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CURTAS VILA DO CONDE 21ª EDIÇÃO INVENTÁRIO DO ESPÓLIO DO MOSTEIRO DE SANTA CLARA PARTE III

“UM OLHAR SOBRE VILA DO CONDE” POR CASIMIRO TEIXEIRA


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CAPA Fotografia de Diogo Schartt Título O Som do Mar Local Praia do Mestre Junho 2013

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03 EDITORIAL OLHAR SOBRE 05 “UM VILA DO CONDE” Por Casimiro Teixeira DA 13 CRÓNICAS CIDADE E DO MUNDO

05

MUNDO QUE NÓS 23 OPERDEMOS 5

A religiosidade popular em terras do Ave no período pombalino

POR CÁ...” 41 “ACONTECEU Cascatas de São João

23

2013

49 FOTOVILA “Vila do Conde à noite” 53

CURTAS VILA DO CONDE 21ª Edição

41

DO 61 INVENTÁRIO ESPÓLIO DO MOSTEIRO DE SANTA CLARA Parte III

53

71 PERCURSOS Casas Brasonadas do Burgo DO CONDE PELA 91 VILA LENTE DE ... MARCO SANTOS

61


Alexandre Maia Diretor e-vilacondense alexandre.maia@lexart.com.pt

Com a chegada do mês de julho a Vila do Conde, chegam também muitos veraneantes que procuram descanso e paz nas nossas praias, que frequentam os nossos cafés, restaurantes e esplanadas, que descobrem a nossa cidade, os seus monumentos e a sua cultura. É também no mês de julho que a cidade acolhe, como é já habitual, os amantes da curta-metragem visto que se realiza mais uma edição deste festival que já se internacionalizou e colocou Vila do Conde no roteiro dos festivais de cinema. Por esta razão, decidimos, nesta edição, dar destaque ao Curtas Vila do Conde - 21º Festival Internacional de Cinema com um artigo que visa rever o seu historial, desde os

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seus primórdios até aos dias de hoje. Coube, desta vez, a Casimiro Teixeira, escritor vilacondense, partilhar o seu olhar sobre Vila do Conde, dando a conhecer o que o liga a esta cidade e de que forma esta o cativa. Continuamos ainda a conhecer como vivia a população da cidade no período pombalino, desta vez destacando a religiosidade do povo, e somos ainda convidados a apreciar a arte existente no mosteiro de Sta. Clara através da apresentação de algumas peças pertencentes ao mesmo. Não deixamos de refletir sobre o que acontece na cidade e no mundo através das crónicas que, nesta


EDITORIAL

edição, recaem sobre os festejos que decorreram na cidade no mês de junho, na situação da educação no país, e ainda sobre Nelson Mandela, uma figura do mundo. Oferecemos ainda duas propostas para este mês de julho, de férias, para alguns, e quando o calor parece ter chegado: por um lado, sugerimos que faça o percurso das casas brasonadas de Vila do Conde para ficar a conhecer recantos da sua cidade; por outro lado, propomos que percorra a cidade à noite, que

fotografe os locais, monumentos, esconderijos e pormenores desta que o encantam, e que os partilhe connosco participando no concurso de fotografia Fotovila, que neste mês de julho pretende dar a conhecer a beleza, magia e encanto de Vila do Conde à noite. Aproveitamos ainda para recordar o que aconteceu por cá; destacamos as festas a S.João, que decorreram no passado mês de junho, através de uma mostra fotográfica que versa sobre as cascatas espalhadas pela cidade.

Neste mês de julho, de verão, calor e praia, continue a conhecer a sua cidade!


UM OLHAR SOBRE

VILA DO CONDE POR CASIMIRO TEIXEIRA Escritor vilacondense

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Transportamos connosco a infância até ao momento em que morremos. É um romance que nunca nos abandona. Tento ensinar isto ao meu filho, e não se apresenta tão fácil quanto parece. Quero acreditar que o que retive desses tempos terá feito de mim um homem melhor, de sentimentos à flor da pele, e a mais valiosa lição que lhe quero deixar é esta. O meu pequeno tesouro interior. É bem verdade que tomo poucas coisas como certas, pois o progresso arrima-as constantemente, a maior parte delas só medianamente me atinge, outras, destroçam-me em absoluto as lembranças de um menino que, ou não quis crescer, ou não quis que a terra girasse e fizesse mudar quase totalmente o mundo da sua infância. Felizmente que uma delas permaneceu perene e constante na passagem do meu tempo, a sempre contínua paixão por esta vila-cidade; Vila do Conde. Se me dou ao luxo de ter sentimentos contraditórios sobre o que vou vendo,

faço girar os ponteiros do tempo para essa época em que andava à solta pelas ruas e transformo este romance numa história mais aprazível, feliz até. Tal como a própria vida, que não se repete quando termina, também cada novo dia em Vila do Conde pede-me para ser sorvido como se não houvesse outros. Os mais novos, como aliás o meu filho, parecem estar a perder estas memórias e não vão lembrar-se nunca mais de que aqui, já houve um cinema, meio paraíso, meio inferno, onde se podia ver filmes de kung-fu, que faziam abanar o querubim altaneiro sobre a tela gigante, e filmes indianos brutalmente lamechas, mas que punham em água os olhos da minha irmã. Nunca saberão estes meninos, sobre outros meninos, ditos “maus”, de semblantes de uma tristeza medonha, guardados a sete chaves lá em cima, atrás das grades da Correção que se desmorona agora de tanta tristeza, a verem o tempo a correr lento sobre o rio. Ou sobre esse mesmo


© Alexandre Maia

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rio manso, onde milagrosamente até se podia nadar, alheios a todos os medos, salvos de tudo. No momento em que se mergulhava, em que se estendia os braços e nadava-se, voltávamos a ter um caminho só para nós, abrindo-o com as mãos e com os pés. Dentro de água, sentíamos que podíamos falar através de palavras de luz como só as crianças e os poetas podem. Sim. Estes novos vão desconhecer como fomos perseverantes, auto-suficientes, e como Vila do Conde nos ensinou a conquistamos a lucidez da idade adulta. Não sabem que esta cidade, de alguma forma vive por si só, e que sonha por nós. São os ossos do ofício do futuro, suponho. Fazer o passado morrer anónimo para si mesmo, indiferente à memória dos novos e ao quanto ajudou cada um de nós a manter esta paixão viva. Agrada-me a ideia de lembrar o chão da antiga biblioteca, a chiar a cada passo de pintainho que dávamos, de sentir ainda no céu-daboca o sabor pastoso das broinhas de mel do Pinto, uma por dia a caminho da escola. De namorar debaixo da lua, alcantilados no muro alvo da capela do Socorro, depois crescer e casar debaixo do sol salgado, na capela da Senhora da Guia. Não sei, cada dia me parece aquele primeiro, em que atravessei a ponte pela primeira vez, de calças ao boca-de-sino e boca aberta de espanto. O casario descia lá de cima do mosteiro imponente, abria-se ao alto pela avenida fora, e os carros até zuniam nos entalhes das juntas da ponte. Passei de esguelha os


olhos pelo jardim de chão florido do terreiro, a fazer de conta que era o jardim mais bonito do mundo, e era. Fechei a boca para que o meu espanto fosse acudido pela grandeza que as coisas bonitas nos inspiram, e abri muito os olhos para guardar aquele desenho na cabeça para sempre, quando dei por isso, já estava em Vila do Conde. Eu sou aquele que precisou que lhe mostrassem uma evidência. O bocado da minha vida de que mais gosto, e que depois de mostrado, nunca mais esqueci. Fiz amigos, daqueles que me sorriem na memória, fiz escolhas, daquelas que me marcaram o destino, em que pesou eu saber que esta evidência – que este lugar simples é realmente único – é verdadeira. É mais do que justa. Simplesmente é, existe. Porque cada lugar oferece-nos uma pequena janela, desigual de lugar para lugar. Mas, o que vemos realmente no horizonte é o fundo da nossa alma. Um outro lugar mais íntimo, que foi o lugar da nossa infância. E assim, apertados entre este “...pinhal, rio e mar...” não queremos ter fuga de nós próprios. Viajamos para longe, chegamos à outra metade do mundo, abrimos essa janela e afinal, o que encontramos? A paisagem mais familiar de todas, a saudade. Vila do Conde é como um espelho. Faz-nos falta falar e ouvir falar dela, compreender como se mantêm sangue e alma quente e comunicante sob céus estrelados de qualquer outro lugar do mundo, e ainda assim reflectimos a grata saudade que nos faz voltar, sempre.

© J.©Gomes J. Gomes


Começo agora a caminhar por um beco, afinal é mais uma viela, que sobe irregular, empedrada desde a praça luminosa ribeirinha até ao desembocar de uma das ruas mais antigas desta minha vila. Algumas vielas parecem ceder facilmente os seus escaninhos de segredos obscuros à luz de pequenas maravilhas mal adivinhadas. É certamente o caso desta. Devia assumir a estratégia do maratonista no início de uma maratona. Mas não consigo apaziguar o fluxo de emoções quando me perco pelas ruas da minha cidade. Gosto de esquecer as paisagens e relembralas constantemente com novos olhos. Lá em cima, no outro lado do rio, fica um longo passado de vento, suor e serradura, tornado limpo e

mais asseado pelas exigências deste presente moderno. O esplendor galante da nau replicada, lembrança ancorada da grandiloquência do povo que ainda somos. De repente, dou por mim a pensar na indiferença dos pescadores das Caxinas pela sua própria segurança. Muitos nem sabem nadar sequer. E como explicar o desleixo destes pescadores pela própria existência? Muitos nem sabem onde acabam os mares. Desço a escadaria ao lado da Alfândega, atravesso a estrada, sentome num bloco de pedra aberto ao perfil ondulante da nau e penso no que sentem os pescadores lá fora – que transitam entre mares que acabam e mares que começam. De algum modo não consigo evitar a evidente simetria entre passado e presente,

