Revista Bertheriano - Jul/Ago/Set de 2021

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Editorial

Sumário

Editorial No próximo dia 19 de setembro, a Igreja celebra os 175 anos da manifestação de Maria em La Salette (França). Esta é uma data que nós, Missionários da Sagrada Família, queremos celebrar, compartilhando o júbilo dos nossos amigos e irmãos e irmãs Salettinos/as. Nosso fundador foi o Missionário de Nossa Senhora da Salette. Ele concebeu nosso instituto estimulado pelo mandato que ela deixou aos videntes: “Comuniquem isso a

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Editorial

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Missão no Mundo

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Missão no Brasil

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Central

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Espiritualidade

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Testemunhos

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Colabore

todo o meu povo!” Por isso, deu-nos Nossa Senhora da Salette como padroeira. A celebração deste ano jubilar chama-nos a revisitar “o evento Salette”, as palavras e os gestos simbólicos de Deus através de Maria na sua visita a Maximino e Melânia. Para mim, um dos aspectos mais belos, impressionantes de provocadores do “evento Salette” é a escolha dos seus interlocutores e testemunhas: um menino de 11 anos, semianalfabeto, com baixíssima cultura e prática religiosa, menor no trabalho como boia-fria, filho de um divulgador do secularismo; uma

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adolescente de 14 anos, igualmente semianalfabeta e com pouca cultura e prática religiosa, engajada no trabalho infantil na condição de diarista e boia-fria. Neste caso, se repete aquilo que a Escritura diz acerca de Belém: “Você não é de modo nenhum a menor entre as cidades de Judá, porque de você sairá aquele que vai apascentar meu povo” (Mt 2,5-6). Num tempo em que somos assaltados pela tentação de apostar tudo nos meios mais modernos e poderosos para

Expediente

Produção:

Essa é uma publicação da: Província Brasil Meridional dos Missionários da Sagrada Família

“divulgar” um Evangelho reduzido a uma moral ou ideologia religiosa, e também pela sedução dos “cultos turbinados” e da segurança esterilizante dos templos, a mensagem do “evento Salette” ressoa como profecia e provocação eloquentes: A

acreditar

na

força

evangélica

e

na

capacidade

evangelizadora dos “pequenos” (leigos e leigas, pobres e marginalizados) e no valor do testemunho cotidiano no coração de um mundo secularizado e indiferente, mas amado por Deus;

Responsáveis Conselho Provincial Pe. Itacir Brassiani, msf Coordenador Provincial Pe. Domingos de Sá Filho, msf Vice Provincial Ir. Irio Luiz Conti, msf Conselheiro Provincial Pe. Lotário José Niederle, msf Conselheiro Provincial

Edição Raissa Lemos Rocha Revisão de texto Stella Bousfield Editoração Editora Acadêmica do Brasil Capa e diagramação Tuany Pereira

A rever nossas práticas praticamente reduzidas às celebrações, ao serviço daqueles que ainda vêm aos nossos templos e gerar comunidades de discípulos/as missionários/ as em ritmo de saída samaritana às periferias para acolher e consolar todas vítimas, sendo para elas a Boa Notícia de Deus.

Por Pe. Itacir Brassiani, msf Coordenador Provincial

Contato e Pedidos Província dos Missionários da Sagrada Família (Brasil Meridional) Rua da Floresta, 1043 - Bairro Petrópolis Cx. Postal 3056 - CEP: 99051-260 Passo Fundo - RS - Brasil Fone: (54) 3313-2107 E-mail: secretaria@msagradafamilia.com.br Site: www.misafala.org Impressão e tiragem Gráfica Berthier / 2.500 exemplares


Missão no mundo

Passos na missão de formar cidadãos e profissionais em Moçambique

Uma educação em crescimento O Instituto Politécnico Familiar Rural de Mecubúri, outrora

de

Mecubúri à categoria de Instituto Politécnico Familiar

Mecubúri, surgiu no contexto da abertura do governo

Rural de Mecubúri (instituição de ensino médio técnico

de Moçambique em acolher Instituições de Ensino

profissional). Em 10 de fevereiro de 2021, finalmente,

Técnico Profissional.

recebeu o alvará autorizando-o a ministrar o nível

A

Escola

comunidade

Profissional

local

de

Familiar

Mecubúri

Rural

o Diploma Ministerial 62/2019 que elevou a EPFR

pediu

aos

médio em Agropecuária a partir do ano letivo de 2021.

Missionários da Sagrada Família uma instituição de formação profissional na área agropecuária. Em resposta ao pedido, a coordenação da Missão, juntamente com o governo distrital e Arquidiocese de Nampula, mobilizou recursos em parceria com a DISOP, ONG da Bélgica, para a construção desta instituição, que funciona desde 2012. Entre 2012 e 2019, essa instituição funcionou como Escola Profissional Familiar Rural de Mecubúri, ministrando o curso de Agropecuária (Agente Rural). Em outubro de 2019, a escola foi contemplada com

Visão, Missão e Objetivo A visão do instituto é consolidar-se como uma

cada cidadão que a frequenta, proporcionando-lhe um

referência em educação profissional em agropecuária

desenvolvimento que favoreça a orientação profissional,

e ser reconhecido como indutor da inovação e da

fomentando nos formandos o gosto pela produção

transferência de tecnologias alinhadas com o mercado

familiar

de trabalho, desenvolvimento comunitário, atuando

empresarial, seja particular ou coletivo.

com padrão internacional de excelência.

sustentável

e

pelo

empreendedorismo

Seu objetivo geral é qualificar profissionalmente

A Escola entende que sua missão é promover a

os formandos, desenvolvendo neles competências

qualificação profissional de nível Médio (CV3, CV4,

alinhadas com o mercado de trabalho e autoemprego,

CV5) em agropecuária e o desenvolvimento integral de

com senso crítico e participativo.

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Nº Graduados

2014

2015

2016

2017

2018

2019

2020

TOTAL

Total alunos

18

25

24

22

38

33

32

192

Nº meninas

07

10

11

06

14

12

08

68

Nº meninos

11

15

13

16

24

21

24

124

Idade do menor

15

15

15

15

15

14

15

-

Idade do maior

20

21

21

21

23

22

21

-

Encontro com a turma do nível médio

Missão no mundo

Desde 2014 foram formadas sete turmas, como indicado no quadro a seguir:

O caminho se faz caminhando Em 2021, concluímos a última turma do

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Encarado o futuro com confiança A

acreditação

definitiva

como

Instituto

nível básico (referente ao ano de 2020) com 32

Politécnico

estudantes, sendo oito mulheres. Em maio de 2021

agropecuária está dependendo da apresentação de

concluímos as matrículas para a primeira turma

outras infraestruturas que ainda estão pendentes,

do nível médio com 50 estudantes (15 mulheres).

principalmente a estufa e os laboratórios de química

Devido à pandemia, fomos autorizados a formar

(para análise de solos) e de água e de biologia

duas turmas de 25 estudantes. O ano letivo

(para observação morfológica e classificação de

começou no dia 26 de julho.

plantas e animais). Precisamos ainda ampliar a

especializado

em

formação

em

O nosso instituto conta hoje com 28 funcionários.

