Nº 368 Edição Brasil

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NESTA EDIÇÃO

22 Ministros de Finanças Um painel de 140 especialistas dá notas de 1 a 10 aos líderes financeiros das economias latino-americanas SEÇÕES

PMES GLOBAIS

8 Índice 10 Cartas 12 Memo 14 Pistas 16 Editorial 17 Movimentos 54 Capital Aberto 71 Negócio Fechado 72 Raio X 73 Visões 74 Linha Direta

38 Corte preciso

NEGÓCIOS 28 Quer vender? O dilema da brasileira Amil: tem dinheiro, mas não consegue comprar.

30 Dilema da Cemex Companhia mexicana registra queda nas vedas e aumento da dívida.

32 Campo aberto A Colômbia quer que seus times de futebol agora joguem na bolsa.

34 Vírus USA Empresas de salmão que operam no Chile sofrem com a retração nos EUA.

35 Fermentando idéias Os planos da Dupont na região.

Pequenas empresas devem ter cuidado ao cortar custos para enfrentar a crise.

DEBATES 41 Dinheiro curto O impacto da redução das remessas na América Central.

42 Queridos velhinhos A nacionalização dos fundos de pensão na Argentina divide opiniões.

44 Horizonte incerto Os desafios de Lula para conseguir fazer um sucessor nas eleições de 2010.

46 Chapa quente Acidente com ministro agrava o problema de segurança do governo de Calderón.

48 Livre para gastar? Queda no preço do petróleo coloca Hugo Chávez em apertos.

50 Panorâmica A política fiscal tem que ser um motor de desenvolvimento, diz Javier Santiso.

51 Quinta coluna Problema gerador da crise foi excesso de regulação, diz Susan Kaufman.

FINANÇAS 52 Quem mandou apostar? Que lição ficou dos exageros em instrumentos derivativos cambiais.

55 Opinião Para John Edmunds, próximo desafio será lidar com o rápido aumento da liquidez.

56 Entrevista Francisco González, do BBVA.

ESPECIAL 60 Educação executiva As novas tendências nos cursos sob medida para empresas.

I-BIZ 68 Xamãs do século 21 Laboratórios da região buscam inspiração na floresta.

70 Clics & Chips Canon: tendência retrô.

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 3

ILUSTRAÇÃO DA CAPA: RODRIGO DÍAZ CARRIZO

Nº 368 / 17 DE NOVEMBRO, 2008




americaeconomia.com / 2.0 O site de negócios globais da América Latina

OS SEGREDOS DO WINDOWS 7

DESAFIO PENDENTE A América Latina luta contra anos de atraso em infra-estrutura digital e se esforça por criar vias para a Sociedade da Informação. Mas dizer que uma cidade é digital porque possui um grande número de habitantes conectados à internet não é suficiente. O conceito vai além. Uma verdadeira cidade digital utiliza a infra-estrutura tecnológica disponível para conectar-se e conectar seus cidadãos entre si, para que a informação flua em forma bidirecional entre o Estado e os cidadãos. O consultor argentino Alejandro Prince explicou à AméricaEconomia.com.br, para uma série especial de infra-estrutura digital, que “o Estado é um organismo onipresente; muitas vezes, burocrático e ineficiente, e em alguns casos corrupto. Então, a transparência que a nova tecnologia oferece pode ajudar a melhorar a relação do cidadão com o governo”.

Enquanto o Windows Vista não emplaca na região, a Microsoft já prepara o sucessor de seu sistema operativo. A empresa acaba de lançar uma versão pré-beta só para programadores do Windows 7. Em conversa com a AméricaEconomia.com.br, Carlos González, gerente de Produto do Windows para a América Latina, disse estar confiante de que uma versão beta para o público estará pronta na primeira metade do próximo ano. “A versão definitiva poderia estar disponível na primeira metade de 2010”, afirmou o executivo.

AINDA NÃO RECEBE? LEIA O QUE ACONTECE NOS PRINCIPAIS SETORES DA ECONOMIA E DOS NEGÓCIOS REGIONAIS EM SEU E-MAIL. ASSINE. 6 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

RADAR AMERICANO “A América Latina está fora do radar dos Estados Unidos.” Foi assim que o ex-embaixador do Brasil em Washington, Rubens Barbosa, iniciou a conversa com AméricaEconomia. com.br sobre a vitória do democrata Barack Obama na disputa presidencial dos Estados Unidos. Para o ex-embaixador, a região “não entra em um elenco de dez prioridades da política externa norte-americana”, mas acredita que o Brasil tem uma posição privilegiada entre os países latino-americanos e se destaca como um importante interlocutor entre a região e os Estados Unidos.


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ÍNDICE DE EMPRESAS OS NÚMEROS REFEREM-SE À PRIMEIRA PÁGINA EM QUE AS EMPRESAS SÁO CITADAS. EXCLUI AS EMPRESAS QUE FIGURAM EM GRÁFICOS E RANKINGS

a

d

k

Aché ..........................................68

Danone ......................................65

Kellog ........................................64

Pemex ........................................23

AFJP Nación .............................44

Dattis Comunicaciones .............33

KPMG .......................................53

Petrobras ...................................65

AFJP Siembra ...........................43

Dupont.......................................35

Kraft ..........................................67

q

Amil ..........................................28

e

Kroll InfoAmericas ...................49

Qatar Petroleum ........................72

Aracruz ......................................52

Embraer .....................................69

l

r

Arco Advice ..............................45

Ernst & Young Chile .................36

LabFarve ...................................69

Rinker ........................................30

Autoridad del

EvaPhone ..................................70

Laboratórios

s

Canal del Panamá ...........20,72 Avimed ......................................28

f Fazio Consultoria em

b

Saúde ...................................29

Biotecnología ......................69

Schering ..............................69

Sadia..........................................52

Larraín Vial ...............................32

Samcil .......................................28

Latin America Marketing

Santander...................................29

Banchile Inversiones .................34

FinanzasToday ..........................54

Consultants.........................18

Seminarium ...............................17

Banco do Brasil .........................17

Fitch Ratings .................31, 34, 72

Linde .........................................66

Snacks .......................................65

Banco do Estado do Piauí .........17

g

Linux .........................................40

Standard & Poor’s .....................30

Banco Votorantim .....................17

Gávea ........................................18

m

Subaru .......................................18

Bancomer ..................................59

Gems Investimentos ..................18

Marine Harvest..........................34

Superfund ..................................18

Bimsa Reports ...........................31

Golden Cross.............................28

Medial .......................................28

t

Biolab ........................................68

Gómez Pinzón Zuleta................33

Merrill Lynch ............................53

Tanner........................................36

Blanco y Negro .........................32

Gruma .......................................53

Microsoft .....................................6

Tele Design ...............................39

BP..............................................35

Grupo BBVA .............................56

Milliman....................................28

Telefônica ..................................19

Bradesco....................................17

Guisa .........................................53

Mitz ...........................................18

Toyota........................................18

c

h

n

Tresko........................................39

Canon ........................................70

Hilton Hotels .............................19

Nossa Caixa ..............................17

u

Celfin Capital ............................36

Honda ........................................18

Nutrabien...................................40

Unibanco ...................................17

Cemex .................................30, 53

Hotel Aloft ................................19

o

Unión Química ..........................68

CHL...........................................19

Hotel W .....................................19

Occidental .................................72

v

Citic ...........................................59

i

OPSM........................................43

Vicuña .......................................53

Coinfar Pesquisa e

Intermédica ...............................28

p

Virgin Galactic ..........................19

Desenvolvimento.................68

Itaú ............................................17

Paex ...........................................40

Vitro ..........................................53

Colmex ......................................47

IXE Grupo Financiero...............31

Paraí ..........................................38

Vivian Blair & Asociados .........18

Comercial Mexicana .................53

j

Pdvsa .........................................48

Volaris .......................................37

Corredores Asociados ...............33

JP Morgan .................................48

Pele Nova

Votorantim.................................52

AMÉRICAECONOMIA magazine (USPS #023106) is published biweekly on March, April, May, June, September, October and November, and monthly on January, February, July, August and December in Santiago, Chile by AméricaEconomía. AméricaEconomía is distributed in the United States by DL Distribution Group, 7301 Sw 100 Ct , Miami, FL. 33173-4651 PH: (305) 595-5505. Periodicals Postage paid at Miami, Florida. POSTMASTER: send address changes to DL DISTRIBUTION GROUP 7301 Miami, FL 33173-4651.

8 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008


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CARTAS insosso que deseja ganhar força no hemisfério em países de pobreza franciscana. O que será a Alba para Lowenthal, o bloco no qual o autor da nota não acredita? Que não se encubram os impérios e blocos totalitários!

rankings que são publicados, como o ranking de cidades, de MBAs e o de bancos (para citar alguns), que se converteram em referências regionais do sucesso das organizações. Minha proposta é de que estudem a possibilidade de criar um ranking de empresas do setor logístico ou operadores logísticos, e de como essa indústria aporta à competitividade dos países da região.

David Cabezas Caballero Sucre, Bolívia

A Espanha acolhe Sim, há um bloco Em relação à coluna de Abraham F. Lowenthal “Sem roteiro” (AméricaEconomia Nº 365, 29 de setembro, 2008), na qual ele fala de uma suposta paranóia dos Estados Unidos frente ao crescimento da esquerda na América Latina, seria bom esclarecer que a paranóia não é norte-americana; corresponde mais bem a Chávez, que no fundo sente pavor do fracasso de seu projeto socialista-marxista que, de fato, acabará caquético, quando os petrodólares deixarem de financiar movimentos que deixam um gosto amargo. Para Lowenthal, não existiria nenhum bloco perverso, adverso ao império na América Latina. Ao contrário, apenas são “diversidade de movimentos que buscam avançar”… Pobrezinhos! Avançar a um socialismo

Quero parabenizá-los pela revista, devido à sua seriedade e ao grau de interesse dos temas. Sempre a deixo na biblioteca para que seja consultada por nossos alunos. Por isso, me surpreendeu a publicação da carta de Arturo Lecaros, de Lima, que apresenta injustas, duras e falsas acusações sobre meu país, a Espanha. Aqui temos muito claro que somos unidos à Ibero-América por laços inseparáveis. Está longe da realidade a afirmação de que aqui se trata com desprezo a pessoa que com seu reconhecido trabalho nos acompanha em nosso dia-adia. Por tradição, cultura e identidade, espero e desejo que os ibero-americanos se sintam tão bem na Espanha como em nenhum outro lugar do mundo. Martín Hernández-Palacios. Diretor Geral, Aliter Escuela Internacional de Negocios Madri, Espanha.

O retrocesso de Lula Muito interessante sua história “O tesouro salgado da Petrobras” (AméricaEconomia N° 366, 13 de outubro, 2008). Nela se conta como o governo Lula está apostando na exploração 100% estatal das reservas de hidrocarbonetos descobertas no subsolo brasileiro, apesar de ter uma estrutura eficiente para fazê-lo como Petrobras. Uma má decisão para Lula, pois todos olhamos com admiração a gestão energética do Brasil. Isso soa a retrocesso e a uma desconfiança do mesmo país em relação ao modelo que criou. Pablo Márquez Bogotá, Colômbia

Mais rankings Como leitor de sua revista, acompanho com muito interesse os diferentes

Guido Angello Bogotá, Colômbia

Correções e ampliações: Na história “South american ranch” (AméricaEconomia N° 365, 29 de setembro, 2008) na qual se analisa a evolução do preço das terras destinadas à agricultura em alguns países latino-americanos, cometemos um grave erro geopolítico: no mapa que consta do infográfico, não colocamos o Equador na América do Sul. Trata-se de um erro involuntário, e agradecemos aos leitores que nos avisaram do problema. Pedimos desculpas pelo ocorrido. Na mesma edição, na história “O poder do design”, cita-se erroneamente a Pedro Holguín como diretor de operações da consultora mexicana em inovação In/ situm. O nome correto é Roberto Holguín.

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MEMO ARTE E ACASO

FERNANDO CARRASCO - POSTALDELDIA

DIRETOR Elías Selman C.

É NATURAL. Está na essência dos políticos. Em seu DNA. Quando a economia de um país evolui bem graças a uma conjuntura favorável, diz-se que se trata de méritos próprios. De políticas acertadas. De cautela na justa medida. De tino. Mas quando o cenário global desfavorece – prejudicando com isso a economia doméstica –, pode-se jogar a culpa nos outros. Nos chineses. Nos gringos. Na má sorte. Não são poucas as declarações de autoridades econômicas de nossos países nas quais se podem identificar esses argumentos para explicar os duros tempos financeiros e econômicos que começamos a atravessar. Quase como se estivéssemos em um cassino, e a estabilidade econômica dependesse simplesmente do lado em que os dados caem ou a cor do número onde a bola escolhe para descansar. Afortunadamente, isso não funciona assim, e os ministros de Finanças ou da Fazenda latino-americanos têm em suas mãos mais ferramentas que a mera sorte para fazer uma ÁLVARO: MALABARES DO boa gestão. Um adequado deseDESIGN nho econômico traz resultados tanto para tempos de crise quanto para os de bonança. Observadores e analistas sabem disso e reconhecem as diferenças. Por isso, pedimos a mais de 140 economistas, analistas e líderes de opinião que nos ajudassem a avaliar os ministros latino-americanos de acordo com a efetividade de suas gestões e de como seus países estão preparados para enfrentar a crise. E como o desenho é algo que não se pode deixar ao acaso, na AméricaEconomia temos um especialista que está a cargo de seu projeto e execução. Tratase de Álvaro Araya, nosso editor de arte, que já está há 11 anos na revista, onde entrou como editor de imagens. Fanático da ideologia Mac e de futebol – torce pela Universidade do Chile, mais conhecida como “La U” –, é um malabarista do design: ele e sua equipe de diagramadores são uma peça-chave na transformação de AméricaEconomia em um modelo multilocal, com base em uma edição internacional da qual derivam as versões para diferentes mercados. “Cada edição de AméricaEconomia implica fechar cinco revistas diferentes simultaneamente”, conta Álvaro. “Por isso, o design não está somente na arte gráfica da capa e no conteúdo; ele também acompanha o planejamento do trabalho que temos que levar a cabo.” E que inclui, é claro, algo de sorte.

VICE-PRESIDENTE-EXECUTIVA Gloria Landabur DIRETOR EDITORIAL Felipe Aldunate M. EDITOR ADJUNTO Rodrigo Lara DIRETOR DE ARTE Álvaro Araya Urquiza EDITORES-EXECUTIVOS Solange Monteiro, Juan Pablo Rioseco EDITOR BRASIL Dubes Sônego ESCRITÓRIO EDITORIAL BRASIL (55 11) 2589-3157 / 3160 EDITOR MÉXICO Marisol Rueda EDITOR MIAMI Antonio María Delgado EDITOR FINANÇAS Eduardo Thomson EDITOR DE FOTOGRAFIA Miguel Candia REPÓRTERES Arly Faundes (México) CORRESPONDENTES•ARGENTINA Juan Pablo Dalmasso •COLÔMBIA Lucía Valdés •MÉXICO Carolina Solís •PERU Cecilia Niezen•URUGUAI Guillermo Pellegrino •VENEZUELA Dorothy Kronick •AMÉRICA CENTRAL Vernic Gudiel •MIAMI Carlos Molina •WASHINGTON Antonieta Cádiz COLUNISTAS•Susan Kaufman Purcell•Félix Peña •Abraham Lowenthal •John Edmunds •Javier Santiso DIAGRAMAÇÃO Riffka Schiro-kauer J., Sebastián Caro P.

•ILUSTRADORES Daniela Guglielmetti, Rodrigo Díaz Carrizo REVISORA Adriana Casarotti

AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE (Estudos e Projetos Especiais) •DIRETOR Rodrigo Díaz COORDENADOR-GERAL Jaime Contreras • •ANALISTA SÊNIOR Pablo Hernández ANALISTA Daniela González • AMÉRICAECONOMIA.COM

•EDITOR Franco Piccato

•REPÓRTERES Marcelo García, Magdalena Álvarez, Pablo Jamett• GERENTE DE PRODUÇÃO Constanza del Río Moreno DIRETOR DE MARKETING Marcelo Silva DIRETOR DE CIRCULAÇÃO Marcial Delcorto • GERENTE DE INFORMÁTICA E LOGÍSTICA Óscar Sánchez • BRASIL•HV2 Comercialização de Mídia •DIRETOR-GERAL Hélcio Vieira •GERENTE DE PUBLICIDADE Oscar da Silva Alves •GERENTES DE NEGÓCIOS Rosangela Bomtempo, Nícolas Cardoso Slamek •GERENTE DE MARKETING Denise Terranova Rua Cel. Arthur de Paula Ferreira, 59 - cj 111São Paulo - SP - Brasil CEP 04511-060 Tel.: 5511-3846-5588 ESCRITÓRIOS COMERCIAIS • EUA Tel: 305/648-9071 •MÉXICO Tel: 5255/5254-2400 Fax: 5254-7510 • ARGENTINA Claudia Dasso Tel: 5411/4383-8410 - 4383-8416 •CHILE Tel: 562/290-9400 Fax: 341-5687 • AMÉRICA CENTRAL Julio Lemus Tel-Fax: 502/2261-0278 • PANAMÁ Yadyra de Paz y Miño Tel: 507/271-5327 - 507/66787564 • PERU Ana Pazos Pastor Tel-Fax: 511-4211852 - Cels: 511-97897272 / 511-97622230 REPRESENTANTES INTERNACIONAIS • ALEMANHA Gerd Bielenberg (GWP International Media Service) Tel: 49211/887-2328 Fax: 887-2919 • ESCANDINÁVIA Finn Greve Isdahl (International Media Sales A/S) Tel: 4755/92-5192 Fax: 92-5190 • ESPANHA Luis Andrade (Luis Andrade Publicidad Internacional) Tel: 3491/441-6266 Fax: 441-6549 • FRANÇA Patricia Goupy (PEM Groupe PEMA) Tel: 331/4143-7057 Fax: 4738-6329 • ITÁLIA Carlo E. Calcagno (Studio Calcagno s.r.l.) Tel: 3902/670-73383 • REINO UNIDO David Todd (David Todd Associates Ltd.) Tel: 4420/7538-5811 Fax: 7538-4911 • SUÍÇA Hans Otto (Infoplus AG) Tel: 411/269-7070 REDAÇÕES • SANTIAGO: Tel 562/290-9400 • CIDADE DO MÉXICO: Tel 5255/5254-2400 • BUENOS AIRES: Tel 5411/4383-8410 • MIAMI: Tel 305/648-9071 AméricaEconomia é uma publicação quinzenal da Nanbei Ltd. •Impressa na Plural Editora e Gráfica . México, franquia paga. Publicação periódica•Registro PP09-0011 PRESIDENTE Nils Strandberg CHAIRMAN Robert R. Paradise

Felipe Aldunate M. Diretor Editorial

12 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

Certificado Licitud de Título Nº 4090 . Certificado Licitud de Contenido Nº 3346 . AméricaEconomía is a Nanbei Ltd. biweekly publication


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SEGUINDO A PISTA FLERTE INTERNACIONAL PUBLICAMOS: Dos 10,7 milhões de PCs vendidos no Brasil em 2007, segundo o IDC, a paranaense Positivo foi responsável por 1,4 milhão – registrando receita bruta de US$ 1,2 bilhões–, com um crescimento de quase o dobro do mercado em geral em unidades vendidas (66,4%, contra 38%). “Fomos os primeiros em share of mind no País”, diz Hélio Rotenberg, presidente da Positivo. A empresa ampliou a capacidade de sua fábrica principal, para 220 mil unidades ao mês, e inaugurará duas novas plantas; uma de monitores, para 40 mil unidades mensais, e outra de computadores, com capacidade inicial de 20 mil unidades ao mês. (“Brasil Positivo”, AméricaEconomia Nº 355, 10 de março, 2008)

O NOVO: O dinamismo da empresa paranaense não passou despercebido. No final de outubro, suas ações dispararam (chegando a uma alta de 28% dia 31) depois que uma revista local anunciou que a fabricante de computadores tinha contratado o banco UBS Pactual para avaliar propostas de compra. Os players internacionais que poderiam ter revelado seu interesse não foram divulgados, e executivos da empresa afirmaram que as conversações ainda estavam em fase preliminar e corriam o risco de não prosperar. De qualquer forma, seria um bom momento para a compra: em 2008, o valor de mercado da empresa caiu mais de 80%. O faturamento da Positivo foi de R$ 1,68 bilhão nos primeiros nove meses do ano.

TORRADO: NOVOS PASSOS.

HAMBÚRGUERES PARA A COLÔMBIA P U B LI C A M O S:

Apesar da Domino’s Pizza continuar representando mais de 50% das vendas da Alsea, seu presidente, Alberto Torrado, apostou no potencial de Starbucks e Burger King para fazer sua empresa crescer na América do Sul. No ano passado, comprou 27 lojas Burger King na Argentina e 22 no Chile. Entrou no Brasil com a Starbucks no final do ano passado e durante 2007 e 2008 espera chegar ao Chile, à Argentina e à Colômbia, onde terá que competir com a tradição do café dos produtores nacionais (“O rei das franquias”, AméricaEconomia N° 248, 8 de outubro, 2007).

O NOVO:

Finalmente a Alsea desembarcou na Colômbia. A empresa negociou com a Burger King Corp. para levar a rede de fast food a Bogotá, com um plano de instalar 20 pontos nos próximos cinco anos. Para isso, a Alsea criará uma subsidiária na qual terá participação de 84,9%. O restante pertencerá aos irmãos Moreno Restrepo, que já são sócios da Alsea na Domino’s Pizza na Colômbia. A empresa afirmou que o primeiro restaurante poderá ser aberto até o final do ano.

14 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

NO RITMO DO MERCADO PUBLICAMOS: “A Vale foi a empresa que mais expandiu sua produção de ferro e, portanto, a que ficou mais bem-preparada para atender ao aumento mundial da demanda. Isso faz a companhia se destacar entre os principais concorrentes”, afirma Cristiane Viana, analista da Ágora Senior. (“A toda máquina”, AméricaEconomia Nº 361, 21 de julho, 2008)

O NOVO: Agora a Vale decidiu tomar o caminho oposto. No final de outubro, anunciou corte de 30 milhões de toneladas métricas anuais na produção de minério de ferro, para se adequar à desaceleração da economia mundial. Segundo o presidente da Vale, Roger Agnelli, a companhia paralisará a atividade de algumas minas que apresentavam maior custo de produção e minérios de qualidade inferior. A Vale também anunciou que interromperá a atividade de duas plantas pelotizadoras – que representam 20% da capacidade de produção nominal – para manutenção.

MAIOR DO HEMISFÉRIO PUBLICAMOS: Uma compra do Itaú no México é dada como certa. E a crise bancária mundial ofereceria boas oportunidades. “Eles podem comprar as operações internacionais de algum banco global”, diz Celso Boin Jr., da corretora Link. (“De olho no mundo”, AméricaEconomia Nº 365, 21 de julho, 2008)

O NOVO: O Itaú resolveu mesmo aproveitar as oportunidades, mas dentro de casa. No começo de novembro, anunciou sua fusão com o Unibanco, criando a maior instituição financeira do hemisfério Sul. Os acionistas do Unibanco migrarão para uma nova companhia que se chamará Itaú Unibanco Holding Financeira.



AFP

EDITORIAL

UMA TAREFA URGENTE Nas

próximas semanas, escutaremos reiteradamente o novo presidente dos EUA insistindo nos enormes desafios que tem pela frente. O significado do triunfo de Barack Obama para a democracia norteamericana e para a imagem de seu país no mundo é equivalente às grandes dificuldades que terá para satisfazer as expectativas geradas em torno de sua figura. É um problema de cifras: Obama não tem os trilhões de dólares necessários para salvar a economia dos EUA da crise, resgatar indústrias-chave e impulsionar planos de saúde universais enquanto reduz os impostos de 95% da população. Quem votou nele pensando que poderia enfrentar tudo isso de uma só vez se decepcionará rapidamente, da mesma forma que os latino-americanos que esperam que o carismático presidente eleito dê início a uma nova relação com o continente. O fato é que já não são tempos para ingenuidade. O novo presidente dos Estados Unidos não terá uma agenda latino-americana mais intensa que a de George W. Bush. Não só porque conhece pouco a América Latina e seus líderes – ainda menos os temas-chave da região – como porque suas prioridades estarão em outras áreas: a unificação de seu país, a solução dos problemas militares no Oriente Médio e o resgate da economia interna. Não obstante, não é uma má agenda para a região. De fato, ainda que Obama nunca pronuncie as palavras América Latina, o continente ganhará se o espírito de colaboração do novo presidente ajudar a reduzir o sentimento anti-norte-americano na região, e se este consiga engatilhar a recuperação econômica do país. Mas há uma tarefa que o novo líder terá que recolher da administração Bush e colocar no escaninho de temas urgentes: aprovar o tratado de livre comércio com a Colômbia. O atual acordo com os EUA do qual o país faz parte, conhecido como ATPDEA (Andean Trade Promotion and Drug Eradication Act), vence em 31 de dezembro, poucos dias antes da posse do novo presidente. Bush

16 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

afirmou que deseja ver o TLC com a Colômbia assinado antes que seu governo expire. Para isso, planeja apresentar a proposta junto com um pacote de ajuda para a indústria automobilística, propiciado por democratas. Rahm Emmanuel, recém-eleito chefe de gabinete de Obama, criticou o pacote. “Não se vincula necessidades essenciais com um ou outro tratado comercial”, afirmou. O problema é que não há alternativa: se o tratado com a Colômbia morre agora, não será reintroduzido ao debate no novo Congresso, de maioria protecionista. A conseqüência seria terrível para o principal aliado dos Estados Unidos na região. Sua economia se desacelera velozmente e requer o pacto para garantir o modelo liberal de desenvolvimento econômico que vem impulsionando a economia, em contraste com o de seu vizinho, a Venezuela. Sem o TLC, os Estados Unidos põem mais tensão em um país que tem muitas de suas instituições sob forte pressão. Além disso, haveria prejuízos para as empresas norte-americanas. A Colômbia, terceiro país em número de consumidores de língua espanhola do planeta, importa produtos de 8 mil companhias dos EUA, ajudando a estimular uma atividade comercial bilateral que em 2007 chegou a US$ 18 bilhões, o dobro do que havia há cinco anos. Não aprovar o acordo comercial significará levar essas companhias de volta a uma condição tarifária desfavorável no país andino. Fechar mercados de alto crescimento não é uma boa idéia para a perspectiva democrata, tampouco para a republicana. Obama deveria promover a aprovação do acordo com a Colômbia no Congresso. Fazê-lo será um excelente primeiro passo para sua agenda regional, evitará que os latino-americanos lhe estejamos pedindo sinais continuamente (pelo menos até abril, quando o presidente dos EUA se reunirá com os mandatários latinoamericanos na Cúpula das Américas) e resolverá de antemão muitos problemas futuros. ■


MOVIMENTOS Bradesco

MARCIO CYPRIANO estava pronto para a glória. O brasileiro tinha o horizonte limpo para converter o Banco Bradesco no maior banco comercial da América Latina. Seus US$ 250 bilhões em ativos e uma taxa de crescimento anual em torno dos 66% mostravam que logo o banco de Cypriano superaria o estatal Banco do Brasil, único na região que ainda lhe vencia. Mas a fusão anunciada entre os brasileiros Itaú e Unibanco (respectivamente, terceiro e quinto maiores da América Latina) foi um balde de água fria na ambição do Bradesco: a nova empresa Itaú-Unibanco somará US$ 314 bilhões em ativos. Para recuperar a posição nessa corrida, o Bradesco teria que comprar um concorrente. Fontes de dentro do banco confirmam que há movimentos nessa direção e que o caixa do banco, que beira os US$ 50 bilhões, o permitiria. O problema é que no Brasil não restam muitos bancos privados de grande porte que já não façam parte de um grupo mundial. O único que cumpre essa característica é o Banco Votorantim, do grupo homônimo. Mas há um problema: no fechamento desta edição, confirmouse que o Banco do Brasil negociava a aquisição de 49% do Votorantim, além de negociar com a Nossa Caixa e o Banco do Estado do Piauí.

ALEXANDRE BATTIBULGLI

e suas opções

NO MERCADO

Para superar a aliança Itaú-Unibanco, o Bradesco teria que aumentar seus ativos em US$ 70 bilhões, provavelmente comprando mais de um banco

CYPRIANO TERÁ QUE IR ÀS COMPRAS?

JAIME CONTRERAS

O WEF não é o WEF

O WEF DA SUÍÇA E O DE SANTIAGO

BANCO Votorantim* Safra Finasa BMC Banrisul Fibra Do Nordeste

ATIVO US$ 46 bilhões US$ 36 bilhões US$ 28 bilhões US$ 14,4 bilhões US$ 10 bilhões US$ 9,4 bilhões

*Em negociação com o Banco do Brasil Fonte: AméricaEconomia Intelligence, cifras arredondadas.

