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Foto de: Valentina Ramos Título: “O mistério do círculo sagrado” Lugar: Citânia de Briteiros © 2014 Todos os direitos reservados Valentina Ramos & Anima Mystica Revista Digital
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Índice dos Artigos 8
O Halloween Luís Miranda
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Para a morte e além Vivianne Crowley
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Onde encontramos a morte, o nascimento e a iniciação Valentina Ramos
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Viagem pela noite de Saturno e pelo palácio de Hel . Valquíria Valhalladur
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Celebrando a vida Eduardo Puente
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Anima Mystica Revista Digital ISSN: 2182-7176 Editores: Luís Miranda Eduardo Puente Valentina Ramos
Neste número colaboraram:
Capítulo Rosacruz do
Porto Fellowship of Isis-
Portugal
Editorial
Silver Circle Dina Amaral
Este é provavelmente um dos números da Anima
Céu Almeida
Mystica Revista Digital mais bem conseguidos e do
Vivianne Crowley
qual mais nos orgulhamos. Nascido da necessidade,
Cristina Aguiar
esta edição especial de Samhain veio tornar-nos conscientes das várias realidades: a nossa realidade efémera e mundana, e a nossa realidade espiritual e eterna, e das realidades que foram mas já não são, ou que sempre estarão connosco .
Anima Mystica Revista Digital, é uma publicação trimestral dirigida à divulgação e discussão de assuntos relacionados com o misticismo e o mundo esotérico (dentro e fora de Portugal), sob uma perspectiva que se estende desde as nossas raízes ancestrais até aos eventos de expressão pagã dos nossos dias.
O véu é fino, e os mistérios atravessam ambos os lugares. Estão carregados de mensagens para os nossos antepassados, que nos guardam. E regressam cheios de sabedoria, magia e compreensão. Muitas vezes, tornam-se incompreensíveis, até que ganhemos asas e alcancemos a sua altura. Muitas vezes vêm através de um gesto ou de um carinho que reconhecemos do passado e nos devolvem a fé e o amor pelos que já partiram. Muitas vezes, revelam-se simples na sua beleza desmascarada, para que possamos entender e saber onde estamos, de onde viemos.
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Contactos Anima Mystica Revista Digital Facebook: https://www.facebook.com/groups/ am.revistadigital/ E-mail: am.revistadigital@gmail.com Download gratuito dos números: http://issuu.com/am.revistadigital
Assim, hoje vemo-nos a partir de realidades diferentes, mas alegramo-nos com a união com os que já partiram, com os que permanecem, com os que estão perto e os que estão longe. Inevitavelmente atinge-nos uma nostalgia que nos obriga a acalmar e a pensar no reencontro que virá em breve, no mesmo sitio, no mesmo lugar, mas num outro tempo que desconhecemos. A Anima Mystica Revista Digital engala-se para a festa da vida e da ´ morte, dos ciclos eternos. Apenas desejamos que goste de ler nossos artigos, tanto quanto nós gostamos de os apresentar. Feliz Samhain!
Os editores Declaração de responsabilidade legal A Anima Mystica Revista Digital respeita a livre expressão, opinião e crença de cada autor. A Anima Mystica Revista Digital não poderá ser considerada responsável pelo conteúdo dos artigos publicados (seja texto ou imagem) sendo essa da inteira responsabilidade dos respectivos autores. Os autores cujos artigos sejam reproduzidos nesta revista mantêm todos os direitos sobre as suas publicações sendo também os responsáveis legais por todas as questões que estes levantem. O Corpo Editorial da Revista não será responsável perante qualquer questão legal derivada de infrações associadas aos artigos publicados. A Anima Mystica Revista Digital compromete-se a não divulgar os nomes dos seus colaboradores salvo autorização dos mesmos ou, quando ocorra uma violação à Lei e nesse caso só às autoridades competentes.
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O Halloween Luís Miranda* A Noite das Bruxas, como era conhecida em Portugal, corresponde à noite de 31 de Outubro, a noite que antecede o Dia de Todos os Santos. Hoje em dia comercializada em Portugal com o nome inglês de Halloween, é uma noite que é celebrada no mundo inteiro (principalmente nos países anglo-saxónicos) em que tradicionalmente todos se disfarçam de monstros e bruxas, e outras criaturas que metam medo, se esculpem abóboras com rostos medonhos e se colocam velas lá dentro e as crianças, devidamente disfarçadas, tocam de porta em porta a pedir doces e ameaçando uma partida ou travessura a quem não assentir ao seu pedido. Mas a origem do Halloween é antiga e o seu significado profundo, tendo pouco ou nada haver com estes costumes e brincadeiras que hoje vemos.
“A origem do Halloween é antiga e o seu significado profundo, tendo pouco ou nada haver com estes costumes e brincadeiras que hoje vemos.”
se com o passar dos tempos. Apesar de o termo “All Hallows” já vir do Inglês antigo, a primeira referência escrita a All Hallows' Eve surge apenas em 1556. É também o nome moderno, em Inglês, para o grande festival que assinalava o final da luz e da metade quente do ano, e marcava o início do frio e escuridão. Conhecido na Irlanda como Samhain, o fim do verão; em galês como Nos Galan Gaeaf, "véspera de inverno"; em anglo-saxão como Blodmonath, "mês do sangue"; e para os povos nórdicos como "as noites de inverno". Era celebrado na data correspondente ao primeiro de novembro do nosso calendário. Ninguém sabe quais os ritos celebrados nessa ocasião, os antigos não deixaram registos escritos. Além do mais é provável que estes, à semelhança de tantos outros, variassem de região em região, consoante os povos que o celebravam. O nome anglo-saxão para a festa parece indiciar uma realidade agrícola, a necessidade de abater o excedente de gado e salgar a sua carne, pois eles não podiam ser alimentados durante o inverno. Esta parece ser uma ideia geralmente aceite, o regresso a casa dos viajantes e dos mercadores, as colheitas e a preparação para o inverno. Mas o festival tinha uma natureza dual.
ORIGEM E ETIMOLOGIA As origens do Halloween perdem-se no tempo. A palavra Halloween, ou Dia das Bruxas, data de cerca de 1745 e é de origem cristã, significando "noite sagrada" ou "santa noite". Tem a sua origem na Escócia e seria a pronunciação local para All Hallows' Eve, a noite anterior ao “All Hallows Day” (Dia de Todos os Santos), tendo esse termo disseminando-
Os Antigos Celtas honravam as forças opostas da natureza que se entrecruzavam (o entrecruzar de linhas era um motivo bastante comum nas suas expressões artísticas). A escuridão e a luz, a noite e o dia, o frio e o calor, a morte e a vida - e não a luz e a escuridão, o dia e a noite, o calor e o frio e a vida e a morte, como seria natural em português. Os Celtas viam o tempo como a progressão natural da escuridão para a luz. O dia come-
* Sobre o autor: Luís Miranda é Editor da Anima Mystica Revista Digital. Tradutor com grande interesse nos temas e na cultura celta, pré-romana e romana.
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çava com o por do Sol, no seu calendário o ano começava com ao por do Sol do dia 31 de Outubro, o início do Inverno. Nesta data era celebrado o Samhain, talvez o mais importante dos festivais agrícolas e, se por um lado era um tempo de reunião e abundância, era também o fim desse mesmo tempo de abundância e o início de um tempo de privação, o fim da luz e o início da noite. No fundo, o fim e início de um círculo que se repete desde o início dos tempos. Seria também a altura em que Cailleach triunfava sobre Bridgit e iniciava o seu reinado de 3 meses sobre a Terra, até ao Oimlec. Apesar de ser uma ideia comum de que este é o festival dos mortos não há provas de que o tenha sido. Dai muitos autores defenderem que o Halloween é exclusivamente uma festa cristã. Os festivais pagãos dedicados aos mortos celebravam-se por toda a Europa mas normalmente teriam lugar com a chegada do tempo quente, entre Março e Maio, constituindo uma espécie de limpeza primaveril que preparava os povos para um novo ciclo.
