesso a conhecimento e a tecnologias médicas, incentivar pesquisas que têm como objetivo solucionar problemas sociais como doenças negligenciadas e implementar medidas como licenças para fins humanitários são parte da responsabilidade dessas instituições. Durante esses anos, foram iniciadas conversas com algumas Agências de Inovação em universidades públicas a fim de compreender suas políticas e práticas de PI e tentar influenciálas. Contudo, há ainda muito trabalho a ser feito. Em 2012, organizamos em parceira com o CEPEDISA a segunda Conferência Internacional da UAEM Brasil (“Universidades Públicas como Atores para o Desenvolvimento Social e Econômico: Prioridades em Pesquisa, Políticas e Práticas em Propriedade Intelectual, Doenças Negligenciadas e Acesso a Medicamentos”). Essa conferência foi o fechamento de um ciclo para mim, pois havia sido admitida no programa de doutorado na Universidade McGill no Canadá e deixaria o Brasil em setembro do mesmo ano. Um pouco antes da conferência, havia conhecido Koichi Kameda de Carvalho e iniciamos a transição de coordenadores e reavaliação de prioridades e projetos da UAEM Brasil. Koichi se tornou o próximo diretor executivo e liderou seu registro como ONG, além de vários outros projetos. Foi também nessa conferência que conhecemos Sara Helena Pereira e Silva, a qual iniciou um capítulo da UAEM na Faculdade de Direito do Sul de Minas; no futuro Sara se tornaria diretora executiva ao lado de Walter Britto Gaspar. Finalmente, em 2018, tive o prazer de conhecer Luciana, atual diretora executiva, e não tenho palavras para medir as conquistas da UAEM Brasil e dificuldades superadas ao longo dos anos. Sem dúvida é um projeto que carrega um pedaço de cada um de nós, de todos os estudantes e de todos aqueles que nos apoiaram. Desde que me mudei para Montreal tenho acompanhado o trabalho da UAEM Brasil e UAEM Internacional e auxiliei em um projeto da UAEM McGill. Também participei de outras conferências da UAEM (EUA e Canada), nas quais revejo amigos e sou inspirada pelo trabalho dos estudantes. Infelizmente, não me envolvi como gostaria nos trabalhos da UAEM durante esses anos por conta de outros projetos e do doutorado. Todavia, sinto muito orgulho da UAEM Brasil (coordenadores e estudantes) e das conquistas e maturidade institucional obtidas ao longo dos anos. 2020 marca dez anos de UAEM Brasil e a certeza de que quando pessoas apaixonadas e comprometidas lutam por acesso a medicamentos, dificuldades são superadas! Os próximos dez anos serão de muitas conquistas!

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Por que você decidiu trazer esse trabalho para o Brasil? Quando conheci o projeto da UAEM em Toronto (2009) fiquei impressionada pela maturidade da instituição, os temas sob discussão e, especialmente, a forma como a UAEM era organizada e se desenvolveu via ativismo estudantil. Há também a história que resultou na criação da UAEM em 2001 que mostra o poder e responsabilidade de cidadãos (estudantes) para a transformação de sistemas (PI e inovação biomédica) que são falhos sob o ponto de vista de acesso e inovação. Também fiquei instigada pelo fato de que discussões semelhantes não faziam parte da realidade brasileira de maneira forte e coordenada e que uma iniciativa como essa deveria partir de cidadãos brasileiros. Vários pontos relacionados à atuação da UAEM chamaram a minha atenção. Primeiro havia uma ausência de discussão ampla e coordenada sob o papel e responsabilidade das universidades e centros de pesquisa em acesso a medicamentos — de modo geral, acesso a tecnologias médicas e direito à saúde — especialmente quando a pesquisa e as instituições que a realizam são financiadas com recursos públicos. No Brasil, a maior parte da P&D na área médica é realizada em universidades e centros de pesquisa públicos, além da produção e difusão de conhecimento que ocorre nessas instituições. Não se pode esquecer também do componente público e conexão de vários outros sistemas, como o Sistema Único de Saúde (SUS), e do papel e responsabilidade das universidades quando pensamos a realidade brasileira. Todos esses temas são conectados e, para propormos soluções consistentes, sua coordenação é necessária. Segundo, havia a necessidade de incrementar e ampliar a participação da comunidade acadêmica e de pesquisa nessas discussões de modo transparente e responsável via um diálogo multidisciplinar e colaborativo, tendo em vista a missão e valores dessas instituições públicas no Brasil, bem como ampliar a participação de estudantes. Terceiro havia a importância de iniciativas que trabalhem no empoderamento e informação de cidadãos — estudantes, pesquisadores e comunidade acadêmica e de pesquisa — e contribuam com a formação de uma massa crítica sobre questões relacionadas à saúde pública e global, PI, inovação e acesso a medicamentos. A beleza do modelo da UAEM é a possibilidade de contribuirmos para a formação de novos líderes e cidadãos conscientes. Nunca subestime o potencial de um estudante! Finalmente, tendo em vista o poder, política e jogo de influências que permeiam as discussões sobre acesso a medicamentos e ao conhecimento, PI, e direito ao desenvolvimento econômico e social, propor soluções a curto e longo prazo não é uma tarefa simples, ainda mais quando tais soluções envolvem articulação em diversos níveis (internacional, nacional e institucional). O impacto dessas questões é indiscutível em qualquer país e especialmente em países em