O WORLD ECONOMIC FORUM (WEF), promotor do mega encontro econômico-empresarial em Davos, tem um problema que não consegue resolver: os piratas. Muitos usam seu nome para promover campanhas por e-mail visando arrecadar fundos em associações e eventos com os quais a instituição com sede em Genebra não tem nenhuma relação. O site do WEF alerta para essa prática, conhecida como phishing. Mas o problema de uso de marca se complicou. No Chile, por exemplo, a empresa local de eventos Seminarium promoveu no início de novembro um congresso chamado World Economic Forum sem a autorização do WEF original. “Nossos advogados definem se podemos usar algum nome ou marca que já esteja no mercado”, afirma Miriam Gutiérrez, diretora de operações da empresa. “E, nesse caso, podíamos”. Os representantes do WEF não estão de acordo, e de Genebra confirmam que colocaram o tema nas mãos de seus advogados. MARÍA SOLEDAD GÓMEZ / SANTIAGO

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 17


MOVIMENTOS Volts sobre 4 rodas TOYOTA E HONDA LEVAM a dianteira no desenvolvimento de veículos híbridos, é verdade. Mas a Subaru, sua concorrente mais direta, não quer que seus motores boxer diesel (lançados neste ano) sejam sua única resposta frente ao desafio ambiental. Hidetoshi Kobayashi, vice-presidente e gerente geral do departamento de marketing e vendas da Subaru Overseas, diz que no próximo ano começarão a fabricar cem unidades do seu protótipo elétrico. “Há dois anos constituímos uma equipe junto com companhias elétricas para desenvolver este veículo. Já terminamos de testá-lo e a partir de 2009 queremos começar a distribuí-lo”, afirma Kobayashi. O ruim é que, por uma questão de custos, ainda não há mercado para que este veículo seja comercializado na América Latina. A companhia japonesa aposta em um crescimento de 20% nas vendas para este ano, para chegar a 9,3 mil unidades vendidas. “E, no próximo ano, chegaremos a cerca de 11 mil”, diz o executivo. “Em todo caso, devido à crise financeira, temos que esperar para ver o que acontece nos mercados antes de agir.” JUAN PABLO RIOSECO / SANTIAGO

100% lá fora

REINHARDT: ALTERNATIVA

O MERCADO COMEÇA a se movimentar para aproveitar as oportunidades criadas pela Instrução 465 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no Brasil. Publicada no início deste ano, ela permite a estruturação de fundos de investimento com até 100% dos ativos aplicados no exterior. As pioneiras foram Gávea e Gems Investimentos. Agora, outra empresa que segue caminho semelhante é a gestora austríaca Superfund, que pretende lançar um produto do gênero até o final do ano. O momento de crise internacional, ao invés de ser considerado uma ameaça, é visto como oportunidade por Lance Reinhardt, diretor da Superfund para a América Latina. A empresa trabalha com um software proprietário que faz a negociação on-line de uma ampla gama de ativos, nos mais variados países do globo, com base em gráficos que apontam tendências de longo prazo. O executivo acredita que o mercado enxergará no produto uma boa alternativa de diversificação de riscos. DUBES SÔNEGO / SÃO PAULO

Bolsas sustentáveis

MARS: BOLSA SOCIAL

CENTO E QUARENTA MULHERES mexicanas estão demonstrando que é possível ganhar dinheiro, preservar o meio ambiente e combater a pobreza ao mesmo tempo. Um projeto concebido em 2003 para apoiar uma escola para crianças de escassos recursos na Cidade do México resultou, com o tempo, no surgimento de uma pequena empresa chamada Mitz, com vendas mensais de US$ 50 mil em bolsas elaboradas a partir de embalagens de confeitos. A diretora geral do projeto, Judith Romano, descobriu este método de produção artesanal em uma comunidade indígena do sul do país. “Este modelo sustentável mantém a escola, gera emprego para as famílias e permite paliar o aquecimento global”, diz Romano. Pouco depois do seu lançamento, as bolsas tornaram-se conhecidas no México e nos EUA. Além disso, com o apoio da fabricante de doces Mars, que fornece a matéria-prima, a empresa se profissionalizou e abriu pontos-de-venda nos EUA. Agora, a Mitz deseja expandir-se e este seria um bom momento. Um estudo realizado por Vivian Blair & Associados e Latin America Marketing Consultants aponta que 77% dos consumidores estão dispostos a pagar mais por produtos que apóiem alguma causa social. MARISOL RUEDA / CIDADE DO MÉXICO

18 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008


MOVIMENTOS A é i LLatiAmérica ti na em órbita VIAJAR EM UMA nave espacial já não é apenas um sonho dos fãs de Star Trek. A partir de outubro, cidadãos de 12 países latinoamericanos poderão reservar seu lugar na nave Space Ship II, da empresa Virgin Galactic. Os que garantirem seu lugar este ano – por módicos US$ 200 mil – terão que esperar por uma vaga até o final de 2010, pois a companhia aeroespacial já tem uma fila de 270 passageiros de 35 países, que se preparam para viajar a 4 mil km/h a partir do próximo ano. O pacote inclui treinamento e técnicas para suportar a pressão. O lançamento será no deserto de Mojave e a viagem tem duração de duas horas, com quatro minutos em que os seis passageiros e os dois pilotos flutuarão dentro da nave com a gravidade zero. “A faixa etária de nossos passageiros é ampla, dos 18 aos 83 anos”, diz Carolyn Wincer, executiva de vendas da Virgin Galactic, empresa que espera realizar vôos diários a partir de 2011. LUCIA LEZACA / BOGOTÁ

HILTON: MAIS ESTRELAS

Os Hilton contra-atacam NÃO SE TRATA DE PARIS HILTON. É sua família que está dando o que falar. Os donos da rede de hotéis do mesmo nome anunciaram seus planos de expandir-se na região. Com um portfólio de 51 propriedades aprovadas e em desenvolvimento na América Latina e no Caribe, a empresa quer somar 200 hotéis da marca nos próximos 10 anos. “No Sul observam o Chile, a Argentina, o Brasil, o Peru e a Colômbia”, diz o brasileiro Cristiano Gonçalves, vice-presidente de desenvolvimento do Hilton Hotels, em Lima. “Por exemplo, na América do Sul se pretende ter 50 hotéis da marca no período de cinco anos”. Para isso, os executivos buscam não só atuar como operadores como também como investidores. Para isso, estariam conversando com empresas locais nesses países. “Ainda falta bastante para desenvolver na área hoteleira, sobretudo naqueles países com mais potencial de crescimento econômico”, afirma Gonçalves. O ataque dos Hilton se desenvolve no mesmo momento da arremetida de Starwood e seus hotéis W e Aloft. Vamos ver quem chega melhor. FRANCISCA VEGA / SANTIAGO

Lar digital

VALENTE: NÃO SÓ TELECOM

À TELEFÔNICA já não basta ser uma empresa de telecomunicações no Brasil. No final de outubro, anunciou uma associação com a construtora CHL para lançar um “edifício inteligente” no Rio de Janeiro. Segundo o contrato assinado, a operadora será a responsável por oferecer a tecnologia que permitirá aos moradores controlar funções

SOLANGE MONTEIRO / SANTIAGO

do apartamento, como temperatura, abrir e fechar janelas, acender e apagar luzes e monitorar a segurança através de um dispositivo de controle que podería ser o próprio celular. Para aceder aos serviços, os moradores terão que pagar uma mensalidade à companhia. “Em alguns dias mais devemos fazer novos anúncios,

com empresas de São Paulo”, afirmou Antonio Carlos Valente, presidente da companhia, em São Paulo. A Telefônica também tem planos de lançar no próximo ano um administrador residencial de conteúdos audiovisuais, como parte da proposta de automação digital desenvolvida pela empresa.

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 19


MOVIMENTOS Onde se vive melhor? AINDA QUE BEM-ESTAR não seja o mesmo que felicidade, o Instituto Legatum se aventurou a lançar o seu índice de prosperidade que avalia as condições de vida de 104 países, pela segunda vez. E a Austrália ocupou o primeiro lugar no ranking deste ano, ao acumular a melhor pontuação nas 22 variáveis analisadas, que vão da competitividade econômica à preservação do meio ambiente e à proteção das liberdades individuais. Dos 21 países latino-americanos que aparecem na lista, o Chile foi o que mostrou o melhor resultado ao localizar-se no 27º posto e destacar-se nos itens de governança, mercados competitivos e uma alta capacidade empreendedora. Depois vem Argentina (31º), Uruguai (36º), Costa Rica (38º), e Brasil e México empatados no 43º posto. Os gigantes regionais apresentam semelhanças consideráveis em algumas áreas-chave do relatório, como crescimento através do investimento de capital, melhor educação, qualidade do meio ambiente e vida em família. No final da lista estavam Equador e Bolívia, países que apresentaram pontuações similares às de Camboja, Bangladesh e Senegal.

PAÍS RANKING 4 EUA 22 Espanha 27 Chile 31 Argentina 36 UruguaI Costa Rica 38 Brasil 43 México 43 Panamá 51 R.Dominicana 58 58 Venezuela 61 Colômbia 65 Peru 75 Paraguai 76 El Salvador Guatemala 82 Honduras 83 Nicarágua 87 Equador 88 Bolívia 90

ISSO É QUE É VIDA...

ANTONIETA CÁDIZ / WASHINGTON

Rebote imprevisível NINGUÉM SABE PARA quem trabalha. A impossibilidade da Bolívia de cumprir seus contratos de fornecimento de gás com a Argentina nos últimos dois anos, mais a decisão desse último país de usar suas exportações ao Chile como variável de ajuste em momentos críticos, derivaram em que muitas das empresas geradoras de eletricidade chilenas – que administram centrais térmicas alimentadas com gás ou petróleo – migrassem para o uso de combustível líquido. O vencedor? O Panamá. Particularmente, a Autoridade do Canal do Panamá (ACP), que anunciou que o tráfego de navios petroleiros aumentou, de outubro de 2007 a setembro de 2008, 4,8% (de 1.972 a 2.067 trânsitos), especialmente devido ao aumento de envios da costa do Golfo do México ao Chile. O dado é significativo, já que tal crescimento se dá no marco de um estancamento do aumento da passagem de barcos: -0,1% no período indicado em relação ao ano anterior, com uma queda na tonelagem de 1,1%. Assim, a ACP lucra com os desacordos no Cone Sul. RODRIGO LARA SERRANO / BUENOS AIRES

20 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

vai &

vem

EDUARDO SERRANO

Louise Goeser, vice-presidente da Ford Motor Company e diretora geral da Ford do México, aos 55 anos decidiu aposentarse. Dia 1 de novembro assumiu, em seu lugar, Eduardo Serrano, antes diretor executivo da companhia. Dia 31 de janeiro do próximo ano o chileno Camilo Sandoval deixará de ser gerente geral da Enaex. Ainda não se conhece quem ocupará o cargo da empresa de explosivos do grupo Sigdo Koppers. Gilberto Caldart é o novo presidente da MasterCard Brasil. Além disso, o executivo ocupará o cargo de vice-presidente de Contas Regionais, e assumirá a responsabilidade das operações da companhia no Peru, Bolívia e Venezuela. O fabricante de produtos de cobre do Grupo Luksic, Madeco, elegeu Cristián Montes Lahaye para ocupar o posto de gerente geral após a renúncia de Tiberio Dall’Olio. Montes ocupou a gerência geral da filial Alusa e foi gerente de finanças em Madeco. José Bastón é o novo presidente de Televisão e Conteúdos do Grupo Televisa. Bastón, que ocupava a vice-presidência corporativa de Televisão do grupo, será o responsável da produção de conteúdos e sua comercialização, tanto no México como no estrangeiro.


MOVIMENTOS Sindicato todo terreno RESULTA PARADOXAL. O MÉXICO, país onde 22% das crianças vivem em condições de extrema pobreza e onde igual porcentagem dos jovens entre 12 e 29 anos – ou 35 milhões – não tem acesso à educação ou ao trabalho, recentemente foi o palco da “doação” de 59 caminhonetes Hummers aos dirigentes do Sindicato Nacional de Trabalhadores da Educação. Cada automóvel custa cerca de US$ 42 mil. Por trás do evento estava a líder sindical Elba Esther Gordillo, que rapidamente garantiu que os veículos serão rifados para a obtenção de recursos a serem investidos em infra-estrutura de escolas. Apesar da explicação, o ato foi fortemente criticado pela sociedade mexicana e muitos garantem que é apenas uma ação a mais de Gordillo visando à preservação de seus aliados. “Antes, o incentivo eram candidaturas a deputado, senador ou cargos públicos através do PRI”, diz Aldo Muñoz, sociólogo da Universidade Iberoamericana. Mas como agora já não há tantos cargos para distribuir, os “incentivos” derivaram em singelos presentes como “cruzeiros ao Caribe e viagens à Europa”, diz Muñoz. Como controlar esse arroubo? Segundo Muñoz, é impossível, porque o sindicato tem a faculdade de administrar suas finanças de forma independente e ao governo convém manter as boas relações com os mestres.

ARLY FAUNDES B. / CIDADE DO MÉXICO

Com sede em Genebra, o Fundo Mundial de luta contra o SIDA, Tuberculose e Malária é uma instituição pública/privada única que investe enormes quantias de recursos financeiros em programas direccionados para a prestação de serviços de prevenção, tratamento e cuidados a pessoas afectadas pelas três doenças mais mortíferas do mundo. Com uma carteira de subvenções totalizando mais de $10 biliões, o Fundo Mundial cresce rapidamente indo de encontro à demanda antecipada dos seus recursos. Departamento de Programas dos Países é o maior Departamento no Secretariado, sendo responsável pela negociação e gestão das subvenções do Fundo Mundial, de todas as operações dos países, e actua como interlocutor primário entre o Fundo Mundial e os países. Procuramos excelentes candidatos para as seguintes posições a partir de 2009:

GESTORES DE CARTEIRA OFICIAIS DE PROGRAMA ASSISTENTES DE CARTEIRA A equipa de Proposta dos Países (CPT) do secretariado do Fundo Mundial, é responsável pela gestão de uma série de produtos resultantes da iniciativa de propostas do Fundo Mundial, revisão técnica, e recomendações para os processos de financiamento. O CPT procura fornecer soluções profissionais, com enfoque no cliente, e de gestão de propostas inovadoras para um vasto número de clientes. Procuramos candidatos qualificados para a seguinte vaga:

OFICIAL DE PROPOSTAS, EQUIPA DE PROPOSTAS DOS PAÍSES (8 POSTOS) Para mais informações e outras oportunidades no Fundo Mundial, consulte directamente o www.theglobalfund.org/en/jobs/


ESPECIAL

MINISTROS

DE FINANÇAS

Discípulos de José Um painel de 140 economistas da América Latina avalia o desempenho dos gestores de finanças públicas da região e quão preparados estão para enfrentar estes tempos turbulentos AméricaEconomia Intelligence

Q

uando José interpretou o sonho do Faraó, como relata o livro do Gênesis na Bíblia, com certeza nunca imaginou que dava uma das maiores lições de finanças públicas de todos os tempos. É uma tarefa que alguns dos ministros de Finanças da região vêm repetindo, como um verdadeiro mantra: “guardar recursos para épocas de vacas magras”. E essa época chegou. No momento em que os mercados acionários mundiais sofrem uma volatilidade extrema, os países desenvolvidos encaminham-se a uma recessão e o crédito se restringe, a capacidade de administrar as finanças públicas de forma adequada será essencial para reduzir o impacto da crise em nossas economias. Quem são os mais bem-preparados? Para dar essa resposta, formamos um painel com 140 economistas da região que responderam, através de e-mail, um questionário sobre a gestão pública das finanças. Os resultados estão refletidos neste segundo ranking Melhores Ministros de Finanças, fruto da percepção dos especialistas sobre o desempenho desses gestores. Desta vez, quem leva o primeiro lugar é o ministro da Fazenda do Chile, Andrés Velasco. De acordo com os especialistas participantes, Velasco é, de longe, quem conta com as melhores ferramentas para empreender uma política anticíclica nesses tempos de crise, que no país se reflete na queda do preço do cobre, principal produto de exportação do Chile, de US$ 3,2 a US$ 1,8 a libra. Tal fato não afetou o humor do ministro. O país conta com dois fundos de reserva que – em 30 de junho – somavam US$ 21,22 bilhões (12,6 do PIB). Pela primeira vez o Chile terá um orçamento expansivo em época de recessão. E apesar de a idéia do superávit estrutural ser atribuída à equipe financeira do governo anterior, Velasco tem levado esse princípio com o mesmo rigor que José no Egito. O segundo lugar é do mexicano Agustín Carstens, um dos principais promotores da reforma tributária e energética que o Estado mexicano finalmente conseguiu levar adiante. O terceiro lugar do ranking é de Luis Valdivieso, do Peru, que,

7,8

apesar de estar a poucos meses no cargo, já conseguiu transmitir confiança ao mercado de que o país continuará avançando em uma administração cuidadosa da macroeconomia e impulsionando reformas. Já o quarto lugar ficou com Guido Mantega, do Brasil, que apesar de não demonstrar a mesma liderança identificada em seu antecessor, Antonio Palocci, transmitiu a confiança necessária para levar o País ao grau de investimento conquistado este ano.

Avaliação ministerial Notas de desempenho FONTE: PAINEL DE ESPECIALISTAS, AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE (siglas referem-se à extensão usada para identificar o país na internet)

10 9 8

7,8 7,4 7,0

7

6,7 6,7 6,1 6,1 5,9 5,9 5,9

6

5,1 4,9

5 3,8

4

3,5 3,4

3,2 2,8 2,8

3 2 1 .cl .mx .pe .br .co .gt .uy .cr .pa .sv .do .py .hn .ni .bo .ec .ve .ar

Os especialistas convidados a formar o painel tiveram que avaliar a gestão dos ministros com notas entre 1 e 10, em cinco aspectos: estabilidade macroeconômica, impulso a reformas prócompetitividade (crescimento), liderança da equipe econômica e envio de sinais de confiança à cidadania, aos empresários e aos investidores. Este último ponto é extremamente relevante em

Andrés Velasco,

Agustín Carstens,

ministro da Fazenda, Chile

secretário da Fazenda e Crédito Público, México

O país conta com a melhor política fiscal anticíclica da região, com reservas de mais de US$ 21 bilhões.

22 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

7,4

É valorizado por impulsionar a reforma tributária e a energética que modernizará a Pemex.


ESPECIAL

MINISTROS

DE FINANÇAS momentos como o atual, com Chile, México e Peru encabeçando a lista. Um sinal de confiança, por exemplo, é que o peruano Luis Valdivieso tenha conseguido sobreviver ao escândalo de corrupção que envolveu o gabinete inteiro em outubro passado e que forçou a saída de ministros em outros cargos-chave. Esse talvez seja o motivo de Alan García ter nomeado um novo primeiro-ministro de esquerda, Yehude Simon, mantendo, entretanto, o mesmo rumo em assuntos fiscais. Valdivieso afirmou recentemente que conta com um fundo de estabilização fiscal de US$ 1,2 bilhão para enfrentar o atual panorama. Na outra ponta do ranking, os ministros da Fazenda da Argentina, Venezuela e Equador tiveram sua gestão reprovada tanto por analistas locais quanto por estrangeiros.

quatro países tiveram uma nota de risco neste sentido. Justamente aqueles que já despencaram em seus índices de risco país: Argentina, Bolívia, Equador e Venezuela. Outra característica importante ao classificar a gestão de um ministro de Finanças é que este impulsione reformas que contribuam para melhorar a competitividade do país no longo prazo. Ou que, do ponto de vista dos resultados, crie condições para que seu país registre um aumento da taxa de crescimento potencial. Neste aspecto, muitos não passaram na prova. Pois, se a nota média de nossos ministros de Finanças em estabilidade macroeconômica é 5,5, em reformas eles tiveram 4,8. O vencedor nessa matéria é Agustín Carstens, do México, país que conta com a reforma tributária e a energética. Apesar

Em momentos em que os mercados mundiais sofrem uma volatilidade extrema, alguns ministros se encontram mais bem-posicionados do que outros para enfrentar as conseqüências.

Timão firme

Lento, mas seguro

Notas relativas à confiança que os ministros inspiram

Notas à estabilidade macroeconômica FONTE: PAINEL DE ESPECIALISTAS, AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

FONTE: PAINEL DE ESPECIALISTAS, AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

10

10

9

9 8,1 8

7,0 6,6

7

6,5

6,4

6,0 5,8 5,8 5,8

7,0 6,6 6,4 6,4

6,1 6,1

5,8 5,8 5,3

5,0

5

5 3,6

4

3,2 3,0 2,5 2,3

2,1

2

1

1 .cl .mx .pe .co .br .sv .gt .uy .cr .pa .py .do .ni .bo .hn .ec .ve .ar

E para confirmar o fato, que já é quase um clichê, de que América Latina está mais bem-preparada do que nunca para enfrentar uma crise mundial, as avaliações em relação à manutenção de um bom grau de estabilidade macroeconômica situaram quase todos os países com nota acima de 5. Somente

3,0 3,0 2,9 2,9 2,5

3

2

7,0

7,3

6 4,4 4,3

3

8,0

7

6

4

8,3

8

7,4

.cl .mx .pe .co .br .uy .gt .sv .cr .py .pa .do .ni .bo .hn .ve .ec .ar

de existirem vozes que apontem que a reforma energética recentemente aprovada no México foi diluída para conseguir sua aprovação no Congresso, essa não deixa de ser considerada um passo significativo num país que sempre se opôs às mudanças na indústria petrolífera. Tal reforma permitirá melhorar o de-

Luis Valdivieso,

Guido Mantega,

ministro de Economia e Finanças, Peru

ministro da Fazenda, Brasil

Com pouco tempo no cargo, já é reconhecido como garantia de políticas responsáveis no governo de Alan García.

Carece da liderança de seu antecessor, mas conduziu as finanças do País ao valorizado grau de investimento.

6,7

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 23


ESPECIAL

MINISTROS

DE FINANÇAS Espírito de líder

Reformistas e conformistas

Notas à liderança sobre a equipe econômica

Notas ao trabalho pró-reformas

FONTE: PAINEL DE ESPECIALISTAS, AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE FONTE: PAINEL DE ESPECIALISTAS, AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

10 9

10 8,0

9

7,8

8

8

6,9 6,6 6,5 6,4 6,3

7 6

6,0 6,0 6,0

7

5,7

6,7 6,6 6,2

5,3 5,3

6

5

5,5 5,5 5,5 5,4 5,3 4,8 4,8 4,7

5

3,8 3,7

4

7,1

3,1 3,0 3,0

4

3

3

2

2

1

3,8 3,7 3,5 3,0 2,5 2,1

1 .cl .mx .gt .pe .co .cr .br .py .uy .sv .do .ni .pa .bo .hn .ve .ar .ec

.mx .cl .pe .br .gt .sv .co .cr .do .uy .pa .ni .py .hn .bo .ec .ar .ve

sempenho da estatal Pemex e, considerando a dependência do governo federal da receita do petróleo, é um ponto importante para Carstens. Já a reforma tributária aprovada no ano passado permitiu ao governo elevar seu orçamento para este ano a US$ 234 bilhões, um recorde histórico, e Carstens já anunciou que o orçamento de 2009 será ainda maior. Finalmente, um bom ministro de Finanças tem que demonstrar liderança nos planos econômicos do governo e lidar com as demandas de seus pares em cartei-

ras como trabalho, desenvolvimento social, educação, saúde e energia. Tal relação é que vai medir sua liderança na condução econômica, e ao mesmo tempo é com eles com quem terá que implementar sua política econômica. Por isso que é importante que a liderança não consista apenas em mandar, mas também em convencer de que aquilo que se propõe em Finanças está na direção correta. Neste aspecto, novamente os ministros do Chile e do México obtêm as melhores notas, embora não sejam poucos os avaliados acima de 6, como o ministro brasileiro Guido Mantega, quem tem tido que manter as rédeas firmes para que o Brasil mantenha suas

A liderança não consiste somente em mandar, mas em convencer o restante do gabinete de que aquilo que é defendido por sua pasta, que administra as finanças públicas, está na direção correta.

Héctor Alexander,

Óscar Zuluaga, min. da Faz. e Crédito Público, Colômbia

ministro de Economía e Finanças, Panamá

6,7

6,1

Um dos artífices do plano que permitirá ao Panamá manter altas taxas de expansão, inclusive na crise.

6,1

O ministro tem enfrentado problemas devido aos déficits registrados antes mesmo do estouro da crise.

Juan Fuentes,

Álvaro García,

ministro de Finanças Públicas, Guatemala

ministro de Economia e Finanças, Uruguai

Está entre os mais bemavaliados em liderança sobre a equipe econômica, atrás dos ministros do Chile e do Brasil.

O contador assumiu recentemente, mas atribuem a ele conquistas de seu antecessor, Danilo Astori.

24 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

5,9


ESPECIAL

MINISTROS

DE FINANÇAS William Hándal,

Guillermo Zúñiga, ministro

ministro da Fazenda, El Salvador

da Fazenda, Costa Rica

5,9

O ministro recebeu boas notas em liderança e estabilidade, mas o mercado não o reconhece como um reformista.

metas fiscais em ordem, além de dirigir a equipe econômica que finalmente conseguiu o valiosíssimo grau de investimento para o País. Vale destacar o fato de que o ministro de Finanças da Guatemala, Juan Alberto Fuentes Knight, tenha ficado no terceiro lugar nessa matéria. Com certeza terá uma boa oportunidade de demonstrar a sua liderança em 2009, já que se espera que para então o governo impulsione uma importante reforma tributária que poderia enfrentar uma forte oposição do setor privado. Independentemente da gestão dos ministros de Finanças ou de se a política monetária é independente ou não do poder político, também perguntamos aos especialistas sobre o desempenho dos países em política monetária. O país mais bem-avaliado é o México, com 7,6, seguido de Brasil e Peru, ambos com 7,5. Logo estão Chile e Colômbia. Os piores – e não é de se estranhar - foram Venezuela, Honduras e Argentina, todos com taxas de inflação de dois dígitos. Na América Central, os preços continuam subindo além da conta, em média 14%, com a Nicarágua como o país com a inflação mais alta (22,8%) e El Salvador com a menor taxa (8,7%). Um fato curioso é que países como Costa Rica e Guatemala obtenham uma nota de nível médio, embora a inflação não ceda. Mas, em épocas de vacas magras, a inflação se torna uma preocupação de segunda ordem, já que quando se contrai a demanda a alta dos preços tende a diminuir, e inclusive pode temer-se uma deflação. As verdadeiras preocupações neste caso são o emprego e o crescimento. A teoria das finanças públicas propõe como regra de ouro que o gasto público seja contracíclico: que cresça menos que o PIB em anos de vacas gordas, para dar espaço de crescimento ao setor privado e não pressionar a inflação, e que se expanda mais que o produto em anos de vacas magras, para compensar o espaço que deixa o setor privado na parte baixa do ciclo. No papel soa muito fácil, mas na prática não é tanto. A maior parte das vezes, quando chega a recessão, o Fisco não tem os recursos para aumentar o gasto e a única alternativa para não

Em época de vacas magras, o aumento dos preços internos passa a ser uma preocupação de segunda ordem, já que quando a demanda se contrai a inflação tende a reduzirse.

O país lançou um plano de investimento público recorde, apesar de que sua execução não foi tão rápida quanto se esperava.

5,9

Do dito ao feito Desempenho da política monetária e da inflação FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE E FONTES OFICIAIS

País

Nota PM

Inf. Set. 2008

México

7,6

5,5

Brasil

7,6

6,3

Peru

7,5

6,2

Chile

7,1

9,9

Colômbia

7,0

7,6

Paraguai

6,6

9,1

Costa Rica

5,5

15,8

Uruguai

5,4

7,5

El Salvador

5,0

8,7

Guatemala

5,0

12,8

Rep. Domin.

4,3

14,6

Bolívia

4,0

14,5

Equador

3,8

8,9

Argentina

3,8

25,0

Honduras

3,7

13,7

Venezuela

2,9

36,1

Panamá

N.D.

10,0

Nicarágua

N.D.

