2 Este segundo número do dubocage é inteiramente dedicado a um trabalho interdisciplinar efetuado pelos alunos do 11º G no âmbito das disciplinas de Desenho e Português, lecionadas, respetivamente, pelos professores Rui Ermitão e Carla Canelas Com base no estudo do “Sermão de Santo António aos Peixes”, os alunos, divididos em equipas, foram convidados a representar plasticamente o seu entendimento da simbologia de cada um dos peixes estudados, com vista à partilha do seu produto final em espaços da escola selecionados por cada equipa como os mais adequados para o efeito. À laia de introdução, cabe explicitar que o “Sermão de Santo António aos Peixes”, da autoria de Padre António Vieira, conhecido sermonista jesuíta do século XVII, tem como finalidade demover os homens do exercício da corrupção, dirigindo-se a um destinatário imediato: os colonos de São Luís do Maranhão, no Brasil. Para tal, Vieira assume-se como pregador, com a missão de purificar os ouvintes e chamá-los à verdade, de acordo com o conceito predicável que inicia o texto: “Vos estis sal terrae” (“Vós sois o sal da terra”), retirado do Evangelho de S. Mateus. Por outro lado, pregando no dia de Santo António e tendo como finalidade festejar e glorificar o santo, Vieira decide pregar não apenas “de” Santo António, mas “como” Santo António, por demais conhecido pelo chamado designado “milagre dos peixes”, que o teriam ouvido atentamente, ao contrário da atitude herética toma pelos homens de
Arimino. Assim, Vieira enuncia o destinatário explícito do seu sermão, os peixes, já que os homens do Maranhão o não ouvem nem respeitam. A partir daí, estrutura o seu sermão dividindo-o em duas partes: os louvores e as repreensões aos peixes. Louva os peixes em geral pela sua diferença e indiferença em relação ao homem, passando em seguida ao panegírico de quatro peixes em particular, cujas virtudes se assemelham às qualidades de Santo António, que tão bem demovia os homens dos seus vícios: o Santo Peixe de Tobias, a rémora, o torpedo e o quatro-olhos. Seguem-se as repreensões em geral aos homens que se “comem uns aos outros” e cometem outras “maldades”, dando lugar às repreensões em particular a peixes que simbolizam os grandes vícios humanos: os roncadores, os pegadores, os voadores e o polvo. No contexto da disciplina de Desenho, os alunos procederam, após a exposição dos seus trabalhos, à desconstrução da obra de arte em que tinham participado. Tal atividade é também um processo criativo que, tendo como ferramenta a fotografia, capta, de forma subjetiva, aspetos parcelares da obra inicial, constituindo-se simultaneamente como uma leitura subjetiva e como um novo objeto artístico, com existência própria e independente. É todo este processo que vos mostramos em seguida. Alexandra Cabral
Colaboradores Alexandra Cabral Anastasia Kopylovich Caetana Sacramento Camila Barbosa Carla Canelas Carlota Martins Catarina Baião Daniel Prata Diogo Gaspar Guilherme Nunes Inês Costa Lara Pereira de Almeida Laysa Trepa Laura Grosso Leonor Marinho Lucas Serra Maria Beatriz Varela Maria Palma Marta Peres Rita Ribeiro Rui Ermitão Sebastião Sarmento Sofia Ferreira Sofia Serpa Teresa Raquel Viktorya Terletska
Coordenação Alexandra Cabral
Grafismo Miguel Boullosa Rui Ermitão
Logotipo
Bernardo Botelho
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O SANTO PEIXE DE TOBIAS
Esta instalação é uma obra representativa do Santo Peixe de Tobias da obra “Sermão de Santo António (aos peixes)”, de Padre António Vieira. Este peixe apresenta duas seguintes qualidades principais: curar a cegueira com o fel das entranhas e afugentar os demónios com o coração.
