Vox Objetiva edição 36

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Amor sem limites

junho/12 • Edição 36 • Ano IV • Distribuição gratuita

Movimento conhecido como poliamor defende o fim da monogamia obrigatória e a liberdade de múltiplos relacionamentos

Giorgio Caravaggio

Cesare Battisti

Exposição traz um pouco do tenebrismo a Belo Horizonte

“Não quero sair do Brasil de jeito nenhum”


PORCENTUAL DE ESTUDANTES QUE ATINGEM OU EXTRAPOLAM AS METAS

entre Os 10 municípiOs BrasileirOs cOm maiOr númerO de alunOs cOm cOnhecimentO adequadO Ou superiOr aO esperadO, sete sãO mineirOs.

São Tiago (MG)

49%

Guaxupé (MG)

48%

Itaú de Minas (MG)

48%

O Governo de Minas parabeniza os alunos, pais e responsáveis,

Monte Santo de Minas (MG)

46%

professores, especialistas e analistas, enfim, toda a comunidade escolar

Capelinha (MG)

43%

Com certeza, essa conquista está relacionada aos investimentos

Amambal (MS)

43%

em infraestrutura e modernização das escolas, à valorização e à

Elói Mendes (MG)

41%

João Monlevade (MG)

41%

educação envolvidos na busca de um ensino de qualidade.

Novo Horizonte (SP)

41%

10º

O exemplO de minas para O Brasil.

Vargem Alta (ES)

39%

FONTES: ONG TODOS PELA EDUCAÇÃO / DADOS DA PROVA BRASIL 2009, DO MEC, RELATIVOS AO RESULTADO DO 9º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL EM LÍNGUA PORTUGUESA E PISA 2009.

pelo excelente resultado obtido no ranking da ONG Todos pela Educação.

qualificação continuada dos servidores da educação. E reflete, sobretudo, os anos de empenho, dedicação e trabalho de todos os profissionais da

ACESSE E SAIBA MAIS: www.educacao.mg.gov.br


MetrOpolIS • OLHAR BH

Beagá radical Luiza Villarroel

“Que belo horizonte!”, exclamou o Papa João Paulo II ao avistar a capital da Praça Israel Pinheiro. O ano era 1980. Na ocasião, o pontífice fazia uma visita ao Brasil. Desde então, o local é conhecido como Praça do Papa. Ao contrário dos sábados e domingos, em dias de semana a tranquilidade impera no espaço, fazendo dele palco ideal para a prática de esportes. Feita em uma segunda-feira, com a luz amarelada do fim de tarde, a fotografia mostra Thiago Duarte, presidente da Federação Mineira de Skate Downhill, treinando naquele que é um dos mais belos cartões-postais da capital mineira.

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Expediente

A Revista Vox é uma publicação mensal da Vox Domini Editora Ltda. Rua Tupis, 204, sala 218, Centro - Belo Horizonte - MG CEP: 30190-060.

“... O povo que conhece o seu Deus se tornará forte e ativo.” (Daniel 11:32)

Editorial

CARLOS viana Editor-Chefe carlos.viana@voxobjetiva.com.br

Sem punição, a lei é morta

• Editor e jornalista responsável Carlos Viana • diagramação e arte Graziele Martins • Capa Shutterstock • Reportagem André Martins Henrique André • ESTAGIÁRIOS Fernanda Carvalho Bianca Nazaré

O leitor de Vox Objetiva tem a oportunidade de ler uma entrevista reveladora. A repórter Fernanda Carvalho foi recebida por um dos nomes mais polêmicos do noticiário político brasileiro há alguns meses. Trata-se do ativista italiano, agora quase brasileiro, Cesare Battisti. Condenado na Itália por vários crimes de assassinato em nome da esquerda ideológica radical, Battisti aportou em nossas terras com passaporte falso e acabou recebendo a “benção” do ex-presidente Lula. Ganhou o direito de se ver longe da cadeia entre nossos mares e montanhas.

• diretoria Comercial Solange Viana

Escritor em busca de contar as memórias dos tempos em que se diz perseguido pela Justiça italiana e capitalista, o terrorista não se exime de falar sobre qualquer assunto. Sente-se, com razão, livre para expressar e respirar os ares da liberdade concedida pelo Estado brasileiro. Começou vida nova, sendo tratado em muitos lugares como uma espécie de celebridade.

• anúncios comercial@voxobjetiva.com.br (31) 2514-0990

Naturalmente todas as pessoas que cometem erros têm o direito de recomeçar uma trajetória, desde que paguem pelos crimes cometidos.

• ATENDIMENTO jornalismo@voxobjetiva.com.br (31) 2514-0990 www.voxobjetiva.com.br

Em nosso país não tem sido assim. Criminosos violentos ou sorrateiros do “colarinho branco” conseguem se ver livres das sentenças judiciais por meio de manobras jurídicas ou dos benefícios concedidos por uma legislação cada vez mais leniente.

• CORRESPONDENTES Greice Rodrigues -Estados Unidos Ilana Rehavia - Reino Unido

• REVISÃO Versão Final • tiragem 30 mil exemplares Os textos publicados em forma de artigos, produzidos por colunistas convidados, expressam o pensamento individual e são de responsabilidade dos autores. Todos os direitos reservados. Os textos publicados na revista Vox Objetiva só poderão ser reproduzidos com autorização dos editores.

O sorriso largo e reluzente de Cesare Battisti tem o mesmo significado do silêncio de “Carlinhos Cachoeira” diante da CPMI que investiga as ligações criminosas do bicheiro com políticos e empreiteiras. Expressam as faces de uma impunidade que se tornou lugar-comum no Brasil. Um, é vero, já está livre. O outro se diz vítima de um sistema corrompido. Um dos mais renomados nomes do nosso Direito, o professor e criminalista Heleno Fragoso, ensinava que “muito mais eficiente que a pena é a certeza da punição”. De fato, os tempos mudaram.


charge

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sumário Fernanda Carvalho

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Fernanda Carvalho

verbo............................................................. entrevista • CESARE BATTISTI

Após “massacre midiático”, ex-ativista político retoma a vida longe da Itália Stock.xchng

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METROPOLIS.............................................. INTERNACIONAL • A VOLTA

COMPORTAMENTO •

POLIAMOR

Eles pregam que o amor por mais de uma pessoa faz parte da natureza humana

Mexicanos retornam para casa e taxa migratória cai a 0

Artigos.............................................................................

METEOROLOGIA • Ruibran dos Reis

POLÍTICA • Paulo Filho

O futuro da Terra está em nossas mãos.......................................

Julgar o “mensalão”.............................................................

JUSTIÇA • Robson Sávio A indústria da violência.......................................................

A sustentável leveza............................................................

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CRÔNICA • Joanita Gontijo A temperatura da sopa........................................................

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SALUTARIS........................................................................

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VINHOS • VARIEDADE As uvas e os terroirs.........................................................

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Evite que seu prédio venha a ruir..........................................

PSICOLOGIA • Maria Angélica Falci

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RECEITA • PALADAR Risoto Mineiro..................................................................

IMOBILIÁRIO • Kênio Pereira

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Capa...................................................................


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Salutaris..................................................

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salutaris..................................................

COMPORTAMENTO • O TROCO

Profissionais da mente explicam por que revidar ajuda a combater a violência

SAÚDE • UNIVERSO ONÍRICO

Os sonhos contribuem para o aprendizado e podem trazer revelações Divulgação/ Território Tupiniquim

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Stock.xchng

podium.........................................................

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ESPORTE • VIOLÊNCIA ASSISTIDA?

kultur.......................................................... RETRÔ E VINTAGE • “BONS TEMPOS”

A música que marcou a história e a vida dos fãs aficionados pelo passado

kultur..........................................................

CINEMA • PROMETHEUS

Ridley Scott dirige superprodução que retoma o mito da vida extraterrestre

MMA divide opiniões: esporte ou pancadaria gratuita?

Fernanda Carvalho

PODIUM......................................................... VEÍCULOS • DISPUTA ACIRRADA

F1 “pega fogo” com oito diferentes campeões nos oito circuitos disputados Divulgação/ Mentes Brilhantes

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vanguarda.............................................. TECNOLOGIA

• CIENTÍFICOS

Brinquedos estimulam inteligência infantil, substituindo os presentes clichês

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kultur.......................................................... ARTES PLÁSTICAS

• CARAVAGGIO

Obras do pintor italiano em exposição inédita na capital dos mineiros

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VERBO

O prisioneiro do passado Cansado de carregar o peso da vida conturbada e de ver o próprio nome vinculado ao terrorismo, o escritor Cesare Battisti busca a simplicidade, uma vida tradicional no país que ele escolheu chamar de seu Fernanda Carvalho O sotaque reforça as origens italianas. No Brasil há aproximadamente oito anos, ele veio para viver no país do Carnaval, mas viu os anos passarem na monotonia, quase o tempo todo preso a sete chaves. Na Península Itálica teria sido pior. Com o futuro determinado por uma condenação, Cesare Battisti teria apenas passado pela vida: estaria para sempre atrás das grades e sem sentir o calor do sol italiano. Mas ele fugiu e, depois de residir na França e no México, atracou os pés nas terras equatoriais brasileiras para ficar. O nome Cesare Battisti foi, por muito tempo, sinônimo de terrorista. Ele foi acusado de ter cometido quatro assassinatos na época em que era um dos membros do grupo de extrema esquerda Proletários Armados pelo Comunismo. Apesar de 70 ter sido uma década de muito terrorismo político para a história italiana, Battisti viu o próprio rosto estampado em jornais mais vezes do que qualquer ativista político italiano da época. Pouca gente parece notar, porém, que “outro homem” surgiu de Cesare. Há cerca de vinte anos ele publica livros: são quase vinte obras. Neste ano, Battisti lançou Ao pé do muro na 3ª Bienal do Livro de Minas. Em um bate-papo com a VOX OBJETIVA, o escritor falou sobre o Brasil, os livros e sobre sua história de vida, que tanto se confunde nas narrativas que as próprias mãos redigem.

Você está lançando o livro “Ao pé do muro”, que mostra realidades brasileiras sob o olhar do protagonista Augusto, um foragido internacional que vem para o Brasil em busca de proteção. Como ex-ativista político, como você enxerga o Brasil? O Brasil é uma nação que não se pode considerar nem desenvolvida, nem menos desenvolvida; nem à frente, nem atrás. É uma nação diferente, que tem algo que eu ainda não consigo entender. E isso é o que faz com que eu grude aqui. É um país jovem que, mesmo passando por diversas dificuldades, tem um gesto de viver o drama com alegria. É um país que faz inveja a muitos outros do chamado “primeiro mundo”. Hoje todos gostariam de viver aqui. O Brasil é um país que acolheu todo mundo. A história do Brasil é essa. Então o povo brasileiro está acostumado a receber, a ser tolerante, a entender e a compreender as ideias e as culturas dos outros povos. E essa tolerância não existe nos outros continentes, nos outros países. Isso é o que faz do Brasil um país bom para viver, porque cultura gera economia também. E a economia pode gerar cultura, se for uma economia justa. Este país está gerando muita cultura. É por isso que a economia está se desenvolvendo muito. Agora esperamos que isso seja distribuído para todo mundo e que não existam dois Brasis. É por esses motivos que, depois de ter se exilado na França e no México, você resolveu vir para o Brasil?


Divulgação


VERBO

Eu vim, porque me interessava o Brasil. Eu poderia ir para outros países onde talvez não ficasse quatro anos e meio na prisão. O Brasil me interessava pela situação política e pela, digamos, indústria cultural. Claro que eu não imaginava que ia passar parte desses dez anos na cadeia. Você não tem vontade de voltar para a Itália? Não. Itália de jeito nenhum. Faz muito tempo que estou fora e não tenho nenhuma relação com o país. Na França, sim: tenho duas filhas lá. Sou divorciado. Voltaria à Europa para visitar, mas para viver, nunca. Você acha que algum dia os italianos que “querem sua cabeça” vão te esquecer? Eles não vão esquecer, porque esse é um bom pretexto para esconder outras coisas. Eu sou como uma cobertura, uma ótima cobertura para muitas coisas. Quando evidenciam o Cesare Battisti, não se fala de toda a podridão que existe no poder; não se fala da crise; não se fala da Itália que está em falência. Durante todos os anos, eles encobriram tudo: corrupção, máfia no governo, falência da economia italiana por uma administração mafiosa, operações eleitorais. É bom pegar Cesare Battisti, quando falta um mês para as eleições, né?!

anos. Nesse período, eu vivi no México, na França e escrevi quase 20 livros, escrevi roteiros para filmes, fiz voluntariado de atividade social,... Eu sou isso aí. Não sou o que falaram de mim. Nunca se falou, durante essa campanha imunda, durante todo esse massacre midiático, que isso era dos anos 70. Sempre deixavam de citar esse fato importante. Não posso falar da política brasileira. Essa é uma das condições... Mas é como se falássemos das coisas da Dilma durante a ditadura como se tivessem acontecido hoje. Foi um pandemônio. O jornalismo não sabe mais o que é a ética profissional. Ele se vendeu. Assim como você disse, na época da ditadura brasileira existiram vários movimentos, inclusive armados, de esquerda, dos quais a atual presidente fez parte. Existia alguma relação entre grupos brasileiros e os Proletários Armados pelo Comunismo?

É como se falássemos das coisas da Dilma durante a ditadura como se tivessem acontecido hoje

Você deu uma entrevista à TV Folha na qual disse que a sua principal intenção é deixar de ser o Cesare Battisti terrorista. Você já alcançou o seu objetivo? Estou perto de alcançar. Acho que essa mídia brasileira, a grande mídia, que foi cooptada pela Itália de maneira manifesta, flagrante, não tem mais motivos, talvez não haja mais recursos para continuar falando o que a Itália quer. Então, por exemplo, trocaram a palavra terrorista por ativista político, já se fala em livro, escritor,... Eu sou escritor há 30 anos e, quando falam de mim, falam como se a atividade política tivesse acontecido ontem. Aconteceu há 32

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Relação ideológica, com certeza. Porque era uma luta pela liberdade, pela igualdade e contra as autoridades e os abusos de poder. Agora organizativa não.

Após muita luta, esses grupos conseguiram chegar à liderança no Brasil, como o PT, que foi criado como um partido para representar o povo e lutar por ele. Os Proletários também conseguiram chegar ao poder na Itália assim como no Brasil? Não. Nós perdemos e não existe mais nenhum partido, nenhuma organização, mesmo porque a organização da qual eu fazia parte não aceitava a forma de partido. Não nos considerávamos um partido. Nós não queríamos tomar o poder. Nós só queríamos abrir espaços de contrapoder; só queríamos lutar contra a corrupção e os abusos. Mas perdemos. Ainda estamos pagando, porque existem presos políticos na Itália, mesmo tendo se passado 40 anos. Não sei quem disse que não tem nada pior para um revolucionário do que tomar o poder. O revolucionário que toma o poder começa a ser reacionário. Então nós perdemos


VERBO

sim. Mas ficamos revolucionários, né?!

tão forte que ninguém quer engolir.

Na época em que Lula negou a sua extradição para a Itália, especialistas em relações internacionais afirmaram que o país só tinha a perder. Por que você acha que o Lula resolveu acolher você?

Qual é a sua intenção a partir de agora? Já tem alguma nova história em mente?

