Nº 387 Edição Brasil

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BRASIL

brasil.americaeconomia.com

SOFT POWER INFLUÊNCIA DO BRASIL NO EXTERIOR MEXICANO NA NET A ESTRATÉGIA DE SLIM NA TV PAGA BM&FBOVESPA UMA PLATAFORMA REGIONAL

VIVA O POPULAR MERCADO DE CARROS COMPACTOS IMPULSIONA NOVO CICLO DE INVESTIMENTOS BILIONÁRIOS NO BRASIL

Nº 387 MAIO/2010 R$ 8,90

ESPECIAL: AS MELHORES CIDADES PARA FAZER NEGÓCIOS








NESTA EDIÇÃO

18 20 24 28 34 36 38 42

50

Portal Carta ao Leitor

ESPECIAL

Ranking das melhores cidades para fazer negócios na AL

Cartas Índice de Empresas Pistas Negócio Fechado Movimentos Opinião – John C. Edmunds I-biz Clics & Chips Linha Direta

Negócios Sony Ericsson Novos celulares para sair da má fase Locaweb nas nuvens Negócios na América Latina TV a cabo O que o mexicano Slim quer na NET? Capa – Setor Automotivo Projetos bilionários de investimento A virada do Sul Como as têxteis voltaram ao lucro Entrevista Fabio Hering – presidente da Cia. Hering

1

Rumo ao Oriente A experiência brasileira na Índia

Debates

Pão de Açúcar x Casas Bahia Revisão de acordo gera incertezas

36

56 60 64 66 68

Logística reversa Aumento do consumo requer legislação Soft power A influência internacional do Brasil Arbitragem internacional Empresários defendem-se da América Latina Nova presidente Os desafios de Laura Chinchilla, da Costa Rica Democracia vertical As lições que a China tem para dar

Finanças

72 2

Plataforma de negócios BM&FBovespa quer projeção internacional Ilustração de capa: Julio Ramos

Fotos: 1 - iStockphoto; 2 - Patrick Rodrigues

10 11 12 12 13 14 44 76 78 80 82

Seções


1904 MC MOVIMENTO MANUFACTURE O CALIBRE 1904 MC É O RESULTADO DE UM SÉCULO DE PAIXÃO E BUSCA DA EXCELÊNCIA TÉCNICA PELA CARTIER. INTEGRANDO UM MECANISMO AUTOMÁTICO CRIADO, DESENVOLVIDO E FABRICADO PELA MAISON, O RELÓGIO CALIBRE DE CARTIER ELEVA A TRADIÇÃO RELOJOEIRA A UM PATAMAR MAIS EXIGENTE DE SOFISTICAÇÃO E PERFEIÇÃO.

BOUTIQUE CARTIER RUA HADDOCK LOBO, 1567 - SÃO PAULO - TEL. (11) 3081 0051 CONCESSIONÁRIOS AUTORIZADOS BERGERSON 0800 643 8999 (PR, SC) • CRISTOVAM JOALHEIROS (17) 3234 2402 (SP) • DRYZUN 0300 115 0100 (SP) FRATTINA JOALHEIROS (11) 3062 3244 (SP) • GRIFITH (61) 3361 5848 (DF) • MERITUM (19) 3251 7761 (SP) • NATAN (81) 3467 5097 (PE) SARA JÓIAS (21) 3202 4500 (RJ, RS) • TALENTO JÓIAS (31) 3071 4600 (MG) • TÂNIA JÓIAS (85) 3244 0065 (CE)


PORTAL

brasil.americaeconomia.com

CONTINENTE OBESO

A América Latina está engordando a um ritmo alarmante, ameaçando colapsar o sistema público de saúde nas próximas décadas. Reportagem exclusiva de AméricaEconomia.com mostra que essa ameaça afeta a maioria dos países, sobretudo o México. Para exemplificar o avanço das consequências da obesidade, em 1993, cerca de 7% da população sofria de diabetes; em 2000, eram 10%; em 2009, esse percentual foi para 15%. O Ministério da Saúde mexicano estima que, em cinco anos, mais de 30% da população sofrerá de algum tipo de diabetes. A reportagem indica os custos dessa evolução em vários países e as pressões feitas às empresas do setor alimentício para que se envolvam na batalha em favor de uma alimentação de melhor qualidade. 1

LEIA NO PORTAL

EDIÇÃO: AINÁ VIETRO (AVIETRO@AMERICAECONOMIA.COM)

BB PAGA US$ 480 MILHÕES POR BANCO PATAGONIA O Banco do Brasil está fincando suas garras no exterior. Prova disso é que, no dia 21 de abril, anunciou a compra de 366.825.016 ações ou 51% do argentino Banco Patagonia, ao preço de US$ 1,3076 cada uma. O total da transação foi de US$ 480 milhões. Caso o acordo seja aprovado, será feita uma OPA (oferta pública de ações) na Argentina dos papéis remanscentes do Patagonia. Segundo o comunicado enviado ao mercado, o Patagonia tinha US$ 2,57 bilhões em ativos no fim de 2009. Já o Banco do Brasil fechou o ano passado com US$ 407,11 bilhões.

MERCOSUL TERÁ LIVRE COMÉRCIO COM O EGITO Nos próximos meses, o Brasil e demais integrantes do Mercosul – Argentina, Paraguai e Uruguai – devem iniciar um acordo de livre comércio com o Egito. Acompanhado de empresários que visitaram o país em meados de abril, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, disse que a intenção é fortalecer o comércio para enfrentar a concorrência da Ásia e da Europa. A assinatura do convênio deve acontecer durante a reunião de cúpula entre os presidentes dos quatro países do Mercosul, em julho.

10 AméricaEconomia Maio, 2010

UMA RELAÇÃO DELICADA Peter Hakim (foto), presidente do Diálogo Interamericano e conselheiro editorial de AméricaEconomia Internacional, analisa em artigo exclusivo como a maior integração entre Brasil e México, responsáveis por quase dois terços da economia da América Latina, poderia impulsionar toda a rede de acordos comerciais já existentes na região.

2

Foto: 1 - iStockphoto; 2 - Divulgação

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CARTA AO LEITOR

BRASIL brasil.americaeconomia.com PUBLISHER José Roberto Maluf CONTEÚDO Diretora de Redação Tatiana Engelbrecht Editora Executiva Solange Monteiro Diretora de Arte/Projeto Gráfico Janaína Diniz Repórteres Graziele Dal-Bó e Roberta Pregnaca Editora do Site Ainá Vietro Revisão Assertiva Produções Editoriais Produção Gráfica Eduardo Keppler Infografia Anna Luiza Aragão Colaborador Andre Carvalho (assistente de arte)

QUANTO MENOR, MELHOR O

Brasil começou 2010 acelerando forte. Se a afirmação não é unanimidade, a indústria automotiva, pelo menos, não tem

do que se queixar. No primeiro trimestre, o país superou a Alemanha em número de licenciamentos de veículos leves: foram 750 mil, contra 670 mil no país que é símbolo mundial desse segmento. Com isso, conquistamos outro posto: o de quarto maior mercado

COMERCIALIZAÇÃO Gerente de Publicidade Sidney Espósito Executivos de Contas Nagibe José Adaime – nagibe@springcom.com.br Rogério Ferreira – rogerio@springcom.com.br

de automóveis do mundo, atrás apenas de China, Estados Unidos

MARKETING Marcia Leonardi, Elisangela Silva, Rafael Borsanelli

crescimento, abocanharemos o terceiro lugar em 2016.

e Japão. E, segundo analistas do setor, por pouco tempo: estudos apontam que, se a economia brasileira mantiver o atual ritmo de Em nossa reportagem de capa, mostramos o ciclo de investi-

ADMINISTRATIVO/FINANCEIRO Diretor Executivo Eduardo Colturato Gerente Financeiro Edison Arduino

mentos bilionários por parte de fabricantes e fornecedores de au-

PROJETOS ESPECIAIS Tania Macena

asiáticas no mercado brasileiro e a aposta cada vez maior do setor

CIRCULAÇÃO Gabriela Beraldo Pré-impressão First Press Periodicidade Mensal (Maio de 2010) CTP, impressão e acabamento IBEP Gráfica

topeças, o crescimento espantoso da participação das montadoras em veículos compactos, que já representam quase 80% do market share nacional. Seguindo a trilha dos investimentos no Brasil e na América Latina, trazemos, com exclusividade, um estudo da AméricaEco-

Circulação auditada por

nomia Intelligence que traça um mapa das melhores cidades para

SPRING EDITORA-PRODUTORA Rua Ferreira de Araújo, 202, 7o andar – CEP: 05428-000 São Paulo/SP – Tel.: 11 3097-7666 Site: www.springcom.com.br E-mail: contato@springcom.com.br

fazer negócios. Para nossa surpresa, a pesquisa revelou que, quan-

AMÉRICAECONOMIA INTERNACIONAL Diretor Elias Selman Carranza Vice-presidente Executiva Gloria Landabur C. Diretora Internacional de Marketing Mica Selman Diretor Editorial Felipe Aldunate M. Editores Fernando Chevarría (Lima), Juan Pablo Rioseco e Víctor Herrero (Santiago), Karen Correa (Guaiaquil) Diretor de Arte Álvaro Araya Urquiza Editor de Fotografia Miguel Candia Diretor de Circulação Marcial Delcorto Gerente de Produção Constanza del Río Moreno AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE (Estudos e Projetos Especiais) Diretor Jaime Contreras Soria Coordenadora Geral Daniela González Pesquisador Sênior Andrés Almeida Analista Paulina Saavedra AMÉRICAECONOMIA.COM Diretor de Estratégia Digital Rodrigo Guaiquil Editor Lino Solis de Ovando Webmaster José Fuentes ESCRITÓRIOS Buenos Aires +5411 4383-8410 Cidade do México +5255 5254-2400 Costa Rica +506 225-6861 Lima +511 610-7272 Miami +305 648-9071 Panamá +507 271-5327 Santiago +562 290-9400 Uruguai +5982 901-9052

do o assunto é o poder de atrair negócios e investimentos, nem sempre as maiores levam vantagem. A queda de braço entre a família Klein e o megaempresário Abilio Diniz; uma entrevista com Fabio Hering, que comanda uma das empresas têxteis mais tradicionais do país, a Cia. Hering; os desafios da nova presidente da Costa Rica, Laura Chinchilla; e os riscos e as virtudes da influência internacional do Brasil são outros assuntos desta edição. Boa leitura. José Roberto Maluf

ASSINATURAS Central de Atendimento Tel: 55 11 3038-1493, de 2a a 6a feira, das 8h às 20h. Site: www.assineamericaeconomia.com.br. E-mail: americaeconomia@acsolucoes.com.br Cartas: Rua Butantã, 500 – 2o andar – CEP 05424-000 – São Paulo/SP Valores de assinatura: Por 1 ano: R$ 96,00 / Por 2 anos: R$ 182,00 Pagos em até 5x no cartão de crédito ou em até 3x no boleto bancário (preço válido para as vendas realizadas pela Central de Atendimento e pelo website da revista). Em caso de descontinuação da publicação, a Spring Editora-Produtora LTDA. garante aos assinantes desta publicação a restituição, em reais, da parte do valor já pago correspondente aos exemplares não entregues, devidamente corrigido monetariamente. Ao fazer sua assinatura, exija a credencial do vendedor e pague sempre com cheque nominal, mediante recebimento da primeira via de nosso pedido de assinatura.

Chairman Robert R. Paradise

Maio, 2010 AméricaEconomia 11


ÍNDICE DE EMPRESAS

CARTAS Gostei muito da reportagem sobre compensação de emissões de carbono em eventos, (“Pegadas Lucrativas”, AméricaEconomia No 384, fevereiro, 2010). Ajuda a conscientizar as empresas de que existem meios de cuidar do meio ambiente. Mesmo que seja inevitável a emissão, é importante divulgar que há empresários focados em compensar os danos causados pela poluição, e ainda lucrar com isso. Um bom exemplo de economia sustentável. VALDINEI MARCOS DA SILVA – SANTA

CATARINA, BRASIL

Os números referem-se à primeira vez em que as empresas são citadas em cada reportagem. 3M

50

Facebook

82

MEO Australia

15

Acer

47

Falabella

13

Microsoft

19

Fiat

29

Mitel

13

Adidas

47, 50

Advent

14

Financial Times

82

Mixxer

42

AmBev

14

FLC Plásticos

15

Motorola

18

Anchor Ethanol

79

Foley Hoag

65

NET

24

Apple

18

Fonterra

79

Nike

47

ArcelorMittal

44

Ford

29

Nokia

18

Arla Foods

79

Foursquare

82

Occidental Petroleum 64

Arnold & Porter

65

Freshfields B. Deringer 64

Asus

47

Gartner

Ativa

27

Gateway

AviChina

30

Bain Consulting Banco Banif Banco do Brasil

Oi

26

Panasonic

80

18

Panda Security

15

Gayosso

46

PanDigital

80

34

General Motors

29

Pão de Açúcar

42

26

Gerdau

39

Parque Arauco

15

Globo

24

Petrobras

15

26

Philips

15

Pininfarina

30

10, 73

18, 47

Banco Votorantim

73

Goldman Sachs

Bethia

13

Google

BM&FBovespa

72

Grupo Caoa

30

Portugal Telecom

27

Bosch

30

Grupo Impacta

40

Prada Assessoria

32

Boston Scientific

51

Grupo Kalyani

40

PwC

51

Bradesco

73

GVT

Procter & Gamble

50

MUITO OTIMISMO?

BrandAnalytics

33

Harbin Motor

30

Protiviti Brasil

42

Interessante o especial sobre as projeções de diretores de finanças para o financiamento de suas empresas (“Em Busca do Capital”, AméricaEconomia No 385, março, 2010). É estimulante ler esses líderes bem informados sobre o que está se passando. Entretanto, chama a atenção o excesso de otimismo, talvez porque falem em nome de empresas especialmente bem-sucedidas e que, geralmente, têm acesso a recursos mesmo em meio a crises profundas. PABLO CARDENAL –

Brasfanta

14

Heineken

50

Pyramid Research

18

BTG Pactual

73

Hering

Realty Corporation

42

Café Punta del Cielo

46

HP

47

Renault-Nissan

32

Casas Bahia

42

HSBC

73

Renner

42

Caterpillar

50

HTC

18

Samsung

18

Celfin Capital

13

Huawei

19

Sancor

79

Chadbourne & Parke

64

Hyundai

29

Santander

73

Chery

30

IBM

18, 69

Schlumberg

53

Citibank

73

IDC

20

SHC

30

Citroën

30

Itaú Unibanco

59, 73

SKY

26

Claro

25

JAC

30

SLW Corretora

42

BUENOS AIRES, ARGENTINA

ConocoPhillips

64

Kerton Group

18

Sony Ericsson

18

Converge Com.

25

Kia

30

Sony

80

COPO MEIO CHEIO

CSM Worldwide

29

LAN

13

TAM

13

Escrevo para pedir um favor: falar ao mundo que o México não é um país com problemas da forma com que se diz. O México é um país cheio de oportunidades, que teve sérias dificuldades em 2009, mas que tem enfrentado seus problemas com resultados que melhoram seu potencial de crescimento. Há uma tendência global em falar mal do México e ressaltar apenas o que há de ruim. O México é um país bonito, agradável, onde se pode trabalhar seriamente, tal como tenho feito com minha empresa nos últimos 15 anos.

Curtis Mallet

65

Lancaster

34

Tata Motors

39

Dafra Motos

41

Larcomar

15

Tecnoworld

80

Dalila

34

Leader

42

Telecom Itália

27

De Smet Ballestra

79

Lean Institute Brasil

29

Telefônica

26

Lenovo

47

Telmex

25

TIM

27

AARON CONNELLY – CIDADE DO MÉXICO, MÉXICO Cartas para a redação:

americaeconomia@springcom.com.br

12 AméricaEconomia Maio, 2010

Dell

19, 47, 50, 58

18,82

26, 53

36, 34

Delphi

30

LG

Demarest e Almeida

54

Lifan

30

Toshiba

47

Descarte Certo

59

LinkedIn

82

Toyota

29

Lloyd’s

53

TVS

41

Diálogo Interamericano 61

18, 41

Dimension Data

15

Locaweb

20

Twitter

82

EBX

13

Magenta

15

Vale

15

Effa Motors

30

Mangels

15

Vivo

27

Embratel

25

Marcopolo

39

Volkswagen

29

Energy for Industry

79

Marfrig

15

WEG

39

Essencis

59

Medoro

15

ZTE Corp.

19

Foto: Mário Águas

NEGÓCIO VERDE


PISTAS DECLÍNIO MARCADO

TUDO EM CASA

PUBLICAMOS

PUBLICAMOS A TAM posicionou-se como uma das candidatas à compra da participação na chilena LAN que o presidente recém-eleito Sebastián Piñera se comprometeu a vender antes de sua posse. Para isso, entretanto, a TAM tinha um páreo duro: a família Cueto, que já detinha 25% da LAN. (“Voando Alto”, AméricaEconomia No 385, março, 2010)

Em 2009, as exportações de etanol caíram, e a expectativa é a de que, até o fim do ano, a redução nas vendas internacionais seja de 20%, sobretudo pela forte queda nas compras dos EUA. (“Otimismo Verde”, AméricaEconomia No 378, agosto, 2009)

O NOVO Segundo a União da Indústria de Cana-deAçúcar (Unica), esse declínio nas exportações de etanol não dará trégua tão cedo. A Unica anunciou uma estimativa de queda na temporada 2010/2011 (abril/março) para o menor nível desde 2003/2004, entre os produtores da região centro-sul, que representam 90% da produção de cana do Brasil. Para a safra 2010/2011, a Unica prevê exportações de 1,8 bilhão de litros, contra 2,75 bilhões na de 2009/2010. Segundo a organização, os motivos para tal projeção são o câmbio desfavorável e a queda nas vendas para os EUA e a Índia.

O NOVO Com um certo atraso, no final de março, Piñera conseguiu concluir a venda dos 26% que possuía na companhia aérea LAN. Entre as compradoras estiveram o grupo empresarial da família Cueto, o grupo Bethia – da família Solari, donos da rede varejista chilena Falabella – e a corretora Celfin Capital, também do Chile. A venda para a Bethia gerou polêmica, pois, para concretizar a operação, Piñera primeiro vendeu a empresa Axxion – por meio da qual administrava as ações da LAN – em bolsa, evitando arrematar diretamente as ações da companhia, economizando o pagamento de impostos.

SOMAR FORÇAS PUBLICAMOS Os recursos do Fundo da Amazônia serão aplicados exclusivamente sob a forma de financiamentos não reembolsáveis. “Nossa expectativa é a de que o volume de doações para o fundo cresça muito”, diz Guilherme Accioly, gerente do Departamento de Gestão do Fundo, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). (“Capital Verde”, AméricaEconomia No 383, janeiro, 2010) O NOVO

O Ministério do Meio Ambiente afirmou que o BNDES está negociando com 12 países futuras doações ao Fundo da Amazônia, que hoje conta apenas com a Noruega como doadora. Não foram divulgados os países interessados. Criado para promover projetos de prevenção e combate ao desmatamento e para a conservação e o uso sustentável das florestas no Bioma Amazônico, o Fundo contava, no começo deste ano, com uma carteira de 50 projetos, cinco dos quais já aprovados.