Memória descritiva Decidimos por em evidência as qualidades do Santo Peixe de Tobias, representando assim, um grande coração, que servia, de acordo com o sermão, para afastar os demónios, que foram representados por sacos de plástico. Os dois olhos que se encontram na ponta das entranhas remetem para a primeira qualidade do peixe, curar a cegueira. A partir dessas mesmas entranhas, caem uns laços envolvidos em linha que, ao chegar ao chão, pousam sobre uma cartolina vermelha, também ela coberta por laços e cordas vermelhas, representando, assim, gotas de sangue que caem e formam uma poça de sangue. Caetana Sacramento, Inês Costa, Sebastião Pacheco
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A rémora
gar hoje aos peixes?» (Capítulo II, “Sermão de Santo António aos Peixes”, de Padre António Vieira), cuja última palavra, «peixes», se refere- às pessoas que entram na instalação. Estas têm virtudes e pecados, sendo guiadas pela língua de Santo António, que aponta na sua direção.
Memória descritiva Simbologia da instalação: O peixe que nos calhou em sorteio foi a Rémora. Este é um peixe pequenino que se pega ao leme de uma nau e tem a força e o poder de mudar o seu rumo. A língua de Santo António era uma Rémora na terra, pois ele usava a força da sua palavra para dominar e guiar as paixões humanas, assim como a rémora fazia com as naus.
«Se alguma Rémora houve na terra, foi a língua de Santo António[...]» , Capítulo III, “Sermão de Santo António aos peixes” A entrada da nossa instalação começa nas escadas, onde está escrita a frase «Enfim, que havemos de pre-
Na nossa peça acima das escadas, estão duas pontas de uma nau partida, que são seguradas pela Rémora e pela língua de Santo António. Assim, é representada a força do pequeno peixe e da língua deste pregador.
«O Apóstolo Santiago, naquela sua eloquentíssima Epístola, compara a língua ao leme da nau e ao freio do cavalo. Uma e outra comparação juntas declaram maravilhosamente a virtude da Rémora, a qual, pegada ao leme da nau, é freio da nau e leme do leme. E tal foi a virtude e a força da língua de Santo António.», Capítulo III, “Sermão de Santo António aos peixes”
5 Por detrás desta peça está um mapa, o qual tem dois significados: representar o mar em que as naus navegam, sendo que a linha vermelha é o seu percurso, e também representar a língua de Santo António, que guia as pessoas por um bom caminho ao redor do mundo. Utilizámos vários materiais. Nas escadas usámos fita isolante vermelha para fazer as letras da frase, pois a fonte utilizada faz-nos lembrar o fio vermelho usado no mapa.
A nau é feita de cartão para parecer sólida e pesada, ao contrário da Rémora que é feita de fio, um material mais leve.
«Esta é a língua, peixes, do vosso grande pregador, que também foi rémora vossa, enquanto o ouvistes; e porque agora está muda [...] se veem e choram na terra tantos naufrágios.», Capítulo III, “Sermão de Santo António aos peixes”
As línguas são feitas de tecidos e diferentes tipos de papel, estes materiais oferecem-nos texturas diferenciadas fazendo-as mais interessantes ao olhar. Como a língua guia o observador, tem de ser chamativa.
O papel crepe em diferentes tons de azul que colocámos dentro da nau, e em cima da mesa, representam a água do mar a entrar no barco. Por detrás da nau está o mapa preso no K-Line preto, este dá destaque à luz da lanterna colocada dentro da Rémora. A lanterna, por sua vez, dá destaque ao peixe e à língua. O mapa foi pintado com café para lhe dar um ar envelhecido e nele está uma linha vermelha presa em pioneses que representam a língua e o percurso das naus ao redor do mundo.
Esta instalação foi criada e pensada por nós com a intenção de passar a mensagem de Padre António Vieira sobre este peixe tão pequenino, mas de tão enorme força e poder. Daniel Prata, Laura Grosso, Marta Peres
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«[...] quem haverá que não louve e admire muito a virtude tão celebrada da Rémora?» ,Capítulo III, “Sermão de Santo António aos peixes”
«Quem haverá, digo, que não admire a virtude daquele peixinho tão pequeno de corpo e tão grande de força e no poder [...]» , Capítulo III, “Sermão de Santo António aos peixes”
«[...] se se pega ao leme de uma nau da Índia, apesar das velas e dos ventos e do seu próprio peso e grandeza, a prende e amarra mais que as mesmas âncoras, sem se poder mover, nem ir por diante?» , Capítulo III, “Sermão de Santo António aos peixes”
«Quantos, navegando na nau Cobiça, sobrecarregada até às gáveas […] dariam nas mãos dos corsários com perda do que levavam e do que iam buscar, se a língua de António os não fizesse parar, como Rémora […]?» , Capítulo III, “Sermão de Santo António aos peixes”
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Torpedo Descrição Foi proposto à turma de 11°ano de Artes um trabalho em parceria com a disciplina de português sobre o “Sermão de Santo António aos peixes”, de Padre António Vieira. O objetivo do grupo foi transmitir a mensagem simbólica para que remete o Torpedo, através da sua representação figurativa.