“Os Celtas viam o tempo como a progressão natural da escuridão para a luz.” Em 601 DC, o Papa Gregório I emitiu um agora famoso édito para que os seus missionários, ao invés de tentar obliterar os costumes e as crenças dos povos nativos, alteralos: se uma pedra era considerada sagrada, que a consagrassem à Igreja católica. E assim, o festival dos mortos, o “All Hallow’s Eve” surge, em 853 AD pela mão da igreja, com a marcação no dia 1 como o Dia de Todos os Santos e o dia 2 como o Dia de Finados. Tal estaria associado ao conceito de purgatório e terá durado entre os séc. IX e XII, altura em que a reforma protestante decidiu acabar com a ideia de purgatório e do culto dos santos tendo este sobrevivido apenas em alguns locais como na Irlanda, de onde partiu, juntamente com tantos emigrantes, para a América. Lá, os costumes de vestir a gozar com as forças da escuridão e dos pobres pedirem porta a porta a pedir comida
“Os costumes de vestir a gozar com as forças da escuridão e dos pobres pedirem porta a porta a pedir comida para os inverno que chegava transformaram-se lentamente nos costumes do Halloween atual.” para os inverno que chegava transformaramse lentamente nos costumes do Halloween atual, em grande parte pela força da máquina económica que viu uma oportunidade para o consumismo e, como é óbvio, para lucro. SAMHAIN Como já referido, pouco ou nada se sabe de concreto relativamente aos ritos praticados nesta altura. A recusa dos Druidas em manter registos escritos das suas tradições e rituais, mesmo após o aparecimento desta, contribuiu para a ausência de informação e para a muita especulação que existe em torno destes. O mais certo é que os povos da altura encarariam esta data com um misto de felicidade e de apreensão. O tempo de abundância, o regresso dos entres queridos, vivos e mortos, as colheitas e o colher o fruto do trabalho de um ano, mas também a preparação para o Inverno, os sacrifícios, a divinação, o claustrofobismo fruto de um tempo mais agreste e a eterna pergunta de quem sobreviveria ao inverno e quem partiria de encontro aos seus antepassados. Mas também gozariam com a morte. Antes de a temer e se deixarem amedrontar pelos espíritos (que se acreditava que saiam à solta nesta data) eles gozavam com ela. Existem vários exemplos disto ainda nos dias de hoje. Pequenas tradições e rituais por toda a Europa reminiscentes destes rituais ancestrais. Oidhche Shamhna, a noite anterior ao Samhain era a parte mais importante do festival. As pessoas reunir-se-iam em torno de uma fogueira e durante a festa atirariam os ossos dos animais para as chamas, dai o seu nome em inglês (bonfire – bone fire). Todos os fogos eram extintos durante este período
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e reacesos a partir da grande fogueira, estreitando os laços entre os membros da tribo.
TRADIÇÕES: JACK-O’-LANTERN:
Eram também comum o abate de animais consagrados aos Deuses. Estes eram mortos e a sua carne partilhada na festa. O remanescente seria salgado e guardado para o Inverno que se aproximava. No entanto não existe nenhuma prova que sustente que era praticado qualquer tipo de sacrifício humano e tudo indica que tal insinuação proveio dos romanos. Note-se que na altura estes também diziam que as liturgias cristãs eram locais de orgia onde se praticava o canibalismo.
“A véspera do ano novo Celta era uma altura sagrada. Os Celtas acreditavam que o Oidhche Shamhna era um tempo em que o véu que separava os mundos era mais fino e que o nosso e o outro mundo se juntavam na ligação entre o ano antigo e novo.”
A véspera do ano novo Celta era uma altura sagrada. Os Celtas acreditavam que o Oidhche Shamhna era um tempo em que o véu que separava os mundos era mais fino e que o nosso e o outro mundo se juntavam na ligação entre o ano antigo e novo. Muitos dos rituais praticados nesta altura eram fruto desta crença. Seria posta a mesa para que os ancestrais pudessem se banquetear, os portões, portas e janelas eram deixados abertos para que pudessem servir de entrada. A divinação era também prática comum, mais nesta altura do que em qualquer outra. O uso de avelãs, ossos e até vísceras de animais para este fim seria bastante comum.
As famosas Jack o’ Lantern (as famosas aboboras esculpidas e transformadas em luzes e lanternas) também são uma tradição do Halloween. Usadas pelos povos das Ilhas Britânicas, eram originalmente feitas a partir de partir de nabos (e não abóboras como actualmente acontece) e seriam utilizadas como lanternas durante todo o ano. Estas esculturas poderiam também representar espíritos e duendes ou algum ente querido. Posteriormente teriam sido também usadas para guiar os viajantes no Halloween e serviriam para afastar os espíritos maus. Esta prática é mais recente e parece ter surgido algures entre os Séc. XVIII e XIX, quando começar a lentamente a surgir em registos escritos desta tradição. DOÇURA OU TRAVESSURA Esta tradição, hoje tão comum em alguns países, parece surgir na sequência da tradição dos “soul cakes” e pouco ou nada terá a ver com os festivais pagãos praticados na altura. Parece que os povos das Ilhas Britânicas gostavam bastante deste tipo de festividade onde havia troca de comida e bebida tendo tal sido praticado em várias datas ao longo do ano. Posteriormente esta tradição seria usada como motivo para a caridade sendo dado comida e bebida aos pedintes que batessem há porta. Existem diversos registos desta prática no séc. XIX. BRUXAS E GATOS PRETOS Desde há muito tempo que a bruxa é a visão cristã de uma sacerdotisa pagã. Esta visão deturpada e assustadora serviu a Igreja Católica como um dissuasor da prática da feiti-
“A divinação era também prática comum, mais nesta altura do que em qualquer outra. O uso de avelãs, ossos e até vísceras de animais para este fim seria bastante comum.”
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çaria e nunca tanto quanto durante a Inquisição, quando milhares (?) de mulheres foram queimadas na fogueira. A sua associação ao Halloween parece normal, sendo esta uma data em que elas se reuniriam na floresta (longe do longo braço da Igreja) e celebrariam os seus ritos “satânicos”. A crença que gatos e mochos, morcegos e ratos e outras criaturas da noite, que seriam seus familiares (“familiars”, não parentes) é também antiga e contribuiu para a associação destas criaturas a esta data. Nada disto remota, no entanto, às práticas ancestrais dos Celtas. HALLOWEEN: FESTIVAL CRISTÃO OU PAGÃO O Halloween não é uma festividade cristã, nem pagã. Acho importante separar as coisas, hoje, o Halloween é um festival consumista, impulsionado por uma indústria interessada em lucrar no que já é a segunda festividade mais lucrativa depois do Natal. A tradição do que corresponderia ao “All Hallow’s Eve” não faz parte do calendário católico e a celebração do Samhain Celta, que terá originado todas as anteriores é uma celebração separada que em nada tem a ver com o Hal-
“A tradição do que corresponderia ao “All Hallow’s Eve” não faz parte do calendário católico e a celebração do Samhain Celta, que terá originado todas as anteriores é uma celebração separada que em nada tem a ver com o Halloween.”
loween, a All Hallow’s Eve ou outra celebração qualquer que coincida ocorrer nesta data.