22,8

baixá-lo é se endividar. Mas os mercados se fecham ou cobram sobretaxas, então a única opção é bater na porta do FMI. Para fechar o círculo, em épocas de vacas gordas os países devem pagar a dívida contraída com o Fundo Monetário Internacional, o que reduz sua capacidade de poupança. Essa história lhe parece familiar? O próximo ano será um ano para quebrar o cofrinho e propor um orçamento expansivo. Lamentavelmente nem todos vão poder fazer uma gestão contra-cíclica porque alguns faraós não levaram a sério a advertência de José, pensaram que as vacas gordas iriam durar para sempre. ■ 17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 25


ESPECIAL

MINISTROS

DE FINANÇAS

Andrés Velasco, Chile: “A política fiscal deve e pode ser o amortecedor do choque externo” “Fazemos a distinção entre receita permanente e transitória” Quais serão os efeitos da crise dos mercados financeiros mundiais na América Latina e no Chile? É provável que as economias avançadas se contraiam em 2009. Os países emergentes, entre eles os latino-americanos, serão os motores do crescimento mundial. O Chile continuará crescendo, apesar das turbulências internacionais. Qual será o papel da política fiscal? A política fiscal deve e pode ser o amortecedor do choque externo. Para isso, é necessário credibilidade e capacidade de financiamento. O Chile possui ambos. Usaremos ativamente a política fiscal, e especialmente o investimento em infra-estrutura. O orçamento para 2009 contempla um crescimento real de 8,8% em obras públicas e infra-estrutura. Além de prover capacidade produtiva no médio prazo, estimula o emprego e a atividade econômica. O mundo deve avançar a um cenário de mais regulação? Há mais de duas décadas o Chile aprendeu a lição de que os mercados financeiros requerem regulação e supervisão estritas. Por isso hoje temos bancos fortes e bem capitalizados. O Chile demonstrou que um país emergente pode combinar uma abertura econômica e o necessário uso dos mercados para fornecer recursos com a regulação que corrija potenciais falhas de mercado. Os resultados estão à vista. Qual tem sido o papel da política contracíclica que o Chile aplica há alguns anos na atual conjuntura? Desde o começo desta década o Chile desenha e aplica sua política fiscal com critérios de longo prazo. Fazemos a

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distinção entre receita permanente e transitória; gastamos a primeira e poupamos a segunda. Isso nos permitiu grandes superávits fiscais e importante poupança pública no período do auge do preço do cobre, que hoje temos restaurada em dois fundos soberanos. Hoje o Chile tem mais de US$ 25 bilhões nesses fundos, que são administrados pelo Banco Central de acordo com as políticas de investimento sugeridas por um comitê independente. Essa poupança nos permite olhar com tranqüilidade à atual conjuntura internacional. Os países devem avançar a uma maior diversificação produtiva? Como? Nossa política fiscal contracíclica, somada à presença de um banco central autônomo, um câmbio flexível e um sistema financeiro bem capitalizado nos permitem amortizar o impacto na mudança dos preços das commodities. Mesmo com tudo isso, o Chile tem avançado e continuará avançando na diversificação, tanto de produtos exportados quanto de mercados internacionais. O Chile possui acordos comerciais com economias que representam 86% do PIB mundial, entre elas quase todas as da América Latina, da América do Norte, da Europa, economias asiáticas como Japão, China, Índia, Coréia do Sul e Cingapura. A região também registra baixos índices de investimento em pesquisa e desenvolvimento, tanto do setor público quanto do privado. O que é preciso fazer para estimular essa atividade? Há vários anos o Chile vem abordando esse desafio. No começo do governo da presidente Michelle Bachelet, o gasto total em inovação era de 0,7% do PIB. Aspiramos levá-lo a 1% do PIB. E, o que é igualmente importante: não apenas o setor público é quem deve gastar mais, mas o setor privado também tem que fazer um esforço muito maior. Nos países avançados, para cada dólar que o Fisco gasta em P&D, a iniciativa privada gasta dois. Na América Latina, essa relação costuma ser inversa. Por isso criamos um crédito tributário no Chile igual a 35% do valor dos contratos de pesquisa para que as empresas privadas negociem com as universidades ou centros tecnológicos. A idéia é que estas duas fontes de conhecimento não apenas conversem, mas comecem a produzir juntas. O que o Chile precisa fazer para aprofundar e modernizar seu mercado de capitais? Em 2006 o país aprovou uma reforma fundamental de seu mercado de capitais. Fortalecemos o capital de risco e o capital semente, criamos novos instrumentos e fortalecemos a supervisão do sistema. Há pouco tempo o governo anunciou uma reforma adicional, para expandir o financiamento às pequenas e médias empresas através da securitização e de outros mecanismos inovadores, aprofundar nosso mercado de renda fixa e completar o ciclo de integração do mercado chileno ao internacional. E esses anúncios foram muito bem-recebidos pelo mercado. ■


ESPECIAL

MINISTROS

DE FINANÇAS

Guido Mantega, Brasil: “Não vamos queimar cartuchos” “O País tem condições de manter o atual ciclo de crescimento” Não há risco de perder o controle da inflação devido ao regime de metas que vem sendo adotado pelo governo brasileiro. Obviamente que num cenário de crise global os índices podem variar, mas o esforço do governo é que a inflação fique no centro da meta. Quando houve o choque das commodities, em meados de agosto deste ano, adotamos medidas para frear a economia e conter a inflação. O governo lançou mão de uma política fiscal que envolveu o aumento da meta de resultado primário, redução do imposto de importação para commodities que tiveram seus preços elevados, com impacto nos preços globais (fertilizantes, trigo, aço, etc.). Quanto à taxa de juros, o Banco Central tem dado mostras de que tem agido corretamente ao manter a Selic num patamar que permita o controle da inflação sem impedir o ritmo do crescimento. Já é possível fazer uma estimativa aproximada do que deverá ser 2009 para a economia brasileira? O Brasil tem condições de manter o atual ciclo de crescimento, ainda que sejam necessários alguns ajustes. Nos últimos anos o ritmo de crescimento do PIB foi de 6%; esse ritmo pode cair um pouco. Vamos resolver os problemas emergenciais de crédito e, conforme eu falei, fazer políticas anticíclicas para mitigar os riscos da crise internacional na economia brasileira. ■

AP

O que muda nas diretrizes básicas da política econômica e monetária brasileira no médio e no longo prazo? Não existe intenção do governo de mudar as diretrizes, apenas realizar ajustes pontuais, conforme temos agido até o momento. Vamos manter o regime de metas fiscais e de inflação. Vamos continuar ‘interferindo’ no mercado conforme os problemas se apresentem e elaborando uma política anticíclica, com o Fundo Soberano à frente. Acredito que a forma mais aguda da crise que travou operações financeiras em todo o mundo está passando. A crise é grave, prolongada, sistêmica e mundial, ou seja, atinge todos os mercados e todos os países do mundo. Quais os riscos que o País sofre? O Brasil tem condições favoráveis e uma economia mais dinâmica que continua crescendo, ainda que num ritmo menor. Nossa agricultura tem vantagens competitivas, com alta produtividade e potencial de crescimento. Nossas reservas internas têm sido suficientes para enfrentar a escassez de dólares e temos compulsório elevado, o que, em situações normais, poderia ser considerado um defeito, mas que agora é uma virtude porque é reserva de liquidez em reais de 260 bilhões. Além disso, contamos com reservas de petróleo e de gás para garantir o fornecimento interno. Nossas exportações são para mercados diversificados. O comércio exterior brasileiro representa apenas 13% do PIB, por isso uma crise global não nos afeta tanto. Outro fator que ajuda o Brasil a enfrentar a crise de forma menos ‘traumática’ é que temos uma regulação financeira maior que nos Estados Unidos e na Europa o que nos dá solidez ao sistema. Alguns economistas defendem que, além de garantir linhas de crédito, o governo deveria reforçar a poupança pública através do corte de despesas. O senhor concorda com essa análise? As respostas do governo para a restrição de crédito são conhecidas e reafirmo que novas medidas somente serão adotadas se houver necessidade. Não vamos queimar cartuchos. Quanto ao orçamento para 2009, é possível que algumas adequações sejam efetuadas, como revisão de receitas e despesas. Mas é bom destacar que, até o momento, não há necessidade de mexidas de emergência. A meta do governo é manter os níveis de investimentos e preservar os gastos na área social. Se houver necessidade de cortes, eles serão pulverizados, atingindo um pouco de cada área onde é possível cortar. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) será preservado. O país corre o risco de perder o controle da inflação, em função do repasse da valorização do dólar aos preços dos produtos no mercado interno?

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NEGÓCIOS MEDICINA DE GRUPO

DINHEIRO NÃO É PROBLEMA Apesar de ter a carteira cheia, a operadora de planos de saúde Amil não consegue ir às compras Dubes Sônego, São Paulo

Também recente foi a divulgação de que a Medial, outra empresa com ações na BM&F Bovespa, dona de 1,4 milhão de clientes e vendas de R$ 1,63 bilhão em 2007, estaria para ser comprada pela Amil, o que gerou desmentidos de ambas as partes. Em tom de contra-ataque, Emílio Carazzai, presidente da Medial, chegou a declarar que sua empresa é que pretendia adquirir a concorrente, que faturou R$ 3,5 bilhões, no ano passado. Em ocasiões distintas, Avimed, Golden Cross e Samcil, foram outras empresas de porte significativo que distribuíram notas à imprensa negando a venda ou negociações de venda para a concorrente abastada. Além dessas, não restam muitas opções no time das grandes. “Mais de 90% das empresas de medicina de grupo são de pequeno porte”, diz Arlindo de Almeida, presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), que reúne 250 operadoras de planos de saúde. “Apenas umas 20 empresas contam com 100 mil ou mais beneficiários”. Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o Brasil tem atualmente 1.773 operadoras de planos de saúde ativas. São, porém, na maioria, pequenas empresas com pouco mais de uma dezena de milhares de clientes, com baixíssima probabilidade de

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SETOR FRAGMENTADO: Apenas 20 empresas contam com mais de 100 mil clientes

sobrevivência. Pelo preço que valem, poderiam ser compradas pelas grandes facilmente. Mas a possibilidade de esconderem problemas as torna pouco atrativas. “Comprar operadoras no Brasil afora dá muito trabalho e não rende o suficiente”, diz Paulo Hirai, consultor de saúde privada da Milliman. Um dos receios das empresas maiores é a queda de produtividade. Segundo Hirai, muitas das pequenas empresas do setor foram fundadas por

grupos de médicos que, enquanto sócios, costumam dar o sangue para tocar o negócio. Com a venda para um grupo maior, os mesmos deixam de trabalhar as 12 horas por dia que costumavam e a alta produtividade que aparecia nos números do balanço despenca. “Outras vezes, existem passivos ocultos”, diz o consultor. Um problema comum para as pequenas empresas é suportar as chamadas “ocorrências de baixa freqüência e alto impacto”. Em

LATINSTOCK

A

Amil, umas das maiores operadoras de planos de saúde do Brasil, com cerca de 3 milhões de beneficiários, enfrenta um dilema incomum. Aos 29 anos de fundação, no final de 2007, a empresa decidiu abrir capital e levantou cerca de R$ 950 milhões na operação, quase metade do total para investir em expansão. Foi uma das IPOs mais bem-sucedidas da história recente da BM&F Bovespa. Passado quase um ano, porém, a Amil ainda não conseguiu fechar a compra de nenhum concorrente de peso. Adquiriu apenas dois planos de saúde e dois hospitais. E conta ainda com R$ 1,2 bilhão em caixa. Dinheiro, no caso, não foi o problema. E, contrariando a anedota, também não será a solução. A grande dificuldade, no momento atual, é encontrar empresas de porte que valham a pena e que estejam dispostas a ser compradas. Em setembro, Paulo Sérgio Barbanti, presidente da Intermédica, uma das estrelas da medicina de grupo no País, com cerca de 3 milhões de beneficiários em planos de saúde e odontológicos, disse à imprensa que pretende encontrar um sócio investidor para adquirir 49% de participação em sua empresa. Porém, avisou que os planos não incluem a venda para concorrentes nacionais. O que procura são fundos estrangeiros.


termos leigos, tratamentos ou procedimentos cirúrgicos nos quais os equipamentos, drogas e profissionais envolvidos podem custar centenas de milhares de reais, o suficiente para enterrar o lucro de meses, se não anos, de uma pequena operadora de planos de saúde. Pedro Fazio, dono da Fazio Consultoria em Saúde, tem uma visão semelhante. Para ele, o mercado já está enxuto. Tirando da conta da ANS empresas operadoras de planos de saúde odontológicos e entidades filantrópicas, restariam hoje no mercado por volta de 1,2 mil operadoras de planos de saúde. Mas, este número já chegou a ser de 3 mil, antes que medidas da agência reguladora e fusões eliminassem boa parte do total. “Há umas cinqüenta operadoras com tamanho expressivo. O que falta é absorver os pequenos grupos que ainda teimam em atuar”, afirma o consultor. Segundo ele, os que estão à venda, normalmente, têm muitos problemas. “Como os que estavam em certo equilíbrio já foram comprados nos últimos anos, é preciso olhar com lupa os restantes.” Por isso, tudo indica que desatar os nós que dificultam a consolidação no setor será uma tarefa de paciência. A consolidação do mercado tende a ocorrer, mas deverá ser mais lenta do que muitas empresas gostariam que fosse. “É inevitável que haja um processo de consolidação, porque este é um negócio que precisa de escala”, diz Fazio. “O custo operacional das pequenas corresponde a 25% das vendas, com lucro de 1%, em média. Nas grandes, a relação é de 15% para 3%”, afirma Hirai, que acrescenta: “boa parte das empresas ainda é rentável. Mas, no interior, quem está bem sabe que é porque a

concorrência ainda não chegou. As grandes vão ter que entrar comprando mercado e, para fazer isso, terão que oferecer preços e condições melhores que as disponíveis.” Crescer de forma orgânica, contudo, também implica obstáculos significativos para as líderes. Uma das razões apontadas por especialistas para o sucesso de empresas como a Amil é justamente seu modelo de negócios verticalizado, que inclui o controle de hospitais, laboratórios, clínicas e outras estruturas de atendimento. Tal modelo permite à empresa controlar melhor os custos, principalmente tratando pacientes crônicos dentro de casa. “Na Amil, 1% dos clientes representa 40% dos custos”, diz Daniel Gewehr,

em regiões de menor concentração populacional é o adotado pelas seguradoras de saúde. Empresas do gênero montam uma rede credenciada de médicos, hospitais, clínicas e laboratórios, pagando um valor pré-definido por procedimento realizado pelos clientes. O lado negativo deste modelo é que o número de fraudes, como a cobrança por procedimentos não realizados ou a cobrança em duplicidade, costuma ser bastante alto, diz o consultor. Esta seria uma das razões pelas quais as seguradoras conseguem atuar relativamente bem junto aos públicos das classes A e B. Mas, enfrentam dificuldade para baixar preços e alcançar classes mais baixas. E “a classe C é onde estão 86 milhões de habitantes; é a

planos de autogestão médica, como os de grandes empresas estatais. Competidores com esses perfis representam, respectivamente, 27,2%, 10,5% e 11,5% do mercado de saúde suplementar brasileiro (todos os tipos de planos de saúde privada), segundo dados da Abramge. Com uma fatia de 35,1%, em 2007, as 670 empresas de medicina de grupo do país, do qual faz parte a Amil, somavam 16,2 milhões de beneficiários, 77,1% deles de planos coletivos, o restante de planos de saúde individuais ou familiares, movimentando R$ 15,5 bilhões – média de R$ 77,9, por mês, por usuário. Apesar das dificuldades para compra de empresas, porém, a situação ainda não parece preocupar os investidores da

Pedro Fazio: como os que estavam em certo equilíbrio já foram adquiridos nos últimos anos, é preciso olhar com lupa os restantes. analista do banco Santander, responsável pela cobertura do setor de saúde. A questão é que o modelo verticalizado funciona muito melhor em grandes centros, como Rio de Janeiro e São Paulo, onde a Amil há demanda maior que a oferta por serviços do gênero que em pequenas e médias cidades. “Não adianta comprar hospital em regiões onde uma empresa não tem um número de associados que justifique a manutenção desse custo fixo”, afirma o presidente da Abramge, a respeito do problema de interiorização enfrentado pelas que adotam o modelo, sem referir-se especificamente ao caso da Amil. Segundo Hirai, o modelo mais comum de crescimento

classe que pode ser atacada com o crescimento econômico do País”, diz Almeida, da Abramge. Por ora, nada indica que o número de clientes disponíveis no mercado irá aumentar de forma a permitir que a alternativa de crescimento através de aquisições seja ignorada. Em um mercado praticamente estagnado em 40 milhões de beneficiários, excluindo-se da conta planos odontológicos, crescer de forma orgânica significa tirar clientes da concorrência. Algo que pode ser custoso e demorado. Além de outras empresas de medicina de grupo, a Amil e suas principais concorrentes têm que disputar espaço com cooperativas médicas, seguradoras de saúde e

Amil. Dona de fundamentos sólidos, como margem Ebitda de 10,9% (R$ 227,3 milhões) e lucro líquido de R$ 168,6 milhões, no primeiro semestre, a companhia é bem vista por analistas como Gewehr, do Santander, que considera seus papéis atrativos, mesmo na crise atual. “As ações caíram, mas se você for comparar com a queda do índice Bovespa, tiveram desempenho muito bom”, diz. Quanto à dificuldade de aquisições, porém, o analista pondera: “prefiro que eles façam aquisições, porque o índice de retorno sobre o investimento deles é de cerca de 20%.” Hoje, o dinheiro está aplicado em títulos públicos, rendendo a taxa básica de juros (Selic), ou seja, 13,75%. ■

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NEGÓCIOS CIMENTO

Zambrano: buscando o caminho

PLANO RACHADO A mexicana Cemex colocou em marcha um programa para enfrentar a crise global e a dívida Marisol Rueda, Cidade do México

“D

efinir claramente para onde se vai, focar as variáveis que se pode atingir e não as que fazem mais ruído.” Essas foram as palavras pronunciadas por Lorenzo Zambrano, presidente e diretor geral da fabricante mexicana de cimento Cemex, ao receber em maio deste ano uma distinção de Excelência em Liderança na escola norte-americana Stanford,

onde obteve um MBA. Definir o rumo é exatamente a meta que a Cemex deverá abraçar, já que 2008 provou ter sido um ano para se esquecer: as ações da empresa caíram 70% nos últimos 12 meses, suas operações na Venezuela foram desapropriadas pelo governo de Hugo Chávez, e a classificação da dívida da companhia foi rebaixada.

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As coisas mudam muito em um ano. Antes, os elogios a Zambrano vinham de todos os lados. O mexicano regia com sucesso a monumental expansão da Cemex, respaldada pela histórica aquisição da Rinker, fornecedora australiana de materiais de construção, por US$ 15,3 bilhões, colocando a terceira fabricante mundial de cimentos em três dos mercados

mais quentes do mundo no setor da construção: Estados Unidos, Espanha e Reino Unido. Agora, seus três principais mercados, que representam 38% das suas vendas e 30% de seu Ebitda, estão em crise, o peso mexicano cambaleia e a empresa sofre por sua dívida que se triplicou, de US$ 6 bilhões a aproximadamente US$ 18 bilhões com a compra da Rinker. De qualquer forma, há motivos para acreditar que a companhia, uma das empresas latino-americanas mais globalizadas do mundo, poderá recuperar-se graças à fortaleza do mercado local mexicano e tirando proveito daqueles mercados que até agora têm sido menos importantes para ela. Primeiramente, a companhia precisa sair do círculo vicioso que a levou ao rebaixamento de sua classificação de crédito. O prognóstico negativo em seus três mercados principais afetou os resultados financeiros, que por sua vez afetaram a geração de fluxo, que afetou a capacidade de pagamento da dívida. E isso gerou o rebaixamento. Em meados de outubro, a Standard & Poor’s alterou a classificação de Cemex de BBB a BBB-, ainda com grau de investimento. “As operações se debilitarão devido ao entorno econômico, mas acreditamos que a companhia vai gerar fluxo de dinheiro disponível para o pagamento da dívida”, diz Eduardo Uribe, analista da Standard & Poor’s. “Mas talvez o montante da dívida que eles vão pagar não seja tão grande quanto esperávamos.” Vale lembrar que o compromisso da Cemex era reduzir seu nível de dívida de 4,2 vezes o Ebitda no final de 2007 a 2,7 vezes nos dois anos seguintes. A empresa não respondeu ao convite para comentar a respeito.


Já outra classificadora, a Fitch, não é tão otimista. No final de outubro, rebaixou a qualificação da dívida da empresa a BB+, ou seja, nível especulativo, o que afetará a capacidade da empresa de emitir dívida de curto prazo em termos mais atraentes. E, para agravar o quadro, a empresa também sofreu as conseqüências da aposta em instrumentos derivativos. O plano da Cemex era, através deles, poupar US$ 300 milhões em pagamento de juros, mas sua festa acabou no fim de setembro, quando sua exposição a derivativos cambiais a fez perder US$ 711 milhões. A empresa tratou de reduzir sua exposição eliminando 70% dessas posições e agora busca reduzir o nível da dívida em dólares e aumentar a em pesos mexicanos para, com isso, emendar seu erro.

para reduzir a dívida. Esta venda, junto à de seus ativos na Hungria e Austrália, bem como uma empresa telefônica no México, somam US$ 2 bilhões. E a Cemex também espera receber o dinheiro da desapropriação de suas operações na Venezuela. Os analistas afirmam que os derivados e a dívida são temas que a companhia têm

2007 e 2012 prevê um investimento de US$ 250 bilhões para projetos de aeroportos, ferrovias, rodovias, portos, telecomunicações, água e energia. Embora o PNI tenha sido bastante criticado por lentidão, estima-se que nos próximos meses o governo colocará o pé no acelerador para atenuar o contágio da crise global. E a Cemex de-

MEDIDAS DE CONTINGÊNCIA A Cemex também adotou um programa de diminuição de custos de cerca de US$ 500 milhões. As iniciativas deste plano, para até o fim de 2008, incluem a redução de orçamento, o fechamento de operações não-rentáveis e a redução de 10% da folha de pagamento global, equivalente a 6 mil trabalhadores. A companhia não especificou em que países vai reduzir o número de empregados, mas estima-se que seja nos mercados que já apresentam menor atividade. Nesta linha, a empresa também anunciou que em 2009 seus investimentos de capital serão de US$ 850 milhões, valor notavelmente menor que os US$ 2 bilhões deste ano. A Cemex também espera concluir a venda de seus ativos na Áustria em dezembro, recursos que serão utilizados

No Reino Unido, as vendas da empresa caíram13% de janeiro a setembro. controlados. Além de contar com uma quantidade importante de ativos, sua capacidade de geração de fluxo é notável. “Estimamos que este ano seu fluxo de dinheiro vai chegar a US$ 2,8 bilhões, e em 2009 será um pouco menor”, diz Rodrigo Heredia, analista do IXE Grupo Financiero. Se a presença em outros mercados permitiu a Cemex driblar com êxito a crise do efeito Tequila em 1994, agora será o mercado doméstico quem permitirá à empresa sobreviver à atual conjuntura. O otimismo no México se deve ao Programa Nacional de Infra-estrutura (PNI), do Governo Federal, que entre

tém quase 50% do mercado de cimento nacional. E os indicadores da companhia no país são muito bons. Nos últimos 12 meses, a margem de Ebitda tem oscilado entre 35% e 40%. Embora sejam esperados crescimentos marginais para a empresa, não se prevê nenhum tipo de mudança. “A companhia continua operando, continua fazendo suas entregas, e não deveria haver nenhuma mudança”, diz José Coballasi, analista da Standard & Poor’s. Embora tenha sofrido uma contração no terceiro trimestre devido a uma menor atividade econômica e às condições climáticas pouco favoráveis,

ainda apresenta forte demanda. Hoje o país registra um déficit de 5 milhões de imóveis, e a cada ano se soma uma demanda adicional de 750 mil unidades. Já o investimento em infra-estrutura aumentou 7% no país durante o primeiro semestre, e a Cemex estima que tal tendência continuará nos próximos meses. “No México, os setores imobiliários e de infra-estrutura vão ser os mais fortalecidos”, diz Octavio Campos, diretor de informação e desenvolvimento da consultora Bimsa Reports. A contração da construção no México não se compara com a dos Estados Unidos. Durante os três primeiros trimestres do ano, as vendas de cimento e concreto da Cemex no México sofreram redução de 4% e 8%, respectivamente, em relação ao mesmo período de 2007. Nos EUA, tais porcentagens foram de 10% e 2%. No entanto, estes resultados foram acentuados substancialmente pela inflação nos insumos. Na Espanha, a redução foi de 25% e 21%. E, no Reino Unido, ambos os produtos registraram queda de 13%. Paralelamente, a Cemex ainda tem oportunidades nos mercados da América Latina, África e Ásia. O peso individual destes é menor, mas são mercados emergentes que, embora devam se estabilizar com a crise, estão em bom ritmo. “O principal desafio agora é explorar ao máximo a boa perspectiva que tem no resto de seus mercados (que somam 62% de suas vendas) e atenuar ao máximo o impacto negativo que haverá nos Estados Unidos, Espanha e Reino Unido”, diz Heredia, do IXE. “Tudo depende de como você queira ver o copo: meio vazio ou meio cheio.” ■

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NEGÓCIOS ESPORTE

Diego Rodríguez, Ricardo Fandiño e Carlos Londoño: transperência e lucro

JOGADA NA BOLSA Inspirada no modelo chileno, empresa colombiana quer levar os times de futebol locais ao mercado de capitais Lucía Valdés, Bogotá

O

dia em que a camisa do Colo-Colo, time mais popular do Chile, entrou no campo da Bolsa de Valores de Santiago, o obscuro panorama financeiro vislumbrado pela maioria dos clubes do continente se iluminou. Em 24 de junho de 2005, pelas mãos do

fundo de investimentos Larraín Vial, o time conhecido como “cacique” começou a cotizar ações cheio de glória, ainda que para isso tenha necessitado da aprovação de uma lei que criou as sociedades anônimas esportivas, medida que deu vida à sociedade Blanco y Negro,

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hoje dona do clube que nasceu em 1925. Em poucos meses, apagou o passivo de US$ 30 milhões de suas contas e permitiu a entrada de capitais de grandes investidores, como o empresário e candidato presidencial Sebastián Piñera. O exemplo gerou uma

inquietação positiva nas federações de futebol da vizinhança, pois mostrava como um clube podia livrar-se de suas dívidas e se converter em uma esquadra com finanças sólidas e uma respeitável valorização na bolsa. Entre os mais interessados em replicar


o negócio estiveram os executivos colombianos da empresa Corredores Asociados, que no país trabalham conjuntamente com a Larraín Vial em outros negócios. Diego Rodríguez, vice-presidente de moeda estrangeira, e Carlos Londoño, vice-presidente de bancos de investimento, pensaram que tal estratégia poderia mudar a cara da companhia na América Latina. “Na Colômbia, o governo tem a iniciativa de converter es equipes de futebol em sociedades anônimas, através de um projeto de lei que está sendo examinado nessa legislatura”, diz Rodríguez. Um negócio rentável e transparente para a economia e o futebol.

SEM ESTIGMA Depois de analisar a idéia com seus sócios, a companhia formou uma equipe de trabalho, cujo braço legal é o escritório de advogados Gómez Pinzón Zuleta, e o de comunicação, a Dattis Comunicaciones. Essa é a primeira parte do processo. Agora estão convencendo os presidentes dos clubes locais de futebol mais importantes sobre as vantagens de chegar à bolsa para saldar dívidas e capitalizar-se. De quebra, o futebol colombiano poderia acabar com o estigma que por anos marcou muitos clubes que se viram envolvidos em denúncias de lavagem de dinheiro. O clube Millonarios, de Bogotá, por exemplo, sofreu uma intervenção da Direção Nacional de Narcóticos, e o América de Cali há pouco tempo chegou a ser incluído na “Lista Clinton”, relação de nomes dos principais barões do narcotráfico colombiano e de suas empresas. A questão é como chegar à bolsa. A primeira mudança deverá ser no status da maio-

ria dos clubes colombianos, que são corporações sem fins lucrativos, e dessa forma não poderiam se inscrever na bolsa de valores. “O futebol é um negócio e temos que lhe dar a estrutura necessária para que funcione como tal”, diz Londoño. Ele admite que o modelo está desenhado para aqueles clubes que, como o Independiente Santa Fe ou o Atlético Nacional, tenham capacidade de levar uma nutrida torcida ao estádio, bem como contar com uma marca reconhecida. Um dos mecanismos para que cotizem na bolsa é adiantar um processo indireto, inspirado no modelo chileno, no qual uma empresa privada faz uma emissão de bônus ou ações e assina um contrato de administração com o clube.

vigilância?”, diz Jorge Colmenares, presidente do escritório de Inspeção, Vigilância e Controle da Coldeportes – instituição que planeja, rege e coordena o Sistema Nacional do Esporte na Colômbia. Para ele, os times se converteriam em simples estádios e as sociedades anônimas entrariam para assumir todo o negócio através de um contrato de comercialização. Colmenares prefere o mecanismo jurídico contemplado no projeto de lei em avaliação no Congresso que permite a conversão dos clubes de futebol em sociedades anônimas. Diz que conta com todo o arcabouço jurídico e tributário necessário para que os clubes passem a ser entidades com fins lucrativos, bem como o aval de instituições como

dos e que possam cotizar na bolsa; isso vai fazer com que o negócio se torne mais claro e transparente”, admite. Os conselheiros dos clubes também parecem simpatizar com a idéia. Víctor Marulanda, presidente do Atlético Nacional, diz que se trata de um assunto importante para o futebol, pois “significa que existe outra forma de capitalizar o clube, e ela permite levantar muito mais recursos”. Enquanto governo e privados discutem a forma de garantir dividendos ao negócio, todos concordam que se trata de uma oportunidade que não pode ser desperdiçada. Levando-se em conta que, segundo cifras do Departamento Nacional de Estatística, no ano passado os colombianos

Governo e privados querem aproveitar melhor o potencial de negócios que o esporte pode trazer ao país. A idéia está sendo avaliada e os candidatos sabem que precisam assumir uma estrutura financeira transparente. “Se o processo for bem-sucedido, romperá paradigmas, porque até agora as companhias que entram na Bolsa de Valores da Colômbia são grandes empresas, enquanto os clubes de futebol não o são”, afirma Rodríguez, que se mostra convencido de que esse negócio, que envolve paixão, pode ser muito rentável se bem-administrado. Mas não falta quem questione tal modelo. “Se os clubes constituem uma sociedade anônima que cotiza em bolsa, esta seria vigiada pela Superintendência Financeira, que não é um organismo esportivo. Assim, até onde chegará nossa

a Dimayor, a Federação de Futebol e a Superintendência de Sociedades. A iniciativa apresentada pelo governo exige que os clubes esportivos tenham um mínimo de cinco sócios para operar e propõe que um time (não importa se da primeira ou segunda divisão) tenha um capital base de 1001 salários mínimos, ou seja, US$ 207.733. Luis Bedoya, presidente da Federação de Futebol, diz que o modelo atual está se acabando em todo o mundo. “Há gente interessada em investir no futebol e aportar importantes capitais, mas naturalmente busca lucro. É o modelo que funciona na Europa, que é onde mais entra capital. Que sejam sociedades anônimas, mas com dividen-

gastaram 2% do PIB em entretenimento, algo como US$ 3 bilhões, e que a receita dos times colombianos em bilheteria não alcançam os US$ 100 milhões ao ano, o potencial vislumbrado é grande. “É um negócio gigantesco, e a fatia do futebol nesse negócio pode ser muito maior; esse é o potencial do negócio que estamos apresentando aos banqueiros de investimento”, diz Diego Rodríguez, da Corredores Asociados. E essa também é a aposta dos clubes, que não só contariam com dinheiro para operar como uma empresa e gerar lucro a seus acionistas como poderiam melhorar sua estrutura financeira para concorrer no mesmo nível das grandes ligas de futebol. ■

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NEGÓCIOS ALIMENTOS

Quarentena: indústria piscicultora já registra prejuízos

ATAQUE DO VÍRUS USA A crise sanitária na indústria do salmão no Chile se soma à do país do Norte Francisca Vega, Santiago