pescador. O pescador é representado como duas mãos de tamanho real, abaixo do torpedo, que pretendem alcançá-lo. Estas mãos são a representação das mãos do pecado, as mãos dos homens que se aproveitam do poder para satisfazer a sua ganância, por isso são sujas, rugosas, velhas e um pouco deformadas, com cores que fazem referência ao inferno e também ao demónio.
Memória Descritiva: Materiais Utilizados: • Alumínio • Placa de madeira • Tinta acrílica • Papel higiénico • Cola • Fita cola • Arame • Corda • Flores secas • Rede • Esferovite
Na nossa escultura, o Torpedo é representado como um homem, pois, na obra, os peixes são uma alegoria que têm como referência os pecados dos homens. O Torpedo foi construído começando por se realizar um esqueleto em arame do tamanho desejado; de seguida, foi forrado com papel alumínio e moldado no formato pretendido com papel machê; por fim, foi pintado com tintas acrílicas das cores de um torpedo, para se fazer referência ao peixe. O Torpedo encontra se naquela posição, pois está a tentar fugir, escapar, e a defender-se das garras do pescador que o pretende pescar, com as suas descargas elétricas. As descargas elétricas são representadas por um arame que envolve o Torpedo e as mãos do
Foram realizadas a partir do molde em papel alumínio e fita cola das mãos de um integrante do grupo, sendo depois revestidas com camadas de papel machê para se conseguir maior firmeza e a textura desejada. À volta das mãos, tal como no resto da escultura, estão várias cordas espalhadas na mesa e na rede, para representar os pescadores. Tal como o peixe faz tremer o braço do pescador, Santo António confronta 22 pecadores, que, tremendo, com a força da sua palavra, se convertem. Estes pecadores são representados como flores secas cor de laranja espalhados pela mesa.
Como base para o início do nosso trabalho utilizámos, como inspiração, uma escultura de um escultor espanhol chamado Pablo Hueso. Nesta escultura o homem nela representado esta agarrado num suporte de tela, tal como realizado na nossa peça, porém fizemos várias alterações.
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O esboço inicial para uma das mãos do pescador:
Após embrulhar a mão com papel de alumínio e plástico aderente, o grupo passou uma camada de papel e cola branca utilizando também arame para recriar os ossos visíveis.
Juntaram-se os membros todos e começámos a dar mais volume ao corpo:
O processo de criação da tela onde o peixe se apoiará:
Torpedo após a pintura completa:
Os primeiros passos de criação do Torpedo:
Anastasia Kopylovich, Camila Barbosa, Lucas Serra
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Quatro-olhos
teio.
Definição de instalação: “Uma instalação é uma manifestação artística contemporânea composta por elementos organizados num ambiente. Esta pode ter um caráter efêmero (só "existir" na hora da exposição) ou pode ser desmontada e recriada em outro local. (...) Uma instalação pode ser multimídia e provocar sensações: táteis, térmicas, odoríficas, auditivas, visuais entre outras.” “Instalação (arte)” in pt – Wikipedia. https://pt.wikipedia.org/ wiki/Instala%C3%A7%C3%A3o_(arte) [19 de fevereiro de 2022].
Ou seja, uma instalação é uma obra de arte que se integra num cenário. O objetivo é causar impacto, fazer parar o observador para que este analise a exposição. Cada grupo representou um peixe, dos oito peixes do “Sermão de Santo António aos Peixes”, através de uma instalação num local à escolha dentro da escola. Interpretação do grupo:
Contexto da Instalação: No final do 1º período, foi apresentada à turma uma proposta para se realizar um trabalho sobre o “Sermão de Santo António aos Peixes”, da autoria de Padre António Vieira. Assim, pretendia-se convidar o aluno a integrar os conteúdos de Desenho A e de Português.