“O Halloween não é uma festividade cristã, nem pagã.” O Halloween, a All Hallow’s Eve e o Samhain são três entidades separadas, interligadas e independentes que tiveram ao longo dos séculos uma relação simbiótico – parasítica onde se pode afirmar que sem a existência de uma as outras não existiriam nos dias de hoje. E tendo tudo em consideração, não deixa de ser irónico que assim seja. Bibliografía consultada: Skal, David J. Death Makes a Holiday: The Cultural History of Halloween Rogers, Nicholas. Halloween: From Pagan Ritual to Party Night Bannatyne, Lesley Pratt, Halloween: An American Holiday, an American History, Facts on File, Inc., New York, 1990 Eastwood, Luke - Tlachtga and the Ancient Roots of Halloween/Samhain Hutton, Ronald - The Guardian, Tuesday 28 October 2014 Hutton, Ronald. The Stations of the Sun: A History of the Ritual Year in Britain. Oxford University Press, 1996 Kohler-Camp, Evan - Celtic History: Halloween – Some Truth On the Matter
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Para a morte e além* Vivianne Crowley** No lado esquerdo do palácio de Hades há uma nascente; Perto eleva-se um cipreste fantasmagórico. Aqui, almas que descendem para o submundo podem dissolver-se. Não se aproximem desta nascente; Vão à nascente das águas geladas do Lago da Memória. Aí os Guardiões vão interrogar-vos; Perguntando o que procuram no sombrio submundo. Digam: “Eu sou um filho da Terra e do Céu estrelado, mas a minha linhagem é do céu: Vós mesmo o sabeis, e eu estou sedento e padecendo; refresquem-me com as águas do Lago da Memória.”. E ele vos apresentarão ao Rei Hades, e vos darão de beber do Lago da Memória. E assim seguirás o caminho sagrado que muitos outros conhecidos iniciados tomaram. Segundo as tábuas douradas enterradas com os iniciados dos Mistérios de Orfeu, há 2500 anos. Tradução baseada em W.K.C. Guthrie. (1952). Orpheus and Greek Religion. Princeton University Press: Princeton, pág. 172-173.
“Quando partilhámos da substância divina proibida, ganhámos um dom precioso. Nós tornámo-nos como os deuses.” Em muitas tradições antigas, o dom da consciência humana parece ter sido roubada aos Deuses. Prometheus rouba o fogo celeste. Eva, a maçã proibida. Quando partilhámos da substância divina proibida, ganhámos um dom precioso. Nós tornámo-nos como os deuses; Obtivemos a auto-consciência. Mas na maioria das mitologias, aqueles que desafiam os deuses e roubam os tesouros proibidos são amaldiçoados. Acabam por sofrer castigos terríveis. Prometheus foi acorrentado a uma rocha; o seu fígado arrancado e devorado por águias para toda a eternidade. Para os Gregos da antiguidade, o fígado era a fonte de todas as emoções. O dom da consciência acarreta tormentos emocionais. Reconhecendo a nossa mortalidade Porque é que conhecermos a nossa consciência nos traz tanta dor? Como espécie tor-
* * Traduzido por Dina Amaral. Revisto por Luís Miranda
** Sobre a autora: Vivianne Crowley, é professora universitária, psicóloga e sacerdotisa da Wicca. Ela é exprofessora de Psicologia de Religião em King’s College e em Heythrop College, Universidade de Londres, onde se especializou em Estudos Junguianos e Psicologia Budista. Foi membro fundadora do primeiro programa de mestrado em Psicologia da Religião na Europa É autora de vários livros sobre Wicca, espiritualidade pagã contemporânea e psicologia junguiana. Ensinou Wicca internacionalmente durante mais de 30 anos. No Reino Unido, foi coordenadora inter-religiosa da Federação Pagã e foi a primeira coordenadora do Pagan Capelania Services. Em 1989, lançou o seu primeiro livro sobre a Wicca, um dos livros mais valorizados e difundidos sobre Wicca enquanto tradição espiritual. Atualmente é professora do Departamento de Aconselhamento Pastoral, Cherry Hill Seminary, Columbia, SC, onde leciona cursos de mestrado em Psicologia da Religião, Morte e Morrer, e do Ministério para as pessoas mais velhas. Vive na Europa, dividindo seu tempo entre sua fazenda na Britânia rural, coração megalítico no noroeste da França, e Londres.
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námo-nos deuses na nossa habilidade de criar o mundo no qual vivemos e ao ter consciência da nossa própria existência. Nós tornámo-nos como os deuses; mas não nos tornamos deuses. Ao contrário deles, temos corpos físicos frágeis. Temos a consciência do divino, mas a fragilidade de uma flor que desabrocha, por pouco tempo, até ser levada pelo vento. Podemos reincarnar outra vez, mas o “Eu” que existe agora, formado na herança genética e nas experiências de uma vida, é transitório. A nossa consciência e o nosso sentido próprio estão dependentes, fisicamente, do cérebro e um dia esse cérebro não vai mais funcionar. Este conhecimento pode causar-nos angústia e desespero – é difícil libertarmo-nos de nós próprios e do que sempre conhecemos – ou podemos tomar consciência e aceitar o nosso destino, valorizando esta incarnação ainda mais, pois ela é muito curta. O tempo passa, a juventude desaparece, a doença e a idade vêm. Este é o destino de todos nós, um final humano partilhado. Até o mais rico de nós, como o Steve Jobs, não pode, inevitavelmente, fugir à morte.
“Temos a consciência do divino, mas a fragilidade de uma flor que desabrocha, por pouco tempo, até ser levada pelo vento.”
Espiritualidade e morte Como pode a nossa espiritualidade Pagã ajudar-nos a lidar com a mortalidade? Todas as tradições espirituais tentam reconciliar-nos com o inevitável fim da nossa vida, e da vida dos que amamos. Crenças sobre a vida após a morte são importantes e uma fonte de conforto e inspiração para viver bem as nossas vidas. Os mistérios iniciáticos do paganismo mais tardio, como os mistérios de Orfeu, ensinam que podemos reincarnar noutros tempos e noutros lugares, ou podemos viver no “Outro Mundo”. A Reincarnação é uma crença compartilhada por muitos pagãos de hoje; mas não precisamos de acreditar numa vida após a morte personalizada, para que as
nossas vidas tenham significado. Se conseguirmos descentrar-nos do nosso ego e da necessidade de uma vida após a morte, pessoal e personalizada, cada vez menos nos preocupamos com a morte. Todos os laços que nos ligam a esta incarnação desvanecerão com o tempo; mas libertados deste corpo, os nossos sonhos, esperanças, memórias e visões terão alimentado a psique coletiva humana e contribuído para a sua evolução. A força da vida, da qual fazemos parte, continuará, criando novas e diversas formas de vida. Como seres humanos, vivemos uma posição privilegiada de estar consciente da grande experiência cósmica da qual somos parte. Nós estamos e somos o processo. Podemo-nos alegrar de que o grande processo existe, mesmo que a nossa parte nele seja muito pequena. Pensando no Samhain Ao entrar no Samhain, os nossos festivais para os que já partiram, podem ajudar-nos. Somos lembrados que devemos dar tempo para honrar aqueles que já entraram no grande mistério da morte. Lembramo-nos deles e valorizamos as nossas vivências juntas. Podemos visitar sepulturas e jazigos daqueles que amámos e respeitámos. Mas principalmente podemos, durante este festival da morte, honrar a vida de quem amamos e prezamos; pois sabemos que, em algum tempo, seremos separados, mesmo que reunidos outra vez num futuro. Festivais aos mortos lembram-nos da nossa própria mortalidade. Podemos honrar a vida, preparando-nos para a morte. Se morreremos amanhã, a nossa família saberia como é a nossa espiritualidade? Os nossos desejos fúnebres estão claros, para eles? Podemos não estar preocupados com o aspeto mais prático do funeral, ou com o que vai acontecer com o nosso corpo; mas é melhor para aqueles que vão lidar com esses aspetos, se planearmos um funeral que confortará a nossa família e amigos, tanto pagãos, como não. Será importante para eles saberem que estão a satisfazer os nossos desejos. Assim, vamos honrar a morte, fazendo o melhor da nossa vida. Devemos aproveitar a vida, neste corpo, ainda mais se nos lembrarmos que o nosso tempo é finito. O facto de
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que “Eu” não acordarei, um dia, para ver o sol nascer, ouvir os pássaros cantar, sentir a brisa quente ou cheirar as flores a desabrochar, significa que é ainda mais importante aproveitar o presente, em cada momento e apreciar o que nos rodeia. Cada momento tem um valor supremo. Estejamos felizes ou tristes, com saúde ou com dores, cada momento da nossa existência é único e nunca será repetido.