© António Maia

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entre o heroísmo dos marinheiros e destes pescadores, e sem estranhezas, também do grosso caudal de tantos escritores e poetas que por aqui passaram, e dos que ainda aqui estão, eternos. Para mim estão todos interligados, e nunca serão mais uns do que outros, mesmo que no fundo do mar só existam palavras de areia. Penso nisto e tento compreender se o meu filho saberá que foi Vila do Conde quem os lançou aos ventos e os trouxe de volta, alguns, e se estas palavras alguma vez o ajudarão a entender que esta cidade finge nem precisar de guarda-chuva sob nuvens pesadas e iminentes, e que nos atira ao vento sibilante debaixo do sol quente, que merece esplanadas, longos passeios na marginal e tardes de leitura nos seus jardins. Pergunto-me se ele saberá um dia que o seu pai amou um rancho folclórico, um grupo de teatro amador, dois ou três cafés inesquecíveis, algumas festas eternas no salão dos bombeiros, os bolos do bom doce e do santa clara, as sandes de chouriço e as cadeirinhas circulares do S. João, os despiques dos carros de corridas na curva do praia azul, as pagaias dos kayaks do Fluvial a deslizarem pelo rio ave, o mar, o mar, sempre este mar hipnotizante que nunca nos abandona, e os jogos de futebol de rua, as noites calmas da Feira de Artesanato, as torcidas nos jogos do Rio-Ave, o voleibol e os trampolins do Ginásio, e todos os desfiles, todas as marchas, todas as procissões. O festim colorido das flores nas ruas, de quatro em quatro anos. As tardes longas dos dias de verão, daquelas como se vêem nos filmes que não nos largam as recordações, e até daquele nevão 11 e-vilacondense

inusitado que por um dia acabou com todas as aulas nas escolas. Será que ele se irá lembrar de tudo isto? Mesmo que lho repita por mil vezes. - Os amigos verdadeiros e todos os rostos e todas as ruas e todas as praças e todas as casas e todos os cães e folhas de outono. Alguma vez se perderá sem propósito definido por um caminho que o faça querer contar pelos dedos todos os arcos do aqueduto? Sentirá a compulsão de fotografar as portas da rua da Fraga e de pintar a aguarela o forte S. João? De percorrer todas as pontes, entrar em todas as igrejas, atravessar a vau o açude? Pois não sei. Todavia, insisto na lição fundamental de lhe acender agora as memórias de infância que um dia serão suas, convicto da única certeza que nunca me desilude; que existe todo um deslumbre de orgulho de pertencer, de pertencer a uma cidade assim. O resto agora é com ele.


© Alexandre Maia

© ACMVC


CRÓNICAS DA CIDADE E POR HÉLDER GUIMARÃES Mestre em História Contemporânea Investigador do CITCEM

A HORA DE MADIBA Tudo indica que Nelson Mandela enfrenta a derradeira batalha da sua vida. Aquela que, por muito que se batalhe, todos acabam por sair derrotados. Perante a inevitabilidade da morte, nunca é demasiado prestar homenagem aos homens que de entre os homens se distinguem. E Madiba foi daqueles homens que se distinguiu não só por ter derrubado muros da sociedade sul africana, como os muros que se vão erguendo em diversas partes do mundo. Nelson Mandela nasceu a 18 de julho de 1918. Pertencia à nobreza tribal, há muito arredada do poder nas regiões que viriam a constituir a África do Sul, desde o final da Guerra dos Bóers (final do séc. XIX) que opôs os conflitos coloniais da Holanda e da Inglaterra, com benefício para a última. Ao governo colonial inglês, que secundarizava a cultura africâner em prol da educação inglesa, seguiuse um período infame em que uma minoria branca impunha à maioria negra um vergonhoso regime de apartheid. Imagine que em Portugal chegava um punhado de americanos ou de outra nação qualquer e lhe dizia que, por ser português, não podia 13 e-vilacondense

frequentar a mesma escola, o mesmo restaurante, o mesmo autocarro ou o mesmo WC. Pois este regime de completa segregação racial vigorou na África do Sul (se bem que não era um regime exclusivo deste país tendo vigorado, por exemplo, nos E.U.A.) para vergonha da população, sobretudo da negra que se via privada dos seus mais elementares direitos cívicos. Foi por eles que Madiba lutou pacificamente e após vários anos na prisão, foi solto em 1990. Em 1993 foi agraciado com o Nobel da Paz, conjuntamente com Frederik de Klerk, o Presidente branco que pôs fim ao apartheid e foi, posteriormente, seu vice-presidente numa nova África do Sul. Mandela forjou uma nova África do Sul, em que brancos e negros convivem com os mesmos direitos e garantias. Presidente da África do Sul entre 1994 e 1999, retirou-se para viver a sua velhice com uma tranquilidade que não foi caraterística dos seus dias. Aqui reside a sua grandeza. Nesta hora difícil, choram por ele brancos e negros. Quer a sua hora venha com maior ou menor brevidade, Madiba ficará para sempre na História, pelos muros que derrubou e pelas pontes que construiu.


DO MUNDO


CASA ONDE NÃO HÁ PÃO, TODOS RALHAM E NINGUÉM É um ditado popular, e tem muita razão de ser na hora que o país vive. Assenta como uma luva ao facto político nacional do mês de junho: a greve dos professores. Ódio de estimação de Sócrates eis de novo a classe profissional em luta. Mas desta vez foi bastante mais grave, porque afetou a preciosidade da sociedade portuguesa os alunos. Neste caso parece-me mais séria a luta porque o obetivo era o emprego. Passei por esse inferno que é dar aulas. E por isso falarei com alguma propriedade e serenidade. Essa experiência profissional deixou-me um misto de saudade e desprezo. Saudade do trabalho com alguns colegas e alunos e o frenesim da profissão. Desprezo por muitas situações injustas que se criam nestes meios laborais e que só quem é contratado, ano após ano, sabe

do que falo. Não penso que a greve sirva para granjear simpatias. Elas causam transtornos e ponto final. A greve serve também para demonstrar a força de determinada classe profissional. Os médicos fizeram-na e depois chegaram a um acordo laboral. E houve consultas que ficaram por dar. Os exames nacionais não eram uma questão de vida ou de morte. Aliás, lembro-me que quando dava aulas, os alunos pediam-me com frequência para adiar instrumentos de avaliação. E nunca me pareceu que ficassem muito perturbados por isso. Por outro lado, os alunos também fazem greve às aulas. Os últimos motivos invocados era que não queriam aulas de substituição e queriam aulasde Educação Sexual. Exigiam mais umas coisas que eles não sabiam muito bem. Mas como dava jeito faltar às aulas,


TEM RAZÃO… “bora lá p’rá manif”. E isto para mim era um paradoxo porque, vejamos bem, a maioria destes alunos faltava às aulas “como gente grande”. Para quê, portanto, mais aulas? E em segundo lugar eu não entendia como é que pode fazer greve a um direito? As aulas são em favor dos alunos e não contra eles. E isto o faziam com o total beneplácito dos encarregados de educação, que com velado orgulho, assistiam ao desfiar da maturidade dos seus meninos, que já eram grandes e até já faziam greve. Greve a uma situação que os beneficiava, mas faziam greve como os adultos! E isso era o que bastava! Raramente vi um aluno queixar-se porque as turmas são demasiado grandes, ou porque a sala não tem carteiras suficientes para se sentarem. Quatro numa mesa até dá para jogarem “à bisca” na sala. E claro que se tivermos uma turma de cinquenta alunos, cada vez mais serão desnecessários os professores. Nem quem se pendurem alunos no teto na sala para assistirem às aulas. Já que tanta gente fala sobre a Educação, toda a gente devia


ser professor por um dia. Andar de noite, cerca de cem quilómetros, por esses montes e vales do país; aturar uma turma de vinte e muitos alunos. E gostava de ver as secretárias, os vigilantes, os advogados e os demais que gostam de opinar sobre o assunto a passar hora e meia a aturar berros, má educação (que se dá em casa, na escola aprende-se ciência), sem, sequer, poder ir à casa de banho. Porque sejamos francos, eu não me lembro de nenhuma profissão que tenha que atender vinte e muitas pessoas, ou produtos, durante hora e meia. Nem operários fabris, nem secretárias, nem prostitutas o conseguem fazer. Os professores fazem-no, mas com grande desgaste pessoal. Claro que se estivéssemos no tempo da professora do Miguel Sousa Tavares, até podíamos ter um estádio de futebol cheio, porque era tudo corrido à chapada. Mas felizmente não estamos!

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Depois veio o famigerado exame de Português. Quando vigiei exames as regras eram apertadíssimas: os nomes dos alunos tinham que ser registados numa planta, as portas abertas, proibição de se sentar e de ler, de falar, de tossir, de andar de tacões, tudo o que pudesse afetar o decurso do exame. Ainda pensei em dar a este artigo o título de “a importância de se chamar Aarão”, porque se assim se chamasse o aluno teria mais hipóteses de fazer o exame do que se chamasse Zacarias. Ressalvo o comentário justíssimo de uma aluna que dizia a uma estação de televisão que se os professores queriam fazer greve, deviam fazer todos. Que serviço prestaram aos alunos aqueles professores que, não os querendo prejudicar aceitaram, participar neste circo, com alunos a fazer exame em condições ilegais, em ginásios à boa maneira chinesa? Talvez seja um


pronúncio do futuro da escola pública. O editorial da Sábado de 20 de junho de 2013, dizia que com o exame de Português, os professores tinham provado que o Governo está certo, porque bastam 10% dos professores que não fizeram greve para manter o sistema educativo. Mas eu gostava que os alunos que foram prejudicados pedissem a nulidade do exame de 17 de junho, para ver se certos jornalistas continuavam a sustentar estas ideias, que denotam um certo “lambebotismo”. Eu sei que alguns editoriais expressam, na verdade, a vontade de certos grupos económicos que esperam, como abutres, pela implosão do estado social. Mas devem os portugueses estar prevenidos para o facto de que se a Educação for privatizada, deixaremos de pagar mais impostos ao Estado. Mas, tal como na Saúde, o dinheiro continuará a sair, talvez em maiores

torrentes, quando os privados chegarem à gestão das escolas. Por outro lado, olhemos para a Finlândia onde a escola é pública e igual para todos. Escola pública é meritocracia, não se submete a interesses obscuros de ninguém. Uma sociedade instruída é uma sociedade melhor. Destruir a Escola Pública é multiplicar os “Relvas” por esse país. Ou onde pensa que os nossos governantes foram tirar os seus cursos? Há tempos alguém se lembrou de classificar de corporativismo as lutas dos magistrados, professores, médicos, estivadores, etc.. Apesar de existirem corporações desde a Idade Média, “Corporativismo” é uma expressão aplicada ao Salazarismo e prevê a inclusão de sindicatos docilizados para que, submetendo-se à vontade totalitária do Estado, se evite a conflitualidade social. Corporativista é atitude do Governo e de grande parte dos jornalistas que povoam


