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CHEFE KIKO “USAR A CRIATIVIDADE PROCURÁ-LA, NÃO DEIXAR

Texto: André rubim rA ngel

Por teres nascido no Brasil, esta invasão de bolsonaristas ou “trumpinhos de imitação” (por Paulo Portas) a edifícios governamentais faz-te sentir angustiado? Olhando ao lema do país, como podem esses ditos brasileiros fazer ilegalmente o contrário?

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Em relação à situação política, no geral, eu tento não emitir nenhuma opinião pública. No entanto, o que eu posso acrescentar sobre aquilo que eu tenho assistido no Brasil é que, infelizmente, a quantidade de controvérsias e casos desde a operação “lava-jato” até estes últimos acontecimentos têm denegrido bastante a imagem política coerente daquilo que deveria ser a política, em concreto no Brasil. Revejo-me muito pouco nesses atos: tenho muita pena, pois não contribui nada para o lema do Brasil, que é «Ordem e Progresso».

A tua vinda para Portugal foi uma escolha natural ou o que te fez pesar na balança para essa decisão?

Eu vim para Portugal com 10 anos. Obviamente não foi uma escolha minha, não tinha voto na matéria. Foi uma opção dos meus pais. A minha mãe é brasileira, é de Recife, e o meu pai é português, de Sever do Vouga. Os meus pais tinham ido para o Brasil na altura do 25 de Abril e em 1990 voltámos para Portugal.

Apesar de entenderes que o teu caminho afinal não era aquele no qual te licenciaste, não achas que acabou por ser útil ao teres de gerir os teus 7 restaurantes?

Sem dúvida alguma. Acho que o conhecimento nos dá bagagem para fazermos outras coisas na vida. E o facto de ter estudado outra disciplina que não cozinha, ajudou-me bastante na gestão dos restaurantes e das equipas.

Trabalhou em alguns dos mais conceituados restaurantes do mundo. O que o levou concretamente a fazer uma pausa e sentir necessidade de ir em missão? Foi uma questão de fé, de ímpeto solidário e entrega aos outros, de querer abrandar a sua vida?

Inevitavelmente, procuramos sempre um sentido para a nossa vida. Não procuramos que o trabalho e os nossos objetivos sejam apenas o motor do sentido da nossa vida. Eu sempre trabalhei na área social, com os sem-abrigo, idosos, na prisão de Caxias, no centro de apoio a Deficientes João Paulo II, no Telhal. E o facto de ter feito esta missão em Moçambique, durante um ano, foi algo que fez muito sentido na minha vida. Ainda hoje eu tento estar ligado a projetos sociais e fazer pequenas aventuras, dentro daquilo que eu consigo ajudar na parte social.

Foi nessa experiência que te surgiu a vontade de realizar uma outra: viajar pelo planeta a «Comer o Mundo». Que principais aprendizagens e lições obtiveste desse projeto, para além da parte gastronómica?

O projeto «Comer o Mundo» nasce por eu estar em Moçambique com uma vida mais calma, mais serena e com mais tempo para pensar. O facto de querer conhecer o mundo e querer aprender mais sobre gastronomia também está muito relacionado com isso. Eu acho que os livros são importantes, o estudo é importante, mas acima disso é podermos viajar e conhecer o mundo, ir aos países de origem e perceber, exatamente, como são feitas as coisas em cada um desses países. Por isso, foi importante esta viagem e aprendi muito, principalmente a noção de ‘branco e preto’ e que não há certo nem errado.

E porquê esses 24 países escolhidos nesse teu roteiro e não outros? Já que ainda faltam outros tantos países, pensas e ambicionas recriar o «Comer o Mundo», 2.ª edição com novos rumos?

Os países foram surgindo de modo natural. Começámos pelo Médio Oriente, seguimos pela Ásia, dando a volta ao Canadá e descendo pelas Américas. O bilhete de volta ao mundo que eu tinha comprado exigia que as viagens fossem, mais ou menos, no mesmo sentido. Talvez um dia, com os meus filhos, um novo projeto dos «Martins a Comer o Mundo». Já tinha pensado sobre isso, era um projeto engraçado.

Consideras que alguém, na sua vida pessoal e profissional, fica mais incompleto e improdutivo ao não investir em viagens culturais? E quem não tem essas facilidades e condições/recursos financeiros para poder viajar: o que aconselhas?

Sim, acho que alguém fica sempre mais incompleto. As viagens, sejam elas culturais ou de outro tipo, são sempre formas de carregarmos o nosso ‘gps’ com novos mapas, novas ideias e de abrir a nossa mente. Se não temos hipótese de as fazer, por razões económicas, podemos procurar o conhecimento em livros, não sendo a mesma coisa. Obviamente que é uma pena, mas muitas vezes a cultura e o conhecimento exigem esforço financeiro. É, contudo e infelizmente, uma das condicionantes do nosso dia a dia e da nossa vida.

Uma palavra-chave na tua ação culinária é «criatividade». Com a correria dos dias, a cristalização das rotinas e o desgaste físico-mental destes tempos, de que modo a estimulas e cuidas dela para conseguires ser sempre criativo nos teus diferentes espaços e nas tuas novas receitas?

A palavra «criatividade» é uma palavra fundamental. Esta é uma pergunta muito inteligente, mas não é apenas a criatividade o mais importante. Temos de saber estudar o cliente: às vezes, o que o cliente quer, é apenas algo simples. Eu posso estar a fazer um pregado com uma crosta chinesa, com uns noddles feitos com choco em vez de massa, um molho feito à base de percebes e, no fundo, aquilo que o cliente quer é um pregado grelhado. Por isso, temos de usar

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