infraestrutura existente: dormitórios, refeitório,

Dentre estes, 15 são formadores licenciados, sendo:

cozinha, salas de aula, armazém para cereais e

oito da área técnica (agropecuária e ambiental,

qualificação dos formadores para os níveis CV4

dos quais cinco são engenheiros agrônomos, um é

e CV5. Com a ajuda da Congregação e pessoas e

veterinário, um é agropecuário e um é engenheiro

entidades parceiras que já colaboram com esta

ambiental) e sete das áreas do ensino geral

obra, esperamos poder avançar e cumprir com as

(português, inglês, química, física, matemática,

exigências que o Instituto requer.

informática e biologia). O curso Técnico em Agropecuária se prolonga por três anos. A autorização para começar o

Édina Lima

nível médio foi autorizado porque já temos em

Missionária Leiga e Diretora

funcionamento a sala de informática (doada pela ONG espanhola da Igreja Católica Manos Unidas), o bloco da Administração, a Biblioteca e novas salas de aula (doadas pela Cooperação Japonesa), a estação agrometereológica (doada pela turma de mestrado MBA’84 do IESE, Espanha), que também doou kits de análise de solos. Estes equipamentos foram considerados e aceitos pela Direção Nacional do Ensino Técnico, a entidade reguladora e homologadora das escolas técnicas de Moçambique.


Quero partilhar com os/as queridos/as leitores/as “lo que siento al caminar”, rememorando a “Canção com

realidade, formação e cultivo da espiritualidade na caminhada...

todos”, de Mercedes Sosa. Faço também um tributo ao

Mas de acordo com o Padre Antônio Vieira, “foi

Pe. Milton Sulzbacher, que nos “reemplazó” na missão e

dado aos missionários o fogo das línguas, a ciência

morreu vítima da Covid-19 em terras bolivianas, ao final

e a inteligência”. E assim, “despacito" foi possível,

de janeiro de 2021.

“quebrar a barreira” do quéchua, a língua dos povos

Revisitar

a

história

e

o

itinerário

missionário

originários. O respeito à “pachamama”, o bem-viver e

percorrido faz-me sentir a América Latina mais “en mi

a idiossincrasia dos povos ancestrais e suas máximas

piel". O “fogo das línguas” (Pe. Antônio Vieira) “irrompe

“ama llulia, ama quella, ama sua” (não seja preguiçoso,

onde quer” e nos impele a sair de nós mesmos. Quiçá

não seja mentiroso, não seja ladrão). Simples assim!

nosso testemunho possa encorajar os vocacionados em

Novamente na caminhada das CEBs, inculturar-se e

tempos de reestruturação das províncias.

beber do poço da espiritualidade popular, bem como

Iniciei a aventura missionária em Mato Grosso, em

assumir suas dores e lutas de resistências!

1989, recém-ordenado. “A todos a quem eu te enviar,

Com o passar dos anos, a missão nos obrigava a ser

irás”! (Jer 1,7). Sair da região fria das missões, minha terra

mestres e aprendizes, professores e também alunos,

natal, e lançar-me aos que estavam longe foi um choque

instrutores

cultural e térmico!

médicos da alma e do corpo. E, como servidores

de

técnicas

agrícolas,

construtores,

Paisagens diferentes e atraentes! À frente, novos

seus a todo momento, viver e morrer por eles, como

rostos, nova cultura e um banho de religiosidade popular.

aconteceu ultimamente! Em verdade, o “fogo das

Celebrações vivas, alegres e criativas! Época áurea das

línguas", levou-nos, como levou Paulo, a “fazer-se tudo

CEBs “novo jeito de ser Igreja”.

para todos, para por todos os meios chegar a salvar

Lá me deparei com todos os sotaques típicos e regionais.

alguns” (1 Cor 9,22). Animados pelo espírito da Sagrada

Tudo era desafiador e cativante! As longas distâncias e a

Família, nos lançamos não só a catequizar, sepultar os

comunicação precária no atendimento às comunidades

mortos, ou doutrinar convertidos, mas sustentar os

não eram empecilho para seguir caminhando. O meio

famintos, resgatar os cativos, em múltiplos projetos de

ambiente, o pequizeiro, árvore símbolo do cerrado, aos

inserção social.

poucos fora sendo dizimado! Atuar neste ambiente vasto e diferente e apropriar-se da beleza genuína do pantanal, o cantar e o encantar do povo matogrossense, seu jeito singelo de viver a fé, me cativou! Essa experiência missionária foi uma das mais belas e marcantes, deixando em mim profundas marcas. Percebi o quanto a fé simples exercida nas comunidades e a arte musical é parte intrínseca da alma latinoamericana! A segunda etapa foi Ad Gentes, onde integrei a equipe missionária na Bolívia pluricultural, com membros de distintas províncias e congregações. A missão exige despojamento, abnegação, atitude! Assimilar e dominar a nova língua foi um processo lento e difícil. O “portunhol” era sofrido! “Hablas como sabes”, “estamos acostumbrados", diziam-me! Rostos ameríndios e um novo esforço de inculturar-se e reaprender. A experiência vivida no Mato Grosso foi de grande valia para vencer as resistências que surgiam a “cada rato”! Um processo permanente de adaptação à

Missão no Mundo

O fogo das línguas e a linguagem do amor

Pe. Léo Paulo Fiorin msf São Carlos/SC

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Missão no Brasil

Como anunciar a mensagem de Maria no Brasil de hoje? Estamos celebrando os 175 anos da manifestação

neles a consciência crítica e a confiança na sua

de Maria, mãe e discípula de Jesus, a Maximino e

própria organização e forças. Maria fala claramente

Melânia, em La Salette (França). Nascemos como

a Maximino e Melânia: “Não tenham medo e

congregação missionária na montanha da aparição,

aproximem-se, meus filhos! Eu trago uma boa

pela intuição apaixonada de um grande devoto

notícia para vocês!”

e notável divulgador da mensagem de Maria, o missionário salettino João Berthier.

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Um terceiro aspecto é apontar para sinais concretos dos males que vitimam o povo e passos concretos para

Se não quisermos permanecer na periferia

uma mudança consistente e duradoura da realidade.

ou na superfície deste acontecimento aceito e

Maria ajuda os videntes a perceber tanto a injustiça

reconhecido pela Igreja, precisamos responder, em

que vitima o povo e provoca suas lágrimas (morte

termos teóricos e práticos, como podemos ser fiéis

de crianças, fome, desleixo ético e religioso) como

à mensagem e ao evento de La Salette no Brasil de

para a conversão ao Evangelho de Jesus Cristo como

hoje? Como anunciar a mensagem encorajadora e

caminho para uma convivência e uma sociedade

provocadora de Maria num país de novo ameaçado

mais justa e saudável.

pela fome e pelo autoritarismo, dividido numa

Penso que outro desafio que o evento de La Salette

nociva polarização política e cultural que fere até

apresenta às nossas comunidades e seus agentes

nossas comunidades eclesiais, retrocedendo na

é assumir a dimensão da ecologia integral e do

atenção e no cuidado com o ambiente e com os

cuidado do meio ambiente como parte integrante da

povos originários?

missão. Entendo que na fala de Maria às crianças

Convido você a encarar comigo esta pergunta e

está subentendido que o “desequilíbrio ambiental”

ensaiar algumas respostas que sejam, ao mesmo

(crise na produção de alimentos, morte de crianças)

tempo, fiéis ao Evangelho e ao evento (símbolo e

é a expressão visível de uma desarmonia existencial,

mensagem) da aparição e criativas como resposta

social espiritual (o abandono da convivência sadia,

adequada e encarnada no contexto em que vivemos.

regrada pelo Evangelho). “Tudo está interligado”,

E tomo a dianteira, propondo quatro perspectivas.

dirá o Papa Francisco.