O Lula cumpriu o seu governo. Ele não deu presente a ninguém. Não nos conhecemos. Com certeza, não compartilhamos os mesmos ideais. O Lula era, e ainda é, eu acho, um grande estadista, um “animal político”, uma espécie que está desaparecendo. Ele é um estadista que tomou uma decisão que pode ser impopular. Mas ele não arriscou nada. Ninguém poderia dizer que ele tomou uma decisão errada. Mas ele pode, com provas na mão, dizer que tomou uma decisão justa. O Lula se informou, mandou pessoas para se informar. Ele sabe que eu sou um militante político e que na Itália existiu uma guerrilha. O Lula não é bobo. E ele não correu nenhum risco. Podem passar mil anos e ninguém vai conseguir provar que o Lula tomou uma decisão errada. Quem tomou a decisão errada foi o STF, quando tirou o recurso político. O Supremo invadiu o Poder Executivo e quebrou uma norma constitucional... Voltando aos seus trabalhos, o que seus livros representam para você? Sem livros eu não tinha o que tenho. São uma forma de continuar a luta, um combate por meio da crítica, de sublimar o desejo de ação, os ressentimentos, as ilusões. É um pretexto para denunciar injustiças, inverdades. É um sonho e uma maneira de continuar sonhando, sem passar pela cadeia. Seus livros parecem um tanto quanto autobiográficos. Por que dar nomes a personagens que “são você”? Porque eu escrevo romances, e todo escritor sempre escreve só um livro, continua escrevendo o mesmo livro e está sempre falando dele mesmo. Ele inventa a história, mas o tema é sempre o mesmo. Um autor Lorem Ipsum Dolar amet quando acha que escreveu O honesto para desit escrever consectetur adipiscing elit. livro, que escreveu, enfim, o que queria dizer. Eu ainda Praesent malesuada urna não fiz O livro. Vou continuar a escrever. Mas é claro ornare libe. que a ficção é um recurso para diluir a realidade. Se você faz um romance escrevendo sobre a realidade tal como é, não é um bom romance, porque a realidade é

Minha principal preocupação é me integrar com as ideias, com as imagens, as expressões, o jeito, o jeitinho do povo daqui. Por exemplo: eu começo Fernanda Carvalho

Battisti em lançamento de “Ao pé do muro” na Bienal do Livro 2012 .........................................................................................................................

a sonhar que teria que escrever, eu não diria em português, diria em brasileiro mesmo. Quero escrever sim. Há ideias, mas não vou desenvolver isso antes de estar certo do que estou dizendo exatamente e de saber por que gosto deste país, de saber por que há pessoas que têm um charme particular, uma coisa nos olhos, uma expressão. Não é fácil escrever sobre esse mistério. Você pode parecer muito fútil, superficial, como um turista que diz: “Ah, que bonito!”. Para não cair nisso, estou dando um tempo. Como você enxerga o seu futuro? (Risos) O meu futuro? Nesse momento da minha vida a única coisa que passa pela minha cabeça é me casar (risos). Quero ter filhos, formar uma família,... E isso tudo no Brasil? Sim, claro! Não quero sair daqui de jeito nenhum. Nem se me dessem a cidadania japonesa. (risos).

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ARTIGO - POLÍTICA

pAULO fILHO Jornalista e consultor de Comunicação Social paulojfilho@ig.com.br

Julgar o “mensalão” No meio de tantos escândalos políticos e denúncias de corrupção, o país precisa avançar. É preciso mostrar que o Brasil é capaz de funcionar sob regras e normas. Sobretudo, é necessário haver correção. Está mais do que na hora de darmos um bom exemplo. O país deve mostrar que tem leis, elas valem e precisam ser observadas. Revelado em 2005, o escândalo do mensalão aguarda há sete anos por um desfecho. Agora parece que vai. Está previsto para o dia 1º de agosto, o início dos trabalhos do Supremo Tribunal Federal (STF) no processo de julgamento dos envolvidos no mensalão. Vale lembrar que o escândalo veio a público pelas delações de um dos seus próceres, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB/RJ). A denúncia revelou a “compra” de deputados e votos para a base do governo Lula. Pagamentos regulares eram feitos para beneficiar figuras centrais do governo e do PT. Será bom para o país, especialmente para o governo, para os partidos, para as instituições da Justiça e para a democracia, que esse caso chegue ao fim, atribuindo penas justas aos que tenham culpa e inocentando os inocentes, caso existam.

corruptos que chegam ao poder. Seria o pior e mais degradante dos cenários: um fato para desmoralizar por completo nossas instituições, consolidando a imagem de que somos uma “república de bananeira de quinta categoria”. É constitucional os réus se defenderem e legítimo eles tentarem influenciar a opinião pública – até mesmo a dos magistrados. Para isso, eles podem se valer de possibilidades e subterfúgios da lei. Mas chega a ser deplorável o comportamento e as atitudes de alguns que tentam “melar” o julgamento do caso. Nesse segundo campo está, infelizmente, o ex-presidente Lula.

Mas é possível que vários dos crimes imputados aos réus sejam prescritos

O mensalão é considerado o maior caso de corrupção política do país, nas últimas décadas. É o esquema com maior número de envolvidos, cargos e funções que desempenhavam e o volume financeiro mais expressivo. Mas é possível que vários dos crimes imputados aos réus sejam prescritos. E mais uma vez isso vai significar impunidade para delinquentes e

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O ex-presidente tem uma popularidade transbordante, uma influência onipresente sobre o governo e o controle totalitário e messiânico sobre o PT. Mas frequentemente ele está se valendo dessa posição privilegiada para faltar com a compostura e o senso ético. Medíocres e tacanhos podem ser adjetivos que ilustram a termo algumas atitudes e o comportamento de Lula nos últimos meses, tendo como objetivo evitar ou conturbar o julgamento do mensalão. A determinação e as articulações para a instalação da CPI do Cachoeira têm o intuito de encurralar a oposição e constranger o Procurador-Geral da República. E as conversas nada republicanas e as pressões diretas sobre juízes do STF – como é o que parece ter ocorrido com o Presidente do Supremo, o ministro Gilmar Mendes – estão se apresentando como tiros que saíram pela culatra.


Artigo • Justiça

ROBSON SÁVIO REIS SOUZA Filósofo especialista em segurança pública robsonsavio@yahoo.com.br

A indústria da violência O Brasil convive numa guerra não declarada. Causas externas representam a terceira razão mais frequente de morte, configurando-se como inquestionável desafio para os gestores de políticas públicas. Essas causas de morbidade e mortalidade compreendem as lesões decorrentes de acidentes e de violências. Dados do Ministério da Saúde obtidos em 2010 apontam as causas externas como responsáveis por mais de 138 mil óbitos por ano. Em 2009, a média foi de 380 óbitos por dia atribuídos a causas externas. Em relação a causas específicas, a média diária registrada é a seguinte: 142 pessoas por agressões, 103 por acidentes de transporte terrestre, 25 por quedas e outras 25 por suicídio. A soma das mortes por acidentes ou violência chega a 16 a cada hora.

Desde os anos de 80, a criminalidade vem crescendo principalmente nas regiões de grande vulnerabilidade social. Enquanto se dizimavam milhares de vidas em becos e ruas das favelas brasileiras, a sociedade assistia impávida à carnificina. E a violência foi ampliando seu raio de atuação: sequestros, assaltos em plena luz do dia e envolvimento de agentes públicos de vários escalões da república com o crime.

De alguma forma, todos nos sentimos reféns do crime e do medo

Os cerca de 50 mil homicídios por ano tornaram o Brasil o segundo país mais violento do mundo em números absolutos. Apenas 8% desses casos são esclarecidos. A brutalidade policial bate recorde. O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, além de ser o contingente que cresce mais rápido. Resultado: em média ocorrem 80% de reincidência criminal. Somando-se à violência real, a superexposição da violência na mídia, a perversidade dos criminosos, a banalização da vida e da morte e a baixa eficiência do poder público no combate e na prevenção do crime, o resultado é um estado de letargia coletivo: uma espécie de acomodação e impotência à espera do pior.

Dado que em relação aos direitos existem abismos que nos separam, lamentavelmente foi a violência que passou a nos igualar. De alguma forma, todos nos sentimos reféns do crime e do medo. Mas em vez de nos unirmos para a melhoria da segurança pública, o que vimos foi a imensa ampliação da segurança privada.

A insensatez dos ricos, a incúria dos governantes e a omissão da sociedade agora estão em xeque. O problema passa a ser de toda a nação que se aprisiona no espaço privado, pois o espaço público parece terra de ninguém. Se a violência nos iguala, juntemos nossas forças na construção de uma sociedade mais justa. Afinal a paz é fruto da justiça. Somemos nossas vozes com os protestos por um país decente, mais justo e igualitário. Não percamos essa oportunidade que, mesmo trágica, possibilita uma coesão nacional na construção de uma cidadania efetiva para todos os brasileiros.

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Metropolis • internacional

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Após quatro décadas de crescimento, número de imigrantes anúncio que deixam os Estados Unidos supera o número dos que entram no país

Greice Rodrigues Estados Unidos é o país com a maior população de imigrantes do mundo. São 40 milhões de estrangeiros espalhados por todo o país. Mas nenhuma nação tem tantos representantes no território americano como o México. São 12 milhões de mexicanos, sendo que mais de 50% deles vivem ilegalmente. A maioria enfrenta a perigosa aventura de cruzar a fronteira em busca de uma vida melhor no país vizinho. Sem os documentos legais, eles vivem um tormento diário. Ainda assim se arriscam. A entrada desses imigrantes é um fenômeno que a nação mais poderosa do mundo nunca conseguiu impedir. Considerada por muitos especialistas como fora de controle, a chamada “invasão” mexicana começa a desacelerar, chegando praticamente a uma total paralisação nos últimos anos. Essa é a conclusão de um estudo feito pelo Centro de Pesquisa Hispânico (Pew Hispanic Center) – uma entidade de investigação independente, com sede em

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Washington - EUA. A pesquisa apontou um importante declínio do fluxo de mexicanos que entram no país e um drástico aumento do número de pessoas que estão voltando para casa. Entre 2005 e 2010, cerca de 1,4 milhão de imigrantes mexicanos entraram ilegalmente nos EUA, de acordo com a pesquisa. Mas no mesmo período constatou-se que outro 1,4 milhão fez o caminho inverso. Uma conta cujo resultado é 0. Para entender o que isso significa, basta ver os números contabilizados entre 1995 e 2000. No intervalo de cinco anos, 3 milhões de mexicanos chegaram aos Estados Unidos e menos de 700 mil regressaram ao país de origem.”Não temos certeza de que essa queda vai continuar, mas sabemos que o impasse atual é mais do que apenas uma pausa”, analisa Paul Taylor, diretor do Pew Hispanic Center. Na história dos EUA, nenhum país enviou tantos


metropolis • internacional

imigrantes como o México fez nas últimas quatro décadas. O rápido crescimento começou na década de 80. O “primo pobre” dos norte-americanos se tornava o principal país de origem dos imigrantes que davam entrada na terra de Tio Sam. O segundo país em número de representantes é a China, responsável por 5% do total de imigrantes. Por isso, esse declínio é considerado um fato histórico. De acordo com o Centro Hispânico, há algumas explicações para esse fenômeno. Além de não possuir documentos legais – visto ou autorização de trabalho –, a maioria dos imigrantes mexicanos tem baixa escolaridade e não domina o inglês. Isso reflete na ocupação de postos de trabalho pouco valorizados ou no setor de construção civil. Desde quando o mercado imobiliário americano entrou em colapso, há cinco anos, o trabalho ficou escasso, tornando a vida dessas pessoas ainda mais difícil. E a situação foi agravada pela recessão econômica que castiga a América. Para milhares de mexicanos, voltar para casa tem sido a alternativa mais viável. Na avaliação dos pesquisadores sobre a redução no saldo migratório em pelo menos duas décadas, essa é a primeira queda significativa no número de imigrantes mexicanos não autorizados que vivem nos EUA. Em 2007, eles eram 7 milhões. Em 2011, o número caiu para 6,1 milhões. “Este parece ser o primeiro declínio sustentado do número de imigrantes mexicanos, desde a Grande Depressão,” revela o pesquisador. O relatório aponta também uma expressiva queda no número de apreensões de mexicanos tentando cruzar a fronteira ilegalmente. “Em 2005 foi 1 milhão de prisões. Em 2011, o número caiu para 286 mil. A redução foi de mais de 70%”, aponta o relatório. O declínio ocorreu no momento em que as autoridades americanas intensificaram a fiscalização e a vigilância das fronteiras. O aumento da fiscalização é outra consequência de uma legislação com penas e leis mais severas para quem se aventura a entrar no país clandestinamente. “Alguns estados americanos, como o Arizona, aprovaram leis mais rigorosas com o objetivo de reduzir a imigração clandestina”, revela a pesquisa. Uma das novidades da lei transforma a

imigração ilegal em crime e concede poderes à polícia estadual para abordar e prender qualquer imigrante sem documentos. A falta de uma legislação mais objetiva sobre o assunto tem precupado especialistas e entidades de direitos humanos, mas é um dos principais temas de campanha dos candidatos à presidência dos EUA. O republicano Mitt Romney, por exemplo, defende uma política de “autodeportação”, que impede imigrantes de trabalhar. Eles são forçados a regressar a seus países. Parece óbvio o fato de a maioria dos imigrantes torcer para que a candidatura de Romney não vingue. a volta para casa Efeito semelhante também vem ocorrendo no Brasil. Dados divulgados pelo IBGE mostram que milhares de brasileiros que deixaram o país estão fazendo o caminho de volta. A maioria vem dos Estados Unidos. De acordo com o Censo 2010, foram registradas 286,5 mil entradas de imigrantes internacionais no Brasil. O índice é 86,7% maior que o número apurado em 2000. Naquele ano foram 143,6 mil registros. Do total de imigrantes que retornaram ao país, 174,6 mil eram brasileiros. Em 2000 foram 87,9 mil retornos. De acordo com Maden Campos, pesquisador do IBGE, o Censo não revelou, mas os motivos desse movimento migratório podem ser os mesmos observados no caso dos mexicanos. “A intensificação da fiscalização imposta ao imigrante ilegal e os sinais de fraqueza dados pela economia podem ser a causa ou ter alguma relação com esse movimento, embora a pesquisa não tenha apurado esses detalhes”, explica. Os números da imigração nos Estados Unidos* Mexicanos – 12 milhões Chineses – 2 milhões Brasileiros – 1,3 milhão * número estimado Fonte: Itamaraty e PEW Hispanic Center

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Artigo • IMOBILIÁRIO

kÊNIO DE SOUZA PEREIRA Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-MG keniopereira@caixaimobiliaria.com.br

Evite que seu prédio venha a ruir Vários foram os edifícios que ruíram nos últimos meses. As tragédias implicaram perdas humanas e financeiras. Na maioria dos casos, faltou aos proprietários dos edifícios agir no momento oportuno. Participei de dezenas de assembleias de condomínio como advogado contratado para exigir a reparação dos danos e indenizações das construtoras. Depois das reuniões, passei a compreender os motivos de alguns edifícios perderem seu valor comercial e se tornarem fator de risco à segurança. Por incrível que pareça, são os proprietários das unidades que deixam os vícios de construção chegarem ao ponto de o prédio ruir. Eles não caem da noite para o dia. desunião e omissão

Enquanto não evoluirmos culturalmente, novas tragédias vão ser provocadas pela inércia e falta de profissionalismo

Muitos acham que postular uma ação judicial para exigir o cumprimento de uma obrigação é ruim. Eles só pensam nos gastos. Assim, preferem ser amistosos, pacientes e pedem a Deus que ilumine o construtor para que ele faça reparos que podem custar milhões de reais. Por sua vez, o construtor pode estar com situação financeira crítica. Daí ele foge do problema, enrola ou faz reparos paliativos e reza para que passem os cinco anos necessários para prescrever o direito do cliente de reclamar. As pessoas gostam de resmungar e fazem diversas assembleias sem orientação jurídica nem pericial.