A

vida do chileno Álvaro Jiménez transcorre entre o ar e a água. Como gerente geral para o Chile da norueguesa Marine Harvest, ele acumula milhas com suas viagens de avião entre EUA, Europa e Chile. E quando chega a Santiago, viaja outra vez a um tranqüilo povoado no sul onde estão os salmões cultivados pela empresa número 1 do mundo em sua produção. Mas quem pensa que a vida de Jiménez é quase idílica se engana redondamente. Suas preocupações, como as da maioria dos executivos

das grandes companhias do Chile, já não se limitam ao temido vírus ISA, doença que pode terminar com a vida dos peixes. Agora a crise financeira nos EUA – segundo destino dos salmões chilenos, depois do Japão – deixou muitas companhias com problemas de crédito, um drama para uma indústria sedenta de capital devido à sua estrutura de custos e ao extenso ciclo produtivo. Inclusive, muitos já batizaram a crise de “o vírus USA”. Os estragos feitos pelo ISA já não eram poucos. Depois

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do primeiro brote do vírus, em 2007, foram eliminadas 11.066 toneladas de salmão no país. Com 22% dos centros em quarentena, 6% infectados, 7% classificados como “sob suspeita” e 13% em descanso sanitário, companhias do setor e afins registram números vermelhos e já somam 4 mil demissões. “Apesar de ser difícil estimar, as perdas àindústria devido ao ISA são da ordem de US$ 500 milhões por produtos não-vendidos”, diz Jiménez. O executivo sabe do que fala. Em 2006, a Marine Harvest estimava que a produção chilena chegasse a 140 mil toneladas em 2009. Hoje, a previsão é de 40 mil. “a diferença equivale a mais de US$ 350 milhões”, conta. Segundo uma análise da Fitch Ratings, devido ao ISA, há uma forte queda na rentabilidade por tonelada de salmão vendido. Um exemplo: a Marine Harvest – primeira empresa que informou às autoridades da presença do ISA em sua produção – perdeu US$ 1.577 por tonelada nos primeiros seis meses do ano, reduzindo a rentabilidade em 1.651% em relação à alcançada no primeiro semestre de 2007. A crise financeira chegou na pior hora. Estimativas da SalmónChile, associação que

reúne as maiores empresas do setor que operam no país, indicam que em 2009 se poderia registrar uma redução entre 15% e 20% no total das exportações de salmão, devido a uma queda na produção do chamado salmão Atlântico, um dos mais consumidos pelos norte-americanos, europeus e latino-americanos, especialmente os brasileiros. “Além disso, a situação que o país atravessa permite pensar que ao menos em 2008 e 2009 a produção nacional apresentará decréscimo”, diz Waleska Donoso, analista da Fitch Ratings, em Santiago. Alguns falam que a crise financeira trará a consolidação do setor, quarto na lista das exportações chilenas – depois das indústrias de mineração, florestal e frutícola. “É de se esperar que o processo de aquisições por parte das companhias de maior envergadura continue”, diz o chileno Germán Serrano, analista do Banchile Inversiones, em Santiago. “Apesar de agora ser arriscado e beirar o delírio, a Marine Harvest buscará novos investimentos no país”, afirma Jiménez. Isso porque o Chile é, depois da Noruega, um dos lugares mais aptos do mundo para esse cultivo, devido à sua posição geográfica. Seja como for, o executivo diz que o vírus tarda ao menos quatro anos para erradicar-se, e em 2011 as cifras de crescimento dos anos anteriores poderão ser retomadas. Por isso, não é de estranhar que, como acontece no mar, os grandes possam engolir os menores em uma só mordida. ■


NEGÓCIOS TECNOLOGIA

INOVAÇÕES EMERGENTES Com a cana como base de uma nova química industrial, a Dupont aposta no Brasil Dubes Sônego, São Paulo

ALEXANDRE BATIBUGLI

N

os últimos anos o Brasil viu a violência ganhar escala e contornos capazes de transformar artigos de segurança caríssimos em sonhos de consumo até mesmo para a classe média. O fato não passou despercebido à Dupont. Fabricante do Kevlar, tecido usado em coletes à prova de balas, a companhia acaba de lançar no País o Armura, um sistema de blindagem para carros, resistente a tiros de armas de baixo calibre, voltado justamente a esse público. O lançamento faz parte de uma estratégia de expansão relativamente nova na companhia. Depois de passar os primeiros 200 anos de sua história dedicada a desenvolver soluções tecnológicas de ponta para as maiores economias do mundo, a Dupont decidiu, nos últimos cinco anos, aproveitar seu know-how para explorar os mercados emergentes. A idéia é criar soluções para problemas de cada país ou região, como o que deu origem ao Armura, no Brasil, onde a empresa cresceu 30% no primeiro semestre deste ano em relação ao mesmo período de 2007. De acordo com os resultados mais recentes divulgados pela Dupont, 26% do faturamento mundial, ou pouco mais de US$ 7 bilhões, já vêm de países emergentes. Um per-

centual que deverá crescer na medida em que a companhia lançar novos produtos com base em tecnologia própria e, em função disso, praticamente sem concorrentes diretos. Nesse cenário, o Brasil é peça estratégica para os planos da companhia. De acordo com Eduardo Wanick, presidente da Dupont na América Latina e responsável pela Emerging Markets Growth Initiative, toda uma nova geração de processos e produtos envolve algum tipo sofisticado de fermentação com base em açúcar. E “o Brasil é o maior produtor de açúcar do mundo e quem o fabrica com o preço mais competitivo.” Neste campo encontram-se projetos como o desenvolvimento do biobutanol. Entre 23% e 28% mais eficiente que o etanol, o produto tem como vantagem o fato de não se misturar com a água. Isso facilitaria sua adoção em países europeus onde a distribuição de combustíveis é feita através de dutos, e não de caminhões, nos quais há acúmulo de água devido à umidade, que por sua vez poderia diluir o etanol. Por outro lado, a desvantagem do biobutanol é a complexidade de sua produção. “Estamos justamente desenvolvendo um processo eficiente para a fermentação do açúcar destinado à fabricação

Wanick: segurança e açúcar

de biobutanol. Será algo que uma planta de etanol poderá usar no futuro para converter sua capacidade de produção tradicional de etanol para biobutanol”, diz Wanick. Segundo o executivo, a Dupont estima que o produto alcance escala industrial comercial em cerca de quatro anos. “Hoje, já existe em laboratório”, afirma, desenvolvido em parceria com a BP, antiga British Petroleum. Até lá, a empresa jogará com outras cartas. Mais recentemente, lançou no mercado o bio-PDO, um polietileno tereftalato (PET), no qual a sacarose

do milho substitui o glycol. O produto é capaz de substituir o nylon; tem alguma elasticidade e alta resistência a manchas, o que o faz particularmente interessante para a fabricação de carpetes. Segundo Wanick, nenhum fabricante latinoamericano foi ainda licenciado para fabricar o Sorona, como foi batizado o bio-PDO pela empresa. Mas há negociações em andamento. ■

VEJA ÍNTEGRA DA ENTREVISTA COM EDUARDO WANICK EM WWW.AMERICAECONOMIA.COM.BR

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NEGÓCIOS MERCADO DE CAPITAIS

Bancos concentram quase 80% das transações

CLUBE S.A. Alguns atores começam a ver com bons olhos a possibilidade de desmutualizar a bolsa chilena María Soledad Gómez, Santiago

I

magine se você tivesse que participar da propriedade de uma estrada para transitar por ela? Certamente, ela se tornaria privilégio de poucos. Algo parecido é o que acontece com a Bolsa de Valores de Santiago, onde só participa quem é dono. Ou seja, uma corretora que deseja operar na bolsa chilena tem que comprar uma ação que vale US$ 3 milhões (1,63 bilhão

de pesos chilenos, segundo a última venda, de agosto de 2008). Mas, talvez inspirado na experiência da brasileira Bovespa, o mercado já está pensando em transformações. Em julho, a Bolsa Eletrônica do Chile (BEC), uma das três que operam no país, propôs ao regulador uma mudança no estatuto que a levará, talvez antes do fim do ano,

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a acabar com o requisito de propriedade para exercer corretagem em sua plataforma. O gerente geral da BEC, Juan Carlos Spencer, explica que o processo faz parte de sua estratégia para 2012 e que até agora só contempla as duas primeiras etapas do que se observa em uma desmutualização. “Acabará a limitação de que para ser corretor é preciso ser acionista”, explica. Além disso, “cada ação será dividida em 100 mil partes para ter um floating interessante na bolsa”. E ainda que afirme que não estão fazendo um aumento de capital, também garante que as ofertas de ações ou alianças com investidores estrangeiros são possibilidades abertas no futuro. O caso da BEC está aquecendo o debate. Mesmo com uma lei que desde 2007 permite a desmutualização, até pouco tempo o tema não despertava interesse. O superintendente de Valores e Seguros, Guillermo Larraín, afirma que uma iniciativa nesse sentido daria mais transparência ao mercado. “O desenvolvimento do mercado de capitais tem relação com transformar sua institucionalidade no âmbito privado em esquemas prómercado.” Para Javier Vergara, da Ernst & Young Chile, isso geraria mais concorrência entre as corretoras, reduziria os custos das transações e se poderia gerar um mercado mais diversificado e líquido. Inclusive capitais estrangeiros poderiam participar. Além disso, “as bolsas desmutualizadas tendem a crescer mais”, diz Roberto Darrigrandi, professor da Universidade del Desarrollo e gerente de assessoria da corretora Tanner. Mas por que a Bolsa de

Santiago não avança na mesma linha? Muitos buscam a resposta nos bancos, donos de nove corretoras, que concentraram 80% dos quase US$ 620 bilhões negociados na bolsa entre janeiro e setembro de 2008. “A bolsa não tem nenhum mercado de derivativos, os bancos os têm todos”, argumenta o gerente de uma corretora não-bancária que preferiu não se identificar. Jorge Errázuriz, sócio da Celfin Capital e um dos diretores da Bolsa de Santiago, se transformou no cavaleiro solitário da desmutualização. Claro, a Celfin é uma corretora que não depende dos bancos para funcionar. Errázuriz acha que há consenso entre os corretores. “O que me interessa é que a bolsa ganhe valor”, diz. “A Bovespa, por exemplo, passou a valer mais de US$ 10 bilhões.” Segundo o sócio da Celfin, “a bolsa chilena chegou apenas aos US$ 150 milhões”. Errázuriz inclusive propõe avançar a uma fusão entre as três bolsas do país. “O Chile tem que chegar a outros mercados com uma só cara.” De qualquer forma, ele não preside o conselho da bolsa e não foi possível contar com a opinião de outro representante. E se a vontade de um só diretor não basta, Darrigrandi afirma que é preciso criar incentivos concretos. “Por um lado, poderia haver um maior impulso por parte do governo, ou, definitivamente, um grupo mais forte de privados que pressione para que o restante se junte, pelo menos à discussão.” Enquanto os operadores locais ainda esperam discutir o tema, as rodas mundiais giram no mesmo sentido. ■ -Com Francisca Vega


VISÃO VERDE afaundes@americaeconomia.com

ECOLOGIA SEM JET-LAG Companhia aérea mexicana adota medidas para reduzir o impacto ambiental de seus vôos

indicada”, explica Beltranena. Essa economia também se traduz em redução de custos. “a diferença na tecnologia de 20 anos para cá é dramática”, diz Beltranena. “O que nos dá uma vantagem.”

A ROTA VERDE DA VOLARIS Airbus 320

MENOS CUSTO

Menos emissão de CO2 por Km2 Menos consumo de combustível

34,09 m

9% mais assentos por avião Rotas mais curtas e eficientes

11,76 m

Serviço de bordo frio

37,57 m

40 km

Aeroporto de Toluca

Toluca

Cidade do México

DF N

redução de 36% no tempo

de percorrer a pista

Menos poluição acústica e atmosférica

Atendimento mais tranqüilo no aeroporto

Orgânica

Inorgânica

Cultura organizacional verde

ABAIXO A POLUIÇÃO Esses quatro pilares ambientais acompanham a filosofia com a qual a Iata (Associação Internacional do Transporte Aéreo, na sigla em inglês) enfrenta a mudança climática: tecnologia, operações, infra-estrutura e incentivos econômicos. Segundo o Painel Intergovernamental de Mudança Climática (IPCC), ao melhorar as operações dessas companhias se poderia economizar combustível e reduzir as emissões de CO2 em 6%. “Nosso objetivo é

alcançar 25% de melhoria na eficiência do combustível para 2020 em relação a 2005”, diz Steven Lott, diretor de comunicações da América do Norte da Iata. Como suas rotas, o ponto de partida da política verde da Volaris é o Aeroporto de Toluca. O menor tráfego de aviões permite que a poluição acústica e de CO2 seja menor. O tempo de percurso do avião na pista é 36% menor em Toluca que no Aeroporto Internacional da Cidade do

México, o que colabora para uma menor poluição. A frota operada pela Volaris – a mais jovem da América Latina, com média de 2,1 anos – é formada por Airbus A319 e A320, os quais por sua estrutura e operação geram 34% menos de CO2 por km2 do que um McDonnell Douglas MD-80, bem mais antigo. “Nossos aviões têm um sistema pré-seletivo de carga de combustível e um sensor volumétrico que permite que o sistema libere a quantidade

VÍCTOR JAQUE

A INDÚSTRIA DA aviação é responsável por 2% das emissões de CO2 no mundo, e para 2050 se estima que essa cifra chegará a 3%. Ainda que possa parecer pouco, dentro dessa indústria já existem iniciativas para reduzir tal impacto, sobretudo focadas nos combustíveis fósseis. No México, a companhia aérea Volaris desenvolve diferentes estratégias ambientais, apoiadas no tipo de frota com a qual opera e no uso alternativo do Aeroporto de Toluca, a 40 km da Cidade do México. “Desenvolvemos um trabalho com base em quatro pontos: no vôo, no aeroporto, no uso de tecnologia e na forma como operamos a bordo”, diz Enrique Beltranena, diretor geral da Volaris. Tudo isso para reduzir a emissão de CO2 e a poluição acústica. “Esse não é um tema tão perigoso, mas pode causar distúrbios de sono”, comenta.

Arly Faundes Berkhoff, Cidade do México

Tais características da frota da Volaris ainda estão alinhadas com a filosofia low cost que deu origem à companhia, que também traz conseqüências positivas no impacto climático. As companhias de baixo custo em geral têm 9% mais de assentos por avião do que uma aeronave tradicional – por não ter cozinha – e o fator de carga é mais alto. O que se complementa com rotas mais curtas e eficientes e menos uso de combustível e de emissões atmosféricas. O serviço de bordo também tem representado um grande aporte ao projeto da companhia, já que ao não contar com comida quente não demanda a utilização de fornos, reduzindo o consumo de combustível, além de não usar água ou detergente. Os snacks oferecidos ainda têm outra vantagem; geram 30% menos de lixo em relação ao serviço tradicional, que é separado entre orgânico e inorgânico. E, para concluir a cadeia pró-meio ambiente, a Volaris desenvolve programas para conscientizar seus funcionários e criar uma cultura corporativa verde. “Há pessoas que voam conosco porque sabem desse diferencial”, garante Beltranena. ■

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PMES GLOBAIS

CORTE PRECISO Analistas alertam pequenas e médias empresas a ter cuidado com sua política de redução de custos para enfrentar uma desaceleração em 2009 Solange Monteiro, Santiago, Ilustrações Soledad Tirapegui

D

esde o ano 2000, quando lançou ao mercadoo uma máquina de reciclagem em de cartuchos de impresssora por um sistema a vácuo, a empresa paraibana Paraí não parou de crescer. Com um sistema inovador que garantia mais qualidadee aos cartuchos reutilizados, s, os números da empresa de Luciano Piquet se multiplicaplicaram rapidamente: somente nte nos primeiros três anos do negócio, egócio, vendeu 1,3 mil máquinas, que representaram a reciclagem de 6 milhões de cartuchos e uma economia à época, segundo a empresa, de R$ 138 milhões na importação de novos. Hoje,

Se não consegue visualizar alguma tendência futura para seu setor, não tome decisões conjunturais.

Caso identifique a possibilidade de retração do mercado em que atua, priorize investimentos que tragam retorno no curto prazo, para garantir um colchão de liquidez. O restante, se liquid possível, postergue. possí

com 120 funcionários, faturamento de R$ 15 milhões e previsão de crescimento de 20% – devido em parte ao aumento das exportações – o engenheiro civil já tem sua estratégia de negócios definida para 2009: “Vamos aproveitar o momento de crise para reforçar o marketing da economia proporcionada por nosso produto e buscar novos nichos que ainda eram resistentes à reciclagem”, diz.

38 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

Essa janela de oportunidade identificada por Piquett e o apelo inegável de seu produto, entretanto, não são vantagens com as quais todas as pequenas e médias empresas latinoamericanas podem contar. Frente à enxurrada de notícias apocalípticas que inundaram os meios de comunicação desde o final de setembro, muitas paralisaram pela dúvida, entre elas as que vislumbravam um alto potencial de crescimento e já não sabiam mais o que fazer com seus projetos para 2009. “Além de nossas empresas consultadas atualmente, há muitos ex-clientes que vêm perguntar sobre como reagir”, conta Jorge Peralta, diretor do Centro Pan-Americano de Investigação e Inovação (Cepii), na Cidade do México. E tal preocupação é justificada. Segundo Peralta, esse momento de incerteza pode ser crucial para as empresas e, se não for bem equacionado, poderá reverter-se em uma queda de crescimento desnecessária. “Muitas correm o risco de tomar decisões conjunturais, sem dimensionar como a crise lhes pode afetar e, pior, pensando automaticamente em cortar gastos que mais podem prejudicar a competitividade do negócio

Esteja atento a cortar custos que não agreguem valor a seu cliente.

do que melhorar sua condição em um momento de retração de mercado”, alerta. Segundo vários especialistas latino-americanos, a primeira dica que as empresas devem ouvir ao buscar o divã de um consultor é: manter a serenidade. “Em geral, essas empresas não estão envolvidas na bolsa, nem têm influência na cotação do dólar. Assim,

Busque flexibilizar custos que não fazem parte do negócio principal (como com o outsourcing de atividades secundárias e um programa de remuneração variável).


têm que aprender a parar de sofrer com o que não tem poder de alterar”, diz Luiz Eduardo Ferreira Henriques, gerente do programa Parceiros para

Não se resigne apenas a cortar: busque alternativas criativas de como faturar mais.

a Excelência Paex (Paex) da Fundação Dom Cabral, em Minas Gerais. A segunda, é que não adianta chorar se ainda não implementou um sistema de gestão eficiente que inclua a administração de custos. “Custo é como unha: se não cortar sempre, cresce. E quem não tem uma administração eficaz, não é na crise que irá consertar isso: vai fenecer.” Para empresas que já têm a máquina azeitada, o foco é realizar um estudo sobre quais custos cortar sem prejudicar “o valor agregado ao cliente”, lembra Henriques. No caso da empresa de Piquet, “não deixamos de fazer um estudo detalhado do que podemos reduzir sem atingir o faturamento”, diz. “Assim, o primeiro objetivo será reduzir o estoque de peças

pela metade, para R$ 1 milhão, para garantir capital de giro”, diz. Com isso, o empresário ainda espera ganhar uma vantagem adicional. “Como nossa matéria-prima é o ferro, também apostamos em uma queda do preço no mercado, para comprá-lo posteriormente em melhores condições”, diz. No Chile, o empresário John Kauke, da fabricante de produtos de consumo Tresko – entre eles, ração para mascotes – revelou no blog do site da AméricaEconomia que usou de maleabilidade ao preparar o orçamento para 2009. “Nós o filtraremos através de vários cenários para afinar nossa visão quanto a oportunidades e necessidades de cortar ou expandir categorias de custos e investimentos”, afirmou. Patricio Cortés, diretorexecutivo do Centro para o Empreendimento e Inovação da Universidad del Desarrollo, em Santiago do Chile, lembra

Esteja atento à conquista de novos mercados.

melhor postergá-los.”

Na ofensiva

Potencialize o mercado doméstico com inovação: vendendo mais e melhor a seus clientes.

que sobretudo as empresas de rápido crescimento se caracterizam por ser altamente sensíveis aos ciclos econômicos, e por isso precisam contar com uma grande capacidade de ser flexíveis. “Se não estão armadas rmadas de vantagens de custo o e tecnologia, terão dificuldades”, ades”, diz. “Nesse sentido, elas precisam poder trabalhar har com um alto percentuall de custo flexível, que pode ser alcançado, por exemplo, com o outsourcing das áreas que não fazem parte doo negócio central ral e com uma política de remunerauneração variável.” el.” Quanto aos planos de investimentos novos, analistas indicam que, se estes já não estão em curso, é preciso ser seletivo. “Em um cenário de crise, o ideal é priorizar aqueles que dêem retorno no curto prazo, para garantir um colchão de liquidez”, diz Henriques. “Os outros,

O fato de criar uma forte trincheira, segundo os especialistas, não significa, porém, que os empresários deverão esconder-se nela esperando o fim da crise. “Cortar custos é importante, mas esse é apenas um elemento da equação: também é fundamental pensar em como aumentar as vendas em um cenário adverso; é preciso reinventar-se”, diz o mexicano Peralta. Bem o sabe a brasileira Tele Design, especializada em estruturação de redes de telecomunicações. Criada em 1996, spin off da divisão de engenharia de uma operadora de TV a cabo, para instalar redes de expansão para esse serviço, a empresa sofreu uma

Tome cuidado com políticas de demissão, pois podem trazer queda na produtividade: devido ao ambiente de incerteza entre os funcionários e os custos que implicarão a capacitação de novos, caso os necessite em um curto espaço de tempo.

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PMES GLOBAIS

Acentue o trabalho em equipe para motivar os funcionários a pensar conjuntamente em formas de tornar a empresa competitiva em um cenário adverso.

forte crise de demanda entre 2002 e 2003. “Ainda que não fosse devido a um contexto global, mas local, tivemos que aprender a diversificar, ampliando nossos serviços para o setor de telecom”, conta Humberto Katro. Hoje, a empresa – que foi responsável pelo sistema de distribuição de sinais de TV no último GP de Fórmula 1 no Brasil – registra faturamento de R$ 14 milhões (2007) e crescimento de 126% entre 2005 e 2007, com previsão de 40% em 2008. “Graças à convergência e ao triple play, novas demandas foram geradas, e já não é mais tão supérfluo ter TV a cabo”, comenta Katro. Como boa parte das empresas do setor de serviços, o item mão-de-obra é o principal insumo da Tele Design – e, conseqüentemente, o mais sensível. “Buscamos capacitar nossos funcionários aqui dentro mesmo”, diz o empresário, acrescentando que a empresa investe anualmente até 2% de seu faturamento em treinamento. Assim, além de um

mon monitoramento mais criterioso dos investimentos, rio a primeira medida a ser adotada caso haja uma retração nas vendas – “o que não acreditamos que acontecerá, devido à alta demanda reprimidda no País”, frisa Katro – é atrasar os planos de novas contratações. E conov mo tal realidade não escapa do olhar dos funcionários, e para evitar a formação de um ambiente hostil, há três anos a empresa adota uma política de transparência que inclui reuniões mensais com eles. “Com isso, além da troca de idéias, percebemos a compreensão clara deles quando há desligamentos que são inevitáveis e quando são por problema de performance”, diz, evitando assim a boataria que afeta em cheio a produtividade. Para Enrique Van Rysselberghe, diretor da rede internacional de empresas Paex da Universidad del Desarrollo, no Chile, esse é um passo fundamental. “Incentivar o debate dentro da empresa de como chegar ao melhor custo, com grupos de trabalho, a partir dos conhecimentos que eles têm da operação é a melhor forma de fazê-los sentirem-se responsáveis por tornar a empresa mais competitiva.”

Sempre aperfeiçoar E se é verdade que quem não estruturou sua gestão para agüentar a época de crise corre risco de morrer, também é certo que melhorar continuamente os processos de uma empresa com foco na produtividade é uma premissa que não se pode deixar atrás em nenhum momento. “Dentro do varejo, onde atuo, é comum em um momento

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de crise o empresário ater-se a ganhos questionáveis de corte. Assim, as melhores práticas de gestão podem desmoronar e seu reinício posterior pode ser penoso.” O mesmo se pode dizer da necessidade cada vez maior do investimento em tecnologia da informação no apoio às tomadas de decisão de forma estratégica. “As empresas se perguntam se estão dispostas a investir em tecnologia numa época em que a economia cobra vital importância. Mas hoje é uma realidade: a tecnologia é 100% necessária para garantir a continuidade de um negócio”, afirma Carlos Muñoz, gerente geral da Linux Latin America, que promove a plataforma de código aberto. No Peru, Cesar Peñaranda Castañeda, economista da Câmara de Comércio de Lima, afirma que às pequenas e médias empresas do país urge aproveitar o atual momento para investir mais do que nunca em melhorias de gestão e produtividade. “Somente assim se pode impulsionar o crescimento no longo prazo”, diz. “Apesar sar de uma estimativa de queda da do PIB peruano para 2009 9– estimado em 6,7% – o cenário ainda é positivo, e as empresas precisam aproveitar para melhorar seus processos antes de correr riscos em um ambiente de maior desaceleração”, disse. Para Castañeda, “é nesse se momento que elas têm que fortalecer sua estrutura interna nterna e começar a buscar novos caminhos no exterior, o que ainda é pouco explorado pelas empresas locais e, sobretudo, aproveitar o bom momento que vive o país para potencializar ao máximo as vendas internas.”

Para Peralta, esse é um exercício que se deve fazer continuamente. “Sempre é preciso pensar em quais mudanças se pode fazer na proposta de valor de um produto, tendo claro por que certas pessoas o compram e outras não”, diz. Foi o que a empresa chilena Nutrabien, fabricante de snacks doces como cookies e brownies. “Em 1998 vivemos uma situação semelhante, e buscamos conquistar os clientes com novos produtos a preços mais acessíveis”, conta a empresária Isabella Jaras. “Depois disso, focamos em ter uma posição sólida, sem dívidas”, conta. Uma preocupação importante, também ressaltada por Peralta. “Um professor me dizia que quando as águas de um rio secam deixam aparentes as pedras da ineficiência. Elas é que devem ser atacadas. E por isso tem que ser inovador”, exemplifica. Afinal, com ou sem crise, a máquina não pára, e a fórmula para mantê-la funcionando sempre está em descobrir como continuar crescendo. ■

Aperfeiçoar processos também é sinônimo de ganho de competitividade.