A primeira perspectiva para um anúncio fiel e

Estes são alguns “pontapés” iniciais no jogo da

criativo da mensagem de La Salette no Brasil de

“acolhida fiel e criativa” da mensagem de Deus em

hoje é priorizar a aproximação e o diálogo com as

La Salette. É um chamado dirigido a nós e nossas

pessoas e setores sociais vitimados ou colocados à

comunidades para que caminhemos decididamente

margem pelo projeto econômico neoliberal e injusto

como uma Igreja mais evangélica, comprometida

que vem sendo implementado. Maria dirigiu-se a

com os pobres, em saída solidária para acolher

duas crianças em situação de vulnerabilidade, que,

e dialogar com os pequenos e vulneráveis. Você

em tenra idade (11 e 14 anos!), trabalhavam como

concorda? O que você acha necessário acrescentar

“boias-frias”.

ou desenvolver?

Uma segunda linha inspiradora para nossa missão no Brasil de hoje é anunciar aos pobres e excluídos uma mensagem claramente positiva, encorajadora, emancipadora, capaz de despertar

Pe. Itacir Brassiani msf Passo Fundo/RS


Central

Reconciliem-se! Ao povo pobre e aos católicos relapsos de La Salette e do mundo, Deus oferece, gratuitamente, sua mãe em missão reconciliadora. Ela nos chama a reconciliar a fome reinante com uma mesa farta, e a reconciliar o povo com o projeto de seu filho Jesus. É Deus que quer revelar sua identidade mais profunda, seu mistério, Aquele que age pela bela e terna mulher, pelos pequeninos e pequeninas, ou seja, através de nossa e sua humanidade. Em nossas famílias, em nossa sociedade, a solução dos maiores problemas se dá através de pequenas e permanentes atividades, realizadas em comum, em mutirão. Entre o sinal da cruz e o prato de comida, os dois são indispensáveis para a reconciliação. Esta tem um lugar privilegiado para ser vivida: ao redor da mesa. Aí é onde acontece o diálogo, a partilha das ideias, onde repartimos o pão como alimento para o corpo e para o espírito, para todos os convidados, indistintamente. Estão junto a estes pobres e deserdados de La Salette, sem falta, os pecadores, as prostitutas, os impuros, os samaritanos, os pescadores, os cobradores de impostos, os perseguidos, o filho mais novo e o mais velho, os peregrinos, os profetas, os pacíficos, os puros, os pastores, os testemunhas, os mártires e os apóstolos.

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Porém, os méritos são de um só, daquele que é Pão e Palavra, na única e mesma mesa, Jesus Cristo, Nosso Senhor. Aquele que veio para servir e não para ser servido. Aquele que ousa lavar os pés e o pecado da humanidade e reconciliá-la com o Pai, no sangue, no sofrimento e na ressurreição da carne. Maria, gozando da confiança que Deus colocara nela, não fica só no céu, porque assunta em corpo e alma, e nem fica só na montanha de La Salette, olhando ao longe. Ela desce para a planície com os pequenos, Melânia e Marcelino, em obediência a tudo o que seu filho disse e fez. Acontece, então, a reconciliação entre a montanha e a planície, integrando toda a natureza, morada comum de Deus e nossa. Participam da reconciliação o Pai, o Filho, sua Mãe, os pequenos, os pobres e os pecadores que passaram a morar na Casa da Misericórdia, mais conscientemente, com a mediação histórica da Mãe de La Salette, em 1846. Eis a derradeira Aliança dos diferentes, confirmada pelo Espírito Santo e ungida com o óleo da Paz. Atestam esta obra reconciliadora os milhões de devotos, as centenas de comunidades, as dezenas de santuários e basílicas que visualizam a doação gratuita do Pai e de sua Mãe, ao mundo, Casa Comum dos reconciliados.

Assim, que podemos rezar com todas as Melânias e todos os Marcelinos: “Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco...” “O pão nosso de cada dia nos dai hoje...” “Nossa Senhora da Salette, reconciliadora dos pecadores, rogai sem cessar por nós que recorremos a vós. Amém!”

Pe. Vergílio João Moro msf Jataí/GO


Central

A simplicidade das coisas do Reino de Deus Coin é um pequeno lugar de roça onde, em setembro

de

1846,

viviam

algumas

poucas

famílias. Estava localizado a pouco mais de quatro quilômetros de Corps, cidade onde viviam Maximino e Melânia, os dois pastorzinhos de La Salette. O terreno era propício e, por ser um pedaço de

Buscando um sentido

planície em meio às montanhas dos Alpes, fazia

Eu gosto muito de ficar conversando com o

Em Coin plantava-se e produzia-se bom trigo.

daquela região um lugar importante de produção agrícola, mesmo se tal produção não fosse assim tão grande em quantidade.

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Maria fala de Coin! Para ali dirigiram-se, alguns meses antes da aparição, o pai e o próprio Maximino. Um fato interessante aconteceu naquele lugar já quase no retorno dos dois a Corps. Tal fato serviu posteriormente para que o pai de Maximino acreditasse no filho quando este relatou o episódio acontecido no alto da montanha no dia 19 de setembro. No seu diálogo com as crianças, Nossa Senhora perguntou a Maximino se já havia visto trigo estragado. Ele, sem muito pensar, respondeu que não. Então, a “Bela Senhora” lhe recordou o episódio de Coin:

“Mas tu, meu filho, tu deves tê-lo visto uma vez, em Coin, com teu pai. O dono da roça disse a teu pai que fosse ver seu trigo estragado. E então fostes ambos até lá, apanhastes duas ou três espigas entre as mãos e, amassando-as, tudo virou pó. Ao voltardes, quando não estáveis mais do que a meia hora longe de Corps, teu pai te deu um pedaço de pão dizendo: "Toma, meu filho, come pão ainda neste ano, pois não sei quem dele comerá no ano próximo, se o trigo continuar assim!"

Pe. Roger Castel, um velho missionário saletino da Província da França, que muito estudou o fato da Salette. Seus comentários sempre despertaram em mim algumas novidades na análise da aparição e na interpretação do conteúdo dessa espiritualidade. Certo dia, quando nos encontramos no refeitório para o café da manhã, na Casa Provincial em Grenoble (sede da Diocese na qual está o Santuário da Aparição), conversamos justamente sobre o acontecido em Coin, com Maximino e o seu pai. Padre Castel começou fazendo a aproximação desse Episódio de Coin com a passagem do Êxodo, na qual Deus diz que ouviu o clamor do seu povo e resolveu descer para libertá-lo. Para ele, a fome eminente fez que, em nome de “Seu Filho”, Nossa Senhora descesse do céu para deixar ao mundo a sua mensagem.