MAIS UM X

1

2

Fotos: 1 - iStockphoto; 2 - Divulgação

PUBLICAMOS

Foram muitos os que desconfiaram ao ver Eike Batista entrar nos segmentos de petróleo e geração de energia, para ser mais um em meio a dezenas de projetos desses setores. Parecia um novo arroubo na carteira do grupo EBX, que abrange outros empreendimentos tão desconexos como uma mineradora, turismo náutico e um restaurante chinês. (“O Filho do Sol”, AméricaEconomia No 385, março, 2010)

O NOVO

O grupo EBX inclui mais um setor em seu amplo leque de atuação. Assinou um memorando de intenções para a formação de uma joint venture com a canadense Mitel, para atacar no setor de telecomunicações. A ideia é fabricar no Brasil telefones IP e sistemas de vídeo para segurança. Maio, 2010 AméricaEconomia 13


NEGÓCIO FECHADO AMBEV

A companhia de bebidas investirá até R$ 2 bilhões no Brasil em 2010, com o objetivo de elevar a capacidade produtiva de suas fábricas entre 10% e 15%. Os recursos serão destinados a unidades localizadas em 13 estados. De acordo com a AmBev, o investimento leva em conta o cenário favorável da economia e está condicionado à manutenção das atuais alíquotas de impostos federais para o setor de bebidas.

VALOR: R$ 2 BILHÕES ADVENT INTERNATIONAL

A empresa norte-americana de private equity anunciou, em abril, o término da captação do Latin American Private Equity V (LAPEF V), com um valor total de US$ 1,65 bilhão. Segundo comunicado distribuído à imprensa, as empresas dos segmentos de serviços financeiros, serviços em aeroportos, varejo, educação e serviços especializados serão os targets do LAPEF V. O valor de cada investimento será de US$ 50 milhões a US$ 200 milhões, em empresas avaliadas entre US$ 50 milhões e US$ 750 milhões. “Do total desse fundo, mais de 50% serão aplicados em empresas brasileiras”, adiantou, no comunicado, Patrice Etlin, sócio da Advent e responsável pelos investimentos no Brasil. VALOR: US$ 1,65 BILHÃO

BRASFANTA

O grupo brasileiro que atua em segmentos como nutrição especial, bebidas inovadoras,

14 AméricaEconomia Maio, 2010


laminados e software de gestão, comprou a empresa Locomotiva, da São Paulo Alpargatas, por R$ 43 milhões. Segundo comunicado, com a aquisição, o Brasfanta – controlador da empresa FLC Plásticos – passa a ser líder do mercado de lonas e o segundo no mercado de laminados. VALOR: R$ 43 MILHÕES

DIMENSION DATA A sul-africana

Dimension Data, provedora de serviços e soluções na área de tecnologia da informação, comprou participação de 51% na Magenta Computación, um integrador de sistemas com sede em Santiago, por uma quantia não revelada. A transação permite à Dimension Data aumentar sua presença global no mercado latino-americano. O nome da companhia adquirida mudou para Dimension Data Chile. VALOR: NÃO REVELADO

MANGELS A fabricante de rodas de alumínio com sede em São Paulo planeja investir cerca de R$ 382,2 milhões entre 2010 e 2014 nas divisões de rodas e cilindros, entre outras. O aporte está alinhado com as perspectivas de crescimento do Brasil para os próximos anos, em especial de setores nos quais a Mangels tem participação. De acordo com a empresa, a cada ano a administração revisará e definirá o montante de investimento a ser realizado no exercício seguinte, levando em consideração a capacidade financeira da companhia e as condições macroeconômicas vigentes. VALOR: R$ 382,2 MILHÕES

Foto: Divulgação

MARFRIG Por meio de sua sub-

sidiária Seara Alimentos, a empresa alimentícia firmou um protocolo de intenções com o governo de Mato Grosso para a construção de gran-

jas de frango e um abatedouro para produção de produtos in natura (inteiro e cortes), no município de Jaciara, no Mato Grosso. A unidade terá capacidade de abate diária de 200 mil aves, elevando a produção da companhia para 2,6 milhões de aves por dia no Brasil. O prazo para a conclusão do projeto é de três anos, com investimento previsto de R$ 150 milhões. VALOR: R$ 150 MILHÕES

MEDORO RESOURCES A mineradora canadense planeja investir entre US$ 30 milhões e US$ 40 milhões nos próximos dois anos para explorar uma mina de ouro no noroeste da Colômbia, por meio da Frontino Gold Mines. A Medoro recentemente comprou a Frontino, em uma transação avaliada em US$ 200 milhões. VALOR: ATÉ US$ 40 MILHÕES PANDA SECURITY

A desenvolvedora de soluções de segurança, fundada em 1990, comprou sua operação brasileira que, até o momento, vinha atuando no modelo de distribuição exclusiva. Com a incorporação, a empresa passa a contar com 13 subsidiárias em diferentes países, incluindo Áustria, Alemanha, Bélgica, China, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Japão, Suécia, Inglaterra e EUA. Os sócios da distribuidora passam a integrar o quadro da Panda Security do Brasil, respondendo pelo comando estratégico e executivo da operação. A Panda Security conta com 56 escritórios distribuídos por todo o mundo e centrais nos EUA (Califórnia) e Europa (Espanha). VALOR: NÃO REVELADO

PARQUE ARAUCO O grupo chileno, que opera centros comerciais – controlado pelas famílias Said e

Abumohor – comprou o Larcomar, um dos mais conhecidos centros comerciais de Lima, do grupo peruano Grana e Montero (G&M). O valor da operação foi de US$ 36 milhões. VALOR: US$ 36 MILHÕES

PETROBRAS O grupo brasileiro adquiriu, por meio de sua subsidiária integral Petrobras Internacional Braspetro, 50% de participação no bloco exploratório WA-360-P, localizado na bacia australiana de North Carnarvon, junto da empresa MEO Australia Ltd. O valor da aquisição é de US$ 39 milhões. O bloco cobre uma área de 1,2 mil quilômetros quadrados e tem profundidade de água máxima de 500 metros, localizado próximo à região de descobertas de gás. VALOR: US$ 39 MILHÕES PHILIPS A companhia anunciou a aquisição da Tecso Informática, empresa com sede no Rio de Janeiro focada em sistemas de gestão para a área de saúde. De acordo com a Philips, a compra tem como objetivo complementar e ampliar o portfólio da divisão de Healthcare (cuidados com a saúde) da Philips do Brasil. VALOR: NÃO REVELADO VALE A área de logística do grupo brasileiro investirá cerca de R$ 60 milhões neste ano no desenvolvimento e na aplicação de tecnologias inovadoras em suas ferrovias de carga pesada (heavy haul), nas estradas de ferro Vitória a Minas (EFVM) e Carajás (EFC), e nos portos. Entre os principais aportes estão novos equipamentos para operação de locomotivas por meio de comando remoto e uma tecnologia inédita entre as ferrovias brasileiras, que auxilia nas operações em trechos de aclive. VALOR: R$ 60 MILHÕES

Maio, 2010 AméricaEconomia 15




NEGÓCIOS TELECOMUNICAÇÕES

SINAL CORTADO Sony Ericsson aposta em uma nova família de celulares para sair de sua má fase. A estratégia parece trazer mais riscos que acertos ANTONIO MARÍA DELGADO, DE MIAMI

18 AméricaEconomia Maio, 2010

indústria, mas, se tiver o portfólio que os consumidores querem, pode mudar o jogo rapidamente.” Chama a atenção o fato de o executivo citar um de seus rivais mais fortes, já que, diferentemente da Apple, os lançamentos da Sony Ericsson não têm causado tanto frisson. Segundo a empresa, entretanto, o objetivo desses modelos – lançados em fevereiro no Congresso Mundial de Celulares, em Barcelona, e que chegam progressivamente ao mercado latino-americano no segundo trimestre – é atender a demanda dos consumidores por aparelhos de design atraente, oferta abundante de aplicativos, boa capacidade de gravar vídeo e fácil acesso a redes sociais.

TODOS IGUAIS Segundo Derek Kerton, analista da Kerton Group, consultoria de Telecomunicações com sede em San José, Califórnia, os telefones da Sony Ericsson efetivamente estão entre os melhores lançamentos recentes. “O problema é que não há muita diferença entre esses aparelhos e os melhores lançamentos de concorrentes como Motorola e HTC”, diz. Ou seja: a crescente semelhança entre os celulares quanto a tamanho, sistema operacional, funcionalidade e aplicações ameaça derrubar a estratégia da Sony Ericsson. A maior parte dos fabricantes, por exemplo, está optando pelo sistema operacional Android, do Google, que vem sendo apontado como a melhor resposta da indústria frente à experiência do usuário brindada pelo iPhone, da Apple. Kerton compara o atual cenário dos aparelhos celulares ao dos computadores pessoais no começo dos anos 1990, quando as margens de fabricantes como IBM, Ga-

Em problemas Números da Sony

2009

Unidades vendidas Preço médio por aparelho Vendas Fonte : Sony Ericsson

Variação sobre 2008

57,1 mi

-41,0%

US$ 160

2,6%

US$ 6,78 bi

-39,6%

Fotos: 1 - Miguel Candia; 2 - Toru Yamanaka/AFP

N

o momento em que a fabricante de celulares Sony Ericsson luta para emergir de um ano marcado por uma forte queda nas vendas, no lucro e na participação de mercado, o novo presidente executivo da companhia, Bert Nordberg, demonstra um otimismo que parece desproporcional ao cenário que lhe espera. “Achamos que temos vantagem frente à concorrência”, diz o executivo sueco, de 53 anos, tirando de uma sacola os aparelhos celulares recém-lançados para apresentá-los. “Agora, contamos com o portfólio correto”, completa. Em 2009, a Sony Ericsson registrou perdas líquidas de US$ 1,12 bilhão e queda de 40% nas vendas. A empresa ainda mantém o quarto lugar em participação de mercado mundial, com quase 4,5% das vendas, ainda que muito atrás da Nokia (39%), da Samsung (21,1%) e da LG Eletronics (10,4%), segundo dados do Interactive Data Corporation (IDC). Na América Latina, também está em quarto lugar, com market share de 10%, segundo a empresa de pesquisas Pyramid Research. No Brasil, entretanto, fechou 2009 em quinto lugar, com apenas 7,4% de mercado – uma queda considerável, frente aos 11,1% de 2008, segundo dados do Gartner. Nordberg, que assumiu, em outubro do ano passado, a liderança da companhia, aposta que a nova gama de celulares – cinco no total: Vivaz, Vivaz Pro, X10, X10 mini e X10 mini pro – será suficientemente atraente para garantir a volta do crescimento e da rentabilidade. Uma jogada arriscada, em uma indústria em que a concorrência é cada vez mais intensa e na qual os produtos tendem a se diferenciar cada vez menos. Para o sueco, entretanto, ter os produtos corretos é garantir que metade da batalha já esteja ganha. E cita o exemplo do iPhone, da Apple. “Você pode sair do nada, ser um total desconhecido da 1


BERT NORDBERG, PRESIDENTE DA SONY ERICSSON: ESTRATÉGIA ACERTADA OU EXCESSO DE OTIMISMO?

teway e Dell reduziram-se consideravelmente porque todos usavam componentes comuns e o mesmo sistema operacional, o Windows, da Microsoft. Norberg discorda dessa “comoditização” e afirma que a companhia aprendeu que os telefones têm de oferecer novidades constantemente 2 para a marca ganhar a lealdade dos usuários. Além das convicções do executivo, o certo é Mercado brasileiro de celulares que uma menor diferenciação Principais fabricantes no mercado obrigaria os fabri2008 Vendas Percentual cantes a partir para a frente consumidor final 34,3 de mercado (em milhões de unidades) que mais lhes dói: o preço. 2009 Vendas Nesse campo, a Sony Erics32,6 Percentual consumidor final de mercado (em milhões de unidades) son parece contar com certa 22,5 margem de manobra. Nos úl23,9 11,43 timos anos, a empresa empre18,5 8,41 16,39 endeu uma forte redução de 5,31 gastos, incluindo o fechamen14,84 11,1 to de instalações nos EUA, na 18,8 10,21 Suécia e na Índia e a demis6,08 3,34 13,4 4,96 são de ao menos 3,6 mil em8,98 10,4 7,4 pregados. O próprio Nordberg Nokia LG Motorola Samsung Sony Eletronics Ericsson aponta que a empresa estaria Fonte : Gartner disposta a comprar essa briga. “Nossa estratégia é produzir aparelhos com maior funcionalidade a preços mais baixos”, afirmou. Segundo Nordberg, ainda restaria uma cartada para sua O problema é que, nesse campo, falta boa concorrência. A empresa: o aporte da japonesa Sony, quando o assunto é enempresa está focada no segmento de aparelhos voltados ao tretenimento. “Estamos nos afastando do conceito de ser uma público de renda média e média-alta, com preços em torno companhia tecnológica para nos aproximarmos do conceito de US$ 160, em 2009. Por baixo, está sendo pressionada pelas de uma de entretenimento”, diz, afirmando que o objetivo de companhias chinesas Huawei e ZTE Corp., que, segundo anaseus aparelhos é sempre melhorar a experiência do usuário. listas, nos próximos anos, poderão desbancar a Sony Ericsson “Queremos que as pessoas sorriam, e aparelhos com alto grau e a norte-americana Motorola. E, de cima, a pressão vem da de funcionalidade as ajudam a fazê-lo”, diz. Apple, com o sucesso de vendas do iPhone. Segundo o Gartner, Agora, resta esperar para ver se o mercado comprará o a Apple já conta com 17% do mercado global de smartphones. sorriso desse sueco. Maio, 2010 AméricaEconomia 19


NEGÓCIOS TI

MAUTNER: APOSTA EM PARCERIAS COM FORNECEDORES PARA GANHAR CLIENTES

SOLANGE MONTEIRO, DE SÃO PAULO

A

grande vantagem das empresas de serviços online é a de não ter fronteiras físicas que limitem seu mercado. Para a Locaweb, que oferece hospedagem de sites e prestação de serviços de tecnologia, entretanto, a tentação dessa facilidade inicial não foi suficiente para acelerar seus planos de internacionalização. Só depois de 11 anos é que ela decidiu anunciar formalmente sua entrada no

20 AméricaEconomia Maio, 2010

LÁ VAI A NUVEM

mercado externo, em setembro de 2009, com estrutura e metas definidas. “Nosso foco é a América Latina, e queremos que a operação na região represente 5% do nosso faturamento até 2012”, conta Henrique Macedo, gerente de Produtos Internacionais da empresa. Para acompanhar o crescimento tanto no mercado externo quanto no interno, a Locaweb fortaleceu sua estrutura, num processo que culminou

na inauguração, no ano passado, de um novo data center em São Paulo, cuja capacidade total é de 25 mil servidores. “A ocupação se dará em módulos e acho que, no ritmo de crescimento que vimos registrando, poderá nos atender tranquilamente até 2015 ou 2016”, diz Gilberto Mautner, presidente da Locaweb. No ano passado, a empresa também abriu um centro técnico em Miami (EUA) e outro, de serviços de su-

Foto: Montagem de AméricaEconomia sobre foto de Divulgação

Locaweb expande operações na América Latina e quer ganhar o mercado mexicano com serviços de cloud computing


ESTRATÉGIA MARIACHI Neste primeiro momento, a Locaweb dá sinais de ter especial interesse pelo mercado mexicano, com destaque para a oferta de serviços de cloud computing – conceito de computação em nuvem que permite o acesso a processamento, armazenamento e softwares através da internet –, que oferece no Brasil desde 2008, e conta com 3 mil clientes. Neste ano, o serviço foi oferecido no mercado internacional. “No México, nenhuma empresa ainda se estabeleceu como líder ou referência em cloud. O momento é de conhecer o produto, descobrir para que serve. E estamos investindo nisso”, diz Macedo. E como fazer para ganhar a confiança de clientes com um serviço pouco conhecido e uma marca ainda menos fa-

70%

dos clientes da Locaweb são pequenas empresas porte, em Montevidéu (Uruguai), com o objetivo de atender clientes de língua espanhola em todo o continente americano. O investimento foi de cerca de US$ 1 milhão. “Agora temos uma plataforma inicial para poder atender esses mercados”, afirma Macedo, destacando que a empresa espera ver o break even dessa operação até o final de 2010. A escolha das duas cidades foi cuidadosamente estudada. “Por estar no Mercosul, Montevidéu apresenta uma série de facilidades, como no deslocamento de pessoas e na forma de administrar; além disso, lá existem zonas francas de serviços, onde podemos nos estabelecer com um custo bem menor do que, por exemplo, na Argentina, inclusive do ponto de vista de salários”, conta Macedo. Já a eleição de Miami se deu por ser um “ponto de interconexão dos países latino-americanos”.

mosa? Segundo Mautner, a empresa privilegiará a estratégia que a consolidou no Brasil: parcerias com agências, webdesigners, consultorias e empresas que desenvolvem soluções digitais, sobretudo, para pequenas e médias empresas. “Temos mais de 14 mil desenvolvedores parceiros no Brasil; é um sistema que funciona bem”, afirma o empresário. Tal estratégia parece casar muito bem com o conceito de cloud service, já que, além de possibilitar agilidade na expansão de um sistema de armazenagem ou de aplicações, este permite um serviço de custo inicial reduzido, possibilitando a contratação por empresas menores. “É um conceito que virtualiza a capacidade de armazenamento, precifica o software como um serviço e permite a cobrança de forma mais granular, por operação”, diz Reinaldo Roveri, gerente de Pesquisa da consultoria IDC

Brasil, especializada em TI. Segundo Roveri, atualmente, o cloud computing movimenta cerca de US$ 17 bilhões no mundo, “e a estimativa é de que chegue a US$ 44 bilhões até 2013, representando entre 25% e 30% da receita total do setor de TI”, completa Roveri. Essa elasticidade que permite oferecer um custo inicial baixo e expandir conforme a demanda é muito bem espelhada na oferta e no perfi l de público da Locaweb. “Para cloud services, temos tíquetes que vão de R$ 59 a clientes com vários servidores e milhares de reais por mês”, diz Mautner. Dos cerca de 200 mil clientes que a empresa tem, 70% são pequenos negócios, que colaboraram para a Locaweb fechar 2009 com uma receita bruta de R$ 131 milhões, crescimento de 28% em relação a 2008 e margem Ebitda de 38,1%. “Quando, no México, na Argentina, falamos do porte da Locaweb, as pessoas ficam espantadas com uma empresa que tem 200 mil clientes”, diz Mautner, confiante no potencial de crescimento de seu negócio na região. Entre outros números expressivos colecionados pela empresa estão 2,3 milhões de contas de e-mail, meio milhão em domínios, 320 mil sites e 4,67 mil lojas virtuais. Mautner afi rma que, por enquanto, não há planos de aquisições fora do Brasil. “Não as descartamos, mas hoje não existe um player mais consolidado nesses países, nem em termos de market share, nem de qualidade”, diz. “Talvez o maior seja a Telmex (do México), mas esta não tem uma oferta nem próxima do que a gente faz no Brasil, pois é algo mais arcaico e mais caro”, defi ne, destacando que a opção de uma estratégia menos agressiva tampouco se deve à falta de capital. No final de 2008, a empresa cancelou uma oferta pública de ações, por conta do acirramento da crise financeira mundial. “Pretendemos retomar esse plano de colocação assim que as condições de mercado melhorarem”, diz. “Mas a Locaweb é tranquila quando se trata de capital, e não o faremos se as condições não forem boas”, diz. Maio, 2010 AméricaEconomia 21



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NEGÓCIOS TV A CABO

TODOS LIGADOS Depois de anos de estagnação, a TV paga desponta no Brasil em um jogo de alianças no qual o mexicano Carlos Slim pode levar vantagem VERÓNICA GOYZUETA, DE SÃO PAULO

A

paixão dos brasileiros pelo futebol está intimamente ligada à TV e ao seu desenvolvimento tecnológico. As Copas do Mundo sempre se converteram em um grande empurrão para a TV se popularizar no país, já que essa é a oportunidade escolhida por fabricantes de aparelhos, bem como pelas emissoras, para lançar novidades. Foi assim com

24 AméricaEconomia Maio, 2010

a transmissão ao vivo, a TV em cores, a TV digital e o LCD. Esse último já alcançou 50 milhões de unidades no Brasil, mais do que o dobro do registrado em domicílios do México, por exemplo. Para a Copa de 2010, sediada na África do Sul, a novidade esperada é a transmissão em 3D para clientes de TV por assinatura. Mas pode ser que ela não vingue.