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desenvolvimento e de menor desenvolvimento relativo. Reformar os diversos sistemas (saúde, inovação biomédica, industrial, educação e PI) de uma maneira coordenada e que atenda necessidades locais e globais é um desafio. O modo como a UAEM está organizada e atua na base desses sistemas via empoderamento é estratégico para mudanças que sejam sustentáveis e tragam diversidade de soluções. Universidades e centros de pesquisa possuem um grau de autonomia institucional para experimentar novos projetos, influenciar a direção e prioridades de P&D, e garantir acesso aos frutos de sua pesquisa que não é completamente explorado. O papel e potencial dessas instituições precisa ser estrategicamente repensado e direcionado para garantir acesso ao conhecimento, tecnologias médicas e inovação. Quando você iniciou o projeto no Brasil, em algum momento chegou a pensar que ele se tornaria o que é hoje? Quando iniciei os trabalhos da UAEM no Brasil não tinha dúvidas de seu potencial e importância e que se tornaria um projeto sedimentado e respeitado no Brasil e internacionalmente. Na minha opinião, a UAEM Brasil é hoje fruto do trabalho e esforço contínuo e conjunto de diversas pessoas ao longo dos anos. Essa iniciativa é redefinida e repensada constantemente considerando os novos desafios, possibilidades e conquistas - não apenas da UAEM, mas de outras instituições que atuam na área de acesso a medicamentos e saúde global e que coordenam esforços. A beleza e potencial incalculável da UAEM Brasil está, na minha opinião, na ampla possibilidade de atuação tendo em vista sua missão e valores e também nos estudantes que não medem esforços para implementarem os projetos que acreditam. Em 2010 e 2011, quando iniciamos trabalhos no Brasil, conversamos com diversas pessoas (estudantes, professores, pesquisadores, membros da sociedade civil, ativistas e membros do governo) para apresentar a UAEM, sua história, missão e valores e a necessidade de construir uma iniciativa autêntica brasileira. Na mesma oportunidade desenvolvemos e apresentamos um portfólio de projetos da UAEM Brasil para diversos parceiros. A opinião de diversas pessoas foi essencial nesse processo. Ao olhar o portfólio de 2010-11 hoje, vejo áreas que ainda podem ser exploradas como também outras que não haviam sido pensadas ou mencionadas e que hoje têm um papel de destaque na instituição. Hoje a UAEM Brasil tem uma atuação consistente e informada em temas que afetam diretamente o Brasil e conta com o envolvimento de vários estudantes a longo prazo. Isso é resultado do apoio diário por parte de seus diretores e rede a estudantes no processo em que buscam autonomia e conhecimento como membros da UAEM. Na minha opinião, empoderamento é a maior conquista e desafio. Em 2018, quando vi a apresentação da Luciana sobre a UAEM Brasil em Montreal e conversamos sobre os projetos e possibilidades de atuação, não tive dúvida de que continuamos com um olhar novo e no caminho certo! Sinto muito orgulho do que a UAEM Brasil se tornou! No cenário atual e pelo que você tem acompanhado, como enxerga a atuação da UAEM? Acredito que o cenário atual é pautado por extremos, não apenas no Brasil, mas em várias partes do mundo. De um lado há uma onda de conservadorismo, intolerância, descuido com o interesse público, liberdades individuais e populações em situações vulneráveis. De outro vemos discussões e iniciativas que protegem direitos humanos e buscam criar uma sociedade mais igualitária, participativa e transparente. Por exemplo, na área de acadêmica e de pesquisa há um