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Nas reuniões, cada um “saca da cartola” uma solução “sem pé nem cabeça” e assim nada decidem de forma eficiente. Os defeitos vão aumentando, infiltrações tomando conta das ferragens, que oxidam e rompem o concreto. Os proprietários reclamam que seus automóveis estão sendo danificados pelas goteiras. Em vez de assumir o alto ônus de refazer a manta de impermeabilização, a construtora simplesmente instala bandejas no teto de garagens, que desviam as goteiras para um cano que escoa a água para um ralo. De forma ingênua, o proprietário aceita reparos paliativos e a “maquiagem”. economia inconsequente

Em centenas de prédios, os proprietários não se unem, acham que os problemas não são deles e que o síndico deve se virar. Diante do desequilíbrio de conhecimento entre os moradores e a construtora, há proprietário mais experiente que orienta o condomínio a contratar um advogado especialista e um perito. Mas logo vêm outros e dizem: é caro! Assim, deixam de investir 2% do valor da unidade, são premiados com uma desvalorização média de 35% do patrimônio e perdem o valor de multas e indenização que ficariam a cargo das construtoras saldarem e beneficiar o condomínio. Pensam pequeno, sem refletirem em longo prazo. E conquistam um enorme prejuízo! É comum haver proprietário ou amigo do construtor que sabota a assembleia e depois vende seu apartamento para outra “vítima”.


O Brasil cresceu, com a garra do seu povo, com a esperança que está no ar e com a alegria de cada brasileiro, com soluções originais que abrem caminho para o futuro do planeta. Futuro onde produzir e preservar se integram. Hoje, o Brasil é respeitado porque inclui e melhora a vida das pessoas e protege o meio ambiente.


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Banco de imagens do MinistĂŠrio do Turismo.


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O “mito” da monogamia Militantes do amor e do sexo livre, os poliamoristas defendem o direito de amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo Bianca Nazaré Cadinho expõe uma questão que choca e gera sofrimento ainda hoje no Ocidente: amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo e não poder viver essa experiência. O personagem do ator Alexandre Borges vive com duas mulheres concomitantemente, sem que elas saibam, e dá umas “escapulidas” com a amante Aléxia (Carolina Ferraz). É difícil esquematizar a convivência mútua com Verônica (Débora Bloch) e Noêmia (Camila Morgado), as oficiais. Para estar com a segunda, Cadinho sempre arruma uma

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viagem a trabalho para justificar a ausência da casa da primeira. É um verdadeiro sufoco. Para o escritor e criador das cenas do mulherengo de Avenida Brasil, Antonio Prata, o personagem não é um cafajeste total. “O Cadinho sofre muito na mão daquelas mulheres para satisfazê-las. A gente falava, eu e o João (Emanuel Carneiro, criador da novela), que Cadinho não é um cara poligâmico e sim apaixonado pela monogamia. Tão apaixonado que repetiu três vezes”, brinca o colaborador da novela, que vai ao ar na Rede Globo.

Ao contrário do que pensa o escritor, mesmo com humor, Cadinho ilustra um dilema real, muitas vezes silenciado. O problema é tão presente que inspirou a pesquisa orientada pela psicóloga e professora Noely Montes Moraes. Estudo que gerou o livro É possível amar duas pessoas ao mesmo tempo? A resposta à pergunta é sim. É possível. “Mas se relacionar depende, porque vivemos numa sociedade

Apesar da polêmica, Prata acredita que amar três mulheres ao mesmo tempo seja coisa de novela. “Acredito que esse personagem não seja nada realista. Se fosse, esse cara seria um cafajeste: tem duas famílias, e uma não sabe da outra. Mas todo mundo entende que é brincadeirinha”.

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monogâmica, embora hipócrita. Relacionar-se com mais de uma pessoa traz uma carga imensa de sofrimento para todos, a menos que se tratem de canalhas ou cínicos. Então isso não dá direito à poligamia. Não somos escravos de nossos desejos e necessidades”, completa a pesquisadora da PUC de São Paulo. Conhecida por levantar a bandeira do amor livre no Brasil, a psicanalista e escritora Regina Navarro Lins concorda com Moraes sobre a possibilidade de amar duas ou mais pessoas ao mesmo tempo. Discorda, contudo, da afirmação de que esse amor não daria direito à poligamia. “Um dos pressupostos mais universalmente aceitos em nossa sociedade é o de que o casal monogâmico seja a única estrutura válida de relacionamento sexual humano. Entretanto, as sociedades que adotam a monogamia têm dificuldades para comprovar que ela funciona. Pelo contrário. Parece haver grandes evidências, expressas pelas altas taxas de relações extraconjugais, de que a monogamia não funciona muito bem para os ocidentais”, rebate Lins.

vivendo o amor No mundo todo, cresce o número de indivíduos seguindo em sentido oposto ao dos costumes, assumindo afeição por diversas pessoas ao mesmo tempo. Essa mudança na sociedade ganha força com a bandeira levantada por alguns movimentos, como o poliamor. Ainda que temerosos pela exposição da própria imagem e de seus companheiros, é possível encontrar indivíduos satisfeitos com relacionamentos múltiplos, como a filósofa e estudante de psicologia Silvia, 36 anos. Silvia viveu com uma pessoa durante dez anos, mas sempre teve que abafar a atração por outros homens, amando-os platonicamente. Ela terminou o namoro após conhecer outra pessoa e não conseguir se afastar dela. Chegou a propor uma relação a três, mas eles não aceitaram. Então ela investiu no novo amor.

Parece haver grandes evidências, expressas pelas altas taxas de relações extraconjugais, de que a monogamia não funciona muito bem para os ocidentais

Com o segundo companheiro, houve os mesmos problemas: ciúmes e traições. Até que, novamente, conheceu alguém que a abalou, mas complemente diferente dos outros. “Assim que conheci o Leandro, nós nos apaixonamos. Disse a ele que me A psicanalista concluiu, após separaria por vontade própria anos de estudos e consultas, e, se fôssemos ficar juntos, eu que aqueles que abandonam o nunca mais repetiria os moldes casamento para seguir um novo de relacionamento. Ele sempre amor, acabam seguindo o mesmo Regina Navarro Lins teve uma cabeça muito aberta e modelo de relacionamento. O uma autoestima absurda. Essas sofrimento causado ocorreria duas coisas foram essenciais para porque, quando se depara com a o caminho que começamos a trilhar. Então, desde “traição” do marido ou da esposa, o ser humano sente o início, eu sempre tive liberdade para me envolver que falhou ou que o companheiro não compartilha com outras pessoas e ele também. Mas nada é simples, o amor de antes. Isso é um erro e uma mentalidade claro”. herdada do século XII, época do surgimento do amor romântico - o amor cortês impossível e idealizado Com o tempo, Silvia foi abrindo para Leandro a no Ocidente -, segundo a autora de A cama na possibilidade de arrumar outro namorado, já que o varanda e de dez outros livros sobre relacionamento companheiro viajava muito. Vencido o ciúme do início e sexualidade.

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e juntando o acaso, a filósofa conheceu o carioca Frederico num show em Belo Horizonte, em setembro do ano passado. Durante um mês, os dois mantiveram contato por MSN. “Eu deixava claro para o Frederico que amava o Leandro e deixava claro para o Leandro que estava começando a gostar de outra pessoa. Eles ficaram amigos de Facebook, antes mesmo do meu reencontro com Frederico. Isso foi tornando a coisa mais leve”. A terceira visita de Frederico à Belo Horizonte selou o começo do triângulo amoroso. Foi o momento em que os rapazes se dedicaram a conhecer um ao outro. Segundo Silvia, tudo aconteceu naturalmente, devido à honestidade com que enfrentaram a situação. “Isso os deixa seguros de que nunca vou mentir para eles. Já passamos por cada coisa! Quase terminei com um e chorei no colo do outro. Tive discussão com um, e o segundo defendeu não a mim, mas o primeiro”, lembra.

não impede a possibilidade de os companheiros terem outras relações sexuais esporádicas e responsáveis. Um dos argumentos da filosofia é que o amor não deve excluir o mundo. A crença de que um indivíduo vai amar somente uma pessoa pelo resto da vida é algo impossível para a ideologia. Para eles, um segundo amor não anula o primeiro, assim como um segundo filho não acaba com o amor dos pais pelo primeiro. Carlos Latuff

Leandro e Frederico se tratam com cordialidade, e os encontros públicos ocorrem com naturalidade. “É engraçado quando um diz ‘amor, pega isso pra mim’. E o outro diz ‘eu também quero, pega para mim também, amor’. Em janeiro, Frederico passou parte das férias aqui, antes e depois de irmos a Porto Alegre. Esse foi o período em que convivemos os três por mais tempo em casa”, conta Silvia. relacionamento honesto A história de amor de Silvia se enquadra na filosofia de vida dos chamados poliamoristas ou poliamantes. O movimento cresce desde a década de 80 e vem se fortalecendo no Brasil com o grupo de discussões paulista Pratique Poliamor Brasil (poliamorbrasil. org) e mais radicalmente com a Rede Relações Livres (rederelacoeslivres.wordpress.com), em Porto Alegre. Poliamor não é relacionamento aberto. Os poliamoristas permitem que o companheiro tenha relacionamentos concomitantes, caso se apaixone por outras pessoas - desde que haja honestidade mútua. Como a honestidade sugere, a fidelidade entre eles está implícita, ou melhor, polifidelidade. Mas isso

Os poliamoristas contestam o casamento como instituição válida ..........................................................................................................................

Todos são amados igualmente. Os poliamoristas não aceitam o ciúme como norteador da relação. Em vez disso, sentem-se satisfeitos de verem seus companheiros amando ou sendo amados por outras pessoas. Essa sensação de contentamento é chamada de compersion, expressão que pode ser entendida como regozijo ou comprazer. O que marca os poliamoristas não é somente o fato de se relacionarem com mais de uma pessoa ao

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Arquivo Pessoal

as experiências dele. Eu o amo. Não quero nem posso privá-lo daquilo que o faça feliz e que pode fazê-lo crescer. Isso é recíproco. Relacionamento começa com respeito, e respeito à liberdade é fundamental”.

O italiano Milo Silvestro planeja viver no Brasil com a companheira Vanessa e o namorado dela .........................................................................................................................

mesmo tempo, mas a contestação de várias regras que constituem o sistema ocidental: as regras patriarcais, cristãs e monogâmicas. “Desde o meu primeiro relacionamento sério, eu ficava entre duas pessoas. Era muito doloroso. Eu sentia que estava fazendo algo errado. Hoje em dia, quando olho para trás, percebo que sempre tive essa natureza não monogâmica. Mas eu ainda não sabia do poliamor”, desabafa a estudante de Design Gráfico, Vanessa, 23 anos. Após ouvir que não tinha talento para a monogamia, impressionada, Vanessa resolveu pesquisar sobre o assunto. “Vi que fazia sentido e que eu não era anormal e promíscua. É natural você sentir atração e afeto por várias pessoas ao mesmo tempo”. Vanessa namora Vinícius (nome fictício), 20, há dois anos. Desde o início do relacionamento, ela expôs para o companheiro as próprias necessidades afetivas. Com o tempo, os dois foram criando regras para orientar o envolvimento. Hoje o casal não segue a maioria dos “protocolos”, como aliança, data de namoro, além de abolirem o ciúme. Vanessa e Vinícius não se sentem obrigados a fazer tudo juntos. “Temos liberdade para ficar com outras pessoas por pura atração. Podemos escolher. É a vida, a liberdade e são

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No final de 2010, Vanessa conheceu, pela internet, a banda italiana Dead Channel que, por acaso, é militante do poliamor. Atraída pelo som e pelos ideais do grupo, a estudante iniciou contato com o vocalista Milo Silvestro. “Começamos a conversar sobre um trabalho de faculdade, mas depois ficamos amigos. Aprendi mais sobre o poliamor. Ele dizia que não havia meninas como eu por lá. Conversávamos todos os dias, até que ficou tarde para negar que estávamos apaixonados. Claro que eu conversei com meu namorado. No começo, ele achava muito louco e ficou com ciúme, mas essa fase já passou. Agora namoramos à distância. Fazer o quê?! Procuramos conversar todos os dias e nos vemos por Skype sempre que dá”. Em julho, Silvestro vem a Belo Horizonte conhecer Vanessa e o companheiro dela. Ele aproveita para fugir de Roma, coração do cristianismo. “A Itália é um dos países mais conservadores e católicos. Isso tem efeitos ruins sobre o social. Mesmo os não católicos têm uma mentalidade conservadora e clichê. Na verdade, eu nunca encontrei uma pessoa com os ideais do poliamor por aqui”, confessa o músico de 24 anos. Devido às poucas perspectivas de trabalho, cultura e relacionamentos que se encaixem naquilo que procura, Milo não vê razões para se prender ao país de origem. “Eu notei que há um grande movimento do poliamor no Brasil. Estou tão maravilhado que planejo passo a passo minha ida definitiva para o Brasil a fim de viver com Vanessa e Vinícius e construirmos a família que sempre sonhamos”, planeja. Daniel Cardoso vive uma relação poliamorosa mais avançada. O professor universitário português, de 25 anos, mora em Lisboa e vive há oito anos com Sofia. Há dois anos ele conheceu Inês. Atualmente Cardoso mora com a primeira companheira, mas o trio está prestes a morar junto em uma nova casa. Cada um


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terá o próprio quarto. O português começou a contestar a monogamia após ler o livro de Robert Heinlein, Um estranho numa terra estranha. “A ideia de poder viver uma relação não possessiva e não monogâmica fez sentido àquela altura e foi algo que foi discutido entre mim e a pessoa por quem me interessei e que viria a ser minha atual companheira”, explica o lusitano. casamento É consenso entre os militantes da nova filosofia do amor a ideia de que o casamento é uma instituição imposta pela sociedade e pela religião. Portanto, são contra. No entanto, eles pretendem formar uma família com múltiplos parceiros e filhos. Em 2006, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reconheceu o relacionamento entre um homem casado há mais de 30 anos e outra mulher com quem manteve união estável durante 16 anos. Aparentemente a esposa era amiga da concubina. Apesar de não ser a luta dos poliamantes no momento, esse precedente da Justiça gera discussões. “Se for oficializar o casamento poliamoroso, pode ser que eu me case. Quero que meus filhos saibam que têm dois pais sim”, conta Vanessa. Os filhos são outra questão envolvida na relação múltipla. A psicanalista Regina Navarro Lins reforça que crianças com mais pais e mães ganham mais cuidados e têm menos risco de se sentirem abandonadas, caso alguém deixe a família.

na discussão, porém, ainda está restrito às questões sobre os direitos de amantes que contribuem para o crescimento do patrimônio do companheiro. Contudo, Stolze acha difícil que o casamento entre mais de duas pessoas seja aprovado, porque “a monogamia é uma característica marcante do nosso sistema”. Mas o professor defende que o Direito não deve restringir as famílias. “As leis devem acompanhar os valores por que se pauta a sociedade. Por isso, boas leis matrimoniais pressupõem o esperado respeito à dimensão existencial do indivíduo, ou seja, à própria dignidade humana”. Pensando o futuro, o português Daniel Cardoso imagina que talvez os relacionamentos sejam mais incertos, porém menos ligados às categorias e mais fluidos. “Parafraseando Gayle Rubin, é preciso começar a olhar para a forma como as pessoas tratam umas às outras, e não para aquilo que fazem de específico”, conclui. Inês Rôlo Martins

A filósofa Silvia acredita que a luta política pela legalização do casamento poliamoroso seja válida. “Mais que isso: temos que pensar no modelo de casamento que temos: institucionalizado e corroborado por toda uma série de valores morais monogâmicos e patriarcais. É por essas e outras que nunca me casei e nunca vou me casar”, completa. O juiz Pablo Stolze admite que o poliamor seja um tema controverso na jurisprudência. Professor da Universidade Federal da Bahia, Stolze é coautor do Novo Curso de Direito Civil. O jurista avançou

Daniel vive em Portugal com duas companheiras. Os três vão morar juntos numa nova casa ..........................................................................................................................