de incompetência os jornais portugueses. Eu sei que as aulas de História têm poucos tempos letivos, e o professor tem de dar a matéria a correr. Por vezes até é preferível dormir do que prestar atenção ao professor. E é o que se vê: bastou um ignorante utilizar conceitos para que este, erroneamente se generalize. Comentem futebol, que é mais fácil e não se aprende nas aulas. Os sindicatos, depois do folclore, lá conseguiram alguma coisa. Um osso que vai para os mesmos, aqueles que perpetuam os problemas que, sejamos claros, existem há décadas. É com eles que se vai fazer a reforma do Estado na Educação. Tem tudo para ir no caminho certo, isto é, para o abismo em que o país caminha. Mais coisa, menos coisa, nada de novo… Não isentos estão algumas associações de pais. Ouvi, recentemente, um vice-Presidente da CONFAP comentar assuntos da educação com base no comentário de… Marques Mendes, conhecido por

todos pela sua longa experiência em contexto escolar. Isto é completamente ridículo! Como é que um pai, dirigente de uma associação nacional de pais, se mune de argumentos de um político falhado, do que da sua própria experiência com a escola? A Escola, de facto, tornou-se numa árvore de Natal. Mas para aliviar o peso, os primeiros a sair são os professores. Eu não digo que os pais não devem ter ação na escola, mas reafirmo que há muita gente que se pendura na escola para se mostrar a certas esferas do poder. Se fossem direitos, pediam a anulação dos exames realizados em condições irregulares. O Governo, esse, continua na marginalidade da lei. Ponham os olhos no Brasil, esse povo de analfabetos e preguiçosos, que se levantou por uma melhor Educação e Saúde em detrimento do dinheiro que se esbanja nos estádios. Exatamente a mesma atitude que tivemos no Euro 2004!



JUNHO O MÊS DO POVO EM VILA DO CONDE Junho foi para Vila do Conde o mês das festas populares. Primeiro foram os tapetes de flores, em dia de Corpo de Deus, que trouxeram milhares de pessoas e forasteiros. Belíssimas criações do génio dos vilacondenses. Depois veio o S. João, coroado pela vinda da primeira vaga de calor consistente do ano. Tudo esteve muito bem, desde a iluminação às cascatas. Na noite de S. João as marchas luminosas do Monte e da Praça, evidenciaram o trabalho que centenas de pessoas têm na preparação dos carros alegóricos, dos arcos, dos

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ranchos, enfim, de tudo o que faz da noite de S. João aquela noite, fresca, ardente, luminosa e que insufla o coração de qualquer vilacondense de gema de um enorme orgulho de ser vilacondense. Afinal é noite de S. João! E o S. João mais antigo e típico do país tem dois fortes concorrentes na região – Porto e Braga. No dia de S. João realizou-se o que, de facto, é mais típico nas sanjoaninas: a procissão do padroeiro e a ida à praia, verdadeira explosão de alegria, num povo que anda triste e cansado com as agruras desta vida.


© Alexandre Maia

Não deixo, por fim, de recordar que junho foi o mês em que se concluiu uma obra que representava uma antiga aspiração de Vila do Conde e suas freguesias. Trata-se da ponte de Retorta que liga a sede do concelho às freguesias do sudeste, ponte que foi construída com as verbas da Câmara, logo dos impostos de Vila do Conde. Qualquer ponte serve para reforçar laços, aproximar entre duas margens, que de outra forma não poderiam relacionar-se. E esta ponte tem a ampla vantagem de retirar trânsito à ponte sobre o Ave. Quem lá passa tempos

infinitos na fila do trânsito agradece. E em obras como esta vale a pena investir. Pelo menos, pode a Câmara estar endividada até ao “pescoço”, mas outras também estão e fizeram muito menos que Vila do Conde. E, porque superiormente, só vislumbro capacidade de destruir e não de reedificar uma sociedade nova, como seria desejável, aqui fica o desafio: olhem para Vila do Conde. Construam pontes, pontes para o futuro. É o povo que vos elegeu que o exige!


© Hélder Guimarães


O MUNDO QUE NÓS PERDEMOS 5 A religiosidade popular em terras do Ave no período pombalino POR HÉLDER GUIMARÃES Mestre em História Contemporânea Investigador do CITCEM

Pode parecer um estudo menor aquele que me propus fazer para este número do e-vilacondense. No número anterior publiquei um texto referente à religiosidade oficial, isto é, praticado pelo clero nas igrejas e mosteiros. No número de junho, tentarei explicar a religiosidade de cariz mais popular, recorrendo primordialmente às Memórias Paroquiais de 1758, como fonte do meu estudo. A religião é, em grande parte, um dos pilares básicos do mundo que nós perdemos. Nenhum homem poderia ser feliz na vida deste mundo, se não preparasse convenientemente a sua vida além túmulo. Aliás, para que serviria ser bom num mundo tão mau, se não houvesse esperança de se alcançar a felicidade eterna. Com esta certeza jogava o Papa e o alto clero, admoestando os reinos com a interditio e a excomunicatio (excomunhão) que impedia os povos de celebrar correctamente a sua fé. Sabendo que a religião popular expressa as verdadeiras preocupações das populações, convido o leitor para uma viagem ao mundo da devoção popular.

A descida do Espírito Santo sobre os Apóstolos - Tela do Coro Alto da Igreja de Santa Clara

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DA FOME, PESTE E GUERRA LIVRAI-NOS SENHOR! Começamos esta viagem com o estudo das imagens, capelas e confrarias existentes naquele que viria a ser o futuro concelho de Vila do Conde. Comecemos pelos padroeiros das freguesias. A escolha do santo padroeiro, que aparece adstrito à identificação da comunidade (ex. S. Salvador de Árvore), pode ter a ver com a principal atividade económica de uma comunidade (ex. S. Miguel ligado às colheitas, S. Pedro ligado às atividades marítimas), a identificação com o padroeiro, que não era santo, mas apresentava o pároco da freguesia como parece ser exemplo o caso de S. Salvador de Modivas, cujo padroeiro era o Mosteiro de S. Salvador de Vairão, ou por simples escolha da população, como parece ter sido o caso de Vila do Conde onde, segundo se supõe, o S. João escolhido para santo padroeiro da primitiva paróquia foi o Evangelista, mas os gostos e as necessidades dos vilacondenses converteu-o no Baptista, porque a festa deste era mais próxima do solstício de verão. Da análise do quadro 1, depreendemos que a maioria dos padroeiros das freguesias do futuro concelho de Vila do Conde era o próprio Cristo, ou a Virgem Maria sob diversas invocações (Santa Maria a Nova em Azurara, Santa Maria ou Nossa Senhora da Expetação em Bagunte, Touguinha e Vilar) e Santos Apóstolos ou Mártires do período romano. Todas à excepção de Mosteiró cuja alteração do santo padroeiro, está documentada nas Memórias de 1758. Tal explica-se com a antiguidade das povoações de Vila do Conde. Grande parte destas povoações existia já no período alti-medieval e, por25 e-vilacondense

tanto, havia necessidade de se escolher um padroeiro comunitário que tivesse um papel dúplice para estas populações: em primeiro lugar o de interceder junto de Deus pela comunidade nos seus anseios de paz, segurança e prosperidade e nada melhor que um mártir, alguém que tenha dado a vida numa cruz, numa roda, esfolado, queimado, metido num caldeirão etc.ª, etc.ª para agradar a Deus. Não sendo a religião cristã adepta de sacrifício de qualquer espécie, como eram as pagãs, o sangue derramado por estes mártires substituía, no altar das oblações, o sangue que outrora servia para apaziguar a divindade e de cujo mérito esperavam os camponeses partilhar e beneficiar; por outro lado, competia ao santo padroeiro ser paradigma para a comunidade paroquial, que sob a sua égide era constituída, por vezes em condições de extrema dureza. O grande problema que se afigura é o facto de se pôr em causa a existência de um grande número destes santos. Lembremos que a maioria vem do período em que os cristãos eram perseguidos, eles próprios foram mortos nessas perseguições e não havia muitos registos. Por isso, muitos destes santos foram canonizados tendo como base da sua santidade as lendas, a aclamação popular (como eram aliás os bispos e os líderes das comunidades), não contendo o Martiriologium Romanum grandes informações sobre eles. Por isso, por meio de uma investigação mais exigente, que resultou dos trabalhos do Concílio Vaticano II (196165), uma grande parte destes santos foi retirado do calendário católico. É caso para perguntar: o que andamos nós a festejar? Caso documentado nas


Quadro 1 Padroeiro

Nr.º de Freguesias

Divino Salvador

5

S. Pedro

3

S. Miguel

2

Virgem Maria

4

S. Marinha ou S. Margarida de Antioquia

3

S. Mamede

1

S. Tiago

1

S. Vicente de Saragoça

1

S. Martinho

3

S. João Baptista

1

S. Cristóvão

1

Santo André

1

S. Gonçalo

1

S. João Evangelista

1

Santa Cristina (de Bolsena)

1

S. Simão e S. Judas

1

S. Estêvão

1

Santa Eulália

1

Condição

Vida

Situação atual

Jesus Cristo/Deus

Judeia (séc. Ia.c./ séc. I) Judeia/Roma (séc. Ia.c./ séc. I) Referido no Antigo Testamento Judeia (séc. Ia.c./ séc. I) Antioquia (Séc. IV)

Transfiguração (6 de agosto) Solenidade a 29 de junho 29 de setembro

Mártir Arcanjo Virgem Mártir Mártir

Cesareia (séc. III) Mártir Palestina (séc. I) Mártir Hispânia (Séc. IV) Mártir Panónia (séc. IV) Mártir Palestina (séc. I) Mártir Palestina (séc. III) Apóstolo e Mártir Palestina (séc. I) Beato e frade Portugal (séc. XII e XIII) Apóstolo Palestina (séc. I) Mártir Pérsia/Itália (séc. III) Apóstolos Palestina (séc. I) Mártir Palestina (séc. I) Virgem e Mártir Mérida/Hispânia (séc. III/IV)

(*) Extintos com a Reforma Litúrgica do Concílio Vaticano II

8 e 18 de dezembro; 20 de julho* 17 de agosto* 24 de julho 20 de julho 11 de novembro 24 de junho 25 de julho* 30 de novembro 10 de janeiro 27 de dezembro 24 de julho 28 de outubro 26 de dezembro 10 de dezembro