DEBATES IMIGRAÇÃO

DANÇA DAS REMESSAS Para muitos centro-americanos nos Estados Unidos, o sonho americano desvanece e a economia de seus países começa a sofrer Arly Faundes Berkhoff, Cidade do México

N

inguém disse que seria fácil, mas tampouco que, de uma hora para outra, tudo iria ladeira abaixo. Essa é a sensação de uma grande parcela de imigrantes hispânicos nos

EUA que estão perdendo seus trabalhos, e em alguns casos até suas casas, como efeito da crise norte-americana. “Meu marido, José, renunciou a seu trabalho para criar uma empresa própria

AP

Dólares escassos: o dinheiro não viaja

e, como não foi bem-sucedido, voltou a ser vendedor”, conta a dominicana Ysabel Vázquez, em Miami. O ajuste econômico vivido pela família Vázquez não afeta apenas sua casa em Miami, mas cruza a fronteira e chega à família de José na República Dominicana, a quem ele enviava, religiosamente, US$ 200 mensais. Agora, quando dá, José manda US$ 50. E essa é uma realidade que se estende a muitas outras famílias centro-americanas que vivem nos Estados Unidos. Segundo o Fomin (Fundo Multilateral de Investimentos) do BID e os bancos centrais dos respectivos países, as remessas enviadas desde os EUA representam 1,6% do PIB do Panamá e 20,8% do de Honduras – o índice mais alto de toda a América Latina – passando por 2,1% na Costa Rica e 7,1% na República Dominicana. No caso dominicano, 37% dos domicílios recebem remessas de, em média, 1,8 pessoas no exterior, segundo pesquisa de Manuel Orozco, a cargo do Programa de Remessas e Desenvolvimento do Inter-American Dialogue, em Washington. Segundo essa mesma pesquisa, no caso de Honduras, trata-se de 32% dos lares, onde as remessas representam 75% da renda. “Minha estimativa é a de que para 2009 essas transferências diminuam 10%”, diz Orozco. “As implicações são a redução do consumo, da poupança e dos investimentos.” As projeções são pouco otimistas. Recentemente, o Fomin publicou uma estimativa que indica que o volume total de remessas que a América Latina receberia em 2008 teria um crescimento nominal de 1,5%, chegando a US$ 67,5 bilhões. Entretanto, dado o ajuste infla-

cionário, o montante estimado para este ano valerá 1,7% menos que o do ano passado, registrando assim a primeira queda de valor desde o ano 2000, quando o Fomin começou a monitorar os fluxos. “O fato é que pela primeira vez vimos cifras negativas em países como El Salvador e Guatemala”, diz Natalia Bajuk, a cargo do Programa de Remessas. O país mais prejudicado poderá ser Honduras, pelo alto percentual que as remessas representam no PIB. “Estamos falando de um dos países mais pobres da região e tal contração poderia ser muito forte”, diz Luis Sanz, professor do Incae na Nicarágua. Para Sanz, o problema está no perfil dos receptores das remessas. São quase 60% mulheres, e 75% da renda se destinam ao consumo. Assim, isso causaria um menor consumo interno e o aumento do nível de pobreza. “Muita gente que recebe remessas representa a camada mais pobre da população, e esse dinheiro ajuda a compensar a baixa renda”, diz Sanz. De fato, segundo o professor, metade dos receptores de remessas tem entre 18 e 35 anos e quase 90% não têm grau universitário. No caso da Nicarágua também há conseqüências, ainda que menores, já que a origem das remessas está diversificada entre Estados Unidos e o restante da América, especialmente Costa Rica. Tais elementos formam um panorama sem solução à vista. Para a dominicana Ysabel Vázquez, somente uma coisa é clara. Ela não sairá dos EUA, ainda que seu marido já tenha insinuado a intenção de voltar à República Dominicana. “Cheguei aqui com nove anos de idade, e de fato já voltei uma vez, mas não me adaptei porque minha vida eu fiz aqui.” ■

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PRESIDENCIA

DEBATES FUNDOS DE PENSÃO

Previdência: Cristina quer cuidar dos velhinhos

A DISCÓRDIA DA APOSENTADORIA Projeto de lei para estatizar o sistema previdenciário gera polêmica na Argentina Rodrigo Lara Serrano, Buenos Aires

“A

té o dia em que me aposente, o sistema previdenciário mudará várias vezes mais”, diz a economista argentina Victoria Giarrizo, entre sorridente e resignada. Talvez porque lhe faltem mais de três décadas antes de pensar na aposentadoria. E logo acrescenta: “A mesma gente que reclamou

da privatização compulsiva em 1994 agora fala mal da estatização compulsiva, da falta de liberdade.” A decisão da presidente Cristina Fernández de Kirchner de acabar com o sistema de capitalização individual na Argentina, com o envio de uma lei ao Congresso, surpreendeu a todos. De fato, diz-se que seu

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marido, o ex-presidente Néstor Kirchner, tinha seu plano em uma AFJP (Administradora de Fundos de Aposentados e Pensionistas, na sigla em espanhol) privada antes de mudar, no ano passado, a uma estatal. Como era de se esperar, os inimigos da medida a classificaram de “roubo”, enquanto seus partidários usam o mesmo epíteto para avaliar a gestão das empresas privadas. Uma análise menos apaixonada mostra que as AFJP argentinas não conseguiram a mesma legitimidade que os administradores privados em outros países da América Latina (como Chile, Peru e México), por vários motivos. Um deles é uma estrutura de comissões percebida como injustificável. Mas isso também significa que tanto o governo atual quanto os anteriores, bem como as forças opositoras,

nunca tiveram vocação para aperfeiçoar o sistema. Este é um tema importante, já que as AFJPs argentinas mostram que têm problemas de nascença. De partida, o Parlamento nunca colocou em marcha a comissão de controle presente na lei original. E as empresas tampouco a exigiram. “O ex-presidente Carlos Menem deixava que as AFJPs fizessem qualquer absurdo em troca de obter os fundos das administradoras com bônus de 11%”, conta um ex-gerente de uma delas, que pede para não ser identificado. Então para que se privatizou o sistema, se podia ter obtido esse dinheiro diretamente? A coisa não era bem assim. “Antes das AFJPs, os empregadores retinham a contribuição previdenciária de milhares de empregados e não


as depositavam. Nesse sistema, o empregado era estafado”, diz. Com as AFJPs “isso acabou e, de certa forma, o Estado conquistou eficiência impressionante na cobrança”. Mas também ficou com os passivos do verdadeiro inferno de dezenas de caixas previdenciárias de cada estado provincial (a Argentina é um país federal). E isso foi chave no deterioro das contas fiscais no final dos anos 90. O ex-ministro de Economia Domingo Cavallo calculou a sustentabilidade da transição ao sistema de capitalização convencido de que ainda tinha uma década de crescimento acima de 6% pela frente. Equivocou-se. Quando a conversibilidade caiu, a situação chegou a ser tão grave que se eximiu dos que aportavam ao sistema a obrigação de recolher 11%, reduzindo esse percentual para 5%. As contas apenas cresceram. A instabilidade foi tal que agora, ao completar 15 anos, os especialistas lembram que ao menos seis foram de crises internas ou externas. Depois, houve erros como autorizar as empresas a emprestar dinheiro a fideicomissos que por sua vez passam os fundos a cadeias de venda de eletrodomésticos e financiam a compra de aparelhos de TV e DVDs. Apesar de ser um percentual pequeno, não parece uma forma contracíclica de investir em fundos que, em teoria, deveriam impulsionar o mercado de capitais. Carlos Arias, ex-executivo da AFJP Siembra e consultor de planning financial persons, concorda que “não se pode fazer uma ‘timba’ (roleta) disso: têm que ser investimentos conservadores”. De qualquer forma, tais investimentos eram estipulados pela Superintendência. “Uma contradição.” Arias

também acha que as comissões eram altas. Para ele, “quando a rentabilidade é negativa, é preciso ter flexibilidade para baixar as comissões e proteger a poupança dos afiliados”. Ou seja, todas as correções que fossem possíveis, “mas não houve intenção de fazê-las”. Francisco Díaz Hermelo, diretor acadêmico do MBA da Universidade de San Andrés, concorda. “As comissões abusivas foram autorizadas pelo Estado em seu momento e recentemente tinham sido re-

estatização, a maioria da população não considerou que o sistema era sustentável. “Mas, ao avaliar a estatização, existe um nível de desconhecimento de 40%. O restante se manifesta dividido pela metade, a favor e contra.” O problema, para Puceiro, é que “esta é uma sociedade que está demandando mudanças profundas, mas que não quer pagar por elas. E o governo explora essa atitude frívola da população.” Nas AFJPs também houve

NO LIMITE Fundos de pensão administrados na Argentina em dezembro de 2007, em %. Total: US$ 30,1 bilhões FONTE: ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DE ORGANISMOS DE SUPERVISÃO DE FUNDOS DE PENSÃO

OUTROS 3,2% EMISSORES ESTRANGEIROS 8,4% FUNDOS MÚTUOS E DE INVESTIMENTO 14,6% DÍVIDA GOVERNAMENTAL 54,9% AÇÕES 15%

INSTITUIÇÕES NÃO-FINANCEIRAS 1,5%

duzidas”, lembra. E acrescenta que, além disso, e das perdas produzidas pelos malsucedidos créditos ao setor público, “o sistema foi rentável durante todos esses anos e poderia ter sido aperfeiçoado sem que fosse preciso eliminá-lo”. Para Enrique Zuleta Puceiro, da consultoria OPSM, a presença dos bancos nas AFJPs criou a idéia de que o sistema fazia parte da especulação financeira, e isso impediu que contassem com o apoio da população. Segundo pesquisas da OPSM, logo depois do anúncio da

INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS 2,4%

certa frivolidade quando, em meados de outubro, se descobriu que a queda em suas rentabilidades tinha chegado a tal nível que, para evitar pagarem as aposentadorias com até 17% de desconto a quase 300 mil afiliados (aposentadorias programadas que saem do fundo administrado) para o fim desse mês em relação há um ano, a única saída era buscar ajuda do governo. “As AFJPs estavam muito dependentes. Fizeram da crise uma oportunidade para pedir dinheiro”, diz Zuleta.

No governo, dizem que o fato foi um novo exemplo de “lucro privado, perdas públicas”. O ombudsman da Tercera Edad, Eugenio Semino, vê a situação da seguinte forma: as AFJPs cobraram US$ 11,76 bilhões em comissões durante 14 anos (US$ 840 milhões anuais). E ganham mais de US$ 1,2 bilhão anuais do Estado para estabelecer o piso da PBU (Prestação Básica Universal) e da PC (Prestação Compensatória), dinheiro que corresponde aos aposentados pelo tempo que contribuíram ao sistema previdenciário público antes de 1994. Ainda assim, avalia, não podem sustentar sua operação e pagar a 183 mil aposentados (dos 446 mil do sistema) sem descontos, recebendo o dinheiro de 9,5 milhões de afiliados. As empresas dizem que o motivo principal é a crise planetária. Somente em setembro, os fundos de pensão argentinos perderam mais de US$ 1,3 bilhão. O fato de existir muitas aposentadorias baixas que tinham que ser completadas pelo Estado para chegar ao valor mínimo ajudou nessa tomada de decisão, explica Alberto Muller, economista e especialista em previdência. Muller não está de acordo com a estatização, mas defende um sistema público que coexista com os fundos privados. Ele destaca que “a comissão pura era de 23%, realmente muito alta”, isso sem considerar o desconto para o seguro “que ia às empresas coligadas e eram preços de transferência, não de mercado”. Para Muller, o sistema de capitalização foi prejudicado por não estimular a concorrência. “As administradoras eram proibidas de garantir rentabilidade. Qual então era o

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DEBATES FUNDOS DE PENSÃO sentido de ter concorrência?”. Grande ironia, “a única que podia garanti-la era a estatal AFJP Nación, mas esta era insignificante: uma rentabilidade de 2 a 3% ao ano”. Mariano Cané de Estrada, professor do mestrado em Finanças da Universidade de San Andrés, discorda. E diz que, na verdade, para todas as AFJPs a lei só garante uma rentabilidade mínima em relação à média do sistema. Desenho “que contribui à geração de um comportamento que não favorece a individualidade, já que para minimizar os riscos de cair abaixo do nível mínimo muitas vezes o mais simples é não se diferenciar demasiado em termos de carteira média do sistema”. A solução, para ele, seria fazer “como no México: não ter um requisito de rentabilidade mínima e em troca disso fixar um limite de risco máximo, o que limita as perdas em termos absolutos e não relativos”.

CAIXA VAZIO Supõe-se que outra motivação que levou o governo a estatizar foi tomar o controle do dinheiro. Cerca de US$ 30 bilhões em ativos. Muller acha que esse não seria o motivo mais importante porque “não é muito, já que entre US$ 15 bi e US$ 20 bi são dívidas de títulos públicos.” Outros US$ 10 bilhões são ações, “mas se as rematarem, duvido que tirem mais de US$ 5 bilhões”. Na verdade, o que as autoridades querem, explica Giarrizo “é o fluxo de quase US$ 4 bilhões anuais dos afiliados”. Como “as contas vêm apertadas em 2009, com isso se evita o default, mas – que ironia – o lava.” O ministro da Economia do ex-presidente Néstor Kirchner, Roberto Lavagna, compartilha dessa visão. Foi incisivo em

entrevista ao jornal Crítica: “Está claro que o governo dos Kirchner quer recuperar receita, quer dinheiro: primeiro tentou através do campo (impostos de exportação de grãos), e agora por esta via. Não é necessário fazer escândalo; esta é a realidade”. O governo afirma que teve que tomar tal medida já que as AFJPs ofereciam um horizonte cinza e iam requerer, em quatro anos, aportes estatais de mais de US$ 7 bilhões. Nesse marco, a reação das AFJPs se concentra em Sebastián Palla, presidente da União de Administradoras de Fundos de Aposentadorias e Pensões (UAFJP, na sigla em espanhol). “Não achamos que esse sistema seja à prova de balas, mas é bem-sucedido”, garantiu publicamente, ainda chocado com a notícia. Mas seu alter ego no governo, o presidente da Anses (instituição estatal que administra os fundos herdados do velho sistema), Amado Boudou, classificou de “autocrítica demolidora” o anteprojeto alternativo apresentado pela UAFJP, que permite a redução nas comissões dos fundos nos meses em que haja rentabilidade negativa; além de um sistema misto de repartição e capitalização individual. Dando a estatização como um fato consumado – na primeira quinzena de novembro, já tinha sido aprovada pela Câmara dos Deputados – tanto partidários quanto opositores pedem que a Anses, que administrará os fundos, se converta em uma instituição pública autárquica. “É uma boa idéia”, diz Hermelo. “Haveria benefícios pela alta concentração de fundos, melhoraria a relação beneficiários/contribuintes, e a transparência e a administração independente estariam mais garantidas. Entretanto, o

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Odiado: o sistema nunca conquistou legitimidade

Estado argentino não tem um bom histórico de respeito às instituições autárquicas.” Para conquistar o apoio da maior quantidade possível de deputados e senadores, o governo ofereceu criar uma comissão de controle composta por empresários, sindicalistas e parlamentares. Fala-se que uma parte dos fundos seria investida em fideicomissos destinados a financiar obras de infra-estrutura. Hermelo opina que, se estes fossem de alto impacto social e melhorassem a competitividade do país, os fideicomissos seriam benéficos. “Melhor ainda se estivesse prevista uma renda direta à Anses via taxa de serviços ou pedágio pelo uso dessas obras.” Mas “se a obra de infra-estrutura é um trem-bala a serviço de poucas pessoas de alta renda, não será tão be-

néfico. Nesse caso, os fundos estariam melhor empregados financiando o crédito privado ao consumo.” De outro ângulo, Giarrizo vê um efeito secundário nada desprezível. “A estatização apresenta à Argentina o desafio de ver se realmente quer criar um mercado de capitais competitivo. Porque é certo que nossa bolsa é uma roleta. Um fundo chega aqui, decide destruir o valor de uma ação, e o faz.” Mas o grande dilema virá de um fato demográfico. Com uma população envelhecendo e grande parte da força de trabalho na informalidade, como se financiará a aposentadoria de amanhã? Ou o Estado se converte em uma “AFJP” monopólica supereficiente, ou muda sua estrutura impositiva. Não parecem ser tarefas fáceis para a Argentina. ■


DEBATES POLÍTICA

AP

Lula: desafios em fortalecer o PT para as próximas eleições

FUTURO INCERTO

Retração econômica pode minar prestígio do presidente Lula e comprometer seus planos de fazer um sucessor em 2010. Mas não é só Solange Monteiro

P

ara o presidente Lula, possivelmente teria sido melhor se o ano terminasse em setembro. Com um índice histórico de aprovação de seu governo de 80%, descobertas de petróleo que poderão colocar o país no Olimpo energético e a população feliz com o aumento da renda, do emprego e do crédito, até então 2008 parecia perfeito. Mas o reflexo da crise financeira internacional que golpeou o real e a bolsa somou entre as preocupações do governo mais um risco de liquidez: a de capital político. Isso em um momento que Lula precisa preparar o PT para a primeira eleição presidencial desde a redemocratização que – dentro das regras atuais – não poderá contar com seu nome entre os candidatos. O medo de uma forte retração econômica e o recado de parte do setor produtivo de

que a crise financeira já tinha atingido, sim, a economia real, foram avaliados por muitos como um golpe na imagem de solidez do presidente. “Hoje Lula já conseguiu se blindar, pois convenceu a população de que a crise veio de fora, e que está reagindo contra ela”, avalia Ricardo Ismael, professor de Sociologia da PUC-Rio. Mas faz a ressalva: “Se até o fim do primeiro semestre de 2009 essas pessoas não vislumbrarem uma melhora, se colocarão impacientes, ansiosas por retomar o caminho da mobilidade social”. E aí, niguém sabe quanto dessa irritação sobrará para o governo. Para Murillo de Aragão, presidente da consultoria política Arko Advice, em Brasília, “o que seria mortal para as pretensões do governo de eleger sucessor seria a perda do controle da inflação”. E,

segundo Aragão, se o desaquecimento for pior do que o esperado, Lula ainda tem cartas para jogar. “O presidente deve manter seus programas sociais protegidos, o PAC funcionando, e deveria adotar medidas para melhorar o ambiente de investimento.” Já nos meandros da política, os desafios de Lula e do PT são tão ou mais complexos. Isso porque as eleições municipais realizadas em outubro deixaram um sinal claro: nenhum passo importante na direção de acordos poderá ser dado sem o apoio do PMDB. Apesar de aliado, está claro que a partir de agora o partido deverá cobrar muito mais por seu passe, e se deixará cortejar. “Lula terá que ter muita tranqüilidade para manter a base política unida”, diz Aragão. “Isso se o PMDB não lançar seu próprio candidato”, afirma Ismael. O

sociólogo lembra que, enquanto PT e PSDB polarizaram as intenções de voto para presidente, o partido optou por não lançar candidato próprio e fortalecer suas bases regionais e a presença no Congresso. “Agora, se Lula não consegue consolidar um nome à sucessão, o PMDB poderia muito bem partir para a disputa”, diz. Mas dizer que a crise econômica ou preferências municipais demonstram uma redução de apoio ao governo não significa necessariamente o crescimento do “anti-lulismo”. E isso, para os analistas, deveria ser levado em conta pela oposição – leia-se PSDB. “Desde que perdeu a presidência, o discurso do partido foi esvaziado. Bem ou mal, Fernando Henrique chegou ao governo com propostas inovadoras e uma agenda de reformas”, diz Ismael. “Assim ao PSDB não basta reclamar do Mensalão. Ele precisa mostrar uma agenda pós-Lula, que também responda como fazer o Brasil crescer pós-crise, além de uma proposta social, já que apesar da alta aprovação de Lula no Nordeste (92%), sobretudo devido ao Bolsa Família, as pessoas ainda demonstranm angústia sobre a geração de emprego para esses jovens que saem da escola.” Já para Lula e o PT, além de torcer para que no segundo semestre de 2009 a economia já tenha dado sinais de voltar a seu rumo, será fundamental que o partido consiga fortalecer o nome de um candidato, o que hoje ainda não acontece com Dilma Roussef. “Muito do que o partido conquistou de acordos e coalizões até agora foi devido à fortaleza do nome de Lula”, lembra Ismael. “Mantendo-se as condições atuais, acho que Lula coloca seu candidato no segundo turno. Mas vencer é outra coisa”, diz Aragão. ■

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DEBATES POLÍTICA

Felipe Calderón: A guerra contra as drogas continua

AP

CHAPA QUENTE

A morte de dois de seus homens de confiança agrava os problemas enfrentados pelo presidente mexicano Marisol Rueda, Cidade do México

É

fato. Grande parte da população mexicana continua suspeitando que a morte de Juan Camilo Mouriño, secretário de Governo no México, e do czar antidrogas José Luis Santiago Vasconcelos foi obra do narcotráfico. A

queda e explosão do Lear Jet que os transportava no centro da Cidade do México no começo de novembro causou comoção e medo. A crença de que a sombra do poder da droga ameaça as máximas autoridades do país é uma pista

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do nível em que se chegou no embate entre autoridades e delinqüentes. Apesar de não existir nenhuma prova pública que indique que a morte dos dois funcionários tenha sido algo mais que um acidente, o medo

da população não chega a ser absurdo. No final de outubro, descobriu-se que um importante cartel, o dos Beltrán Leyva, tinha se infiltrado na Siedo (Subprocuradoria de Investigação Especializada em Delinqüência Organizada).


Funcionários responsáveis pela área de inteligência da instituição passavam informação aos capos da droga em troca de pagamentos entre US$ 150 mil e US$ 450 mil mensais. Além das suspeitas, o acidente significou um duro golpe para o presidente Felipe Calderón, que agora terá que lutar contra o narcotráfico sem seu mão direita. “Temos um cenário caótico no âmbito da delinqüência, da política e da economia”, diz Carlos Lugo, cientista político da Universidade Iberoamericana. “De um só golpe, duas unidades centrais da estratégia política do governo de Calderón ficaram acéfalas”, diz. Além de ser o titular da Secretaria de Governo (ministério semelhante à Casa Civil), Mouriño presidia o Conselho de Coordenação para a implementação do sistema judicial penal do país, uma reforma judicial aprovada recentemente pelo Congresso, e coordenava a campanha contra o narcotráfico, empreendida há dois anos por Calderón, quando assumiu o cargo. Mouriño ainda era o encarregado do lobby do governo com a classe política para levar a cabo as reformas propostas pelo Governo Federal. “Quem o suceder terá que se esforçar em dobro para chegar ao nível em que se estavam negociando os assuntos federais”, diz Lugo. O nome do sucessor já foi anunciado: Fernando Francisco Gómez Mont, reconhecido político profissional das fileiras do Partido de Ação Nacional, da situação, vinculado a importantes reformas como as da Justiça e a Eleitoral. A escolha de Mont para a Secretaria de Governo foi recebida como uma decisão

acertada do presidente. Para alguns analistas, Mont é visto como um homem capacitado em matéria de negociação e diálogo político e com uma clara visão de Estado. Mas será preciso ver como será sua gestão como lobista e conciliador. Já Vasconcelos, ex-titular da Siedo, estava a cargo de implementar o sistema de Justiça Penal. “Ele era o pilar da estratégia de combate ao crime organizado”, disse Lugo. Sua morte também deixa um vazio substancial, já que ele gozava de uma franca proximidade e da confiança do presidente mexicano, tinha construído uma estratégia clara

uma falta de profissionalismo na ação do governo, bem como de eficiência e eficácia”, diz Irma Méndez de Hoyos, pesquisadora da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais do México. Além disso, se confirmaria o grande perigo que implicaria ter o aeroporto internacional da capital mexicana dentro da cidade, e não nos arredores. “Esse tipo de acidente volta a acentuar a vulnerabilidade em um assunto no qual ainda há muito por fazer”, afirma Méndez. E, para os analistas, grande parte da população mexicana não esquecerá o incidente. “Dificilmente se poderá extirpar

das exportações mexicanas vão aos EUA, as remessas provenientes desse país constituem a segunda entrada de divisas do México e o vizinho do Norte é a principal fonte de investimento estrangeiro. E a primeira entrada de divisas, o petróleo, também está se debilitando, já que seu preço internacional está caindo. O governo vem revisando para baixo seu prognóstico de crescimento do PIB desde o início do ano. O último prognóstico do Banco de México para 2008 é de 2%, e para 2009 a estimativa baixou de entre 2,25% e 2,75% para 0,5% e 1,5%. O Fundo Monetário In-

Seja ou não um acidente, analistas apontam que o fato impacta negativamente o governo de Calderón. de combate e contava com uma visão detalhada da estrutura do narcotráfico no país. O governo mexicano declarou que as investigações indicam que a queda do jato se tratou de um acidente. Mas, ficará a dúvida até daqui a 11 meses, quando sairão os resultados finais das investigações do acidente – onde morreram mais sete pessoas, incluindo funcionários federais. Seja ou não um acidente, os analistas afirmam que o fato impactará negativamente no governo de Calderón. Caso se trate de um atentado, “será um golpe muito forte na Presidência”, diz Lugo. “Significará que o Estado já foi penetrado pelo crime organizado.” E, no caso de ser um acidente, este deixaria ventilada a vulnerabilidade do sistema de segurança mexicano, segundo analistas. “Isso deixa buracos que indicam

do imaginário dos cidadãos que isso foi um atentado”, diz Gerardo Esquivel, pesquisador de Economia do Colégio do México (Colmex). “As pessoas poderão pensar que é o resultado do enfrentamento ao narcotráfico e das descobertas de droga que estavam acontecendo.” Nos 23 meses da administração de Calderón, o número de execuções relacionadas com o crime organizado já supera 7 mil, segundo relatórios extra-oficiais.

E TEM A ECONOMIA... Se isso fosse pouco, o governo de Calderón também tem que enfrentar os efeitos mais severos da crise econômica global. A manifestação mais concreta de seus efeitos levou as autoridades econômicas do país a reduzir o prognóstico do crescimento econômico. Oitenta e dois por cento

ternacional (FMI) também reduziu as expectativas de crescimento do PIB mexicano para 2009 de 1,8% para 0,9%. E as projeções de Esquivel, do Colmex, são ainda mais pessimistas. “Para 2009, calculo entre -1% e 0%”, diz. O governo lançou um plano anticíclico que contempla mais gastos em infra-estrutura, mas os analistas acham que este não será suficiente para o tamanho do problema. “Não me parece que as medidas anunciadas sejam suficientes para enfrentar a magnitude do choque”, afirma Esquivel. Outros analistas afirmam que essa pode ser a oportunidade para que Calderón ajuste seu gabinete para focar-se no panorama político, econômico e de segurança. “O presidente sabe que os resultados conquistados na primeira metade de seu mandato não foram os esperados”, diz Méndez. ■

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DEBATES DIPLOMACIA Chávez: gastar ou não gastar

A política internacional de Hugo Chávez poderá se ver debilitada e até desvanecer se os preços do hidrocarboneto se mantiverem baixos Antonio María Delgado, Miami

48 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

AFP

HAMLET E O BARRIL DE PETRÓLEO

Q

uarenta dólares podem parecer uma quantia pequena. Mas isso depende para o bolso de quem. No do presidente venezuelano Hugo Chávez, a diferença entre têlos ou não pode ser gigante. “Para Chávez, não é o mesmo o barril de petróleo custar US$ 100 ou US$ 60”, diz Aníbal Romero, professor de teoria política da Universidade Metropolitana de Caracas. Ele e outros interessados na evolução política da Venezuela estimam que a queda da renda petrolífera pode obrigar o governo venezuelano a tomar algumas decisões nada fáceis nos próximos meses. “Chávez vai mergulhar em um sério dilema”, afirma o acadêmico. O presidente venezuelano poderia ter que optar por manter o gasto interno e perder ao menos parte da influência que obteve através de sua petrodiplomacia. Isso porque, apesar de Caracas contar com reservas de mais de US$ 100 bilhões, acumuladas durante o auge do preço das commodities, os elevados custos dos subsídios fornecidos pelo governo venezuelano, um incremento do gasto público da ordem de 45%, as sérias limitações da estatal Pdvsa de incrementar sua produção de petróleo, o elevado custo da política exterior e o deterioro do aparato produtivo, juntos, são insustentáveis. “A forte queda dos preços do petróleo nas últimas semanas, em momentos que a economia mundial avança a uma recessão, sugere que a festa está acabando rapidamente”, indica um relatório sobre a Venezuela e o Equador elaborado pelo JP Morgan. Os preços do petróleo caíram mais de 58%, para


CARTAS NA MESA Ente as opções à disposição de Chávez para evitar o problema está a possibilidade de cortar o orçamento de sua ambiciosa agenda internacional, que inclui apoio econômico e fornecimento de petróleo em condições preferenciais aos países nos quais a Venezuela identifica afinidade ideológica. Segundo estimativas do Grupo Assessor Petrolífero Venezuelano, Chávez já gastou mais de US$ 30 bilhões em iniciativas como essas. Outra alternativa é a de postergar seus planos de renovar seu arsenal militar que até agora envolveu contratos para adquirir 54 helicópteros e 38 aviões russos de combate, 24 aviões chineses de treinamento, 20 aviões Super Tucano

brasileiros, mísseis terra-ar, sistemas de radar e 100 mil rifles de assalto AK. O governo também poderia optar pela redução do gasto social e a eliminação de certos subsídios, como o que mantém os preços da gasolina em três centavos de dólar por litro, e o supervalorizado câmbio fixo oficial que ajuda a conter a inflação ao reduzir os custos das exportações.

reduzidos, mas o resultado será o descontentamento geral: de seus aliados radicais no restante da América Latina que esperavam muito dele, e de seus aliados internos, que igualmente se acostumaram ao aporte populista de um governo dadivoso e rico.” Outros analistas concordam que a influência de Chávez na América Latina se verá seriamente prejudicada se o

OCASO NEGRO Preço médio de exportação do petróleo venezuelano em US$ por barril FONTE: MINISTÉRIO DO PODER POPULAR PARA A ENERGIA POR PETRÓLEO

120 100

DÓLARES

menos de US$ 64 o barril, desde que em julho alcançaram seu máximo histórico, de US$ 147,27. O petróleo venezuelano era negociado no final de outubro por US$ 61,09 o barril. Segundo o JP Morgan, os altos preços do petróleo permitiram à Venezuela desfrutar de um tranqüilo superávit em sua conta corrente este ano, mas a tendência poderá mudar drasticamente se a atual debilidade dos preços se mantiver ao longo do tempo. Para o banco, o número mágico são US$ 70 o barril. Abaixo desse patamar, o país começaria a registrar déficit em conta corrente. “Assumindo que os altos níveis de gasto e de importações tenham vindo para ficar, cada redução de US$ 10 na média anual do petróleo conduziria a um aumento de 3,25% do PIB no déficit em conta corrente e de 1,5% do PIB no déficit fiscal da Venezuela, em 2009”, indica o informe.

80

60 40 20 0 1º TRIM.

2º TRIM.

3ºTRIM.