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SALUTARIS • COMPORTAMENTO

Hora de responder Ao contrário do que recomendam os ensinamentos cristãos e o discurso contra a violência, “dar o troco”, em alguns casos, é necessário André Martins Conta a Bíblia que, depois de ser traído por 30 moedas de prata, Jesus se aproximou de Judas, seu delator, beijou-lhe a face e o chamou de “amigo”. O trecho, pormenorizado no livro de Mateus, denota, sobretudo, benevolência – um dos tantos atributos de Cristo. No lugar do Messias, entretanto, poucos teriam lançado olhar compassivo diante de uma traição. Stock.xchng

Há quase 2 mil anos vigorava a conhecida Lei de Talião, o “olho por olho, dente por dente”. Os ensinamentos cristãos não correspondiam às regras sociais da antiguidade. Eles significavam uma irrupção. Jesus era pela temperança, mansidão, compassividade e pelo perdão. Por diversas vezes, ele sugeriu que, uma vez agredido, o melhor a fazer era oferecer a outra face. “Os humilhados serão exaltados”, dizia em pregações. O pensamento cristão ganhou espaço e se emaranhou com a ética humana, tornando-se uma espécie de regra social. O poder instituído se consolidou. Para não viver em uma terra sem leis, onde tudo fosse resolvido a fio de espada, o homem passou a abrir mão da honra e do direito de fazer justiça por ele mesmo. Era assim ao menos em tese. Afinal, nem sempre é isso que se vê, principalmente em países com altos índices de violência, como o Brasil. Quem arbitra e estabelece reparações entre partes discordantes é o Poder Judiciário, que funciona melhor em alguns países que em outros.

Impor limites é necessário para impedir a perpetuação da violência .........................................................................................................................

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Reprimir a agressividade, não revidar uma violência, procurar o caminho da introspecção e do autocontrole é algo bonito. Ao menos no papel. Desde crianças, as pessoas são inseridas em um mundo de violência. Elas recebem instruções que vão guiá-las por toda a vida. “É preciso levantar a bandeira da paz”; “Violência só gera violência” é o que se aprende nas escolas. Mas se a criança chega da escola com marcas de agressão feitas por um coleguinha, a coisa pode mudar de figura. Se for um menino, é possível que o pai deixe de lado os princípios cristãos e explique para o pequeno que na Antiguidade de Cristo funcionava de outro jeito.


SALUTARIS • COMPORTAMENTO

De acordo com a psicanalista Yeda Fajardo, o revide em igual proporção – embora politicamente incorreto – é sim uma ação legitimada socialmente. A vingança, por exemplo, sempre foi vendida pela indústria cultural e comprada com prazer pela sociedade. Os exemplos estão em filmes, novelas, livros. “Quando uma pessoa sofre algum tipo de violência, é tolerável que ela encontre algum método de reparação. Isso é algo socialmente permitido”, explica. Para a psicanálise, a agressividade (não apenas a física) é um elemento constitutivo do homem. O sentimento se manifesta desde os primeiros anos da criança, passando por mutações ao longo da vida. “Kant entende a violência como o ato; o outro é como o meio e o instrumento. No caso do bullying, a criança agressora enxerga a vítima como um instrumento para dar vazão à agressividade. O natural é que haja o revide, pois a vítima também passa a enxergar o agressor como um objeto”, explica.

O sentimento de culpa injustificado passa a ser um tormento em longo prazo. E essa carga pode desencadear diversos transtornos, como explica a psicóloga clínica Maria Angélica Falci. “Diante disso, a pessoa pode desenvolver comportamentos antissociais, ansiedade generalizada, depressão moderada ou grave e diversos sintomas psicossomáticos”, enumera. Responder à agressão não quer dizer necessariamente rebater à altura. Não é recomendado, por exemplo, que uma violência física seja paga na “mesma moeda”. Diante de um abuso, é necessário que o indivíduo agredido se imponha para evitar a recorrência do ato. “É preciso que essa pessoa se posicione. Por meio da fala é mais que o suficiente. Basta dizer algo, como ‘isso eu não posso tolerar. Este é o meu limite’. Essa reação é um tipo de revide; é uma resposta ao ato violento”, explica Maria Angélica.

Quando uma pessoa sofre algum tipo de violência, é tolerável que ela encontre algum método de reparação

o perdão

Embora revidar com parcimônia e bom senso seja preciso, em Yeda chama a atenção para a Yeda Fajardo determinados momentos o possibilidade de o revide acontecer recomendável é optar pelo pela necessidade de “exorcizar” perdão. No trato com os filhos, uma culpa cujo peso o indivíduo por exemplo, é preciso saber equilibrar a punição por agredido não suporta. “A forma de se ver livre dessa erros e peraltices com o perdão. A criança passa a culpa é praticando uma violência semelhante contra um terceiro. Nesse caso, o ‘troco’ não é dado por entender a casa não como um lugar de repressão, mas como um ambiente marcado pela tolerância. conta da agressão sofrida em si, mas é a forma que o agressor encontra para se ver livre da culpa”. De acordo com a psicóloga Maria Angélica, é necessário que as crianças tenham voz dentro de casa. Mas o revide, que seria natural, nem sempre “É interessante que elas desenvolvam a capacidade acontece. E isso pode ser um problema. Ser de reagir diante de diversas situações. Eventualmente politicamente correto, aceitando passivamente uma estarão erradas, mas posicionar-se com firmeza rotina de violências físicas e psicológicas, não é nem sempre significa questionar a autoridade. Os saudável. Conviver sofrendo abusos pode dar origem responsáveis têm que ser sensíveis e saber entender a um processo de autodestruição. “Existem pessoas isso. Não é saudável para criança nenhuma viver que são violentadas, e muitas vezes não sabem a neutralizada pelo medo da severidade de pais que não razão. Pode ser que nem exista... Esses indivíduos se sabem perdoar, mas apenas punir os erros com rigor”, perguntam: ‘por que estou sofrendo essa violência?’”, entende. ilustra.

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ARTIGO • PSICOLOGIA

maria angélica falci Psicóloga clínica e especialista em Saúde Mental angelfalci@hotmail.com

A sustentável leveza Imagine você subindo uma montanha íngreme com uma mochila cheia de pedras nas costas. Imaginou? Pois é justamente essa a sensação que incomoda muitas pessoas ao longo da vida. Elas carregam fardos e fardos de amargura, dor, tristezas e não lutam para mudarem de lugar. O subir a montanha fica muito complicado, pois exige um esforço inacreditável. Aí elas são tomadas por uma fadiga inexplicável e, por isso, permanecem como estão. Comece a pensar em mudar de lugar, de ir retirando as pedras aos poucos, de aliviar o estresse e a fadiga. Você vai vivenciar um respirar diferente, uma paz inconfundível, uma sustentável leveza de SER. Experimente colocar no lugar das pedras, sensibilidade para perceber, amadurecimento para vivenciar e tolerância consigo. Assim você poderá desconstruir um caminho de dor e trocá-lo por um de estabilidade emocional. Ainda que sua vida tenha uma história de muitas ruínas e pesos astronômicos, você poderá mudar de lugar e se permitir mudar internamente, abandonando sentimentos autodestrutivos.

Promova uma mudança com profundidade, que englobe pensamentos e atitudes e que, quando aplicados à vida, refletem um brilho capaz de deixar o olhar do outro espantado. A leveza do ser pode ser alcançada com foco, com real desejo de modificar os polos negativos e filtrar para si o que remete ao prazer, a ter uma vida sem desconforto emocional e a sair da cristalização de uma vida nociva. Isso significa abrir novas e reais possibilidades.

Promova uma mudança com profundidade, que englobe pensamentos e atitudes e que, quando aplicados à vida, refletem um brilho capaz de deixar o olhar do outro espantado

Torne-se por inteiro e evite fragmentos de si mesmo. Dissipe os fantasmas do passado, volte-se para a cura de feridas e mágoas do passado. Esses sentimentos só conduzem aos processos depressivos. Planeje, sonhe e adote ideais realistas. Em resumo: volte a funcionar, de certa maneira, como uma criança que é ‘leve’ por

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natureza. Por meio do ato de brincar, elas dissipam suas dores e tristezas. Reconstrua sua autoimagem, pois a construção do corpo emocional é, sem dúvida e em longo prazo, a melhor estratégia para encontrar uma vida leve.

Muitas pessoas perguntam: como vou conseguir? Realmente são passos realizados com o que cada um possui internamente e se chama pulsão de vida: aquilo que motiva as pessoas a desejarem mais a plenitude da vida. A morte pode ser lenta, e sabemos que o estresse constante é um veneno diário. Portanto, é aconselhável fazer uma leitura interna e iniciar os passos para alcançar a leveza. A partir daí, é preciso fazer esforços para alcançar uma vida saudável, de preferência até a idade mais avançada. Não existe uma receita pronta, mas, com certeza, a fórmula está à disposição de todos. Qual passo você gostaria de dar para começar?


SALUTARIS • SAÚDE

Luz do inconsciente Pesquisadores sugerem que o sonho seja uma ferramenta de autoajuda e um momento de criação auxiliadora Bianca Nazaré Paul McCartney criou a letra e a melodia da canção “Let It Be”, após sonhar com a mãe. Morta em decorrência de um câncer, ela dizia ao filho: “deixe estar”. No século XIX, Friedrich August Kekulé não conseguia entender a formação dos átomos do benzeno. Após um cochilo na cadeira, de frente ao fogo da lareira, o químico teve um sonho com átomos dançando e “girando como cobras” diante dele. Como se tivesse passado por um rápido processo de catarse, ele finalmente

compreendeu o problema e criou a fórmula do benzeno. Mary Shelley, escritora contemporânea de Kekulé, ficou famosa por escrever a história de um monstro criado por um cientista obcecado pela vontade de recriar a vida. O Frankeinstein foi produto de um sonho com uma criatura bizarra. “Sonho constantemente com meu trabalho, com processos que eu estava desenvolvendo e com algo que esqueci. Quando acordo, sei imediatamente o que devo Reprodução/ Salvador Dalí

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SALUTARIS • SAÚDE

fazer. Nunca tenho coisas pendentes ou com erros. Por outro lado, isso me incomoda. Ocupo minha mente com o trabalho mesmo estando fora dele, e minha cabeça continua trabalhando”. O caso da assistente de pessoal Greiciele Aparecida da Paixão, 23 anos, reforça a crença de psicólogos e neurocientistas de que a mente utiliza os sonhos para o autoconhecimento.

O grande opositor das ideias junguianas foi o fundador da psicanálise, Sigmund Freud. Contrariando a tese sobre o inconsciente coletivo do psicólogo suíço, o alemão acreditava que todo sonho fosse “pessoal e intransferível”. O psicanalista Guilherme Massara explica que a interpretação dos sonhos é completamente subjetiva.

Cientistas entendem o mundo dos sonhos como um portal de entrada para o inconsciente, onde estão escondidos problemas e soluções que o homem não consegue acessar no estado de consciência. Porém, a compreensão sobre a função dos sonhos nem sempre foi essa.

“Para a psicanálise, o que interessa é o caráter linguageiro dos sonhos. O sonho narrado e, portanto, interpretável. Por causa disso, raramente o sonho significa exatamente o que mostra. O sonho precisa ser interpretado”, reitera Massara, Doutor em Filosofia pela Universidade de São Paulo e professor adjunto do Departamento de Psicologia da UFMG.

“As transformações dos significados dos sonhos foram ocorrendo desde a antiguidade, quando eram entendidos como mensagens dos deuses. Logo, o significado dos sonhos foi interpretado como reflexo do cotidiano, com Santo Agostinho criando o termo ‘arquétipo’, resgatado mais tarde por Jung. Posteriormente veio o conceito de sobrenatural e sonhos premonitórios. Com o fortalecimento da Igreja Católica, surgiu a ideia de que os sonhos eram obras do diabo. Chegando à nossa realidade, Sigmund Freud decifrou os sonhos como desejos reprimidos e, finalmente, chegamos a Carl Gustav Jung, que criou o conceito de ‘inconsciente coletivo”, elabora o psicólogo Sérgio Pereira Alves.

A melhor maneira de alcançar o autoconhecimento seria tornando consciente o material do inconsciente

A ideia de inconsciente coletivo sugere que os seres humanos possuam informações psíquicas comuns, mesmo os de culturas diferentes. Jung tentava entender o fato de pessoas de culturas opostas relatarem sonhos com significados praticamente iguais. Jung acreditava que a melhor maneira de alcançar o autoconhecimento pudesse ser tornando consciente o material do inconsciente. “Uma excelente maneira de entrar em contato com isso seria com os sonhos que, como mensagens do próprio inconsciente, podem nos esclarecer nossos anseios, dificuldades e medos”.

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sonho lúcido

Na maioria dos sonhos, as cenas são entendidas pelo cérebro como acontecimentos. Um exemplo disso é a constatação do suor e dos batimentos acelerados pelo pavor, quando a pessoa desperta de um pesadelo. Porém, algumas vezes podem ocorrer sonhos em que algum elemento desperte a consciência para o fato de que tudo aquilo é uma imaginação e que a pessoa está dormindo. Esse tipo de sonho é conhecido pela comunidade acadêmica como sonho lúcido. A consciência de estar sonhando pode provocar medo em pessoas inexperientes. Com alguns exercícios, além de saber que está no mundo onírico, o indivíduo pode controlar o conteúdo do sonho e fazer o que quiser. Intrigado com a própria condição de dorminhoco e sonhador crônico, o neurocientista Sérgio Arthuro Mota Rolim, de 31 anos, resolveu estudar os sonhos lúcidos, após ler um artigo de Stephen Laberge, conhecido por ser um dos pioneiros na pesquisa científica do tema. Rolim está prestes a defender a tese sobre o estado de consciência nos sonhos. O pesquisador explica que durante a fase do sono mais relacionada com os sonhos – o sono REM (do inglês Rapid Eye Movement ou movimentos rápidos dos


SALUTARIS • SAÚDE

olhos) – os músculos do corpo estão completamente relaxados, menos os dos olhos. Aproveitando essa condição do músculo ocular em suas pesquisas, Laberge pedia a seus voluntários que, caso conseguissem ter um sonho lúcido, fizessem quatro movimentos com os olhos para a direita e para a esquerda sucessivamente. “Laberge conseguiu captar esse movimento pré-combinado e voluntário, porque colocou eletrodos sobre a pele próxima ao olho”. Para finalizar a tese de doutorado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Rolim aplicou um questionário pela internet e obteve resposta de 3,5 mil pessoas. O resultado da pesquisa indicou que o sonho lúcido é um estado de transição para a vigília. Nesse caso, o cérebro estaria bem próximo de despertar. “Isso explica por quê, para a maioria das pessoas, o sonho lúcido dura muito pouco. Elas acordam logo após se darem conta de que estavam sonhando. Entretanto, essa transição se dá de forma mais gradual e prolongada para algumas pessoas. Mas ainda não sabemos por que isso acontece”, esclarece o pesquisador. “Em um dos sujeitos que investigamos, observamos uma ativação na região temporoparietal direita e, em outro voluntário, na região frontal

do cérebro. Vários demonstram que essas com a autoconsciência corporal. Isso explica

trabalhos na literatura regiões estão relacionadas e a formação da imagem a consciência no sonho”.