O conceito da exposição foi estabelecido durante as férias, com vários esboços rápidos e uma projeção tridimensional em miniatura, feita com plasticina. Por sua vez, a paleta cromática da instalação faz alusão, em particular, ao primeiro episódio da terceira temporada de Narcos: México, no qual é exibido um alto contraste entre cores quentes e cores frias.
“O Sermão de Santo António aos Peixes é uma das obras mais conhecidas do Padre António Vieira. O Sermão foi pregado em S. Luís do Maranhão, no Brasil, no dia 13 de Junho de 1654 — na sequência dos litígios que surgiram entre os colonos brasileiros e os Jesuítas, que contestavam a escravidão dos povos indígenas.” “Sermão de Santo António aos Peixes” in pt – Wikipedia. https://pt.wikipedia.org/wiki/Serm%C3% A3o_de_Santo_Ant%C3%B3nio_aos_Peixes [19 de fevereiro de 2022].
Que peixe é representado pelo QuatroOlhos? O Tralhoto. Este é uma espécie de peixe nãocomestível, do Brasil, cujos olhos apresentam uma dupla curvatura, que lhe permite, colocando-se à superfície da água, ver simultaneamente o que se passa dentro e fora desta. O Tralhoto possui o olho dividido em partes aéreas e aquáticas. Cada olho tem uma estrutura dupla, que se projeta acima da linha da água. A córnea está dividida por uma banda pigmentada horizontal, numa zona superior, fortemente convexa, e numa zona inferior, plana. A íris possui duas projeções, que dividem a pupila em duas, a superior, adaptada à visão aérea, e a inferior, adaptada à visão aquática. Memória Descritiva : Após uma reflexão coletiva sobre as particularidades do projeto, concluiu-se, depois de analisar, comparar e confrontar as diferentes opiniões, que se efetuaria uma instalação para ser desenvolvida em trios (sete trios e um par). Para atribuir um peixe a cada grupo, fez-se um sor-
A cor vermelha simboliza paixão, calor, ação e coragem. É uma cor quente que está associada ao poder, à guerra, ao perigo e à violência; todavia, ao mesmo tempo, esta sugere força, porque está relacionada com a nossa necessidade primitiva de sobrevivência e preservação, seja no âmbito emocional ou no físico. No contexto religioso, o vermelho é a cor da carne, do pecado, do diabo, da tentação; é a cor que provoca a paixão carnal e o desejo. Por outro lado, a cor azul significa tranquilidade, serenidade, harmonia e espiri-
10 tualidade, mas também está associada à frieza, monotonia e depressão. Simboliza a água, o céu e o infinito. O azul é a terceira cor primária e está espiritualmente associada ao Poder Curativo de Deus. A simbologia da cor dos tecidos remete para esta paleta cromática anteriormente referida e simultaneamente para a dicotomia, tão apreciada pelos artistas barrocos, entre o Céu e o Inferno. A azul fez-se a representação dos dois olhos do Tralhoto, que olham para cima, atentos aos perigos do ar, pois o azul está relacionado com a palavra evangélica correspondente ao carácter religioso dos contemporâneos da época. Em oposição, através do vermelho foi dado ênfase à expressividade do Inferno. Deste modo, os olhos que olham para baixo e vigiam os peixes maiores do mar, foram envolvidos com um tecido encarnado. (Céu/ Paraíso/Ar = Azul, cor fria; Inferno/Mar = Vermelho, cor quente).
Do Inferno consegue-se observar duas mãos grandes e rugosas a puxar o olho que cede (cai) para o Céu: estas são a representação do dever dos cristãos de afastarem os olhos da vaidade terrena. O olho oposto, que já caiu, encontra-se pousado sob um espelho partido que exprime a forma como a vaidade pode corromper o ser humano.
Assim, os olhos de cima foram cobertos com um tecido azul ligeiramente transparente e fez-se ainda referência, através do panejamento, à manipulação no discurso religioso evangélico e à coação efetuada pela Igreja Católica aos fiéis. Esta dominou a política, a economia e especialmente a cultura por séculos e moldou a sociedade de acordo com a sua ideologia e os seus conceitos do bem e do mal.
