Out/Nov/Dez 2021 Ano 9 | Edição 57 R$10,00
PONT & VÍR ULA
KENNEDY & LUCIMARA Unidos pelo amor e parceiros na vida e nas letras
2 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
ÍNDICE OUTUBRO/NOVEMBRO/DEZEMBRO 2021 Pág. 1 Kennedy & Lucimara Pág. 2 Publicidade Pág. 3 Índice, Editorial e Expediente Págs. 4 - 5 Matéria de Capa Págs. 6 - 7 Poeta em Destaque: Arthur Gregório Valério Pág. 8 Talvez o que pareça encaminhar minhas ideias... - Perce Polegatto Canto Divino - Maria Luzia Misuraca Graton Págs. 9 - 10 Para um grande amigo, o melhor pedaço! - José A. de Azevedo Poetas em Destaque Pág. 11 Cantinho Literário de Bridon e Arlete Pág. 12 Pe. Afonso de Castro: um professor salesiano - Raquel Naveira Pág. 13 Poetas em Destaque Pág. 14 A lição da figueira! - Irene Coimbra Pág. 15 Poetas em destaque Pág. 16 Sinopse do romance “No crepúsculo da vida” - Mazé T. Chotil Um gato de porcelana - Maria Alice Ferreira da Rosa Pág. 17 Anel de Giges - Sérgio Roxo da Fonseca Pág. 18 A culpa é de Lenin - Ithamar Vugman Pág. 19 Poeta Inesquecível - Alvim Barbosa | Poetas em Destaque Pág. 20 Sobre o livro “Religião da origem à ideologia” de Júlio José Chiavenato pelo Prof. Dr. Francisco A. Moura Duarte Pág. 21 O casamento do Dúbio Elegante e Frígida Estonteante Fernando de Oliveira Cláudio Pág. 22 Advogada em Destaque: Leiliane Coimbra Pág. 23 Participantes da 18a. Antologia Ponto & Vírgula Pág. 24 Foto em Destaque - Aline Cláudio
Editorial Outubro, novembro e dezembro voaram!!! Fim de 2021! Fim de 2021 mas não da Pandemia do coronavírus, infelizmente! Vacinas, as mais variadas possíveis, continuam sendo aplicadas pelo mundo inteiro. E a pergunta é sempre a mesma: Quando terminará tudo isso? De nossa parte, continuamos firmes, com fé Foto: Fernando O. Claudio e confiantes em Deus que logo tudo voltará ao normal. Jamais desistiremos de nossa missão de alimentar almas famintas. E é com imensa alegria, que destacamos o casal: Kennedy de Oliveira Gomes e Lucimara de Souza Gomes, também alimentadores de almas, e ativistas culturais na vizinha cidade de Cravinhos, onde residem. Kennedy é jornalista, formado e especializado em “Comunicação: Linguagens Midiáticas”, e Lucimara de Souza Gomes é formada em Letras e Pedagogia, especialista em linguagens midiáticas, escritora e autora do livro “Entre tantas coisas e outras crônicas”. Kennedy e Lucimara estão sempre envolvidos, com muito entusiasmo, tanto na Educação, como na Cultura e sempre dispostos a ajudar aqueles que recorrem a eles. Irá conhecê-los, um pouco mais, nas páginas seguintes! A todos os nossos colunistas, parabéns pelos seus belos poemas, contos e crônicas, que sempre encantam a todos!! A você leitor/a, desejamos uma boa leitura e fica o convite para juntar-se a nós, sendo mais um dos assinantes da revista “Ponto & Vírgula”!
Irene Coimbra Editora
EXPEDIENTE Direção Geral: Irene Coimbra de Oliveira Cláudio - irene.pontoevirgula@gmail.com Edição: Ponto & Vírgula Editora e Promotora de Eventos | Diagramação: Aline Cláudio Impressão: Ribergráfica - A Cor da Qualidade | Fotos de Capa e Matéria: Ana Cláudia Ferreira (@anacf_photografia) Anuncie na Revista Ponto & Vírgula. Associe sua marca à Educação e Cultura! Mídias: Impressa, Digital e Audiovisual. Publicidade e Venda: Irene – (16) 3626-5573 / WhatsApp: (16) 98104-0032 Tiragem: 1 mil exemplares impressos Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 3
Os artigos assinados são de responsabilidade do autor. A opinião da revista é expressa em editorial.
KENNEDY & LUCIMARA Unidos pelo amor e parceiros na vida e nas letras Kennedy de Oliveira Gomes
S
ou Kennedy de Oliveira Gomes, natural de Cravinhos, e sempre fui apaixonado pelas letras. A decisão de fazer faculdade de Jornalismo surgiu ainda no ensino médio, depois de acompanhar o trabalho do Lin Fernandes, professor de física e, na época, radialista da extinta Rádio Independência de Ribeirão Preto. Depois de formado, especializei-me em “Comunicação: Linguagens Midiáticas”, e meu gosto pelo esporte me levou a cursar, recentemente, uma pós-graduação em “Jornalismo Esportivo”. Já atuei em empresa televisiva, radiofônica, impressa e atualmente sou assessor de imprensa da Prefeitura de Cravinhos. Paralelo ao meu trabalho e com o objetivo de levar notícias de Cravinhos e região,
além de apresentar conteúdos nacionais e internacionais através das mídias digitais, um amigo e também jornalista – Emir Freiberger – e eu, em 23 de novembro de 2016, decidimos fundar o site da InterTV Web (www.intertvweb.com. br), que traz em seu slogan “A informação precisa de que você precisa”. A InterTVWeb conta com uma equipe gabaritada e especialistas em diversas áreas que proporcionam conteúdos variados aos leitores, como literatura, economia, saúde, moda, nutrição, coluna social, charge, agronegócio, dentre outros, sempre através de uma linguagem clara, dinâmica e objetiva. Além disso, mantém, através da prestação de serviço com o jornalismo, um compromisso com a verdade, a ética e a imparcialidade. Uma das colunistas é a poeta e incentivadora da Revista Ponto e Vírgula, Irene Coimbra, que desde o começo colabora com seus lindos poemas. A fim de continuar a divulgar “a informação precisa de que você precisa”, ao completar seus cinco anos de fundação, neste ano, a InterTV Web terá novidades, entre elas a
4 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
sua sede própria, que contará com um estúdio de Rádio e TV Web. Acompanhe as nossas redes sociais e fique bem informado: Facebook e Instagram - @intertvweb
Lucimara de Souza Gomes
D
