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Volo per Veritas | Juliana Torchetti Coppick
Preparando a Artilharia para a Próxima Batalha

Equipamentos para leitura dos cordões e cartões onde são depositadas as gotas.
Há cerca de 2 anos fiz um artigo falando sobre minha participação em terra em um “dia de campo”, que aqui nos EUA chamamos de Operation S.A.F.E (Self-regulating Application & Flight Efficiency). O programa foi desenvolvido em 1981 e é uma demonstração clara de que os profissionais da aviação agrícola reconhecem sua responsabilidade em minimizar os possíveis efeitos adversos da aplicação de defensivos na saúde das pessoas, dos animais e no meio ambiente.
Nesse ano de 2020, mais precisamente em primeiro de junho, eu pude participar não só em terra, mas também voando um Air Tractor 502B. Para minha alegria, o evento se deu na base da empresa para a qual eu trabalho. O local escolhido foi o aeroporto do Condado de Coles, em Illinois. Um local excelente com duas pistas asfaltadas e uma de grama.
Geralmente feito em dois dias, esse programa é um verdadeiro deleite aos olhos dos que se interessam não só pelo voo, mas também por entender a dinâmica da aplicação aérea de defensivos. Os equipamentos, normalmente compostos por bandeiras balizadoras, cordões de teste, papéis hidro sensíveis e verificadores de velocidade/ altura das aeronaves, são montados em uma área previamente estabelecida. Como a maioria dos leitores provavelmente já deve saber, o objetivo é que cada piloto faça passagens aplicando água com corante. Assim sendo, o ideal é que essas passagens sejam feitas na altura e velocidade nas quais operamos normalmente no dia a dia.
Um dos pilotos veteranos me deu um briefing da sequência e gentilmente pontuou alguns aspectos que são importantes não só para a avaliação técnica da calibração, mas também para fazermos um bom trabalho durante a safra. Para muitos, essas observações soariam bastante óbvias, mas acreditem, muitos pilotos experientes ainda cometem erros como, iniciar a subida após o “tiro” com a alavanca de aplicação ainda aberta, ou acelerar demais a aeronave principalmente na entrada da lavoura. São os detalhes que garantem uma boa aplicação.

Corante utilizado na água para os voos de teste.

Papéis hidrossensíveis. Os mesmos também passam por um scanner para gerar dados precisos do tamanho e distruibuicao das gotas. Os coletoresde papel são posicionados ao longo da trajetória de voo da aeronave aser testada.

Linha fluorescente no local da aplicação para coleta de gotículas. A corda é então alimentada através de umfluorômetro para avaliação por software especial.
Após alguns voos com o corante já é possível ver o rastro que fica no solo. Aliás, a coloração magenta (além de dar um toque feminino ao dia de campo) tem uma função prática, uma vez que o produto possui característica fluorescente, para possibilitar a leitura e escaneamento das gotas quando os cordões passarem pelo fluorômetro.
Confesso que estava um pouquinho apreensiva ao voar diante de uma plateia, principalmente por saber que cada detalhe do voo seria tecnicamente analisado. Mas, maior que a apreensão, era a minha expectativa positiva em testar a eficiência dos equipamentos instalados a bordo do AT502B que será meu companheiro de jornada nessa safra que está para se iniciar.
Costumo dizer que os bicos da barra de aplicação são como a caneta com a qual “assinamos” nosso trabalho. De fato, o melhor piloto, voando o melhor avião, não poderá realizar uma aplicação aérea com excelência se o todo o equipamento (bomba, barras e bicos) não estiver corretamente instalado e calibrado.
Éramos cerca de 10 aeronaves participando do dia de campo, sendo 9 turboélices e 1 aeronave a pistão. O pequenino Ag Truck nas cores azul e amarelo, era idêntico ao avião no qual fiz meus primeiros voos na primeira safra. Rapidamente um filme passou pela minha cabeça, como se eu fosse expectadora da minha própria jornada. Com um sorriso meio saudoso e meio orgulhoso no rosto, fui informada de que era minha vez de acionar o motor e fazer 3 passagens.
Após isso, eu deveria parar no pátio para que os bicos que ficam nas pontas das barras fossem fechados; técnica essa que visa reduzir a quantidade de produtos que é carregada pelo vórtice que se forma nas pontas das asas.
Assim fizemos. Os resultados estavam quase perfeitos, exceto por um leve acúmulo de produto no lado esquerdo da faixa, por conta do efeito que chamamos de “prop wash”. (Acreditem ou não, nesse exato momento não consigo me lembrar qual é a tradução para esse termo em português. O que me faz pensar que após a safra, uma viagem ao Brasil será providencial). Mas o tal “propwash” nada mais é que o efeito causado pelo deslocamento de ar das pás das hélices; que carrega as gotas para o lado esquerdo da faixa de aplicação (no caso de aeronaves nas quais a hélice gira em sentido horário). O problema é facilmente resolvido, de acordo com analistas, colocando alguns bicos extras no lado direito da barra de aplicação, ao lado do trem de pouso e fechando alguns bicos à esquerda.
Terminei meus voos e os números estavam ótimos! Passei pelo crivo da “plateia” e achei bastante proveitoso poder agregar mais essa experiência à minha carreira de aviadora.
Ao final do dia, com meu avião já calibrado, fui agraciada com alguns hectares de soja para pulverizar. Oficialmente, minha safra começou!
E, meus amigos, nós sabemos que não há sensação melhor do que a de se estar trabalhando com uma aeronave bem cuidada e calibrada!
Aristóteles dizia: “Só fazemos melhor aquilo que repetidamente insistimos em melhorar. A busca da excelência não deve ser um objetivo, e sim um hábito. ”