Fez-se uso da rede para simular o mar, habitat natural do Quatro-Olhos, e, consequentemente, esta acaba por se ligar às veias que vêm dos olhos, situadas no Inferno, formando, assim, um ambiente que sugere um purgatório. Na rede entrelaçou-se rosas sem espinhos e pétalas, com as quais se pretendeu simbolizar a beleza e inocência do idealizado Paraíso.
Ao longo do “Sermão de Santo António aos Peixes”, o Padre António Vieira utiliza diversos recursos expressivos. Três deles são evidentes quando descreve e louva o Quatro-Olhos: a antítese; a metáfora; e a comparação. Para que a instalação estivesse de acordo com a obra, empregou-se a antítese de um modo literal* e no contraste entre as cores frias de cima opostas às cores quentes de baixo (Exemplos de antíteses no Sermão: *Para cima / para baixo; *Céu/ Inferno). Por outro lado, Vieira recorreu à metáfora "… águias, que são os linces do ar; os linces, que são as águias da terra", significando que o perigo faz das águias um ser similar aos linces, mesmo que estes animais não partilhem o mesmo meio, pois são o reflexo um do outro. Assim, para um peixe tão pequeno como é o Quatro-Olhos, simbolizam ambos uma ameaça. Utilizaram-se rosas vermelhas, cor quente, na parte de cima, para demonstrar que, apesar de não estar no seu meio natural, que é a parte de baixo, representa o mesmo perigo e é um espelho das ameaças existentes no local das cores frias. Por último, a comparação “…unidos como
11 os dois vidros de um relógio de areia,” foi aproveitada para a realização mais geral do trabalho, porque um relógio de areia possui a silhueta de um infinito na vertical, o que se tentou simular na instalação.
Olho Esquerdo do Inferno:
Esboços, Estudos e Miniatura da Instalação: Inferno:
Olho Esquerdo Do Paraíso:
Paraíso:
Lara Pereira de Almeida, Maria Beatriz Varela, Teresa Raquel
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Roncadores
O
Descrição do peixe
Nome: Roncador ou Roncador Canário Características: Peixe alongado que em momentos de stress emite sons. Estes peixes, que são uma metáfora ou alegoria para "pessoas" que se gabam muito, pois, na sua opinião, são os mais importantes e os melhores; no entanto, são frágeis e indefesos, e na altura de agir acobardamse. O provérbio apresentado no excerto "Quem tem muita espada, pouca língua tem" evidencia a ideia que o autor pretende transmitir, que é a de que quem muito se gaba, na maior parte das vezes, não é realmente o que diz ser ou não faz realmente o que diz fazer. Deste modo, a crítica é feita às pessoas arrogantes, cobardes, vaidosas, soberbas através dos Roncadores.
Memória descritiva: A instalação é composta por um único peixe, com cerca de dois metros, todo ele revestido à base de cola branca, papel absorvente e água. Foi inicialmente estruturada a traqueia através de noo-
dles de espuma de natação, unidos e revestidos por fita cola crepe , que depois foram envolvidos por argolas de alumínio e papel de revista. Após o revestimento de cola, foi pintada com tinta spray dourada.
segundo elemento de três peças a ser feito foi a cauda, onde se utilizou um tapete de yoga para o molde, que foi depois preenchido com esponja de almofada e pequenas pedras para equilibrar o peso por todo o peixe. Depois do revestimento a cola, foi pintada de azul e coberta por uma mistura de brilhantes em tons azuis e verdes e celada por uma camada de cola branca.
13 Para a cabeça utilizou-se a técnica do balão, que depois de cheio foi envolvido em fita cola crepe e uma mistura de cola branca e papel absorvente. Ainda com a mistura fresca, abriu-se o balão e moldou-se a cabeça do peixe. Depois de seca, pintou-se com o mesmo tom da cauda e sofreu o mesmo revestimento de brilhantes. o redor de toda a boca foram colados paus de gelado, finalizados com spray dourado, onde se aplicaram os dentes feitos por papel de revista e cola, também pintados de dourado.