“Cada momento tem um valor supremo. Estejamos felizes ou tristes, com saúde ou com dores, cada momento da nossa existência é único e nunca será repetido.”
A vida é curta: vive-a agora! O Samhain é visto como um “portão entre mundos”. É um tempo de transição. Será que poderá passar a ser, para nós, uma fase das nossas vidas, em que vivemos cada momento plenamente? Será que pode ser um tempo para fazermos aquilo que sempre planeamos, mas que nunca encontramos tempo para fazer: visitar aquele lugar especial, visitar um familiar, ter um filho, estudar, escrever o livro com que sempre sonhámos, viver a nossa vida de acordo com os nossos valores? Seja o que for, é melhor não esperarmos. Não sabemos se veremos outro Samhain. A vida é curta: vamos vivê-la agora.
Encontro de Pagãos Este encontro é para todos os interessados na Espiritualidade Pagã, Wicca, Druidismo, Bruxaria, Magia Celta e todos os "caminhos" que celebram o Paganismo. Todos são bem vindos e convidados a participar com opiniões e experiências e para um copo com pessoas que partiMais informações em: portopagans@gmail.com lham interesses semelhantes. ou através da página de Porto Pagans no Facebook o Google +
Neste momento encontramo-nos na 3ª Sexta-Feira de cada mês, por volta das 21.30
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Onde encontramos a morte, o nascimento e a iniciação * Valentina Ramos **
É inevitável que, no nosso acompanhamento dos ciclos e na nossa sintonia com eles, nos encontremos cara a cara com momentos de reflexão e de dúvida. Reflexão porque olhamos para o que temos feito, o que temos conseguido, o que temos deixado, o que temos ganho. Dúvida, porque quando ousamos olhar para a frente, para o futuro, descobrimos que realmente não conhecemos nada, não sabemos o que nos espera, inclusivamente não sabemos o que sucederá quando já não estivermos neste espaço, neste tempo. Quando tivermos morrido.
não podemos escapar, ou como seguindo o canto das sereias. A morte é uma espécie de beleza e de terror que seguimos e da qual fugimos. Contudo, seguindo o ciclo que respeitamos e no qual acreditamos, a morte é o caminho do renascimento, o caminho da iniciação. Necessitamos de morrer para voltar de novo. Despojarmo-nos das nossas roupas deste mundo para poder entrar no outro como espíritos renovados, desejosos de novos desafios e aprendizagens para o crescimento e a comunhão.
O lugar da morte Os mistérios da morte, o renascimento e a iniciação são elementos comuns em todas as tradições e religiões do homem. Voltamo-nos para o este para admirar o esplendor do Sol que dá a vida, e pedimos ao Pai supremo pelo perdão dos nossos pecados, ou aos Deuses e Deusas pelo reconhecimento da nossa própria divindade. No entanto, voltamo-nos para o oeste procurando a saída, e explorando o desconhecido.
“A morte é o grande mistério que nos impulsiona a querer saber o que acontece e para ele vamos, como atraídos por um íman do qual não podemos escapar, ou como seguindo o canto das sereias.”
O oeste é o ponto da morte na maioria das religiões e tradições. É o lugar onde vamos descansar, seguindo a lógica do percurso solar, e onde as nossas meditações nos levam a procurar aquilo que todavia não sabemos. A morte é o grande mistério que nos impulsiona a querer saber o que acontece e para ele vamos, como atraídos por um íman do qual
O oeste também é reconhecido com a água, numa mistura sinuosa de simbolismo que não raramente nos ajuda a compreender a um ou a outro. A água explicando el oeste. O oeste explicando a água, esse veículo universal da matéria e da não matéria.
* Traduzido por Céu Almeida. Revisto por Luís Miranda
** Sobre a autora: Valentina Ramos é Licenciada em Psicologia, Mestre em Comunicação e Doutora em Psicologia. É iniciada em varias escolas esotéricas e é membro da Fellowship of Isis. A autora pode ser contactada através de seu email: valia.ramos@gmail.com
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A água como símbolo da vida e do renascimento Somos feitos de água, nos formamos na água, vivemos nossos primeiros meses no líquido materno, nascemos da água. A água é a fonte da vida. Nos nutre. Nos alimenta. Não é de estranhar que o misticismo se encontre repleto de símbolos que ligam a água e a vida: a água da vida, a fonte do renascimento. Assim, tudo o que contenha água absorve as suas propriedades. Os caldeirões, os poços, convertem-se nas representações da matriz primordial, do ventre materno, e o nosso reflexo neles nos devolve mesmo a nossa essência. Através deles a revelação ocorre. É certo: não há maior mistério do que o mistério de como surge a vida. Basta espreitarmos na água do caldeirão para que toda a imagem se comece a transmutar e novas formas surjam, que a nossa mente se deixe ir pelas mudanças de luzes e sombras (muitas vezes mais sombras do que luzes) que nos olham desde o fundo sem fundo. Olhar para o caldeirão, olhar para o poço, é olhar no nosso subconsciente mais profundo e enchermonos de terror, porque tememos o que realmente somos e não estamos preparados para conhecer.
“Basta espreitarmos na água do caldeirão para que toda a imagem se comece a transmutar e novas formas surjam, que a nossa mente se deixe ir pelas mudanças de luzes e sombras (muitas vezes mais sombras do que luzes) que nos olham desde o fundo sem fundo.” Contudo, a água no caldeirão também é símbolo de abundancia. De onde vem a vida vem também a fertilidade. O medo que nos assusta é também a fonte de cura da nossa
alma e do nosso corpo. Do caldeirão saem os remédios. No caldeirão cozinham-se os alimentos que permitem mantermo-nos saudáveis e fortes. É a magia metamorfoseando a realidade. De novo não somos realmente o que cremos que somos, mas no que conseguimos transformarmo-nos no nosso crescimento e conhecimento.