Central

Coin é um lugar simbólico Esta aproximação já dá muito pano para manga, mas Pe. Castel foi muito gentil comigo e traçou ali, naquele momento, seis aspectos quanto à terra de Coin no contexto do fato e da mensagem da Salette. Por sorte, ali havia uma caneta e peguei um pequeno pedaço de papel e fui anotando cada um destes seis aspectos: Coin era o lugar da laicidade, ou do mundo que vivia longe da religião, daqueles que zombavam da Igreja, dos que não iam à missa. Não consta que naquela época houvesse lá uma capela. Era o mundo do secularismo e do abandono de Deus. Coin era o lugar do cotidiano, da vida como ela é, onde se via o esforço do trabalho humano se perder, porque o trigo estava se estragando de maneira assustadora devido às condições da natureza. Coin era o lugar da produção, entendida aqui não somente como produção econômica, mas também onde se dava o “giro da vida”, onde a produção das possibilidades de futuro era marcada pela crise agrícola e pela consequente migração para Grenoble, ou para Lyon e até para Paris. Coin tornou-se um lugar teologal, ao ser citada por Maria na sua aparição. Tudo o que estava acontecendo ali, na vida daquele povo, parece então ter uma explicação: o povo de Coin e redondezas estava desviando-se dos caminhos da aliança e do compromisso com a fraternidade do Reino de Deus. Coin se fez chão, lugar da oscilação da esperança, tão necessária para viver, acreditando que as coisas poderiam mudar. O pai de Maximino disse: “Se as coisas continuarem assim, não sei quem vai ter pão no próximo ano”. Toda a base moral da vida poderia

Uma chave existencial, pastoral e espiritual Esses foram os seis pontos aos quais o Pe. Castel fez referência sobre o episódio de Coin. Porém, após cada um deles, ele sempre repetia que aquele ponto era mais uma razão para explicar a Aparição, mas não era a explicação da razão de Maria falar daquele fato na sua aparição. Isso me fez perguntar: “Então, porque Maria citou esse episódio na sua aparição?” A resposta foi muito simples: “Porque jamais passará desapercebido aos céus o gesto de alguém dar um pedaço de pão a outro alguém. O gesto do pai de Maximino lhe dar um pedaço de pão e não uma cobra, foi percebido por Aqueles que estão nos céus...” Penso que o Padre Castel percebeu que eu fiquei pensativo com a resposta que ele me deu, a ponto dele acrescentar: « C'est la simplicité des choses du royaume de Dieu... » (É a simplicidade das coisas do Reino de Deus…). Em La Salette, Maria vem nos dizer das coisas mais simples que se tornam gestos e fatos mais significativos no Reino de Deus. Ela nos recorda a simplicidade das coisas do Reino anunciado por seu filho Jesus.

estar ameaçada por aquela situação sem esperança. O episódio de Coin tornou-se então uma “chave” que abre os corações endurecidos que não queriam aceitar o fato daquela aparição de Nossa Senhora justamente a Maximino e Melânia, uma chave que abre os corações endurecidos para ser depois, e tão somente depois, fato que gera conversão.

Pe. Adilson Schio ms Missionário de Nossa Senhora da Salette Reitor do Santuário de Caldas Novas/GO

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Central

Você também é chamado a ser discípulo e missionário! O venerável Padre João Berthier, fundador dos Missionários da Sagrada Família, quis Nossa Senhora

da

Salette

como

padroeira

dessa

Congregação. Sua admiração e devoção pessoal por Maria em La Salette começou bem cedo, quando ele ainda tinha seis anos. Berthier tinha apenas seis anos de idade quando sua avó lhe contou a história da aparição de Nossa Senhora nos Alpes de La Salette. A história da aparição e a mensagem de Maria aos dois videntes marcou de forma profunda e definitiva sua vida, e

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ele acabou se tornando grande devoto e propagador de Nossa Senhora da Salette. Quando já era padre e missionário saletino, inspirando na experiência da sarça ardente, Berthier disse em uma de suas homilias: “Nosso coração te segue, ó Maria! Oxalá possamos te contemplar lá no alto! Tu te fizeste ver aqui nesta maravilhosa aparição para nos oferecer a grande e bela visão de tua glória no céu. ‘Vou aproximar-me para admirar esta visão maravilhosa”. E, dirigindo-se aos romeiros, estimulou-os: “Vocês disseram que vieram aqui para ver a manifestação de Nossa Senhora. Digam o mesmo em relação ao céu, do qual La Salette é uma antecipação, um aperitivo: Vou aproximar-me, vou caminhar nos mandamentos. E verei e admirarei”. O impacto do evento da aparição de Nossa Senhora em La Salette chegou a nós através da linguagem

Acolhendo a admiração do Pe. Berthier por Nossa Senhora de La Salette e considerando as releituras e interpretações teológicas, percebemos a relevância de Nossa Senhora para a vida vocacional, espiritual e missionária. Foi olhando para Maria que Berthier descobriu sua vocação religiosa, apostólica e missionária. Olhando para este acontecimento, meditando nas palavras de Maria e mergulhando no seu simbolismo, podemos descobrir o sentido da nossa vocação primeira, o chamado a uma vida doada a serviço de nossas comunidades. Maria dizia aos dois adolescentes: “Não tenham medo, meus filhos! Aproximem-se! Eu tenho uma boa notícia para vocês! Vão e anunciem isso a todo o meu povo!” Este convite estimulante é dirigido hoje a todos nós, membros das comunidades eclesiais. É um convite especial dirigido a você, por que não?! Não tenha medo de gastar sua vida pelo Evangelho, de doar o melhor de si pelos outros, de sonhar um mundo melhor e se engajar destemidamente na tarefa de transformar este sonho em realidade.

da devoção tradicional na qual ele cresceu e se desenvolveu. Com o tempo, os conceitos foram mudando e dando à luz uma devoção à Maria mais consistente e passamos a considerar Maria não mais unicamente em seus traços gloriosos, mas ressaltando sua figura humana e feminina de discípula missionária, aquela que deu seu “Sim”, para gerar a vida do Salvador.

Fr. Adilson Juliano Assmann msf Saudades/SC


Central

Nossa Senhora da Salette: um convite que desabrocha em envio Quando refletimos sobre as palavras proferidas por Nossa Senhora na aparição nas montanhas de La Salette, na França, nada é mais emblemático do que o CONVITE e o ENVIO feitos para os videntes Maximino Giraud e Melânia Calvat: “Vinde meus filhos, não tenhais medo, estou aqui para vos contar uma grande novidade.” É um convite que, em primeiro lugar, destaca a proximidade que a mãe de Jesus quer ter com as “pobres crianças”, tocando-lhes assim o coração. É um convite que também ajuda na superação dos medos e das desconfianças, pois só pode haver proximidade construtiva quando há plena confiança no ouvir e no falar. Aproximar-se sem medo é, acima de tudo, confiar. Ouvir o convite e ir ao encontro de Nossa Senhora e, ao mesmo tempo, ser chamado e tratado como “filho(a)” certamente acalentou o coração dos dois pastores, que responderam prontamente, dando os passos da coragem. É um convite que, na resposta positiva de Maximino e Melânia, levará a um grande aprendizado e uma grande responsabilidade. Um grande aprendizado: Estar atentos/as à Palavra, compreender a profundidade da ação que Maria entrega a eles, através da mensagem anunciada, do chamado à reconciliação. Este aprendizado leva as duas crianças videntes de La Salette a se tornarem proclamadores dos pedidos da mãe de Jesus, sem nunca entrarem em contradições. Uma grande responsabilidade: Para que, além de escutar, seja possível anunciar e levar adiante, de forma que outros corações sejam tocados. Esta responsabilidade trouxe aos pastorzinhos de La Salette a maturidade na transmissão da mensagem. Deste encontro nasce a segunda palavra de destaque pronunciada por Maria: “Vão meus filhos, comuniquem isso a todo o meu povo”. O pedido de Maria em La Salette faz daqueles dois pobres pastores e boias-frias portadores de palavras de conversão e reconciliação. As palavras CONVITE e ENVIO não foram diretamente pronunciadas por Maria, mas estão subentendidas no contexto da aparição como um caminho pedagógico da compreensão de Maximino e Melânia em relação à missão de comunicar a experiência como boa notícia a todo povo. Este CONVITE-ENVIO transforma para sempre a vida daquelas duas humildes, pobres e limitadas crianças. Elas se mostram capazes de relatar e passar adiante, sempre com exímia autenticidade e detalhes coerentes, a mensagem de Maria. Em La Salette, Maria nos inspira também hoje a desenvolver a capacidade de ouvir os apelos, a atitude de aproximar-nos sem medo e a decisão de anunciar o Evangelho da vida e da alegria plenas com coragem e esperança.