Após a finalização das três peças, estas foram unidas com cola quente.
Interpretação da obra: Os roncadores são peixes representativos da arrogância, da ostentação e da vaidade. Através da traqueia procuramos representar o grande roncar do peixe, e através da sua cor dourada, a ostentação. A cabeça e a cauda estão cobertas de brilhantes com o objetivo de, mais uma vez, ilustrar a ostentação e a vaidade que nele é contida.
Ironicamente, os Roncadores são peixes pequenos, mas decidimos representa lo com um grande tamanho para demonstrar a ilusão da importância que eles pensam ter e a ausência de olhos representa essa mesma ilusão/ cegueira onde eles constantemente vivem. Utilizamos ainda o provérbio “Nem tudo o que reluz é ouro” para enfatizar a falsa imagem que as pessoas passam, pois o que falam não corresponde ao que fazem.
Carlota Martins, Maria Palma, Sofia Ferreira
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Pegadores
Na obra de Padre António Vieira, quando o peixe maior é apanhado pelos pescadores, os outros, mais pequenos, morrem com ele. Para tentar retratar este acontecimento pintámos a mão principal a desfazerse gradualmente, da esquerda para a direita. Ou seja o polegar está vivo, sem qualquer marca , mas, em contraste, o mindinho está morto, em esqueleto. Em cima do mindinho está colocada uma rede, uma t-shirt, e um chapéu, que simbolizam os pescadores. As cores escolhidas foram o azul, para as costas da mão, o cinzento, para a palma, e o branco para os detalhes do esqueleto.
Memória Descritiva: O peixe que nos calhou foi O Pegador. Este é um peixe pequeno que se agarra a outros maiores, aproveitando-se deles. A maneira que o nosso grupo encontrou para o representar foi criar uma mão enorme com algumas mãos pequenas agarradas.
Processo:
Iniciámos o nosso trabalho fazendo moldes, em arame, para o dedo mindinho. Para isso criámos dois círculos interligados com arame. Para além de enrolados uns nos outros, os arames estavam, também, presos com fita cola. Em seguida enrolámos os mol-
15 des com papel de alumínio, preso com fita cola Quando os moldes estavam todos feitos decidimos colocar uma solução de cola branca e papel de jornal.
ência. Com os moldes presos e o trabalho terminado, só nos faltou colocar para exposição.
Após os moldes estarem completos e secos aplicámos as tintas de "spray" (azul, branca e cinzenta). Local de Exposição A nosso ideia inicial era colocar a mão presa ao teto. Isto significa que não poderia existir nenhuma referência aos pescadores. Infelizmente ,o nosso trabalho era demasiado pesado, por isso, após diversas tentativas decidimos mudar o plano original e colocá-lo ao pé de um cabide, em cima de uma mesa.
Com os dedos terminados, só nos ficou a faltar a palma da mão. Para a criarmos, utilizámos uma caixa de televisão. Quando conseguimos a forma correta começámos a prepará-la para ser pintada, utilizando a mesma técnica aplicada na pintura dos dedos. Com os moldes todos feitos só nos faltou prender os dedos à palma. Inicialmente utilizámos fio de nylon, mas, após diversas tentativas falhadas optámos por utilizar cola quente, que funcionou na primeira experi-
Guilherme Nunes e Diogo Gaspar
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Voadores
A asa deveria ser feita com material que fosse firme e que encaixasse no peixe corretamente; então, fizemos o molde das asas em arame e por fim, colocámos plástico em ambos os lados.
Descrição do peixe O peixe conhecido como peixe-voador tem atribuição natural nas águas quentes das regiões tropicais e subtropicais de todos os oceanos, apresentando maior diversidade no Pacífico e no Índico. O voador é mencionado no capítulo V do “Sermão de Santo Antônio aos peixes”, de Padre Antônio Vieira. «Os voadores, sendo peixes, também se metem a ser aves »(simbolizam a presunção, vaidade e a ambição). «Dizei-me, voadores, não vos fez Deus para peixes? Pois porque vos meteis a ser aves? (...) Contentai-vos com o mar e com nadar, e não queirais voar, pois sois peixes.»