A NET Serviços, maior empresa brasileira de TV a cabo, já tem a tecnologia disponível e a apresentou em eventos como o Carnaval e a Fórmula Indy, em locais restritos. A inviabilidade da operação se justifica por dois fatores: falta de patrocinadores dispostos a desembolsar um alto valor destinado à TV Globo – que tem direitos de transmissão – e baixa penetração da TV por


do Brasil com questões regulatórias. A TV aberta tinha altos índices de audiência e um público satisfeito. Houve demora no processo de regulamentação, e só no final dos anos 1990 as normas ficaram prontas. E houve também uma série de crises financeiras que limitaram a adesão de assinantes”, explica Samuel Possebon, autor do livro TV por Assinatura, 20 anos de Evolução e diretor da Converge Comunicações, grupo editorial especializado no mercado de comunicação e TI.

PACOTE MEXICANO

Foto: 1 - Altrendo Images/Getty Images

1

assinatura no Brasil, considerando que TV se paga com anunciantes e/ou assinantes. Pois é, apesar de ter o maior número de aparelhos da América Latina, o número de domicílios que pagam para assistir à TV é de pouco mais de 10%, o mais baixo da região. Desde 1988, quando saíram as primeiras licenças, o Brasil tem vivido uma estagnação na área, tendo hoje uma penetração ainda

irrisória se comparada a vizinhos como Colômbia, com 75%, ou Argentina, onde 63% das TVs estão ligadas em canais pagos. A média sul-americana é de apenas 25% porque é puxada para baixo pelo resultado do Brasil. O dado parece estranho em um país adepto a novidades tecnológicas, invadido por celulares e redes sociais. “Foi uma mistura de fatores específicos

A situação, no entanto, começou a mudar em 2005, quando as operadoras passaram a focar em produtos desenvolvidos para a classe C, sobretudo com a oferta de pacotes de serviços, juntamente com telefonia e banda larga. Um dos responsáveis por essa tendência é o mexicano Carlos Slim, que, por meio da Telmex, tem 49% das ações da NET (os 51% restantes pertencem à Globopar) e é dono da empresa de telefonia Embratel. A presença de Slim nas duas companhias permitiu uma aliança que tem sido a grande vantagem da NET no mercado. Com a Embratel, a NET conseguiu colocar TV, telefonia e banda larga no mesmo cabo. O resultado? Em 2009, a NET registrou participação de 50% no mercado de cabo, 25% no de banda larga e 6% em telefonia fi xa. Para manter essa aliança vencedora, a NET trocou, em dezembro, seu contrato de uso de capacidade de rede da Embratel, que era de curto prazo, por outro, de longo prazo e irrevogável. Com isso, as ações da NET subiram 51% no ano passado, considerado ruim para o setor de telefonia na Bolsa, graças a uma melhora considerável em seu lucro, de R$ 20 milhões em 2008 para R$ 736 milhões em 2009. Já o novo contrato com a Embratel deve elevar a margem Ebitda (sigla em inglês para lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) de 27% para 29%, segundo um relatório da empresa. A expectativa agora é a de que a NET aproveite a Claro, operadora ceMaio, 2010 AméricaEconomia 25


NEGÓCIOS TV A CABO

TUDO PARA CRESCER As apostas da NET e de Slim fazem sentido em um mercado com grande potencial de crescimento em TV paga e banda larga. “Hoje, temos um ritmo de crescimento bastante consistente e constante, com taxas superiores a 20% todos os anos”, diz Possebon, que acha que a TV paga não é mais um produto de alto luxo no Brasil. Atualmente, o país tem quase 8 milhões de assinantes e espaço para crescer não apenas em grandes cidades – como São Paulo, onde a penetração atualmente é de 19% –, como também em cidades do Nordeste, onde a renda vem aumentando, e a TV paga quase não existe. Recife, por exemplo, tem uma penetração de apenas 3%, se-

gundo dados da Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA). Na competição, que promete ser acirrada, estão, além da NET e da SKY (da Globo e do Grupo Murdoch), grandes empresas de telefonia, como Telefônica, Embratel (também de Slim) Oi e GVT, que acaba de ser comprada pela francesa Vivendi. As empresas de

Aprovação de projeto de lei poderá permitir a participação majoritária da Telmex na NET, reduzindo o poder da Globo telefonia têm uma vantagem sobre a NET, que opera na TV a cabo, pois têm à disposição tecnologias com potencial de disseminação mais rápida, como o DTH (via satélite) e o IPTV (TV de protocolo Internet). Para Alex Pardellas, analista do Banco Banif, a NET, que é a empresa mais competitiva no momento, pode

19 %

ABERTO A ESTRANGEIROS

é a penetração da TV a cabo na cidade de São Paulo

2

26 AméricaEconomia Maio, 2010

sofrer com essa concorrência em função do alto custo da sua infraestrutura. “A TV paga é um negócio de escala”, ressalta Pardellas. “O mercado de DTH tem crescido muito porque o processo é muito mais simples. Praticamente todas as empresas têm entrado”, confi rma Possebon, da Converge. Isso faz também com que o mercado de DTH seja mais fragmentado, observa Pardellas. No cabo, a NET é líder, com mais de 50%, mas isso representa apenas 93 entre mais de 5,6 mil municípios, dos quais só 272 têm TV a cabo, enquanto o satélite não tem limites. Foi por isso que o Goldman Sachs rebaixou o rating da empresa no meio de abril e a tirou da sua carteira de recomendações, provocando uma queda brusca das ações na Bovespa, de 4,1%, no dia do anúncio. Para ganhar corpo, a NET tem recorrido ao seu caixa e saído às compras. “Alguns elementos para o nosso crescimento acelerado são a conquista de clientes e a compra de empresas, que trazem clientes e licenças”, diz Elek Jr., destacando que o plano de aquisições continua fi rme. A empresa optou por comprar enquanto a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) não libera novas concessões de TV paga, o que não deve acontecer tão cedo. “A Anatel tem arcabouço pronto para fazer licitações de concessão, nada impediria que o fizesse, mas a dúvida sobre a participação das empresas de telecomunicações faz com que adie o assunto”, diz Possebon. O último leilão aconteceu em 2000.

Outra definição para a atuação das empresas de telefonia na área é o Projeto de Lei 29, que está emperrado no Congresso e com poucas chances de ser aprovado em ano de eleição, acredita Possebon. No projeto, está previsto que estrangeiros podem ter o controle de uma empresa de TV paga, ponto que abriria caminho para Slim tomar o controle da NET das mãos do Grupo Globo. Atualmente, a Telmex tem 49%. Mas, segundo o acordo, caso a lei seja aprovada, ela passa a ter 51%.

Fotos: 2 - SXC; 3 - Joseph Eid/AFP

lular de Slim no Brasil, para entrar no mercado móvel. “É muito interessante para a oferta da NET dar mobilidade aos seus clientes e oferecer banda larga móvel. Temos um assinante muito dinâmico, e faz sentido facilitar essa oferta”, diz João Elek Jr., diretor Financeiro e de Relações com os Investidores da NET, afirmando que a parceria é possível, pode acontecer e não existe restrição regulatória para isso.


O MEXICANO CARLOS SLIM: OUSADIA DO MAGNATA FEZ A NET GANHAR MERCADO

As especulações ficam por conta de quanto pode custar esses 2%, mas Possebon não vê nenhuma possibilidade de entraves entre os sócios. “A Globo já tem uma defi nição muito clara do que quer na TV paga: uma presença na área de conteúdo com a Globosat. Seu foco vai ser na oferta de conteúdo”, diz o especialista. “E hoje a NET vale mais do que valia em 2004. Isso, do ponto de vista financeiro, é bom para ambos”, diz Possebon. É importante lembrar que esse acordo aconteceu quando a Globo enfrentava sérios problemas financeiros com a NET. A empresa tinha suspendido o pagamento da sua dívida, em 2002, e a Telmex entrou na renegociação. O principal concorrente da NET no mercado de TV paga e banda larga é a espanhola Telefônica, que vem de um ano difícil. A Anatel suspendeu a venda dos serviços da empresa por três meses, depois de registrar problemas na banda larga. Segundo um relatório da corretora Fator, a empresa pode ter perdido R$ 12 milhões em vendas e pelo menos 70 mil clientes por mês para a concorrência, sem contar os danos à sua imagem. Segundo um relatório da Ativa, outra desvantagem da Telefônica é que ela estaria “amarrada” para concorrer na oferta móvel porque divide o controle da operadora celular Vivo com

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a Portugal Telecom, que tem planos de assumir a totalidade da empresa. Já os espanhóis andam em conversas para uma fusão com a Telecom Itália, na qual ficariam com a TIM no Brasil. Independentemente de trocas de ações, fusões e leis, a NET está em vantagem no Brasil graças à ousadia de Carlos Slim. “O Slim já está com as quatro patas no Brasil”, brinca Pardellas, do Banif. Seja o que acontecer daqui para a frente, ele já entrou nos setores de TV paga, internet, telefonia e celular no Brasil. Com o apetite que o magnata mexicano demonstra ter, poucos duvidam que ele não consiga. Maio, 2010 AméricaEconomia 27


NEGÓCIOS CAPA

POPULAR DO FUTURO Brasil se torna o quarto maior mercado de automóveis do mundo e impulsiona novo ciclo de investimentos bilionários no país. A demanda anual pode superar os 5 milhões de veículos em 2016 POR GIULIANO AGMONT, DE SÃO PAULO

O

motor do mercado brasileiro nunca roncou tão alto como em 2010. Os resultados das vendas de automóveis no primeiro trimestre do ano indicam que o país superou a Alemanha – que registrou 670 mil licenciamentos de veículos leves no período, contra 750 mil no Brasil. Com isso, 1

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o Brasil já pode ser considerado como o quarto maior mercado de automóveis do mundo, atrás apenas de China, EUA e Japão. Para este ano, a perspectiva é a de alcançar quase 3,5 milhões de veículos vendidos, o dobro de 2005 e um avanço de mais de 8% em relação a 2009. Até 2016, e se a rotação da economia conti-

nuar alta como está, o Brasil deve superar o Japão e registrar a terceira posição, com uma demanda que pode chegar a 5 milhões de veículos. E tem tudo para saltar da atual posição de sexto maior produtor de veículos do mundo para quinto, ou mesmo quarto, disputando o posto com Coreia do Sul e Alemanha.


Foto: 1 - Divulgação; 2 - Fabio Gonzalez

JAIME ARDILA, DA GM: RENOVAÇÃO DE PORTFÓLIO NO PAÍS

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Esta nova realidade pressiona a produção das montadoras e impulsiona um novo ciclo de investimentos bilionários por parte de fabricantes e fornecedores de autopeças, com foco, sobretudo, em

carros compactos e seus derivados, que respondem por quase 80% do market share nacional. Hoje, as 20 plantas das 14 montadoras do Brasil têm capacidade instalada de cerca de 4 milhões de veículos por ano. Segundo a Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), em quatro anos, o país terá condições de produzir 6 milhões de veículos. Nesse período, de 2010 a 2013, somente o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) planeja injetar cerca de US$ 17 bilhões para empreendimentos da indústria automobilística, com destaque para as novas unidades das asiáticas Toyota e Hyundai, em Sorocaba e Piracicaba, no interior de São Paulo, além da expansão das fábricas das quatro líderes de mercado, que também dispõem de recursos de suas matrizes: Fiat, Volkswagen, General Motors e Ford.

FORTALECIDO Assim como em outros países emergentes, o setor automotivo brasileiro saiu da crise melhor do que entrou. Além da solidez dos alicerces macroeconômicos construídos nesta última década e meia, contribuíram para a retomada das vendas as medidas anticíclicas adotadas pelo governo, como a redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e a oferta de crédito por intermédio de bancos públicos. E, também, o esforço da indústria automobilística em repassar os benefícios para o consumidor. Para o consultor Paulo Cardamone, vice-presidente da CSM Worldwide, a disponibilidade de crédito, associada à queda de juros, ainda que insuficiente, permitiu o crescimento contínuo desse mercado desde 2002. “A oferta de financiamentos hoje é dez vezes maior do que era em 2000, o que reflete a confiança do mercado.” O professor José Roberto Ferro, presidente do Lean Institute Brasil, acrescenta a essa conta a distribuição de renda, a queda da inflação, o aumento do emprego e o crescimento do PIB. “O Brasil tem mais gente com recursos para comprar produtos novos e melhores.” Maio, 2010 AméricaEconomia 35


NEGÓCIOS CAPA As montadoras asiáticas crescem no retrovisor dos quatro principais fabricantes de veículos do Brasil: Volkswagen, Fiat, GM e Ford. Elas prometem abocanhar 20% do mercado da América do Sul nos próximos dez anos. Primeiro, vieram os japoneses, que hoje têm como principais representantes a Honda e a Toyota. Depois, foi a vez dos coreanos, que ainda devem fazer bastante barulho no país com as marcas Hyundai e Kia. Agora, são os chineses que prometem invadir o mercado. Pelo menos dez marcas podem ter veículos à venda no país nos próximos dois anos. A estratégia inicial da maioria das empresas é a de importar o veículo no modelo CKD (kits para serem montados no país em que os veículos são vendidos). Com pouco mais de dez anos de existência e quase 2 milhões de veículos produzidos, a Chery lançou, no ano passado, um utilitário esportivo produzido no Uruguai, acaba de colocar mais dois modelos importados no mercado e promete inaugurar uma fábrica no país até 2012. “Fabricaremos um compacto de R$19 mil, com freios ABS e duplo airbag de série, e um sedã completo. Teremos capacidade de produzir de 150 a 200 mil veículos por ano”, diz Luis Curi, presidente da Chery do Brasil. “Nossa meta é a de atingir 7% do mercado em 2018, chegando aos 350 mil carros vendidos.” Os chineses sabem que o grande desafio no Brasil, além de entender a lógica fiscal e tributária, é o de vencer o preconceito contra a qualidade de seus produtos. Eles afirmam que trarão a “Nova China” para o país, que faz computadores, TVs e celulares. Também garantem que estão escorados nos mesmos estúdios de design e fornecedores dos principais players mundiais, como Pininfarina, Bosch e Delphi. “Sabemos que não podemos errar. Nossos carros têm de satisfazer o consumidor”, reconhece Curi, que garante ter conversado com 43 concessionárias para oferecer suporte pós-venda e promete um centro de desenvolvimento tecnológico no Brasil. “Já temos motores flex desenvolvidos pela Chery.” Outra empresa que promete agitar o mercado é a JAC. Até o fim deste ano, o Grupo SHC, de Sérgio Habib, ex-presidente da Citroën, importará três modelos e não descarta construir uma fábrica no Brasil. Completam a lista três parceiras do Grupo Effa Motors: a AviChina, a Harbin Hafei (que vai montar uma van e um comercial leve em Manaus) e a Lifan, além da Great Wall, trazida pela CN Auto e a BYD, que negocia com o Grupo Caoa.

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Foto: 3 - Roberta Dabdab

ASIÁTICOS NO RETROVISOR

CLEDORVINO BELINI, DA FIAT: VOCAÇÃO BRASILEIRA PARA OS COMPACTOS

Levando em conta que a taxa de motorização do país é de um carro para cada 7,9 habitantes, é possível entender por que o mercado brasileiro se tornou tão atraente para as grandes companhias, a exemplo dos demais Bric – Rússia, Índia e China. Na prática, fica evidente que esses países vão ditar o ritmo de crescimento e desenvolvimento do setor, já que mercados maduros como Japão e EUA têm quase um carro por habitante. “Essas economias renovam sua frota, mas não têm margem para crescer”, avalia Sérgio Reze, presidente da Fenabrave (Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores). Estima-se que o percentual de brasileiros em condições de comprar um carro novo saltou de 10% para 15% nos últimos anos – o Brasil tem quase 200 milhões de habitantes, e uma frota inferior a 30 milhões de carros. “Até 2015, teremos de 20 a 30 milhões de novos consumidores da classe C”, avalia Jackson Schneider, ex-presidente da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores). Esse impulso, dizem os analistas, deve fazer com que a América do Sul, que hoje responde por cerca de 7% do mercado mundial, aumente essa participação em pelo menos 1% ao ano na próxima década. Reforça essa expectativa o fato de a Argentina também viver um bom momento de vendas de veículos, embora isso se deva mais


companhia, anunciou um aumento de R$ 4 bilhões para R$ 4,5 bilhões no período de 2011 a 2015 em infraestrutura no país, de um total de R$ 5,5 bilhões previsto para a América do Sul. “Implantaremos no Brasil plataformas de veículos globais, e apostamos em um crescimento desse mercado acima do PIB”, disse Mulally, na capital paulista.

GLOBAL COMPACTO à busca pela segurança patrimonial diante da alta da inflação.