A água como símbolo da morte e da iniciação A água também é símbolo da morte. Da mãe viemos e para ela regressaremos algum dia, senão sempre. Eternamente regressamos a ela em ciclos de vida e de morte, pois a iniciação nos fala das muitas mortes que devemos passar nesta vida. De alguma forma todas as culturas aceitam a ideia do nascimento e da morte como parte de um mesmo processo. A diferencia reside no que vem depois da morte, e no conceito de imortalidade que se tem. Mas sempre estamos voltando ao ponto de declínio, ao oeste, á água. Nosso corpo, convertido em cinzas depois de o termos abandonado, é muitas vezes devolvido ao mar, que nos recebe como parte do processo natural de regresso. Nascemos na água e quando morremos voltamos a ela. Através da água, o barqueiro nos leva para o infra mundo. No entanto, a água, com o seu poder regenerador, é ao mesmo tempo a fonte do sagrado. Recebemos bênçãos através da unção com água. E são essas bênçãos as que nos direcionam para o nosso novo corpo nos processos de iniciação. Somos imersos na água para abandonar e abandonarmo-nos, para limpar e purificarmo-nos, e assim se completa a iniciação nos mistérios. *** O oeste, a água, o lugar da morte e dos mistérios, são o espaço sagrado para a meditação e para a revelação. Quando não conhecemos e quando não nos conhecemos. Quando tememos e quando somos valentes porque estamos a dar um passo para o caminho iniciático. Nos deixamos levar pela cor-
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“Sabemos que a água nos leva para o oeste, e nos trás de volta. Sabemos que aquele que regressa não é o mesmo que aquele que partiu rente majestosa que flui e fluímos com ela. Fechados os olhos, levitamos como flutuando no meio de um mar, com medo de reconhecer que debaixo de nós vive o desconhecido, confiando em que estamos suficientemente protegidos e seguros como para que o desconhecido não nos destrua de uma dentada. Sabemos que se estivermos detidos não chegamos a nenhum lado. Sabemos que a água nos leva para o oeste, e nos trás de volta. Sabemos que aquele que regressa não é o mesmo que aquele que partiu.
Bibliografia consultada Arin Murphy-Hiscock (2009). The Way of the Hedge Witch: Rituals and Spells for Hearth and Home. Provenance Press: MA Christopher Partridge (2004). The ReEnchantment of the West: Volume 1 Alternative Spiritualities. T&T Clark International: New York Douglas Davies (2002). Death, Ritual, and Belief: The Rhetoric of Funerary Rites. Continuum: London Livia Kohn (1992). Early Chinese Mysticism: Philosophy and Soteriology in the Taoist Tradition. Princeton University Press: West Sussex Mary Jane Markell (2002) Sand, Water, Silence-the Embodiment of Spirit: Explorations in Matter. Athenaeum Press: Great Britain
FELLOWSHIP OF ISIS PORTUGAL
Mais informações: aqui E-mail: fellowshipofisis.portugal@gmail.com
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Viagem pela noite de Saturno e pelo palácio de Hel Valquíria Valhalladur * À meia noite de 31 de outubro abrem-se os portais de Helheim, o reino de Hel, deusa da Morte, da decadência e velhice, dissipandose os muros nebulosos que separam o mundo dos vivos do mundo dos mortos, deixando entrar as memórias residuais dos antepassados, e abre-se uma grande oportunidade evolutiva do Eu. A meia noite assinala ainda a abertura do portal da noite iniciática nos mistérios da morte, da entrada das forças do caos incarnadas pelos fenómenos atmosféricos que caracterizam o clima do inverno, e dá-nos passagem para a dimensão oculta dos segredos da profecia sob a custódia das mulheres. Nos próximos meses reinará a desordem, a turbulência, a destruição. O manto da morte cai abruptamente e instaura o caos necessário para que haja um renascimento integral, físico e espiritual. O turbilhão mental conduz-nos a uma viragem psicológica, à fragmentação do Ego, e à vertigem de caminhar na corda do trapézio que delimita a ténue fronteira da loucura e da alienação como vias do êxtase místico e da manifestação do Eu Verdadeiro. O processo de purificação da natureza durante a tortura invernal é um lembrete constante da necessidade de desprendimento da materialidade para nos entregarmos conscientemente ao processo de regeneração consciencial. A simbólica alquímica da periocidade da fratura espaço-temporal com a abertura das portas do reino das sombras perdeu-se, e com essa vivência foi-se tam-
bém o ciclo de renovação interna do ser humano. Os próximos meses serão governados pelas trevas, pelo turbilhão das hostes espectrais da Caçada Selvagem, da esterilidade e da morte. Os organismos vivos recolhem-se, apelando a que façamos o mesmo e nos deixemos arrastar pela força cósmica centrípeta, que nos obriga a ir ao centro de nós próprios e procurar a ponta da espiral que voltará a rodopiar no sentido ascendente, na restauração da ordem. A passagem da fúria incontrolável de espíritos e da Ceifeira pelo mundo terreno lança, porém, rastos de promessas revivescentes, cujo triunfo absoluto será celebrado a 1 de maio, quando o sol atingir a metade do dia, na glória ascensional deste sobre os agentes da destruição – e assim acontece o nascimento do novo Ser. Nesse dia, por entre os novos portais brilharão os raios solares, do rei do verão, do doa-
“O processo de purificação da natureza durante a tortura invernal é um lembrete constante da necessidade de desprendimento da materialidade para nos entregarmos conscientemente ao processo de regeneração consciencial.”
* Sobre a autora: Valquíria Valhalladur é pseudónimo de Maria Cristina Ferreira Aguiar, nascida do Porto, e com o qual assina o seu primeiro livro “As Moradas Secretas de Odin”, publicado pela Madras Editora, em 2007, e desta forma deu conhecer os seus estudos em Mitologia Nórdica. A partir deste intróito, desenvolveu os conhecimentos em Posturas Rúnicas (Stadhagaldr) em workshops, e acrescentou mais uma criação, desta feita, “As Máscaras da Grande Deusa”, com a chancela da Zéfiro Editora, em 2011, mas já assinado com o nome de jornalista Cristina Aguiar. A autora pode ser contactada através de seu email: aguiar_cristina@hotmail.com
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dor da vida, símbolo luminoso do espírito, a contraparte masculina da alma, que decreta o final do reinado do Mestre Negro. Renascer às mãos do Mestre Negro É tempo agora de enfrentar o regresso do Mestre Negro, Saturno, o regente da escuridão, da morte transfiguradora, o portador da luz, o Pai do Homem Solar e patrono da Era Dourada. Saturno, planeta que empresta a designação ao sétimo dia da semana, saturday, nas línguas anglo-saxónicas, o romano Saturni dies, prenuncia a sua própria ressurreição, ao domingo, sunday (dia do Sol e primeiro da semana), a faceta brilhante daquele como Rei-Criador, o Sol Primevo ou Sol Superior. Saturno tinha como atributos, na sua representação iconográfica uma pequena foice - que lhe servia para cortar o cereal nas searas, para podar as árvores e as vinhas, como servia também para castrar ou mutilar instrumento que simbolicamente representa o aniquilamento da persona, na fase de transformação alquímica da plenitude espiritual. Os dias consagrados a este deus chamavam -se Saturnálias e encerravam dezembro, mês que lhe era dedicado, pois era nesta altura que o Sol começava a ascender nos céus e a garantir o regresso da germinação das plantas. Saturno, pai dos Deuses, era interpretado como um deus da geração, da dissolução, abundância, riqueza, agricultura, renovação periódica e libertação. Nas Saturnálias os celebrantes restauravam simbolicamente o Princípio dos Tempos, a origem da civilização, a Idade de Ouro, da eterna juventude, de paz e prosperidade.
“Saturno é o Sol noturno, a faceta velada do Sol diurno e espiritual durante a sua travessia pelo submundo Saturno é o Sol noturno, a faceta velada do Sol diurno e espiritual durante a sua travessia pelo submundo. O significado astrológico de Saturno como agente limitador, castrador, obscurecesse por completo o significado esotérico deste como motor transmutador dos
condicionalismos que aplica à casa astrológica em que se encontra. Saturno aniquila o sentido mais físico, material e superficial para nos oferecer a oportunidade de fazermos "renascer", por via da dor, do despojamento e da aniquilação, o significado oculto nesse domicilio zodiacal, então libertos dos constrangimentos, pela "morte" do Ego, plenamente conscientes e em comunhão com o Eu Superior. Essa é uma experiência de caráter meramente iniciático, em que mergulhamos numa espécie de hora zero, de fim de um ciclo para que haja o início de um ciclo novo. Saturno é, pois, o que expõe a verdade e revela o que se oculta em camadas sedimentares, de modo a que o processo de autodescoberta seja realmente penoso e implique uma sucessão de mortes até se alcançar o foco central da tocha da Iluminação.