Da mesma forma, ( com papel machê; e neste caso, um molde em cartão para facilitar) , criámos um peixe maior em relação aos outros para representar a grande ambição dos voadores.
Processo: Este é o esboço inicial do peixe :
Começamos em seguida a testar a cor do peixe e os detalhes como as escamas e os olhos.
Depois de termos feito o esboço, fizemos as bases do corpo dos peixes com papel machê.
17 A cor escolhida foi o estal, mas as escamas não ficaram como esperávamos, por isso cortamos vários pedacinhos de plástico reciclável que colamos ao corpo do peixe para representar as escamas.
Por fim, fizemos um barco para representar a forma de como os peixes morrem. os peixes-voadores, quando “voam”” caem inúmeras vezes nos convés de barcos, acabando por morrer. Enquanto os outros peixes morrem porque estão esfomeados e são enganados pela isca dos marinheiros, o peixevoador morre porque é meramente vaidoso e insiste em voar, sendo depois “atirado” pelo vento para o convés do barco e morrendo (o vento é a sua isca).
tas spray e acrílicas, fita cola transparente e fita crepe, arames, cola, plástico reciclável para as escamas do peixe e plástico para a representação do mar onde os peixes estão e eventualmente caem dentro do convés do barco. Esta instalação foi especialmente pensada para transmitir a mensagem do sermão pois o padre António Vieira, quando fala aos peixes, mas, na verdade, é aos homens que se dirige, alertando-os acerca da sua vaidade e grande ambição, sendo os peixes metáfora dos homens:. "Quanto melhor lhe fora mergulhar por baixo da quilha e viver, que voar por cima das antenas e cair morto! Grande ambição é que, sendo o mar tão imenso, lhe não basta a um peixe tão pequeno todo o mar, e queira outro elemento mais largo. Mas vede, peixes, o castigo da ambição. 0 voador, fê-lo Deus peixe, e ele quis ser ave, e permite o mesmo Deus que tenha os perigos de ave e mais os de peixe. Todas as velas para ele são redes, como peixe, e todas as cordas, laços, como ave. Vê, voador, como correu pela posta o teu castigo. Pouco há nadavas vivo no mar com as barbatanas, e agora jazes em um convés amortalhado nas asas. Não contente com ser peixe, quisestes ser ave, e já não és ave nem peixe; nem voar poderás já, nem nadar. A natureza deu-te a água, tu não quiseste senão o ar, e eu já te vejo posto ao fogo. Peixes, contente-se cada um com o seu elemento. Se o voador não quisera passar do segundo ao terceiro, não viera a parar no quarto. Bem seguro estava ele do fogo, quando nadava na água, mas porque quis ser borboleta das ondas, vieram-se-Ihe a queimar as asas.”
Memória descritiva : O peixe que representamos é o peixe-voador, que é criticado pela sua grande vaidade, ambição, e falta de humildade. Usamos diversos materiais para fazer a instalação, como: papel machê e cartão para os peixes e barco, tin-
Leonor Marinho, Sofia Serpa, Laysa Trega
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O polvo Este trabalho tem como referência a obra literária “Sermão de Santo António aos peixes”, de Padre António Vieira, mais especificamente o capítulo V, onde é apresentado o Polvo. Este é severamente criticado pelo pregador por representar a traição, a falsidade e a hipocrisia.
Memória descritiva: A figura de feições humanas no centro representa uma das vítimas da traição do polvo. Os fios vermelhos e as flores que escorrem da ferida aberta no seu abdómen representam o sangue.
As Rosas vermelhas, tal como os outros elementos da natureza, simbolizam a pureza e beleza aparente do polvo, já que flores são normalmente associadas ao que é belo - «O Polvo com aquele seu capelo na cabeça parece um monge, com aqueles seus raios estendidos, parece uma Estrela, com aquele não ter osso, nem espinha, parece a mesma brandura, a mesma mansidão.» - . As cordas são usadas como outra metáfora para os braços do polvo -«O polvo dos próprios braços faz as cordas […] ».