As pesquisas sobre os sonhos lúcidos podem contribuir em diversos sentidos. Rolim defende que algumas pessoas poderiam utilizar este recurso para se divertir. Existem relatos de indivíduos que conseguiram voar livremente num sonho e outros que mantiveram relações sexuais com quem desejavam e atingiram o orgasmo. Outra possibilidade seria utilizar o sonho lúcido para o treinamento de habilidades, como num ambiente virtual. “Cientistas alemães fizeram um experimento em que treinavam um grupo de pessoas a jogar uma moeda para dentro de um copo a certa distância. As pessoas que treinavam novamente, durante o sonho lúcido, tinham um desempenho real melhor no dia seguinte, ao contrário das pessoas que não treinaram no sonho”. Indivíduos que sofrem de pesadelos recorrentes ou de transtorno de estresse pós-traumático e depressões graves conseguiriam reconhecer que estão sonhando. Isso diminuiria o medo do pesadelo. De acordo com Rolim, essas pessoas poderiam transformar pesadelos em sonhos bons.

Reprodução

No sonho lúcido é possível controlar o conteúdo e fazer o que quiser, como no filme A Origem, de Christopher Nolan ..............................................................................................................................................................................................................................................................

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SALUTARIS • receita

Risoto Mineiro ingredientes

3 folhas de couve fatiadas finamente

150g de arroz-arbóreo

Sal a gosto

30g de cebola repicada

Cebolinha a gosto

20ml de azeite

Pimenta-do-reino

80g de costelinha

MODO DE PREPARO:

80g de linguiça

Refogar a cebola no azeite e adicionar as carnes. Logo após, acrescentar a base de risoto. Colocar água para conseguir a consistência do arroz. Quase ao ponto, adicionar as pimentas biquinho e reservar. Fritar a couve para dispor no prato. Corrigir o tempero, se necessário.

40g de carne de sol desfiada 8 unidades de pimenta biquinho

Divulgação/ Rede Gourmet

Fonte: Vila Madalena/ Unidade Vespasiano

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SALUTARIS • vinhos

As uvas e os terroirs Danilo Schirmer A cultura do plantio da uva é disseminada há séculos entre os povos. Podemos citar os romanos como determinantes nesse processo. Na época das cruzadas, eles se instalavam nos territórios reconquistados. Começavam vida nova. E as videiras sempre os acompanhavam. Afinal, o vinho fazia parte da cultura romana. A bebida era considerada um alimento. Servia também para os momentos de relaxamento e distração. Dessa forma, as uvas foram plantadas em várias regiões diferentes e, claro, adaptaram-se, cada qual à sua maneira, nessas diversas áreas. Vários fatores influenciavam, e influenciam até hoje, o crescimento e o desenvolvimento dos tipos de videira. Clima, solo e relevo interferem na sobrevivência e na qualidade das frutas. Associada às intervenções humanas, por meio de técnicas no plantio, na colheita, na elaboração e na armazenagem do vinho, características e identidades foram delineadas. O ato de degustar permite identificar as particularidades dos mais diversos tipos da bebida. Na Europa, onde o plantio e o cultivo foram difundidos em larga escala, existem alguns terroirs identificados e reconhecidos que se utilizam de um sistema de denominação em que os vinhos se enquadram em um conjunto de regras e normas designadas àquela região. Nos países fora da Europa foi possível identificar

e reconhecer a melhor adaptação de determinadas castas em certas regiões. As uvas são conhecidas como emblemáticas. No Brasil, há alguns anos, foi criado o sistema de denominação Indicação de procedência (IP), visando dar uma referência de qualidade aos vinhos elaborados na região do Vale dos Vinhedos, no Rio Grande do Sul. Em sintonia com o conceito de terroir presente em outras regiões produtoras, a Casa Valduga disponibiliza no mercado brasileiro uma nova linha de vinhos que valoriza o potencial de cada uva em determinada região. Serão apresentados ao consumidor a linha Leopoldina (região Vale dos Vinhedos), com as uvas Chardonnay e Merlot; a linha Identidade (região de Encruzilhada do Sul), com as uvas Gewurztraminer, Arinarnoa e Marselan; e a linha Raízes (região de Campanha), com as uvas Sauvignon Blanc, Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc. Vêm aí muitas novidades. Aguardem!

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podium • ESPORTE

Virou febre Conheça um pouco do esporte que tem mexido com a cabeça dos brasileiros Henrique André Luta ou apologia à violência? Mistura de artes marciais ou pancadaria desmedida? É inegável que o Mixed Martial Arts (Artes Marciais Misturadas, ou somente MMA) tem se expandido no país. Um crescimento iniciado, sobretudo, com exibição de diversas lutas nas madrugadas da TV brasileira. Até a Globo de Galvão Bueno entrou na “briga” e transmite (às vezes ao vivo e outras como se fosse) combates em sua grade de programação. Não seria exagero dizer que o MMA é o novo “filão” do mercado esportivo. Mas para se consolidar, será necessário que a modalidade supere grandes desafios: provar que é um esporte como outro e se desvincular da ideia de que tudo não passa de violência gratuita. O Brasil é a casa de grandes lutadores. O país se tornou uma fábrica de campeões. Vitor Belfort, Wanderlei Silva, Anderson Silva (“Spider”), os irmãos “Minotauro” e “Minotouro” Nogueira, Lyoto Machida, Maurício “Shogun”, José Aldo e Júnior Cigano são os nomes mais conhecidos. Mas assim como acontece no futebol, existem atletas de MMA longe do glamour e dos contratos milionários oferecidos pelo UFC. Lutadores que superam as adversidades do dia a dia para poderem praticar o esporte e tirar o próprio sustento da atividade. O professor e lutador Cristiano Titi convive diariamente com vários esportistas. Ele sabe muito bem a importância do MMA. Para ele, associar o esporte à violência é um grande equívoco. “Como cidadão, vejo que o crescimento do esporte é muito importante para que atletas, principalmente os menos favorecidos financeiramente, tenham um objetivo de vida e fiquem longe de tudo aquilo que é ruim e errado. O preconceito

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vem diminuindo, principalmente com uma mídia cada vez mais voltada para o nosso esporte. Sinto muito orgulho de fazer parte desta história”, diz. No Jiu-Jitsu, Cristiano Titi foi bicampeão mundial, tetra pan-americano, tri brasileiro, campeão europeu e hexa interestadual. Já no MMA, acumula oito vitórias e duas derrotas. O jornalista mineiro Chico Maia não partilha da opinião de Titi. Para ele, o UFC está longe de ser um evento esportivo. “Artes marciais são outra coisa: nada a ver com isso aí. Preconceito nenhum. Sou contra o incentivo à violência”, diz. O antigo “Vale-Tudo” teve início por aqui na década de 30, quando os irmãos Carlos e Hélio Gracie desenvolveram o hábito de desafiar mestres de várias artes marciais em lutas sem regras nem limites de tempo. O objetivo era mostrar ao mundo a superioridade do Jiu-Jitsu sobre outras modalidades. No Japão, uma série de combates foi organizada por Antônio Inoki, na década de 70, inspirando o “movimento shoot” do wrestling profissional. Esse movimento acabou resultando nas primeiras ligas de MMA, como o Shooto, em 1985. Mas foi somente em 1993 que o esporte começou a ganhar popularidade e mídia. O ano marca o surgimento do UFC (Ultimate Fighting Champioship), que inicialmente era muito violento e sem regras. Com o passar dos anos, o evento começou a atender às necessidades da mídia televisiva. Aí um regulamento foi desenvolvido pensando na segurança dos atletas e estabelecendo um limite de tempo para os confrontos. O brasileiro Royce Gracie foi o primeiro vencedor do UFC, finalizando três adversários em apenas cinco minutos. Além disso, conquistou três das quatro primeiras edições do torneio. Com o crescimento do esporte, em 1997 os japoneses criaram outra liga de MMA: o PRIDE Figthing Championship. Dez anos depois, os proprietários do UFC compraram os direitos sobre a liga e sobre os lutadores contratados. A partir daí, tudo passou a pertencer à mesma organização.

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podium • ESPORTE

Opiniões no Twitter “MMA é um esporte em que os lutadores são treinados e preparados para a luta. Luta é diferente de briga.” (@joaopauloab13) ‎”Só diz que o MMA faz apologia à violência quem nunca praticou alguma arte marcial ou quem é muito preconceituoso… É um esporte como qualquer outro.” (@brunovpu) ‎”Em minha opinião, um esporte que coloca um atleta tetraplégico, como ficou um lutador dos EUA, não pode ser esporte.” (@claudineidjesus) “Se fosse um esporte como outro, amigo lutaria contra amigo. Tanto é que eles não se enfrentam.” (@Ruy_Neto) “Se fosse esporte, eu ia praticar com irmão e amigos, assim como nós jogamos futebol um contra o outro.” (@eduardocbv)

ufc 147 ou ufc bh Aproveitando o “boom” do esporte, Belo Horizonte entrou na rota das cidades que abraçaram o maior evento do MMA: o UFC. A luta foi realizada no dia 23 junho, no Mineirinho. Foi o terceiro evento no Brasil e ficou marcada como a primeira luta fora do Rio de Janeiro. Governo do Estado e Prefeitura investiram quase R$ 1 milhão no evento. A despeito da polêmica fratura do punho esquerdo do lutador Vitor Belfort, inicialmente o oponente de Wanderlei Silva, o evento se concretizou. Os mineiros que compareceram ao ginásio para conferir o embate entre Silva e o americano Rich Franklin nem pareciam os mesmos que se demonstraram tão pesarosos e revoltados com a fratura de Belfort, ocorrida em maio. Resultado: sucesso de público e, como não poderia deixar de ser, de renda.

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De acordo com o diretor de Desenvolvimento Internacional do UFC, Marshall Zelaznik, cada edição do UFC tem uma média de um bilhão de telespectadores, o que fomenta a visibilidade e, consequentemente, o turismo das cidades onde são realizados. E foi isso que certamente animou os governantes mineiros. “A realização do UFC em Belo Horizonte é a comprovação da nossa capacidade. Mais do que isso: é a demonstração da confiança desses empresários internacionais na possibilidade de realizar um evento dessa magnitude na nossa capital. O UFC é um dos esportes que mais crescem no Brasil em relação à audiência e ao reconhecimento”, declarou o governador Antonio Augusto Anastasia, durante o lançamento do evento, realizado na Cidade Administrativa. O prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, percebeu as “benesses” econômicas do UFC. Ele destacou a grande atração de investimentos resultantes da realização do UFC em Beagá. “Esse é um evento de artes marciais mistas muito importante. No Rio de Janeiro, mais de 10 mil ingressos foram comprados por pessoas que vieram de fora da cidade. Portanto, eles se hospedaram em hotéis e frequentaram restaurantes. Do ponto de vista da ativação da economia, é muito importante”, analisou. Osvaldo Afonso/ Agência Minas

Lacerda e Anastasia comemoraram a realização do UFC 147 em BH .........................................................................................................................


podium • ESPORTE

Divulgação/ Território Tupiniquim

Socos, chutes, pontapés e muito sangue: na tentativa de finalizar o adversário, vale quase tudo no MMA ..............................................................................................................................................................................................................................................................

Curiosidades: * No início, os praticantes de MMA eram especializados em apenas um tipo de arte marcial, mas, com o passar dos tempos, foram se especializando em outros. * A ideia de combinar os elementos de várias artes marciais foi iniciada e popularizada por Bruce Lee, no final dos anos 60 e no início de 1970. Lee defendia a ideia de que “o melhor lutador não é um boxer, karateka ou lutador de judô. Para ele, o melhor lutador é aquele que pode adaptar-se a qualquer estilo.” Seus conceitos inovadores foram

reconhecidos em 2004 pelo presidente do UFC, Dana White, quando chamou Lee de “o pai do MMA”. * À medida que o conhecimento sobre as técnicas se propagava entre lutadores e espectadores, tornava-se claro que as regras do MMA precisavam ser alteradas. Os principais motivos que levaram a essas mudanças foram a proteção da saúde dos lutadores, o desejo de acabar com a imagem de “uma luta bárbara até a morte” e ser reconhecido como um esporte. Fonte: tatame.com.br

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Vanguarda • Veículos

Os velhos tempos estão de volta? Depois de Pastor Maldonado, chegou a vez de Lewis Hamilton. A temporada 2012 da F1 tem oito campeões diferentes. A briga nunca esteve tão boa Fred e Carol Gosaric No final de semana dos dias 9 e 10 de junho, a Fórmula 1 viu, pela sétima vez no ano, um piloto diferente levantar a taça de primeiro colocado. Dessa vez, Lewis Hamilton não deu margem aos adversários e venceu o Grande Prêmio do Canadá, disputado no maravilhoso circuito de Montreal, na ilha artificial de Notre Dame. Pela primeira vez na história da categoria máxima do automobilismo, em sete corridas disputadas foram sete vencedores diferentes. Com sua vitória, o inglês Hamilton se igualou a Fernando Alonso, Mark Weber, Sebastian Vettel, Nico Rosberg, Pastor Maldonado e Jenson Button, todos com uma vitória no ano. Para muitos, é sinal de que as alterações no regulamento da categoria enfim surtiram efeito; para outros, a Fórmula 1 se tornou ainda mais chata e sem emoção.

O Grande Prêmio do Canadá foi exemplo disso. A diferença no grid de largada entre o pole position Sebastian Vettel e o décimo terceiro colocado Nico Hulkenberg foi de apenas 0,944 segundo. Os 17 primeiros colocados foram separados por menos de 1,5 segundo. Durante a corrida, após um início relativamente entediante, a disputa ganhou em emoção. A estratégia de paradas para a troca de pneus definiu o pódio. Após liderar boa parte da prova, Alonso optou por apenas uma parada e não conseguiu segurar os demais carros com pneus novos no final da prova, terminando apenas em quinto, com Rosberg a menos de um décimo de segundo atrás. Melhor para Lewis Hamilton, Romais Grosjean e Sergio Perez, que formaram o pódio dessa incrível corrida nessa ordem.

Pela primeira vez em muitos anos, é possível assistir a uma corrida imprevisível

O fato é que, pela primeira vez em muitos anos, é possível assistir a uma corrida imprevisível. Brigas por posições no pelotão inteiro acontecem durante toda a corrida, e os tempos de qualificação quase sempre separam os 12 primeiros por menos de um segundo! Para os fiéis das bancas de apostas europeias, é um mau negócio. Para os amantes da categoria, é sim um sinal de que, enfim, os bons velhos tempos estão de volta!

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Massa mais uma vez mostrou evolução e levou sua Ferrari a um décimo lugar, mesmo depois de uma rodada no início da corrida. Para Bruno Senna, melhor esquecer o final de semana e focar na próxima etapa. Mais uma vez o sobrinho do saudoso tricampeão teve uma apresentação péssima, com batida nos treinos livres e a uma corrida sem pontos altos. A Fórmula 1 segue agora para circuito de rua de Valência, para o Grande Prêmio da Europa, com a promessa de mais uma corrida acirrada. Vamos torcer para, quem sabe, Felipe Massa conseguir ser o oitavo piloto diferente a vencer uma corrida este ano.


Vanguarda • veículos

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- Extintor de incêndio (dentro do prazo de validade e com funcionamento perfeito); - Macaco; - Triângulo (sinalização); - Freios; - Correias; - Mangueiras; - Líquidos: arrefecimento, freio, câmbio e direção.

Antes de viajar, é preciso se precaver conferindo ítens de segurança .........................................................................................................................