efino-me como um ser humano em construção, vivendo de pequenas felicidades. Sou formada em Letras e Pedagogia, especialista em linguagens midiáticas. Amo a educação e acredito em seu poder transformador. Sou apaixonada por jornalismo e pelas artes. Aprecio literatura, em especial a crônica. A crônica diária me encanta. Existir, observar, sentir, refletir: traduzir tudo isso em letras é meu passatempo preferido. Comecei a publicar meus escritos em um blog em 2009. Foi quando percebi que, para escrever um texto, eu carecia ser simplesmente um eu a sentir o mundo, captando o mínimo de poesia do viver cotidiano. Para mim, a língua portuguesa é intrigante, desafiante, encantadora, apaixonante. E, diante de toda essa admiração pela língua e pela escrita, despretensiosamente, em 2017, lancei, de forma independente, meu primeiro livro. Garimpei meus escritos, escolhi os textos, lapidei outros e nasceu o “Entre tantas coisas e outras crônicas”. O título partiu de uma crônica finalista do Mapa Cultural Paulista edição 2011/2012, um programa que, embora atualmente em novo formato, ainda tem o objetivo de fomentar as produções culturais do interior, revelando valores em segmentos que não teriam acesso aos meios de comunicação e com pouca visibilidade no meio cultural. Foi um grande estímulo, já que por duas vezes fui finalista neste mesmo programa cultural, na outra ocasião, com um conto. Costumo dizer que escrever é como fabricar um tecido. Ao substituir um fio comum por um fio de qualidade desconhecida e a ele unir uma pitada particular de técnica, crio a competência de urdir um formoso e diferente tecido apto a revestir até os gostos mais refinados. A tessitura de um escrito também é assim. Um sentir, um olhar com um pouco mais de sensibilidade penetra nas letras e faz a diferença no texto e na vida. Também sob a perspectiva de tocar a alma por meio da escrita, durante a pandemia, aceitei fazer parte de um projeto um tanto quanto diferente e desafiador – “Preces de esperança” –, que começou naturalmente a partir da amizade com um padre da arquidiocese de Ribeirão Preto, o Pe. Josirlei Ap. Silva. Ele, que é Capelão Hospitalar e possui a delicada habilidade de entrar na intimidade do paciente para acolher seus medos, suas angústias, tornando seu sofrimento menos doloroso através da palavra de Deus. Ao viver as experiências dentro dos hospitais,
o padre as relata para mim e eu as traduzo em letras, publicando, em seguida, em uma rede social - @precesdeesperanca - e em uma coluna no site InterTV Web. Em tempos de fardos tão pesados e de insistentes incertezas, encontramos este caminho para levar um pouco mais de leveza, amor e esperança às mídias digitais, compartilhando com outras pessoas vivências que encorajam a chama da nossa fé a permanecer acesa.
Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 5
Poeta em Destaque ARTHUR GREGÓRIO VALÉRIO O mistério de uma flor (Para Lara Dillela Micali)
O grande mistério do amor é não haver no amor mistério algum. O verdadeiro amor, isto é, o amor no final das contas, não é razoável nem merecedor de aplausos. O amor é só para os que estão amando. Quem enxerga de fora as coisas, é cego e só tem olhos abertos aquele que aposta tudo na verdade achada e solitária, onde a verdade mesma nunca esteve.
Das últimas conclusões No fim, são os fins. A alma nunca morou ao lado, nem esteve escondida dentro do corpo, ou das coisas. O corpo, tal como ele é, nunca foi digno de culto nem de perseguições. O corpo não era senão uma coisa entre as outras, como a alma, e a verdade. Tudo era mesmo o que era, do modo como era O que valeu a pena, valeu, e o que não valeu, também foi-se. O mistério do mundo sempre foi a possibilidade angustiante de não haver no mundo mistério algum. Mas ao invés disso, abismo que não tem fundo, nem porque. No fim, são os fins. Nada se concebe do que é inconcebível. Nada se pensa do que é impensável. A revolução não foi outra coisa senão assassinato. A meritocracia e a igualdade, débeis fantasias de berço. O impossível continuará impossível, e o possível, indecifrável. Que tenham fé os que a procuram, mas saibam os que não a procuram, que suas certezas vulgares, 6 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
ditas, de passagem, racionais, isto é, lógicas são tão duvidosas quanto a capital do país das fadas. E que saibam todos, que, no final, é vedado ao homem o conhecimento de onde se vem, e para onde se vai. Ou porque razão se questiona desde cedo, na reflexão mais inútil e estúpida concebível, sobre aquilo que não sabe explicar-se sequer para si mesmo. A alma nunca morou no subterrâneo, nem no céu. Os olhos nunca enxergaram nada por detrás das ilusões e cada qual na sua ilusão, já de antemão perdida naquilo que encontrava pelo caminho, se afundava ainda mais. No ocaso, sem nuvens e sem verdade, cego de tanto ver e louco de tamanha razão onde o caminho chega ao fim e não há nada que se diga sobre o mundo que não seja também mortal ou passageiro como tudo sempre foi.
Da folha seca Não tenho mais esperança nas coisas nem nos homens. Eis minha alegria. Minha esperança são todas as esperanças possíveis de se suportar o mundo tal como ele é de suportá-lo, e não estar aquém dele de ser no mais, humano, e permanecer aí, não é preciso superar o homem nem a fraqueza não é preciso deixar de sofrer. Minha sina é permanecer aí, onde a finitude me abandona. Minha esperança é estar junto as coisas. Aguardar num canto, mas sem perder tempo, demorar-me sem equilíbrio na corda do inevitável, e deixar que tudo fique como está, sem a necessidade de ser algo em especial, além de tudo o que já é. Nossas palavras passarão com os anos. O doce som dos bailes e do calor só existirá, quem sabe, no esquecido. O que ficará para o tempo serão silêncios e não palavras. O não dito, que abre caminho para o novo de outros homens. A falta que faremos no sem-lugar que nunca nos conheceu. Todo o desamparo que não poderemos ouvir nem ver do alto da montanha e que será por nós tocado naquela presença palpável e imediata de quando já não pudermos estar presentes. Não restarão dúvidas nem ressentimentos na velhice, quando tudo foi tal como foi. Não existem rivalidades entre os rapazes. Ninguém mais é um rapaz. Não há coisa alguma que não pareça pequena ou digna de pena. Não há lugar para orgulhos, nem arrependimentos e nem tempo para se desperdiçar. Como o passado é tudo e o futuro nada, a vida ganha e então perdida é por fim ganha sempre outra vez tal como pode. Tudo o que conhecemos nos nossos dias passará e só terá feito sentido, no fim, aquilo que deixamos escapar, onde nos pegamos, de repente,
quem sabe felizes, com as coisas, sem nenhuma ingenuidade, pois aí já havíamos desistido de toda felicidade. Deixar que os mortos morram em paz. Deixar que um botão de rosas seja o que é, e não outra coisa. Deixar, sem desejá-lo, que aquilo que é mortal, seja mortal pois tudo o que é nosso morrerá, mas nunca será perdido antes de perdemos a vã ideia de que o fim, é o fim e não existem apesares.