Saturno
A simbólica do condutor do carro cósmico puxado por serpentes-dragões, mostra o deus Saturno como mediador da relação entre o Divino e o Humano, o mestre da transformação da consciência, o mistagogo que nos guia à Unidade – caminho que ele próprio nos indica quando ao sétimo dia se torna Uno com o Sol Diurno. O trânsito de Saturno pelo signo da Serpente e da Fénix, Escorpião, em reciprocidade com o de Plutão, Senhor dos Infernos por Capricórnio, impõe ao mundo atual uma Era de Morte, de destruição dos vícios, de escamação, do enforcamento do Homem-material, de superação dos instintos e da natureza vil que o corrompe e o leva ao envelhecimento. A lentidão de Saturno auxilia-nos nesta caminhada evolutiva, de despreendimento gradual, sofrido e caótico, como os temporais invernosos, até à exigência do óbito do Eu Inferior no naufrágio
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das águas instintivas das quais ressuscitaremos para a Imortalidade, do mesmo modo que o Sol renasce das cinzas após o sétimo dia. O Dia e a Noite em Hel No apogeu do inverno, Capricórnio inicia um dos polos críticos da carreira da alma, tendo o seu oposto em Caranguejo, o Portal da Vida, o útero que dá à Luz os espíritos renascentes, e embala o crescimento das plantas, devolvendo à natureza a sua capacidade reprodutiva. Revemos esta dicotomia na natureza dual de Hel, deusa escandinava do Submundo e da Morte. Representada com uma faceta escura, como personificação do fim aniquilante e da decrepitude; e outra brilhante, a simbolizar a renovação e perpetuação dos ciclos de vida, Hel contém em si os Mistérios da Vida e da Morte, sobre os quais assentam os alicerces dos ciclos biológicos dos organismos vivos. Parece estranho haver neste fim uma promessa de continuidade. A faceta luminosa de Hel é a garantia de que a vida prossegue de forma contínua e cíclica, longe de quem nos "semeou" e agora pertence à dimensão mítica dos Antepassados: tudo isto em prol de um círculo ininterrupto de nascimento-morterenascimento. Hel é a reminiscência do culto dos mortos no Neolítico, em que a força de gestação se centrava na terra, a epifania da Mãe Ancestral, em cujo útero simbolizado nas grutas ou estruturas megalíticas, o homem primitivo se conectava à força telúrica de transformação. Nas galerias escuras e húmidas das incubadoras de arcaicas divindades infernais vislumbra-se uma nova luz, a epoptia. A via iniciática proporciona ao homem um novo renascimento, depois de passar pela prova da Morte e desta ressurgia fortalecido e dotado de inteligência superior. Os ocultistas modernos da Tradição Nórdica desenvolveram dramas mágico-rituais em nove cavernas subterrâneas (1), simbolizando os nove
níveis cósmicos da Árvore Yggrdrassil, onde Odin se autossacrificou em busca da Gnose, inspirados no ministério dos Doze Diar, ou Drotner fundado, segundo nos conta Snorri Sturlosson na Ynglinga Saga, pelo Odin histórico e civilizacional. Os sacerdotes dos Mistérios Odínicos oficiavam o culto e aplicavam a justiça, e como profetas, revelavam o futuro. Os ritos secretos celebravam a morte do belo e amado Balder, simbolizavam a dor dos deuses e dos homens pela perda da emanação espiritual e criadora do Sol. O objetivo final do percurso iniciático era o resgate de Balder dos domínios da Morte, da deusa Hel, e devolver-lhe a vida. O candidato desempenhava o papel do "morto" Balder, em estado cataléptico projecional induzido por ação de técnicas ocultas dos sacerdotes, deambulava de forma sequencial por nove cavernas que simbolizam as esferas da Natureza. Os sacerdotes da Iniciação personificavam o sol, a lua e as estrelas. Depois de perambular durante horas por passagens labirínticas, o candidato era levado à presença da estátua de Balder, o Belo, paradigma de todos os Iniciados e símbolo de Purificação, colocado no centro de uma sala, que simbolizada a casa dos Aesir, ou a Sabedoria, e obedecia a um juramento de sigilo num abraço simbólico a uma espada. E na culminação no rituDeus Balder al bebia de um crânio humano, o hidromel santificado, recebendo o anel da Ordem, após o que podia, então, declarar-se discípulo de Ódin, na condição de Ser renascido, puro, sábio e devidamente autorizado a revelar os Mistérios. A prova de Morte nos ritos odínicos revelavam o ser iluminado e conhecedor da Imortalidade e a maturação do intelecto no culminar triunfal da submissão ou aniquilamento das paixões. Balder fora vítima da manipulação do génio do fogo destrutivo personificado por Loki, que impelido pela ira ante tamanha grandeza do filho de Ódin, manipulou o cego Hodr, irmão de Balder. A cegueira e as emoções instintivas são inimigas ferozes ao crescimento espiritual do indivíduo. A personalidade guerreira de Hodr, uma versão escandinava do romano Marte, tornava-o suscetível
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aos enganos e aos confrontos. O barco-pira de Balder vogou pelas águas do mar, até à meta final: o reino de Hel, ou se quisermos o poente figurativo do sol na linha do horizonte. A água separa o mundo dos vivos do mundo dos mortos e é neste berço que as cinzas do corpo de Balder se diluem, revelando um ser purgado pelo ordálio do fogo.
ções ou vozes, e tem ainda fortes probabilidades de reencarnar. Na mitologia nórdica, Frey oferece-nos a oportunidade de nascer ou renascer, e de perpetuar a família, é também uma divindade dual: garante a fertilidade pela sua natureza solar, e acolhe os mortos. O culto dos mortos, ligado ao culto dos Vanes, traz prosperidade e relembra a importância dos Antepassados.
“No Outro Lado, a alma alvorece para a eterna e paradísica existência no Valhalla ou em Folkvang, mas para lá chegar teria de levar uma existência terrena dinâmica, plena, sem medo da morte e em desafios constantes ao Destino.”
O dia 1 de novembro é a porta que faz regressar da eternidade familiares ainda vivos na memória e oferece o momento de matar saudades e de resgatar recordações dos arcanos guardiões, ainda hoje celebrados com gestos singelos de oferta de colheitas às alminhas espalhas pelas estradas secundárias deste país. Reminiscências do culto dos mortos que, felizmente, foram preservados na tradição popular das regiões serranas portuguesas. "Passar o limiar" ou a porta significa agregar-se a um novo mundo. É o que acontece neste ponto do calendáro. Durante metade do ano, os vivos e os espíritos coexistem. A noite ilumina-se na ténue chama das velas e alegra-se em banquetes pantagruélicos sobre as pedras tumulares. Do México aos países do Norte, os cemitérios transformam-se em agitadas áreas de comunicação e comunhão com os defuntos, com a finalidades de renovar entre todos os membros sobreviventes, e também com o finado, a cadeia que se rompera com o adeus definitivo de um dos seus. Os vivos voltam a partilhar a mesa com os ancestrais, mantendo os laços inquebrantáveis de uma linhagem em perpétua renovação. O submundo adquire, então, matizes coloridas e aquece com a celebração de Todos os Mortos, que a Igreja mascarou como dia de Todos os Santos. Comer e beber com os mortos facilita, e mantém, a associação da comunidade dos mortos com a dos vivos, permitindo viajar entre as duas dimensões sem qualquer perigo. E são, de facto, santos os espíritos dos Antepassados, pois "vivem" sob a terra para preservarem o seu húmus - a substância que dá vida à semente.