EXPANSÃO À VISTA A maior carteira de investimentos no Brasil é da Volkswagen, que programa injetar R$ 6,2 bilhões no país até 2014. Cerca de 40% desse montante será destinado às três unidades de produção de São Paulo, e o restante, para desenvolvimento de novos produtos. Com pouco mais de 15% do total, o Brasil é o terceiro mercado da montadora alemã, que pretende tomar a liderança mundial da Toyota até 2018. A italiana Fiat, que detém a liderança de veículos leves no Brasil desde 2001 e acaba de apresentar o novo Uno, não havia divulgado seus investimentos para a América Latina até o fechamento desta edição. Mas a empresa desembolsou R$ 5 bilhões entre 2008 e este ano para ampliar sua capacidade de produção de 700 mil para 800 mil veículos por ano no Brasil. Considerando a planta de Córdoba, na Argentina, a Fiat tem capacidade instalada para fabricar 1 milhão de veículos por ano na região. “O Brasil detém 33% das vendas e 20% do faturamento do Grupo Fiat, o

que demonstra a vocação do país para carros compactos, com valor agregado mais baixo”, diz Cledorvino Belini, presidente da Fiat do Brasil e responsável pelo Grupo Fiat na América Latina, e recém-empossado presidente da Fenabrave. O executivo não confirma, mas está praticamente certo que a Fiat vai produzir o Cinquecento na unidade da Chrysler no México. A General Motors manteve inalterado seu cronograma de investimentos no país, de R$ 5 bilhões para o período entre 2008 e 2012, com liberação anual de R$ 1 bilhão. O mercado brasileiro é o terceiro mais importante para a GM, atrás de EUA e China. Já a marca Chevrolet tem o segundo maior mercado global no Brasil, perdendo apenas para o norte-americano. “Esses investimentos nos permitirão ampliar a capacidade produtiva e renovar o portfólio de veículos para atender essa demanda”, estima Jaime Ardila, presidente da General Motors do Brasil e Mercosul. A Ford também anunciou um aporte bilionário para o Brasil. Em visita ao país no início do ano, Alan Mulally, novo presidente mundial e CEO da

6,2

bilhões de reais é a previsão de investimento da Volks

Os carros globais são uma tendência irrefreável do setor automobilístico. As montadoras cada vez mais vão investir em soluções que atendam diferentes mercados. No Brasil, parece inevitável que os fabricantes invistam no nicho do carro compacto para aproveitar o lastro de mercado. As quatro grandes já fazem isso: brigam nessa categoria o Gol, da Volks; o Fiesta e o Ka, da Ford; o Palio e o Uno, da Fiat; e o Corsa e o Celta, da GM. Toyota e Hyundai, que devem estar produzindo até 2013, prometem lançar modelos compactos também. “Mas é preciso incrementar o conteúdo tecnológico nos carros para o Brasil atingir os patamares internacionais de exigência. Estamos muito defasados em questões como segurança e emissão de CO2”, alerta Paulo Cardamone, da CSM. Maior montadora do mundo, a Toyota ainda tem participação relativamente tímida no Brasil. Isso demonstra a cautela e a cadência com que os japoneses exploram seus mercados, bem como a prioridade global dada pela matriz. Nos últimos anos, os gastos da Toyota se concentraram em outros países, e só agora a equipe de engenharia da empresa está livre para se dedicar mais ao Brasil. “Paralelamente, os dirigentes da montadora esperavam o Corolla ser líder de sua categoria no país e bater a Honda, assim como já acontecia com a Hilux, para justificar o investimento. Em 2009, o Corolla superou pela primeira vez o Honda Maio, 2010 AméricaEconomia 35


NEGÓCIOS CAPA

Civic e criou condições para a vinda dos investimentos”, explica o consultor José Roberto Ferro, apesar do problema relacionado com o recall do modelo (ver box na página ao lado). O motor é outro quesito importante. Mais da metade dos automóveis emplacados hoje no país é 1.0 litro. Os outros 50% são versões principalmente 1.4 e 1.6, e a minoria, 2.0 ou mais. Os modelos flex, que permitem abastecimento com gasolina ou álcool, representam mais uma tendência. Cerca de 90% dos veículos vendidos no país têm motor flex, e já respondem por mais de 30% da frota. Ou seja, todos os fabricantes que exploram o mercado brasileiro precisam oferecer carros com motor bicombustível, inclusive pelo apelo ecológico. Justamente por isso, os motores elétricos ainda são no Brasil, bem como na maior parte do mundo, muito mais tendência do que realidade. Uma das primeiras propostas que parecem mais consistentes quanto aos carros movidos a eletricidade partiu da aliança Renault-Nissan. O grupo franconipônico anunciou uma parceria com a Prefeitura de São Paulo para estudar a viabilidade de utilização de veículos elétricos na capital paulista. A ideia é avaliar, entre outros itens, a infraes-

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trutura para implantação da rede de recarga dos veículos, além do modelo mais indicado para o projeto. A RenaultNissan deve lançar seu primeiro veículo elétrico, o Leaf, ainda neste ano nos mercados dos EUA e do Japão. Caso o projeto em São Paulo vingue, o prefeito Gilberto Kassab prometeu encomendar um lote de carros elétricos à CET (Companhia de Engenharia de Tráfego). “A viabilidade do carro elétrico no Brasil depende de incentivos públicos”, defendeu o CEO da aliança Renault-Nissan, Carlos Ghosn, em evento da comunidade libanesa, realizado na capital paulista, em abril. “Já temos acordos com cerca de 50 governos no mundo todo”, afirmou.

da Assessoria mostra que o excesso de capacidade de produção global, associado à rápida apreciação cambial do Real, impõe desafios significativos à competitividade das empresas. O chamado Custo Brasil, que envolve principalmente burocracia, infraestrutura, juros e carga tributária, precisa cair para dar condições de igualdade aos fabricantes instalados no país. O capital também é muito caro, dificultando empréstimos. Assim como os custos de matéria-prima. “O fato de o mercado estar bem não significa que a indústria também esteja”, pondera Letícia Costa, responsável pelo estudo. O setor de autopeças, por exemplo, terá um déficit entre importação e exportação de R$ 3,5 bilhões, podendo chegar a R$ 4 bilhões em 2011. “O faturamento do setor é o mesmo há décadas”, diz Arnaldo Frederico Meschnark, presidente da Sindiforja (Sindicato Nacional das Indústrias de Forjaria). A falta de mão de obra especializada é outro drama vivido por esse setor, que responde por mais de 25% do PIB industrial do país e cerca de 5 a 10% do PIB geral. Tal cenário, além de criar gargalos pontuais diante de picos de demanda, pode enfraquecer o setor manufatureiro e estimular a montagem de carros com peças produzidas fora do país, limitando a capacidade da cadeia produtiva, responsável por levar a matéria-prima aos chamados “sistemistas” e às montadoras. Por isso, o mercado aposta, e espera, que entrem na agenda do próximo governo brasileiro, além das reformas política e tributária, investimentos em infraestrutura e mais medidas de estímulo ao crédito, sem que a euforia em torno do pré-sal inviabilize esse processo.

90%

dos carros vendidos no Brasil são flex

TERRENO ACIDENTADO O otimismo em torno do Brasil é notório. Mas o motor desse mercado pode começar a falhar se alguns reparos não forem feitos. As barreiras à competitividade fora dos portões das fábricas podem jogar água no reservatório de óleo do setor. Um estudo feito pela Pra-


4

Foto: 4 - Divulgação

A ONDA DE RECALL A Toyota protagonizou o maior recall da história da indústria automobilística e deflagrou uma onda de convocações para reparos de defeitos de fábrica também por parte de outras montadoras. A empresa japonesa já teve de retirar das ruas para consertos mais de 8 milhões de veículos, quantidade superior à que vendeu no ano passado em todo o mundo. Tudo começou com um alerta emitido pelo órgão de controle de segurança veicular nos EUA sobre um problema nos tapetes de alguns modelos, que virou uma bola de neve até se constatar que a falha era no pedal. No Brasil, as consequências para a empresa, que sempre foi reconhecida pela qualidade de seus carros, foram ainda mais graves. O Ministério Público de Minas Gerais proibiu a venda do Corolla no estado até que a fabricante trocasse os tapetes dos carros em circulação. Como resposta, a fabricante tomou a iniciativa de realizar uma campanha de “chamamento preventivo”. “A medida pode ter sido considerada drástica, mas é um alerta para que as empresas comecem a se mexer quando for preciso anunciar um recall”, avalia Eduardo Tomiya, diretor da consultoria de gestão de marcas BrandAnalytics. Ele lembra o caso do Fox, que gerou repercussão em 2008, quando alguns proprietários tiveram os dedos das mãos arrancados ao abaixar o banco traseiro do veículo. “Na época, a Volkswagen disse que os clientes deveriam ter lido o manual, e se eximiu da culpa, o que não deveria ter acontecido”, diz Tomiya. Neste caso, o analista afirma que o melhor a fazer é ser transparente com o consumidor, explicando as causas do problema e o que a empresa está fazendo para resolvê-lo. Mas o movimento de recalls foi além de Toyota e Volks. A Honda promoveu um deles no início deste ano, em quase meio milhão de veículos em todo o mundo, para reparos nos sistemas de airbags. Na sequência, GM e Nissan também anunciaram seus recalls. A primeira convocou donos de mais de 1 milhão de ve-

ículos Chevrolet e Pontiac, nos EUA, Canadá e México, para consertar problemas no sistema de direção. E a segunda fez um chamamento envolvendo cerca de meio milhão de carros para reparar problemas no pedal de freio e no medidor de tanque de combustível. No Brasil, o Ministério da Justiça determinou, no início deste ano, que a Fiat fizesse o recall do modelo Stilo, que estaria causando acidentes por desprendimento da roda traseira. A montadora convocou pelo menos 50 mil veículos fabricados entre 2004 e 2008. Segundo Tomiya, é difícil mensurar com exatidão de que forma essa onda impactou no orçamento das montadoras, já que ela ocorreu justamente em um momento aquecido para o setor no Brasil, mas ele garante que “um erro como esse pode colocar em risco todo o investimento em marketing de uma empresa”. Os analistas reconhecem que as imposições do mercado obrigam as montadoras a trabalhar no limite. Isso leva a altas taxas de lançamento de veículos, redução do tempo de desenvolvimento de produtos e emprego de tecnologias cada vez mais novas. Do outro lado, a pressão dos consumidores e a rapidez com que as informações circulam na internet tornam a cobrança em torno das normas de segurança cada vez maior. “Está mais difícil omitir problemas”, diz o consultor José Roberto Ferro, do Lean Institute. “Mas é um procedimento normal feito pelo setor, que é aceito pelo mercado e continuará acontecendo.” Segundo ele, o segredo para não criar problemas mais graves de imagem é dar respostas rápidas e proporcionais ao impacto causado por eventuais defeitos de fábrica, algo que passou a ser feito por muitas montadoras depois que a Toyota não o fez. (Colaborou Graziele Dal-Bó)

Maio, 2010 AméricaEconomia 35


NEGÓCIOS TÊXTIL

FÁBRICA DA MODA Veja como três empresas da cadeia têxtil brasileira conseguiram reinventar seu negócio para combater o declínio das vendas MÁRCIA VAISMAN, DE FLORIANÓPOLIS

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34 AméricaEconomia Maio, 2010

VIRADA DA HERING: INVESTIMENTO EM MODA E AJUSTE NOS PREÇOS

Fotos: 1 - Charles Steuck/Liquidificador; 2 - Bernardo Presser

H

ering, Dalila e Lancaster são companhias que têm mais em comum do que a localização em Santa Catarina. Em meados desta década, as três – respectivamente, uma confecção, uma fabricante de malhas em rolo e uma estamparia – passavam por uma fase ruim, com dívidas e estagnação nas vendas. Graças a um processo de reinvenção de seus negócios, as semelhanças entre elas não param por aí: todas se recuperaram e crescem mais de 20% ao ano. Dos três casos, a intervenção mais forte parece ter acontecido na centenária Hering. Até 2005, ela era uma empresa endividada. Um estudo realizado com 1,8 mil pessoas, em vários estados brasileiros, tampouco apontou um bom diagnóstico para a marca: era pouco conhecida fora de São Paulo e Santa Catarina, e seu produto era considerado caro e sem apelo de moda. Ou seja: parecia o fim dos dias da camiseta branca da etiqueta com dois peixinhos. Depois de registrar prejuízo de R$ 17,7 milhões em 2004, a empresa passou a renegociar suas dívidas, incluindo US$ 76 milhões dos títulos negociados no exterior e um passivo junto ao BNDES, abriu mão do controle acionário para capitalizar a companhia e mergulhou em um agressivo plano de negócios, com ajuda da Bain Company Consulting. “Digo que 2007 foi o ano da transpiração, pois partimos para uma estratégia de tirar o fôlego”, lembra o presidente da companhia, Fábio Hering (veja entrevista na pág. 36). Com o valor arrecadado, a empresa foi para o ataque: aumentou o número de lojas de 151 para 276, a maioria franqueada, investiu em peças de moda e muita publicidade e estudou um reajuste de preço em seus produtos que, em alguns casos, chegou a uma redução de 30%.“Tornamos os produtos mais acessíveis, agregando valor sem reduzir a margem de lucro”, conta Hering.


A margem de lucro, positiva há cinco anos consecutivos, tem como base a maior escala de produção. Mas se engana quem pensa que a camiseta Hering foi deixada de lado. A diferença está na valorização de todas as outras peças e na preocupação em reduzir o tempo entre cada lançamento. “Há seis coleções por ano, e, a cada duas semanas, produtos novos estão nas vitrines”, diz Gracila Camargo, analista de Relações com Investidores da Hering. A mudança não parou por aí. A empresa, que tinha 12 marcas em seu portfólio e concentrava parte de sua produção para atender marcas internacionais, como Zara, Armani e GAP, abandonou o private label e enxugou sua carteira. Hoje, a Hering mantém apenas quatro marcas: Hering, Dzarm – para jovens –, PUC e Hering Kids, ambas focadas no público infantil. Para fechar seu plano de negócios, a companhia também retraiu sua atuação no exterior: abandonou operações como a que tinha no Oriente Médio e hoje se concentra exclusivamente na América Latina – nas lojas que possui no Uruguai (5), Venezuela (4), Paraguai (3), Bolívia (2), além de uma nas Antilhas Holandesas –, onde quer concentrar seu foco ao menos pelos próximos três anos.

NOVAS ESTRATÉGIAS A busca de valor agregado não foi a solução encontrada apenas quando o foco direto estava no consumidor final. Isso é o que mostraram a Lancaster Beneficiamentos Têxteis e a Dalila Têxtil, que, por meio do programa Santa Catarina Moda Contemporânea, que atualmente reúne 16 empresas, puderam trocar experiências com outras parceiras do setor e elaborar sua estratégia de recuperação. No caso da estamparia e tinturaria Lancaster, o pulo do gato foi substituir o puro sistema de venda de hora/máquina para as empresas de confecção, que chegavam com seus próprios desenhos, por outro que implicou a contratação de designers próprios, que também passaram a se envolver no desenvolvimento de estampas. “Agora, nosso grupo pensa

Mudança de hábito empresa

Hering

Dalila

Lancaster

antes

depois

Foco

commodity e private label para o exterior

Funcionários

5.000

fortalecimento de marca própria e conceito de valor agregado com redução de preço 6.000

Projeção de crescimento

acima de 30%

Foco

produto sem diferenciação

melhoria em criação e marketing e equipe de vendas

Funcionários

400

540

Projeção de crescimento

acima de 40%

Funcionários

produção hora/máquina 250

diferenciação de produto 315

Projeção de crescimento

20%

Foco

os conceitos e as tendências de estampas e cores ao lado da equipe de desenvolvimento dos nossos clientes”, comenta André Luiz Lobe, um dos diretores da empresa. Hoje, a Lancaster é a única de seu segmento a patrocinar desfiles da São Paulo Fashion Week, como os de Alexandre Herchcovitch e Ronaldo Fraga. O resultado dessa mudança? Uma companhia que, apesar de não revelar faturamento, cresce por volta de 20% ao ano. “Há apenas cinco anos, não apresentávamos crescimento, e hoje arrisco dizer que somos a maior estamparia do Brasil voltada a terceiros. Hoje eu ganho vendendo moda”, enfatiza o diretor. Na Dalila, que fabrica tecidos em rolo para as confecções, a falta de rumo na busca de um diferencial também era evidente quatro anos atrás, refletindo diretamente nos resultados da empresa. “Sempre pensamos em trabalhar com produtos diferenciados, mas não sabíamos como. Fugíamos das commodities, mas nosso produto não tinha uma identidade”, afi rma o presidente da empresa, André Klein da Silva. Na inquietude de seus 26 anos, o empresário afi rma que só encontrou solução quando passou a investir em melhorias na área de criação e marketing, além de mudanças na gestão industrial para atender ao nível de serviço desejado por esse mercado. Hoje em dia, a Dalila desenvolve coleções, fala de tendências e mostra o resultado em

desfiles itinerantes pelo país. Isso é raro no segmento de atuação de malharia em rolo. “Quando passamos a vender informação de moda, tivemos um salto nas nossas receitas”, diz. A empresa, que faturou R$ 106 milhões em 2009, espera crescer 40% ao ano e planeja, até 2013, estar entre as cinco maiores malharias do Brasil. ANDRÉ KLEIN, DA DALILA: SOLUÇÃO ESTAVA EM APRIMORAR CRIAÇÃO E MARKETING

2

Maio, 2010 AméricaEconomia 35


NEGÓCIOS ENTREVISTA

POTENCIAL RENOVADO P

restes a completar 130 anos, a Cia. Hering passou por diversas fases e muitos desafios. Ficou endividada, perdeu mercado e demorou a encontrar seu foco de atuação. Com o passar dos anos, seu produto de prateleira, a camiseta básica, foi perdendo atratividade. Atrelada a problemas macroeconômicos, a empresa afundou-se em dívidas e teve seu faturamento encolhido em cerca de 50%. Em 2005, entretanto, uma nova estratégia colocou a Hering em outro patamar. Basta ver os números. Seu faturamento atingiu a marca de R$ 877 milhões em 2009, com crescimento de 39,4% em vendas e ebitda de R$ 154 milhões. “Ainda há oportunidades interessantes no mercado”, diz o presidente da empresa, Fabio Hering, em entrevista à AmericaEconomia.

MARCIA VAISMAN, DE FLORIANÓPOLIS FOTO: PATRICK RODRIGUES

das, tivemos de sair do modelo de indústria para o de uma gestão focada em negócios, no varejo e na construção das nossas marcas próprias. Isso criou as bases para um modelo de crescimento que vem tendo sucesso há alguns anos.

AE Há alguns anos, o senhor admitiu que a transição demorou mais do que o esperado. O que motivou isso? Hering Do fim da década de 1990 até 2005, vivíamos um ambiente macroeconômico no Brasil que não permitia que a empresa crescesse. O custo do capital era elevado, e tínhamos dívidas. Passado o pior momento, o país ficou mais estável e foi apresentando boa perspectiva de crescimento. Desde 2007, conseguimos pensar em um plano de negócios para voltar a crescer agressivamente.

36 AméricaEconomia Maio, 2010

AE Qual o resultado registrado? Hering Há dez trimestres crescemos mais de 20%, e ainda há muito potencial para atuarmos nesse mercado.

AE Quais são as novas estratégias de mercado da Hering para vencer o prazo das metas estabelecidas pela consultoria que vocês contrataram? Hering Até 2012, pretendemos estar com 405 lojas Hering no país (hoje são 276), fora as multimarcas e as outras que trabalhamos, como Dzarm, PUC e Hering Kids. A partir daí, queremos desenvolver um plano de negócios para cada marca, já que nos concentramos inicialmente na Hering, que era a mais conhecida do consumidor. Paralelamente, podem surgir oportunidades interessantes. Não estou falando que pretendemos adquirir novas empresas, mas estamos atentos ao movimento do mercado. Tudo vai depender da oportunidade e do momento.

Foto: Divulgação

AméricaEconomia Quais foram os principais desafios no processo de reestruturação da empresa? Fabio Hering Nas últimas duas déca-


ternativa de sobrevivência. A partir de 2005, o cenário mudou, e resolvemos concentrar nosso esforço nas marcas próprias, construindo uma base sólida no mercado doméstico e no exterior.