Atrabilis Um estar violeta na pálida atmosfera pega nua na irrelevância de fantasiar por dores e estrelas de aço, já enferrujadas. Todas as luas presas a Saturno para que só um botão de rosa sobreviva. Uma vida inteira para se descobrir que no final, o sol também é frio. A convalescência que não deixa ir embora o que já se foi. Um ser-sempre-outro lilás e insólito na febre, a deixar tudo como é perdido no seu sem-porquê de ser. A tortuosa razão, suficiente para que o fim seja, definitivamente, o fim. A certeza que transborda falta de certeza e cobra a ausente presença do par de olhos do qual já nada passa desapercebido. Eis a mais dura lição que se recebe crua da realidade
Minha casa Dentro de mim não mora ninguém. Nem mesmo eu estou lá. Eu estou aqui fora, como homem entre as coisas, como coisa entre homens. Lá dentro é solidão, um calafrio. Já aqui faz calor e apesar da dor, e do extravio, só se é livre no descaminho, se por dentro houver vazio. Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 7
Talvez o que pareça encaminhar minhas ideias... Por Perce Polegatto
T
alvez o que pareça encaminhar minhas ideias para a ilusão das explicações todas não passe de outro sonho do intelecto, não menos complicado que os raciocínios que nos esclarecem e nos libertam do sonho há pouco despertado por nossa consciência primata, o sonho mal amanhecido de nossa existência. Na verdade, eu gostaria de eliminar para sempre muitos dos gestos que fiz, até mesmo na memória, e que pareciam certos e razoáveis quando os pratiquei, como se nunca fosse envergonhar-me deles mais tarde. Isso continua, com minha queda pela Josie. Minha queda, eu disse. A Queda, segundo a fantasiosa gênese bíblica. Mas que besteira: quase todos os seres vivos dependem dessa queda para continuar existindo. E mesmo que eu e a Josie nunca produzíssemos descendentes, minha atração por ela seria fortemente a mesma. Além disso, os dados reais da vida interessavam-me cada vez menos, que não me permitiriam ser como sou, quase um artista sem metas definidas fora de sua febre. Por outro lado, quando me aproximava da Josie, essa minha
queda se assemelhava a uma vertiginosa ascensão, já que eu sentia progredir na escala dos impulsos sempre mais intensos de um erotismo irrefreável e dominador. A essa altura, o que meu instinto procurava não era que eu resistisse e me reafirmasse, mas que eu cedesse e saísse de mim mesmo, sem restrições, e crescesse até ela, assim como Coco Chanel, seguindo seus instintos felinos e sem contar esforços, enroscava-se entre a sinuosidade de uma árvore para alcançar os telhados. Eu não era o mesmo de alguns minutos antes, e entendia que a Josie também não. Nem o mesmo de algumas semanas atrás, assim como ela agora diferia daquela recepcionista repetitiva que eu conhecera, por trás do balcãozinho envernizado. Quando eu a beijava, e sentia seus dentes delicados mordendo-me os lábios, eu não queria mesmo evitar essa queda entre os dias. Estava envolvido com minha natureza real. E o que eu beijava era a minha própria ousadia adormecida. (Do romance "Projeto esvanecendo-se")
Canto Divino
Por Maria Luzia Misuraca Graton
8 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
Mais puro, mais profundo, paz, toda harmonia sem fim!... Anjos dos céus... Contam segundos... Ajoelhado, arrependido, fazei oração! Cantai vosso canto, abri vosso coração. Embriagados com o bramido do mar encontraremos elos perdidos. De volta fortalecidos, buscando da vida momentos, levantaremos a Cruz. Nossa alma pronta é um lume inebriados com perfume. Ouviremos longe... Celestial canção Cantam a união de todos... O amor, a confraternização! Enternecidos, aureolados de luz! Braços erguidos, agradecemos a Deus, por ter VIVIDO. Do livro: Luz na Paisagem
Imagem: Pascal Debrunner
Dourado céu, torna-se prata! Brilhante sol cobre as três Marias! Suaves murmúrios, alegria, sob flancos avermelhados, devagar descansa o dia... Na imensidão muito azul corre uma estrela cadente, reluz o cruzeiro do sul, um clarão desce o véu Maria, Jesus acalenta... Sob o cortinado do céu, rumorejam fontes... Rios!... Farfalham folhas... Há flores no jardim. A civilização traz desafios. A vida canta em todos e em mim. Cantem homens, crianças dos mundos, aprendizes do Canto Novo!
Por José Antônio de Azevedo
Foto: Natan Ferraro
Para um grande amigo, o melhor pedaço!
O
utra história verdadeira: Ícaro vivia no os lugares está sempre o seu amigo, enrodilhado Triângulo Mineiro quando conheceu So- na cabeceira, guardando-o de malfeitores. Também jão, um homem de meia-idade, mendigo quando dorme Sultão, Sojão fica desperto, vigianmorador de rua num pequeno lugarejo urbano com do-o contra agressores humanos ou animais malpouco mais de dez mil habitantes. dosos. E assim vão vivendo os dois ao deus-dará. Quando jovem, o desafortunado homem era Após o primeiro encontro de Ícaro com os dois, vistoso, romântico e vigoroso, por quem as moças passaram os três a se reunir a fim de melhor coda aldeia nutriam fortes atrações amorosas. Assim, nhecer o ancião. Então, certo dia Sojão esclareceu não foi difícil esposar uma das mais belas prendas como ficou conhecendo Sultão: e por ela se apaixonar loucamente. Casaram-se - Estando com fome, certo dia ganhei um pedaço e viveram um romance caloroso por alguns anos. de pão para o almoço e fui comer debaixo da ponCom ela teve um casal de filhos. Motivada por sua te. Sultão recebeu-me festejando minha chegada e beleza, a esposa desviou-se pelos caminhos da trai- passou a olhar com olhos ternos e fixos o pedaço ção, jogando o amoroso marido na amargura do de pão. Deu-me pena ver o seu comportamento. despeito e os filhos, ainda jovens, na grande cidade Pensei logo que estivesse com fome e dei-lhe um dos traficantes e violência. Desgostoso pela prefe- pedaço do meu pedaço de pão. Ele comeu sofregarência da esposa dada a outrem, Sojão perdeu a mente e permaneceu comigo como a me agradecer. vontade de trabalhar e se divertir, caindo degrau Naquele nosso repasto foi selada a amizade que por degrau da escala social até perdura até hoje. a marginalização. Os filhos, na Em outro, Ícaro quis saber "Qualquer prato com metrópole, enveredaram no arroz, feijão e carne, se o bom e humilde homem vício das drogas, associando-se tinha algum desejo na vida, que sobra para lhe saciar aos grandes traficantes até caíem virtude de sua vontade de a fome, reparte com o poder satisfazê-lo. Pensava, rem na cadeia. Desventurado, Sojão passa a grande amigo." naquele instante, que ele iria perambular pelas ruas da cidapedir uma casa para morar ou de na companhia de um cão também abandonado, um emprego para sobreviver. Qual não foi a sua fiel e amigo. Nutrem, um pelo outro, grande amiza- surpresa ao ouvir, com voz firme e suave: de. Pede para os corações magnânimos apenas aga- No momento desejo ter um cachorro-quente salhos e alimentos para si e o amigo Sultão. Sojão é para nosso jantar. um bom homem, conhecido por todos da cidade e Ícaro foi até uma lanchonete e mandou fazer um estimado pelos corações generosos, embora tenha cachorrão-quente bem recheado (pão tipo baguete perdido a família, a memória, a própria identidade e inteiro) e levou para o mendigo. Ele arregalou os dos amigos sobrara apenas um. É sóbrio e tranqui- brilhantes olhos afetuosos e encantadores e, com lo, conformado como morador de rua e confiante o sorriso mais lindo que Ícaro já presenciara disse: em Deus. Ao receber algum pedaço de pão ou uma - Tudo isso?! calça velha agradece com reverência ao benfeitor Agradeceu o benfeitor com o costumeiro “Deus com um “Deus lhe pague”. Qualquer prato com ar- lhe pague” e retirou as salsichas do recheio, dandoroz, feijão e carne, que sobra para lhe saciar a fome, -as ao Sultão que, ávido, saciou a fome. Ícaro não reparte com o grande amigo. Quaisquer alimentos entendeu o gesto de Sojão: a salsicha é mais sucuganhados divide com Sultão. Dorme, ora debaixo lenta que o pão, pensou. Entre intrigado e surpreso, de uma ponte, ora nos galhos de uma mangueira so- indagou porque dera a melhor parte ao animal. Pabre uma prancha adaptada com colchão. Em ambos rece incrível, mas a resposta do mendigo foi: Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 9
