O Segredo da Pororoca

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Aos que buscaram, em seus trabalhos, mostrar que jaz em solo brasileiro algo que — por mais absurdo — deve ser de conhecimento de todos... Antes que seja tarde. Pois uma coisa é certa: uma luta silenciosa tem sido travada em busca dos legados de Deus. Aos pesquisadores: Coronel Bernardo de Azevedo da Silva Ramos (Inscrições e Tradições da América Pré histórica — Imprensa Nacional)

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Ludwig Schwennhagen (Fenícios no Brasil, editado por Moacir C. Lopes — Cátedra)

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Introdução

N

o início dos anos 80, eu trabalhava num hotel na zona sul do Rio de Janeiro, quando comecei um projeto que, de início, eu acreditava ser fácil de realizar; o tempo mostrou que o que eu pensava ser apenas uma simples reunião de um determinado grupo de pessoas em busca de aventuras ou para localizar — quem sabe — uma cidade perdida (naquele tempo ainda não havia surgido o Indiana Jones), na realidade, era algo difícil e extremamente perigoso. Eu tinha pesquisado o caso do coronel Falwcett e possuía alguns dados relacionados ao assunto. O tempo foi passando e, aos poucos, fui chegando à constatação de que, embora houvesse algumas dúvidas e

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questões que pareciam ser fáceis de sanar, o trabalho tornou-se algo muito difícil; onde se poderiam buscar respostas, as portas eram fechadas. Percebi que deveria desistir e seguir minha vida. O tempo já me havia feito quase esquecer o assunto, quando fui chamado para conversar com uma senhora de nome Raisa. Ela chegou ao calçadão de Copacabana (local de nosso primeiro e único encontro) e, com muito esforço, foi retirada do táxi e colocada numa cadeira de rodas. Ficamos conversando na calçada da orla, em um dos bancos; fiquei desconfiado. Apresentei-me e fiquei esperando, sem saber o real objetivo do encontro. Ela parecia saber muito a meu respeito, isto é... Tudo. Falou que estava de viagem para seu país e que tinha vindo ao Rio de Janeiro apenas para falar comigo sobre o trabalho que eu havia iniciado; disse que gostaria de ajudar de alguma forma, pois estava muito doente e teria pouco tempo de vida. Então, ela tirou de uma bolsa um saco que continha umas fitas cassete; eram cerca de cinco fitas de noventa minutos. Eu segurei-as sem perguntar coisa alguma; ela disse que o conteúdo das fitas poderia oferecer informações muito valiosas para o trabalho. Conversamos por mais alguns

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minutos e chamei um táxi; o homem que estava com ela — que ficara distante de nós durante toda a conversa — colocou-a dentro do carro e ambos foram embora. Eu não tinha gravador e só depois de uma semana é que consegui um; ouvi uma fita, mas não toda; confesso que fiquei meio entediado e deixei para ouvir depois. Com isso, o tempo foi passando e só ouvi um pouco da primeira, que falava sobre a guerra. Para dizer a verdade, devido às turbulências da vida, pouca atenção dei às fitas: uma perdi, gravando música por cima de seu conteúdo original; outra se foi, destruída por ficar enrolada no mecanismo do gravador. Quer dizer, depois de passar por três mudanças de residência, acabei ficando com apenas duas das cinco que havia recebido de D. Raisa. Um dia, quando não tinha muita coisa para fazer, decidi ouvir as duas fitas; uma delas estava impregnada de mofo, causado pela umidade. Ainda procurei um amigo que trabalhava com equipamentos de som, mas ele nada pôde fazer: ela estava perdida. Na outra, a que estava perfeita, estavam, para minha surpresa, os fatos que relatarei neste livro.

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O fato é que, cinco anos depois da conversa com aquela senhora, escutei a fita (a que restou) cujo conteúdo — acredito eu — poderia ter mudado os acontecimentos mundiais. Anos mais tarde, decidi que deveria, de alguma forma, fazer o simples relato dos fatos, deixando para o leitor a tarefa de tirar suas próprias conclusões. Para isso, foi preciso reunir um apanhado de situações, o que possibilitou manter a coerência com as provas verdadeiras, que, aliás, estão à disposição de todos que, porventura, se aventurem à busca da verdade. Espero, assim, poder conduzir o leitor à investigação, fazendo-o concluir, por si só, de uma história que começou numa casa de família humilde — em algum lugar da Alemanha — e que poderá mudar muitos conceitos.