DICA A temporada de férias está chegando. Você está preparado para pegar a estrada e curtir um merecido descanso? E seu carro? Lembre-se de que, antes de qualquer viagem, você deve fazer uma revisão em seu veículo, checando os principais itens de segurança do carro para evitar ficar parado no acostamento. Diversas oficinas hoje oferecem um checkup gratuito de diversos itens. Na verificação podem ser diagnosticados problemas que têm o poder de transformar seu tempo de descanso em dor de cabeça. Procure seu mecânico de confiança e solicite que ele faça uma revisão nos componentes do motor, freios, pneus, na suspensão e na iluminação. Não dê chance ao azar! Uma pequena despesa hoje pode evitar grandes gastos amanhã. Estes são os principais itens que você deve checar: - Luzes: farol, setas, luzes de freio, farol de milha e luz de placa; - Calibragem dos pneus, especialmente do estepe; - Limpadores e desembaçadores;

Além disso, planejar sua rota é de extrema importância. Quando viajamos de carro, normalmente escolhemos destinos conhecidos. Essa condição possibilita saber o melhor horário para sair e evitar congestionamentos. Dá pra saber onde parar para lanchar e descansar e conhecer os melhores trechos para ultrapassagens seguras. Mas muitas vezes optamos por desbravar novos destinos. Afinal, o Brasil oferece de tudo um pouco. Nesse caso, o cuidado deve ser redobrado! Evite viajar à noite. Procure conhecer previamente a estrada, os trechos mais perigosos, os postos de combustíveis e as borracharias presentes em todo o trecho, os locais para descanso e lanche e observe a sinalização das estradas. Respeite! Afinal, as placas estão lá por um motivo e nunca devem ser ignoradas. Ultrapasse sempre que tiver excelente visibilidade e, principalmente, descanse bem antes de pegar no volante. Motoristas pouco experientes devem ter ao seu lado um navegador, alguém que o auxilie em caso de dúvidas ou até mesmo se bater um cansaço. Uma boa companhia nunca faz mal a ninguém. Muitas dessas informações estão no site www. apontador.com.br e www.viamichelin.pt. Dirija com atenção e cuidado e lembre-se: se for beber, não dirija! Quando se trata de dirigir, álcool só é bom como combustível. Boa viagem e bom descanso!

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Vanguarda • TECNOLOGIA

O despertar da inteligência Possíveis substitutos dos tradicionais carrinho e boneca, os brinquedos científicos entretêm e fazem os pequenos descobrirem as ciências e o mundo André Martins A energia gerada a partir do calor do sol incide sobre placas termossensíveis acopladas a um carrinho ou a um pequeno barco. Então, como mágica, engrenagens são acionadas. As rodas ganham o solo e os remos, a água. Interrompida a luz solar, os objetos param após o atrito com o chão e o líquido se tornar zero. Se a lógica de funcionamento de alguns brinquedos inteligentes intriga até gente grande, o que dizer sobre a excitação que despertam nos públicos aos quais são destinados: infantil e jovem?

A Science4you tem expandido os negócios. Em dois anos, a empresa ampliou o número de parceiros, o quadro de colaboradores – que inclui designers, biólogos, químicos e engenheiros – e os lucros. A empresa exporta para a vizinha Espanha e para algumas nações africanas. No Brasil, a expectativa é de que os produtos cheguem ainda no final do mês de junho. A ambição da S4Y é colocar seus brinquedos nas prateleiras de países com mercados mais competitivos, a exemplo do inglês.

Os objetos citados, movidos O catálogo da empresa é vasto. a energia solar, são apenas Os mais de 70 produtos oferecidos algumas dos produtos vendidos introduzem as crianças no mágico por uma empresa portuguesa universo das ciências, combinando criada em 2008, no auge da conhecimento e diversão. Cada kit crise econômica mundial. O vem acompanhado de pequenos responsável é um jovem de livros com instruções de montagem 27 anos que fez do trabalho e manipulação. Todo o material de conclusão de curso um é revisado por professores da passaporte para o mundo Universidade de Lisboa, parceira do empresarial. Aluno do curso projeto. de Finanças da Universidade Cláudia Lopes de Lisboa, Miguel Pina Martins “A maior parte do que fazemos trocou o mercado de ações é para ser desfrutada nos tempos pelos brinquedos científicos. livres, sempre com o pensamento Um exemplo de espírito visionário e ousadia num ‘isto é para divertir’ e, obviamente, para aprender. Cada país em que os empreendedores são criticados pelo vez mais os pais se preocupam com a educação dos conservadorismo. E os resultados logo vieram. Em filhos, procuram produtos que permitam às crianças 2010, Martins era eleito o empreendedor do ano pela serem mais inteligentes e competitivas na escola. A Comissão Europeia. Science4you vai a esse encontro. Elas conseguem

A criança se sente estimulada a descobrir tudo o que o objeto pode oferecer

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Vanguarda • TECNOLOGIA

aprender enquanto brincam, e essa é a melhor forma”, opina. Os brinquedos científicos podem ser simples, como quebra-cabeças, ou complexos, como minicasas ecológicas, objetos movidos a energias sustentáveis e kits de reagentes químicos. A psicóloga Cláudia Lopes trabalha com objetos pedagógicos em uma escola da capital mineira. Para ela, esses brinquedos são desafiadores. Por essa razão, estimulam os mais variados estágios da maturação infantil. “A partir do momento em que a criança tem

em mão um brinquedo que não oferece caminhos e proporciona apenas experiências baseadas na repetição, o objeto perde sua eficácia. Os brinquedos inteligentes são diferentes por serem desafiadores. Eles oferecem diversas possibilidades de encaixe, de montagem e proporcionam descobertas. A criança se sente estimulada a descobrir tudo o que o objeto pode oferecer”, explica. mentes brilhantes Quando crianças, a soteropolitana Djali Valois e o criciumense José Eduardo de Luca tinham uma

Triqo, da Mentes Brilhantes .................................

Divulgação/ Mentes Brilhantes

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Vanguarda • TECNOLOGIA

Divulgação/ Mentes Brilhantes

Em pesquisas na internet e conversas com outros pais, o casal constatou um problema: a limitação da indústria nacional de brinquedos. Como é sempre do “caos” que surgem as grandes ideias, com o conflito, a dupla visualizou uma grande oportunidade. “Como acontece na natureza, na vida não há saltos quânticos. As nossas ideias sempre decorrem de necessidades que percebemos dentro da nossa área de atuação. Vi uma oportunidade de ouro: aliar a nossa necessidade de oferecer a nossos filhos brinquedos que unissem ludicidade e aprendizado a um material que pudesse ajudar, e muito, a voltar a despertar o brilho nos olhos de crianças e jovens pelas ciências”, explica. E com esse ideal nasceu a Mentes Brilhantes, com sede em Florianópolis. Com apenas dois anos de funcionamento, a empresa oferece 30 conjuntos de peças que possibilitam a montagem de diversos brinquedos inteligentes. A Mentes Brilhantes atende desde pais afoitos por tecnologia e inovação até a instituições de ensino.

Tecnologia, ciência e diversão ao alcance da pequena Sofia, filha de Djali e José Eduardo, os criadores do Mentes Brilhantes .........................................................................................................................

característica similar muito marcante: a mania incorrigível de reduzir brinquedos a uma miríade de peças. Depois de reunir os fragmentos, ambos admiravam os objetos como quem os havia concebido. O detalhe é que ele, ao contrário dela, quase sempre tinha sucesso nas remontagens. O casal se conheceu em 1995. Dois anos depois eles se casaram. Apaixonados por tecnologia, os dois partiram à procura de brinquedos inovadores com o nascimento dos filhos, Sofia e Franco. “Queríamos algo que não se resumisse a armas e bonecas licenciadas ou brinquedos cheios de luzes e sons que brincam sozinhos”, relata a mãe.

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De acordo com a criadora da marca, os kits trabalham em três eixos: estimulam as crianças a construir o próprio brinquedo, fazendo-os desenvolver o raciocínio lógico e a habilidade motora; propiciam a descoberta dos mecanismos de funcionamento das peças e chamam a atenção para a observação dos fenômenos gerados a partir do funcionamento dos brinquedos. Assim fica bem mais fácil e divertido aprender. “Cada projeto permite explorar uma série de conceitos de Física e Matemática. Há sempre um assunto central, como a Energia Eólica ou a Energia Solar, e assuntos circundantes decorrentes do tipo de montagem, como gravidade, aerodinâmica, força, Leis de Newton, torque, velocidade angular, etc.”, enumera Djali. Com alguns brinquedos, as crianças podem desvendar fenômenos da natureza e, em escala reduzida, entender o funcionamento de hidrelétricas, geradores de energia e até teleféricos. Assim como a S4Y, a Mentes Brilhantes produz material didático com uma visão transdisciplinar. A palavra de ordem para possibilitar a “conversa” das crianças com as ciências é “estratégia”. “A


Vanguarda • TECNOLOGIA

física responsável pelo desenvolvimento de conteúdo para a capacitação da empresa costuma dizer que não podemos ensinar ciência formal para crianças pequenas, mas podemos colocá-las diante de fenômenos da natureza e fazê-las refletir e discutir sobre o que veem”, analisa. O cientista e professor Fernando Soares é exceção. Ao contrário de muita gente, ele se esquiva das soluções fáceis na hora de presentear. Além de acreditar que a indústria nacional de brinquedos subestime os pequenos, o físico enxerga certo “sexismo” perpetuado no ato de presentear meninos e meninas. “Os presentes dizem exatamente o que querem dizer. Hoje o menino brinca com o carrinho, amanhã ele dirige o carro (conduz, tem o poder, trabalha fora, decide). Por sua vez, a menina cuida de uma boneca (faz comidinha, compras, arruma a casinha). No futuro, espera-se que ela continue com tal comportamento. É triste!”, opina.

Quem mais se favorece com o pensamento de Soares e a certeza de que crianças não são todas iguais é o primo Gabriel Fellipe Soares Diniz, de 14 anos. “Decidi estimular o Gabriel a desenvolver suas habilidades investigativas e de construção. O gosto dele é mais voltado para o uso das leis da natureza, para construir coisas”, explica. O último presente dado ao menino foi o Neocube – um conjunto de ímãs de formato esférico, com 5mm de diâmetro cada. Associadas, as pequenas peças dão origem a objetos de infinitos formatos. “Tenho um Playstation 3, mas os brinquedos que mais gosto são realmente os científicos. Eles ensinam noções de física e desenvolvem o raciocínio lógico”, opina o garoto que, além do Neocube, tem xadrez, lego e um kit de alquimia dado pelos pais no Natal. Em breve, Gabriel terá outros brinquedos para se ocupar. Mas tudo faz parte da surpresa. “Espero que cheguem a tempo”, brinca o primo.

Divulgação/ Mentes Brilhantes

O barquinho se movimenta a partir da energia solar. As fontes renováveis estão incorporadas em diversos brinquedos da empresa ..............................................................................................................................................................................................................................................................

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vanguarda - TECNOLOGIA

4G em 2013 Produtos com tecnologia de quarta geração (4G) chegam ao mercado no mês de março do ano que vem, segundo afirma o diretor de Engenharia da Oi, Luis Alveirinho. A empresa foi vencedora, ao lado da Vivo, Claro e Tim, do leilão de distribuição da tecnologia no país. As quatro gigantes serão responsáveis pela implantação do 4G em áreas urbanas e rurais. Os primeiros testes foram realizados na conferência Rio+20 e alcançaram velocidade máxima de 100 megabits por segundo. Mas de acordo com a Oi, os consumidores brasileiros terão acesso a 20 megabits/s.

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Interatividade convergente A Microsoft criou um sistema que permite a interatividade do Xbox 360 com TVs, tablets e smartphones. O software chamado Smartglass possibilita o acesso de conteúdos extras, interativos e inéditos relacionados com o programa exibido ou o jogo executado por meio do Xbox. O aplicativo apresentado na feira anual Eletronic Entertainment, em junho, será gratuito e tem previsão de lançamento para o final deste ano para Android, iOS, Windows Phone e Windows 8.

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Novidade no mercado de tablets Segundo matéria do jornal The Wrap, a Microsoft estaria desenvolvendo um tablet. O aparelho seria concorrente do Ipad, da Apple, com tela sensível ao toque e sistema operacional Windows 8.

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Artigo • meteorologia

Ruibran dos Reis Diretor Regional do Climatempo Professor da PUC Minas ruibrandosreis@gmail.com

O futuro da Terra está em nossas mãos No plano ambiental, o mês de junho foi marcado pela Rio+20. Na Cidade Maravilhosa, pesquisadores e governantes do mundo inteiro pararam para discutir a melhor forma de utilizar os recursos naturais do nosso planeta. O último evento de porte sediado pela cidade do Rio foi a Eco-92, na década de 90. Gro Harlem Brudtland, primeira-ministra da Noruega em 1983, foi quem utilizou, pela primeira vez, o termo “Desenvolvimento Sustentável”, durante a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pela ONU. O objetivo do Desenvolvimento Sustentável é verificar de que forma é possível suprir as demandas atuais da sociedade sem comprometer a geração futura.

preocupar com a utilização do petróleo do pré-sal, acredito que precisemos fazer um planejamento de como aproveitar os recursos naturais provenientes da energia solar, eólica, etc. Com essa discussão, é importante verificar que não se pode continuar com o consumo acelerado que a sociedade mantém. O planeta tem um recurso finito. Se todos tiverem um consumo como o do americano, por exemplo, vamos necessitar de 2,5 planetas semelhantes à Terra.

Não quero ser pessimista, mas vejo que em 2032, todos terão de se sentar à mesa para discutir os mesmos assuntos na Rio+30

Não vou comentar os resultados da Rio+20, mas pelas discussões no Brasil sobre as arrecadações que virão do pré-sal – quando foi possível assistir até ao governador do Rio de Janeiro chorar – dá pra ter uma ideia de que nossos governantes não estão nem um pouco preocupados com as próximas gerações. O petróleo demora nada menos do que 600 milhões de anos pra se formar. Antes de se

No dia a dia, preocupam-me muito as ações dos governantes. Claro que podemos fazer alguma coisa. Mas o que fizermos será pouco diante desse estímulo voraz do consumo veiculado pelos meios de comunicação. Nossos rios estão todos poluídos; o uso de defensivos agrícolas não é controlado. Não se consegue andar mais nas grandes cidades e, cada vez mais, o governo incentiva o uso de carros em vez de criar uma política de transporte em massa. Não quero ser pessimista, mas vejo que, em 2032, todos terão de se sentar à mesa para discutir os mesmos assuntos na Rio+30. Mas tomem cuidado, governantes: pode ser tarde demais.

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KULTUR••cinema SÉRIE Retrô KULTUR

O disco não parou de rodar Saudosismo e paixão por música fazem com que o passado nunca seja deixado para trás Fernanda Carvalho A pré-venda iniciou, mas não durou muito tempo. Os long plays acabaram antes que começassem a ser vendidos “de verdade”. Depois de quinze anos de carreira e muitos intervalos, a banda Los Hermanos lançou, no início deste mês, a discografia completa em vinil. O que não se esperava era que o formato fizesse tanto sucesso entre os fãs, predominantemente jovens. O chiado da agulha: muitos consideram esse o motivo da paixão por LPs. Mas é mais que isso. Ao contrário do MP3, o disco demanda tempo e atenção. É preciso tirá-lo da capa com cuidado, manuseá-lo, ligar o toca-discos de agulha nova e colocar o álbum. Depois de ouvir um lado, é necessário se levantar da cadeira e virar o long play para escutar as outras faixas. As músicas, então, são realmente apreciadas. Por todo esse fetiche, o bolachão, como também é chamado, nunca foi deixado de lado. Nem mesmo quando os compact discs ou CDs começaram a ser comercializados em 1982. Ao redor do mundo, vários musicistas, estudiosos e amantes guardam coleções que de muito serviriam para contar a história da humanidade. A maior coleção de vinis do mundo está alojada em uma grande sala na cidade de Pittsburgh, no sudoeste do estado americano da Pensilvânia. O dono dela é Paul Mawhinney, um apaixonado por música desde os 12 anos de idade. O “número 1” foi um disco de Frankie Laine lançado em 1951 pela Columbia Records. Desde então, o colecionador não parou mais. De acordo com Mawhinney, hoje a coletânea soma 2 milhões de vinis, todos juntados ao longo de 60 anos. A saúde de Paul e a idade avançada forçaram o colecionador a passar os discos adiante. Depois de quase duas décadas de tentativas e muita frustração, ele finalmente parece ter conseguido. Paul revelou à Vox Objetiva que os LPs estão em processo de venda para um museu. Mas enquanto a negociação não for concluída, ele prefere não dar detalhes sobre o destino da gigante coleção.