- Para um grande amigo o melhor pedaço. Ícaro despediu-se de Sojão com um grande abraço, afagou as orelhas de Sultão e saiu dali refletindo como é bom ter amigos verdadeiros. “É UMA LIÇÃO PARA JAMAIS SER ESQUECIDA.” A mensagem ficou martelando em sua cabeça: Para um grande amigo o melhor pedaço. Para um bom amigo, o pedaço melhor. O melhor pedaço é para um grande amigo. O melhor pedaço... Um grande amigo... Do livro: Comendo Fogo e Cuspindo Cinzas Páginas 20 - 22 ***
Poetas em Destaque
Ah, Senhor meu, entra que a casa é tua e eu, escrava apenas, jamais senhora. Quero te descalçar as sandálias, ungir-te os pés com doces óleos, enxugá-los com meus cabelos, colocar-te a branca rede para que teu corpo manso me espere, tenro favo, praia de perfumes e doçuras. Eu me deitarei ao teu lado, trêmula caça amestrada pelas tuas mãos, teus dedos que pousarão sobre mim mapeando-me o corpo, o sexo, puxando-me contra ti para, de novo, o céu me seja dado e me abra em delta misturando-me em tuas águas no teu mar de vida minha... Ah, Senhor meu! - Ely Vieitez Lisboa 10 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
Decífra-me ou te devoro Ricardo José Daiha Vieira Decifra-me ou te devoro ... Dizia-me teu coração e eu de ti enamorado, cego, apaixonado, dei asas à ilusão. Decifrei-te os códigos, li de ti as entrelinhas, ajoelhei-me à teus pés fiz de ti minha rainha. Decifra-me ou te devoro ... E nem pensei no final, que de ti encantado, deveras enfeitiçado pelo enigma indecifrável, a esfinge indomável, seria então devorado.
CANTINHO LITERÁRIO Por JC
Bridon & Arlete Trentini
Studio Cine Foto Mary
Fascinação JC Bridon
Meus pensamentos Arlete Trentini dos Santos
Me cativaste com teu jeitinho doce e com teus olhos brilhantes.
Meus pensamentos voam para ti que entendes todo meu sentir. Com uma palavra me fazes ver o quanto sou teu bem querer.
Me cativaste com tua maneira alegre de ser e com teu belo sorriso. Me cativaste conquistando para sempre meu coração que ainda pulsa como outrora. Me cativaste com tua eterna juventude mostrando que o amor continua presente em teu coração. Me cativaste olhando nos meus olhos numa noite estrelada de outrora como fazes ainda hoje mostrando que é possível amar eternamente.
Sou uma harpa em tuas mãos. Dedilhas cada uma das cordas. Só tu sabes fazer a afinação e fazes nascer assim uma canção. E eu canto, aqui no meu recanto. Vem, cobre meu corpo com teu manto. Eu bem sei que não és santo, mas fazes minha vida ter encanto. Tenho aqui uma chama que clama e reclama. Faz-me rolar de um lado para outro na cama. Mesmo longe, sinto que me sentes não sou só eu a pensar tão indecente. Do livro “Alinhavando poesia” – Pág. 22
Foto: Guille Pozzi
Do livro "Amor, Sonho e Poesia" – Pág. 30
Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 11
Pe. Afonso de Castro: um professor salesiano Por Raquel Naveira
F
oi na Universidade Católica Dom Bosco, quando ainda estudava Letras, que travei contato com o Padre Afonso de Castro (1942-...), nosso professor de Literatura Brasileira. Pe, Afonso havia se graduado Mestre pela Universidade Nacional de Brasília (UNB). Cabelos grisalhos, olhos grandes e azuis que faiscavam de inteligência. Era um mestre que não impunha respostas, ao contrário, estimulava a criatividade, a leitura crítica, os debates. Um aprendiz entre saberes, mistérios, simbolismos. Fazia germinar ideias, provocações. Desenhava no ar pontes que atravessávamos com imaginação. Tinha suas paixões declaradas: Manoel de Barros, Guimarães Rosa, Cecília Meireles, Clarice Lispector. E tudo permeado pela filosofia de Gaston Bachelard. Encontrou em mim uma aluna ao mesmo tempo culta, com bagagem de leitura, mas humilde para crescer. Ao término do curso, ele já pró-reitor, convidou-me para dar aulas no Departamento de Letras, iniciando assim minha carreira no Magistério Superior. Por sua vez, ele estava se doutorando em Teoria Literária e Literatura Comparada pela UNESP de Assis. Passei também, juntamente com as aulas, a trabalhar como revisora da editora da Universidade. Chegou então às minhas mãos o livro A Poética de Manoel de Barros: a linguagem e a volta à infância, do Pe. Afonso de Castro, com uma dedicatória para mim! Que estudo formidável sobre a obra do poeta Manoel de Barros! O mestre apresenta os livros sobre os quais se debruçou como Poemas Concebidos sem Pecado, Livro de Pré-Coisas, O Guardador de Águas e outros. Analisa poemas, focando na volta à infância que imprime no inconsciente do poeta “a saudade e a nostalgia de um tempo pleno de vida, que se renova constantemente”. Explica: “Na infância, o mundo, as coisas, os seres, as pessoas foram vivenciadas de tal forma marcantes, que preenchem uma idealidade arquetípica a que os poetas voltam como origem de suas revelações poéticas.” Estado primordial, potência do ser, mundo de possibilidades. Sim, Manoel de Barros, eterno 12 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
menino em busca de uma “linguagem madruguenta, inaugural, que os poetas aprenderiam- desde que voltassem às crianças que foram, às rãs que foram, às pedras que foram.” A dedicação de Pe. Afonso à obra de Manoel de Barros se intensifica com dois outros títulos: Análise Estética de Poemas Rupestres e Outra Pessoa Desabre e Análise Poética, Estética e Hermenêutica, Homem de Lata, de Manoel de Barros e Cara de Bronze de João Guimarães Rosa. Os dois livros são comentários, apontamentos, espécie de anotações de tópicos para uma aula, roteiros de leitura. Transcreve o poema, depois vai abrindo clareiras na relação do poeta com as palavras. A análise do conto “Cara de Bronze”, de Guimarães Rosa é como uma câmera visualizando os campos, a fazenda, os vaqueiros, o violeiro, a moça Branca-de-todas-as-Cores, o Grifo, a viagem. Escritor e educador como Dom Bosco, Pe. Afonso procurou resgatar o carisma salesiano, atualizar e divulgar o Sistema Preventivo, demonstrando que permanece verdadeiro o ditado: “Vale mais prevenir que remediar”. Todo esse esforço o levou a uma cadeira na Academia Sul-Mato-Grossense de Letras, onde somos confrades. Nesses tempos pandêmicos, nosso diálogo tem sido intenso através das crônicas poéticas que escrevo e envio aos amigos. Entre uma mensagem e outra, fizemos uma amiga em comum: a poetisa e comunicadora, Irene Coimbra, que movimenta escritores com sua bem cuidada revista Ponto&Vírgula e o programa semanal de mesmo nome na TV de Ribeirão Preto. Pe. Afonso acompanha a produção sensível dessa agitadora cultural, que une toda uma comunidade em torno da Arte. E lá se vão mais de três décadas de respeito e trocas literárias com Pe. Afonso de Castro. Se fecho os olhos, posso imaginá-lo de batina negra num daqueles navios que atravessaram o oceano, no final do século XIX. Posso imaginá-lo num passado recente, chegando a terras do sul de Mato Grosso para cumprir seu destino e missão.