Pe. Leonir Nunes dos Santos ms Superior Provincial dos Missionários de Nossa Senhora da Salette Curitiba/PR

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Central

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A mensagem de Nossa Senhora da Salette Uma verdadeira mãe “se derrete amor” por seus filhos!

A conversão é sinal da graça misericordiosa para com

Assim, aconteceu que um dia de sábado ensolarado, era

cada criatura. Em Salette, Maria é o canal da graça de Deus

19 de setembro de 1846, quando Deus permitiu que a Terra

e se torna modelo para todo cristão que se compromete

recebesse a visita da mais bela criatura que ele criou, a

com o Reino de Deus. Aqueles que zombavam de Deus

Virgem Maria. Duas simples crianças que pastoreavam

na missa e comiam carne na quaresma como cães,

em uma montanha se depararam com uma forte luz, uma

precisavam fazer a experiência da graça de Deus em

misteriosa criatura que aos seus olhos fascinavam e ao

suas vidas errantes. A conversão gera mudança de vida,

mesmo tempo os amedrontavam.

ressignificação. A Virgem Maria pede que Maximino e

A visita da Virgem Maria se dava em contexto difícil.

Melânia levem a todo povo sua mensagem da conversão

Nuvens negras pairavam sobre a Igreja, que sofria parte da

que brota da compaixão de Deus. Isso é necessário para

triste herança da Revolução de 1789 que perseguiu e matou

que o braço de seu Filho não caia e ele canse de interceder

muitos cristãos. Era também o tempo do surgimento da

pela humanidade.

indústria e de grandes transformações e descobertas,

Maria está em plena sintonia com o projeto de Deus. Ela

com “massas humanas sobrantes” perambulando pela

não toma a glória de seu Filho para si, mas se faz-se serva

Europa. Muita gente vivia como ovelhas sem pastor, sem

que leva todos a Ele. Desse modo, a vontade de Nossa

Deus, sem fé. Quem se considerava adulto e importante

Senhora é que seus filhos e filhas alcancem a santidade,

tratava a religião com desprezo e influenciava a grande

a salvação de suas vidas que custou a vida de seu Filho.

massa a vilipendiar a fé.

Como em Caná, também em Salette Nossa Senhora vem

Maria vem ao encontro de seus filhos e filhas “se derretendo em lágrimas” de dor e aflição, mas também

pedir que façamos a vontade de Jesus, busquemos ao Senhor, pois todos somos chamados à santidade.

de compaixão e misericórdia. Maximino e Melânia

A aparição de Nossa Senhora da Salette é uma

não compreendiam direito o que se passava, até que

manifestação da misericórdia de Deus pela humanidade

a bela senhora que chorava se apresentou dizendo:

por intermédio da materna assistência da Virgem Maria.

“Aproximem-se, filhos, não tenham medo Estou aqui

“A maternidade de Maria na economia da graça perdura

trazer boas notícias”. Maria veio trazer uma mensagem

sem interrupção, desde o consentimento, que fielmente

de misericórdia, conversão e santificação.

deu na anunciação e que manteve inabalável junto à cruz,

Os pecados da humanidade clamavam a Deus por

até a consumação eterna de todos os eleitos”, diz a Igreja.

justiça. Nossa Senhora diz que as blasfêmias e o

São inesgotáveis os sinais e incomensuráveis os frutos

desrespeito ao descanso dominical eram os graves

que a aparição de Nossa Senhora da Salette produz. É uma

pecados que tornavam o braço de seu Filho pesado. Deus

clara demonstração de que Deus é atento ao percurso da

já não encontrava espaço nos corações dos homens. Esse

história. O evento Nossa Senhora da Salette nos exorta

é o risco que o Homem cava para a si mesmo. Como dizia

a não nos perdermos no tempo, a dar a devida atenção

Dostoievsky em uma de suas obras: “Se Deus não existe,

aos sinais dos tempos, e nos chama a viver à luz da fé e a

tudo é permitido”. Quando quebra a relação com Deus,

cumprir nossa missão de ser sal e luz no mundo.

o ser humano é capaz de tudo, perde o rumo e a própria compreensão de sua dignidade.

Cabe entregar-nos sem medo e com piedade à vontade de Deus, sabendo que ser sinal profético no mundo

Diante da nefasta conjuntura, Maria, como mãe de Deus

significa, antes de tudo, comprometer-se com o Reino de

com Cristo e a Igreja, surge como arauto da misericórdia

Deus, como Maria, sendo sinal de santidade na Igreja e no

de Deus à Humanidade sofredora é vítima de si mesma

mundo. Que Maria, Mãe de Cristo e da Igreja, nos ajude

e aconselha: “Rezem ao menos um Pai Nosso e uma

a ser coerentes com o Evangelho, dóceis aos sinais dos

Ave Maria. Mas se vocês tiverem tempo e puderem,

tempos e fiéis à Igreja de Cristo.

rezem mais”. A Virgem Maria compreende que só pela misericórdia de Deus o ser humano pode unir-se a Deus novamente, e essa misericórdia passa pela oração: rezar não por si, mas por todos.

Luiz Ronaldo Alves dos Santos Noviço dos MSF, Santiago, Chile


A presença missionária dos Missionários da Sagrada

realização pessoal. Aqui descobrimos outra profunda lei

Família neste momento da história é bastante plural e

da realidade: a vida se alcança e amadurece à medida que é

diversa no que diz respeito às formas particulares que

entregue para dar vida aos outros. Isto é, definitivamente,

assume nos 23 países nos quais estão presentes. A partir

a missão”.

de nossas Constituições e das palavras do venerável

Como dinamismo da realização pessoal, a missão faz

Pe. Jean Berthier, essa missão sempre foi uma participação

com que o ser vá se realizando na medida em que se

específica na tarefa missionária da Igreja, especialmente

torna comunicação da vida nova, vivência e partilha do

na formação de missionários para enviá-los em missão

Evangelho nas interações com a alteridade, abertura

conforme as necessidades da Igreja.

de processo de emancipação para o outro e para si

Conforme o Pe. Ferdinand Nolte msf, a Congregação

mesmo. Eis a verdadeira dimensão existencial da missão

pisou modestamente na arena missionária no início do

na solidariedade profética e dialogal para que todos

século 20 para, ombro a ombro, trabalhar e sofrer com

cheguem à salvação.