Memórias Paroquiais de mudança do Santo Padroeiro foi Mosteiró, em que o pároco memorialista escreveu: “Que o seu orago de presente é São Gonçalo e antigamente foi S. Salvador, e desta mudança não há memória se não até ao ano de mil seiscentos e três se acha nos capítulos das Visitas [d]esta com capítulo de São Salvador de Mosteiró; e desta visita de Dom Frei Gonçalo de Morais Bispo do Porto que foi no ano de mil seiscentos e três até ao presente se acha nos livros das Visitas S. Gonçalo de Mosteiró.” Naturalmente, a veneração do padroeiro não esgotava as necessidades que as comunidades tinham. Hábitos milenares, enraizados na cultura popular, exigiam que para cada problema da vida fosse atendido por um protetor celestial. E assim, a Igreja empreendeu um processo de substituição da mundividência pagã pela cristã. Naturalmente que o enfoque estava na divindade, que desde cedo se impôs como una e trina. Ou seja, mistério dos mistérios, Deus é um e ao mesmo tempo três pessoas: Pai, Filho e Espírito Santo. Ao culto da Santíssima Trindade associa-se o sacrifício de Cristo, a Eucaristia e o Espírito Santo. Na hierarquia sagrada, segue-se o culto da Virgem Maria, tida para muitos, como a substituição da Deusa Mãe. Segue-se uma multidão de Apóstolos, de Mártires e Santos que, como acima afirmaram, substituíram na mentalidade dos homens medievais, os deuses pagãos da antiguidade. Nas terras do futuro concelho de Vila do Conde, além do culto 27 e-vilacondense

devido aos padroeiros, era prestado culto a inúmeros santos. Das imagens referidas nas Memórias Paroquiais metade referiam-se a Santos e a outra metade era partilhada com o culto das Almas do Purgatório, da Virgem Maria, de Cristo e da Santíssima Trindade. A Santíssima Trindade era adorada em Ferreiró, Fornelo e Gião. Aliadas ao culto da divindade temos o culto da Eucaristia e das imagens de Cristo. As Memórias Paroquiais são, muitas vezes, omissas relativamente à existência de sacrário. Expressamente, só são referidos dezasseis sacrários nas igrejas Paroquiais. O culto do Sacrário, isto é, da veneração das partículas sagradas que restavam do sacrifício da Eucaristia, estavam, segundo Viriato Capela, restringidos por inúmeras normas (como as do Arcebispado de Braga de 1637), que visavam preservar todo o decoro e asseio devido à Tipologias das Imagens referidas nas Memórias Paroquiais de 1758


© Hélder Guimarães

Retábulo das almas da Igreja Matriz de Vila do Conde


divindade, como por exemplo, ter constantemente acesa uma lamparina para indicar a sua presença. Tal, impunha à comunidade gastos consideráveis com cera, missas, adornos, pelo que, muitas vezes, era necessário proceder a escritura pública para a obter licença que autorizava a igreja possuir sacrário 1. Esta situação parece comprovar-se em Mosteiró onde o sacrário só foi colocado em 1736 e "foi feita a sua colocação à custa dos fregueses desta freguesia os quais se obrigaram por uma escritura pública à sustentação de cera e de azeite no mesmo ano de colocação". O Pároco de Mindelo também expressou o rol de obrigações que a sua freguesia tinha de realizar para manter o Santíssimo Sacramento na Igreja Paroquial, apesar de o Santíssimo ser da responsabilidade dos cónegos do Mosteiro de Moreira, “os devotos moradores desta freguesia que veneram com todo o respeito, e decoro, que devem, e com muita solenidade, e devoção lhe fazem festa todos os anos, semana santa, Domingos terceiros, e todas as sextas feiras lhe mandam dizer uma missa, coisa muito antiga, e a mais de todas estas vizinhanças, e se mostra pelos grandes aparatos, que tem, e com suas esmolas devotas o estão conservando com todo o zelo e fervor." Resumindo, ou o Pároco omite a referência ao sacrário (e esta hipótese é também corroborada por Viriato Capela), ou

a freguesia não tinha possibilidades económicas para o manter 2. Ainda associados ao culto da divindade temos as imagens do Menino Jesus ou Santo Nome de Jesus, da devoção das crianças, que aparecia em treze referências. O crucifixo, cuja imagem de Cristo era obrigatória após a reforma Tridentina, aparece referido em dez igrejas: Árvore, Azurara, Bagunte, Gião, Guilhabreu, Mindelo, Vairão, Vila do Conde 3, e Vilar de Pinheiro 4, à época recentemente inaugurado. Outras imagens de Cristo sob a invocação do Divino Salvador, Ecce Homo, Santo Cristo ou Senhor dos Passos tinham menos expressão nas igrejas de terras do Ave. A presença de imagens da Virgem Maria era tão importante, como as do próprio Cristo. A principal invocação da Virgem Maria era a “Senhora do Rosário”, presente em vinte e cinco igrejas 5. Inclusivamente, Mindelo tinha duas imagens, sendo que o Pároco justificava a existência de uma segunda, mais pequena, para sair em procissão no primeiro Domingo de cada mês. Esta devoção, segundo Viriato Capela, insere-se na piedade Barroca, pós Tridentina, daí a sua proliferação por todo o país 6. A padroeira da Casa de Bragança e do Reino, a Senhora da Conceição, tinha imagens nas igrejas paroquiais de Retorta, Macieira e Vila do Conde. Depois temos virgens cujas evocações

1. CAPELA, 2003: “Sacrário” 2. Não devemos, contudo, esquecer que a Reserva Eucarística não servia só para veneração dos fiéis na Igreja. Servia, também, para se administrar aos enfermos e moribundos na forma de Viático. Se nos dias de hoje não se atribui grande valor a este preceito, no mundo que nós perdemos era importantíssimo morrer comungado, pois significava morrer na graça de Deus e alcançar a vida eterna. 3. Com invocação de “Senhor da Paciência” e que hoje existe com o nome de Senhor do Bonfim. 4. Com invocação de “Senhor dos Afligidos” 5. Só Arcos, Outeiro, Parada e Touguinha não a referem. 6. CAPELA, 2003 : “ROSÁRIO, Virgem do”

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Nossa Senhora do Rosário - - Tela do Coro Alto da Igreja de Santa Clara



nos lembram os mareantes – a Senhora da Boa Viagem em Vila do Conde e Azurara – as parturientes – Senhora da Expetação ou da Encarnação em Bagunte, Junqueira, Touguinha, Vilar e Vila do Conde. Relacionadas com o culto da morte estão os altares edificados em honra das Almas do Purgatório. O culto das almas é impulsionado pela Reforma do Concílio de Trento e vem dar resposta a uma angústia que dilacerava a alma do homem do mundo que nós perdemos e que se exprime no salmo 129 (130): “Se tiverdes em conta os nossos pecados Senhor, quem poderá salvar-se?”. A teoria do Purgatório estabelecia uma espécie de esperança para todos aqueles que, por pequenas faltas, poderiam incorrer na condenação eterna, verdadeiro medo do comum dos homens do mundo que nós perdemos, que esperava após uma vida de sofrimentos gozar da salvação eterna. À volta deste tema da salvação gerou-se toda uma economia, gerida pela Igreja, e que implicava rezar missas em troca de um estipêndio 8 ou de legados pios 9. A leitura da teoria do Purgatório faz-se pela descrição de uma representação como existe no retábulo das almas da Igreja Matriz de Vila do Conde: uma barca envolta em chamas purificadoras, ainda que pequenas, e à qual não escapam o Papa e o Bispo (e em muitos casos o Rei). As missas que se rezavam serviam para que Deus se compadecesse das Almas do Purgatório e encurtasse a sua estadia em tão incómodo lugar. Daí se vê a figura dos arcanjos: um com uma balança pesa os pecados e a sua

remissão pelo fogo purificador e pelas orações dos mortais, o outro retira a alma purificada do Purgatório e esta vai para junto da Virgem Maria, que se vê em plano intermédio e para junto da Santíssima Trindade que coroa a cena, em plano superior. Os vivos, desempenham, claramente, um papel de proporcionar aos mortos o seu rápido trânsito para a glória celeste, impedindo que a alma ficasse penada e se mantivesse na terra dos vivos; por outro lado, os vivos esperam que, quando deste mundo se finassem, os vivos que por cá ficassem também lhes fizessem o mesmo. Daí as alminhas nas encruzilhadas, e os altares a elas levantados nas igrejas paroquiais. Tal era o caso de Azurara, Bagunte, Fajozes, Labruge, Mindelo, Mosteiró, Tougues, Vila Chã, Vila do Conde e Vilar de Pinheiro, onde o Pároco confirmava com orgulho que "se dizem mais de duzentas missas". Ao culto das almas, podemos associar os cultos de S. Miguel, cuja imagem se venerava nas Igrejas de Arcos e Santagões (de cujas freguesias era padroeiro) e Retorta. Por fim restam os santos. E háos para todos os gostos e feitios (consultar quadro anexo). Em terra de pescadores temos o S. Pedro, mas esta teoria cai por terra quando, das freguesias ribeirinhas, só Vila do Conde e Labruge tinham imagens de S. Pedro. As demais eram Fajozes, Formariz e Canidelo. Com mais de cinco imagens encontramos santos associados à família como S. José e sua sogra Santa Ana, mãe da Virgem Maria, a quem o pároco de Mindelo se referia como

8. Valor que ainda hoje se paga por cada missa. 9. Que abordamos no número anterior e que enriqueceram tantas igrejas e mosteiros

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“causa das causas”. Se hoje o concelho de Vila do Conde festeja em peso S. João Baptista, o percursor, maior entre os filhos de mulher (Mt. 11,11), no mundo que nós perdemos o culto do Santo Percursor tinha um caráter bastante residual, existindo, unicamente, três imagens, naturalmente em Vila do Conde, Tougues e Vairão. Verdadeiramente popular era o português, Fernando de Bulhões, mais conhecido por Santo António de Lisboa ou de Pádua. A ele recorriam os pobres (daí o pão de Santo António), os criadores de gado e as moças casadoiras . A sua veneração, no futuro concelho de Vila do Conde, atingia as quinze imagens. O autor dos “Sketches of Portuguese Life”, verificava como em Lisboa se festejava este santo, e descrevia aos ingleses os seus milagres. Mas dizia, igualmente, que se o Santo não atendesse as suas preces, era “alvo das mais possíveis grotescas indignidades”. O autor refere, apenas, os marinheiros que a ele rezavam por ventos propícios e que se não eram atendidos partiam as imagens do

Santo atiradas contra os mastros 10. Não menciona outras indignidades, mas nós sabemos que amarrar o Santo debaixo da cama era prática comum das donzelas mal-amadas. Mas havia um Santo ainda mais importante que Santo António. O mundo que nós perdemos era um mundo pautado por um frágil equilíbrio. A trilogia macabra das fomes, pestes e guerras assolou a existência do homem dessas épocas. Fosse porque as doenças matavam muitos trabalhadores, os campos ficavam incultos e existia agitação social ou fosse porque as guerras destruíam as colheitas, provocavam fomes e tornavam o sistema imunitário mais frágil às doenças, existia um santo que protegia o povo. Esse Santo era S. Sebastião que, com dezasseis imagens, rivalizava com o culto da Virgem e das pessoas da Santíssima Trindade. A ele também se associa S. Roque. Mas o primeiro é o Santo de cujo culto esperavam os homens do mundo que nós perdemos, que os livrasse dos tormentos da doença ou peste.