ção de suas mercadorias com marcas de terceiros. Nos últimos 15 anos, atuamos fortemente em private labels porque a economia interna era difícil, os juros, altos, e havia forte oscilação na moeda estrangeira. Por isso, essa era uma al-

AE Por que vocês fecharam lojas no Hemisfério Norte e resolveram investir, inicialmente, apenas na América Latina? Hering Por causa da crise financeira,

e até porque não era nosso target. Em contrapartida, a Hering já é conhecida na maior parte da América Latina. Já temos uma boa operação no Paraguai, no Uruguai e na Venezuela. Estamos expandindo para Argentina, Chile e Peru, onde já estivemos no passado. Concentraremos nossa atuação, pelos próximos três anos, na América Latina. Pode haver outra expansão, mas esse agora não é o nosso foco.

Foto: Divulgação

AE Vocês decidiram encerrar a produção para as marcas estrangeiras e investir nas próprias. Foi uma decisão acertada? Hering Ninguém constrói uma prote-

Maio, 2010 AméricaEconomia 37


NEGÓCIOS BRICS

Foto: 1 - Divulgação

TRILHA AO LESTE

38 AméricaEconomia Maio, 2010


Empresas brasileiras que se instalaram na Índia colhem os frutos da aposta em custos competitivos e acesso a mercados asiáticos ROBERTA PREGNACA, DE SÃO PAULO

A

distância de milhares de quilômetros, as diferenças culturais e o fuso horário não foram empecilhos para algumas empresas brasileiras que, nesta década, fincaram o pé na Índia para expandir seus negócios, de olho no potencial de crescimento do mercado asiático. Hoje, o resultado de companhias como Gerdau, WEG e Marcopolo, algumas das principais brasileiras presentes no país, justificam inclusive novos planos e anúncios de investimentos. Ruben Bisi, diretor de Operações Internacionais da fabricante de ônibus Marcopolo, com sede no Rio Grande do Sul, aponta que os fatores de atratividade da Índia não repousam apenas naquele país. “O que está acontecendo é que o Brasil está perdendo a competitividade, não só para a Índia, em função do custo Brasil”, afi rma. A empresa atua naquele mercado por meio de uma joint venture com a Tata Motors, em duas unidades já em operação e com expectativa de produzir aproximadamente 14 mil ônibus em 2010. “Em termos de produção, as duas fábricas representarão, neste ano, em torno de 30% do nosso volume”, afirma o executivo. O investimento total nas duas fábricas foi de US$ 66 milhões, sendo que o aporte da Marcopolo foi equivalente à metade do valor, incluindo recursos próprios e financiamento. Além da valorização do Real, que prejudica as exportações a partir do Brasil, as empresas ainda apontam a mão de obra qualificada, custos reduzidos de frete e de logística e uma proximidade com clientes situados na Ásia como outras vantagens importantes. “Com as fábricas da Índia, queremos avançar no Oriente Médio, para o sul da Ásia e para os vizinhos da Índia, como Paquistão e Sri Lanka”, afirma Bisi.

PLANO DE VOO TERRITÓRIO INDIANO OFERECE DIFERENCIAIS COMPETITIVOS PARA COMPANHIAS DO BRASIL

Para chegar a esse mercado, entretanto, não bastou arrumar as malas e partir: as companhias dedicaram anos de estudo para obter sucesso. Foi o caso da WEG, fabricante de equipamentos eléMaio, 2010 AméricaEconomia 39


NEGÓCIOS BRICS tricos e geradores, com sede em Santa Catarina. “Avaliou-se comprar uma empresa, para termos uma operação industrial na Índia”, destaca Sergio Luis Marsiglia Sobreira, diretor de Operações da WEG na Índia. “Depois de avaliar várias opções, optamos desenvolver um projeto novo, começando do zero.” A WEG planeja investir entre US$ 65 milhões e US$ 70 milhões em uma unidade fabril que produzirá motores e geradores de média e alta tensão na Índia, com previsão de iniciar operação no segundo semestre de 2010. A uni-

firmou, em 2007, uma parceria com a faculdade indiana PSG College of Technology para a utilização da ferramenta Virtual Classroom Impacta (ou classe virtual Impacta). De acordo com o presidente do grupo, Célio Antunes, a Impacta, atualmente, trabalha na adaptação dessa tecnologia na PSG, que permitirá aos seus alunos acessar em um ambiente virtual o conteúdo de aulas presenciais. “Se somarmos investimentos em carga horária, no trabalho com os professores e na adaptação da tecnologia, esse valor deve alcançar aproximada2

mente R$ 500 mil”, afirma o presidente do grupo, que faturou R$ 40 milhões no ano passado e está de olho em novos mercados para crescer. “Essa tecnologia poderá ser implementada em qualquer lugar do mundo, não só na Índia.” Outro exemplo, de peso, é o do grupo Gerdau, que possui operações em mais de dez países e capacidade instalada superior a 20 milhões de toneladas de aço. A empresa fechou uma joint venture, em 2007, com o Grupo Kalyani, para operar uma planta siderúrgica naquele país. “A Índia foi eleita pela Gerdau para ser a porta de entrada no continente asiático por se tratar de um mercado extremamente promissor, principalmente pelo enorme potencial de crescimento no consumo de aço”, afirmou André Gerdau Johannpeter, CEO da companhia.

A Índia atraiu empresas brasileiras sobretudo nas áreas de siderurgia, transporte, educação e infraestrutura 3

dade terá capacidade de produzir mais de 300 motores ou geradores por ano. “Existe uma vantagem imediata, que é a de estar próximo ao mercado. Você encurta o prazo de entrega e simplifica o processo de logística”, diz Sobreira. Há também o caso de empresas que escolhem a rota traçada pela Marcopolo, trabalhando em conjunto com empresas locais. A Faculdade Impacta de Tecnologia (FIT), instituição de ensino especializada na área de tecnologia da informação e pertencente ao Grupo Impacta, sediada em São Paulo, ACIMA, RUBEN BISI, DA MARCOPOLO. À DIREITA, O PRESIDENTE DA TVS, HARDIP SINGH GOINDI, E O PRESIDENTE DA DAFRA, CRESO FRANCO

40 AméricaEconomia Maio, 2010


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Fotos: 2 e 3 - Divulgação; 4 - Leonid Streliaev

ANDRÉ GERDAU JOHANNPETER: A GERDAU TEM OPERAÇÃO NA ÍNDIA DESDE 2007

A Gerdau planeja desembolsar, no total de suas operações, R$ 9,5 bilhões, entre 2010 e 2014. “Na Índia, estão sendo realizados R$ 88 milhões em investimentos neste ano”, diz o CEO. O aporte será para um laminador com capacidade instalada de 300 mil toneladas, voltado à produção de aços especiais e vergalhões. A previsão é de que o equipamento entre em operação em 2011. Bisi, da Marcopolo, destaca a importância de chegar a um novo território com o apoio de um parceiro local. “Eu diria que uma joint venture facilita muito, pois deixamos de ser vistos como um estrangeiro chegando, mas como sócio de uma empresa local. Portanto, somos muito mais bem recebidos. A velocidade como as coisas acontecem é completamente diferente do que se estivéssemos sozinho. Diria que é uma questão de dividir um pouco o lucro, mas também dividir um pouco o risco”, diz.

PRÓXIMOS PASSOS O território indiano deve continuar na rota de empresas brasileiras que buscam diferenciais competitivos e custos

atraentes. “A Índia é um país que tem, assim como o Brasil, necessidade de desenvolver sua infraestrutura para continuar crescendo, como estradas, portos, aeroportos, energia elétrica, indústria de aço, cimento, óleo e gás, todas as áreas que têm potencial de crescimento”, diz Sobreira, da WEG. “Os investimentos programados já demonstram nossa intenção de expansão no país”, afirma Johannpeter, CEO da Gerdau. “A dinâmica de crescimento dos mercados indiano e asiático como um todo determinará os investimentos adicionais a serem realizados na Índia. Entretanto, não estamos planejando realizar novas aquisições no país.” Apesar do avanço das empresas brasileiras, alguns executivos acham que o apetite das empresas indianas para investir no Brasil é maior do que o das empresas brasileiras de se instalar na Índia. “O interesse é muito forte, principalmente em setores como açúcar e minério”, afi rma Roberto Paranhos do Rio Branco, presidente da Câmara de Comércio Brasil-Índia.

O certo é que, independentemente do destino, o fluxo de investimento direto que sai da Índia para outros países tem registrado um crescimento significativo nos últimos anos, indicando um forte impulso de internacionalização das empresas do país. Segundo estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), divulgado em abril, o investimento estrangeiro direto da Índia saiu de um fluxo médio de US$ 1,7 bilhão ao ano, entre 2000 e 2005, para mais de US$ 16 bilhões anuais entre 2006 e 2008. “Os brasileiros sempre foram mais tímidos para serem internacionais”, diz Rio Branco, afirmando que a Índia deve receber investimentos pesados na área de infraestrutura, o que amplia o interesse de empresas estrangeiras. De qualquer forma, enquanto os indianos estudam nosso mercado, as empresas brasileiras já estão colhendo os frutos de ter chegado antes à Índia, acumulando experiência na bagagem que levam em seu processo de internacionalização.

CAMINHO INVERSO Empresas indianas enxergam o potencial do mercado brasileiro. A fabricante de motocicletas TVS Motor Company fechou uma parceria com a brasileira Dafra Motos para a fabricação do modelo Apache RTR 150. “Houve um investimento de cerca de US$ 1 milhão, tendo em vista que o investimento mais pesado já foi feito durante o processo de implantação das linhas de montagem da Dafra em Manaus”, afirma Creso Franco, presidente da Dafra. “A fabricação de produtos TVS em nossa fábrica vai nos proporcionar contato com novas tecnologias, tanto em processos quanto em produtos, e nos levará a um excelente patamar em pesquisa e desenvolvimento.” Já o Instituto de Pesquisa & Desenvolvimento Brisa, com sede em Brasília, é outro exemplo de sinergia entre os dois países do Bric (grupo de países emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia e China). Realizou um intercâmbio com engenheiros indianos para trabalhar em projetos de adaptação de produtos para o mercado local para a fabricante de eletrônicos LG. Os engenheiros ficaram no Brasil entre janeiro e julho de 2007 e, de acordo com Katia Argolo de Castro, diretora de Operações do instituto, a experiência foi positiva e pode se repetida. “Os indianos são pessoas extremamente interessadas e dedicadas. São também muito técnicos e sistemáticos, têm um método de trabalho que visa à melhor qualidade do que se está fazendo,” diz.

Maio, 2010 AméricaEconomia 41


NEGÓCIOS VAREJO

Decisão da Casas Bahia de rever acordo com o Pão de Açúcar gera impacto negativo no mercado ROBERTA PREGNACA, DE SÃO PAULO

A

nalistas de mercado foram pegos de surpresa em meados de abril, quando a Casas Bahia solicitou ao Grupo Pão de Açúcar a revisão do acordo de fusão entre as duas companhias, divulgado no final de 2009. Um assunto que parecia encerrado e não demandaria outro esforço de Abilio Diniz, do Pão de Açúcar, Michel Klein, da Casas Bahia, advogados e assessores para encontrar um novo ponto final. Até o fechamento desta edição, Pão de Açúcar e Casas Bahia não tinham manifestado uma decisão. “Do ponto de vista econômico, isso não faz sentido”, afi rma Eugenio Foganholo, diretor da Mixxer, consultoria especializada em varejo e bens de consumo. “Parece mais uma jogada de negociação (da Casas Bahia) do que qualquer outra coisa.” Apesar das incertezas sobre o rumo das conversas, o diretor da Mixxer achava, em meados de abril, que a fusão seguiria em frente. “Tenho a impressão de que a chance de haver continuidade dessa compra é muito grande, pois os custos envolvidos em uma rescisão, para todas as partes, e a repercussão no mercado, seriam extremamente negativas”. Acordos de fusões e aquisições, segundo analistas, podem ser desfeitos

MICHEL KLEIN, DA CASAS BAHIA (À ESQUERDA), E ABILIO DINIZ, DO PÃO DE AÇÚCAR: EM BUSCA DO FINAL FELIZ

42 AméricaEconomia Maio, 2010

quando uma das partes se sente em desvantagem ou quando ocorre uma mudança das condições de mercado vigentes, como a crise fi nanceira mundial, que abalou os mercados e mexeu com o capital de diversas companhias. “Às vezes, acontece de empresas desfazerem um acordo. Não é normal, mas acontece”, afi rma Cauê Pinheiro, analista de varejo da SLW Corretora. Pinheiro cita o caso da Lojas Renner, que, em 2008, anunciou a aquisição da rede varejista Leader, com atuação no Nordeste e Sudeste do Brasil. Meses depois, a Renner alegou alteração no cenário econômico-financeiro brasileiro e mundial para desistir da compra.

CAPITAL HUMANO Alguns especialistas alertam que, em casos de grandes fusões e aquisições, as empresas devem ter cuidado especial não somente com ganhos operacionais, melhor competitividade e acesso a novos mercados. “Os processos de due dilligence, de forma geral, têm um foco muito grande na área financeira e nos aspectos mercadológicos. E muitas vezes não dão uma atenção especial a aspectos culturais, que estão associados a essas empresas. Porque, no fi nal, quem vai fazer a diferença são as pessoas”, diz Waldemir Bulla, sócio-diretor da Protiviti Brasil, consultoria especializada em gerenciamento de riscos, auditoria interna e governança corporativa. Uma rescisão do contrato teria impacto negativo para os dois lados, dizem analistas. O mercado espera ansioso que o resultado dessas negociações devolva o sorriso que os presidentes de Pão de Açúcar e Casas Bahia estampavam no rosto no dia do anúncio da fusão de seus ativos.

Foto: - Marlene Bergamo/Folha Imagem

CLIMA DE INCERTEZA

No caso da fusão entre Pão de Açúcar e Casas Bahia, o analista é otimista, mas, cauteloso. “Acho que há chances de ser desfeito, mas aposto numa mudança das condições do acordo, que fique melhor para a Casas Bahia.”



MOVIMENTOS

FÉ DE AÇO

O otimismo está estampado nos olhos de Lakshmi Mittal (foto), CEO da ArcelorMittal, siderúrgica com sede em Luxemburgo que produziu 73,2 milhões de toneladas de aço bruto no ano passado. Ou seja, aproximadamente 8% da produção mundial. “Vemos recuperação em mercados como Argentina e México. Mas não estamos vendo isso no México como vemos no Brasil,” disse à AméricaEconomia o principal executivo da empresa, durante visita a São Paulo, em meados de abril. Somente no Brasil, a ArcelorMittal tem planos de desembolsar cerca de US$ 5 bilhões em até quatro anos, com foco no incremento da produção de aço e de minério de ferro. A siderúrgica planeja aumentar a produção de suas minas brasileiras, que foi de 4 milhões de toneladas em 2009, para 5 milhões de toneladas neste ano. A meta é a de alcançar 15 milhões de toneladas de minério de ferro até 2015. A ArcelorMittal tem como objetivo global aumentar a sua autossuficiência nessa matéria-prima de 64% em 2009 para 75% em 2015. ROBERTA

PREGNACA, DE SÃO PAULO

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44 AméricaEconomia Maio, 2010


COM GELO, POR FAVOR

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Fotos: 1 - Divulgação; 2 e 3 - iStockphoto

REDE SÍSMICA

Quando a terra começa a tremer por todo o planeta, a computação em rede pode se transformar em uma grande arma. É o que defendem Elizabeth Cochran, da Universidade da Califórnia, e Jesse Lawrence, da Universidade de Stanford. Eles dirigem a Quake Catcher Network (QCN, rede de captação de terremotos), iniciativa que busca desenvolver a maior rede sísmica do mundo. A ideia é simples. A maior parte dos computadores portáteis modernos tem um sensor interno, desenhado originalmente para proteger o disco rígido em caso de queda ou sacudida violenta. Os sismólogos podem usar esse sensor para detectar e medir terremotos. No site da QCN pode-se fazer o download gratuito de um software que mede as vibrações da Terra e transmitir esses dados via internet à central da QCN. Os desktops não têm esses sensores, mas a QCN distribuiu sensores sísmicos, os chamados acelerômetros, que se conectam a esses computadores por meio de USB. Atualmente, essa rede conta com 1.660 voluntários em todo o mundo. Os esforços da QCN se concentram, agora, no Chile, onde cem acelerômetros foram distribuídos entre voluntários para analisar as réplicas do terremoto de 8,8 graus do dia 27 de fevereiro, que ainda sacodem o país. “Não só poderemos ter estatísticas para entender como se produzem os sismos, como também dar alertas com mais antecedência”, diz Cochran, de Aguas Saladas, na fronteira do México com os Estados Unidos, epicentro de um terremoto de 7,2 graus no começo de abril.

