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Tribalistas: Um lan\u00E7amento, cinco acertos
As inovações que fizeram do novo álbum do grupo a mais surpreendente entrega do ano no país
por_ Alessandro Soler ■ do_ Rio
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Um salto para o futuro e uma piscadela ao passado. No lançamento tido como o mais inovador do ano por seu formato, “Tribalistas” estabelece uma ponte entre a forma mais imersiva como se consumia música antigamente e a era do streaming e das redes sociais. O segundo álbum do grupo homônimo, formado por Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, foi entregue em agosto, 15 anos depois do primeiro, agregando conteúdos presentes em discos de vinil ou CDs — letras, fichas técnicas, fotografias — a outros como videoclipes e lyric videos (vídeos com as letras), tudo empacotado para consumo em dispositivos móveis. A ideia do chamado hand album, ou álbum de mão, já chamaria a atenção por si, mas ainda se anunciou de maneira espetacular: num vídeo surpresa, estrelado por Carlinhos, Marisa e Arnaldo e transmitido para milhões de pessoas no mundo inteiro pelo Facebook. Além da maior rede social, se sentaram juntos pela primeira vez o maior serviço de streaming — o Spotify —, o maior distribuidor digital de música ibero-americana — a Altafonte — e os artistas e suas equipes.
São pelo menos cinco os acertos que tornam esse lançamento um provável modelo para outros. Nas próximas páginas, seus protagonistas explicam as ideias por trás dele.
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No princípio era o streaming
A aposta é clara: o streaming foi aforma prioritária de distribuição. “2002, quando lançamos o primeiro, foi o último suspiro do álbum físico. Era preciso nos colocarmos no mundo de hoje, que é digital, de maneira sagaz”, afirma Marisa Monte. “Ficou claro que não dava para ter as majors tradicionais à frente, por isso procuramos distribuidores digitais e plataformas de streaming.”
Animada com as possibilidades do formato, mas ciente da necessidade de melhorar os pagamentos aos artistas, Marisa crê que a resposta está na expansão: “A música deixou de ser produto e passou a ser serviço. O digital, em suas diferentes formas, já é 60% do mercado. Só o Spotify tem quatro milhões de assinantes no Brasil e potencial para dez vezes mais. As remunerações vão crescer junto, é inevitável. Mas as leis precisam acompanhar, regular as relações, proteger os criadores.”
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Encontro de titãs
Outra mudança de lógica foi não priorizar os meios de comunicaçãotradicionais e divulgar em redes sociais. “Queríamos um contato direto com o nosso público, sem passar por intermediários e oferecendo o que a gente tem, o nosso dom, a nossa música”, Marisa conceitua.
Era natural ir ao Facebook para apresentar o conteúdo hospedado no Spotify. Como equacionar, porém, o problema de ter tantos gigantes juntos? Quem teria a palavra final?
“Não houve conflito entre Facebook e Spotify. O maestro maior eram os Tribalistas. Tanto o Facebook quanto nós viemos com soluções técnicas e adaptações para atender ao que eles queriam”, descreve Roberta Pate, responsável pelo relacionamento com gravadoras e artistas do Spotify Brasil.
Fábio Silveira, gerente nacional do agregador digital espanhol Altafonte no Brasil, faz coro: “Nada acontecia sem a discussão entre os artistas. O nível de conhecimento deles é tão incrível quanto a vontade de aprender. Às vezes, alguém jogava uma ideia em uma reunião, e começava uma discussão produtiva e repleta de cuidados com os detalhes.”
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Ouça o vídeo, veja a música
O Spotify já vinha testando, em pequena escala, vídeos de artistas em suas playlists (numa indicação de que entrará num segmento que tem a hegemonia absoluta do YouTube e vê a expansão de um faminto Facebook, que, segundo o “The Wall Street Journal”, investirá US$ 1 bilhão em vídeos originais em 2018). Agora, o gigante sueco dos streamings lançou pela primeira vez no Brasil as versões visuais das músicas, tudo reunido na página do álbum na plataforma e na playlist “This is: Tribalistas”. São peças audiovisuais de conceito simples — filmagens com boa luz e boa edição das gravações num estúdio no Rio —, com direção de Dora Jobim.
“Como o Tribalistas é um projeto muito visual, vimos a oportunidade de usar vídeo aqui no Brasil. Conseguimos articular a parte técnica com os engenheiros na Suécia. Já havia vídeos rodando nos EUA, mas algo nesse nível foi inédito”, explica Roberta.
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Tudo junto e misturado
O hand album, o espaço no Facebookque concentra tudo reunido, é uma inovação que tem como base um formato de anúncios já usado por lá, chamado canvas: uma apresentação de tela cheia e interativa, adaptada no caso dos Tribalistas para ter os conteúdos que eles queriam, como se fosse um disco de vinil daqueles antigos, com encartes, letras e tudo mais. “É uma experiência única com foco em mobilidade”, define Christian Rôças, do Creative Shop, o setor de inovação do Facebook. “Quando somamos essas possibilidades com o alcance da nossa plataforma, temos uma poderosa ferramenta para o mercado da música.”
A ideia é estender o novo formato a mais lançamentos, inclusive lá fora, com vídeos verticais, imagens em 360 graus, em 3D... Novas parcerias com o Spotify, é claro, estão no radar.
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E começa o show
Aproveitar-se da fama global para criar um evento global. Com essaideia em mente, era preciso pensar soluções técnicas, como a entrada das músicas no ar em cada país de maneira a não “furar” o Brasil. “Não podíamos correr o risco de o álbum ser lançado, por questões de fuso horário, 12 horas antes no Japão, por exemplo. Montamos uma ação de publicação escalonada a partir da hora daqui”, comenta Fábio Silveira, da Altafonte.
O start foi o vídeo-espetáculo no Facebook, quando seis milhões de pessoas assistiram ao vivo, em 52 países, à apresentação dos quatro primeiros singles, em 9 de agosto. Arnaldo, Carlinhos e Marisa não decepcionaram: cantaram, responderam perguntas, falaram do conceito do álbum... Um show para impactar e extrapolar fronteiras — do país e dos lançamentos tradicionais do mercado.
ARTISTAS-OPERÁRIOS
O envolvimento de Marisa Monte, Carlinhos Brown e Arnaldo Antunes na elaboração do conceito e nas trocas com os players digitais traduz um papel mais proativo e global que muitos artistas há anos vêm desempenhando em seus projetos.
“Quando meu filho tinha 4 ou 5 anos, perguntaram a ele o que eu fazia. Ele mandou: ‘Reunião’”, Marisa ri. “É uma nova lógica, mesmo, um trabalho enorme, o público não tem noção… Estar no palco cantando não é trabalho, é prazer e alegria. A gente trabalha para poder fazer isso. O trabalho é antes.”
Paralelamente à megadivulgação dos Tribalistas, os três mantêm suas agendas. Arnaldo roda o país com o show “A Casa é Sua”, de clima intimista; Carlinhos segue como jurado do programa “The Voice Brasil”, da TV Globo, e tem aparecido em shows como um do Afoxé Filhos de Gandhy, em setembro, em Salvador; e Marisa estende a turnê com Paulinho da Viola, a convite deste. “Seriam, a princípio, três shows. Já foram não sei quantos desde maio. Quero degustar esse momento com prazer e dedicação. Olhar a dois metros de mim, no palco, o Paulinho da Viola, meu amigo há 25 anos, cantando e tocando aquelas músicas maravilhosas não tem preço.”