AS ASSOCIAÇÕES DE FIÉIS Os fiéis foram vivendo a sua fé e organizaram-se, muitas vezes, em confrarias. As Confrarias surgiram na Idade Média para dar resposta a uma multidão de desenraizados do campo, que chegavam aos meios urbanos e não tinham uma rede de solidariedade que os assistisse. Dentro da confraria se recriava a família, deixada para 10. G.,A.P.D, 1826: 135 11. COELHO, 2011:160

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trás no campo. E, para os irmãos ou confrades a confraria representava o amparo nas dificuldades da vida: o trabalho, a doença, a morte, a viuvez e a orfandade. Os confrades, que se reuniam sob o patrocínio de um santo, e lhe promoviam o culto era, assim, uma sociedade fechada ao mundo exterior, excepto aos pobres 11.


© Hélder Guimarães Imagem de S. Sebastião - Capela de Formariz


Nelas se exprimia a única forma de governo popular num catolicismo extremamente hierarquizado, e com posições bem vincadas. Assim se compreende que em França, François Lebrun notasse a desconfiança do episcopado para com estas associações de fiéis 12. Não era para menos, porque após a Reforma Protestante, o clero reafirmou a sua autoridade sobre a sociedade dos países onde o catolicismo se manteve como religião preponderante, como era o caso Português. Tal como em todo o Ocidente europeu, em Portugal e nas futuras terras de Vila do Conde existiam múltiplas confrarias. Segundo Viriato Capela, a mais importante era a do Subsino, múltiplas vezes associadas à Confraria do Nome de Deus. A ela competia zelar pelos interesses da Paróquia, tanto religiosos, como civis 13. Em Vila Chã, por exemplo,

a Confraria de S. Sebastião aparece identificada com a confraria do Subsino. Em Bagunte referia-se, somente, o juiz de "quem corre avisar os freguezes para os ministérios pertencentes à Igreja; e este faz as vezes daqueles que, em outras partes costumam chamar juiz...". Em Rio Mau afirmava-se que na Igreja havia “um juiz do subsino, eleito a votos do povo da freguesia". Em Touguinha, a Confraria do Nome de Deus, que como acima referimos aparece associada ao Subsino, tinha um juiz, que prestava contas ao Provedor de Viana e tinha o direito de cobrar dá contas ao e os fregueses eram obrigados a dar, por cada fogo: os casados 26 reis e os solteiros e viúvos 12,5 reis. Outro tipo de confraria existente, eram aquelas que tinham


motivações profissionais. Tal era o caso da Confraria dos Náuticos do Corpo Santo (S. Pedro Gonçalves Telmo), dos estudantes do Senhor Crucificado e dos lavradores da Confraria do Espírito Santo, todas de Azurara. Em Vila do Conde os mareantes e pescadores do alto reuniam-se em volta da Confraria da Senhora da Guia, que “lhe fazem numerosa confraria”. Os sacerdotes também tinham as suas confrarias: como era o caso da Confraria de S. Miguel de Malta; em Vila do Conde, a Confraria da Senhora da Encarnação ou da Madre de Deus (cuja imagem está na capela mór), fundada, segundo a Memória, em 1528 e a de Nossa Senhora da Touguinha, a

quem iam os clérigos fazer festa, com estatutos de 1622. Depois havia as confrarias para as circunstâncias da vida religiosa dos fregueses. Eram os casos das Confrarias do Rosário e do Santíssimo Sacramento, cuja função era, como acima se referiu, de zelar pelo culto do Santíssimo Sacramento. Era de tal forma importante esta confraria que em Vilar, afirmava o pároco serem confrades todos os fregueses, sendo esta de 1609 e a de Mosteiró de 1751, o que prova o contínuo crescimento deste tipo de confrarias ao longo de todo o período moderno. Já a do Rosário, que é referida por dez párocos, também continua a crescer uma vez que o abade de Vilar de Pinheiro não esconde a sua satisfação por ser a

12. LEBRUN, 1990: 909. Para os casos da influência dos mosteiros destas terras ver mapa 3 13. CAPELA, :”CONFRARIA DO SUBSINO”

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confraria ereta em 1754 "com tanta felicidade, que sendo a freguesia de tão pouco povo, já se acha com perto de trezentos irmãos". De igual forma, em Labruge, a de S. Sebastião era tão importante que a freguesia fazia toda

parte da Confraria. Resta-nos as confrarias das Almas, que aparecem nas Memórias em dez ocasiões. A estas confrarias competia rezar pelas almas dos mortos, mantendo, assim, a paz dos vivos.

AS IGREJAS E IMAGENS Verdadeira casa da comunidade, as igrejas e capelas povoavam o espaço do futuro concelho de Vila do Conde. Estes espaços tinham diversas funções: espaço sagrado, onde a comunidade se reunia para presenciar os mistérios da fé católica; serviam de cemitério, sendo que a sua inumação em terreno sagrado, ainda que altamente prejudicial do campo de vista sanitário, trazia grandes benesses no que concerne à salvação da alma; a Constituição de 1822 reservoulhes, ainda, um papel fundamental na realização de eleições. Segundo o texto constitucional, era na igreja que se deveriam reunir os eleitores após a celebração da Missa do Espírito Santo (art. 53º) 14, o que mostra a importância destes locais, como locais da comunidade. Uma comunidade podia não ter órgãos de gestão local, nem edifícios que os albergasse. Mas se não tivesse uma igreja, não era verdadeiramente uma comunidade. Como vimos no número anterior, ter o direito de padroado ou construir uma capela ou parte da Igreja paroquial era de extrema importância: como fonte de rendimentos, como marca de prestígio 14. MIRANDA, 1997: 44 15. CAPELA, 2003: ”CAPELAS RURAIS”

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social, como forma de se distinguir na morte, não se misturando com os demais corpos nas naves das igrejas, levaram os homens mais proeminentes da sociedade a construírem capelas. Assim, das capelas referidos nas Memórias Paroquiais 44% eram privadas e 56% eram de administração pública. As ereção de capelas estava em franco declínio porque, de acordo com Viriato Capela, a vinculação de terras, foros, censos e outros rendimentos à fundação e sustentação de capelas entraram em declínio na segunda metade do século XVIII, levando ao abandono e ruína de muitas capelas em todo o país 15. Quanto às igrejas paroquiais, sabemos que muitas foram alvo de restauro aquando do terramoto de 1755. O processo de reparação por tão violento sismo estava praticamente concluído. No entanto, ele aparece em pleno processo de ampliação de algumas das igrejas paroquiais, como era o caso de Fajozes, em que o pároco orgulhoso das suas qualidades de construtor refere que "A Igreja se está fazendo de novo o corpo (…) fica um dos principais templos de toda a Maia"; tal


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também era o caso da Junqueira, cujo cura não consegue esconder a excitação por estar "A Igreja está feita de novo, e é uma das melhores desta Província". Outros tinham consciência da antiguidade dos seus templos, como era o caso de Rio Mau em que o pároco referia que "a Igreja é das mais antigas desta terra.” Nos “Sketches of Portuguese Life” o autor refere que, em geral, as igrejas das aldeias “são muito bem ordenadas no seu interior; porém, as imagens nos altares são, em geral, tão miseráveis espécimes de esculturas em madeira, e tão ridículas em suas faces inexpressivas, que o próprio pobre de espírito, se não acostumado a vê-las desde a sua infância, seria incapaz de retrair rirse delas, em vez de sentir a veneração que elas suscitam” 16. Em alguns casos reporta-se à qualidade das imagens existentes nas igrejas: umas pela sua antiguidade, como é o caso da imagem de Santo Antão, existente em Vilar, que o pároco dizia ser “de pedra e mostra ser muito antiga”. Outros referiam-se a imagens recentemente colocadas nas igrejas como é o caso da Senhora da Expetação de Touguinha, o Senhor dos Afligidos de Vilar de Pinheiro, ou Nossa Senhora de Touguinha; outras tinham fama de milagrosas e tinham o condão de trazer muitos forasteiros (e com eles receitas) como era S. Gonçalo de Mosteiró, cuja romaria se fazia a 10 de janeiro e na oitava do Espírito

16. G., A.P.D., 1826: 335 e 336 17 GUIMARÃES, 2008: 148

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Santo, "nos quais dias se ajunta muito povo das freguesias circunvizinhas em romaria ao Santo e na primeira oitava da Páscoa (…) e de Matosinhos". Outras impressionavam pela sua beleza estética: como era o caso da Senhora da Expetação de Vilar que "na encarnação do rosto e no talhe dos vestidos mostra ser antiquissima esta Imagem, e se tem aqui por tradição que viera de Inglaterra no tempo em que lá se começaram a negar as Imagens sagradas o culto e veneração que lhe era própria." A outra imagem que causa grande estupefação era a de S. João Baptista, de quem o Prior Camelo Falcão dizia ser “primorosa Imagem do grande Baptista com tanto respeito, e tão vivamente representativa (mostrando o cordeiro com acções e gestos tão naturais, e persuasivos) que embebidos os sentidos, quando se chegam para os individuar de perto parece só esperam que fale: falta única, com que se diversifica ao parecer de figurado." Era natural o espanto do Prior. Diante dela também se deteve o Rei D. Luís, quando em 26 de Junho de 1872 visitou Vila do Conde 17.

E com a bela imagem de S. João nos ficamos neste capítulo do mundo que nós perdemos

BIBLIOGRAFIA



“ACONTECEU POR CÁ ...” CASCATAS DE SÃO JOÃO 2013

FOTOGRAFIA POR...