os pioneiros missionários mais antigos. Na verdade, a Congregação não é senão um fruto da profunda convicção do fundador de que a colheita é grande, mas poucos são

Uma presença nos cinco continentes

os operários (Mt 9,37). Berthier não cansava de repetir:

É motivo de grande alegria constatar que a nossa

“é para as missões estrangeiras que a Congregação foi

presença em tantos e diversos lugares, nos quais a missão

fundada”.

foi adquirindo seu próprio rosto e configuração, assume a

A memória deste início nos desafia e abre horizontes que não se podem ser esquecidos se quisermos manter

diversidade cultural e a expressividade que são próprias dos povos com os quais se compartilha a missão.

a fidelidade à história da construção congregacional e

Nossa presença na Argentina, Alemanha, Áustria,

suas implicações para o futuro da missão. De um lado, é

Brasil, Bielorrússia, Bolívia, Canadá, Chile, Cuba, Espanha,

importante manter a modéstia e humildade nas relações

Estados Unidos da América do Norte, França, Filipinas,

com os outros agentes da missão; por outro, é necessário

Holanda, Indonésia, Itália, Madagascar, Moçambique,

desenvolver e qualificar nossa participação específica na

Noruega, Papua Nova Guiné, Polônia e Suíça revela que

missão da Igreja.

o sonho missionário do Pe. Berthier está se realizando,

A missão realiza nosso ser humano!

desafiando a todos os missionários a unirem os seus esforços para a autêntica vivência da espiritualidade e do carisma missionário por ele deixado.

Na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, o Papa

Na medida em que formos capazes de conviver e

Francisco acena para o elemento fundamental da missão

cooperar, indo além das fronteiras étnicas, nacionais

evangelizadora: “os que mais desfrutam da vida são os

e culturais, poderíamos desenvolver e aprofundar

que deixam a segurança da margem e se apaixonam pela

ainda mais nossa identidade na Igreja, salvaguardando

missão de comunicar a vida aos demais. Quando a Igreja

as diferenças de expressão desta identidade que são

faz apelo ao compromisso evangelizador, não faz mais

próprias do âmbito local.

do que indicar aos cristãos o verdadeiro dinamismo da

Central

As missões dos Missionários da Sagrada Família no mundo hoje

13 13


Central

“ Presenças fronteiriças”

atua em paróquias, lugar que é considerado o ambiente

A missão ad gentes se caracteriza pela presença

tradicional ou normal da presença enquanto presbíteros

ativa dos cristãos nas situações de fronteira social, cultural e religiosa. Eis alguns exemplos da presença dos Missionários da Sagrada Família nas situações de fronteira: em Camajuani, Cuba; em Itamarati e Carauari, na imensa Amazônia; no Santuário em Patu, no sertão nordestino; na extrema periferia de Santa Cruz dela Sierra, na Bolívia; em Goroka, em Papua Nova Guiné; em Longavi, no Chile; em várias cidades da Bielorrússia extremamente secularizada; em Mecubúri e Nampula, em Moçambique; nas cidades dos arredores de Praga, na República Checa; na Ilha de Flores e em Tanjung Selor (Kalimantan), na Indonésia; nos diversos povoados da Ilha de Madagascar; em Saint Jean de Bournay, na França laicista; no serviço aos migrantes de língua portuguesa em Bad Libenzel e Hirsau, na Alemanha.

14

O desafio do “mundo” urbano e das paróquias Nas grandes áreas metropolitanas e capitais, a missão é desafiada pelas periferias, ambientes e situações particulares e existenciais. Percebe-se que as grandes metrópoles engendram um novo perfil de vida cristã, desafiando a vida religiosa e missionária a um novo estilo de vida, adaptando e desenvolvendo modos novos de vivência comunitária, utilizando novas linguagens para o anúncio do evangelho e ampliando as formas de testemunho e compartilhamento social. É necessário aprofundar o desafio da nossa missão nas grandes metrópoles e nas circunstâncias próprias que esse contexto exige e oferece. A valorização e preparação das pessoas para que sejam capazes de dialogar e interagir de maneira inteligente e criativa parece fundamental para avançar na missão. Em algumas regiões, temos um número de missionários liberados para serviços específicos ligados ao carisma e aos ministérios prioritários, especialmente na pastoral

Uma grande parte dos Missionários da Sagrada Família

e/ou religiosos. A forma de organização da Igreja tem sua base nas paróquias, mas é importante encontrar formas de exercer o ministério ou o serviço missionário, sobretudo intensificando nossa presença e atuação na animação missionária da Igreja, na pastoral familiar, na animação e acompanhamento das vocações.

Situações emergentes que nos interpelam Hoje somos interpelados ao diálogo permanente e profético com as realidades emergentes. A própria configuração das famílias tem se modificado muito nos últimos tempos. Para realizar nossa missão levando em conta as mudanças culturais e as próprias mudanças de época, estamos vivendo, precisamos aprofundar a formação e a qualificação da vida religiosa e missionária. Um processo de formação congregacional e de caráter internacional

certamente

poderá

organizações civis, ONGs.

para

despertar uma nova visão mais qualificada, abrangente e universal, mas também para gerar novas experiências de convivência, aproximação e missionariedade. Nas sociedades atuais, nas quais há o predomínio do individualismo e da tendência à autorreferencialidade do sujeito, o mais adequado parece ser o investimento nas disposições interiores e exteriores à vida comunitária, através de dinâmicas interativas e relacionais que colaborem com a superação das vulnerabilidades pessoais. Seria importante avançar para sermos presença missionária em alguns âmbitos como o da cultura, da arte, da produção e elaboração de conhecimentos científicos em diálogo com a espiritualidade e teologia. Olhando para as questões ambientais, poderíamos elencar um número sem fim de questões abertas que são necessárias e que devem ser enfrentadas com coragem, começando pelo processo formativo e a qualificação específica dos missionários.

familiar e na animação missionária. Há também quem se dedique a pastorais sociais e ao diálogo com outras

contribuir

Pe. Júlio Cesar Werlang msf Roma/Itália


Espiritualidade

Caminhar e viver a fé na perspectiva de La Salette Melânia, a vidente daquele marcante 19 de

continua seu serviço de cuidar dos necessitados,

setembro de 1840, insistia na descrição da cena

chorando com aqueles que choram. Quantas

da aparição: “a misteriosa “Senhora” chorava sem

lágrimas a pandemia fez escorrer pelos rostos das

cessar. Ela chorou durante todo o tempo em que

mães Marias pelo mundo todo?! Apenas no Brasil

nos falou. Vi suas lágrimas caírem”, dizia ela, sendo

são mais de meio milhão de mortes, de histórias

confirmada por Maximino.

que desapareceram, de afetos que foram rompidos,

As imagens de Nossa Senhora da Salette chamam

de sonhos que foram interrompidos.

a atenção pelas lágrimas da “Bela Senhora”. As

Uma espiritualidade a partir de Nossa Senhora da

lágrimas da mãe de Jesus nos remetem a pelo

Salette nos convoca à solidariedade com todos os

menos dois acontecimentos dolorosos na vida de

que choram, assumindo suas dores, mas também

Maria e de Jesus.

seus sonhos e busca de consolação. O conselho

O primeiro está ligado à ordem de Herodes de

da mãe Maria, que nos orienta a fazer o que Jesus

matar todas as crianças na tentativa de matar

disser, nos dá uma direção para mudar nossas

Jesus que acabava de nascer. Maria e José precisam

relações a fim de que, como humanidade salva pela

fugir da violência de Herodes buscando refúgio

vida, cruz e ressurreição de Jesus, vivamos a alegria

no Egito (cf. Mt 2,13-18). No final, o evangelista

de ter razão de nossa esperança.

cita o profeta Jeremias (31, 15): “Em Ramá se ouviu uma voz, lamentação, choro e grande pranto; era Raquel chorando seus filhos e não querendo ser consolada, porque já não existem” (Mt 2,18). O outro acontecimento é citado pelo evangelista São João (19, 25): “E junto à cruz de Jesus estava sua mãe...”

