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Laura Jane Vidal

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Vânia Perciani

Vânia Perciani

UM LUGAR DE SILÊNCIOS...

Era um lugar de silêncios ... assim mesmo, no plural e com reticências. Afinal, eles eram muitos: sentimentos calados, segredos guardados, verdades não ditas. Nenhum deles estava ali para sempre. Segredos um dia se revelam, sentimentos transbordam, verdades vêm à tona. Assim, eles iam ficando ... dias, meses, anos, quem sabe quanto tempo? Por isso, aquele era um lugar transitório, passageiro, semelhante a um porto: silêncios chegavam, outros, partiam. Havia, por ali, silêncios guardados por quase toda uma vida! A mulher, que um dia fora a garotinha assustada e molestada, guardara por tanto tempo lembranças doloridas, que quase chegara a duvidar de si mesma! Ela era tão criança quando tudo acontecera. As lembranças podiam ser fruto de sua imaginação infantil? Quem teria acreditado nela? Por isso, o silêncio. Calou-se por tanto tempo, que quase esqueceu. Foi o que a ajudou a viver! Seu silêncio refugiou-se ali, para que ela pudesse seguir em frente. E ela seguiu. Mas nenhum silêncio dura para sempre! Porque, à semelhança da crisálida, que guarda a promessa de

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liberdade, um dia ele se rompe e, ao se romper, que alívio, quanta leveza! Fora assim com ela. Ela agora se sentia mais leve. Ela estivera lá, quando ele se fora, o pai que nunca soube sê-lo, que nunca o foi! Nos últimos suspiros de vida, que ele arfava ruidosamente, ligado aos aparelhos, a alma entre um mundo e outro, ela verbalizou a dor, o medo, a angústia. Não era um ajuste de contas! Era tão somente a necessidade de extravasar! Ela deslizava entre os dedos as pedras do rosário, murmurando preces por aquela alma que partia, pedindo clemência, misericórdia. Suplicando a Deus que a fizesse digna de perdoar. Porque perdoar também é se libertar. Ao ser verbalizado aquele silêncio, ali recolhido há tantos anos, a crisálida, enfim, se rompeu! O silêncio também se fora, já não havia o que guardar, recolher, calar. Havia tanta vida lá fora, luzes e cores, a alma acalentava imensa vontade de viver, que ela se entregou à vida, quase trêmula, como a borboleta liberta, que voa pela primeira vez.

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