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KULTUR • SÉRIE Retrô

Divulgação

Gilberto Gil e Caetano Veloso faziam parte dos superpolitizados que revolucionaram a música nacional na época da ditadura .........................................................................................................................

A história inteira da música do século XX pode ser encontrada na grande sala ambientada de Paul Mawhinney. Uma enorme quantidade de álbuns raríssimos ocupa essas prateleiras. E até mesmo o primeiro disco do mundo, segundo ele datado de 1881, está no meio da coleção. Todos mantidos intocados, em perfeito estado. Em Belo Horizonte, uma sala um pouco menor guarda outra coleção com “ar” de exclusiva. Numa rua habitacional do bairro Floresta, um cartaz colocado em frente a uma porta de vidro indica: “Discoteca Pública”. São cerca de 13 mil long plays só de música brasileira. A coleção veio do acervo do pesquisador Edu Pampani e foi colocada em um espaço para estudiosos e apaixonados por qualquer estilo de música nacional poderem apreciar.

Brasil foi uma fase efervescente. Com o início da ditadura, em 1964, a lei da censura impedia que todos se expressassem livremente. A música servia de válvula de escape. Para Carlos Augusto Alves, bacharel em história e coordenador de programação da TV Uni BH, a década de 80 foi a mais marcante. Na época, a MPB se mesclou com as causas políticas e sociais. “Isso mexeu com os jovens de uma forma incrível. Não havia acesso aos fatos como hoje. Os cantores eram os arautos das ‘grandes novidades’. Além de superpolitizados, Caetano e Gil vinham com um comportamento andrógino que gerava grandes debates. Chico, cult, com referências na grande tradição da música, nos forçava a aprender. De repente, todo mundo esqueceu a Jovem Guarda”. Edu Pampani pondera que a música mudou bastante, depois da ditadura. “Essa foi uma época muito boa! Para driblar a censura, o compositor tinha que ser bom de verdade; tinha que ser fera”. Foi justamente na década de 70 que o colecionador começou a escutar “música boa”. Antes disso, ele se dizia da turma do rock n’ roll, “como a maioria dos jovens nessa época”. Os primeiros discos, naturalmente, vieram do gênero. “O número um foi o The Dark Side of the Moon, do Pink Floyd. É o único que eu guardo”, conta.

Do clássico e erudito às escolas de samba e forró. O conjunto de discos representa 60 anos da história da música popular brasileira gravada em vinil. Para Pampani, as mais primorosas lembranças de todo esse tempo são da década de 70. “Eu acho que as melhores datam de 1973, 1974 e vão até 1977. Não sei por que eu tenho esse ano de 1977 na cabeça. Acho que é porque todos os discos que eu descobri dessa data são ótimos”, analisa rindo. O período preferido da música para Pampani parece ser o mesmo de muitos estudiosos e amantes. No Stock.xchng

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KULTUR • SÉRIE Retrô

Led Zeppelin, Black Sabbath, Deep Purple, Yes, Genesis e Pink Floyd: esses são apenas alguns dos nomes do hard rock e do rock progressivo que marcaram internacionalmente a década de 70. De acordo com o amante e estudioso do gênero, Tiago Meneses, esse foi o período em que várias bandas dessas subdivisões do rock tiveram seu auge criativo, “ainda que os estilos tenham sido moldados nos anos 60”, elucida. Na década de 70, o mundo perdia o denominado Rei do Rock, Elvis Presley, morto em 1977. Mas, ao mesmo tempo, ganhava o fortalecimento da psicodelia, as distorções do blues mesclado ao rock e o auge da disco music. The Dark Side of the Moon “enlouquecia” os adoradores, com filosofia e experimentações musicais, e John Travolta, em Os Fernanda Carvalho

Embalos de Sábado à Noite, fazia as pistas de dança ferverem. Nessa época, Tiago nem “sonhava” em nascer. “Eu gostaria de ter vivido a juventude nesses anos, mas só se eu morasse na Inglaterra. Minha maior vontade em relação a esse período era de ter estado presente nos festivais”, conta rindo. Enquanto isso, Edu Pampani trabalhava de office boy em São Paulo e usava o tempo do almoço para andar pelas ruas comprando discos em promoção. Foi então que ele iniciou o que hoje ocupa o espaço de uma sala na rua Itaúna. Os discos estão começando a ser catalogados. Sete mil foram cadastrados. Antes de chegar a Belo Horizonte, a coleção de Pampani ‘morou’ em Salvador. Lá ele montou uma loja onde só vendia discos importados usados. Segundo o colecionador, o mercado de compras de “segunda mão” era forte. Pampani viajava pelo Brasil em busca de bandas brasileiras independentes. “Na época, quase todo estado tinha o próprio selo e a gravadora. As distribuições eram bem regionais. Não se espalhavam pelo país. Antigamente era muito mais difícil. Telefone e correio eram mais caros. Depois que eu abri a loja dessa coleção, começou a aparecer de tudo, mas era bastante filtrado”, diz. Hoje a realidade é outra. As músicas circulam em alta velocidade. E sempre em larga escala. Distância não é mais um limite. Não dá tempo de levantar para trocar o lado do disco, porque existem outros milhões de músicas esperando para serem “digeridas” a ligeiras garfadas. Também não é fácil para um artista chegar aos altos patamares dos reis da década de 70: logo aparece outro e toma os holofotes. Mas não dura muito. Logo, logo “a fila anda” novamente.

A Discoteca Pública surgiu a partir do acervo do colecionador e pesquisador Edu Pampani. Hoje conta com cerca de 13 mil discos ........................................................................................................................

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E mesmo com tanta facilidade, muitas pessoas costumam viver no saudosismo de outras épocas da música, até mesmo das que não viveram. Carlos Augusto Alves acredita que todo mundo esteja inclinado a considerar a própria juventude como a melhor. E não é por acaso que o retrô está tão em


KULTUR • SÉRIE Retrô

Fabrício Araújo

A multi-instrumentista retrô Gunhild Carling foi uma das atrações do Estação New Orleans Nova Lima ........................................................................................................................

evidência em todos os aspectos da vida. Tiago Meneses aponta outro fator: “acho que o maior mal seja a mania das pessoas de comparar o que tinha de melhor antigamente com o que tem de pior hoje. Antes também existiam músicas ruins e hoje existem boas”, analisa. Talvez essa sim seja a solução da charada. De acordo com Tiago, o público “da minoria” é culpado por bandas boas não aparecerem e as músicas “de povão” estarem sempre em evidência. “Muitas vezes, bandas que estão no começo, buscando espaço, fazem shows e o pessoal não vai. Infelizmente esse é o mesmo povo que vive reclamando que não tem show na sua cidade, que não há bandas legais no Brasil”, avalia.

No final de maio, um festival trouxe ao município de Nova Lima o original jazz e blues de New Orleans. De acordo com a prefeitura, cerca de dez mil pessoas passaram pelo evento em cada um dos dois dias. Foram mais de vinte nomes regionais e internacionais do mundo da música improvisada. A multi-instrumentista Gunhild Carling foi um desses representantes. Nascida em família de músicos, a história de Gunhild com as melodias começou desde muito cedo. É quase como se os instrumentos fossem partes do corpo dela. O jazz, o swing e o blues parecem circular no sangue da família Carling. De cor muito branca, como uma típica sueca, sua voz se assemelha às originais cantoras negras do blues. Quem a viu no palco de Nova Lima sentiu como se tivesse sido transportado para uma década muito longínqua. As influências de todos os tempos são evidentes em várias das bandas atuais. O que foi criado será sempre reproduzido até que alguém consiga reinventar. No palco de uma praça que poderia ser de New Orleans, Gunhild tocou jazz, dançou swing e cantou. Soltou a voz com um megafone e fez relembrar as antigas cantoras de rádio. O festival em Nova Lima deu a certeza de que o tempo não é estático. O presente traz muito do passado e ainda dá indícios do que está por vir.

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Kultur • cinema

Enigmas da criação Reprodução

Logan Marshall-Green e os ótimos Noomi Rapace e Michael Fassbender em cena de Prometheus .............................................................................................................................................................................................................................................................

Prometheus, novo filme de Ridley Scott, traz os dilemas do existencialismo como pano de fundo da superprodução sobre a vida alienígena André Martins Conta a mitologia grega que os irmãos Prometeu e Epimeteu foram os primeiros titãs a habitar a Terra. Coube aos dois dar vida aos animais. Enquanto o primeiro examinava a criação, o segundo distribuía a cada espécie os mais diversos atributos e características naturais. Entretanto, ao homem nada restou. Diante disso, Prometeu subiu ao céu e, do sol, trouxe o fogo à Terra. Com o elemento, presenteou o homem, dando a ele o domínio sobre todos os seres viventes. A visão mitológica é uma dentre as tantas existentes que dissertam sobre a formação do homem. Soma-se a ela o criacionismo teológico, o evolucionismo de Darwin e os estudos astronômicos que sugerem a existência de seres extraterrestres – os possíveis

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predecessores da espécie humana. Perdido entre ciência e fé, o homem sempre teve a criação como um mistério insolúvel. O novo filme de Ridley Scott, Prometheus, peregrina por esse caminho. É mais que o tão badalado prelúdio da franquia Alien e o retorno do diretor à ficção científica. O que se tem é um retrato puro e futurístico da inquietação humana diante de perguntas existenciais cujas respostas permanecem na obscuridade do passar do tempo. O filme se passa no distante ano de 2093. Ao associar diversos pictogramas de civilizações antigas e encontrar os mesmos símbolos, os cientistas Elizabeth Shaw (Noomi Rapace) e Charlie Holloway (Logan Marshall-


Kultur • cinema

Green) embarcam na nave Prometheus. A missão dos 17 tripulantes que rumam para o espaço é investigar a presença de vida em um ponto remoto do Universo. Num “abrigo”, que curiosamente oferece condições de vida similares às da Terra, os exploradores descobrem uma organização de seres enigmáticos e complexos. Alguns deles, de feições humanoides, são chamados “engenheiros” (àquela altura, os prováveis criadores da raça humana). Mas o contato de criatura e criador é catastrófico. Isso coloca em perigo a vida na Terra. De semelhanças com Alien – o oitavo passageiro é feito Prometheus. Há nas obras personagens que se equivalem, exemplo das heroínas Shaw, de Noomi, e Ellen Ripley, vivida pela competente Sigourney Weaver; dos androides e outros. O diretor também relembra o primeiro filme, lançado em 1979 e dirigido por ele, por meio de tomadas quase espelhadas. A diferença é que, claro, foram repaginadas e muito bem feitas, graças ao refinamento da técnica de efeitos especiais. Até a própria estrutura de narração e o encadeamento lógico das ações fazem uma ponte entre os dois longas. Embora rememore o espectador em vários momentos e carregue uma carga nostálgica, Prometheus não se enquadra na categoria “mais do mesmo”. Por meio do filme, Scott resgata também uma temática desenvolvida em Blade Runner – o caçador de Androides, filme que possivelmente inspirou o tocante Inteligência Artificial, de Steven Spielberg. O robô David, incorporado pelo soberbo Michael Fassbender, é um quase-humano: tem desejos, ambições, é persuasivo e perspicaz. Ele desempenha um papel central. Em determinados momentos, é quase impossível não recordar a revolta da criação no desfecho de Uma odisseia no espaço, de Stanley Kubric. David é criatura como seu criador. E programado para pensar, ele também está à procura de respostas. Em tempo: é importante destacar a extraordinária capacidade de Fassbender de compor qualquer tipo de personagem com aparente facilidade. Não é à toa que o rapaz tem sido disputado “à unha” pelos diretores de Hollywood. A sueca Noomi Rapace também é ótima. Ela dá vida a uma heroína que transpira fragilidade e fixação – por viver ou descobrir o que se propõe. Por outro lado, Charlize Theron tem uma atuação apenas correta. Ao fim, percebe-se claramente que a

bela loira vencedora do Oscar por Monster – desejo assassino nada mais é do que uma coadjuvante de luxo em uma superprodução. Após a verdadeira bomba a ser esquecida Alien vs. Predador, de 2004, coube a Ridley Scott – o iniciador de tudo – retomar o mito com inteligência e rigor estético. Prometheus é prova de que o diretor está inteiro e não desaprendeu a fazer ficção científica da melhor qualidade, a despeito dos seus 74 anos. O cinema de Scott pode ser considerado “arrasa-quarteirão”, pois agrada às massas. Mas ele se consolida também por um cinema de pensamento, de poesia sutil e de filosofia, que está presente da mais pura forma na nova obra. Além da obsessão por descobrir a origem humana, há a supressão causada pelo fim, a tentativa desesperadora de dominar as regras da vida e o desejo de esconjurar a morte.

Prometheus é daqueles filmes para os quais o tempo só deve fazer bem. Assim como a incerteza provocada pelo belíssimo e emblemático final – que ao mesmo tempo é ponto de partida – é possível que se saiba o peso e a relevância da mais nova obra de Ridley Scott com o passar dos anos. Assim como Blade Runner, Prometheus tende a envelhecer bem. Reprodução

Michael Fassbender é o androide David em “Prometheus” ..........................................................................................................................

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Kultur • Artes plásticas

Uma arte tenebrosa como o próprio criador Obras do pintor italiano Caravaggio viajam no tempo e no espaço. Depois de quase 500 anos, elas chegam ao Brasil, pela primeira vez, em grande escala Fernanda Carvalho Reprodução

Crianças, jovens, adultos e idosos. Uma fila indiana com a cara do Brasil: miscigenada. Alunos de várias idades e de diferentes colégios esperam pelas próximas orientações. Mochilas e bolsas não podem entrar: ficam guardadas em escaninhos. Câmeras fotográficas, nem pensar! Flash é dispositivo proibido. E celulares, só no silencioso. Depois de todo o procedimento, finalmente se chega à sala: escurecida, refrigerada e misteriosa, com um clima que muito lembra o protagonista da exposição. A parede é vermelha e intensa, como não poderia deixar de ser. Bem no centro, ao fundo, recebendo todos, está a Medusa Murtola, pronta para petrificar os olhares curiosos. São seis pinturas a óleo do mestre italiano Michelangelo Merisi da Caravaggio e outras 14 de seus seguidores em outras paredes azuis. As obras vieram para o Brasil confortavelmente em vários voos. Como não é permitido transportar mais de duas vezes Caravaggio no mesmo avião, as peças foram divididas em pares. Quando aterrissaram, estiveram acompanhadas por uma escolta armada. E antes de serem colocadas em exposição, ficaram horas se acostumando com o clima. As obras do mestre são tratadas como rainhas. Mas não é à toa. Apenas algumas das pinturas de Michelangelo Merisi sobreviveram às centenas de anos. Com “cabelos mais que brancos”, elas são cuidadas “a pão-de-ló”, como joias preciosas que mudaram definitivamente a visão artística da época. Simulam o real com suas imperfeições e não como idealização.

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Inspirada na mitologia grega, a obra Medusa Murtola sai da Itália pela primeira vez e é um dos destaques da exposição ..........................................................................................................................