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crescimento considerável de projetos que visam discutir e implementar novas formas de organização de P&D e ciência aberta. Tais projetos têm mostrado na prática que é possível fazer a diferença. Universidades como centros de discussão de ideias e produção e difusão de conhecimento têm um papel fundamental na defesa de direitos humanos e interesse público, bem como na formação de cidadãos. A atuação da UAEM é indispensável, pois não apenas defende o interesse público ao discutir como P&D é conduzida e para quais fins, como também promove a formação crítica e empoderamento de comunidades acadêmicas e de pesquisas. Ao discutir e implementar diversos projetos, membros da UAEM se tornam agentes de mudança em suas instituições e na sociedade brasileira. Trabalhos como o da UAEM também trazem consequências indiretas, pois mesmo que o projeto seja conduzido por apenas alguns estudantes, sua presença em universidades e centros de pesquisa são uma lembrança constante de problemas que acometem a sociedade brasileira e global e que suas soluções são interesse de todos. Em sua opinião, quais os maiores desafios a serem superados para alcançar a transparência quando falamos de preço de medicamentos? Transparência é, sem dúvida, um dos pontos mais importantes para um diálogo efetivo sobre preço e acesso a medicamentos (e outras tecnologias médicas). Para sua efetivação, coordenação de esforços dos mais diversos atores nacional e internacionalmente é essencial. Sem transparência não há como se discutir preços, pois a informação sobre o desenvolvimento e gastos com tecnologias médicas é incompleta ou não confiável, bem como os termos em que cada ator participou na P&D do medicamento e custos envolvidos. Um dos maiores desafios para alcançar transparência é ultrapassar o jogo de poder e política que permeia o sistema de inovação biomédica, e especialmente o modelo de negócios da indústria farmacêutica. Para limitar esse jogo precisamos de informação atualizada, de qualidade e confiável em domínio público. Há vários anos maiores possibilidades para debate e novas estratégias que impactam a discussão sobre transparência têm surgido como fruto do trabalho constante de várias instituições. O surgimento e sucesso de iniciativas que desenvolveram medicamentos e tratamentos com custos mais baixos como o DNDi e a necessidade de investir, ampliar e compartilhar conhecimento e dividir custos relacionados a P&D que resultaram em iniciativas como o projeto Genoma e o SGC (“Structural Genomics Consortium”), demonstram o reconhecimentos das falhas do sistema de inovação biomédica e PI do ponto de vista de inovação e acesso. Esses exemplos também mostram que outras soluções são possíveis. Também há o debate cada vez mais constante sobre a impossibilidade de custear tratamentos e o impacto disso não apenas em indivíduos e em países em desenvolvimento, mas em sistemas de saúde e países desenvolvidos. Acredito que atingimos um ponto em que as limitações impostas por jogos de poder e política e interesses sofrem a pressão de iniciativas da base do sistema que ganharam força ao longo dos anos e provaram que outras soluções para problemas de acesso e inovação são possíveis. Transparência, coordenação e informação caminham juntas. Na minha opinião, o maior desafio é a coordenação dessas iniciativas e debates e a criação de uma infraestrutura que permita que informação sobre preços de medicamentos, custos de P&D, diferentes modelos para P&D e estratégias de PI para regulá-los estejam em domínio público. Tudo isso resulta em um debate mais participativo e baseado em evidências, que tem o potencial de minimizar poder, política e