Cremos que Deus realizará suas promessas:

"E Deus limpará de seus olhos toda lágrima, e não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor, porque já as primeiras coisas são passadas” (Ap 21,4).

A vida de Nossa Senhora, assim como nos é apresentada nos evangelhos, está ligada a muitas alegrias, mas também a muitas dores. Como se não

Para enxugar as lágrimas de Nossa Senhora da

bastasse o desafio de cuidar de Jesus, ela estende

Salette, precisamos fazer a nossa parte. No filme

seu olhar misericordioso para os irmãos e irmãs de

“A Missão”, que fala sobre o massacre dos guaranis

Jesus, também feitos por Jesus, seus filhos e filhas.

e jesuítas nas reduções, um personagem diz ao

As diversas aparições de Nossa Senhora nos

representante do Papa: “Não se preocupe, o mundo

recorda o cuidado materno de Deus que se revela

é assim”. Mas outro responde: “Nós fizemos o

em Maria. Desde os dias da vida com Jesus até

mundo assim”.

nossos dias, a mãe Maria ‘aparece’, não para trazer

Que nossa espiritualidade tenha Corpo e brilho,

uma nova revelação, mas para apelar, como já fizera

Alma e vigor, Espírito e vida, em Jesus, Maria e José.

um dia: “Fazei tudo quanto ele vos disser” (Jo 2,5). Naqueles dias, com sua presença frágil e forte, e nos dias de hoje, chorando copiosamente como em La Salette ou aos pedaços como em Aparecida, Maria

Pe. Francisco Ary Carnaúba msf Porto Alegre/RS

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Espiritualidade

Fechando os olhos para ver melhor Fechei

os

olhos

e

fiquei

profundamente

a velhice está chegando, trouxe para o presente

emocionado. Nunca tinha “visto” tão longe.

também o pensamento do Frei Beto: “Na velhice, é

Nunca fizera tamanha retrospectiva em minha

preciso agarrar a vida pelos chifres e deixar a morte

vida. Pessoas e fatos que me pareciam ter ficado

nos surpreender.”

tão distantes, no tempo e no espaço, de repente, ocuparam um lugar especial no presente.

creio ter entendido melhor o que se diz quando se

Tudo parecia real! Como é maravilhoso recordar,

fala que, para Deus, não existe passado, nem futuro,

ou mais do que recordar, reviver. Foi como se

pois para ele tudo é presente. Eu também nunca

acontecesse comigo o milagre que aconteceu com o

tinha entendido tão bem como esteve presente em

cego que pediu a Jesus: “Que eu veja de novo”.

minha vida a arte de desaprender, a arte de nascer

Eu estava tendo a graça de ver novamente as belas

16 16

Ao sentir tanta coisa presente em minha vida,

de novo, como Jesus disse a Nicodemos, um dia.

paisagens que me encantaram um dia, pessoas

Como é sublime a arte de reaprender. Quanta

que me amaram, apesar do meu desejo de posse,

bagagem inútil consegui deixar para trás. Quanta

apesar de minhas limitações. Momentos de solidão

mudança de mentalidade aconteceu em mim. Se

e de tristeza, quando a vida parecia andar de ré.

não fosse isso, a minha vida não teria a leveza que

Mas também momentos de verdadeira alegria que

tem.

brotavam profundamente do meu ser, ao descobrir, verdadeiramente, quem eu era. Momentos de dor

E concluo dizendo, como alguém que disse antes de mim:

e de saudade, de sonhos e realizações. Momentos que, nem então, nem agora consigo explicar. Lembrei de pensadores e de pensamentos, que tiveram influência em minha vida, como Rousseau que teria dito “prefiro ser odiado pelo que sou, do

“Para perder uma guerra, basta vangloriar-se com a vitória de uma batalha, baixar a guarda e esquecer que o inimigo ainda está de pé”.

que amado pelo que não sou”, um pensamento que me ajudou imensamente a ser mais autêntico em minha vida. Lembrei de Nelson Mandela que, ao sair da prisão onde ficara por diversos anos, olhou para trás e disse: “Eu continuaria preso se não perdoasse a quem me colocou aí dentro”. E, como

Pe. Euclides Benedetti msf Santo Ângelo/RS


Espiritualidade

Lágrimas que regam o campo da missão O mundo está carente de "lágrimas missionárias”. Cada ato de misericórdia, de compaixão, de

derramar lágrimas de amor. Quem sabe chorar as dores, suas e dos outros, sabe semear o amor.

solidariedade, perdão, é lágrima-semente de vida.

Que nossas lágrimas de vida possam juntar-se

O que seria da vida e do mundo sem o amor e as

às lágrimas de Salette. Chorando, ela manifestou o

“lágrimas” da compaixão?

seu amor maternal por todos os seus filhos e filhas

Com Jesus, conforme o episódio da morte de Lázaro

que perdemos, ao longo da caminhada da vida, o

(cf. Jo 11,35) e Maria, em sua aparição em La Salette,

sentido de sermos todos irmãos, filhos e filhas de um

podemos aprender o sentido das lágrimas que

mesmo Pai-Amor. A vida precisa de amor e não de

brotam da compaixão. São lágrimas que expressam

“julgamentos”! Jesus disse: “Lo que quiero es que sean

e constroem nossa humanidade, são lágrimas

compasivos, y no que ofrezcan sacrificios. Pues yo no

missionárias e redentoras!

he venido a llamar a los justos, sino a los pecadores.” (Mt 9,13)

Quem nunca derramou lágrimas? Lágrimas de saudades, de dor e de sofrimento, de encontros afetivos e ternos, lágrimas de despedidas, de solidão e de abandono, lágrimas de luto. E há também as lágrimas das festas que celebram a ternura e a bondade da vida, as lágrimas da fé, dos milagres e bênçãos, da acolhida incondicional.

Que nossas lágrimas sejam missionárias e anunciem o Evangelho da Salvação. Que elas reguem as sementes de amor, solidariedade e serviço que espalhamos com a vida em nossa missão. O “julgamento” da vida fica para Deus, que senta na mesa entre os pecadores, e não na cadeira do juiz, que se abaixa diante da mulher acusada para olhá-la no mesmo nível de humanidade, em vez de olhar de longe ou de cima para baixo e atirar pedradas doutrinais. Uma missão sem lágrimas seria como um jardim

Quem aprende o valor das lágrimas de compaixão

sem flores! Missão é vida, e a vida tem suas lágrimas,

pela vida e as chora de verdade nunca fará julgamentos

sem ser necessariamente um “vale de lágrimas”.

apressados dos outros, juízos e acusações sem

“Bem-aventurados os que choram, porque serão

amor e misericórdia. Antes, far-se-á próximo do seu

consolados”, proclama Jesus de Nazaré, o missionário

mais próximo que são os nossos irmãos segundo o

do Pai!