OUTUBRO

20 A 04 OCT

27 A 31 OCT

CIFRAS PRELIMINARES

Chávez poderá priorizar seu programa de ajuda a Cuba. Romero afirma que o governo venezuelano provavelmente tratará de manter todos os programas vigentes, ainda que em menor volume, e diz duvidar de que essa estratégia dê bom resultado. “Chávez provavelmente tratará de manter ambas as coisas (o elevado custo de sua política exterior e o elevado gasto público dentro do país), em termos

nível de ajuda que a Venezuela oferece a alguns desses países começar a minguar. “É uma fórmula baseada exclusivamente em dinheiro”; diz John Price, diretor-gerente da assessoria Kroll InfoAmericas. “A aceitação de Chávez fora da Venezuela indicada nas pesquisas está no mesmo nível que a popularidade do presidente George Bush, cerca

de 24%. Sendo assim, não é um personagem popular”, argumenta. E acrescenta que “o motivo pelo qual tantos líderes da região estão dispostos a envolver-se com ele é muito simples: a quantidade de coisas que está disposto a dar, seja através da entrega direta de dinheiro, ou porque está disposto a postergar bastante os prazos de vencimento dos pagamentos pelas compras de petróleo do país.” A disposição do governo de oferecer petróleo sob condições brandas é possível devido aos altos preços do barril, em comparação com o relativamente baixo custo de produção no país (que hoje está ao redor dos US$ 15), fato que dá certa garantia de que a Venezuela obterá lucro na transação. O caso é diferente quanto ao subsídio interno dos preços da gasolina, cujo custo alguns projetam em mais de US$ 10 bilhões. Entretanto, o primeiro – apesar de dar lucro – é mais fácil de eliminar que o segundo, porque pode gerar menos repercussões políticas adversas para o governo Chávez. Nessa decisão, nem tudo serão considerações numéricas. No que diz respeito a Cuba, analistas acham que a inclinação de Chávez seria a de continuar atuando como Papai Noel até o último momento. E a ilha é o componente mais custoso de sua petrodiplomacia. “Para Chávez, significará escolher quem serão seus amigos no futuro. Mas, no caso de Cuba, esse será o último lugar em que mudará seus planos originais. Primeiro o fará nos outros países, e tratará de resistir até o final.” “Ainda que, eventualmente, também poderá ver-se obrigado a cortar lá também”, conclui Price. ■

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DEBATES PANORÂMICA

Javier Santiso

América Latina e seu desafio fiscal VIVEMOS TEMPOS INCERTOS, mas também fascinantes para a América Latina. Há somente uma década, as economias da região teriam sucumbido, em um piscar de olhos, a uma crise financeira como a atual. Os efeitos da tormenta estão se fazendo sentir e se aprofundarão em 2009, bem como nas outras regiões emergentes, mas não com o dramatismo com o qual as economias latino-americanas tinham se acostumado. Um elemento-chave desta capacidade de suportar o temporal financeiro melhor do que no passado está baseada na boa ancoragem fiscal das economias regionais, que permite uma maior resistência aos choques externos. Um fato particular dessa característica é que oferece um exemplo da progressiva maturidade das políticas econômicas em boa parte da América Latina, a qual resultará em bons lucros em momentos difíceis. Segundo o relatório “Perspectivas Econômicas da América Latina 2009” do Centro de Desenvolvimento da OCDE, nos últimos anos a maioria dos governos latino-americanos (sempre há exceções) adotaram medidas fiscais adequadas para afrontar um contexto crítico como o atual. Entre os avanços estão uma melhora significativa na gestão da dívida pública, a redução do déficit fiscal e a adoção de importantes iniciativas de responsabilidade fiscal, como a criação de fundos de estabilização. A região também foi pioneira em inovações fiscais que abarcam desde modalidades especiais de transferência condicional de dinheiro a vista a interessantes orçamentos participativos. Pese o conquistado, ainda resta muito pela frente. A tormenta desatada nos países desenvolvidos somente agudiza a urgência de outras medidas. Por exemplo, o índice de volatilidade da receita pública continua alto, e a estrutura de arrecadação, demasiado agressiva: a receita depende excessivamente de fontes não-tributárias – como as tarifas de exportação e exploração de recursos naturais, todos submetidos às volatilidades que estamos presenciando – como também de impostos indiretos que incidem sobre o consumo. Ao contrário, os impostos sobre a renda pessoal, que costumam ser muito mais progressivos ao incidir segundo o nível de renda, aportam somente 4% do total da receita fiscal da América Latina, frente a 27% nos países da OCDE. 50 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

No campo do gasto público, o panorama também oferece margem de melhoria. Entre 1990 e 2006, o gasto público representou 25% do PIB na América Latina, o que contrasta com os 44% alcançados nos países da OCDE. Menos dinheiro arrecadado é obviamente sinônimo de menos dinheiro para gastar, apesar de que o relatório não valoriza tanto a quantidade, mas a qualidade. A comparação do rendimento estudantil no Chile e no México com países que gastam menos por estudante, como a Lituânia, ilustra que os governos latino-americanos continuam gastando de maneira ineficiente e, particularmente, investem pouco nas políticas com maior impacto na aprendizagem e nos resultados, como o número de horas que os alunos estão em sala de aula ou na melhoria das políticas de admissão nos centros educacionais. Toda reforma que pretenda promover a qualidade fiscal na América Latina deve levar em conta esses problemas ou apresentar soluções que permitam explorar ao máximo o potencial do Fisco como motor de desenvolvimento. As conquistas fiscais são colocadas especialmente à prova em contextos difíceis, como o atual, e é precisamente agora quando convém ressaltar como a política fiscal pode contribuir a um crescimento econômico que não ignore a igualdade. É necessário colocar as políticas fiscais que promovam o crescimento e a igualdade ao menos no mesmo nível das destinadas a estabilizar a produção e o preço. Uma política fiscal com base na igualdade e na efetividade pode e deve constituir-se no melhor antídoto contra o caudilhismo fiscal que ainda afeta numerosos sistemas latino-americanos e que explica os baixos níveis de legitimidade fiscal que a OCDE encontrou há um ano, quando publicou a edição anterior do relatório. Se os cidadãos têm a certeza de que seus governos arrecadam de forma justa e gastam adequadamente, estarão mais disposos a cumprir com suas obrigações fiscais, o que por sua vez redundará positivamente na própria legitimidade democrática. Níveis elevados de legitimidade fiscal ajudam a consolidar a confiança da cidadania nas instituições públicas. Ao contrário, uma sociedade desigual onde os bens públicos são escassos, de baixa qualidade e onde a pressão tributária não corresponde ao nível de receita é um sistema em que a desconfiança nas instituições é maior. A política fiscal, com seus desafios e oportunidades, pode e deve ser um dos eixos desse diálogo sobre como a América Latina pode avançar em sua agenda de desenvolvimento e consolidação democrática. Afinal, injetar maior progressividade nos gastos também faz parte da história da democracia. Sua consolidação é acompanhada de uma maior legitimidade fiscal que só pode ser conquistada com maior arrecadação e, sobretudo, gastando melhor. Ou seja, não gastando forçadamente mais, mas de forma eficiente e mais progressiva, para dessa forma poder alcançar as populações mais pobres da região que serão, inevitavelmente, as que mais sofrerão o impacto da atual crise financeira e macroeconômica global. ■ Diretor e economista-chefe, Centro de Desenvolvimento da OCDE


DEBATES 5a COLUNA

Susan Kaufman Purcell

Os preconceitos sobre a crise LOGO QUE a crise financeira golpeou os Estados Unidos, se tornou comum escutar que a América Latina não se veria muito afetada, já que suas economias tinham se “desacoplado” da norte-americana. Havia muitas razões para afirmá-lo. Os países latino-americanos tinham diversificado seus sócios comerciais e por isso dependiam menos dos EUA como mercado e fonte de investimentos em relação a décadas anteriores. Com superávit comercial e saudáveis reservas em moedas estrangeiras, bem como déficits fiscais mais baixos, dava para pensar que os países estariam protegidos dos problemas econômicos do vizinho do norte. Em pouco tempo, se tornou evidente que a região permanecia vinculada – e portanto, vulnerável – não somente aos problemas que afetam os EUA como também aos que golpeiam a economia mundial. O colapso dos grandes bancos, a queda descontrolada de Wall Street, a seca de crédito interbancário e o pânico resultante provocaram efeitos e reações semelhantes na América Latina. Seus mercados de capitais sofreram colapsos inclusive maiores que os dos Estados Unidos na medida em que investidores estrangeiros, necessitados de liquidez, tiraram dinheiro. Isso, por sua vez, reduz a demanda global por commodities que tinha estimulado, em parte, o explosivo crescimento recente da região. O que havia por trás dessa percepção equivocada de que as economias da América Latina estavam “desvinculadas” da dos Estados Unidos? Uma explicação possível envolve a China. Depois de anos mantendo-se economicamente isolado, com baixas taxas de crescimento, o país asiático adotou uma economia de mercado, chegando a crescer taxas superiores a 10% ao ano. Sua crescente demanda por matériasprimas, energia e alimentos impulsionou o boom de exportações no continente latino-americano. Como resultado, a América Latina chegou a achar que era menos dependente da economia norte-americana. Uma explicação relacionada com a anterior é que a economia mundial se caracteriza tanto pelo fluxo de comércio e pelos investimentos como pela interconexão do sistema financeiro. O resultado é que somente as economias mais auto-suficientes ou fechadas podem estar verdadeiramente desacopladas. Finalmente, o PIB dos EUA continua sendo maior que o de qualquer

outro país. A China continua dependendo das importações, exportações, dos investimentos e das tecnologias norte-americanas para seu próprio crescimento, bem como o restante do mundo. Além da crença no desacoplamento da economia norteamericana, a América Latina parece ter tirado outra conclusão errônea da crise financeira nos EUA. Especificamente, parece que se acredita que a crise foi originada por uma regulação insuficiente ou inadequada do mercado. Isso levou a uma crítica renovada na região da chamada estratégia de desenvolvimento “neoliberal”, do livre comércio e da globalização, o que fortaleceu o posicionamento de quem promove o maior papel do Estado nas economias latino-americanas. A realidade, entretanto, é que a atual crise financeira surgiu como resultado de um excesso, e não escassez, de regulação e interferência governamental na economia dos EUA. O livre mercado não causou a crise imobiliária e hipotecária. Foi ao contrário. À Fannie Mae e Freddie Mac, duas “empresas com apoio público”, foi ordenado que aumentassem os empréstimos ao consumidor que, devido à sua baixa renda, não foram aceitos no mercado comercial de crédito hipotecário. Devido aos vínculos entre Freddie, Fannie e o governo, se assumia (de forma correta) que este as resgataria se os devedores subprime dessem o calote. O governo também reduziu os custos de conceder empréstimos subprime para incentivar Fannie e Freddie a continuar emprestando aos pobres. Os esforços de alguns legisladores, que viram a crise chegar, para reduzir esse tipo de crédito foram derrotados, em parte, devido a uma grande campanha de contribuições por parte dessas empresas às campanhas de alguns legisladores importantes. A decisão do Fed de manter os baixos juros (por outros motivos) continuou contribuindo para o descalabro. Parte da responsabilidade pela turbulência que finalmente se desatou também é compartilhada pelos bancos privados, fundos de cobertura ou hedge funds, e outras instituições não-governamentais, bem como os avanços em tecnologia que permitiram desenvolver novos e complexos produtos financeiros que tornaram difícil ou impossível elucidar quem devia quanto a quem. O tema, entretanto, não é que todos (e, portanto, ninguém) sejam responsáveis pelo que aconteceu. Ao contrário, o tema é que a América Latina necessita evitar a conclusão errônea de que o livre mercado é o principal responsável pela crise. Chegar a uma conclusão equivocada poderia fortalecer os sentimentos antimercado e antiglobalização que já prevalecem na região e privaria o continente das oportunidades que a economia de mercado oferece para seu desenvolvimento e crescimento. ■

A atual crise surgiu como resultado de um excesso, e não escassez, de regulação e inteferência do governo.

Diretora do Centro de Política Hemisférica da Universidade de Miami

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FINANÇAS DERIVATIVOS

QUEM MANDOU APOSTAR? Rápida desvalorização do real levou companhias brasileiras com contratos de derivativos cambiais à lona. Resta saber a lição que ficou Solange Monteiro e Eduardo Thomson

SOLEDAD TIRAPEGUI

A

primeira a soar o alarme foi a Sadia. No final de setembro, com a disparada do dólar, a companhia processadora de carne de frango anunciava que poderia ter extrapolado os limites estabelecidos pela política de risco da empresa ao investir em mais derivativos cambiais do que necessitava para cobrir suas exportações. Instantaneamente, a companhia demitiu seu principal executivo financeiro, tirou Luiz Furlan de sua aula de tênis e o levou de volta ao

conselho da Sadia. Os anúncios que vieram na seqüência faziam crer que essa era apenas a ponta do iceberg. A Aracruz, maior produtora mundial de celulose de eucalipto, revelou que sua exposição em contratos de target forward poderia ser o dobro dos derivativos atrelados ao pré-pagamento de exportações. Uma situação crítica que só teve um sinal consistente em 4 de novembro, quando a empresa finalmente revelou o valor total da perda

52 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

Desvalorização do real: muitos sentiram o golpe

– US$ 2,13 bilhões, o maior anunciado –, e que esta já estava sendo renegociada com os bancos, eliminando com isso a exposição em 97% desses papéis. A falta de informações concretas sobre o número de companhias e o montante envolvido nessa jogada pela solidez do real levava mais tensão ao mercado. A corrida das empresas para resgatar depósitos para cumprir contratos e a possibilidade de calote a bancos fizeram o mercado batizar o evento de subprime tropical. O governo estimou que cerca de 200 empresas estavam envolvidas nesse tipo de contrato, e muitos previam que o buraco poderia ser mais fundo. Afinal, ainda havia um universo inexplorado entre as empresas de capital fechado, outras que poderiam ter negociado diretamente na BM&F Bovespa, além das com contratos no exterior. Dessa forma, em um lap-

so de tempo, os derivativos cambiais, que costumam ser avaliados como uma excelente forma de cobertura para as empresas exportadoras, se transformaram em vilão, dando duras lições às empresas que por um momento de euforia desviaram seu foco da proteção e buscaram esses papéis como uma máquina de lucro. Observando seus efeitos em países como Brasil, Rússia e Coréia, Paul Krugman vaticinou no New York Times que o resultado dessa aposta de risco na fortaleza das moedas dos países emergentes seria “o segundo epicentro” da crise financeira mundial. Outro mercado emergente fortemente afetado foi o México, onde importantes empresas revelaram perdas por suas exposições a esses instrumentos. Segundo Nicolás Olea, sócio do escritório da KPMG na Cidade do México, as perdas no país se explicam


porque os gerentes financeiros pecaram por uma confiança desmedida. “A estabilidade experimentada pelo peso mexicano os fez cair em uma zona confortável”, explica. “Ao ver que sofriam perdas por operações em que o dólar continuava se debilitando, decidiram assumir um risco extra e apostar em operações contrárias em derivativos para ressarcir perdas anteriores e embolsar lucro extra.” Entre as companhias mexicanas que participam dessa lista estão a Cemex, com perdas de mais de US$ 700 milhões, a fabricante de tortilhas Gruma, com US$ 684 milhões; o grupo industrial Gissa, com US$ 600 milhões e a fabricante de vidro Vitro, com US$ 227 milhões. O caso mais significativo foi o da empresa varejista Comercial Mexicana, que teve que pedir ajuda a seus credores devido aos US$ 1,39 bilhão em perdas relacionadas à exposição a esses derivativos.

MAU PRECEDENTE No Brasil, ainda que permaneça a dúvida sobre quando essa onda de prejuízos tocará o fundo, a aposta é de que os anúncios bombásticos já foram dados, e as negociações em curso entre empresas e bancos acalmam o mercado. “Bolhas existirão, e é preciso acostumar-se a elas”, diz Gabriel Basaluzzo, diretor do mestrado de Finanças da Universidade San Andrés, em Buenos Aires. Mas nem todos os que estão em cima dela, grandes ou pequenos, querem aceitar isso. A empresa têxtil Vicunha, por exemplo, devia US$ 100 mil ao Merrill Lynch por perdas com derivativos, e afirmou que não pagaria alegando que a pessoa que assinou não tinha

autorização para fazê-lo. Para Carlos Eduardo Gonçalves, professor de Economia da FEA/USP, esse é um precedente arriscado. “Se as empresas não pagarem, o que vai ser do mercado futuro daqui pra frente?”, questiona. Afinal, o jogo não pode ser legal apenas quando se está ganhando, e não é de hoje que as empresas o fazem. Um working paper do Banco Central chamado “Demand for Foreign Exchange Derivatives in Brazil: hedge or especulation”, publicado no final do ano passado por Fernando Oliveira e Walter Novaes, analisou contratos de swaps de taxa de câmbio abertos ao final de 2002 e identificou que em períodos de grande volatilidade cambial, como em 2002, a demanda de empresas por esse tipo de derivativo está fortemente relacionada a razões especulativas, sendo as empresas exportadoras as com maior probabilidade de fazê-lo. Além do risco da perda pelo câmbio, entretanto, o problema está na credibilidade, “já que o acontecido expõe um problema sério de governança corporativa”, lembra Gonçalves. “O que o board estava fazendo nessa hora?” E há quem afirme que a aventura mal-sucedida dos derivativos seja motivo para o afastamento de investidores internacionais que buscam negócios na bolsa brasileira, e não querem saber de especulação com seu dinheiro. “O instrumento escolhido por essas empresas é simples, não fixa limites para cima ou para baixo para limitar perdas excessivas e em períodos de volatilidade moderada são eficazes”, diz Basaluzzo. “Mas quando uma bolha rompe, cobra tudo de volta, e num

só golpe, e a estrutura da tesouraria de uma empresa não está preparada para identificar esses momentos, pois tem seu foco na área produtiva, e não na financeira.” Para José Cézar Castanhar, economista da FGV-Rio, “esse episódio deixou claro que é errada a noção de que se pode acreditar em ajuste automático; e que os executivos precisam focar-se na finalidade da empresa, e avaliar mais seriamente os impactos de suas escolhas.”

Para as empresas escaldadas pelas perdas de dinheiro e de moral nesse jogo de azar, a sugestão dos analistas é de trabalhar com políticas de exposição ao risco mais rígidas, como as de um banco. Para Basaluzzo, outra estratégia possível para retornar uma empresa ao foco produtivo seria uma mudança na política interna da companhia, excluindo o resultado desses mecanismos financeiros da remuneração do CFO. “Esse executivo está aí para garan-

Empresas agora precisam detalhar opções de risco em seus balanços.

CORREÇÃO DE ROTA Como, então, evitar o desastre? “Não se pode colocar travas nem restringir o mercado, mas do ponto de vista regulatório hoje se está facilitando ao máximo a divulgação de dados, da forma mais transparente possível”, diz Edison Arisa, coordenador técnico do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), sobre a iniciativa da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) deliberar a exigência de informações mais abrangentes e detalhadas sobre os instrumentos derivativos que as companhias detêm em seus balanços trimestrais, a partir do terceiro trimestre deste ano. Arisa acrescenta que a CVM também pediu às empresas, de forma facultativa, que passem a apresentar uma análise da sensibilidade dos derivativos que operam, com parâmetros pré-definidos.

tir caixa e minimizar o risco. Enquanto seja premiado por resultados, poderemos ver tal situação se repetir com mais freqüência”. Já Álvaro Cyrino, professor de Economia da Fundação Dom Cabral, afirma que hoje “os executivos são remunerados pela capacidade de criar uma fantasia, e são bem remunerados porque isso é arriscado. Não há no universo condição de crescer nas taxas esperadas pelo mercado, descola-se da realidade e aí se forma a bolha”. Mas Cyrino acha que esse modelo já não agrada e que “estamos começando a ver as coisas como elas deveriam ser”. Por ora, a versão do “subprime tropical” está descartada, ainda que as perdas sejam inegáveis. A torcida é para que alguma lição tenha ficado e o pior já tenha passado. Ao menos até a próxima bolha. - Com Dubes Sônego

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CAPITAL ABERTO ethomson@americaeconomia.com

DÓLAR TAPA-BURACO

PROCURA-SE A SRA. WATANABE!

Investidores compram a moeda norte-americana para cobrir suas operações de derivativos forward À PRIMEIRA VISTA, a alta no câmbio em época de crise não deveria surpreender ninguém. Historicamente, cada vez que um país latinoamericano entrou em crise, esta foi acompanhada por um deterioro da moeda local. O curioso é que nesse caso o fenômeno se repetiu, mas a crise não foi interna, mas externa. Quem é o culpado? Um derivativo conhecido como forward e os investimentos no exterior. Desde o final do século 20, os mercados financeiros de nossa região começaram a se sofisticar com o uso cada vez mais freqüente dos derivativos como mecanismos de cobertura - que são amplamente usados por fundos mútuos, administradoras de fundos de pensão e outros investidores institucionais quando fazem investimentos no exterior -, atados a um forward de venda,

e a investir esses capitais em renda variável. O investidor deixa comprometido com o banco a venda de uma certa quantidade de dólares. Esse valor está ligado ao rendimento das ações no exterior. Se o valor dos investimentos sobe, não há problema, pois o investidor tem mais dólares para vender no mercado. Mas se esses investimentos caem, reduz-se a quantidade de dólares que o investidor pode retornar ao país, sem que haja diminuição do compromisso de venda de dólares negociado no contrato forward. “Isso foi o que obrigou todos os investidores a sair a comprar dólares de forma proporcional à queda nos valores externos”, diz Fernando Orpis, da FinanzasToday, em Santiago. Basta olhar algumas cifras. Entre 1º de setembro e 30 de outubro, o índice Bovespa caiu

47%, enquanto o dólar subia 32% no Brasil. No Chile, o IGPA caiu 33%, e o dólar subiu 30%. No México, o IPyC caiu 37%, enquanto o dólar subiu 26%. Na Argentina, por sua vez, a bolsa caiu 51%, mas o dólar não subiu tanto (11%) porque foram as pessoas as que buscaram refúgio na moeda norte-americana, e não os investidores institucionais. Algo semelhante aconteceu no Peru, onde a alta do dólar foi de apenas 1,1%, enquanto a bolsa caiu 52%. Os forwards são uma faca de dois gumes? Tecnicamente não, se quem os usa é um especialista em Finanças. Mas até eles podem ser surpreendidos. De qualquer forma, não se preocupe. Já sairão instrumentos dedicados a cobrir esse novo risco. O mercado sempre os inventa. Rodrigo Díaz

REAL PESO .MX PESO .CL

ARREMETIDA FINANCEIRA Cotações e paridades, base 100

IGPA .CL IBOVESPA IPyC .MX

Fontes: Reuters e Economática

160

140 120

100 80

60 40

20 01 SET 08

11 SET 08

21 SET 08

54 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

01 OUT 08

11 OUT 08

21 OUT 08

O JAPÃO está a bordo da recessão, a bolsa local desabou em outubro a níveis não vistos há 25 anos, mas o iene sobe. Não soa muito lógico, mas o fenômeno se deu porque milhares de investidores mundiais tiveram que cobrir suas posições de

CUIDADO COM O IENE Ienes por US$

100 98 96 94 2008 13 OUT

20 OUT 17 OUT

3 NOV

FONTE: YAHOO! FINANCE

carry trade em ienes. O carry trade consiste principalmente em endividar-se na moeda de um país com baixas taxas de juros, como o Japão, onde estas estão em 0,5%, para depositar o dinheiro em outros mercados com taxas maiores, como a Inglaterra, onde a taxa está em 4,5%. A diferença de 4% vai para o bolso do investidor, sempre que o câmbio se mantenha estável. Mas, com a volatilidade mundial, muita gente quis sair de suas posições e teve que comprar ienes no mercado, impulsionando o valor da moeda. Em outubro, o iene chegou a ser cotado a quase 94 por dólar, seu maior valor nos últimos 13 anos. O carry trade em ienes chegou a ser um investimento tão popular que até levou ao surgimento do termo “senhora Watanabe”, em referência às donas de casa que embarcaram nessa operação.


FINANÇAS OPINIÃO

John C. Edmunds

Seca e inundação TEM SIDO REVELADOR OBSERVAR como um só fato pôde engatilhar uma cascata de efeitos secundários no sistema financeiro mundial. O montante total de hipotecas subprime emitidas nos Estados Unidos não superou os US$ 3 trilhões. Em épocas anteriores, o dano causado por esses empréstimos teria sido mais fácil de conter. Mas a essas alturas tais créditos já tinham sido partidos em milhares de pedaços e vendidos a compradores em diferentes países ao redor do globo. A conseqüência foi arrastar para o buraco o valor dos ativos financeiros em todo o mundo, que significou perdas de até US$ 100 trilhões para os investidores. O efeito na América Latina tem sido muito severo, especialmente quanto às condições subjacentes da maioria das economias da região. Ficou claro que alguns países latino-americanos estavam vivendo além do que seus meios permitiam. Mas a maioria estava nas melhores condições financeiras de sua história. Tinham feito o dever de casa: refinanciado ou pagado a dívida externa, acumulado reservas em moeda estrangeira e dado transparência a seus próprios mercados financeiros. Infelizmente, muitos investidores acreditaram no cenário apocalíptico de que a economia mundial entraria em uma longa e profunda recessão, e que os sistemas financeiros de muitos países latino-americanos colapsariam. Por isso, sua reação foi vender, e a onda de vendas chegou quando os compradores, que normalmente tinham buscado amortizar a queda, estavam enfrentando uma crise de liquidez. O resultado é que os preços dos bônus, ações e divisas caíram a níveis que, em retrospectiva, serão vistos como excessivamente baixos. Por exemplo, o valor agregado das ações da BM&F Bovespa, a bolsa de valores do Brasil, caiu de US$ 1,58 bilhões em maio de 2008 para US$ 440 milhões no final de outubro. Uma queda de 72% em menos de seis meses! Os preços desses ativos não deveriam ter caído tanto. Não houve uma revolução no Brasil, nem uma guerra, nem um desastre natural de maiores proporções. Sequer houve eleições que pudessem mudar significativamente o balanço político. O país definitivamente não estava enfrentando uma crise de dívida. Em junho de 2008, suas reservas de moeda estrangeira equivaliam a 134% da dívida em dólares garantida pelo governo. Tampouco

havia uma crise cambial. A política cambial é a de livre flutuação. O que aconteceu foi que, no momento exato em que a pressão por vender era maior que o normal, os mecanismos para comprar esses ativos estavam inabilitados. As quedas nos mercados latino-americanos alcançaram apenas a metade da gravidade registrada nos primeiros dias de 1995. Não obstante, em1994-1995 os sistemas financeiros eram muito mais vulneráveis. Não tinham a transparência nem a solidez verificadas atualmente. Desta vez, os aparelhos financeiros da região provaram que são capazes de agüentar choques. Os sistemas de países industriais são os que necessitam de reformas. Eles estão lançando grandes operações de resgate. E quando uma operação não dá resultado, lançam outra. O motivo é que desta vez a crise os afeta. O dano que a América Latina sofreu tem sido escassamente levado em conta. O resultado será que as operações de resgate errarão no caminho do excesso. Os bancos centrais dos países industrializados, com a plena cooperação das autoridades fiscais, injetarão tremendas quantidades de liquidez no sistema financeiro. Continuarão fazendo isso, às vezes de forma direta, sem desenho, até serem bem-sucedidos em substituir a liquidez perdida. Depois enfrentarão um problema diferente, e talvez melhor: como lidar com um rápido incremento da liquidez. Serão resistentes em reverter seu próprio rumo, proporcionando o combustível necessário para uma onda inflacionária. Os países latino-americanos mais prudentes não participaram dessa fase maníaca de injetar liquidez. Tampouco vão reagir exageradamente quando esta regressar de forma mais consistente. Ao contrário, toleraram estoicamente a queda dos preços dos ativos, e quando isso acontecer, permitirão que os preços dos bônus e ações cheguem às nuvens. Isso porque devem estar preparados para defender suas economias das duas ameaças que se apresentam com a crise. Uma é a paralisia financeira e a outra é a possibilidade de que a China e a Índia deixem de crescer rapidamente. Essa desaceleração, se acontecer, não será remediada rapidamente. Dessa forma, o preço das ações e dos bônus se recuperarão, e o fator limitante será o crescimento dos grandes países emergentes. ■

Os países latino-americanos deverão preparar-se para as duas ameaças que se apresentam: a paralisia financeira e a possibilidade de China e Índia deixarem de crescer

Doutor em Administração de Empresas pela Universidade de Harvard, professor de Finanças do Babson College de Boston e co-autor de Wealth by Association.

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 55


FINANÇAS BANCOS

Francisco González, presidente do Grupo BBVA

“A BOA NOTÍCIA DA CRISE É QUE ELA ACONTECEU” A crise financeira e econômica mundial poderia ter representado um golpe ainda maior se demorasse alguns anos mais para explodir. Essa é a opinião do presidente do Grupo BBVA, Francisco González, que há alguns anos teve que enfrentar críticas de alguns setores por conduzir o banco de forma demasiadamente conservadora, mas que agora colhe seus frutos. Recentemente, o grupo anunciou um aumento de 9,1% em seu lucro, para 4,23 bilhões de euros, e a volatilidade imperante no setor permitiu ao banco passar do 20º lugar entre os maiores do mundo ao 10º. Em recente visita a América Latina, González falou com exclusividade a AméricaEconomia sobre a crise, a América Latina e seus planos de crescimento. 56 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

González: “Se eu pudesse transferir os ativos que tenho em todo o mundo, gostaria de ter mais ativos na América Latina”


Estamos em meio a uma conjuntura desafiadora. Quando se deu conta da profundidade da crise em que estamos inseridos? Há pelo menos quatro ou cinco anos pensamos que as coisas não iam por um bom caminho. Víamos uma desconexão contínua entre a economia real que crescia a 4%, 5% ou 6% em nível global e a economia financeira, que oferecia taxas incríveis, de 100% ou 200%. E sabíamos que isso não poderia continuar assim. Claro, não imaginávamos que os problemas começariam a surgir em agosto do ano passado, mas essa posição ascética e crítica nos levou a ter um crescimento saudável e evitar o contágio de um produto tóxico. Isso nos permitirá estar fora da parte que começa agora, conseqüência de uma recessão: a morosidade. Para isso também nos preparamos fortemente, sem participar de operações de “alavancagem excessiva”, e portanto vamos ter a morosidade mais ou menos padrão, e isso nos permitirá navegar na seguinte parte do ciclo muito melhor do que a média do sistema financeiro.

MIGUEL CANDIA

Por que a mensagem da defasagem entre a economia real e a financeira não foi captada por todos? Boa pergunta. Já faz seis anos que falo desse tema. Possivelmente tenha uma sensibilidade extrema porque trabalhei na bolsa por muito tempo. E a verdade é que tenho pânico dos mercados, os conheço demasiado. E vi claramente a defasagem sem entender por que se concedia um empréstimo a uma empresa que não pode pagar, ou se concediam empréstimos pelo valor de uma casa na suposição de que esta sempre vai subir. Por experiência própria,

pensava que isso não poderia seguir como estava. Mas eu não era o único que pensava assim. Havia muitos outros, mas estes não foram conseqüentes e se estenderam um pouco mais porque a regulação assim o permitia. É verdade que quando todos os seus concorrentes assumem um risco que você não quer tomar, no final é difícil isolar-se 100%, pois isso implica outros riscos que talvez você não queira. Nós tivemos a sorte de a regulação espanhola impedir que tomássemos esse tipo de risco.

Por que as autoridades não enfrentaram isso de melhor forma? Porque a crise é uma crise global e, frente a ela, não há uma autoridade global, nem política, nem regulatória. As respostas frente a essa crise têm sido locais, regionais: da Europa, dos EUA, da China. Portanto, as autoridades seguiram a curva. Agora já se começa a tomar algumas medidas globais, mas não é fácil.

Seria preciso criar uma ONU financeira? Sim, mas isso não se faz de um dia para o outro. Os países não vão ceder soberania tão facilmente. Acho que a reunião de Washington é positiva para colocar as bases de princípios comuns, mas até que isso se transforme em norma, que estas sejam aplicadas e que haja uma boa coordenação, levará tempo.

Há alguma boa notícia em meio a tudo isso? A boa notícia dessa crise é que ela aconteceu, porque se isso não tivesse passado agora, seria mais tarde, e quanto mais tarde, pior. Ela aconteceu quando a economia ia muito bem, e ainda assim causou estragos. Imagine se essa crise acontecesse em quatro anos

mais, com um endividamento que continuasse crescendo. Seria muito pior.