A água solvente do submundo A alma tem essência feminina que no gótico sáiwala deriva de sáiws, "mar", força líquida ondulante e volátil, como as diversas forma da alma. A runa Laguz, "oceano" ou "lago" simboliza a travessia da alma para o Outro Mundo, sendo a porta da metamorfose, o líquido que desfaz as formas e abre os portais do mundo informe das brumas de Niflheim, reino do frio e da escuridão, ao mesmo tempo incorpora as águas frutuosas, nas quais habitam os novos germes vitais. Já no Outro Lado, a alma alvorece para a eterna e paradísica existência no Valhalla ou em Folkvang, mas para lá chegar teria de levar uma existência terrena dinâmica, plena, sem medo da morte e em desafios constantes ao Destino. Recear o fim físico seria o mesmo que temer a vida na mentalidade dos povos germânicos. A cobardia era uma fraqueza superada, porque a certeza na imortalidade gloriosa movia o espírito intrépido deste povo, sempre a desafiar os limites do fio da navalha. Perpetuar a memória do nome era a missão fulcral na vida para que na morte a alma fosse preservada como fonte inspiradora e protetora da comunidade. O corpo físico morre, mas o seu duplo continua a viver na dimensão das sombras e manifestar-se em sonhos, apari-
Nota da autora (1) Estas câmaras iniciáticas representam as noves esferas em que os sacerdotes dividiram o universo: 1) Asgard, Mundo dos deuses; (2) Al-
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fheim, Mundo da Luz, dos Elfos ou Espíritos; (3) Niflheim, Mundo do frio e da escuridão, localizado a Norte; (4) Jotunheim, o Mundo dos Gigantes, a localizado a Este; (5) Midgard, o mundo dos humanos da Terra, localizado no centro; (6) Vanaheim, o Mundo dos Vanir, a oeste; (7) Muspellsheim, Mundo do Fogo, a sul; 8) Svartalfheim, o Mundo da Escuridão e dos Elfos negros, que fica sob a terra (Midgard); 9) Helheim, o Mundo do Frio e morada dos mortos, que está localizado no ponto mais inferior do universo. Todos esses mundos são invisíveis aos sentidos, exceto Midgard. Notam-se muitas semelhanças com nove mundos cósmicas Escandinavos e os nove planos e esferas dos Mistérios Eleusinos pelos quais o candidato tinha de percorrer durante o rito de regeneração e do regresso de Perséfone do reino de Hades
Bibliografia Aguiar, Cristina, As Máscaras da Grande Deusa. Zéfiro Editora Gennep , Arnold van, Los ritos de paso. Alianza Editoral. Grimm, Jacob, Teutonic Mythology Vol.II. Dover Publications Hall, Manley Palmer, The secret Teachings of All Ages. Dover Publications Heindal, Max Heindel e Agusta Foss, A Mensagem das Estrelas. Editora Pensamento Valhalladur, Valquíria, As Moradas Secretas de Odin. Madras Editora
Pode anunciar o seu evento, workshops, palestras, publicações e cursos; de forma gratuita, enviando um email dirigido a: am.revistadigital@gmail.com
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Traduzido ao português por Luís Miranda
A)
Saudações a ti, Osíris, Senhor da Eternidade, Rei das Duas Terras, chefe das terras beira-rio; Governante perfeito, (bem amado), Grande de ternura no corpo de Nut, amado de (seu pai, quando este apareceu); Jovem real que usava a Coroa Branca, Que saiu do ventre com a uraei na cabeça. Que criou a luz no corpo da sua mãe, Quando iluminou seus irmãos no útero;
O eternamente jovem que ressuscitou a Eternidade, Quando cercou as terras com os seus braços; Aquele que criou a Verdade e aboliu a Falsidade, Quando assumiu o trono de Atum. B) O augusto (Deus) que inaugurou as oferendas, (De bonita) face (com barba longa), (O dourado), (cabeça) colorida com lapis-lazuli: O que ama (é) que (todos) o possam contemplar (a ele). O mais velho, o (filho) primogénito de Geb (era ele) Quando tomou posse das terras em triunfo;
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Hino/Invocação a Osiris Fonte: Hinos a Isis no seu templo em Philae. Louis V. Zabkar (pag 34)
Rei do Céu, governante das terras, grande soberano no Submundo. Senhor da vida que repeliu o seu inimigo, Quando o seu Bas tomou posse de todos os homens. Reluzente criança, está inundado de água, Nasceu no primeiro dia do ano. Vem, verdadeiramente grande, alegre e em regozijo, Seja gentil com o Rei do Alto e Baixo Egipto, Ptolomeu; Ele é Horus, Repele todo o mal dele.
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Celebrando a vida* Eduardo Puente ** O véu é mais ténue, sim, todos nós temos escutado isto e temos escutado também que no Samhain é mais fácil compartilhar com os seres amados que passaram o véu, no entanto, para mim o Samhain é também um apelo a celebrar a vida. Muitas vezes imagino que os mortos vêm pelo fino véu contemplando a alegria da vida, o regozijo daqueles que amaram e amam e que é precisamente esta canção de alegria e bondade, que alimenta aqueles que se aproximam do outro lado.
“Este é um dia onde medito sobre aquelas pessoas que inspiraram aquilo que sou hoje.” Este é um dia onde medito sobre aquelas pessoas que inspiraram aquilo que sou hoje, Chamando os seus rostros á minha mente, as suas palavras, inclusivamente os seus sorrisos. Pego no rosário da minha avó (sim, o rosário) e mantenho-o nas minhas mãos enquanto acendo as suas velas e contemplo a sua fotografia. Este apelo aos meus ancestrais através do vínculo físico e emocional é muito forte, nutritivo, transporta-me á casa dos meus avós onde às escondidas contemplava o seu altar meio sincrético. Pausa: Agora recordo-me de um livro que é provavelmente um dos mais simples e ao mesmo tempo dos mais efetivos que li sobre o tema da comunicação com os espíritos: “Talk to me”, de Jimahl di Fiosa, BB, irmão, este livro foi uma das leituras mais rápidas e intuitivas que fiz nos últimos anos. Fim da
Pausa. Celebro a estes ancestrais, brindo com eles com aquelas bebidas que eles gostavam ou no meu caso, usualmente bebendo e oferecendo aos meus deuses e mortos aquelas bebidas e oferendas que eles mesmos ofereciam aos seus deuses. ¿Acaso não devemos ser nós continuadores do seu legado?, penso quando faço isto que de alguma forma estou a dar continuidade à devoção que eles rendiam, por isso neste dia, com as suas imagens na minha mente e com as suas palavras no meu peito, sou capaz de dizer uma oração cristã, pegar num rosário e se o momento o proporcionar , chamar a Jesus Cristo para que cuide deles e os ilumine nas suas longas viagens. Á frente da sua fotografia elevo o copo de vinho que tanto queriam e se possível aqueles doces que creio que mais do que ser do seu prazer , são do meu próprio prazer e ainda o é neste momento, recordando como cor-
“Celebro a estes ancestrais, brindo com eles com aquelas bebidas que eles gostavam ou no meu caso, usualmente bebendo e oferecendo aos meus deuses e mortos aquelas bebidas e oferendas que eles mesmos ofereciam aos seus deuses. ¿Acaso não devemos ser nós continuadores do seu legado?.”