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Capítulo i

A

quele senhor careca, com seu terno surrado preto, sapatos velhos, em farrapos, estava em desespero: — Eles não podem pegar estes papéis! Vamos, rápido! Você deve levar tudo para o lugar combinado. Aconteça o que acontecer, temos de salvar o que temos. Vá! Naquela casa, havia um grupo de cinco pessoas, a maioria de idade avançada; entre elas, uma jovem de 14 anos, neta do chefe daquela família. Não deu tempo, freio brusco de pneus, alerta de que era tarde demais para fugir; a morte estava chegando.

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— Rápido, não dá mais tempo! Pegue a garota, vamos! Suba para o teto e não saia de lá até que tudo tenha terminado! Guarde isto com você e, depois, entregue para Isa, ela saberá o que fazer. Vamos, suba, suba. O barulho dos tiros e das portas sendo abertas à força chegou assustadoramente. Em poucos instantes, a porta era derrubada, deixando surgir as botas negras e polidas dos soldados da SS; eles ficaram perfilados, lado a lado, deixando um vão para que passasse o oficial Cruz de Ferro, da SS. Ele parecia saber o nome de todos e foi direto ao seu objetivo: — Sabemos que você tem o que estamos procurando. Entregue-nos, agora! As pessoas estavam acuadas no canto da sala, estáticas, sem reação. O oficial aplicou um violento chute no rosto de uma senhora, uma simples anciã, que caiu com o rosto sangrando, fazendo com que Abraham se manifestasse: — Não sabemos de nada do que vocês querem. — Pode deixar, logo teremos resposta. — A voz fria não deixa dúvida: é a Gestapo com seus homens, os “carniceiros”.

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Pela fresta do teto, ela podia ver a mais bestial crueldade humana contra pessoas indefesas. Sem emitir um só ruído, ela viu quando um dos homens sacou sua pistola “lugger” e a disparou na cabeça de um senhor, o pai de Abraham, que, aliás, já estava em estado deplorável de tanto apanhar. As lágrimas escorriam dos olhos da menina e, por azar, um pingo alertou um dos soldados, que então começou a fazer disparos em direção ao teto. Abraham passou a gritar e, dizendo que iria entregar o que eles queriam, pediu à jovem que aparecesse. Ela, então, abriu a tampa do sótão e, com a ajuda dos homens que estavam na casa, desceu com a pasta de papéis e alguns objetos, dizendo: — Por favor, vocês já têm o que queriam; está tudo aqui! Essas pessoas não têm culpa de nada! Podem me levar! As pistolas “lugger” trabalharam com precisão, acertando um a um, com um furo na testa. Sentado à mesa, prostrado em sua cadeira, com o rosto desfigurado, Abraham, o pai da menina, em suas últimas palavras, implorou para que não fizessem nada com ela, que estava em pé, ao lado

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dos homens, calada, estática, assistindo a matança de sua família. Finalmente, um tiro, jogou o rosto de Abraham para trás, espalhando seus miolos na parede. Era o fim: os homens da Gestapo deram por encerrado seus trabalhos ali e sairam levando a jovem. No corredor do prédio, corpos de pessoas que moravam ao lado, fumaça, fogo, um verdadeiro clima de destruição; estamos no local onde ser judeu era risco de vida. Era o início da caçada; o início da Segunda Guerra Mundial. O ano era 1936, em plena vigência da lei de cidadania do Reich, uma lei cruel, segundo a qual os judeus eram perseguidos implacavelmente, sem qualquer direito ou proteção, sendo vítimas do terror imposto pelo Estado e seus instrumentos: a SS e a temível Gestapo; estávamos em plenos preparativos para os Jogos Olímpicos de 1936 e, muito em breve, nos anos seguintes, o mundo iria sentir o gosto amargo da guerra. Descendo a escada, ao chegar à rua, como o comboio já estava com muitos presos, a jovem foi levada até a viatura da Gestapo que seguia os veículos. Eram sufocantes os dias em Potsdam; dias sombrios, em que a calma sutil da estrada era