Apesar de não representar nem 10% das que sobreviveram, segundo o curador italiano, Giorgio Leone, trata-se da maior exposição do pintor na América Latina. Belo Horizonte teve a honra de receber a estreia. Ignorando todo sinal de indignação à burocracia, a capital demonstrou apreço pelo


Kultur • Artes plásticas

presente. O número 1250 da rua Jornalista Djalma Andrade está em clima de segurança máxima. Vigias e sensores são apenas os dispositivos facilmente visíveis na Casa Fiat de Cultura. Não é permitido nem mesmo escrever a caneta no próprio caderno dentro da galeria. Mas, além dessas, existe a proteção não revelada, que fica “trancada a sete chaves”. Cinco minutos no museu e já é possível perceber o porquê de tanta vigilância. O alarme é constantemente acionado pelos sensores. As pessoas não se satisfazem com a proximidade. Querem mais. Cada uma parece ter a esperança de tocar o que representa uma parte de Caravaggio. Se fosse possível, porém, é provável que uma das principais obras não mais existisse. A história representada pela Medusa de Caravaggio tem uma origem longínqua. Conta a mitologia grega que a Medusa transformava em pedra todos que a olhavam diretamente. Ao contrário das irmãs, ela era mortal. Depois que foi decapitada por Perseu, sua cabeça, com cabelos de serpentes, passou a servir de arma. Foi afixada ao escudo por Atena. Teria proteção melhor? Há pouco tempo, a obra foi revelada como legítima do pintor italiano. Pincelada sobre um escudo de madeira, o sobrenome do trabalho veio do poeta contemporâneo de Caravaggio, Gaspare Murtola. Na exposição, a obra ganhou posição de destaque e proteção reforçada de vidro. O olhar amedrontador, aterrorizante e raivoso da Medusa talvez revele mais do que o que conta a mitologia. É mais um reflexo do que se passava com Caravaggio. Violento, ameaçador e, ao mesmo tempo, fascinante, o pintor sempre foi considerado um enigma do mundo da arte. Dividiu a vida entre o pincel e a espada, revelando-se exímio na arte de retratar e “na de aniquilar”. Era intolerante às regras, carregava as próprias normas e expressava a sua dialética interior nas obras pictóricas. A agressividade expressa nas telas do pintor não é fruto do acaso. A morte é um tema recorrente. A

Medusa é apenas uma das obras que mostram seres decapitados. Na exposição, a pintura Santo Agapito mostra São Januário sob a forma humana, degolado, entre vida e morte, com gotas artificialmente pintadas jorrando da jugular. A pintura que dá boas-vindas a quem entra na galeria é uma das que mais exprimem as características de Caravaggio. A imagem de São Jerônimo imerso na meditação é intensificada por um jogo de luz e sombras, característica que impulsionou o pintor italiano. Foi a partir dele que a técnica Barroca do tenebrismo ganhou força. A morte não é deixada de lado em São Jerônimo que escreve. Uma caveira apoiada sobre livros dialoga em conflito dramático com a cabeça do personagem. No corpo do santo humano, as marcas do tempo. Rugas, unhas sujas, dedos calejados e poucos cabelos brancos. Michelangelo Merisi revolucionou a arte católica. Em vez de endeusar os homens, humanizou os deuses. Aproximou os pobres mortais do mundo dos céus e falou por meio da própria obra que todos podem ser chamados a se tornar santos. Na sala ao lado, os quadros representam obras dos principais Caravaggescos. Alguns brincam com a mesma dialética de luz e sombra, outros tornam mais humanos os santos e outros representam a morte. Mas poucos se aproximam da arte que ficou consagrada pelo nome do anfitrião da galeria. Como em um filme, uma obra revelada pelo jogo de luz e sombra. Como na fotografia, uma cena da realidade reproduzida, repleta de imperfeições humanas. Como na música, sons e silêncios, ouvidos em cada olhar. E mais do que em muitas palavras: expressões fortes, hipnotizantes, assustadoras. Tão enigmáticas quanto o próprio artista. Aqui, criador e criatura se confundem; um é parte do outro. Caravaggio e seus seguidores Data: 22 de maio a 15 de julho Local: Casa Fiat de Cultura Mais informações: (31) 3289-8900

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Kultur • música

O micróbio do samba

Meus encantos Reprodução

Artista: Adriana Calcanhotto Gravadora: Sony Music O DVD “O micróbio do samba”, da consagrada cantora gaúcha Adriana Calcanhotto, acaba de chegar às prateleiras. O DVD tem como base as 12 canções do álbum de mesmo nome lançado no ano passado e outras quatro músicas. Depois de gravar dois CDs voltados para o público infantil, no novo projeto Adriana faz experimentações com o samba. Coisa de qualidade. Assim como o CD, o DVD inclui a canção “Mais perfumado”, que Reprodução rendeu à cantora uma indicação ao Grammy de Melhor Canção de Língua Portuguesa em 2011. O DVD traz também um documentário sobre a nova turnê, que passou por diversas cidades europeias, Tóquio e algumas capitais brasileiras.

Paula Fernandes chegou a declarar que “Meus encantos”, seu novo álbum, não tinha sido feito para vender. A despeito da imprecisão do pronunciamento da cantora mineira, o novo CD é o mais novo sucesso de vendas no Brasil. Somente na primeira semana, 250 mil cópias saíram das lojas para chegar à casa dos brasileiros. Isso rendeu a Paula o CD triplo de platina. O sétimo projeto da cantora traz 15 faixas, duas delas em língua estrangeira: “Hoy me voy” e Long live”, uma parceria com a cantora americana Taylor Swift. Mas é precisamente a faixa “Eu sem você” que dá pinta de ser o grande sucesso do CD. Com apenas 27 anos, Paula Fernandes é a cantora com maior destaque no Brasil. Os shows da sete-lagoana chegam a custar cerca de R$ 350 mil.

I told you I was trouble Artista: Amy Winehouse Gravadora: Universal O primeiro DVD da curta carreira de Amy Winehouse tem se sustentado nas listas dos mais vendidos no Brasil. Além dos grandes sucessos do segundo disco, “Back to black”, o DVD, gravado ao vivo em Londres, inclui o documentário “I told you I was trouble”. O DVD é, sem dúvida, uma boa pedida para relembrar a cantora britânica, morta há quase um ano pelo consumo abusivo de álcool. Ao mesmo tempo, é um registro melancólico sobre os sonhos e projetos de uma das mais notáveis cantoras do soul que surgiram nos últimos anos.

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Artista: Paula Fernandes Gravadora: Universal Music

Reprodução


KULTUR • LITERÁRIA

Reprodução

Guia politicamente incorreto da filosofia

Reprodução

Getúlio: 1882-1930

Reprodução

O filho de Netuno

Autor: Luiz Felipe Pondé Editora: Leya Páginas: 224

Autor: Lira Neto Editora: Companhia das Letras Páginas: 624

Autor: Rick Riordan Editora: Intrínseca Páginas: 432

Não. Essa não é mais uma versão da história da filosofia. O terceiro livro da série “politicamente incorreta” é um ensaio sobre o cotidiano, por meio de pensamentos de grandes nomes, como Nietzsche, Darwin e Nelson Rodrigues. Dividida por temas, a obra trata de diversos assuntos: religião, felicidade, preconceito, capitalismo e instintos humanos. Tudo com uma grande pitada de ironia. Depois de Guia politicamente incorreto da história do Brasil e Guia politicamente incorreto da América Latina, o livro de Pondé segue o contrassenso e já ocupa a “cabeceira” dos mais vendidos.

Este é o personagem da história brasileira sobre o qual mais se escreveu. Mas nada que foi lançado sobre seu nome provavelmente se compare com essa trilogia. Getúlio: 1882-1930 é o primeiro livro da série, de autoria do jornalista especialista em biografias Lira Neto. A obra com narrativa prazerosa e ritmo de romance foi escrita depois de muita pesquisa em diários íntimos, boletins de ocorrência, charges, livros de memórias, entrevistas e todo tipo de arquivo. A documentação serviu para uma reconstituição minuciosa da trajetória política e pessoal de um dos mais populares ex-presidentes do Brasil.

Depois do bestseller Percy Jackson e os Olimpianos, Rick Riordan lança uma série para encabeçar as listas internacionais de mais vendidos. O filho de Netuno é a segunda obra da coleção Os Heróis de Olimpo. Inspirado na mitologia greco-romana, o livro conta uma nova aventura de Percy e os amigos semideuses. Agora eles terão que enfrentar os enigmáticos alvos da Profecia dos Sete. Neste livro, novas criaturas surgirão, mas alguns conhecidos monstros também vão fazer parte da narrativa. Percy e os companheiros terão muito trabalho pela frente. Se perderem essa batalha, as consequências serão as piores.

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KULTUR • agenda cultural

Emmerson Nogueira Ele é brasileiro, mas se revelou para a terra pátria ao executar diversos sucessos internacionais de bandas de peso, como Pink Floyd, Beatles, Supertramp, dentre outras. Resultado do CD e DVD “Emmerson Nogueira Ao Vivo Vol. 2”, gravado em comemoração pelos dez anos de parceria entre o músico mineiro e a gravadora Sony, o show do cantor chega a Beagá. Na seleção, música de altíssima qualidade: “Breakfast in América”, “Shine on You Crazy Diamond”, “Hotel Califórnia”, “Sailing”,... Na apresentação, os fãs poderão conferir também composições autorais. Ingressos à venda Marcos Hermes na bilheteria do Chevrolet Hall e no site da Tickets for Fun. Local: Chevrolet Hall Data: 28 de julho Horário: 23h Mais informações pelo site www. chevrolethallbh.com. br ou pelo telefone 3209-8989

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Savassi Festival 2012 Divulgação/ Refinaria da Imagem

O Savassi Festival caiu nas graças do belo-horizontino por espalhar música nos mais variados pontos da conhecida região da Savassi. Entre os dias 23 e 28 de julho, Belo Horizonte volta a receber o evento. Atrações gratuitas, ao ar livre, prometem movimentar a capital dos mineiros. O Savassi Festival é conhecido por propiciar o protagonismo de artistas locais, sejam eles iniciantes, sejam consagrados. Local: Palácio das Artes Período: 23 a 28 de julho Mais informações pelo site www.savassifestival.com. br ou pelo telefone 2514-1510


KULTUR • agenda cultural

De Chirico - o sentimento da arquitetura

Reprodução/ Chirico

Cerca de 120 obras, entre esculturas, pinturas e imagens da Fondazione Giorgio e Isa de Chirico, de Roma, permanecem expostas na Casa Fiat de Cultura até o fim de julho. É uma oportunidade para os mineiros conhecerem a obra do artista greco-italiano Giorgio de Chirico, considerado um dos precursores do surrealismo. Com a exposição, os visitantes podem identificar o ar fantasmagórico e a metafísica impressa nos objetos e nas cidades representadas pelo artista. Chirico tem grande importância na história da arte, precisamente na arquitetura. Sua obra se inscreve em grande parte do século XX. Depois de Belo Horizonte, a exposição passa por São Paulo e Porto Alegre. Local: Casa Fiat de Cultura Período: até 29 de julho Mais informações pelo site www.casafiatdecultura. com.br ou pelo telefone 3289-8900

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CRÔNICA

Joanita gontijo Jornalista e autora do blog tresoumais.blogspot.com joanitagontijo@yahoo.com.br

A temperatura da sopa O desafio não durou muito e logo apareceu uma imagem do fundo do mar. A última peça do quebra-cabeça se encaixou perfeitamente e fez os olhos dele brilharem. Eu acompanhei todo o processo e contribuí com uma dica importante: em primeiro lugar, coloque as peças do canto da figura e só depois vá preenchendo o centro. À noite, ao servir uma sopa quente para meu filho, avisei: “Comece pela beirada para não queimar a língua!”. Cantos, beiradas, margens, bordas não existem à toa. Basta olhar em volta pra compreender suas razões e funções. Para entrar no rio, é preciso testar a temperatura da água e a profundidade. Os primeiros passos, na parte mais rasa, devem ser lentos e cuidadosos até que nossos pés se acostumem com as pedras, nossa pele habitue-se à correnteza gelada e nosso corpo se sinta seguro para um mergulho.

Nada impede que um conhecido se transforme em um grande amigo ou que aquele beijo no final da festa torne-se um grande amor. Mas, por favor: não queime etapas

Também nas relações que construímos, há bordas que devem ser tateadas. A paixão, muitas vezes, mostra-nos atalhos perigosos, mas ainda acredito que a escolha segura seja o caminho mais longo... A cada passo, uma certeza; a cada abraço, um novo desejo. Em tempos de amizades virtuais, o contato dispensa a aproximação física, e a empatia é conquistada no intervalo de um “click”. Nas redes

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sociais, basta um “curtir” para que muita gente compartilhe suas alegrias, dores e carências para centenas de conhecidos com status de amigos. Se há afinidades reais ou vínculos de afeto, não se sabe. O que interessa é manter a agenda cheia de nomes e os finais de semana recheados de compromissos fugazes. Viver noites de gargalhadas superficiais e sentir ressacas que consomem a alma à procura de um sentido para as coisas. Não sou contra as amizades, mesmo aquelas que não sobrevivem a uma conversa séria, uma ajuda fraterna ou um happy hour prolongado. Eu mesma tenho muitas relações desse tipo. O que me preocupa é quando confundimos espectros de amores e amigos verdadeiros. A decepção é inevitável. Basta acender a luz para que eles desapareçam.

Nada impede que um conhecido se transforme em um grande amigo ou que aquele beijo no final da festa – quando não havia mais esperanças de sair acompanhado da balada – torne-se um grande amor. Mas, por favor: não queime etapas; não se apresse. Relações precisam de tempo, confiança, cuidado. É necessário passar pela margem para não se afogar num lago desconhecido. É importante separar as peças e ter atenção para encaixá-las uma a uma no quebra-cabeça e não destorcer a imagem final. É recomendável tomar a sopa devagar. Altas temperaturas deixam a comida sem sabor.


CARAVANA DA SAÚDE ASSINE SAÚ DE

Um gESto SimplES poDE mUDAR A SAÚDE No bRASil: SUA ASSiNAtURA. É uma campanha que tem como objetivo conseguir assinaturas para apresentar um projeto de lei de iniciativa popular na Câmara dos Deputados, em Brasília, e buscar mais recursos da União para a saúde. É claro que a Assembleia de Minas apoia essa iniciativa da Associação Médica Brasileira (AMB), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Academia Nacional de Medicina (ANM). E conta com a sua participação. Vá até um posto de coleta de assinaturas na Assembleia Legislativa, prefeituras ou câmaras municipais. São necessárias, em todo o País, 1.499.999 assinaturas. Mais a sua.

ASSINE POR MAIS SAÚDE PARA TODOS.

AssistA à tV AssembleiA, em bH, cAnAl 35 UHF

www.almg.gov.br l

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MINAS MAIS IGUAL


EM BH, A SAÚDE É PRIORIDADE. NOVOS LEITOS, MAIS CIRURGIAS ELETIVAS E MELHOR ATENDIMENTO.

Silene Oliveira Vale e sua filha Hanna, que realizou uma cirurgia de adenoide, pelo SUS, este ano.

A PREFEITURA DE BELO HORIZONTE REALIZOU MAIS DE 70 MIL CIRURGIAS ELETIVAS NOS ÚLTIMOS ANOS. DAS 19 MIL CIRURGIAS QUE AINDA PRECISAM SER REALIZADAS, 14 MIL JÁ ESTÃO AGENDADAS.

Imagem ilustrativa

As obras do grande Hospital Metropolitano do Barreiro estão em andamento e vão criar 320 novos leitos.

Foram criados 807 novos leitos para pacientes do SUS, o equivalente a 3 hospitais de grande porte.

PREFEITURA DE BELO HORIZONTE. NÃO PARA DE TRABALHAR POR VOCÊ. WWW.PBH.GOV.BR


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