ALEXANDRE MAIA 41 e-vilacondense


Š Alexandre Maia


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CONCURSO DE FOTOGRAFIA

TEMA JULHO

“VILA DO CONDE À NOITE” 49 e-vilacondense


REGULAMENTO 1. Tema Livre nos procedimentos técnicos a empregar, deverá obedecer a um tema genérico “Vila do Conde” e ao sub-tema do mês, definido no site e na revista e-vilacondense, registando qualquer pormenor, situação ou acontecimento, desde que ocorridos dentro do concelho de Vila do Conde. 2. Obras O número máximo de fotografias a apresentar por concorrente é uma. A dimensão mínima é 21cm por 30cm, sendo requisito a orientação vertical. 3. Prazos e formas de entrega Os trabalhos deverão ser enviados através de e-mail para o endereço fotovila@vilacondense.pt até ao dia 15 de cada mês. O e-mail deverá conter os seguintes dados. - Nome do fotógrafo; - Título da fotografia; - Local da fotografia; - Data da fotografia (mês e ano) 4. Prémios 1º Prémio - Utilização da fotografia como capa da revista e-vilacondense com os devidos créditos do autor. 2º e 3º Prémio - Publicação da fotografia na revista e-vilacondense com os devidos créditos do autor. 5. Juri O juri sera composto por todos os utilizadores do nosso site (www. vilacondense.pt), através da atribuição de uma classificação (rating) a cada fotografia. Os premiados serão os trabalhos que obtiveram a classificação mais alta até ao dia 25 de cada mês. Os trabalhos premiados ficam propriedade do Vilacondense - Roteiro Online, o qual se reserva o direito de os poder utilizar no nosso site www.vilacondense.pt e na revista e-vilacondense sempre que entenda conveniente, referindo sempre os respetivos direitos autorais. Quaisquer informações adicionais podem ser solicitadas através do e-mail fotovila@vilacondense.pt.



PREMIADOS JUNHO 1º LUGAR Diogo Schartt Título O Som do Mar Local Praia do Mestre Junho 20133

2º LUGAR João Rosmaninho Título Encanto Local Praia do Rock ‘rol Abril 2013

3º LUGAR Tiago Ferreira Título Doca Pesca Vila Chã Local Vila Chã Maio 2013


CURTAS VILA DO CONDE 21ª EDIÇÃO POR ALEXANDRE MAIA Licenciado em Educação Visual e Tecnológica Diretor e-vilacondense

Quando chega o mês de julho, chega também o cinema a Vila do Conde, muito por culpa de cinco jovens que tiveram a ideia quase peregrina de criar um festival de cinema. Digo quase peregrina porque esta foi uma ideia que nasceu, vingou, que se adaptou e transformou, e que hoje é considerada uma mais-valia não só para o cinema e para a curta-metragem, mas também para a cidade de Vila do Conde. Posso afirmar ter sido um privilegiado por ter feito parte deste projeto durante cerca dos dez anos em que fui projecionista de curtas metragens, na altura em que estas eram projetadas em película. Curiosamente, a exposição Film, que decorre simultaneamente à edição deste ano do festival no Solar, Galeria de Arte Cinematográfica, recai sobre esta expressão artística, pretendendo dignificá-la antes que caia em rutura definitiva em prol do suporte digital. Tive a oportunidade única de visualizar muitas das curtas metragens que foram passando pelo festival, de projetar filmes nos diversos espaços que foram sendo ocupados pelo mesmo, como a tenda, montada inicialmente na Praça da República e mais tarde na renovada Praça José Régio, ou o cinema ao ar-livre, cujas sessões decorriam nas traseiras da sede do Ginásio Vilacondense, e que eram um verdadeiro desafio para os cinéfilos que, não raras vezes, vinham munidos de mantas e cobertores para combater as comuns noites de nortada em Vila do Conde.

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Mas o intuito deste breve artigo não é recordar experiências pessoais, embora, para mim, estas sejam indissociáveis do festival; o meu objetivo é dar a conhecer de forma sucinta este festival tão importante para a cidade e a sua evolução desde a 1ª edição, até à edição deste ano. De facto, a história deste Festival Internacional de Curtas Metragens de Vila do Conde (FICM), remonta a 1993, ano em que se realizou a 1º edição, e que foi o ponto de partida para a aventura que este ano completa o seu 21º aniversário. Este é, portanto, um festival que já atingiu a idade adulta, que amadureceu e se transformou, mas que mantém as directrizes e objetivos primários. A origem deste festival prende-se com a equipa fundadora e com a sua formação; a ideia partiu, como já foi referido, de cinco jovens com ligação ao cinema e às artes visuais. Assim, Dario Oliveira, José Nuno Rodrigues, Mário Micaelo, Miguel Dias e Rui Maia pretendiam, com este festival, criar não só um espaço de divulgação da

produção nacional e internacional, mas também promover a discussão do cinema e das artes visuais. Aquando da 1º edição do FICM, em 1993, ficaram definidos pela equipa fundadora os objetivos e as directrizes que nortearam a conceção do mesmo, os quais, em termos muito genéricos, defendiam a criação de um festival que fosse de encontro às primeiras filmagens de novos realizadores que, maioritariamente, começam o seu trabalho pela produção de filmes de curta duração, por vezes a par com a longa metragem. É este ainda o grande objetivo do festival, agora denominado Curtas Vila do Conde. Em 1999, nasce a Agência da Curta Metragem que se institui não só como um apoio externo ao festival, mas também como um instrumento de promoção e divulgação da curta metragem enquanto opção cinematográfica. Este organismo, a par com o próprio festival, tem trabalhado no projeto de difusão da curta metragem, gerindo algumas curtas metragens, fazendo a sua divulgação e


promoção, trabalhando até com escolas, procurando novos públicos. É também no seguimento desta filosofia de divulgação e promoção partilhados pela equipa organizadora do festival e pela Agência da Curta Metragem que há alguns anos o Curtas Vila do Conde procura abranger os mais jovens com a realização do Curtinhas, uma secção do festival dedicada a pais e filhos que visa cativar ambos para o cinema e a curta metragem. Na edição deste ano, o 21ª Curtas Vila do Conde, haverá a competição de filmes para quatro escalões etários (para maiores de 3, 6, 9 anos, e pais e filhos) que representa uma oportunidade para pais e crianças se divertirem com pequenos filmes especialmente pensados para um público infantil. Para além da competição, haverá o Espaço Infantil “Brincar ao Cinema”, nas instalações do festival, e duas oficinas dedicadas a desvendar os “efeitos especiais” no

cinema. Também com o projeto Take One! se pretende cativar o público jovem dando voz e imagem a filmes de escolas e promovendo masterclasses assim como mais uma edição do VideoRun. Por falar em instalações, este festival decorre, desde 2009, no Teatro Municipal de Vila do Conde, mas durante largos anos a casa do então FICM foi o Auditório Municipal de Vila do Conde. Contando desde o início com o apoio da Câmara Municipal de Vila do Conde, vários espaços foram sendo cedidos para suprir as dificuldades logísticas com que a equipa organizadora se foi deparando à medida que o festival crescia e tomava proporções cada vez mais internacionais. Assim, o festival estendeu-se, como referi no início deste artigo, ao cinema ao ar livre nas traseiras da sede do Ginásio Vilacondense, ao cinema na tenda na Praça da República e na Praça José

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Régio, ao Solar de S.Roque e até ao piso -3 do parque de estacionamento da Praça José Régio, numa dinamização avassaladora da cidade e na instituição de um novo ritmo durante a semana em que o festival decorre. Efetivamente, a importância deste festival tem vindo a aumentar de ano para ano, o que se traduz no número de filmes a concurso, nacionais e internacionais, e nas várias ramificações que este Curtas de Vila do Conde tem vindo a assumir. Assim, nesta 21ª edição do Curtas Vila do Conde, a competição internacional exibirá 34 filmes de 21 países diferentes, numa seleção com alguns dos autores que fazem a história no festival; por sua vez, a competição nacional mostrará 17 curtas-metragens portuguesas que se dividem entre nomes consagrados e jovens autores que arriscam no cinema o seu olhar sobre o mundo. Também os filmes-concerto são já

tradição, e nesta edição de Stereo serão apresentados quatro exemplares. A dupla The Legendary Tigerman e Rita Redshoes volta ao festival para musicar um filme de Paulo Abreu; ainda num filme do mesmo cineasta, Vítor Rua tocará música ao vivo. Os Zelig (exOrnato Violeta e Pluto) compõem uma banda sonora para um clássico mudo de John Ford, recentemente recuperado, “Bucking Broadway” (1917); o músico e compositor italiano Alex Puddu apresenta um espetáculo musical para filmes porno dinamarqueses dos anos 70. Finalmente, João Vieira, a partir do pseudónimo de White Haus, dará um concerto com inspiração na Nova Iorque dos anos 70, na sua música e nas imagens em movimento. Por fim, é importante referir o projeto Estaleiro (desenvolvido pela Curtas Metragens CRL) em que se convidaram cineastas com experiência para rodar um filme na zona norte com uma


equipa constituída por estudantes. Em 2013, o Curtas Vila do Conde exibirá, em estreia mundial, estas obras: “Mahjong”, de João Pedro Rodrigues e João Rui Guerra da Mata (rodado na Varziela, uma pequena Chinatown, num prolongamento da experiência asiática da dupla de realizadores); “A Mãe e o Mar”, de Gonçalo Tocha (sobre as pescadeiras de Vila Chã, filmadas no método íntimo do cineasta); “De Onde os Pássaros Vêem a Cidade”, de André Tentúgal (uma aposta num novíssimo realizador, numa história sobre uma rapariga à procura da felicidade); e “Fernando que ganhou um pássaro do mar”, de Felipe Bragança e Helvécio Marins Jr. (uma curiosa incursão ficcional sobre um pássaro oferecido a um português e as imagens culturais do Brasil que projeta na sua imaginação). Muito ficou por dizer nesta breve resenha que remonta a 1993 e termina em 2013, na 21ª edição do Curtas Vila do Conde. Resta recorrer, uma vez mais, à minha experiência pessoal para incentivar a ida a este festival que dinamiza de forma inigualável a cidade de Vila do Conde e dá a conhecer novos projetos cinematográficos e culturais. Apesar de ser um festival internacional de cinema com a dimensão e reconhecimento que possui, não deixa de ser um acontecimento intimista, da nossa cidade, de vilacondenses e para vilacondeses. Não deixe de fazer parte desta experiência. Fontes: 1. Ramos, Felicidade. Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em Ciências da Comunicação – Especialização em Cultura, Património e Ciência, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Porto, 2010. 2.Jornal do Curtas Vila do Conde 2013 - 21ª edição.