Poetas em Destaque Alceu Bigato
Isolino C. de Oliveira
Marlene Cerviglieri
Adriano Pelá
Algumas diferenças
Meu Pé de Limão
Alceu Bigato
Isolino C. de Oliveira
Cuidamos bem; e é bom cuidar do nosso meio ambiente. Desde a nascente, lá no alto da colina. O rio distante da cidade, é um rio diferente. É a casa dos peixes. É a nossa piscina. Com a parada no ar e a marcha à ré do beija-flor. O sabiá, maestro da floresta: sem a batuta. E o sol, com o mesmo calor, azeda o leite e adoça a fruta.
Numa casa em que morei, nos anos que lá se vão, tenho saudosas lembranças, de um antigo pé de limão. Nele, às vezes, eu subia e sentia um bem estar, creio que era a amizade, que entre nós não tinha par. Aquele pé de limão, no quintal de minha casa, era uma fonte de sombra, onde eu sempre brincava.
***
Foi-se a vida de criança, tudo se modificou, a casa não é a mesma e o limoeiro acabou!
Assobio do vento
***
Marlene B. Cerviglieri Sopra o vento na colina, no meio das arvores a assoviar! Fogem os pássaros assustados, do que não podem enfrentar. Se aquietem passarinhos, que logo tudo vai passar. Com a chuva dos céus, a tormenta vai se acalmar! Sai o sol a brilhar, aquecendo tudo outra vez. E assim nossa bela natureza que a todos sempre vai ajudar.
Suavíssima Adriano Roberto Pelá Voz suave como o bater das asas da borboleta... Agradáveis sons em tons leves... Olhar direto, tranquilo, irradiam mensagem de atenção, e apreço ao outro! Movimentos corporais elegantes, como os passos de uma bailarina. Atitudes suaves, tranquilas, qualidades do ser divinal suavíssima... ***
***
Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 13
O
s dicionários dizem sucintamente que religião é “um sistema de crenças que estabelece e regula as relações entre os seres humanos e as divindades”. Mas o que separa o divino do humano? O que é divino? O que é humano? Afinal, o que é religião? Este livro faz uma busca exaustiva em seis mil anos de história, procurando as origens das grandes religiões. Júlio José Chiavenato desenvolve uma acurada análise da relação entre religião e ciência, religião e filosofia, religião e economia, religião e política, demonstrando os fundamentos materiais que possibilitam a evolução do processo religioso. Quando surgiram as primeiras religiões os religiosos prescindiam do divino. Depois adoraram vários deuses, para finalmente, adotarem um só. Esse processo não aconteceu “naturalmente”. Foi provocado por uma série de fatores políticos e econômicos (desde os persas, egípcios e judeus) que influíram ou condicionaram as crenças e suas teologias, criando ritos e rituais específicos, convenientes a grupos sociais ou a sistemas de poder. Nessa caminhada construiu-se a história da humanidade. A história humana registra, além do encontro do homem com o místico, a violência para a imposição de crenças que se apresentavam, geralmente, como sinônimos de paz e amor. O processo religioso quase sempre esteve ligado à repressão intelectual e política e marcado pela intolerância. Sem menosprezar santos e mártires, ideias e crendices, que mereceram o respeito do autor, Religião Da Origem à Ideologia mostra como surgiram as grandes religiões – Hinduísmo, Budismo, Confucionismo, Zoroastrismo, Islamismo – dando ênfase ao Judaísmo e Cristianismo, que são nossas maiores influências. A origem e o desenvolvimento dessas religiões, especialmente do Cristianismo e sua relação com o poder político desde o Império Romano, explicam como surgiram os nossos conceitos éticos e morais e como eles nos condicionam diante dos desafios cotidianos. Na introdução do livro Júlio José Chiavenato afirma que religião é algo que se discute com muito 14 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
Foto: Guilherme Oliveira
Sobre o livro “Religião da origem à ideologia” de Júlio José Chiavenato pelo Prof. Dr. Francisco A. Moura Duarte
emocionalismo e pouca racionalidade. Seu amplo ensaio procura um ponto de equilíbrio racional ao expor a história da origem das grandes religiões. É um livro necessário, que se contrapõe à onda de esoterismos e misticismos vulgares que se tornaram moda atualmente. Num texto claro, esclarecedor, crítico e sem preconceito, este Religião Da Origem à Ideologia enriquece os estudos sobre religião e religiosidade, independente da posição do leitor sobre o tema. Júlio José Chiavenato é um autor surpreendente, sem dúvida um dos grandes escritores brasileiros atuais e que sabe expor como poucos seus pontos de vista e analisar com profundidade os assuntos por ele abordados. Dr. Francisco Alberto de Moura Duarte Presidente da FUNPEC - Ribeirão Preto
Poetas em Destaque Cecília Figueiredo
Luzia Madalena Granato
Fernanda R-Mesquita
Maria Auxiliadora Nogueira Zeoti
Descomplicado
Primavera
Cecília Figueiredo
Luzia Madalena Granato
Se isso for muito complicado, eu descomplico assim: recuo. Se eu achar que não vale a pena, eu desvalorizo assim: anulo. Se eu teimar que não vai dar certo, eu decido assim: te mato. - Não de verdade; Matar os outros é pecado – Te mato gentilmente com faca de matar afeto. Depois vou pra janela, sem culpa e sem medo.