Os esqueletos de peixe com cabeça de homem, que flutuam acima dele, são outras vítimas que seriam uma previsão do destino da figura central. Assim brincámos com o espaço temporal, futuro e passado, pois o corpo e as cadeiras vazias, em oposição, sugerem o seu aspeto anterior. As cabeças de homem relembram que os peixes são metáforas dos homens, e que as vítimas do polvo, que é ele próprio uma metáfora do homem dissimulado, hipócrita e traidor, é também humano.
As mãos presentes no cenário também remetem para esta metáfora, abertas, com os seus dedos tentáculo a postos para capturar outro "peixe", mas de uma forma não obviamente ameaçadora, que não o alarma e o leva, «inocente da traição» e «desacautelado», a cair na sua armadilha. As plantas que envolvem os tentáculos, tal como as flores no corpo, simbolizam a tranquilidade e a beleza aparente do polvo, a sua «brandura» e «mansidão», que escondem a sua verdadeira natureza. O tom do fundo não contrasta com a parede, e, juntamente com os cinzentos do desenho, contribuem para
19 a camuflagem do polvo.
Em seguida, cobrimos o corpo com uma mistura de cola branca e água e pedaços de jornal. om tinta acrílica pintámos o corpo com manchas de tinta de cor branca, rosa claro, cinzenta, vermelha e preta.
Finalmente, o olho desenhado é o de Padre António Vieira, que observa estas atrocidades tanto no plano dos peixes como no plano dos homens. Depois de alguns testes para decidirmos o formato e o posicionamento do papel de cenário, começámos a desenhar. Cortámos os tentáculos e expusemos o papel de cenário, depois as figuras dos peixes nas cadeiras e, por fim, nas escadas, pendurámos cordas vermelhas, e fios de nylon para prender os outros peixes.
Processo: Começámos por cobrir o corpo do "River" com papel alumínio e em seguida enrolámo-lo com fita cola. Mais tarde, já com todas as peças formadas, juntámo-las, alongando as pernas e os braços.
20 Fresco de A Última Ceia, 1498, de Leonardo da Vinci
A Última Ceia, de Leonardo da Vinci, é uma das obras que nos serviu de referência, pois relacionámos o nome da obra com a ideia de que os peixes se comiam uns aos outros, sem saberem se este seria o seu último jantar. Há três grandes temas nas representações artísticas da Última Ceia. Mas o primeiro e o mais significativo é a dramática e dinâmica cena de Jesus anunciando que foi traído por um dos apóstolos. A traição é uma palavra forte no nosso tema, já que no texto do sermão, além da traição, também é mencionado Judas: «O polvo com aquele seu capelo na cabeça, parece um monge; com aqueles seus raios estendidos, parece uma estrela; com aquele não ter osso nem espinha,
parece a mesma brandura, a mesma mansidão. E debaixo desta aparência tão modesta, ou desta hipocrisia tão santa, testemunham constantemente os dois grandes Doutores da Igreja latina e grega, que o dito polvo é o maior traidor do mar. Consiste esta traição do polvo, primeiramente, em se vestir ou pintar das mesmas cores de todas aquelas cores a que está pegado. As cores, que no camaleão são gala, no polvo são malícia; as figuras, que em Proteu são fábula, no polvo são verdade e artifício. Se está nos limos, faz-se verde; se está na areia, faz-se branco; se está no lodo, faz-se pardo: e se está em alguma pedra, como mais ordinariamente costuma estar, faz-se da cor da mesma pedra. E daqui que sucede? Sucede que outro peixe, inocente da traição, vai passando desacautelado, e o salteador, que está de emboscada dentro do seu próprio engano, lança-lhe os braços de repente, e fá-lo prisioneiro. Fizera mais Judas? Não fizera mais, porque não fez tanto. Judas abraçou a Cristo, mas outros o prenderam; o polvo é o que abraça e mais o que prende. Judas com os braços fez o sinal, e o polvo dos próprios braços faz as cordas. Judas é verdade que foi traidor, mas com lanternas diante; traçou a traição às escuras, mas executou-a muito às claras. O polvo, escurecendo-se a si, tira a vista aos outros, e a primeira traição e roubo que faz, é a luz, para que não distinga as cores. Vê, peixe aleivoso e vil, qual é a tua maldade, pois Judas em tua comparação já é menos traidor!» Catarina Ribeiro, Rita Bailão, Viktoriya Terletska