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INVENTÁRIO DO ESPÓLIO DO MOSTEIRO DE SANTA CLARA Parte III POR MÓNICA SOUSA E VALQUÍRIA COSTA Licenciadas em História-variante Arqueologia - FLUP

O Vilacondense Roteiro Online dá continuidade à publicação do inventário do espólio religioso do Mosteiro de Santa Clara. A inventariação das obras de arte sacra permite que estas peças sejam devidamente sinalizadas, identificadas e fotografadas permitindo ao público em geral o acesso a um acervo valioso e aprimorado ao longo dos séculos. Estas peças são testemunhos de diferentes épocas e estilos artísticos materializando-se na difusão da memória, fundamental para a formação cultural das gerações atuais e futuras. No presente inventário serão utilizadas estampas da autoria das investigadoras e do Dr. Flores Gomes.

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Pรกtio da entrada do Mosteiro de Santa Clara, em fevereiro de 2003.


APRESENTAÇÃO DE NOSSA SENHORA MENINA Datação: Séc. XVII-XVIII Material: Pintura a óleo sobre tela, com moldura vermelha e dourada, verde por fora. Estado de conservação: Razoável. Dimensões: Alt.152 cm; Larg. 74 cm Descrição: Apresentação da Virgem Menina aos Doutores do Templo. Segundo Monsenhor Manuel Amorim os Evangelhos apócrifos referem-se à “Apresentação no Templo de Nossa Senhora, quando menina, onde seus pais S. Joaquim e Santa Ana a levaram para aí servir e ser educada com outras jovens. Esta tradição desenvolveuse no Oriente e no séc. VI celebravase com relativo esplendor. O Papa Gregório XI, em Avinhão, introduziu-a no calendário romano e no séc. XVI o Papa Sisto V tornou-a obrigatória. Seria desse século ou do princípio do seguinte, na opinião do Dr. Flávio Gonçalves, uma tela existente no coro alto da Igreja de Santa Clara de Vila do Conde (…).” 1 A pintura retrata a Virgem Menina, subindo um conjunto de degraus, no cimo dos quais se encontra um

sacerdote, de braços abertos, numa atitude de acolhimento. Do lado esquerdo da Virgem Menina está a sua mãe, que segura com a sua mão direita as costas da Virgem Menina, representado um movimento de entrega ou apresentação. Do lado direito, está o pai, com as mãos erguidas sobre o peito em atitude de oração. Na parte inferior da tela encontra-se pintada a legenda, cujo estado não torna percetíveis as letras que a compõem. A moldura, pintada em vermelho e dourado, é ricamente decorada com elementos vegetalistas dourados em todos os perfis, sobretudo nos superior e inferior. O filamento exterior é pintado em dourado e verde. Estampa de 2003.

1. AMORIM, Mons. Manuel, “O Culto Mariano no Arciprestado de Vila do Conde e Póvoa de Varzim”, Edição do Arciprestado de Vila do Conde e Póvoa de Varzim, Póvoa de Varzim, dezembro de 2003.

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SANTA CLARA Datação: Séc. XVI-XVII Material: Escultura de madeira policromada e estofada. Dimensões: Alt. 139 cm; Larg. 67 cm Base: Séc. XVII- XVIII Talha dourada, estilo nacional Alt. 20 cm; Larg. 64,5 cm Descrição: Imagem de Santa Clara, de madeira estofada a ouro. Esculpida de pé, em posição frontal e com a perna esquerda ligeiramente fletida, quebrando a rigidez da expressão facial. De fácil identificação, segura na mão direita uma custódia dourada e na esquerda o báculo. O primeiro atributo alude ao milagre associado à Santa que, empunhando a custódia, conseguiu expulsar os invasores sarracenos que tentavam saquear o seu mosteiro. O segundo atributo, o báculo, caracteriza-a como fundadora de uma ordem, a Ordem de Santa Clara (também conhecida por Ordem das Clarissas ou “Damas Pobres”), sendo o ramo feminino da Ordem de São Francisco. Usa o hábito de clarissa profusamente decorado e dourado. O corpo apresenta um volume generoso, sendo coberto por uma túnica

roçagante, um escapulário, um véu dourado ajustado, plissado e debruado a cordão, que cobre completamente a cabeça, pescoço e peito. Sobre estas peças está um manto que aperta um pouco abaixo da gola. Por último, um novo véu, curto e solto cobre o véu-gola e parte da capa. A base é baixa, retangular, de cor castanha, sem qualquer decoração. A escultura encontrava-se colocada sobre uma base, em talha dourada, de secção hexagonal. No centro do perfil frontal da base, entre flores e folhagens, surge uma pequena cabeça de um anjo. Atualmente, a escultura da Santa encontra-se na Sacristia da Igreja do Mosteiro de Santa Clara de Vila do Conde. Estampas de 2003 e 2013.


S. FRANCISCO Datação: Séc. XVI-XVII Material: Escultura de madeira policromada e estofada. Base: Séc. XVIII Talha dourada, estilo joanino Alt.22 cm.

Descrição: Imagem de São Francisco de Assis, esculpida de pé e frontal, de cabeça ligeiramente virada para o lado direito, a olhar em direção ao crucifixo que segura com a mão esquerda, perna esquerda ligeiramente fletida e pé esquerdo virado para a esquerda, procurando-se com estes movimentos quebrar um pouco a rigidez da escultura. Os braços estão cruzados sobre o peito, sendo visíveis os estigmas nas costas das mãos. São Francisco de Assis é frequentemente representado com a face alongada, nariz reto e fino, pescoço esguio e testa curta, tal como se verifica nesta escultura. O rosto é muito expressivo, a testa e as sobrancelhas estão suavemente franzidas e o olhar é intenso, procurando transmitir o seu forte amor e devoção por Cristo, assim como a sua humanidade e humildade. O cabelo é tonsurado e de 67 e-vilacondense

cor castanho-escura, assim como as barbas. Enverga o hábito franciscano, escuro, mas repleto de decorações douradas. A túnica é cingida na cintura por um cordão que aperta do lado direito, sendo bem visível a ponta com os três nós distintivos das virtudes monacais da Ordem. O hábito forma pregas pesadas e termina no tornozelo, deixando ver os seus pés descalços, símbolo da sua santidade e desinteresse pelos bens materiais. O capuz cai para trás em formas rígidas. A sua base é paralelepipédica de secção hexagonal e dourada. A escultura encontrava-se sobre uma base em talha dourada, de forma hexagonal, decorada com motivos florais e vegetalistas. Atualmente, encontra-se na Sacristia da Igreja do Mosteiro de Santa Clara de Vila do Conde. Estampas de 2003 e 2013.



S達o Marcus

S達o Paulo (?)


AUTORES DO NOVO TESTAMENTO Datação: Finais do séc. XVIII Descrição: Esculturas de vulto redondo pintadas de uma só cor. Representados com longas barbas (que simbolizam a dignidade do Santo), cabelos encaracolados, túnicas e mantos que caiem formando várias pregas assimétricas que dão movimento à escultura. Habitualmente são representados descalços (simbolizando a sua santidade) e segurando um livro. Dois dos santos são de madeira mais escura e melhor conservados. Estes encontravam-se no Pátio da entrada do Mosteiro. Os de madeira mais clara e em pior estado de conservação (já não tinham uma das mãos) encontravamse na Biblioteca (1º andar) do Mosteiro. Atualmente, as quatro esculturas

podem ser observadas na Sacristia (antiga Sala do Capítulo) da Igreja do Mosteiro de Santa Clara de Vila do Conde. Os Autores do Novo Testamento são vários, neste grupo em estudo identificamos São Marcos. Nos demais, por se terem perdido os atributos, não são identificaveis, supõe-se contudo que uma das imagens diga respeito a São Paulo, por ainda ser visível o punho de uma provável espada. Aos santos evangelhistas está associado um símbolo, a São Mateus o anjo, a São Marcos o leão, a São Lucas o boi e a São João a águia. Estampas de 2013.


PERCURSOS CASAS BRASONADAS DO BURGO Textos cedidos pela Câmara Minicipal de Vila do Conde Durante os séculos XVII e XVIII assistimos ao desenvolvimento e enriquecimento do património edificado da urbe, com a construção de grande parte das casas solarengas de famílias fidalgas que viviam na Vila, ou que aqui se fixaram e que, fruto

da sua próspera situação financeira e social, aqui entenderam edificar as suas residências. Normalmente, os seus proprietários estavam ligados ao comércio marítimo ou a importantes cargos políticos e sociais.


BRASテグ DE VILA DO CONDE De negro com uma caravela de vermelho, vestida, mastreada, encordoada, realテァada e com テ「ncora de ouro, vogante num mar composto de sete faixas ondeadas de prata e verde.

Coroa mural de cinco torres de prata. listel branco com os dizeres "Vila do Conde" a negro.

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A casa dos Morgados de S. Bento, edificada na Rua da Lapa, parece ter sido construida em finais do século XVII, sensivelmente na mesma altura e pelos fundadores da Capela de S. Bento, os Carneiros de Sá. Mais tarde, em 1871, a residência foi vendida por Rafael Ferraz Carneiro de Sá Barbosa a um sobrinho e herdeiro de João Elias da Costa de Faria e Silva, ministro da rainha D. Maria II. Recentemente, foi alvo de uma profunda intervenção e pertence a particulares.

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O brasão de armas, que se encontra na sacristia da Capela de S. Bento, apresenta composição partida, de tipologia francesa, com representação dos Carneiros e dos Sás.