Como está o BBVA? Nós estamos bem. É evidente que estamos tendo uma atividade menor que antes. Mas é preciso ver as coisas do ponto de vista relativo: há dois anos éramos o vigésimo banco do mundo, e hoje estamos em 10º, 11º ou 12º, dependendo do dia, porque a volatilidade dos mercados é extrema. Mas a crise nos pilhou com muito capital, o que é importante, com muita liquidez. No ano passado, securitizamos grande parte do balanço e tomamos 38 bilhões de euros em liquidez, mais do que tínhamos orçado, pensando que a liquidez se transformaria em um tema importante. Outro fato que é importante é a qualidade do nosso portfólio, que em média é muito boa. Ou seja, a morosidade está subindo, mas o restante cresce muito mais. E isso fará a diferença.

Nos últimos anos o BBVA também aumentou sua presença internacional. Qual a importância dessa estratégia para enfrentar a atual conjuntura? Os EUA são um país importante para nós. Queremos estar na zona de maior crescimento dos EUA, que é justamente a do Sul, um prolongamento do México. Além disso, nos demos conta de que nosso banco de varejo e nossa experiência são enormes quando nos comparamos com os bancos norte-americanos, porque nossos sistemas de pagamentos, e o de muitos países latino-americanos, está muito mais avançado. Por exemplo, nós quase não trabalhamos com cheque, fazemos o settlement sobre todos os pagamentos domésticos eletronicamente. Na Espanha,

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 57


MOVISTAR OPEN – ATP VIÑA DEL MAR

VIÑA DEL MAR, CHILE

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ACAPULCO, MEXICO ABERTO MEXICANO TELCEL APRESENTADO PELO HSBC 23 A 28 DE FEVEREIRO, 2009 www.abiertomexicanodetenis.com


FINANÇAS BANCOS ninguém usa cheque. Já nos EUA o cheque é realmente um instrumento incrustado na mentalidade norte-americana e é um elemento de um atraso tremendo quanto à produtividade e à conveniência do cliente. Nosso conceito de fortalecer a marca de varejo é um conceito muito desenvolvido de cross selling. Vendemos de tudo em nossos bancos, até produtos físicos. Isso porque temos um conceito muito amplo do banco.

E a presença na China? A China é outra história. É uma aposta no longo prazo, de dez anos. Lá não se pode estar por conta própria, é preciso ter um sócio local. Nós temos um sócio que se chama Citic, é o sexto ou sétimo maior banco da China. Temos 30% desse grupo, na parte de Hong Kong. O que buscamos lá é trocar conhecimentos e criar uma relação de longo prazo. Se eventualmente eles traçam o caminho que queremos, do livre mercado e do mundo privado, será uma situação espetacular. O mundo neo-econômicopolítico se transfere à Ásia e o BBVA é um dos quatro ou cinco bancos do mundo com presença na China.

E como vê o BBVA na América Latina? Temos uma concepção muito positiva. Sou presidente do grupo desde o ano 2000 e até hoje não me equivoquei nisso. Agora vem a primeira crise de verdade. Veremos como será. Mas, francamente, se nesse momento pudesse transferir os ativos que tenho em todo o mundo, gostaria de ter mais ativos na América Latina.

Mais do que na Ásia? Não, mais do que na Europa.

Dentro da América Latina, onde o

crescimento do BBVA se dá com mais força? O México crescerá menos, mas temos um banco muito importante, o Bancomer, que tem capacidades enormes de reduzir custos e aumentar seu market share. No Chile, vamos crescer mais em termos relativos; no Peru e na Colômbia, continuaremos crescendo. No Paraguai, temos um banco magnífico: são cem pessoas, nada mais, mas funciona que é uma maravilha. Continuaremos crescendo em quase todos os mercados; mais lentamente que antes, porém mais do que na Europa e nos EUA, que estão em recessão. Mas Texas e Alabama, estados onde estamos localizados,

e o respeitamos. Respeitamos cada país e nos sentimos cidadãos de cada país. Se não estamos de acordo com algo, dizemos, mas com respeito. Na Argentina, o tema da nacionalização do sistema previdenciário não estava dentro de nossas previsões; mas, uma vez que está aí, tratamos de nos adaptar a esse realidade e a acatamos.

Mas acatar é uma coisa, e continuar investindo é outra... Bom, para isso é preciso fazer estatísticas e ver para onde o capital vai, quais são os fluxos. No final, é importante a previsibilidade, o estado de direito, que se respeitem os princípios de igualdade de oportunidades,

Fomos tentados a fazê-lo, não posso dizer por quem, e respondemos que não porque não era uma coisa que se encaixava em nossos planos. Mas estamos nas primeiras rodadas desta crise. Certamente seremos contatados novamente, a algumas coisas diremos sim, a outras diremos não. Em geral os governos não querem ficar com os bancos, eles querem é que estes funcionem. Acontece que alguns necessitam de ajudas parciais ou temporárias. Nós não necessitamos comprar bancos; queremos construir um modelo, ser um banco do futuro mais do que ser um banco tão grande.

Não pensam em comprar bancos?

“Nós não necessitamos comprar bancos; queremos construir um modelo, ser um banco do futuro mais do que ser um banco tão grande.” crescem mais que os Estados Unidos em geral, e por isso estou otimista.

Como avalia o mercado argentino e a decisão de nacionalizar o sistema previdenciário? Acho que o mundo caminha na direção de economias de livre mercado com regras adequadas. A economia de mercado e a democracia são a melhor forma de organizar a sociedade. Os que dizem “a economia de mercado falhou, falhou a democracia” não têm razão. A falha está em certas pessoas, em certas instituições, não no sistema, que continuará forte. Gostamos de investir onde há certa previsibilidade, onde o estado de direito impera. E claramente não ficamos satisfeitos quando acontece algo imprevisível. Mas cada país tem sua forma de atuar

que existam meios para que as pessoas possam educar-se, seguir adiante. Quando um país se afasta disso, tem um preço na economia de mercado. Mas ainda assim eu acredito muito na Argentina como país.

Há mais ambições em relação ao Brasil, onde o BBVA só tem uma operação de wholesale e não um banco de varejo? Para discutir é preciso duas pessoas. Se queremos comprar, falta alguém que venda. Ficaríamos encantados de estar no Brasil, mas não tivemos até agora a oportunidade de realizar esse casamento. Mas a vida é longa e certamente haverão segundas e terceiras oportunidades.

O BBVA foi contatado por algum governo entre os países desenvolvidos solicitando o resgate de algum banco em problemas?

O crescimento inorgânico depende em parte de nós e parcialmente de oportunidades, bem como do ciclo econômico. Se o ciclo é duro e longo, haverá muitas oportunidades para nós; se é menor, haverá menos, mas tampouco nos torturamos. Somos menos acquirers do que as pessoas pensam. Se erramos temos muito a perder. Se tivéssemos comprado o que nos ofereceram há um ano, hoje estaríamos em má situação. Espero que sigamos com a cabeça fria para evitar operações que destruam valor. Talvez tenhamos perdido alguma boa. Não há fórmula matemática. Há muitas tentações, e queremos garantir que essas tentações sejam as boas: pecar quando tenhamos que pecar. ■

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 59


ESPECIAL

EDUCAÇÃO

EXECUTIVA

LIÇÃO DA CRISE Menos recursos, novos conteúdos e formatos diferentes. A demanda pelos cursos de educação executiva se transformará devido ao turbilhão global. E algumas escolas já estão reagindo Pablo Hernández

A

bancários da região: apesar de serem um dos clientes mais freqüentes dos programas de educação executiva oferecidos pelas universidades, os bancos da América Latina tiveram que reavaliar o seu orçamento nos últimos meses, incluindo

contração do mercado financeiro e seus efeitos nos negócios poderia ser um excelente assunto para debate em sala de aula. Mas para alguns essa mesma crise é a que os impedirá de estudar. É o caso de muitos executivos

RANKING EDUCAÇÃO EXECUTIVA 2008 Melhores escolas de negócios em programas de capacitação continuada FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE (siglas correspondem à extensão do país usada da internet)

40%

20%

Cobertura de clientes RK 08

RK 07

Escola

Índice Fideliz.

Robustez da oferta % Prog. U. Corp.

Personalização

20%

Professores FT+PT c/ Ph.D.

Rede Internacional

Índice % Visitantes Qual. Visit.

Op. no exterior

Nº Países

Índ. Qual. Convênios 17,4

.ar

48

81

41,4

9,7

ALTA

50,8

47,4

31,4

55

11

2

6 UAI

.cl

54

94

37,9

16,3

ALTA

37,9

10,3

79,6

25

6

9,1

3

2 ITAM

.mx

70

63

65,3

8,6

MÉDIA

40,3

22,4

54,9

27

3

13,5

3 FDC

1

13 IAE - U. AUSTRAL

Nº % Gran. País Clientes Empresas

20%

.br

38

97

62,2

4,4

MÉDIA

21,0

9,7

79,7

16

8

9,3

5

10 UNIANDES

.co

32

75

49,2

10,2

MÉDIA-BAIXA

40,4

16,2

92,1

46

4

3,2

6

16 IESA

MÉDIA-ALTA

63,6

67,1

28,8

6

3

8,8

MÉDIA

63,6

44,0

-

22

4

100,0 8,0

4

7 8 9

.ve

27

0

100,0

8,5

4 IE

.es

22

32

19,4

-

7 PUC CHILE

.cl

20

70

21,6

9,6

MÉDIA

32,4

45,2

93,6

10

6

.ar

55

0

21,6

1,0

MÉDIA-BAIXA

22,0

15,9

95,0

8

3

8,7

16

4

80,3

11 U. DE SAN ANDRÉS

10

5 ESADE

.es

15

0

46,3

39,2

MÉDIA

34,4

4,4

-

11

… ESAN

.pe

85

59

40,2

3,4

MÉDIA-BAIXA

17,2

27,0

73,1

4

4

2,3

12

1 IESE

.es

9

33

27,3

6,7

MÉDIA

91,4

10,0

-

10

2

26,8

13

9 KELLOGG

.us

6

33

N.D.

-

MÉDIA

79,2

-

-

3

3

28,9

14

14 CENTRUM

.pe

38

11

24,0

7,1

MÉDIA-ALTA

52,6

32,2

50,7

2

1

14,9

15

18 IBMEC SÃO PAULO

.br

35

74

31,9

20,0

MÉDIA-BAIXA

52,3

-

-

3

3

10,3

16

19 U. TORCUATO DI TELLA

.ar

11

91

23,0

5,9

MÉDIA-ALTA

29,4

9,3

100,0

2

1

6,8

17

20 UDD

.cl

23

48

13,6

6,0

MÉDIA

16,3

4,4

94,1

5

2

2,1

18

22 U. DEL PACÍFICO

.pe

39

0

74,8

-

MÉDIA

13,5

34,2

62,2

2

1

0,4

19

12 ESIC

.es

21

0

37,3

1,7

MÉDIA

33,8

5,4

-

5

1

2,3

20

… U. BELGRANO

.ar

76

54

N.D.

-

MÉDIA-BAIXA

11,1

-

-

1

1

1,2

21

… ADEN BUSINESS SCHOOL

.ar

15

93

48,8

8,0

MÉDIA-BAIXA

12,7

18,2

52,5

0

0

-

MÉDIA-BAIXA

22,2

57,1

42,4

1

1

5,4

MÉDIA

25,5

3,5

43,8

0

0

0,4

22

17 IDE BUSINESS SCHOOL

.ec

20

50

11,6

-

23

… IEDE

.cl

21

38

18,2

27,7

24

15 EGADE GUADALAJARA

.mx

N.D.

N.D.

43,4

-

MÉDIA-BAIXA

16,1

6,1

43,8

0

0

-

25

21 U. DEL CEMA

.ar

N.D.

N.D.

20,3

14,1

MÉDIA-BAIXA

23,7

-

-

0

0

-

26

… U. AMERICANA

.py

N.D.

N.D.

22,5

-

BAIXA

22,5

14,9

43,8

0

0

-

60 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008


ESPECIAL

EDUCAÇÃO

EXECUTIVA CRITÉRIOS DE SELEÇÃO

AS MAIS INTERNACIONALIZADAS

Elementos para escolher educação executiva

Escolas com mais operações extraterritoriais

FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE QUALIDADE

PROFESSORES

12

IAE AUSTRAL

14,3%

13,6%

VALOR AGREGADO

12,7% PREÇO

11,5%

INOVAÇÃO

Número de países

10 FDC

IE

8 PUC CHILE

UAI

6

ESADE 4

UNIANDES

ITAM

UDD

11,5% PRESTÍGIO

2 IESE

12,6% 0

RECOMENDAÇÕES

0

10

EXPERIÊNCIA

11,0%

12,8%

o de educação, com o que reduzem suas possibilidades de enviar profissionais a cursos de atualização. De olho nessa tendência, a Fundação Dom Cabral (FDC), de Belo Horizonte, buscou uma solução: desenhar um pro-

20 30 40 Número de operações

50

60

grama para executivos de diferentes empresas que tenham necessidades e desafios comuns. É uma mistura dos tradicionais programas abertos oferecidos pelas universidades para executivos de qualquer companhia e dos fechados, que são

% Programas SÓCIOS PARA AMÉRICA LATINA / Operações declaradas 2007-08

Alta Dir.

Preços US$/Hora

Gerência

Alta Dir.

Gerência 1.178

IESE, IPADE, INALDE, ESE (Chile), PAD PIURA, IDE, IEEM (Uruguai), ISE (Brasil), INST. BRAVO MURILLO

14,4

58,3

1.260

UCLA, BABSON, WHARTON, INSEAD, IE, SHANGHAI JIAO TONG U., MELBOURNE BS, CAPE TOWN U., ESADE (Arg.), FGV SP, IESA, EGADE MTY

18,0

40,3

991

872

U. A. BARCELONA, U. P. MADRID, HEC MONTREAL, DUKE U., ASHRIDGE U., KELLOGG, STANFORD, FDC, PUC CHILE, UDESA, INSEAD, IMD

19,1

75,7

950

470

KELLOGG, INSEAD, SAUDER, OLIN, ITAM, UDESA, PUC CHILE, UCT GSB, U. PACÍFICO, UNL (Argentina)

30,6

63,6

1.380

825

ESAN, IESA, EGADE MTY, UDESA, FGV SP, U. AUT. DE MANIZALES, LALC

25,1

61,7

421

497

INALDE, DARDEN, UAI, EGADE MTY, UDESA, FGV SP, INCAE, UNIANDES

11,1

43,7

1.566

1.680

UAI, COPPEAD, FGV SP, IESA, INCAE, ITAM, EGADE MTY, PUC CHILE, UNIANDES, U. PACÍFICO (Peru), UDESA

35,9

20,5

3.600

3.600

KELLOGG, FDC, UDESA

3,8

33,6

870

790

FDC, ITAM, ISEDE-UCU, IESA, FGV SP, INCAE, IE, PUC CHILE, EGADE MTY, UNIANDES

18,7

43,9

906

734

ORT, ICDA (Argentina), INCAE

29,6

43,7

2.400

1.400

MIAMI U., AMERICAN ACADEMY OF FINANCIAL MANAGEMENT HARVARD, CEIBS, INDIAN SB, IESA FDC, PUC CHILE, ITAM

1,1

10,8

403

336

70,6

29,4

8.978

8.978

100,0

-

N.D.

N.D.

EADA, U. CARLOS III (Espanha), UDD, UDESA, U. EXTERNADO, PUC (Equador), UCSG (Equador), ESI (Guatemala),

22,3

31,3

N.D.

N.D.

HARVARD BS, INSEAD, FREEMAN BS, DUKE, TEXAS U. (SAN ANTONIO), FIU, CRUMMER SCHOOL, HKUST

20,8

68,1

N.D.

N.D.

9,4

50,0

555

531

ROTMAN U., ST. GALLEN U.

3,7

11,0

1.480

795

FDC, UDD

FDC, CENTRUM, U. PACÍFICO

32,0

48,4

384

335

EGADE MTY, ESIL (Peru), ESPOL (Equador), U. POLITÉC. DEL CHIMBORAZO (Equador)

48,5

24,2

N.D.

N.D.

FREEMAN BS

6,8

13,5

300

640

-

7,1

85,8

450

413

IESE, IPADE, INALDE (Colômbia), PAD PIURA, IEEM (Uruguai), ESE (Chile)

8,3

35,7

1.250

1.250

-

6,4

78,7

443

477

-

22,8

40,4

2.000

1.500

-

23,3

46,6

660

558

-

-

20,0

N.D.

N.D.

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 61


ESPECIAL

EDUCAÇÃO

EXECUTIVA MERCADO DE GRANDES

ORIENTAÇÃO DE PROGRAMAS Distribuição da oferta de programas de educação executiva na América Latina segundo o nível de executivo

Distribuição dos clientes de educação executiva na América Latina segundo tamanho

FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE PEQ. + MICRO 4% GRANDES 48%

PROFISSIONAL 29%

GERENCIAL 41%

MÉDIAS 48%

OPERACIONAL 7%

ALTA DIREÇÃO 23%

COM DISTINÇÃO

AS CORPORATIVAS

Melhores corpos acadêmicos em educação executiva 2008 (índice base 100)

Percentual de programas em universidades corporativas 2008 FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

9

UAI IDE

81,4 78,6

1 2 3 4

8

ITAM

10

6 7

IBMEC SP

5

4 5

85,2 82,1

UNIANDES

U. DEL CEMA UNIANDES

6

89,1

77,6

16,3 14,1

IAE U.AUSTRAL

7

90,1

IE IAE U.AUSTRAL

3

IESA

UAI

39,2 20,0

PUC CHILE

8

94,7

ESADE IBMEC SP

ITAM

9

KELLOGG

100

IESA

8,5

ADEN BUSINESS SCHOOL

8,0

10

1

IESE

2

FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

10,2 9,7 9,6 8,6

10

76,5 25

50

75

projetados especialmente para determinada companhia.

A VOZ DO CLIENTE A proposta da FDC de adequar seu formato de aula é uma das que começarão a se estender entre as escolas de negócios. É que a atual crise financeira está mudando as condições dessa rentável indústria e a forma como clientes e instituições participam dela. Essa é uma das principais conclusões dessa quinta edição do ranking de educação executiva promovido todos os anos por AméricaEconomia Intelligence. O objetivo é analisar a oferta educacional das melhores escolas de negócios da região para as empresas e verificar quão fortes estão de acordo a diferentes critérios: quantidade e qualidade dos clientes que atendem, o grau acadêmico de seus professores, a capacida-

30

40

50

de de adequar seus cursos às necessidades e demandas das empresas, bem como suas redes e convênios internacionais e regionais, que lhes permitem atender os clientes globais de melhor forma. Esses e outros critérios foram organizados em quatro diferentes dimensões cujos resultados podem ser vistos na tabela das páginas 60 e 61 (a metodologia pode ser verificada na pág. 67). Esta edição do ranking é liderada por duas escolas do Cone Sul: a IAE da Universidade Austral, de Buenos Aires, e a chilena Universidade Adolfo Ibáñez, com sede em Miami e Santiago. Às líderes se seguem a mexicana ITAM, da Cidade do México, a FDC do Brasil e a colombiana Uniandes, de Bogotá. Tratase de uma concorrência estreita da qual também participam

A brasileira Fundação Dom Cabral buscou uma solução à queda na demanda: desenhar um programa educacional para executivos de diferentes empresas que tenham necessidades e desafios comuns.

62 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

20

100



ESPECIAL

EDUCAÇÃO

EXECUTIVA

CARLOS GARCÍA IESA A escola venezuelana protagoniza um dos saltos mais destacados no ranking de 2008, acompanhada de professores de qualidade e uma rede de colaboração com escolas de toda a região.

MARTHA CECILIA BERNAL UNIANDES

MÓNICA SACRISTÁN ITAM

GABRIEL ARAMOUNI UDESA

A escola colombiana distingue-se por seu nível de colaboração na região. Tem um dos corpos docentes de maior prestígio e é líder em seu país.

Novamente em uma posição privilegiada, a escola mexicana se sobressai por seu volume de programas e seu alto nível de complexidade.

A escola argentina é reconhecida na América Latina por seu alto nível de participação em programas colaborativos.

escolas globais com forte presença na região, como os espanhóis Instituto de Empresa, o Esade, o Iese, e, desde o ano passado, a escola madrilenha Esic, além da norte-americana Kellogg, de Chicago. Todas estas conquistaram postos privilegiados por conseguirem fidelizar sua carteira de clientes melhor que a concorrência (quanto mais clientes, mais méritos), seja porque impulsionaram a criação de universidades corporativas ou porque fortaleceram sua oferta de programas fechados a empresas (ou in company, como são conhecidos no jargão acadêmico).

Exemplos de outras crises econômicas indicam que a educação de executivos é uma linha prescindível no orçamento das companhias. Suspender um programa permite economizar até US$ 100 mil.

64 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

Para todos, não obstante, os trimestres e os cursos que os acompanham estarão marcados pela crise. “Se observarmos o que aconteceu em crises anteriores, como a que se seguiu ao atentado de 11 de setembro nos EUA, veremos que a educação de executivos é uma linha prescindível no orçamento de uma companhia”, diz Stephen Burnett, decano associado da Kellogg. Uma hora de aula para um grupo fechado de gerentes ou altos executivos de uma empresa pode custar entre US$ 1 mil e US$ 3 mil, dependendo da instituição que a ofereça. E dado

MAPA DE POSICIONAMENTO Clientes de programas fechados ou in company em educação executiva 2008, por escolas FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE 60 U. SAN ANDRÉS 50 40 U. DEL PACÍFICO Médias

Devido aos altos custos de comercialização, as instituições sempre tentam capturar primeiro os clientes maiores, para depois focar-se nos médios e, finalmente, nos pequenos. No mercado da capacitação continuada, o processo se repete. As escolas tentam primeiramente conquistar as demandas de capacitação de grande clientes. Mas como nessa luta nem todas podem ganhar, algumas têm que se conformar em atender à demanda de empresas de menor porte. Essa é a dinâmica observada no gráfico do mapa de posicionamento regional de acordo à sua carteira de clientes in company. Tal como se vê, 57,7% das escolas se localizam no quadrante 3, o que significa que contam com uma carteira que combina equilibradamente grandes empresas (com vendas anuais superiores a US$ 50 milhões) e médias (com vendas anuais entre US$ 5 milhões e US$ 50 milhões). Todas as escolas que não são latino-americanas mas têm presença e operações na região se posicionam nesse quadrante. Por sua vez, 11,5% das instituições têm uma carteira mais focada nas médias e 15,4% podem considerar-se ganhadoras, com uma carteira mais focada nas grandes companhias da região. A Esan é a única escola que aparece como ganhadora em ambos os segmentos, com mais de 30 clientes em cada um deles.

TEMPOS DIFÍCEIS

CENTRUM 30 IESA

1

ESAN

2

3 4 ESIC ESADE IEDE UDD U. BELGRANO 10 IESE IE IBMEC SP IDE PUC CHILE UTDT ADEN UNIANDES KELLOG 0 0 10 20 30 Grandes

ITAM

20

IAE U. AUSTRAL UAI FDC 40 50

60


ESPECIAL

EDUCAÇÃO

EXECUTIVA que um programa pode durar entre 12 e 30 horas, suspendêlo pode gerar uma economia imediata de US$ 12 mil a US$ 100 mil nos gastos da empresa. “Os orçamentos de formação para 2009 já foram reduzidos, porque as vendas caíram”, diz a argentina Magui López, da gerência de RH da filial argentina da francesa Danone. Não obstante, a transformação não tem relação apenas com orçamentos. “As companhias estão modificando as solicitações temáticas tradicionais de educação continuada, como finanças e logística, por cursos e programas mais focados na rentabilidade de capital e no fomento da inovação dentro das empresas”, diz Mónica Sacristán, do Itam. No Peru, Daniel Infante, da empresa alimentícia Snacks (ex-Frito Lay Perú), observa que seus executivos mudaram a ênfase dos cursos que demandam. “Nossos executivos estão nos pedindo cursos de bolsa de valores, de investimento e manejo de dinheiro”,

diz Infante. “Vamos ter que considerá-los em 2009.” Além disso, se tem observado um aumento na demanda por programas abertos. Isso porque, frente a um possível corte de pessoal, os executivos buscam capacitar-se. “Assim protegem sua empregabilidade, tornando-se mais valiosos para suas companhias”, diz Sacristán, do Itam. E não é de se estranhar, porque nossos executivos têm pouca formação sobre como operar em tempos de crise, segundo afirma uma executiva da Petrobras que prefere não se identificar. “Sabemos mais como operar em tempos de prosperidade e abundância”, diz. Uma pesquisa feita por AméricaEconomia Intelligence com um grupo selecionado de gerentes de recursos humanos de grandes companhias que operam na América Latina, na segunda quinzena de outubro – a crise escurecia o panorama mundial – revelou que os clientes que demandam capacitação se inclinam majoritariamente pela opção de desenvolver o capital humano

As companhias estão mudando suas demandas temáticas tradicionais de educação continuada, de finanças ou logística por programas focados na rentabilidade do capital e no fomento à inovação.

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ESPECIAL

EDUCAÇÃO

EXECUTIVA da companhia para enfrentar períodos turbulentos e, na mesma linha, menor é a opção pelo corte de pessoal como forma de enfrentar a baixa maré econômica. Um dado revelador.

A TRAMA REGIONAL Outra das fortes ferramentas com as quais as escolas de negócios contam para enfrentar uma provável retração de mercado em 2009 é sua rede de sócios. Porque, na batalha pelos contratos de grandes companhias, uma combinação precisa de oportunidade, prestígio e bons sócios pode constituir uma oferta irresistível. Esse é justamente o atributo no qual a argentina IAE da Universidade Austral se destaca, por oferecer a maior quantidade de programas às empresas internacionais, incluindo muitas operações fora da Argentina. Nesse sentido, as redes de colaboração entre escolas, como Sumaq e Unicon, podem ver-se fortalecidas nesse novo cenário, devido a que estas os provêem de uma estrutura de custos mais leve e flexível na hora de trabalhar com clientes transnacionais. Os clientes, não obstante, são muito exigentes na hora de fazer sua seleção internacional. Prova disso foram os vários meses que os executivos do grupo alemão Linde levaram para escolher qual universidade latino-americana seria a responsável pelos cursos de capacitação a seus executivos na região. Finalmente, optaram pela colombiana Universidade de los Andes, devido a que, além de cumprir com todos os padrões de qualidade acadêmica, demonstraram contar com uma rede de sócios de igual prestígio, o que garantia a qualidade do serviço no restante dos

países onde possui operações. Outra das escolas protagonistas desse fenômeno de colaboração é a argentina Universidade de San Andrés, que está unida tanto às outras sete escolas que formam a aliança Sumaq quanto às oito latino-americanas que formam parte da Unicon. “A opção por colaborar se fundamenta na demanda das empresas por alta qualidade, bem como pelo acesso a uma rede de universidades de equivalente prestígio para garantir essa qualidade de serviço”, diz Gabriel Aramouni, diretor da área de educação executiva. “Além disso, é uma estratégia de crescimento: dentro de uma rede de escolas sócias se desenvolve o fenômeno da concorrência regional, isolando dessa forma a concorrência local.” A colaboração se dá nos planos docente e técnico, ao compartilhar métodos e recursos, distribuindo o lucro de forma proporcional ao volume de recursos facilitados. “A participação no Sumaq só traz vantagens”, diz Martha Cecilia Bernal, diretora de management development da colombiana Universidade de los Andes. “Quanto mais forte for a relação com nossas escolas irmãs, mais simples se torna gerar ofertas de melhor qualidade para empresas regionais.” E, além disso, permite resolver facilmente problemas que possam surgir, como, por exemplo, um professor que adoeça e não possa dar o curso. “Isso se soluciona com um telefonema.” Outras que estão nessa linha são o Itam da Cidade do México, a PUC do Chile e a FDC, de Belo Horizonte. “Essas alianças nos trouxeram contatos estratégicos e também maior clareza nos desenhos em atenção às diferenças na cultura em-

A opção de colaborar se fundamenta em que as empresas demandam alta qualidade, bem como o acesso a uma rede de universidades de equivalente prestígio para garantir a qualidade do serviço.