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interesses privados em prol de efetiva mudança e promoção de acesso, inovação e interesse público. E em relação a patentes de medicamentos e a influência destas no preço, como você enxerga a relação entre elas? Na sua opinião, como a UAEM pode agir para tentar melhorar a situação? Patentes (e direitos de PI de uma maneira geral) influenciam o preço e acesso a medicamentos. O efeito da introdução de produtos genéricos no preço de medicamentos é uma prova disso, bem como os abusos que a indústria farmacêutica comete ao implementar sua estratégia de PI, por exemplo patentes de segundo uso, trolls de patentes, e práticas anti-competitivas. Direitos de PI podem ser usados como instrumentos para promoção de acesso a conhecimento e inovação, ou para facilitarem abusos. Cabe a nós definir a narrativa em que tais direitos são concedidos e exercidos. Há uma necessidade de incrementar o debate sobre direitos de PI de maneira geral e, especialmente, no ambiente acadêmico e de pesquisa, bem como esclarecer a relação entre esses direitos e o domínio público, sua importância para a criação e difusão de conhecimento e necessidade de avaliação caso a caso para estratégias de PI. Uma patente pode ser vista como fonte de informação para um cientista que desenvolve um novo medicamento e necessita de informações sobre o que já foi desenvolvido e pesquisado, daí a necessidade de o documento da patente ser claro, completo e preciso. Do mesmo modo, há múltiplas estratégias para licenciamento de invenções desenvolvidas por universidades que priorizem competição e acesso. Ao avaliar diferentes práticas e políticas de PI nessas instituições e a diversidade de estratégias de PI que diferentes projetos de P&D podem utilizar, a UAEM pode iniciar um processo de coleta de dados e diálogo informado com os membros de universidades e centros de pesquisa. Esse diálogo é facilitado pelo fato de que os participantes da UAEM também fazem parte dessas instituições. É também preciso promover o debate sobre os custos e benefícios das políticas de PI em universidades e centros de pesquisa públicos e avaliar o potencial de modelos alternativos para P&D e ciência aberta. Todos essas discussões podem ser exploradas pela UAEM. De modo geral, a UAEM pode agir como um centro de difusão e educação sobre direitos de PI para a comunidade acadêmica e de pesquisa ao promover um debate informado sobre esses direitos e vinculá-los ao domínio e interesse públicos, bem como esclarecer os impactos que abusos decorrentes desse sistema podem gerar em acesso e inovação.

Entrevistadora: Mariana Paiva Guimarães e Silva, acadêmica de medicina pela UNIVÁS em Pouso Alegre, onde atua como líder de capítulo pela UAEM-Brasil

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A UAEM Brasil A Universidades Aliadas por Medicamentos Essenciais é uma organização global de estudantes universitários de diversos campos - direito, saúde pública, farmácia, medicina, relações internacionais, etc. - que acredita no acesso universal a medicamentos e em um sistema de pesquisa e inovação em saúde mais justo. São três os nossos pilares de atuação: 1) Acesso às tecnologias em saúde - com ênfase em preços justos que garantam a universalidade; 2) Inovação em saúde - que deve ser guiada pelas necessidades em saúde da população e não pela possibilidade de lucro da indústria; e 3) Empoderamento - para que nossos estudantes, suas universidades e a comunidade em que estão inseridos sejam agentes da mudança. No Brasil, a UAEM é uma organização não governamental legalmente registrada desde 2013. Composta por estudantes de diversos campos, a UAEM Brasil tem atuado na ampla conscientização de estudantes, professores, decisores e da sociedade sobre a crise de acesso a medicamentos, as iniquidades a ela relacionadas e no debate sobre

maneiras de enfrentá-la. Acreditamos que isso passa pela defesa de um Sistema Único de Saúde (SUS) universal, integral e gratuito, voltado às reais necessidades em saúde da população e ao alcance da equidade; pela garantia de financiamento público para a saúde, para a educação e para a pesquisa e o desenvolvimento de tecnologias em saúde; e por arranjos normativos justos que se contraponham à ganância da indústria farmacêutica.

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