JUAN PABLO DALMASSO, DE CÓRDOBA

A crise econômica não foi suficiente para matar o hábito de degustar um bom uísque. As exportações dessa bebida representaram uma injeção de US$ 5 bilhões na economia do Reino Unido em 2009, recorde histórico quando se trata desse destilado. O Brasil foi um dos mercados emergentes que registraram maior aumento de consumo, 44%, totalizando US$ 93 milhões em vendas. O México, apesar da crise, incrementou seu consumo em 25%, com vendas de US$ 65 milhões. Entretanto, nenhum país latino-americano superou a Venezuela, onde, apesar das voláteis condições da economia, o consumo de uísque cresceu 73%, totalizando um mercado de US$ 173,7 milhões. Com esse resultado, o país tornou-se o único da região a figurar nos destinos “top 10” das destilarias escocesas. Talvez a revolução bolivariana seja mais fácil de engolir com um bom scotch. FELIPE ALDUNATE

M., DE SANTIAGO 3

Consumo sem ressaca 10 principais destinos de uísque escocês por valor de exportações Consumo 2009 (US$ milhões)

Variação (% anual)

1

EUA

627,0

13

2

França

610,1

13

3

Espanha

473,7

-5

4

Cingapura

251,3

-9

5

Grécia

195,5

15

6

Venezuela

173,7

73

7

Coreia do Sul

168,8

-24

8

África do Sul

162,3

7

9

Alemanha

154,8

-7

10

Taiwan

127,5

14

Fonte: Scotch Whisky Association e AméricaEconomia

Maio, 2010 AméricaEconomia 45


MOVIMENTOS 4

LÁGRIMAS E CAFEZINHO No México, um velório sem café não é velório. Segundo a Gayosso, uma das principais agências funerárias do país, parentes são apenas 10% da frequência em um evento assim, enquanto 90% passam apenas para socializar. Com base nessa estatística, a Gayosso associou-se à rede de cafeterias que leva o sugestivo nome de Café Punta del Cielo (Ponta do Céu) para realizar velórios em cafés adaptados. “Os velórios têm um componente social e, para isso, é necessário um lugar próprio”, diz o mexicano Pablo González Cid (foto), fundador da rede. Das sete cafeterias-velório que pretende instalar, três já estão prontas, oferecendo o serviço 24 horas. Mas nem tudo é luto nos planos do empresário. Para 2010, ele ainda planeja expandir sua rede tradicional para a Ásia, onde abriu recentemente uma cafeteria, em Hong Kong. “Assim como Juan Valdez é o máximo representante do café colombiano, nós aspiramos ser embaixadores do bom café mexicano”, diz González, que já conta com uma loja franqueada em Madri e planeja, em breve, chegar aos Estados Unidos. DAVID SANTA CRUZ,

DA CIDADE DO MÉXICO

A Câmara dos Deputados quer acabar com a máxima de que política no país só traz más lembranças. Por isso, inaugurou, no final de março, uma lojinha de suvenires que comercializa, entre os mimos turísticos de Brasília, produtos com a marca da Casa. Responsável pelo espaço, Mônica Rebello diz que o movimento tem surpreendido. “Recebo uma média de 200 pessoas por dia, e as vendas vão de vento em popa.” Mônica foi a vencedora de um pregão para escolher quem comandaria o estabelecimento e paga R$ 600 por mês de aluguel à Câmara. Ela conta que os itens preferidos da clientela – formada por turistas, servidores e até manifestantes que chegam de outras cidades para protestar em frente ao Congresso – são cartões-postais, canetas, camisetas e a coleção que comemora os 50 anos de Brasília, composta por canecas, ímãs e caixas ilustrados com fotos antigas da cidade. Ao contrário do expediente dos parlamentares, a lojinha abre de segunda a segunda, inclusive nos feriados. GRAZIELE DAL-BÓ, DE SÃO PAULO

46 AméricaEconomia Maio, 2010

5

Fotos: 4 e 5 - Divulgação; 6 - Pedro Armestre/AFP

FUI AO CONGRESSO E LEMBREI-ME DE VOCÊ


NO ATAQUE A Adidas domina o time do Real Madri; a Nike, o do Barcelona. A Adidas ataca com a Argentina; a Nike, com o Brasil. Cada jogo é também uma disputa comercial entre as duas maiores companhias de artigos esportivos do mundo. A norte-americana Nike é a líder de mercado, com US$ 19,17 bilhões em vendas em 2009, seguida pela alemã, com cerca de US$ 15 bilhões. A Adidas reconhece que não vem de uma boa campanha. “O ano passado foi difícil”, diz o alemão Herbert Hainer, CEO da empresa, sobre a queda de 10% nas vendas e de 60% no lucro operacional em 2009. A única região que salvou a companhia foi a América Latina. “Aí, crescemos 19%, com vendas de 1 bilhão de euros”, diz Karl-Heinz Maurath, vice-presidente da Adidas para a América Latina. Em ano de Copa do Mundo, a empresa está otimista. “Como patrocinadores oficiais, fornecedores e licenciadores, seremos a marca mais visível durante a Copa”, afirma Maurath. A Adidas vestirá 12 seleções, entre as quais também estão a do México e a do Paraguai. FELIPE

ALDUNATE M., DE SANTIAGO

6

PC NA MODA A indústria de PCs tem 30 anos, mas segue vendendo 1 milhão de unidades diárias em todo o mundo. As vendas em nível mundial cresceram 27,4% durante o primeiro trimestre de 2010, chegando a 84,3 milhões de unidades, de acordo com a consultoria Gartner. A América Latina recebeu 7,2 milhões dessas máquinas, um aumento de 35,4%, superado somente pelos 36,9% alcançados pela Ásia. “Foi um resultado um pouco abaixo do esperado”, diz Mikako Kitagawa, analista da Gartner. Em nível global, a HP segue como a empresa que mais vende no planeta, com 18,2% do mercado, seguida por Acer, Dell e Lenovo. A grande surpresa é a Asus, companhia taiwanesa que superou a Toshiba, ocupando o quinto lugar. FELIPE ALDUNATE M., DE SANTIAGO

Maio, 2010 AméricaEconomia 47


MOVIMENTOS 7

PRESIDENTE LULA E HU JINTAO, PRESIDENTE DA CHINA

BOM, MAS AINDA É POUCO Brasil e China assinaram, em abril, acordos para permitir as exportações brasileiras de folhas de tabaco e carne bovina ao país. Bom sinal? “Considerando que os BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) têm hoje as economias mais dinâmicas do mundo pós-crise, isso pode trazer ganhos a médio e longo prazos”, diz Rafael de Sá Marques, presidente da Associação dos Analistas de Comércio Exterior, sem demonstrar otimismo. “Passou da hora de termos escritórios avançados de comércio exterior, como fazem os grandes países exportadores”, afirma, dando como exemplo os EUA, “que separaram a condução de sua política comercial do Departamento de Estado (equivalente ao nosso Itamaraty) em 1962, quando criaram o United States Trade Representative – USTR”, aumentando, dessa forma, a eficiência dos programas de promoção de exportações. ROBERTA PREGNACA, DE SÃO PAULO

HORAS A FIO Os complexos regimes tributários dos países latino-americanos são uma dor de cabeça para as empresas. Segundo dados do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), a América Latina é a segunda região do mundo em tempo gasto para preparar os pagamentos de impostos, superada apenas pela Ásia Central. As empresas latino-americanas dedicam, em média, 320 horas por ano para preparar suas declarações tributárias, contra 177 horas em mecados de renda alta, como os Estados Unidos e a Europa Ocidental. O mais lento é o Brasil: em média, uma empresa gasta 2,6 mil horas para administrar questões relativas a impostos. VÍCTOR HERRERO, DE SANTIAGO

Contabilidade infernal

Tempo requerido para efetuar os pagamentos de impostos em 2007 Brasil Venezuela Equador México Argentina Peru Chile Costa Rica Colômbia horas anuais u

0

500

1000

1500

2000

2500

Fotos: 7 - Roosewelt Pinheiro/ABr; 8 - Divulgação

8

44 AméricaEconomia Maio, 2010



ESPECIAL CIDADES

O VALOR DAS PEQUENAS Ranking das Melhores Cidades para Fazer Negócios da América Latina destaca as capitais e os municípios cujo poder de atração se encontra nas vantagens de não ser grande AMÉRICAECONOMIA INTELLIGENCE

N

ão foi fácil para a gigante norte-americana Procter & Gamble (P&G) escolher para onde levar a matriz de suas operações na América Latina quando decidiu tirála de Caracas, na Venezuela, em busca de um ambiente de negócios mais acolhedor. A companhia pesquisou as 12 cidades latino-americanas onde tem operações – entre elas, São Paulo, Cidade do México e Buenos Aires, capitais de seus maiores mercados na região. A escolha final, entretanto, recaiu na relativamente pequena Cidade do Panamá. “A Cidade do Panamá tem uma localização estratégica e facilidades em infraestrutura que permitem um rápido acesso a vários pontos da América Latina de forma direta”, diz Alejandra Cobb, gerente de relações externas da P&G. Alejandra ainda aponta os incentivos fiscais e uma política migratória favorável como outras vantagens, confirmando a eficácia das políticas públicas panamenhas na atração de investimento estrangeiro direto (IED), que, em 2009, representou 10% do PIB do país. E a P&G não está só: Caterpillar, Adidas, Heineken, Dell e 3M estão entre as multinacionais que decidiram fincar os pés por lá. Esse interesse de empresas internacionais em buscar cidades menores

50 AméricaEconomia Maio, 2010

e os esforços destas em atraí-las levaram a AméricaEconomia Intelligence a desenvolver o ranking deste ano sob outro ponto de vista: modificou-se a metodologia que define o Índice de Competitividade Urbana (Icur), para reduzir a distância entre grandes e pequenas na hora de avaliar sua competitividade. Tal exercício foi um dos fatores que provocaram alguns movimentos de destaque na lista, e não apenas para a Cidade do Panamá, que saiu do 11º lugar no ano passado para o sétimo neste ano. São Paulo, reiteradas vezes líder do ranking, caiu para a terceira posição. E o Rio de Janeiro, em 12º em 2009, passou para o quinto lugar, à frente de Buenos Aires (em sexto).

CIDADE DO PANAMÁ E CURITIBA (À DIREITA): ESFORÇOS PARA ATRAIR INVESTIMENTOS


Fotos: 1 - iStockphoto; 2 - Paulo Fridman/Getty Images

OFERTA URBANA Segundo a urbanista da Universidade de Columbia, Saskia Sassen, essa tendência mundial de busca por cidades menores se dá por um fator que ela chama de “diferenciação especializada”, em que “as cidades melhoram em competitividade ao defi nir seu lugar no mercado global”. Isso implica que, para melhorar sua oferta urbana, essas cidades médias não necessitam chegar a um tamanho pantagruélico. Trata-se de uma estratégia similar, diz Saskia, à adotada por cidades como Copenhague (Dinamarca), Zurique (Suíça) e Chongqing (China).

No caso da Cidade do Panamá, Jaime Bocanegra, executivo da PricewaterhouseCoopers, destaca que a equação competitiva se dá “pela oferta de infraestrutura típica de uma urbe, com a vantagem de ser um município pequeno e fácil de administrar”. Algo que depende de dedicação para um bom planejamento urbano, como é o caso de Curitiba. Seu ex-prefeito, Beto Richa, destaca o esforço realizado pelo urbanista e também exprefeito Jaime Lerner, para desenvolver um “conceito de sustentabilidade integral, que contempla as dimensões social, econômica e ambiental”. Outro exemplo de destaque é a mexicana Monterrey, que não se inibiu diante do tamanho da Cidade do México e, com uma estratégia sustentável, conseguiu transformar sua proximidade com os Estados Unidos em vantagem competitiva para atrair negócios e empresas multinacionais. Hoje, entretanto, a cidade sofre com os efeitos da violência e do narcotráfico, o que a fez perder posições no ranking (de 10º para 12º).

PERDAS E GANHOS Mas não é apenas o tamanho que justifica algumas mudan-

ças no ranking. A mais notória é a volta de Miami – que, apesar de não ser latino-americana, sempre foi considerada neste estudo por concentrar muitos headquarters de multinacionais para suas operações na região – ao primeiro lugar da lista. Suas vantagens em termos de qualidade de vida e entretenimento continuam presentes, além de sua localização privilegiada e conectividade – por exemplo, com a melhor oferta aérea entre as cidades do ranking. A novidade neste ano é a valorização desses atributos, já que o custo relativo de operar a partir dessa cidade foi reduzido fortemente em decorrência da queda do preço dos imóveis e da desvalorização do dólar em relação à maioria das moedas latino-americanas. Entretanto, a cidade ainda tem como ponto negativo as restrições à entrada de estrangeiros, não apenas em relação à obtenção de vistos de trabalho como também para viagens de negócios rotineiras. Exemplo notório dessa dificuldade é o caso da empresa norte-americana Boston Scientific, de produtos médicos, que decidiu instalarse na Costa Rica (nona do ranking). Santiago está em segundo lugar. As vantagens da cidade estão na qualidade de vida, em seu marco econômico e político, em sua infraestrutura e em seu sistema tributário simples e previsível, além do baixo custo em relação a

Maio, 2010 AméricaEconomia 51


ESPECIAL CIDADES outras metrópoles, sobretudo quando se trata de mão de obra e bens imobiliários. Mesmo depois do terremoto de fevereiro, ainda ainda são mantidos projetos para a construção de edifícios corporativos entre os mais altos da América Latina. Entretanto, Santiago ainda é percebida como uma cidade chata, provinciana, estressada e poluída, fatores que devem ser trabalhados pelo país. Em pesquisa feita com lei-

52 AméricaEconomia Maio, 2010

tores de AméricaEconomia para este especial, a pior classificação da cidade é quando se trata de recomendá-la para ser visitada. São Paulo fica em terceiro lugar, mas continua superando todas as outras do continente quando se trata de seu potencial de negócios e serviços corporativos. E tudo indica que não demorará a retomar a liderança geral. Os investimentos projetados para melhorar a infraestrutura logística da cidade

para a Copa do Mundo de 2014 (veja pág. 55), se concretizados, serão um grande aporte em um dos segmentos que mais prejudicam a capital paulista: a capacidade de deslocamento das pessoas, por conta dos grandes e constantes congestionamentos. A infraestrutura para eventos olímpicos internacionais é outro fator positivo e que ajudou a cidade do Rio de Janeiro a ganhar muitas posições em relação ao ranking de 2009, ficando


pela primeira vez à frente de Buenos Aires. Enquanto a Argentina se consome em um contexto político que prejudica a atração de investimentos, com constantes ameaças de expropriação e mudanças nas regras do jogo – como a intervenção do governo argentino no Banco Central – o Rio de Janeiro tem profissionalizado sua equipe e sua forma de desenvolver projetos, fator que foi fundamental para ganhar o posto de sede dos Jogos Olímpicos de 2016.

Copa e Olimpíada, além da exploração do pré-sal, são sopa no mel para as empresas que estão em busca de bons projetos de investimento. Alguns exemplos são a chegada ao Rio de Janeiro da empresa inglesa de seguros Lloyd’s, em 2009, e neste ano, o anúncio da aterrissagem da francesa Schlumberg, de tecnologia. Sem contar a força da própria Petrobras. Felipe Góes, secretário de Desenvolvimento do Rio de Janeiro, admite

que o principal problema da cidade ainda é a violência. Entretanto, afirma que “essa tendência está se revertendo”, citando a política de ocupação pacífica das favelas. Nessa disputa, o que não falta é torcida a favor do principal cartão-postal do país.

Veja metodologia em brasil.americaeconomia.com

Maio, 2010 AméricaEconomia 53


ESPECIAL CIDADES

O FATOR FUTEBOL A

corrida, agora, é contra o relógio. Mas o resultado poderá valer a pena. Todas as oito cidades brasileiras que participam do ranking de cidades de AméricaEconomia estão entre as 12 escolhidas para sediar a Copa do Mundo de 2014. Apesar do atraso na tomada de decisões, elas esperam ganhar, como herança, um impulso em sua infraestrutura. “Até poderemos tapar os últimos buracos 15 minutos antes do apito inicial, mas ainda dá tempo”, diz a advogada Tatiana Campello Lopes, do Demarest e Almeida, no Rio de Janeiro. De acordo com um estudo realizado pelo escritório, se conseguirem concretizar os projetos atualmente listados para receber os jogos da Copa, essas cidades terão atraído mais de R$ 70 bilhões em investimentos. Uma cifra invejável para um período de apenas quatro anos. E isso sem contar o aporte que deverá chegar das redes de hotéis, numa estimativa de criação de mais de 30 mil leitos adicionais. Antes de considerar a partida ganha, entretanto, todas essas cidades terão de suar a camisa. Os projetos se

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concentram, sobretudo, em três áreas: aeroportuária, transporte terrestre e estádios. E em todas há problemas por resolver. No caso dos estádios, a Fifa (Federação Internacional de Futebol) já adiou o prazo de início dos trabalhos de reforma e construção, e até o dia 3 de maio os projetos deverão começar. Ainda que o caso mais midiático tenham sido os problemas encontrados no projeto do estádio do Morumbi, em São Paulo, até meados de abril o estádio do Maracanã, no Rio – cuja reforma deverá ser realizada através de uma PPP (Parceria Público-Privada), com prazo de 30 anos – , ainda não tinha edital de licitação. No caso do Arena, no Recife, tampouco se havia chegado a um acordo para sua construção, faltando até licenças ambientais, o que poderá fazer a cidade optar por um plano B, de reforma de estádios antigos. “Preocupa-nos que aconteça o mesmo que nos Jogos Pan-americanos, quando, em decorrência do atraso no calendário, muitas obras foram contratadas com dispensa dos processos licitatórios, para serem completadas em

tempo”, diz Bruno Drago, que também integra o grupo do Demarest e Almeida que estuda os eventos esportivos relacionados à Copa e à Olimpíada. No caso dos aeroportos, a história se repete: todos demandam reformas, mas a maioria ainda carece até do edital de licitação. Bem como o tão aclamado projeto do trem-bala. “Diversas audiências públicas foram realizadas para ajustes no edital a fim de evitar que nenhuma proposta seja apresentada, o que representaria um fracasso completo para o governo”, diz Drago. O momento político de eleições presidenciais também contribui para o atraso. E, antes mesmo da Copa, os Jogos Militares, no próximo ano e a Copa das Confederações, em 2013, serão bons termômetros da reação. “É importante que os projetos sejam sustentáveis em todos os sentidos, evitando-se a criação de grandes elefante brancos”, diz Tatiana, apostando numa virada no que já parece ser os 45 minutos do segundo tempo. Mas, para as cidades, tanto como para o futebol, o que importa, no fim, é o resultado.

Foto: 3 - iStockphoto

ESTÁDIO DO MARACANÃ, NO RIO: A REFORMA DEVERÁ SER VIA PARCERIA PÚBLICO-PRIVADA


8

Pricipais oportunidades

Recife

7

Salvador Aeroportuário • Luis Eduardo Magalhães – valor não estimado Transporte terrestre • Linha 2 do Metrô - R$ 200 mi. • Acessibilidade nas estações do Metrô - R$ 200 mi.

• Av. Beira Rio - R$ 52 mi. Estádios • Arena São Lourenço R$ 500 mi. Hotelaria • 2,5 mil leitos adicionais Saneamento • Drenagem e saneamento R$ 346 mi. • Etapas 2 e 3 da Vila Mangue Z. Sul - R$ 331 mi.

Aeroportuário • Guararapes - R$ 8,7 mi. Transporte terrestre • Projeto VLT (veículo leve sobre trilhos) ou VLP (veículo leve sobre pneus) Valor não estimado • Rua Gomes Taborda e construção do viaduto BR 101 - R$ 85,3 mi.

de investimentos nas cidades-sede dos jogos da Copa • Trem suburbano - R$ 300 mi. • Via expressa Bahia de Todos os Santos - R$ 550 mi. Estádios • Olavo Mangabeira – Fonte Nova – R$ 550 mi. Hotelaria • 5 mil leitos adicionais

1

Rio de Janeiro

• Linha 3 do Metrô R$ 1,3 bi. • Linha 4 do Metrô R$ 2,7 bi. • Arco Metropolitano – R$ 965 mi. Estádios • Jornalista Mário Filho (Maracanã) - R$ 430 mi. Hotelaria • 8 mil leitos adicionais

Aeroportuário

Brasília Aeroportuário • Juscelino Kubitschek - R$ 300 mi. Transporte terrestre • VLT (veículo leve sobre trilhos) R$ 1,3 bi.

• Metrô - R$ 600 mi. • Rede viária - R$ 2 bi. Estádios • Mané Garrincha R$ 600 mi. Hotelaria • 10 mil leitos adicionais

• Tom Jobim - R$ 818,9 mi. • Santos Dumont - R$ 152,2 mi. Transporte terrestre • Trem de Alta Velocidade (TAV) até Campinas (SP) Valor não estimado • Corredor expresso de ônibus - R$ 750 mi.

4

8 São Paulo Aeroportuário • Gov. André Fco. Montoro Guarulhos - R$ 1,65 bi. • Congonhas - valor não estimado Transporte terrestre • Mobilidade urbana R$ 33,4 bi.

• Linha 4 do Metrô R$ 4,7 bi. • 61,4 km de rodovias, ligando o Rodoanel à Av. Papa João 23 - R$ 4,4 bi. Estádios • Cícero Pompeu de Toledo (Morumbi) - R$ 250 mi.

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4

Aeroportuário • Salgado Filho - R$ 250 mi. Transporte terrestre • Linha 2 do Metrô - R$ 2,5 bi. • Projeto de transporte público Portais da Cidade US$ 210 mi.