Chegaste! E sabe como te esperava! Te amo primavera! És a paixão do meu coração! Trazes mais vida à minha alma tão cheia de amor e poesia. Fico te esperando a cada sinal. Anuncias o Amor... Rejuvenesces meu ser, minhas esperanças... Me encanto em cada flor que nasce... Meu coração se renova, como criança que resiste a todas as estações que representam os sentimentos internos. És meu amor platônico, suave amada! Escolho, árvores que simbolizam a vida, raízes, caules, copas frondosas, folhas que, delicadamente, suavizam com a brisa. Te amo, Primavera!
***
Teimosia louca Fernanda R-Mesquita Por vezes a minha alma perde a noção do próprio dono, faz-me escrava das dores dos outros, tão fielmente, povoa-me de inquietações, faz-me perder o sono, enquanto que para eles, não me veem, estou ausente. Preencho as minhas horas com tantos receios vãos, na teimosia de os querer aparar a todos nos meus braços, garantir-lhes que vivem no meu coração, amaciar os caminhos por onde andam os seus passos. Mas talvez eu seja louca, talvez; por esta constante, vez após vez, pensar nos outros, deste modo assim... De tanto amor, preocupação sincera, esqueço que às vezes, fico tanto tempo à espera que eles também se lembrem de mim! ***
***
Constatação Maria Auxiliadora Nogueira Zeoti O brilho da luz perfila quanto mais forte é a sombra. O fino cristal denota quão grande fragilidade. A força de um se mede pela fraqueza do outro. A podridão renegada serve de esterco à semente. Opostos e paralelos são esses trilhos da vida. Se ”há males que vêm para o bem”, “o amor e o ódio andam juntos”. Porque viver é isso mesmo. “São as faces da moeda” e só se aprende vivendo. *** Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 15
Um gato de porcelana Maria Alice Ferreira da Rosa
“C
orrientes, tres cuatro ocho, segundo piso, ascensor, no hay porteiros ni vecinos, adentro cocktel de amor... viejos tangos de mi flor y un gato de porcelana... viejos tangos de mi flor y un gato de porcelana..." Assim começa uma das canções mais conhecidas e tocadas do século XX, o belo tango “A media luz”, imortalizado por Gardel. Você escuta desde pequeno, automatiza a letra na memória, e a deixa lá por muito tempo. Um dia, já adulto, em uma viagem para a Argentina, depois de uma noite de tango e vinho em Buenos Aires, distraidamente anda pela bela cidade, quando avista a placa com o nome da via: Corrientes. E, como num estalo, a letra do tango vem à mente. Por pura curiosidade, você olha o número da primeira construção e começa a procurar o 348. Sente aquela ansiedade infantil de abrir o papel colorido do presente de Natal. Pensa em um lugar discreto, ninho de amores furtivos, garçonnière... E vai caminhando, imaginando as delícias do famoso Corrientes 348. Até chegar lá. Trata-se, apenas, da entrada de um simples estacionamento. Não tem segundo piso, nem ascensor, nem coquetel de amor e muito menos um gato de porcelana... O jeito é dar uma risada e continuar caminhan-
do, voltar aos próprios interesses, depois de um malogrado episódio de detetive frustrado. Quantas vezes na vida nos imaginamos na iminência de descobrir algo fantástico, um segredo guardado a sete chaves, um tesouro escondido... e tudo isso somente existe na nossa imaginação, na nossa ânsia de viver algo extraordinário, do cansaço da vidinha arroz-com-feijão que 99,8% da população vive. Tudo e todos iguais: estudar, trabalhar, sofrer, amar, chorar, ganhar, perder... e sonhar. Sonhamos com a saúde, com a riqueza, com o grande amor, com a paixão arrebatadora, com a nossa Corrientes 348. Quantas pessoas no mundo que ouviram esse tango puderam ir pessoalmente conferir o endereço? Mas todas esperam um dia entrar na sua Corrientes 348. Muitas chegam lá. Em sentido literal ou figurado. E têm, então, a grande decepção. Não encontram nada do que esperavam, não há riqueza, não há paixão, não há segundo piso... apenas um típico estacionamento para automóveis. E, no entanto, em algum lugar teimoso de nosso sentir, continuamos sonhando com o gato de porcelana... ***
Sinopse do romance “No crepúsculo da vida” Mazé Torquato Chotil
D
uas amigas. Para festejar os 60 anos de Lúcia, Marta lhe oferece, como presente de aniversário, um final de semana na cidade de Rouen, capital da Normandia, região francesa. A escolha foi da amiga que desejava rever a bela catedral que Claude Monet pintou 30 vezes depois que se instalou definitivamente em Giverny, no final do século 19. É uma viagem pela cidade do escritor Gustave Flaubert e de sua Madame Bovary, onde os filósofos e escritores Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir 16 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
foram professores no começo de suas carreiras. Na catedral, apreciam os vitrais e visitam a sepultura de Ricardo Coração de Leão, fundador do ducado, cujo coração foi depositado na cripta após sua morte. No passeio, visitas gastronômicas, mas também a notícia recebida por Marta da perda de uma irmã. Mazé Torquato Chotil é jornalista, pesquisadora e doutora em ciência da informação e da comunicação pela Universidade de Paris VIII e pos-doutora pela EHESS. Nascida em Glória de Dourados (MS), vive em Paris desde 1985.