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um alento. Sob o sol do entardecer e atravessando uma relva que fazia sumir algumas planícies, em uma estrada ladeada por árvores, o comboio seguiu por uma estrada paralela e, aos poucos, foi se afastando, até desaparecer. O rosto da jovem estampava uma tristeza profunda: a perda da família, a perda da inocência... Naquela estrada sem fim, seus olhos buscavam uma resposta para tanta maldade dos homens; ela se questionava se não haveria um castigo para os que haviam feito tudo aquilo. O comboio chegou a um algum lugar próximo a Brandenburg. Era um castelo com jardins gigantescos e belos, muito bem cuidados. Na entrada, a bandeira-símbolo do nazismo revelava que o local pertencia à SS. Lá dentro, não havia sorrisos; apenas o olhar frio de uma governanta, seguido por um corredor — cujo chão de tão polido poderia servir de espelho — que exibia, nas paredes, quadros com pinturas magníficas, além de móveis e cristais. Ao fundo, uma sala com sentinelas medievais, ou seja, armaduras em cada lado da porta. O homem da Gestapo entrou e a jovem ficou frente à frente com seu opressor: um homem, com seu uniforme impecável, no qual podia se ver

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a Cruz de Ferro de primeiro cavaleiro. Ela estava diante de Dietrich Dillway, o oficial primeiro de Himmler, homem querido pelo próprio Fuhrer (não era difícil imaginar o motivo da preferência de Hitler. Bastava ver nos olhos frios daquele homem o olhar da própria morte). Ele recebeu a pasta, fazendo sinal para que os agentes saíssem da sala e sentou-se à frente de uma mesa grande, numa cadeira cheia de detalhes em madeira; na parede, um quadro retratando uma batalha medieval, em que cavalos e espadas se misturavam numa pintura de sangue e dor. Sentado, ele verificava o conteúdo da pasta; além de papéis, havia um objeto cuja forma era difícil identificar. Em pé, calada, aquela jovem de 14 anos, de cabelos encaracolados, de olhos azuis grandes e bonitos, já esperava sua morte, quando o oficial começou a falar: — Muito bem, você é filha do judeu Abraham, não é? Seu nome é Raisa e, para sua idade, você é muito inteligente! Na escola, você conseguiu algo que deixou todos surpresos: você, uma judia, tem aproveitamento melhor do que alguns alunos alemães! Eu diria até que você seria a pessoa ideal para nos trazer uma medalha nos Jogos

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Olímpicos. Eu tenho tudo sobre você. — Nesse instante, ele se levantou e ficou ao lado de Raisa. — Sua ida para a escola, o que faz, com quem conversa, sei até sobre sua amiga alemã Sophie. Quero que você saiba que seu pai fez uma coisa muito ruim e, por isso, teve o que merecia, ele trabalhava no museu de Berlim e pegou algo que, para nós, parecia sem importância, mas — para seu povo — tem um valor inestimável. Só que é algo que nos pertence. Ah! Você deve estar querendo saber por que está viva; eu direi: eu queria ver você pessoalmente, não apenas por fotos. Ele então soltou o cabelo da jovem, deixando à mostra a menina-mulher que ela já era, o que foi logo percebido por Dillway. Ele não resistiu e beijou a jovem, que não correspondeu e permaneceu estática, enquanto ele, olhando-a fixamente, disse: — Você irá ceder, mais cedo ou mais tarde. — E se afastou em direção à mesa, onde apertou uma campainha. Minutos depois, chega Frida, a governanta, que levou a jovem para fora da sala. Dillway era o oficial responsável pela limpeza, quer dizer, pelo extermínio dos judeus. Sua “lugger” e seus homens ceifaram várias vidas, o

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que lhe valeu, “a boca pequena”, o apelido de “o carniceiro de Himmler”. O telefone tocou. — Alô! Sim, estou seguindo para lá, senhor; tudo já está pronto, não se preocupe, senhor. — Despede-se com a saudação ao “Fuhrer”. Pouco depois, chegam os homens da Gestapo, que seguem com Dillway, de carro, até a parte dos fundos do castelo e todos embarcam num avião, que decola rumo ao mais novo campo de extermínio de judeus: o Dachau, do outro lado da Alemanha. Seis dias se passaram. Ao final da tarde de uma sexta-feira, chegava o avião. O barulho dos motores era ouvido à distância. Em poucos minutos, a viatura chegou à porta e Dillway desembarcou, sendo recebido por Frida. Da janela, no alto, Raisa, por entre as cortinas, assistia a tudo. Não demorou muito e o palácio foi tomado pelo som de musica clássica, que invadia seus recantos mais secretos. Na imensidão dos jardins, era possível ouvir Mozart, Bizet, Wagner, Bach, Grieg etc. A noite chegou e, com ela, em um quarto fechado, a jovem Raisa vivia o terrível drama da incerteza de seu destino.

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