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Américo Guimarães (Arena da Baixada) R$ 138,3 mi. • Infraestrutura do entorno • Arena da Baixada R$ 204 mi. Hotelaria • 2 mil leitos adicionais

2

3

1 Rio o de de JJan Ja an a neir eiiro e

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6 Porto Alegre

7

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5

Curitiba Aeroportuário • Afonso Pena - R$ 222 mi. Transporte terrestre • Metrô - R$ 2 bi. • Mobilidade urbana R$ 205,6 mi. Estádios • Conclusão do Joaquim

Per P Pe e errna nam n a am mbuc buc uco

3

6 • Projeto cais Mauá R$ 500 mi. • Rodovia RS 010 - R$ 350 mi. Estádios • José Pinheiro Borda - Beira Rio - R$ 130 mi. Hotelaria • 3 mil leitos adicionais

Belo Horizonte Aeroportuário • Pampulha - R$ 7 mi. Transporte terrestre • Metrô - R$ 3,4 bi. • Terminal de passageiros Aeroporto e Confins R$ 342,3 mi.

• BRTs (Bus Rapid Transit) - valor não estimado Estádios • Gov. Magalhães Pinto - R$ 300 mi. Hotelaria • 600 leitos adicionais

Legenda Obras relacionadas à infraestrutura de saneamento básico

Fonte: Demarest & Almeida

Construções, expansões, reformas e modernizações em vias e meios de transporte terrestres; valores estimados Construções, expansão do setor hoteleiro, feita em número de leitos adicionais; não inclui previsão de investimentos

Construções, expansões, reformas e modernizações em estádios e arredores; valores estimados Reformas, expansões e modernizações em aeroportos; valores estimados

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DEBATES RECICLAGEM

O VELHO NÃO ESPERA Aumento do consumo de bens duráveis torna ainda mais urgente a aprovação da Política Nacional dos Resíduos Sólidos GRAZIELE DAL-BÓ, DE SÃO PAULO

56 AméricaEconomia Maio, 2010

Foto: Divulgação

Q

uando, no final do ano passado, a geladeira de Renata Melillo parou de funcionar, e ela decidiu comprar uma nova, a empresária paulistana deparou-se com um grande dilema: o que fazer com a geladeira quebrada? Passá-la adiante parecia impossível, pois o eletrodoméstico já tinha mais de 20 anos. Jogar em lixo comum, para Renata, estava fora de cogitação. Contatar a fabricante tampouco poderia ajudar, afinal, não há lei que a obrigue a comprometer-se com a logística do produto depois de vendido. O jeito, então, foi recorrer a uma empresa especializada nesse tipo de serviço, ao custo de R$ 150. “Quando me disseram o preço, cheguei a titubear, achei meio ilógico pagar para descartar algo, mas a consciência falou mais alto”, conta Renata. Com a economia em crescimento, o nível de renda familiar dos brasileiros seguindo o mesmo caminho ascendente e alguns incentivos fiscais, casos como o de Renata se repetem cada vez mais no país. Segundo estudo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) realizado com 11 países emergentes, o Brasil já lidera, por exemplo, o descarte


de computadores, com 0,5 kg de lixo eletrônico per capita ao ano. Quando se trata de aparelhos de TV, o Brasil só perde para o México, que registra 0,9 kg, empatando em segundo lugar com a China, com 0,7 kg per capita ao ano. Esse aumento de produção de resíduos conta com um agravante: nem todos estão dispostos a pensar duas vezes ao botar a mão no bolso, como Renata, para pensar em uma destinação correta, deixando claro o problema trazido pela falta de uma política pública que determine de quem é a responsabilidade pelos produtos descartados. Sobretudo quando se trata daqueles que contêm materiais nocivos ao meio ambiente.

RESPOSTA LENTA O único projeto de lei que pretende reverter essa situação, a Política Nacional dos Resíduos Sólidos (PNRS), tramita há exatos 19 anos no Congresso. Neste ano, entretanto, ganhou um sinal positivo. O texto, que responsabiliza fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes pelo ciclo de vida dos produtos, foi aprovado em março pela Câmara dos Deputados e, agora, espera o voto dos senadores. “Antes de entrarmos no período eleitoral, em junho, essa questão deve estar resolvida, com a lei aprovada”, aposta o deputado federal Arnaldo Jardim, coordenador do grupo de trabalho suprapartidário responsável pela apresentação da proposta da PNRS na Câmara. Somado aos consecutivos recordes de vendas registrados pelo varejo brasileiro, o ciclo cada vez mais curto dos produtos – nem tanto o de utilidade real, mas o mercadológico – gera um agravante adicional. Enquanto, em 2005, um celular era usado por um ano, em média, hoje, ele tem uma vida útil de menos de seis meses. “A cada novidade lançada no mercado, outras cinco estão na fi la de espera”, diz o presidente do Conselho de Logística Reversa do Brasil (CLRB), Paulo Roberto Leite.

A NOVA REGRA

Érico Hiller Foto: Divulgação

Se a PNRS for aprovada, porém, objetos como lâmpadas, geladeiras, pilhas, baterias e eletrônicos deverão ser retirados do mercado, quando não forem mais ser utilizados, por meio da logística reversa pós-consumo, sistema em que o setor produtivo é responsável pelo processo de coleta e reaproveitamento ou destinação final dos materiais. Na avaliação de especialistas, esse modelo, similar ao usado em alguns países europeus, é o ideal também para o Brasil, mesmo que as fabricantes tenham que embutir esse custo no preço final dos produtos. “A quantia será proporcional à dificuldade de se equacionar o descarte, mas, ainda sim, é a melhor solução dentre todas”, acredita Leite, do CLRB.

RENATA MELILLO: R$ 150 PARA SE DESFAZER DA GELADEIRA VELHA

Maio, 2010 AméricaEconomia 57


DEBATES RECICLAGEM SIMBIOSE AMBIENTAL

15%

Segundo Orlando Fontes Lima Júnior, coordenador do Laboratório de Aprendizagem em Logística e Transportes (Lalt) da Unicamp, uma forma de equalizar o custo desse caminho inverso – que muitas vezes pode ser mais alto do que a própria operação direta – é promover uma simbiose ambiental, por meio das chamadas plataformas logísticas, transformando a despesa em receita. Mas como fazer isso? Para explicar, o professor da Unicamp cita o exemplo de Kalundborg, uma comunidade com cerca de 20 mil habitantes, a 135 km de Copenhague, na Dinamarca. “Naquele local, nos anos 1980, os empresários se mobilizaram para implantar noções de complementaridade nas cadeias de suprimento. O que era resíduo de uma empresa, acabou se tornando insumo para outra, e isso tem funcionado muito bem lá.” No Brasil, um projeto semelhante começa a tomar forma, graças a uma parceria entre a Unicamp, um empreendedor

privado e uma consultoria de conceito urbanístico. O plano é coordenar, em uma área de 8 milhões de metros quadrados, situada ao lado do aeroporto de Viracopos, em Campinas, a instalação de empresas que se complementem em sua cadeia de suprimentos. Mas o país ainda tem um longo caminho pela frente para alcançar o nível da Europa, considerada benchmarking em logística reversa. “Enquanto no Brasil apenas 15% dos itens plásticos retornam, na Europa, esse índice é de 50%”, afi rma Leite, do CLRB. De tudo o que é levado ao mercado, apenas 10% faz o caminho inverso depois de utilizado.

dos produtos de plástico são reciclados, no Brasil. Na Europa, esse percentual é de 50%

INICIATIVAS ISOLADAS Enquanto a legislação segue em compasso de espera, algumas iniciativas isoladas começam a aparecer. Uma das empresas que já estão aplicando esse conceito é a fabricante de computadores norte-americana Dell.

PROGRAMA DE RECICLAGEM GRATUITA DA DELL: BRASIL FOI O PIONEIRO NA AMÉRICA LATINA

Foto: 1 - Divulgação; 2 - SXC

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No programa de reciclagem de equipamentos da marca, o Roberto Lopes, a empresa trabalha fazendo a cliente entra no site da empresa e agenda uma data para o reciclagem de produtos como pilhas, baterecolhimento do produto pela unidade logística da comparias, lâmpadas fluorescentes e eletronhia, que o encaminha para uma empresa de reciclagem eletrônicos para 15 fabricantes e já gratuitamente. O Brasil, onde o projeto começou em 2006, foi pensa em estender o serviço para pioneiro nessa iniciativa na América Latina. Hoje, Colômbia o consumidor final. e México também participam do programa na região. Mes“O brasileiro como sem indicar o quanto é investido no projeto, a gerente meça a ter um grau de Conformidade Ambiental da Dell para a América Latina, de conscientizaCíntia Gates, garante que o processo não interfere no preço ção satisfatório, e dos eletrônicos. isso indica um mer“Os custos para nós são elevados, sim, mas estamos mais cado interessante preocupados com a parte social”, afirma Cíntia, reconhecenpara o futuro”, acredo que a América Latina ainda carece de uma cultura mais dita Lopes. forte em reciclagem. Os exemplos de A Garantech, empresa do grupo Itaú Unibanco com empresas e consu67% do mercado de garantia estendida no país, começou a midores que têm implantar a iniciativa no final de 2009. “Temos 50 ecoponse atentado patos, distribuídos nas cerca de 3 mil assistências técnicas ra a necessidade parceiras. Nesses locais, espalhados em São Paulo, região do de reciclagem se ABC e Guarulhos, o cliente pode descartar celulares, pilhas e multiplicam pebaterias sem custo”, explica o superintendente da empresa, lo país. O que falEduardo Marchiori Eckersdorff. De dezembro a março, foram ta, agora, é fechar recolhidos 200 quilos de materiais eletrônicos, e a meta é que esse elo com uma esse volume cresça, no médio prazo, para 1 tonelada/mês. legislação que deixe Do outro lado do balcão, algumas empresas já começam as regras bem claras. a ver a aprovação da Política Nacional dos 2 Resíduos Sólidos como oportunidade de O que prevê a negócio. É o caso da Descarte Certo, criada no ano passado pelos sócios Ernesto Política Nacional Watanabe e Lucio Di Domenico. Se o foco, dos Resíduos Sólidos até agora, tem sido a pessoa física – que Responsabiliza fabricantes, importadores, distribuidores e paga de R$ 9 a R$ 139 para contratar os comerciantes pelo ciclo de vida dos produtos e sua destinação correta. serviços da empresa –, com a entrada em vigor da PNRS, a rota incluirá também o Incentiva a adoção, o desenvolvimento e o aprimoramento de tecnologias ambientalmente saudáveis como forma de minimizar setor produtivo. impactos ambientais. “Já estamos buscando parcerias com algumas fabricantes de eletroeletrônicos Dá preferência, nas aquisições governamentais, a produtos recicláveis e reciclados. e operadoras de celular”, afi rma Watanabe, sem revelar o nome das companhias. Incentiva a integração dos catadores de materiais recicláveis nas ações O objetivo dos sócios é fechar esse prique envolvam o fluxo de resíduos sólidos. meiro ano com um faturamento de R$ 5 Proíbe o lançamento de rejeitos no mar, nos rios ou no solo. milhões, e parte disso deve vir do novo Proíbe a importação de resíduos sólidos e rejeitos cujas características modelo de negócio. causem danos ao meio ambiente, ainda que para tratamento, reforma, Hoje, a Descarte Certo recolhe 82 reúso, reutilização ou recuperação. produtos, de 23 categorias, que contemplam desde pilhas e baterias até geladeiPrevê que o poder público deverá estabelecer a coleta seletiva, implantar sistema de compostagem (transformação de resíduos sólidos ras e televisores. orgânicos em adubo) e dar destino final ambientalmente adequado Foi pensando no potencial de cresciaos resíduos da limpeza urbana (varredura das ruas). mento do setor que a Essencis Soluções Os municípios que implantarem a coleta com a participação de Ambientais instituiu, há um ano, uma associações e cooperativas de catadores terão prioridade no acesso unidade voltada à Manufatura Revera recursos da União em linhas de crédito. sa. Segundo o superintendente da área, Maio, 2010 AméricaEconomia 59


DEBATES RELAÇÕES EXTERIORES

PODER EM XEQUE Influência internacional do Brasil se intensifica, mas há quem questione as bases que a sustentam RODRIGO LARA SERRANO, DE BUENOS AIRES

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Mas alguns podem se perguntar: por que a Indonésia, por exemplo, que tem um crescimento semelhante e é mais populosa, não recebe o mesmo tratamento? A diferença, apontam os analistas, é que o Brasil, hoje, é o país onde muitos gostariam de estar: reúne as características de um líder confiável em políticas de meio ambiente, ao mesmo tempo que se apresenta como potência petrolífera, com belezas naturais, pessoas alegres, além de ser um grande defensor de um mundo multipolar equilibrado. Essas características, que marcam a influência internacional do país, são alguns dos ingredientes aspiracionais que formam o recheio do soft power (poder brando), expressão cunhada pe-

PRESIDENTE DO LÍBANO, MICHEL SLEIMAN (À ESQUERDA), COM O MINISTRO DO DESENVOLVIMENTO, MIGUEL JORGE: DIPLOMACIA “SOFT”

lo norte-americano Joseph Nye, no final dos anos 1980, para descrever o poder de persuasão de um país em nível internacional a partir de seus atrativos culturais, em detrimento do uso de incentivos econômicos ou do poderio militar, ou hard power (poder duro). Em visita a São Paulo, em abril, o próprio professor da Kennedy School of Government, da Universidade de Harvard, reconheceu o “soft power brasileiro”, afi rmando que “hoje, se leva o Brasil muito mais a sério do que há 20 anos, sobretudo pelo fato de o país focar-se em um desenvolvimento es-

Fotos: 1 - Marcello Casal Jr/ABr; 2 - Fernando Silveira/FAAP

N

os últimos anos, mais do que nunca, o Brasil tem projetado ao mundo a imagem de uma sociedade produtiva, feliz e potencialmente sustentável. Graças a fatores como bem-sucedidas reformas econômicas e financeiras, empresas que se internacionalizam, uma bolsa de valores cuja capitalização só é superada no continente americano pela Bolsa de Nova York, pela Nasdaq e pela Bolsa de Toronto, políticas sociais e um crescimento constante que favoreceu o fortalecimento de uma classe média massiva em um país de 190 milhões de habitantes, o Brasil tornou-se uma das mais importantes potências emergentes do mundo, com voz ativa em muitos fóruns internacionais.


truturado”. E chegou a declarar que a China não estaria preparada para ser potência exatamente pela ausência do poder de coerção da cultura desse país. “Não sei o que é soft ou hard, mas a estatura do Brasil cresce à medida que sua influência aumenta, e sua influência cresce com sua estatura”, diz Peter Hakim, presidente emérito do Diálogo Interamericano, centro de estudos com sede em Washington. Entretanto, o que inquieta parte dos observadores, em um momento em que o Brasil começa a dar novos passos – como o acordo de cooperação militar com os Estados Unidos –, e à beira de eleições presidenciais que poderão mudar a linha adotada pelo presidente Lula para a política internacional do país, é se o uso desse soft power será suficiente para consolidar e fortalecer o papel do país no tabuleiro de decisões internacionais daqui para a frente.

PODER DE PERSUASÃO O conceito de soft e hard power gera debates desde que foi criado por Nye. Para muitos, a parte “soft”, por não poder ser medida com exatidão – como o PIB de uma país ou a quantidade de aviões de combate que este possui –, o torna impreciso, quase inútil. Mas tampouco o hard power pode se traduzir automaticamente em maior influência nos assuntos globais. O Paquistão, por exemplo, possui armas nucleares e uma grande população, mas seu poder de pressão é quase zero. Para o brasileiro Paulo Sotero, diretor do Instituto Brasil da Escola de Assuntos Públicos e Internacionais Woodrow Wilson, da Universidade de Princeton, o Brasil é – e precisa ser – intensivo em seu soft power. “O potencial do Brasil para influir nos resultados

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Alguns observadores questionam se o Brasil pode manter-se eternamente como amigo de todos internacionais provavelmente será determinado mais pela capacidade das elites do país de identificar e aproveitar os ativos de valor associados à sua estabilidade e à governabilidade democrática do que por qualquer outro ativo de poder duro”, escreveu em um paper acadêmico intitulado “Brasil: ser ou não ser um Bric?”. Sotero aponta que, ao ritmo em que está, o Brasil a duras penas chegaria a ter o peso militar da França ou da Itália até 2040 ou 2050 e que, por isso, tem de apostar em outro tipo de persuasão.

O FATOR EUA Para analistas internacionais, a ausência de conflitos bélicos, seu tradicional pragmatismo diplomático e o apoio a um multilateralismo conformam valores dos quais hoje o Brasil se aproveita. “É uma herança que capitaliza o Brasil, diferentemente da Argentina, que, no âmbito internacional, tem sofrido uma descapitalização permanente, bem como do México, que era reconhecido como promessa, devido a sua condição de ponte para os EUA, mas isso acabou”, diz Juan Toklatián, professor da Universidade Torquato di Tella, na Argentina. Os observadores questionam a capacidade do Brasil em manter sua política externa focada em ser “amigo de todos”. “O Brasil precisa decidir qual é a sua posição estratégica”, diz Rodrigo Álvarez, analista de Brasil da Flacso (Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais), no Chile. Ele lembra que a posição de Lula frente à questão nuclear do Irã demonstra a intenção do país em participar dos temas mais conflitantes em escala global, contrariando potências como os EUA. Para Toklatián, a tentativa do Brasil de participar de assuntos do Oriente Médio sem ter o poder “hard” das armas e do dinheiro poderá trazer consequências negativas. “Pode acontecer o mesmo que com o ex-presidente argentino Carlos Menen, que, nos anos 1990, tentou mediar um confl ito na América Latina, e o resultado foi descrédito e dois atentados em Buenos Aires”, diz. Em sua apresentação na Faap (Fundação Armando Alvares Penteado), em São Paulo, Nye afi rmou que esperava que, no caso do Irã, o Brasil “usasse seu soft power JOSEPH NYE, CRIADOR DO CONCEITO DO “PODER BRANDO”: HOJE O BRASIL É LEVADO MAIS A SÉRIO

Maio, 2010 AméricaEconomia 61


DEBATES RELAÇÕES EXTERIORES MINISTRO DA DEFESA, NELSON JOBIM (À ESQUERDA), E ROBERT GATES, SECRETÁRIO DE DEFESA DOS EUA, APÓS A ASSINATURA DE ACORDO DE COOPERAÇÃO MILITAR

para convencer as gerações mais jovens de iranianos de que a posse de armas nucleares não atrairá os vizinhos”. Para Khatchik DerGhougassian, professor de Relações Internacionais da Universidade de San Andrés, na Argentina, esse episódio indica que o país ainda não determinou algo fundamental para seu posicionamento internacional: como será a relação com os EUA. “O Brasil ainda não defi niu se quer ter uma relação com Washington à la Índia, com uma aliança mais ampla e forte, ou algo diferente”, diz. Sotero, da Universidade de Princeton, entretanto, aposta que o destino do Brasil será ao lado dos EUA como potência ocidental. Um sinal disso poderia, inclusive, ser a recente aproximação, em abril, com um acordo de cooperação militar fi rmado entre os dois países.