CAPACITAR-SE EM ÉPOCA DE CRISE

TAMANHO DOS CLIENTES

Percepção de executivos da região sobre estratégias para enfrentar a crise financeira

Distribuição de clientes de educação executiva, por tamanho Segundo vendas, em US$ milhões

FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

O desenvolvimento de capital humano é a melhor forma de competir em tempos de crise

360 83,3%

319 300

Os recursos da empresa devem focar-se integralmente em combater os efeitos da crise

240 199

12,5%

Devem-se postergar as decisões de capacitação até que o mercado entregue sinais de estabilidade

180

160

120 60

4,2%

0%

25

25%

50%

66 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

75%

100%

MENOS DE 5

ENTRE 5 E 50

ENTRE 50 E 500

MAIS DE 500


ESPECIAL

EDUCAÇÃO

EXECUTIVA

COMO FAZEMOS O RANKING DE EDUCAÇÃO EXECUTIVA? Para elaborar este ranking, a equipe de AméricaEconomia Intelligence comunicouse diretamente com as escolas e universidades que desenvolvem programas de educação executiva às maiores corporações da região. Cada instituição recebeu um questionário, e as informações enviadas foram verificadas e organizadas em quatro grupos: Clientes: A avaliação do tamanho da rede de negócios foi feita a partir de uma estimativa do volume de negócios dos clientes associados a cada escola. A isso se somou um fator de integração da oferta, que responde à aglutinação de esforços da escola buscando abarcar todos os segmentos funcionais da empresa (40%). Oferta: Também se considerou importante o nível da personalização ou customização da oferta das escolas, analisando primeiro o percentual de programas que as escolas oferecem sob o formato de universidades corporativas, acrescentando depois a qualidade da aprendizagem, medida pela densidade de alunos por sala

presarial de cada país”, comenta Mónica Sacristán, do Itam, ex-membro do conselho do Unicon. Segundo Carlos García, diretor da área de desenvolvimento executivo da escola venezuelana Iesa, é possível gerar desenhos ajustados e pertinentes às necessidades do cliente, inclusive quando estas se constitem um verdadeiro desafio, seja pelos próprios conteúdos ou pela complexidade da logística. Colaborar para ganhar. Esse seria o mote para 2009. Prova disso é o programa “Growing at Kraft” que a empresa norteamericana de alimentos desenvolve em conjunto com o Iesa, a Egade de Monterrey, a Universidade de San Andrés e a Fundação Getulio Vargas. A lógica desse programa é que a empresa determina as necessidades a cobrir e escolhe as escolas locais que melhor possam responder a esses requisitos. “Assim se garante a qualidade dos conteúdos ministrados e se reduzem custos de transporte dos executivos”, diz Eliza Pérez, da área de recursos humanos da Kraft na Venezuela. Em 2009 as escolas terão que ser mais criativas que nunca para estreitar ainda mais os laços e enfrentar uma eventual redução da demanda. Se for pelo lado da qualidade, quem apresentar uma oferta de alcance regional será sempre uma alternativa atraente, e nisso as escolas que demonstrarem maior trajetória na colaboração e no trabalho

(quanto menos, melhor) e, finalmente, considerando a presença de um modelo teórico para o desenho e posterior aplicação do aprendido nas empresas (20%). Qualidade do corpo docente: A estimativa do componente acadêmico foi estabelecida sobre a relação de doutores e mestres em tempo completo ou meio período. Também se estabeleceu uma estimativa de excelência dos professores visitantes através de uma escala de pontos de acordo com o grau de prestígio da universidade em que esses se formaram (20%). Colaboração: Esta foi avaliada através do número e volume de operações fora de seu território ou fora das sedes centrais da escola. Também se considerou o grau de prestígio dos sócios com os quais registraram operações no último ano (20%). Os resultados de cada índice foram ponderados por seu respectivo fator em uma equação linear indicando a pontuação final que determina a localização de cada escola no ranking de Educação Executiva 2008. 40%

20%

20%

20%

Cobertura de clientes

Robustez da oferta

Professores

Redes de colaboração internacional

EXPERIÊNCIA EM NEGÓCIOS Anos de experiência dos acadêmicos que operam em programas de educação executiva, 2008 FONTE: AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

ACADÊMICA

12,8

CONSULTORIA

10,6 10,4

EMPRESARIAL

2

Em 2009 as escolas terão que ser mais criativas que nunca e estreitar seus laços para enfrentar uma redução da demanda. As que demonstrarem mais experiência em colaboração, estarão em vantagem.

4

6

8

10

12

14

associado terão vantagem. E, se for pelo lado do preço, serão mais bem-sucedidas as que possuírem uma estrutura mais competitiva (e flexível). Por isso, o talento das escolas estará em convencer tanto seus clientes históricos quanto os novos de que a melhor forma de “enfrentar o temporal” é incorporar novos conhecimentos dentro das organizações: mais inovação, mais criatividade. E de que, para isso, a educação continuada é a melhor aliada. “Quem deixar de capacitar seus executivos sofrerá as conseqüências, não imediatamente, mas quando quiser se expandir”, diz Stephen

Burnett, da Kellogg. ■ Com Daniela González 17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 67


ALEXANDRE BATIBUGLI

I-BIZ

MARANDOLA: Biodiversidade a favor da cura

Xamãs do século 21 Os laboratórios latino-americanos visitam cada vez mais as florestas e montanhas em busca de inspiração Juan Pablo Dalmasso, Córdoba

C

uras com base em venenos, aranhas, sapos e serpentes podem parecer coisa de bruxas e xamãs. Mas o brasileiro William Marandola, gerenteexecutivo da Coinfar Pesquisa e Desenvolvimento, joint venture

paulista dos laboratórios Aché, Biolab e Unión Química, garante que é possível conter o desenvolvimento de tumores cancerígenos e sua metástase com carrapatos, prolongando a vida do doente. Também afirma

68 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

que com veneno de serpente se pode combater a hipertensão, ou aplacar dores crônicas ou agudas por longos períodos com um poder 600 vezes maior que o da morfina, sem causar dependência. Marandola não é aprendiz de feiticeiro e suas fórmulas são bem mais sofisticadas que as de um esotérico. Depois de mais de cinco anos de trabalho junto a laboratórios e centros de pesquisa de universida-

des, investimentos de US$ 6 milhões e aportes estatais de outros US$ 2 milhões, a Coinfar conseguiu isolar princípios ativos venenosos, excrecências e outras asquerosidades da fauna brasileira, que renderam 13 patentes no Brasil e 48 no exterior. Agora espera que se transformem em produtos comercializáveis o mais rápido possível. Hoje o laboratório trabalha com sete projetos, entre eles de produtos analgésicos, anti-hipertensivos, antitumores, anticoagulantes e anti-sépticos. Este ano, fez um chamado a pesquisadores para financiar projetos de US$ 1,8 milhão durante os próximos dois anos, convertendo-se em uma das apostas mais originais da biodiversidade brasileira. “Trabalhamos com venenos e animais. Alguns princípios


I-BIZ já eram conhecidos, mas desde 2001 as tecnologias disponíveis para trabalhar com proteínas e péptidos (moléculas que permitem a regulação do organismo) abriram muitas possibilidades na fabricação de produtos”, diz Marandola. “E a fauna representa um campo muito menos explorado que a biodiversidade vegetal.” E, assim, as oportunidades de chegar a propostas originais aumentam. Os biofármacos, elaborados com base em recursos naturais, não são originais. Há cinco anos, representavam 30% das formulações no mercado mundial e, segundo alguns papers, na área do câncer e de algumas doenças infecciosas, representariam respectivamente 60% e 70% das novas drogas lançadas no mercado. Mas os laboratórios brasileiros, pressionados pelas leis de patentes e alentados por subsídios à inovação, encontraram em sua pouco explorada biodiversidade amplas possibilidades de inovação. “E de abandonar uma política de cópia e produção de genéricos de pouco valor agregado”, observa no Canadá, Rahin Rezaie, pesquisador do McLaughlin-Rotman Centre da Universidade de Toronto. Segundo estimativas da revista especializada Nature, existem 19 empresas ligadas à biomedicina. A própria Aché, acionista da Coinfar e maior laboratório farmacêutico brasileiro, desenvolveu o primeiro medicamento 100% nacional: o antiinflamatório Acheflan, que chegou às gôndolas em 2005 depois de sete anos de pesquisas e investimento de US$ 7 milhões na Cordia verbenacea, planta tropical à qual um dos fundadores da empresa, Víctor Saulys, tinha sido apresentada por um curandeiro depois de uma lesão sofrida jogando futebol. Depois disso, a empresa lançou um portfólio de seis produtos com base em

extratos vegetais. Outro exemplo é a Pele Nova Biotecnologia, empresa criada em 2003 por Fátima Mrue e Joaquim Coutinho Netto, que descobriram que o látex da Hevea brasiliensis favorecia a regeneração do tecido lesionado. Eles foram rápidos em registrar o produto, hoje conhecido como Biocure. Suas potencialidades atraíram a atenção de personalidades como Ozires Silva, um dos fundadores da Embraer, que se encarregou de obter financiamento de venture capitals. Em 2004, o produto foi aprovado no Brasil e atualmente é aplicado em feridas, incluindo úlceras diabéticas, feridas cirúrgicas ou traumáticas. Enquanto testam sua aplicação em queimaduras de segundo e terceiro graus, os empresários continuam a registrar o produto em outras praças, já somando 60 países. Desafios naturais É mais eficiente fazer biofármacos do que trabalhar com a síntese química tradicional? “Seria polêmico afirmá-lo”, diz Marandola, da Coinfar, admitindo que se requer uma menor escala de pesquisa para buscar as moléculas necessárias, já que a história das espécies e conhecimentos tradicionais dão uma pista bastante certeira sobre o que buscar. “Se um veneno mata por infarto, certamente deve ter um princípio hipertensor”, exemplifica. Somado a uma boa estratégia de gestão de pesquisa e desenvolvimento (P&D), esse fato deveria tornar a inovação mais acessível, sugerem alguns especialistas, Outros identificam vantagens de origem nas moléculas naturais. “São desenvolvidas pelas espécies com objetivos muito específicos, e por isso são menos arriscadas para a metabolização por parte de terceiros”, diz a argentina Sara

Palacios, do Programa de Prospecção de Plantas Regionais da Universidade Católica de Córdoba. Sempre e quando a planta não tenha sido afetada por contaminantes ou não se trate de uma espécie chamada Cicuta, adverte. E haveria fases de pesquisa clínica, como a prova em animais, que seriam mais breves que nos processos químicos tradicionais. Mas nem tudo são flores. O Brasil é líder devido à escala de sua indústria, ao apoio do setor universitário e a incentivos fiscais, mas ainda falta um longo caminho pela frente. Segundo as pesquisas

Tecnológico de Monterrey criou este ano a cátedra de biofármacos e já possui duas patentes para componentes da casca do feijão preto no combate ao câncer “que estamos negociando para comercializar através de uma farmacêutica nacional”, diz Sergio Serna Saldivar, encarregado da área. Saldivar afirma que também já têm estudos avançados para produtos contra o colesterol e o diabetes não-demandante de insulina. “Sempre com base em vegetais de produção massiva para garantir escala de produção.” No caso dos países andinos,

Problemas na formação de recursos humanos em P&D são desafios a superar. do Centro McLaughlin-Rotman da Universidade de Toronto, os problemas de formação de recursos humanos em P&D, a ainda pouco aceita relação universidade-empresa, mais as falências de infra-estrutura para ensaios clínicos em distintos níveis são desafios a superar. Nesse marco, não é de surpreender que no México, onde a busca por inovação dos laboratórios ainda é recente, ainda não se tenha aproveitado o fato de o país contar com 10% da biodiversidade mundial (quantidade de espécies conhecidas no país sobre a base dos tratados internacionais). No caso da Bolívia, não é a Bolívia, mas os países andino-amazônicos. Há alguns exemplos. O Instituto de Biotecnologia da Unam conseguiu desenvolver um anticoagulante muito útil para infartos e tromboses cerebrais com base na saliva do Desmodus Rotundus, um morcego local, que será aplicado pelo Laboratórios Schering. Já o

da Bolívia ao norte, que acumulam 25% da biodiversidade mundial, já é possível identificar exemplos de exploração dos recursos naturais com valor agregado. Na Colômbia, a LabFarve comercializa produtos de base fitoterapêutica como complementos nutricionais ou para fins cosmetológicos com base na biodiversidade local. Ao sul, na Argentina, as leis de propriedade intelectual não permitem registrar produtos naturais e por isso a biodiversidade quase não foi explorada. Assim, vários laboratórios de biotecnologia da saúde optaram por estratégias afastadas da herboristeria local. “Com um bom nível de pesquisadores, sofisticado, mas com poucas empresas”, avalia Marandola em São Paulo. “Lamentavelmente, ainda não contamos com uma integração universidade-empresa em escala regional”, critica. Talvez seja hora de intercambiar poções e xamãs. ■

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 69


CLICS & CHIPS [gadget]

Estilo retrô O design da câmara PowerShot G10 da Canon é antigo, mas seu interior a converte em um produto de qualidade profissional. Tem resolução de 14,7MP e inclui lentes com ângulo periférico de 28 mm e zoom óptico de 5x. Permite armazenar as fotos em formato RAW, tem tela LCD de 3 polegadas e custa US$ 499. www.canon.com

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Mini-churrasco Deixe de depender de uma grande e cara churrasqueira para desfrutar de uma deliciosa carne. A Grilliput Compact Grill é portátil, compacta e desmontável. Quando o fogo acaba, pode ser armazenada em um pequeno cilindro. Feita em aço inoxidável, pesa 560 g. e suas dimensões são 23 x 26 cm. Custa US$ 20. www.candlelantern.com

[.com]

Quem liga não paga Em tempos de crise, sempre é recomendável economizar. Com o site EvaPhone, sua conta telefônica poderá cair consideravelmente, pois permite usar VoIP para fazer ligações gratuitamente para qualquer destino. Para quem não está registrado, permite apenas duas ligações diárias. www.evaphone.com

[gadget]

Janela para o céu Se você trabalha em um lugar escuro, longe de qualquer raio de sol e sua vista panorâmica são apenas paredes brancas, prove a SkyV HD Virtual Skylight. Trata-se de um sistema que incorpora telas de LCD de alta resolução que são colocadas no teto, onde são exibidas imagens como as que seriam vistas olhando-se por uma janela. Chega ao mercado em 2009. www.theskyfactory.com 70 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008


NEGÓCIO FECHADO >>BANCO CAJA SOCIAL COLMENA O fundo de investimento norte-americano Brysam Global Partners comprou uma participação minoritária no banco colombiano Caja Social Colmeia. Os termos da aquisição não foram revelados, mas o Brysam havia anunciado sua intenção de investir em bancos colombianos para aumentar sua carteira de investimentos na América Latina. O Brysam também tem uma participação no Grupo Financiero IXE, do México, e no banco Vozrozhdenie, da Rússia. >>DASA A Diagnósticos da América, ou DASA, empresa brasileira de serviços de diagnóstico na área de saúde, anunciou a compra do Grupo Maximagem, por cerca de US$ 17 milhões. A Maximagem é uma das maiores empresas de serviços de diagnóstico por imagens em São Paulo, com cerca de US$ 16 milhões em receitas em 2007. A DASA registrou receita de US$ 102 milhões até 2007. >>KIMBERLY-CLARK A empresa norte-americana de papéis e cartão chegou a um acordo para comprar por cerca de US$ 290 milhões os 31% de participação que não detinha em sua filial colombiana Kimberly Colpapel,

ITAÚ - UNIBANCO: O NASCIMENTO DE UM GIGANTE

da holding Colombiana de Inversiones, ou Colinversiones. A Kimberly explicou que o atrativo da compra está na mudança dos hábitos de consumo das pessoas na Colômbia e nos mercados andinos. A Kimberly Colpapel tem três fábricas e mais de três mil empregados. >>KRAFT A empresa de alimentos dos EUA vendeu suas plantas no Equador e no Brasil à empresa colombiana fabricante de gelatinas Progel por cerca de US$ 25 milhões. Com esta aquisição a Progel aumentará sua capacidade de produção de 10 mil toneladas para 16 mil toneladas por ano e se tornará a terceira maior produtora do mundo. >>LEHMAN BROTHERS BRASIL As operações brasileiras do falido banco de investimentos norte-americano foram compradas pelo Banking & Trading Group (BTG), do Brasil. O Lehman tem cerca de 30 profissionais contratados para prestar serviços de assessoria em fusões e aquisições, lançamento de ações e operações de bancos de investimento. A BTG tem escritórios em São Paulo, Rio de Janeiro, Nova York e Hong Kong e gere cerca de US$ 800 milhões em ativos.

>>Itaú – Unibanco

Os dois bancos brasileiros anunciaram a fusão de suas operações, que resultará na criação do maior grupo bancário privado no hemisfério Sul e um dos 20 maiores do mundo, em ativos. A nova empresa terá patrimônio líquido de cerca de R$ 51 bilhões (US$ 24 bilhões) e cerca de 15 milhões de clientes. O Itaú é o segundo maior banco privado do Brasil e tem operações na Argentina, Chile e Uruguai. >>MINERA ATACOCHA O grupo brasileiro Votorantim concordou em pagar aproximadamente US$ 145 milhões por 84,54% do capital votante da peruana Compañía Minera Atacocha, que produz zinco, chumbo, prata e cobre. No início deste ano, a Votorantim fez uma oferta pública pela peruana Compañía Minera Milpo, mas não pôde obter o controle da empresa. >>MOLINOS O grupo alimentício argentino Molinos Rio de la Plata comprou por cerca de US$ 12,5 milhões 49,4% do grupo chileno Carozzi na Compañía Alimentícia Los Andes. A Los Andes produz chocolates, biscoitos, doces e guloseimas com as marcas Bonafide, Billiken, DRF e Nugaton. >>NAMISA Um consórcio composto pelas

japonêsas Itochu, Nipon Steel, JFE Steel, Sumitomo, Kobe Steel e Nisshin Steel, juntamente com a coreana Posco, comprou 40% da brasileira Nacional Mineiros, ou Namisa, uma subsidiária da Companhia Siderúrgica Nacional, por aproximadamente US$ 3,1 bilhões. A Namisa produz aproximadamente 20 milhões de toneladas de ferro por ano. >>PAMPA DE PONGO A empresa chinesa Nanjinzhao Group irá adquirir 100% do projeto de ferro Pampa de Pongo no Peru por cerca de US$ 200 milhões. A vendedora é a Cardero Hierro, a subsidiária local da canadense Cardero Resource. O projeto Pampa de Pongo está localizado no distrito de Marcona, no departamento do ICA, e tem uma área total de 15,3 mil hectares. >>SAIPEM A empresa petrolífera italiana Saipem anunciou a assinatura de contratos no valor de cerca de US$ 1,1 bilhão para realizar atividades exploratórias no Peru e na Venezuela. Os contratos foram concedidos para várias empresas e incluem 17 plataformas com potenciais variáveis de exploração de energia. >>SOLDEXSA A empresa peruana Soldexsa, parte do grupo Brescia, comprou três empresas venezuelanas de solda: a Soldaduras West Arco, a Soldaduras Megriweld e a Comercializadora de Electrodos de Venezuela, por aproximadamente US$ 97 milhões. A Soldexsa, uma das empresas líderes em soldas no Peru, tem operações nos Estados Unidos, Canadá, Chile, Colômbia, Bolívia e Equador, entre outros países.

17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 71


RAIO X [PANAMÁ]

TESTE DE FREIOS A ampliação do Canal ajudará a evitar que a descida não seja traumática em um ano eleitoral Rodrigo Lara Serrano

ALÉM DO CANAL POPULAÇÃO (MILHÕES)

2003

2004

2005

2006

3,284

3,113

3,169

3,226

PIB (VAR.%)

4,2

7,5

6,9

8,7

INFLAÇÃO (%)

0,6

0,5

2,9

2,5

DESEMPREGO (%)

15,9

14,1

12,1

10,4

IED (MILHÕES US$)

771

1.004

1.027

2.574

REMESSAS (MILH. US$)

220

231

254

292

EXP. TOTAIS (MILH. US$)

5.072

6.078

7.591

8.476

IMP. TOTAIS (MILH. US$)

6.274

7.617

8.907

10.201

FONTES: AEI, FMI, CONTROLADORIA DO PANAMÁ E CEPAL. / E=ESTIMATIVA

72 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

criado tensões. Antes mesmo da crise em Wall Street, o déficit de conta corrente e a inflação do país (9,8% de agosto de 2007 a agosto de 2008) indicavam que nem tudo ia bem. A revelação recente de que se negociam novos empréstimos com o Banco Mundial e o BID, que serão destinados a cobrir pagamentos de dívida externa em 2009, é consistente com o dado que indica que este ano o superávit fiscal seria de somente 0,4%, e um déficit de 1,1% para 2009. O fortalecimento do dólar – a economia do Panamá é dolarizada – afeta tanto as exportações de bens (de bananas a roupas) quanto os clientes sul-americanos da Zona Livre de Colón, que não apenas comprarão menos, como também registrarão quedas em suas atividades. O próprio tráfico do Canal já dá sinais de descenso, alinhado ao desaquecimento mundial. Do lado positivo, o plano de infra-estrutura turística, os trabalhos de ampliação do Canal, o novo porto de origem de cruzeiros em Colón e a nova estrada Cidade 2007 08E do Panamá-Colón terão efeitos 3,343 3,403 dinâmicos sobre alguns setores 11,2 9,0 da economia. A incógnita é se a 4,2 9,6 crise de liquidez não terminará 6,3 6,1 afogando outros megaprojetos, como o de converter o país em 1.825 807 um centro de refino de petróleo 309 290 (Occidental e Qatar Petroleum), 9.917 9.608 ou o gigante plano imobiliário em 12.752 13.124 Fort Howard. ■

SOLEDAD TIRAPEGUI

A

pergunta é simples. Com os EUA, a zona do euro, o Reino Unido e o Japão experimentando uma queda de 0,8% em seu PIB conjunto em 2009, como antecipa um estudo recente da Fitch, o Panamá conseguirá crescer 7,5% no ano que vem tal qual suas autoridades anunciam? A lógica seria dizer que não, especialmente porque 70% de seu PIB dependem de serviços vendidos ao exterior. Mas é preciso considerar que o Panamá tem sido uma das economias da América Latina com as maiores taxas de crescimento graças ao investimento em infra-estrutura, particularmente com o projeto de expansão do Canal do Panamá, de US$ 5,3 bilhões. Prevê-se que esses projetos permitirão que o país reaja à desaceleração global e mantenha taxas de crescimento ao redor de 16%. É provável que o otimismo do governo do presidente Martín Torrijos se baseie na necessidade de enviar uma mensagem: a de que em maio de 2009 haverá eleições presidenciais. E nesse assunto Torrijos e o Partido Revolucionário Democrático (PRD) não estão bem preparados, com um apoio que oscila em torno dos 35%. Somente a incapacidade da oposição de apresentar uma frente unida permite prever que a candidata da situação, ex-ministra da Habitação, Balbina Herrera se imponha sem problemas, a menos que a crise se intensifique. O fato de o governo não conquistar popularidade depois de um boom alimentado por investimentos imobiliários, de turismo e do comércio, além do próprio gasto público, explica-se por motivos alheios à economia, bem como por Torrijos não ter conseguido reduzir a notória desigualdade de renda no país. A existência de uma taxa de desemprego próxima dos 7% entre a mão-de-obra não-qualificada enquanto entre a qualificada essa é de praticamente zero é outro sinal. E tudo isso tem


VISÕES EM BUSCA DE NEURÔNIOS PREMIUM Neuropsicólogo revela que a sabedoria não é um dom, é uma meta. Acessível

“As

pessoas que me deixam com a impressão de serem especialmente penetrantes e astutas tendem a extrair o máximo de informação de alguém ao invés de tentar deslumbrá-lo com seu próprio conhecimento e perspicácia.” O autor da frase é Maquiavel? Warren Buffet? Não. A resposta é Elkhonon Goldberg, diretor do Instituto de Neuropsicologia e Funcionamento Cognitivo da Universidade de Nova York. “Acho sinceramente que o interesse em outras mentes é um dos requisitos fundamentais da inteligência executiva”, diz. Inteligência executiva? Existe algo assim? Claro. Sua definição é cristalina. Trata-se da capacidade de encontrar caminhos de atuação ótima “em situações autenticamente novas”. E isso se conquista sobre a base de entender o que pensam e sentem como próprios ou alheios, representar os resultados futuros de ações presentes e – algo assombroso – poder imaginar presentes que não existiram, avaliando crítica e cabalmente as decisões do passado. Políticos, empresários, executivos, militares e líderes de todo tipo que dedicaram toda sua vida a “tomar decisões executivas complexas” costumam se caracterizar por acumular “uma grande biblioteca neuronal de lembranças executivas genéricas”. Trata-se de “padrões” que permitem interagir com a realidade sempre flutuante. Alguns diriam que isso não é nenhuma novidade. Que se chama “experiência”. Outros usarão a expressão “sabedoria”. Outros, “gênio”. O livro O paradoxo da sabedoria não trata da genialidade – artigo caro, escasso, às vezes destrutivo e que não costuma ser reconhecido à primeira vista – mas de como envelhecer pode implicar, como um prêmio ao esforço de uma vida, uma mente lúcida que resiste e, às vezes, supera o deterioro biológico. Segundo esse cientista, gênio e talento se mostram e florescem plenamente na juventude. Acontece. Nada se pode fazer para convocá-los. Já sabedoria e competência são resultados de uma escolha. Do trabalho. Dos erros. Da opção por flexibilidade. E o demonstra. A cada capítulo, vai rastreando como o estudo da mente nos últimos dez anos derrubou as crenças prévias sobre sua imutabilidade passada a juventude. Bem como sobre sua forma de funcionar em qualquer idade. Parte da “magia” do tema é que o modelo dual clássico

sobre o cérebro como uma caixa vazia que se enche de coisas ou uma caixa quase cheia sobre a qual pouco se pode fazer foi substituída por outro conceito: o de um cérebro como um mundo onde convivem verdadeiras faO PARADOXO DA SABEDORIA Elkhonon Goldberg mílias de redes Melhoramentos neuronais que, 2006 passado certo R$ 40 ponto, podem desenvolver capacidades novas por si próprias, dando origem ao que se chama de propriedades emergentes. “Entre as mais interessantes se encontram os atratores e os estados atratores”, explica. Um atrator é uma rede que demonstra um padrão estável de atividade que se autoperpetua. Basta que uma pequena parte da rede se ative para que todo o resto opere. Como as lembranças. Tal mecanismo é fundamental na hora de buscar pontos comuns entre objetos ou situações diferentes. Também para separar o que serve do inútil. Através de argumentos apaixonantes e elegantemente escritos, Goldberg leva o leitor a identificar a conexão do anterior com o conhecimento preceptivo (não o que as coisas são, mas o que nos convém ou devemos fazer). E como isso é a origem da competência e é afetado pela chegada da velhice. “Nossa cultura exige um final feliz para todas as histórias. Sendo, como sou, produto de um ambiente muito mais duro durante minha juventude, essa pretensão me parece risível”, diz, sobre a velhice. Mais realista, ele prefere um final bem peleado. Talvez não com a mente a toda velocidade, mas com a sabedoria em potência máxima. Rodrigo Lara Serrano 17 DE NOVEMBRO, 2008 / AMÉRICAECONOMIA 73


LINHA DIRETA [LIMA]

SER ECONOMISTA NA CRISE

FERNANDO CARRASCO POSTALDELDÍA

A

economia não é uma ciência exata. É uma disciplina com pretensões de ciência. Mas nós economistas nos auto-exigimos, e a sociedade nos demanda, projeções e prognósticos com uma precisão que só uma ciência exata pode dar. Se acertamos (coisa que às vezes acontece), alguém pode sair beneficiado. Já as muitas vezes que nos equivocamos deixam uma impressionante seqüela de mortos e feridos. Os analistas de mercado, sobretudo os de Wall Street, talvez sejam os que possuam o pior recorde em vaticinar o futuro. Se não fosse assim, suas instituições e seus clientes não estariam quebrando. Essa pobreza de análise se deve, em parte, à alta rotatividade dos analistas. Antes que possam adquirir a experiência que lhes permita entender o que realmente está passando, mudaram de mercado de análise ou de profissão, cedendo espaço a outro novato ainda mais desatento. Sei disso porque fui um deles. É por essa insegurança e falta de experiência que acabam remedando-se uns aos outros. Os cegos permanecendo cegos. Mas a culpa também é da velocidade. Tenho presenciado como analistas, devido à pressa em apresentar seus relatórios, substituem a análise de algum movimento inesperado do mercado pela exlicação que se encontra mais à mão. E são poucas as vezes em que a explicação mais à mão tem algo a ver com a realidade. Mas basta que seja exposta de forma oportuna no fórum apropriado para que se propague por todo o mercado como uma verdade inquestionável. Também em tempos normais aflora a imprevisibilidade própria da teoria do caos, surgem os cisnes negros (alto impacto de eventos de baixa probabilidade), enfim, surge a conjunção de uma multiplicidade de eventos com impactos diferentes que se confundem com a simples falta de senso comum. Essas distorsões afetam a visibilidade da análise e confundem o analista. Pior ainda; confundem o auditório. Um dos desafios mais importantes enfrentados pelo economista é quando sua opinião contradiz o consenso do mercado ou a tendência do momento. Como explicar que a inflação deve aumentar devido à tremenda injeção de dinheiro na economia 74 AMÉRICAECONOMIA / 17 DE NOVEMBRO, 2008

se os preços das commodities estão caindo e todos sabem que isso é deflacionário? Nesses casos, o economista inseguro optará por trair a si mesmo, buscando manter a credibilidade entre seus pares, superiores e clientes. A prova de quão confusos andamos todos é que há crise. De fato, a crise atual é o resultado de uma miopia sobre-humana nos países desenvolvidos, entre autoridades, reguladores, traders e brokers... e analistas. A tudo isso é preciso acrescentar a volatilidade de uma crise como a atual, na qual o capital especulativo cresceu enormemente, pois esquiva-se e foge de um mercado a outro com a ponderação e a coerência de uma bala perdida. Os preços e os mercados são governados por seus fundamentos? Nada. Não importam os fundamentos. Esses capitais se movem para onde há rentabilidade rápida; dessa forma o lucro se baseia em movimentos irracionais. É este o estado dos mercados hoje, quando políticas monetárias equivocadas alimentam o surgimento de uma quantidade monstruosa de capital especulativo que distorce tudo. O preço das commodities vai derivar na desaceleração mundial? Mentira, a queda tão forte reflete movimentos de capital. A inflação desapareceu? Não estejamos tão seguros, pois o mundo vive a maior expansão monetária da história. O dólar é refúgio de valor? Impossível. O mundo está se inundando de dólares e as finanças públicas dos EUA estão se deteriorando à velocidade da luz. As projeções do tipo de câmbio são, talvez, as que melhor refletem a dificuldade de ser economista em tempos de crise. A única resposta honesta à pergunta sobre qual será o câmbio dentro de seis meses ou um ano é: não sei. E, entretanto, dizer não sei qual será o câmbio não é uma resposta aceitável. O economista é obrigado a enganar. Ele tem que dar um número. E, como o risco de errar é alto, o natural é tratar de dar um número que não seja muito diferente do consenso do mercado, para esconder-se dentro de uma selva de prognósticos semelhantes, para passar despercebido. Imagine se alguém acredita em você e toma uma decisão com base em sua estimativa... errada, como sempre. ■ - Guillermo Arbe




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