* Tradução por: Céu Almeida, Revisto por Luís Miranda ** Sobre o autor: Eduardo Puente é Sumo Sacerdote da Tradição Alexandrina e também é iniciado na Ordem Aurum Solis e na Ordem Rosacruz. O autor pode ser contactado através do seu email: edutp00@gmail.com
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ria de pernas soltas para onde estava a minha avó pedindo de todas as formas possíveis um pouco de doce de coco. Agora, recordando isto, sinto que ainda com mais força se estabelece o chamado na minha memoria, sou capaz de sentir o aroma do coco e da canela e inclusivamente sentir a pele da minha avó quando agarrado aos seus pés não me movia até que estivesse servido. Isto, para mim, é também uma forma de celebrar o que dela há em mim. Deixo o rosario, deixo os canticos de som ancestral que apesar de ser estranho hoje, no passado foi uma inspiração. Preparo-me para o grande ritual, onde desde agora mesmo já vou sentindo a presença de todos aqueles que a minha mente e os meus cânticos chamaram. Eles vêm contemplar o mistério da vida e nós a contemplar o da morte. Uma dualidade onde mais uma vez, entramos em contacto com a natureza, apenas não sozinhos (de facto nunca sós), nós a vermos uma pata de elefante e outros, muitos outros, contemplando aquelas outras patas, cauda, orelhas e partes que definiram a sua própria realidade, o seu próprio Mistério. Santifico o meu espaço e chamo desde os quatro cantos do universo e do ser. Logo danço como um menino á frente dos olhares dos meus ancestrais, eles riem-se, eles sentem que os amo, que os recordo, que os exalto. É aqui quando intercambiamos os mistérios do rito, onde as palavras se tornam vazias e ainda assim existe voz. Por último, faço aquela viagem a onde eles estão, chamando-os para que compartilhem comigo o momento da união, da geração, da vida. Num mesmo espaço, os dois mundos, as duas realidades, os dois momentos de medo, dançando, girando como um turbilhão do tempo que na sua ilusão nos mostra separados. Eu escuto as suas vozes, contemplo as suas impressões na minha mente e eu mostro-lhes a beleza da vida, uma vida que não é mais do que a sua própria continuidade ou ¿será um chamado á continuidade?. Abro cada canto do meu ser ao meu rito, como se neste ato, mostrasse aos meus ancestrais, com orgulho, tudo aquilo que consegui junto a eles e lembro que eu também irei fa-
zer essa viagem. Talvez estejam aqui também para mostrar que não devemos temer, que não devemos chorar, mas sim regozijarmo-nos no Mistério da Vida y da Morte. Tão pouco eu sei das suas habitações e no entanto, sinto como penetram no meu espaço e riem comigo. Vejo o sorriso da minha avó com uma pitada de malicia, ¿Onde está o meu doce de coco?, que ironia, agora neste momento, juntam-se os cantos do passado e do presente, juntam-se os cultos imemoriais, não importa se de um chamado barbárico, de uma língua egípcia ou de um Pai Nosso, a união é o sendeiro do Samhain, a união entre duas coisas que aparentemente não podem ser mais distantes e ao mesmo tempo mais próximas. A única forma de manter o véu, um pouco mais próximo de nós, é rompendo com as distancias, principalmente aquelas que florescem ou floresceram em nós.
“Eu te saludo ancestral, na tua língua, no teu culto, no teu canto, porque tu em igualdade de condições vieste ao meu canto, ao meu culto, á minha língua, rindo e mostrando a tua presença, rindo e mostrando a tua bondade.”
Eu te saludo ancestral, na tua língua, no teu culto, no teu canto, porque tu em igualdade de condições vieste ao meu canto, ao meu culto, á minha língua, rindo e mostrando a tua presença, rindo e mostrando a tua bondade. O véu, o véu, o véu! ¿não será também nosso próprio véu? É neste dia que os nossos próprios véus se debilitam, os véus que separam o vivo e o morto dentro de nós mesmos. A minha avó faz-me lembrar o meu avô, o meu avô a minha mãe, a minha mãe o meu pai, aos meus irmãos, ás minhas viagens alegres e tristes de infância, a amores opostos e conflituosos, ao visível e ao invisível dentro de mim mesmo. Assim eu celebro a luz e a escuridão, mas se a escuridão é a ausência de luz, então celebro a Luz em to-
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das as suas facetas. Agradeço a todos aqueles que estiveram presentes no meu canto, agradeço aos que são visíbeis e invisíbeis. Compartilho com eles a minha comida e eles dão-me a sua, compartilho com eles o meu vinho e eles dão-me o seu, digo-lhes que os recordarei e que amanhã ainda os amarei, onde o véu se torna mais escuro, ou onde escolhemos que assim seja para fugir da realidade da nossa própria morte. Nada pode ser mais desagradável do que a consciência perene de que morreremos. Sim claro, todos o sabemos, contudo, nem sempre o recordamos. De facto, ao final, o Samhain também nos mostra que não há tal coisa como a morte, num sentido tal, que nos recorda a imortalidade, no final, se não existisse esta imortalidade, estaríamos celebrando um imenso vazio impregnado com o teatro das nossas próprias fantasias.
“Se a morte é parte da natureza e se o universo dos mortos também o é, então, um caminho que procure la harmonia com estes ciclos, deveria sem dúvidas revelar aos seus caminhantes os sinais para operar nesse mundo.”
Apago as velas, é o momento de nos separarmos, ao menos por um momento, cada universo Tem a sua dinâmica, a sua própria física e química. Apago as velas que estão fora de mim, mas não creio que seja capaz de apagar as luzes no meu interior, pelo menos não enquanto recorde o doce de coco, a pele, as palavras, aquele velho altar, os cânticos feitos em segredo. Não poderei apagalas enquanto recorde o Pai Nosso, o rosário que aparece pendurado frequentemente em qualquer lugar da minha casa, ou enquanto que continue a beber o vinho que eles ofereciam aos seus deuses ou compartilhando o pastel que eles compartiam comigo. Se a arte da invocação é chamar “para dentro” então nunca fui capaz de invoca-los, já que nunca
estiveram fora, só a minha estúpida mente, levanta um véu para seguir com a vida, de facto, não seria invoca-los, mas sim simplesmente, fazer com que o Samhain não seja um dia, mas um dos momentos de Mistério deste Véu, um dos tantos que seguem posteriormente. Apenas digo até amanhã... durmam bem e mantenham a vida dentro da morte da mesma forma que eu mantenho a morte dentro da minha vida. PS. Há um aspeto da Arte que sempre ressoa no meu pensamento, tanto nas minhas meditações, como nos momentos de revelação (se é que isto existe) e é o misterioso universo da necromancia ou simplesmente a necroarte. Há na Arte muitos momentos que poderiam aludir a este antigo e censurado universo dos mortos (ou pelo menos eu escolho encontra-los) e no entanto, muitas vezes sinto-me como um menino tentando jogar com um universo desconhecido. Temos os indícios, temos alguns dos seus Mistérios, e inclusivamente, creio que temos alguns fragmentos de procedimentos, no entanto, é como se esta arte se tivesse olvidado ou escondido com o passar do tempo. No Samhain, uma vez mais recordo (se, ás vezes é melhor esquecer-se) dos múltiplos momentos onde tenho “observado” o véu desde a óptica do mago ou do bruxo, que deseja expandir estes sendeiros. Se a morte é parte da natureza e se o universo dos mortos também o é, então, um caminho que procure la harmonia com estes ciclos, deveria sem dúvidas revelar aos seus caminhantes os sinais para operar nesse mundo, deveria mostrar algumas das físicas e químicas que operam nesse espaço. Claramente, poderiam existir muitos que não o creiam assim, mas desde o mais profundo do meu ser, creio, não sei, que estes sinais se escondem nos nossos ritos sagrados e na comunhão com nossos deuses, no entanto, o véu deve ser removido ou pelo menos, num dia como hoje, observar tudo quanto possamos, aproveitando a sua tenuidade. Os véus não se desvelam sozinhos e cada ano, neste dia, também se nos recorda isto, quiçá pelo caminho mais simples: ¡olha, há um véu!.
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