Evangelho (os abandonados, os esquecidos na miséria humana e os diferem dos padrões impostos ou dominantes), são os irmãos de Jesus de Nazaré. Antes de julgar alguém que pouco conhecemos, temos que

Pe. Wilson Jorge Lamps msf Santa Cruz de la Sierra, Bolívia

17


Testemunhos

Pe. Vicente Euteneuer msf, um “evangelho ambulante” Nascido na Alemanha, em 1930, Vicente Euteneuer

construção de capelas, proporcionando melhores

veio ao Brasil como missionário em formação em

condições para as famílias se reunirem para

1961, e isso certamente favoreceu sua notória e

celebrar em comunidade.

conhecida fluência na língua portuguesa. Com uma

Em 1979, uma grande enchente que atingiu

habilidade muito peculiar, ele se aproximava das

muitas famílias sensibilizou muito o Pe. Vicente, e

pessoas, fazendo perguntas e considerações acerca

ele iniciou um projeto de construção de moradias,

da realidade, com uma simplicidade e um senso de

envolvendo os próprios habitantes e benfeitores da

humor que contagiava as pessoas. Sua presença era

Alemanha. Esta vila, que se transformou em Bairro

acompanhada de uma atenção cativante, traduzida

Sagrada Família, recebeu mais de mil casas para os

em uma mística que despertava uma sensação de

pobres, e hoje, com mais de quinze mil habitantes,

bem-estar impressionante.

é a sede da mais nova paróquia, a Paróquia Sagrada

Depois de ter sido coordenador de Pastoral da

18

Família de Nazaré.

Diocese de Januária/MG, Pe. Vicente foi nomeado

O Pe. Vicente viveu como pobre no meio dos

pároco da Paróquia São José, na cidade de São

pobres, sempre atento às necessidades das pessoas

Francisco, em 1971. Tornou-se conhecido no extenso

que batiam na sua porta, sem distinção de pessoas.

território do município, admirado e respeitado por

Com simplicidade e teimosia ele exercitou com

todo o povo. Como pároco, desbravou a vasta região,

firme convicção a prática da caridade até o último

enfrentando os desafios das estradas, ou da falta de

dia de sua vida. O testemunho de uma pessoa

estradas de acesso às moradias das pobres famílias,

que o conhecia profundamente resume tudo: “Pe.

distantes dos escassos recursos que a cidade

Vicente é o Evangelho ambulante, anunciado não

oferecia ou se recusava a oferecer.

somente por palavras, mas por cada gesto seu.

Inicialmente, quando não havia capelas, ele

Falar do Pe. Vicente é fácil, difícil é continuar os

celebrava na frente da casa de uma liderança. No

trabalhos que ele realizou e nos ensinou a realizar

dia anterior, quando não tinha uma árvore grande

por amor a Jesus Cristo”. O nosso fundador, Pe.

por perto, fazia-se um mutirão para preparar uma

Berthier, havia ensinado que “os pobres, os doentes,

sombra no local da celebração debaixo da qual os

os abandonados são quinhão mais querido do

fiéis podiam se abrigar do sol escaldante e sempre

verdadeiro discípulo de Jesus Cristo”. É isso que o

constante, no clima semiárido da nossa região. O

Pe. Vicente assumiu radicalmente e deixa como

dia da celebração era como que uma só missa, da

testemunho.

manhã até a tarde.

O Pe. Vicente terminou sua jornada missionária

A longa permanência do Pe. Vicente em São

no dia 1º de julho de 2021, nas dependências da

Francisco e a sua incansável atuação na Paróquia

casa onde ele passou a residir nos últimos meses,

São José deixou marcas profundas na vida da igreja

deixando encaminhado o projeto de continuidade

local. Sua atuação se destaca pela criação de muitas

de suas ações em forma de uma entidade

comunidades eclesiais, urbanas e rurais; pela

denominada “Associação Comunitária de Caridade

formação e animação de lideranças leigas e pela

Pe. Vicente”. Que a memória desse Missionário da Sagrada Família, generoso na acolhida das pessoas, mãos estendidas para partilhar o pão com os necessitados, nos inspire no amor ao próximo e na prática da justiça social.

Pe. Pedro Leonides Rocha da Silva msf São Francisco/MG


Testemunhos

Na beleza e na simplicidade da catedral dos cajueiros No dia 27 de junho, celebrei juntamente com

e amigos. Foi muito bom ver através de vídeos,

os amigos e amigas, formandos e coirmãos, a

palavras de incentivo e apoio dos meus tios e

minha consagração definitiva como Missionário

tias, dos meus pais, da minha irmã, dos meus

da Sagrada Família. Foi uma celebração cheia de

amigos. Todos esses presentes e palavras só me

emoção e simbologia, que aconteceu na “catedral

impulsionam e fortalecem ainda mais no meu ser

dos cajueiros”, um espaço aberto e arborizado

missionário.

na sede da missão, em Mecubúri. As mangueiras

Tomei como lema da celebração dos votos

e cajueiros juntam suas copas e formam uma

perpétuos a passagem do cego Bartimeu: “Coragem,

magnífica obra-prima, um belo e decorado teto de

levante-se, Jesus está chamando você!” (Mc 10, 49) É

catedral.

assim que sempre me senti impulsionado a seguir

Este é o meu quarto ano na missão. Cada dia

minha vocação: tomando coragem para colocar-me

que passei nestas terras tão acolhedoras de

em pé num salto e seguir adiante, deixando para

Moçambique me fortaleceram na decisão de

trás as coisas que me prendiam. Não é fácil deixar

professar os votos perpétuos. Claro que gostaria de

coisas, porém é preciso fazer isso para aceitar novos

ter tido minha família de sangue ao meu lado neste

desafios. Na missão os desafios são diários, mas é

momento tão importante, mas a distância impediu

por causa desses desafios, desse amor que sinto

que isso acontecesse. Contudo, graças à internet

pelo trabalho que realizo e pelas pessoas com as

eles puderam fazer parte deste lindo momento.

quais convivo, que escolhi a catedral dos cajueiros

Mas tem outra coisa: em todos esses anos de

como lugar para celebrar este momento;

missão fui construindo amizades que se tornaram

Os votos são dons recebidos, caminhos escolhidos

família. Estes representaram cada familiar, cada

e compromissos assumidos para toda uma

amigo. Minha família de sangue estava longe, mas

vida, e devem ser vividos com fé e dedicação.

eu estava rodeado de irmãos missionários e das

É na simplicidade, a mesma simplicidade que

irmãs da imensa “família das criaturas”, como gosta

encontramos

de falar o Papa Francisco. Eles foram testemunhas

sonhando com uma fraternidade que abrace a

do meu sim, da entrega da minha vida ao serviço dos

humanidade e a criação inteira, que pretendo viver

irmãos e da Igreja. Senti-me acolhido e amparado

os meus votos. É para isso que vivo e viverei, com a

por todos que estiveram presentes na celebração,

graça de Deus.

na

“catedral

física ou virtualmente. Mas as emoções não pararam por aí. Após a celebração, num momento de confraternização, recebi belas homenagens dos meus familiares

Fr. Ricardo Klock msf Nampula, Moçambique

dos

cajueiros”,

e

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