Anel de Giges
Por Sérgio Roxo da Fonseca
O
s antigos romanos acreditavam que a Indaga-se então: se ele é portador do anel de memória dos homens habitava o seu Giges, podendo tornar-se invisível, conforme sua coração e não o seu cérebro. No latim, vontade, como ficariam seus desejos ocultos? Realisua língua natal, a palavra “coração” era “cor”. zaria seus desejos ilícitos e ocultos contra as regras Somos descendentes dos latinos, mesmo após sociais? O que seria da realidade se existisse o anel a influência dos gregos, dos árabes e agora dos de Giges supostamente encontrado na antiquíssima americanos. Não acreditamos que o coração guar- Lídia, hoje Turquia? de a nossa memória, mas insistimos em dizer que Se um homem honesto encontrasse o anel de os sentimentos amorosos ali estão ocultos. Quan- Giges, usando-o para tornar-se invisível, o que condo não, usamos o verbo “decorar”, para dizer que seguiria fazer se saísse por aí executando desejos? guardamos no coração um pedaço da nossa memó- Não encontrando o anel de Giges, como o homem, ria. Os romanos notabilizaram-se por disciplinar as durante séculos, conseguiu lidar com seus desejos relações pessoais. Os gregos, as relações sociais. ocultos? Os gregos conseguiram anotar que o homem Platão e seus irmãos debateram com Sócrates a histórico está submetido a duas espécies de leis: a importância ou a inutilidade do anel de Giges, séculei instalada pela natureza, as leis criadas pelos ho- los antes de Cristo e de Freud! mens, sejam éticas, morais ou jurídicas. A lição deixada por Sócrates, registra GianetAs leis fixadas pela ti em seu livro, marca natureza não podem ser o grau do seu conheci"Não acreditamos que o coderrogadas por atos humento: “a sabedoria nasmanos, como aquelas que ce quando se reconhece ração guarde a nossa memória, geram o sono, a fome, a não saber o que se supumas insistimos em dizer que os vida ou a morte. Ao connha sabido”. sentimentos amorosos ali estão trário, as normas humaPor esses caminhos ocultos." nas podem ser atropelaum latino trouxe para das, sejam éticas, morais Roma um vasto conheou jurídicas. As leis da cimento da sabedoria natureza são inflexíveis e inderrogáveis. As normas grega, como palavras do seu idioma. Trata-se de dos homens são flexíveis e derrogáveis. Cícero que viveu nas proximidades do advento do Ampliando o debate, colocando-o sob a lupa de cristianismo. Entre nós, Cícero notabilizou-se pelo Sócrates, de Platão, de Rousseau, do cristianismo e seu discurso contra Catilina. Na política envolveuoutras vertentes, o extraordinário escritor Eduar- -se com César. Fugindo de Roma após o assassinato do Gianetti, examinou extensamente a questão em de Cesar, foi preso e decapitado. Sua cabeça e suas um livro que tem como título "O anel de Giges" mãos foram expostas em Roma. (Companhia das Letras). O caminho trilhado até hoje pelos homens não Gianetti examina a historia ou a fábula de um se afasta da duplicidade de suas almas. Uma interna pastor que encontrou um anel mágico que, girando e oculta e a outra externa e pública. As duas subseu aro, deixava o portador invisível. metidas às inderrogáveis leis da natureza, e pelas Como o homem é dotado de uma dupla perso- derrogáveis leis da sociedade. O livro de Gianetti nalidade, uma interna e oculta e a outra exteriori- de Giges necessita ser lido pela qualidade da mazada para o público, notabilizou-se por agir segun- téria como pela extraordinária habilidade do seu do sua vontade e muitas vezes contra as normas autor. sociais. *** Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 17
A culpa é de Lenin Ithamar Vugman
U
ma série de eventos aleatórios antecede meu aparecimento como mais um habitante terráqueo. Amado por alguns. Detestado por outros. Tudo começa com Simão, meu futuro pai. Muito jovem, abandona para sempre Bessarábia, sua terra natal. Deixa para trás família. Antes da eclosão da Primeira Guerra Mundial emigra para o Brasil. Mora em Curitiba. Inicia nova vida em terra estranha. O segundo evento acontece em 1917. Neste ano profundas transformações políticas e sociais ocorrem na Rússia. A Revolução de Fevereiro instala o Governo Provisório. O Czar Nicolau II renuncia. Fim da monarquia autocrática russa. Reformas democráticas têm início. A Revolução de Outubro leva Bolcheviques ao poder. Vladimir Ilitch Ulianov, pseudônimo Lenin, é o grande líder. Kerensky, primeiro ministro social democrata, é destituído. Regime ditatorial comunista é implantado. Feroz guerra civil dura três anos. Fronteiras da Rússia são fechadas. A proibição de cruzar as fronteiras constitui evento de excepcional relevância para minha vida. Naum, irmão mais velho de Simão, casa-se com Paulina, irmã mais velha de Fani, minha futura mãe. Paulina engravida. O jovem casal deixa Odessa. Vai
para pequena cidade da Bessarábia, antes do fechamento da fronteira. Samuel nasce no aconchego da família de Naum. O casal não retorna para Odessa. Emigra para o Brasil. Encontra Simão em Curitiba. Cruzar o Oceano Atlântico é mais fácil do que cruzar a fronteira da Rússia. O futuro em terra desconhecida lhes parece mais promissor do que na URSS. O terceiro evento ocorre em 1923. Elias, pai de Paulina, deseja conhecer um país tropical. Deixa Odessa. Leva junto a esposa Nanci e seis filhos. Cruza o Atlântico rumo ao Brasil. Desembarca no país tropical. Muda de opinião. Não retorna para a URSS. Começa vida nova. Fixa residência em Curitiba. Junto da filha, genro e neto. Fani conhece Simão. Casam-se. Cumprem suas obrigações matrimoniais. Nasce Ana. Julho de 1926. Apresento-me ao mundo dois anos mais tarde. Quatro de agosto de 1928. Evento totalmente destituído de importância para a humanidade. Evento de crucial importância para minha vida. A culpa é de Lenin. Indubitável. Ausente Lenin, Fani não vai ao encontro de Simão. Sou um ser diferente. Para o bem. Para o mal. ***
Mini poemas
Poemas... Luzia Madalena Granato
Soluços Nely Cyrino de Mello
Saudade Gleidston César
Poemas são rosas que exalam perfume. Suas pétalas aliviam o coração.
Nas ondas das deslembranças, afogam-se esperanças. No desabraço, a não despedida. O vento açoita o barco, o barco enruga a água, soluçando a desavisada partida.
Há dias em que sorrimos por lembrar o que fomos. E outros em que choramos por relembrar que já não somos.
18 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
Poeta Inesquecível: Alvim Barbosa
Paisagens Poema inédito de Alvim - 1956
Foto: Aline Cláudio
Paisagens morreram nos meus olhos enquanto estrelas perseguiam trevas. O quadro sem moldura dos meus sonhos foi destruído pela mão do tempo. Paisagens ficaram adormecidas, nos meus gestos parados na agonia. Ideias transformaram-se em brumas, e meus olhos esqueceram de chorar. Paisagens que já vi sem conhecer, e conhecendo me senti cansado. A bruma desmanchou fotografias, dos meus olhos perdidos pelo espaço.
Poetas em Destaque Idemar de Souza
Nelson Jacintho
Nossas Vidas - XIII
Poeta sou!
Idemar de Souza
Nelson Jacintho
Por muito, muito tempo, me ative afincado à preces a esses meus sofridos filhos... tão sós... desconsolados... ninguém sabe o que sofreram, nesse mundo, isolados. Ah... vida má! Tão desalmada quanto injusta me pareces!
Poeta sou e isso me enobrece: vejo que o sol se esconde solitário e está na hora de rezar a prece, p'ra libertar de mim algum calvário!
Às vezes, meu jardim quase fenece e, com ele, as flores segredeiras! Nesse tempo, Cravo e Florbela se desertam! Saio à porta... e, ninguém... e maus presságios me afetam. Estou só comigo, agora, a confabular com minhas dores.
Espero a noite que em breve aparece, acordo os sonhos dormidos no armário, prossigo a teia que minh'alma tece, e pesco o verso do imaginário!
Clerodendros, roxos e azuis, eu replantei, com esperança de vingarem... e, rosas vermelhas trepadeiras. Ao florirem, quero-os aqui, todo dia, todo o tempo, à minha vista...