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A Casa de S. Sebastião, atualmente propriedade municipal, acolhe o Centro de Memória de Vila do Conde. A construção deste edifício remonta ao século XVII, facto que se pode constatar através da análise do imóvel, detetando-se, no mesmo, intervenções de várias épocas. O seu primeiro proprietário conhecido foi Frei Manuel Azevedo e Ataíde; Comendador da Ordem de Cristo, natural de Barcelos, que vendeu o solar a Frei João Carneiro Rangel e sua mulher, em 1672. O Solar permanecerá na posse da família até aos primeiros anos da segunda metade do século XIX. D. Joana Felicidade de Vasconcelos Vieira de Lira Sotomaior é a última herdeira e representante da família da Casa de S. Sebastião e será ela quem venderá ao promissor causídico, Dr. José Joaquim Figueiredo de Faria que, em 1852, toma posse como administrador do concelho de Vila do Conde. A família Figueiredo de Faria, habitou a casa durante três gerações tendo-a vendido, posteriormente,

ao município. Esta família foi uma ativa defensora dos interesses locais, ocupando cargos na administração local, para além de terem sido procuradores às cortes. Estão, também, ligados à industrialização local, pois fundaram a fábrica de Lápis Portugália, além de terem participações noutras sociedades industriais e às iniciativas de âmbito turístico, ligadas ao incentivo da frequência da praia vilacondense, que surgiram na localidade como é o caso do teatro Afonso Sanches, do Casino, do Hotel Solar, da Sociedade de Propaganda da Praia, entre outros. O brasão de armas, apeado durante a ocupação da família Figueiredo Faria, foi recolocado depois das obras de intervenção e ampliação recentemente sofridas e que transformaram o solar no Centro de Memória de Vila do Conde. Datado da segunda metade do século XVII, é um magnifico exemplar em pedra calcária, esquartel ado, representando a família que a habitou entre 1672 e 1856 e que por alianças matrimoniais foram: Pereira, Rangel, Coutinho e Carneiros. e-vilacondense 76


A Casa dos Coelhos localizada no gaveto entre as Ruas Antómo José de Sousa Pereira e Comendador A. F. da Costa è, atualmente por legado da primeira Condessa de Coelhos, colégio das Irmãs Doroteias. Segundo a "llustração Villacondense" de setembro de 1912, esta casa pertencia a Manuel Coelho Duarte que nela residia, proprietário também da Capela de Santo António, situada na Quinta da Espinheira na freguesia da Junqueira. A 17 de setembro de 1774 foi passado o alvará de brasão de armas a Manuel Duarte da Amorim Coelho, filho de ManoeI Coelho Duarte e de Francisca MicaeIa

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de Amorim SiIva. Foi capitão-mor e vereador da Câmara de VIla do Conde. Por casamento, o imóvel pertenceu também à família dos Condes de Azevedo. O escudo de armas Iocalizado por cima da entrada principal do edifício, de tipo francês, é de composição plena dos Coelhos.


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A Casa da Praça, cuja propriedade atual é da Paróquia de S. João Baptista e onde funciona o Centro Paroquial, foi pertença de Luis Cameiro de Sá Barbosa, tenente-coronel das milícias Vila do Conde e casado com D. Isabel Margarida Carneiro Pereira Coutinho de Vilhena. O edifício, construído em finais do seculo XVIII e inícios do século seguinte, foi, ainda, propriedade de António Gameiro de Sá Pereira Coutinho Vilhena Rangel, cavaleiro da Casa Real, casado com D. Maria do Carmo Queiroz e, posteriormente, de Maria da Purificação de Queiroz Cameiro Pereira Coutinho de Vilhena

e marido, Dr. Pedro Lopes de Azevedo, Barbosa e Bourbon, 2º Conde de Azevedo. A Casa da Praça, localizada na Rua da Misericórdia, terá permanecido neste familia até aqui se instalar o Centro da Paróquia de S. João Baptista de Vila do Conde. O brasão de armas, esquartelado, de fomato oval, representa as familias Cameiros, Pereiras, Sás e Coutinhos.

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A Casa da Bajoca (ou Beijoca) pertenceu à familia Freire de Andrade. Nela residiu o sucessor da Casa da Barca e do Morgado de Sta. Justa. em Barcelos, José Gomes da Costa Soares Russel do Amaral Sá Brandão. Também neste edificio, presentemente habitado por particulares, esteve instalado o Colégio de Santa Maria Maior, de ensino primário e secundário.

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O escudo de armas localiza-se por cima da entrada principal do edificio. De tipologia francesa, é esquartelado, encontrando-se representadas as famílias Freire de Andrade, Sás, Torres e Barbosas.


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Localizada na Rua de S. Bento, em Vila do Conde, a Casa do Vinhal apresenta-se como um tipico solar urbano minhoto, cuja data de construção aponta para o século XVII. Foi mandada erguer por D. Francisco do Couto Azevedo e sua mulher D. Ângela da Costa, que está ligada, por laços de sangue, com a família que mandou construir a 'Casa Grande", ou casa dos Faria Gaio. Aqui residiu José de Azevedo e Menezes Cardoso Barreto, escritor e geneaIogista, filho de Manuel Carlos Cardoso de Menezes Barreto, de Guimarães, família do ramo dos Viscondes do Paço da Nespereira, e de D. Teresa Maria de Azevedo de Barros e Faria, herdeira da casa do VinhaI, mas em Famalicão.

Atualmente é propriedade pública, encontrando-se aí instalados, desde 1991, a Escola de Rendas de Bilros e o Núcleo Museológico das Rendas de Bilros. O brasão, localizado à esquerda da entrada principal do edifício, é esquartelado, de tipologia peninsular e apresenta as armas das familias Barros, Farias. Coutos e Azevedos.

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A construção da Casa dos Faria Gaio, também conhecida por Casa Grande, ocorreu em finais do século XVII; por iniciativa de D. Estácia Maria Gaio, por ocasião do seu casamento. Localizada na Rua de S. Bento, a casa ter-se-á mantido na família durante mais 3 gerações, sendo que, em 1882, surgem notícias da sua compra por Joaquim Silva, natural de Macieira da Maia, comerciante no Brasil e conhecido como Comendador Macieira. Atualmente é propriedade privada, pertença da Santa Casa da Misericórdia, encontrando-se aqui instalada uma unidade hoteleira. A casa já teve várias ocupações, entre elas o Instituto Secundário do Pe. José Praça, por onde passaram várias gerações de vilacondenses. 85 e-vilacondense

Supostamente, o brasão original tinha a Torre dos Faria como timbre, bem como as armas dos Gaios, dos Pereiras, dos Farias e dos Rochas. O brasão existente será o terceiro escudo desta casa. É de tipologia francesa e a sua composição, plena, é dos Guimarães, colocado na fachada da casa aquando da sua compra por Joaquim Silva.


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Embora assente sobre fundações de um Imóvel quinhentlsta, o Solar de S Roque foi construído nos finais do século XVIII, na antiga Rua Nova, atual Rua do Lidador. Foi Gomes Carneiro filho de Gil Carneiro, cavaleiro d'elRei, o responsável pela vinda deste braço da família dos Carneiros para Vila do Conde. No século XVI, um seu descendente, prior de Monte Córdova, entre outros benefícios, institui o Morgado de S Roque em Vila do Conde, herdado pelo Dr. Francisco Carneiro da Costa, que exerceu vános cargos, nomeadamente o de juiz de fora, em Sintra juiz dos órfãos, em Lisboa, desembargador da Suplicaçäo e desembargador e ouvidor do Crime no Porto. Posteriormente o “Morgado das Casas de S Roque, horta grande de Vlla do Conde e mais propriedades vinculadas", passa para o Dr. António de Mariz Carneiro, fidalgo, desembargador do Porto, cosmógrafo-

mor de Portugal. Durante o século XVIII, para além da construção de uma nova moradia, o solar passará para os Carneiro de Figueiredo, da Casa da Senra e posteriormente, a 24 de maio de 1843, por escritura notarial, o solar é vendido, flcando o comprador "(...) obrlgado a apear as armas que as ditas casas têm na fronteira à sua custa (...)". Recentemente, no âmbito da política de recuperação e reabilitação do património municipal, o solar foi alvo de uma intervenção profunda, criando aqui mais um equipamento cultural de grande qualidade e prestígio. Nessa recuperação, face à impossibilidade de se recoIocar o brasão de armas que outrora se via na fachada, foi colocado um painel de azulejos que o reproduz e cujo desenho se encontra numa das obras de António Mariz Carneiro, pertencente ao espólio da Biblioteca Nacional. e-vilacondense 88


No início do século XVII, Paulo Fernandes compra, no Terreiro (atual Praça da República), uma casa sobradada que passa a habitar. Mais tarde, seu filho Paulo José de Lima, o fundador da família Vasconcelos ditos de Vila do Conde, irá construir no mesmo local, anexando um celeiro adjacente herdado por sua mulher, D. Mónica, a Casa dos Vasconcelos ou do Submosteiro, como também foi conhecida. Paulo José de Lima, Cavaleiro da Ordem de Cristo, foi nobilitado em 1761 e ocupou os cargos de escrivão e vereador da Câmara Municipal. Com a sua mulher, D. Mónica de Vasconcelos Monteiro Barros e Almada, foram ativos defensores das rendas de bilros de Vila do Conde. Os Vasconcelos de Vila do Conde aqui nasceram, viveram e trabalharam, desde o último quartel do séc XVII e são um caso, porventura í mpar, de uma família que conta na sua varonia 89 e-vilacondense

sete gerações seguidas de autarcas e responsáveis vilacondenses. A partir do seu solar, em Vila do Conde, administraram o seu vasto património de oito vínculos, sete casas brasonadas e diversos prazos e foros e ainda hoje mantêm o Paço de Sequeiros em Ponte de Lima. entre os vários notáveis que ao país esta família deu, destaque-se D. João de Castro, poeta, figura de relevo da Geração de 90 (1890) e D. Mariana de S. Paulo Vasconcelos, abadessa do Mosteiro de Santa Clara. Atualmente, o Solar dos Vasconcelos é propriedade municipal classificado como Imóvel de Interesse Público, onde está instalado, desde 1991, o Auditório Municipal. Conserva na frontaria a pedra de armas da família, oficialmente atribuida em 1779 por D. Maria I. De composição esquartelada, representa as armas de quatro famílias: Limas, Vasconcelos, Monteiros e Barros.


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Diretor Alexandre Maia Editores Alexandre Maia - alexandre.maia@lexart.com.pt Hélder Guimarães - memorias@vilacondense.pt Grafismo Alexandre Maia Revisão Paula Miranda Colaboradores Textos Alexandre Maia Hélder Guimarães Mónica Sousa Valquíria Costa Casimiro Teixeira CMVC - Câmara Municipal de Vila do Conde Fotografia ACMVC - Arquivo Câmara Municipal de Vila do Conde Curtas Vila do Conde Alexandre Maia Hélder Guimarães Mónica Sousa Valquíria Costa Dr. Flores Gomes Marco Santos J. Gomes António Maia Publicidade publicidade@vilacondense.pt Contactos 919 748 989 info@vilacondense.pt Apartado 170 4481-910 Vila do Conde Propriedade Alexandre Maia | Vilacondense - Roteiro Online Sede: IMANcowork Rua 5 de Outubro, 523 Vila do Conde ISSN 2182-8709 Leitores Média mensal de 370


Praça José Régio, 168 4480-718 Vila do Conde 252 645 983


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