Eu olho a noite cintilante e bela! Eu vejo a lua no céu a brilhar que me convida a brilhar com ela!
não mais se irão, feito condores! Ainda espero vê-los, rirem... e não tardou certa voz ao meu ouvido: atente-se ao belicista! Mas aplaque, meu amor, o seu largo desejo de vingança!
Voo aos céus sem medo de voar! Deixo p'ra trás a minha térrea cela! Vou às alturas, meus versos soltar!
Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 19
A lição da figueira! Por Irene Coimbra
A
tarde estava começando quando o tempo anunciou a chegada do temporal! Nuvens pejadas, vestidas de negro, caminhando de modo sinistro, o antecediam. Da janela de minha sala eu as observava, com muito medo, quando uma majestosa figueira no centro do parque, atraiu minha atenção pela sua altivez. Enquanto eu, abrigada dentro de casa, com muito medo, aguardava a chegada do temporal, ela, a céu aberto, parecia desafiá-lo. De repente começou o temporal. Um vendaval terrível começou a fustigá-la sem piedade. Raios e trovões e uma chuva de granizo, para meu desespero, aumentavam aquele espetáculo de horror. Seus galhos se retorciam, suas folhas arrancadas e jogadas ao longe, mas ela resistia, bravamente, aos embates do temporal. Sentia que a qualquer momento ela seria atingida e destruída por algum raio. Mas, para meu alívio, a tempestade passou! A devassa em sua folhagem fora grande, deixando seus galhos quase nus, mas, apesar de toda violência do temporal, ela continuava altiva e silenciosa. Sem querer, eu acabava de aprender com ela uma grande lição. Enfrentar, sem medo e com altivez os embates da vida. Eles não duram para sempre.
O MELHOR DA NATUREZA EM SUA MESA Frutas nacionais e importadas do produtor para sua mesa. Atacado: (16) 3638-7464 Ceagesp (Rod. Anhanguera, KM 322, GPB Box 07& 09) Varejo: (16) 3632-4794 Rua Bernardino de Campos, 621 Email: frutao@superig.com.br 20 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
Foto: Irene Coimbra
O casamento de Dúbio Elegante e Frígida Estonteante Fernando de Oliveira Cláudio
O
amor desigual e não mensurado aqui recorre à insensatez da união do casal infiel e mascarado. Homem e mulher, todos iguais. Menos ou mais. O sentido não é o fim, e sim o jogo que não termina. O casamento de Dúbio Elegante e Frígida Estonteante é o início do nada, a neutralidade presente desde sempre. A conquista e a descoberta da vida, de novos prazeres sexuais, diferentes pessoas e sabores. O casamento é um fracasso. O sócio mal sabe da falência, maquilada através do sorriso ou da falsa palavra escondendo assim a bancarrota e a navalha. Elegante e Frígida conheceram muitos países. Percorreram hábitos culturais diversos. Um casal interessante e inteligente. A cultura transbordando em suas vidas; o tempo amigo do espaço e o dinheiro amigo do banqueiro. A falsa imagem de um casal feliz. Imagem não é tudo. A cumplicidade do casal é polvorosa. Padece de mal social, hipocrisia, a mentira e a falsa moral. Frígida Estonteante é uma mulher linda e maravilhosa. Traços finos, elegante, simpática, simetria perfeita, olhos azuis e cabelos cor de mel, um pote de fel. Um olhar ingênuo e nada inocente. Uma mulher que foge a regra. O cheiro, o jeito, o leve traço da moda de Paris, advogada bem sucedida Frígida é uma mulher de causar inveja em muitas mulheres, deixando homens de queixo caído. Dúbio Elegante é diferente. Homem viril, de muito amor no coração. Talvez fosse esse o motivo que partilhava o excesso de amor em relação extraconjugal. Dúbio
foi bem educado, elegante. Ternos e cortes italianos, sapatos italianos, cintos italianos. Moreno alto e forte, olhos da cor do céu e barba rala, um professor universitário de sucesso. O olhar dissimulado e a mente serena de Dúbio Elegante e Frígida Estonteante sempre foi um porto seguro alçado em outras têmporas. Convictos da inocência alheia, o tempo da maldade nunca se desfaz. Dúbio e Frígida são felizes. Mesmo não sabendo dos fatos e desconfiando das artimanhas do amor, o casal permanece mascarado. Um falso brilhante. O tempo e as rugas surgem na aurora da vida. Filhos, netos, um laço de família. A idade chega e a solidão se ausenta. A cumplicidade dos erros e a idade, maximizando o amor, o carinho e a compreensão do casal. As lágrimas da primavera, congeladas, recaem sobre os olhos dissimulados dos errantes, sem pudor dos hormônios extintos e agora esquecidos. Agora velhos, a margem da idade com o rosto cheio de rugas, o casal encontra as dificuldades da vida final. Sem o brilho dos seus corpos e a sensualidade das suas paixões, o casal envelhece só e mal acompanhado, entre mentiras e verdades, egoísta no amor e fracassados na sinceridade. Um casamento frio, aquecido pelo sentimento de culpa. Felizes para sempre Dúbio Elegante e Frígida Estonteante continuam casados até que a morte os separe. Enquanto esse casamento respira pergunto a mim: - Alguém conhece esse casal? ***
Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 21
Foto: Fernando de O. Cláudio
Advogada em Destaque: Dra. Leiliane Coimbra
Dra. Leiliane Coimbra, além de profissional do Direito, é Professora com Licenciatura Plena em Letras, e pós-graduanda em Direito Penal e Processo Penal aplicados, pela Escola Brasileira de Direito. Por sua dedicação em auxiliar pessoas a terem acesso à justiça de forma equânime, imparcial e justa, merece destaque nesta 57ª edição da Revista Ponto & Vírgula. Parabéns, Dra Leiliane! Continue fazendo a diferença sempre para o bem! www.coimbraecoimbra.com 22 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
PARTICIPANTES DA 18a. ANTOLOGIA PONTO & VÍRGULA Coordenação: Irene Coimbra
Adriano Pelá
Alceu Bigato
Alciony Menegaz
Aldair Barbosa
Aline Cláudio
Antônio Carlos Tórtoro
Arthur G. Valério
Carlos Augusto Sborgia
Carlo Montanari
Conceição Lima
Fátima Monteiro
Fernando de O. Cláudio
Heloísa M. Alves
Idemar de Souza
Isa L.Ranzani
Luzia M. Granato
Maria J. M. Moreira
Maris E. Souza
Maria L. M. Graton
Marly Marchetti
Nely C. de Mello
Perce Polegatto
Regina Baldini
Renata C. Sborgia
Wlaumir Souza
Outubro/Novembro/Dezembro 2021 Revista Ponto & Vírgula 23
E U D ES TA Q EM FO TO 24 Revista Ponto & Vírgula Outubro/Novembro/Dezembro 2021
Hexham, Reino Unido Foto: Aline Cláudio