PROBLEMAS NO BAIRRO Apesar desse impasse, os analistas estrangeiros apontam que o Brasil ainda

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tem uma tarefa básica, não necessariamente mais simples, para resolver: a de exercer essa mesma influência que prega em âmbito global na vizinhança. “Na maioria dos países latino-americanos, o Brasil ainda precisa de muita diplomacia e boa vontade – apesar de sua habilidade para reduzir tensões, como a gerada entre Bolívia e Paraguai no ano passado, ter demonstrado o talento diplomático real do país”, diz Peter Hakim, do Diálogo Interamericano. O contraponto, nesse caso, foi a ação brasileira no golpe de Estado em Honduras. O governo apostou todas as suas fichas na restituição do presidente Manuel Zelaya, que, por sua vez, acreditou no poder de influência do Brasil ao refugiar-se em sua embaixada. Apesar de conseguir alinhar o apoio dos países sul-americanos no repúdio ao golpe, o país não foi capaz de influir de forma significativa nos acontecimentos. “O Brasil precisa primeiro consolidar-se na América do Sul, criar con-

senso regional”, opina o professor DerGhougassian. “Nessa esfera, o país está cada vez mais retraído, e suas conquistas são magras”, diz Toklatián, da Universidade Torquato di Tella. “Não conseguiu eleger seus candidatos ao BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) nem à OMC (Organização Mundial do Comércio), tampouco influir na Venezuela.” Para os analistas, o Brasil pode culpar esse avanço tímido aos vizinhos “mal-agradecidos”, mas eles destacam que esse resultado está muito mais relacionado à personalidade política do país. “Para convencer os países, é preciso tirar dinheiro do bolso, pois toda integração implica ceder soberania, e isso tem seu custo”, afirma DerGhougassian. Ou seja, investir em hard power. A correção ou não desse rumo, entretanto, agora dependerá da estratégia de política internacional escolhida pelo sucessor do presidente Lula. Seja ela dura ou branda.

Foto: 3 - DoD/Cherie Cullen

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DEBATES ARBITRAGEM

BUSCAM-SE ADVOGADOS Nesta década, a América Latina converteu-se na Meca das arbitragens ANTONIO MARÍA DELGADO, DE MIAMI

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acordos de investimentos estrangeiros, abarcando mais de 50% do total que se encontrava registrado em 2009 no Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos (Ciadi), órgão do Banco Mundial para a resolução de conflitos comerciais. Um percentual alto demais para uma região que representa apenas 10% da economia mundial. “Deixou de ser o registro de dois ou três casos anuais para chegar a 30 novos por ano”, diz Ignacio Suárez Anzorena, sócio do escritório de advogados Chadbourne & Parke LLP. O recrudescimento dessa tendência também é claramente visível nos montantes que estão em jogo. “Durante os anos 1990, esses casos envolviam milhões de dólares. Hoje, são comuns os casos de centenas de milhões e até bilhões”, diz.

O fenômeno é liderado por países vinculados à Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba), que contratam sofisticados escritórios de Washington, Londres, Paris e Nova York para garantir sua defesa em gigantescas demandas, como a que a ConocoPhillips acionou contra a Venezuela por causa da expropriação de seus ativos petrolíferos, ou a que a Occidental Petroleum moveu contra o Equador. Nigel Blackaby, sócio do escritório de advogados Freshfields Bruckhaus Deringer, em Washington, alerta, entretanto, que o aluvião de casos começou na primeira metade desta década, com a Argentina, depois que as medidas adotadas pelo governo no marco da crise econômica de 2001 levaram dezenas de empresas estrangeiras a apre-

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acordos de proteção de investimento esperam por aprovação no Brasil

Foto: iStockphoto

D

urante o auge das privatizações na década de 1990, as incursões de empresas estrangeiras à América Latina eram comparadas a uma versão moderna da legendária busca do Eldorado. Na época, a região mostrava que tinha muito a oferecer às transnacionais. Os governos da região esticavam tapetes vermelhos para atrair investimentos estrangeiros, e seus mercados subexplorados prometiam gerar fortunas. Entretanto, agora que o Consenso de Washington parece ter perdido o crédito, tais companhias estrangeiras se destinam a desempenhar outro papel histórico em alguns países: o de agentes indesejados do colonialismo, em uma contenda de emancipação cujas escaramuças são defendidas por advogados em renhidas negociações. As expropriações e as súbitas mudanças de regras nas concessões converteram a América Latina em Meca da arbitragem internacional. Hoje em dia, a região domina os casos de quebra de


sentar reclamações ante o Ciadi. Tais empresas foram atingidas sobretudo pela pesificação forçada das tarifas dos serviços públicos, que antes eram fi xadas em dólares. Isso levou muitas empresas a mover processos contra o país. O ruído foi tamanho que, para alguns analistas, influenciou – além de outros fatores, como conflitos de cláusulas com a legislação brasileira – o Brasil a prorrogar a ratificação de acordos de promoção e proteção ao investimento (APPIs), o que legitimaria o uso de fóruns como o Ciadi para

PROFISSIONALIZAÇÃO Para Paolo Di Rosa, sócio do escritório Arnold & Porter, a busca pelos tratados de proteção dos investimentos estrangeiros se intensifica porque, “historicamente, uma empresa tinha que acudir aos tribunais nacionais do país pertinente, onde geralmente o juízo se prolongava indefi nidamente, e onde a empresa sentia que não podia receber um tratamento justo, já que os tribunais pertenciam ao país cujo Estado era a parte contrária no caso”, diz.

Triste domínio

2

61

60

Total

6

Venezuela

2

Paraguai

3

Equador

Chile

Argentina

Bolívia

30

México

60

Am. Central

90

Outros países

120

Am. Latina

Processos de arbitragem abertos no Ciad

0 no de casos

2

10

30

6

121

Fonte: Ciadi; dados referentes a outubro de 2009

a resolução de problemas do gênero. Atualmente, apesar de ser considerado um país atraente para a entrada de investimentos estrangeiros, o Brasil não conta com a aprovação pelo Congresso Nacional de nenhum dos 14 APPIs que tem assinados.

Blackaby concorda que a arbitragem é um dos poucos mecanismos que os estrangeiros têm para se defender das nacionalizações. “A triste realidade é que é impossível conseguir independência judicial na Venezuela, e tampouco na Bolívia”, diz o advogado.

“A ideia de que um juiz de primeira instância decida contra o governo, nesses países, é uma ilusão.” Isso não quer dizer, porém, que estejam desarmados nessa luta. Um advogado especializado, que pediu anonimato, afirma que países como a Venezuela se tornaram muito hábeis no manejo desses processos. Assessorada por escritórios como Arnold & Porter, Curtis Mallet e Foley Hoag, a Venezuela conseguiu desativar muitas demandas antes que chegassem formalmente à etapa da arbitragem. “Não são muitos os casos que chegam a uma arbitragem propriamente dita”, diz o advogado. “Seja porque são resolvidos antes, seja por causa de uma conduta estratégica do Estado que, devido à assessoria de bons advogados internacionais, consegue que investidores aceitem um acordo não muito conveniente para eles.” Esses acordos, geralmente, têm sabor de ultimato, sob um formato de “pegar ou largar”, jogando com a intenção dessas empresas de operar no país para lhes obrigar a renunciar aos seus direitos. O impacto que essas ações estão tomando sobre a confiança dos investidores é palpável. As empresas que optam por investir nos países da região, sobretudo os da Alba, o fazem somente quando as promessas de lucro potencial superam os riscos que implicam estar lá. “Estão mais conscientes da importância de administrar o risco político e incluí-lo nos custos de desenvolvimento de um projeto”, diz Suárez, da Chadbourne & Parke LLP. Maio, 2010 AméricaEconomia 65


DEBATES COSTA RICA

COM A BÊNÇÃO DE ARIAS

reforma fiscal que ficou parado no governo de Arias, entre outros motivos, por sua dificuldade em negociar com a oposição. Apesar de ter ganhado com 47% dos votos, Laura não conseguiu replicar essa maioria no Congresso, onde seu partido conseguiu apenas 24 das 57 cadeiras. Para analistas, esse é um sinal de que Laura não poderá repetir a característica autoritária cunhada por Arias. “Ela terá que passar da política da imposição para a da construção de consensos democráticos”, diz o cientista social Alberto Cortés, da Universidade da Costa Rica.

A NOVA PRESIDENTE, LAURA CHINCHILLA, E OSCAR ARIAS: NECESSIDADE DE CONSENSO

Principal desafio da nova presidente da Costa Rica será descolar-se da imagem autoritária do homem que a levou ao poder YENIFER MÁRQUEZ GONZÁLEZ, DA COSTA RICA

O

costa-riquenho Oscar Arias, Prêmio Nobel da Paz em 1987, é grande amigo das palavras. Desde o dia 7 de fevereiro, quando Laura Chinchilla foi eleita presidente da Costa Rica, Arias não poupou elogios para apresentar sua sucessora. “Nela se funde a melhor relação de prudência, paciência, humildade, responsabilidade e valentia”, disse, certa vez, sobre a sua companheira do Partido Liberação Nacional (PLN), o mais antigo do país. Se, por um lado, essa parece ser uma forte credencial para Laura, cuja posse será no dia 8 de maio, por outro, a nova presidente sabe que um de seus

66 AméricaEconomia Maio, 2010

maiores desafios será o de desgarrar-se da influência de seu antecessor, sobretudo quando se trata de dar uma virada na situação econômica do país. Os números indicam tal necessidade. O desemprego em alta reflete-se no aumento da informalidade no mercado de trabalho, que chega a 35,7%, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT). Em 2009, o déficit comercial do país foi de US$ 2,7 bilhões, ou 10% do PIB costa-riquenho. O déficit fiscal do governo chegou a 3,5%, devido à queda na arrecadação e à ampliação do gasto público para frear os efeitos da crise. Tal cenário faz urgir o projeto de

Por enquanto, os únicos sinais dados por Laura em seus discursos indicam a continuidade da linha escolhida por Arias, ao menos nos assuntos relativos à promoção do livre-comércio – o país negocia tratados comerciais com a China e Cingapura – e quanto à atração de investimento estrangeiro direto, fundamental para acelerar a recuperação do país frente à pior recessão registrada em 27 anos. A nova presidente também deu sinais de apoio à privatização dos setores de eletricidade e telecomunicações do país, temas que, na administração Arias, geraram polêmica e divisão entre os costa-riquenhos. “Mas o maior desafio que temos é o de combater a criminalidade, a violência e o narcotráfico”, afirmou Laura depois de eleita, destacando que “a América Central pode ser o último campo de batalha da guerra que vivem Colômbia e México”. Entre as eleições e a posse, a nova presidente demonstrou buscar o diálogo entre diferentes blocos sociais e políticos. Mas só agora, a partir de maio, é que ela poderá provar se conseguirá desnublar o horizonte dos costariquenhos, seja ou não sob a sombra de Arias.

Foto: Victor Baldizon/LatinContent/Getty Images

ALÉM DAS PROMESSAS



DEBATES VISÕES 1

Fotos: 1 - Liu Dawei/Notimex; 2 - Andreas Rentz/Getty

DEMOCRACIA VERTICAL

68 AméricaEconomia Maio, 2010


Autores de China – Megatendências afirmam que o ocidente ignora a diversificação e a experiência de um sistema político e econômico alternativo vividas pelo gigante asiático RODRIGO LARA SERRANO, DE BUENOS AIRES

“N

os últimos 30 anos, a China se transformou no laboratório em grande escala mais incrível que alguém já viu. É uma sequência de tentativa e erro, tentativa e erro. Se algo não funciona, é jogado longe. Se funciona, é multiplicado.” A afirmação de John Naisbitt soa taxativa, destoando dos matizes e meiostons da manhã de outono em Buenos Aires, onde conversou com AméricaEconomia. Por trás da convicção desse norte-americano, ex-executivo da IBM, estão 43 anos de viagens frequentes ao país asiático, onde atualmente vive parte do ano, encabeçando o Naisbitt China Institute, instalado na Universidade de Tianjin, no noroeste da China. Sentada ao seu lado, Doris Naisbitt, mulher de John, vai além. “A China está desenvolvendo um sistema econômico e social totalmente novo, que será uma alternativa à democracia ocidental”, diz. Essa ideia provocadora faz parte do livro China – Megatendências, que John e Doris acabam de publicar e que, por enquanto, está disponível apenas em chinês, inglês e alemão. John faz parte da honorável e sempre polêmica tradição dos futuristas high profile, que inclui personagens tão fascinantes e criticados como Herman Kahn, conhecido por suas análises sobre as prováveis consequências de uma guerra nuclear, e Ray Kurzweil, inventor e futurista envolvido com

2 À ESQUERDA, PARLAMENTO CHINÊS: ESPAÇO PARA UMA “ZONA LIVRE DE POLÍTICA”. ACIMA, DORIS E JOHN NAISBITT

inteligência artificial. Trata-se de uma profissão de risco, já que o futuro é um animal tão indócil. Entretanto, mais do que buscar uma fotografia detalhada dele, John Naisbitt busca identificar as tendências que lhe darão forma.

NOVO MODELO Assim, quando fala de Pequim, uma das mensagens deixadas por John é a de que os chineses não estão a caminho de se converter em uma democracia liberal bipartidária. Segundo ele, a China busca uma “democracia vertical”. E qual é a diferença? “No ocidente, todo o sistema depende do movimento das eleições, enquanto na China a interação se dá entre conselhos, uma democracia consultiva orientada por resultados”, diz. Nos Estados Unidos, não faltam críticos ferrenhos ao casal Naisbitt por este considerar o sistema chinês estável e positivo, alegando que John e Doris simplesmente adornam o que é uma ditadura sem divisão real de poderes. Já cientistas políticos como Robert John Barros e Adam Przeworski defendem que “um governo (autocrático) pode

seguir regras, mesmo se os poderes repartidos que se vigiam uns aos outros não forem institucionais: é suficiente que cada um deles tenha poder real”. A existência desses grupos é registrada pelos Naisbitt como uma “Zona Livre de Política”. Trata-se de tirar, momentaneamente, um tema importante do debate diário e imediato para buscar sua solução a partir de outras perspectivas, por meio da discussão nesses conselhos. No ocidente, para além da questão dos partidos políticos, lembram os Naisbitt, os lobbies empresariais dificultam ainda mais a existência de ações como essa. “Se, aqui no ocidente, continuarmos dizendo que isso não é possível de fazer, seguiremos bloqueando reformas e ficaremos cada vez mais para trás. Mas poderíamos consegui-lo”, defende Doris. Caso essa instância apartidária consiga manter-se estável e resolver confl itos, Doris e John salientam que tal fato pode atrair o interesse e ser imitado por pequenos países em desenvolvimento. “Esses países interessados têm como perfi l o fato de trabalhar sob Maio, 2010 AméricaEconomia 69


DEBATES VISÕES 3

CHINA’S MEGATRENDS – THE 8 PILLARS OF A NEW SOCIETY JOHN E DORIS NAISBITT EDITORA HARPER BUSINESS 2010 – R$ 68

o modelo ocidental por várias décadas, com programas de ajuda, e seus PIBs não melhoram; ao passo que a China de 30 anos atrás era uma nação paupérrima, diferentemente do potencial que tem hoje”, afirma Doris.

que esses jornalistas, em geral, são “jovens de vinte e poucos anos e, na maioria, mulheres, a maioria bilíngues e acadêmicas. Mas, o mais importante, com desejo de escrever sobre o que está passando no país”.

IDADE DOURADA

LIÇÃO PARA O BRASIL

De qualquer forma, os Naisbitt identificam mudanças progressivas no país, segundo eles, rumo a uma maior flexibilidade e sofisticação. “Por um lado, os profissionais mais jovens querem fazer as coisas para satisfazer a população e manter a economia em crescimento”, diz John. “Por outro lado, hoje os chineses não querem apenas a continuidade do crescimento, mas também a sofisticação da comunicação, e as lideranças governamentais estão de acordo em mudar as formas de comunicação entre as diferentes camadas da estrutura sociopolítica.” Parte dessa mudança, segundo Doris, vem de um boom do jornalismo. “Monitoramos os jornais locais em todas as províncias chinesas, e posso dizer que hoje se vive uma idade dourada na mídia local”, afi rma. “Ao observar esses jornais, percebe-se coisas interessantíssimas. Por exemplo, nos editoriais e nas matérias, os temas mais importantes hoje são corrupção e meio ambiente.” A pesquisadora diz

E o que o Brasil poderia aprender com a China? “Todos podem aprender algo com a China. Basta observar o que eles estão fazendo”, diz John. Doris dá um exemplo: “Eles sabem que, para sustentar o crescimento econômico, têm de passar a um nível mais alto de produção, no caminho de uma nação inovadora, criando um entorno que propicie e sustente essa meta”. Segundo Doris, não é o governo quem consegue consolidar tal projeto, “mas é ele quem cria o ambiente para que isso se desenvolva”. Para Doris, seria como “se no Brasil os diferentes setores políticos se unissem para chegar a um acordo sobre assuntos importantes”. Uma forma de consegui-lo, para ela, seria com a criação de algo parecido com a “Zona Livre de Política”. John, nesse ponto, chega a ser crítico ao país: “O Brasil não é capaz de realizar as reformas que poderiam alavancar seu potencial; o governo Lula chegou a mexer em poucas coisas por aqui ou ali, mas nada foi definidor. E o mesmo acontece na Índia”.

70 AméricaEconomia Maio, 2010

CHAVES DO COMÉRCIO Quanto às possibilidades de negócio entre Brasil e China, John acha que “os chineses pensam mais no Brasil do que os brasileiros na China”. Para ele, “essa é uma grande oportunidade para a América do Sul, pois eles precisam de muitos recursos naturais, e a região os tem para oferecer”. Para quem tem planos de rumar ao oriente para vender seus produtos, Doris dá três conselhos, segundo ela, essenciais: “Primeiro, é importante entender a diversidade da China; seu projeto e seu tempo podem ser equivocados em uma região, mas perfeitos para outra”, diz. “O segundo, é que você precisará – e terá – um sócio chinês. E, em terceiro lugar, saber diferenciar que, enquanto a mente ocidental se foca nos detalhes de um contrato, os chineses privilegiam a moldura. Eles costumam dizer que um contrato emoldura o bosque, mas deixa crescer as árvores”, conclui.

Foto: 3 - iStockphoto

MÍDIA CHINESA: CORRUPÇÃO E MEIO AMBIENTE SÃO TEMAS DE DESTAQUE

Não satisfeito com a observação, o futurólogo chega a apontar a descoberta de petróleo no pré-sal como uma desgraça. “Para mim, isso é o pior que poderia ter acontecido ao Brasil. Disse isso certa vez em um seminário e houve um grande silêncio. Mas o que acontecerá? Agora os governantes poderão pensar: por que se preocupar com reformas se o petróleo nos garante o dinheiro? E dessa forma o Brasil irá prorrogar ainda mais essas mudanças essenciais.”



FINANÇAS MERCADO DE CAPITAIS

ELO REGIONAL Iniciativa busca transformar o Brasil em plataforma de negócios da América Latina

A

tualmente, a América Latina tem se transformado em fonte de interesse para investidores europeus, asiáticos e norte-americanos, certo? Sim. Apesar disso, tanto o mercado de capitais brasileiro quanto outros da região sofrem de um problema: muitos têm relações diretas com centros internacionais, mas não mantêm o mesmo vínculo entre si. Ou seja, um investidor chileno que deseja aplicar em ações brasileiras, por exemplo, poderá escolher outras praças globais, como a de Nova York, para concluir sua operação. O resultado é o aumento dos custos e dos riscos nesses processos, além de uma redução da expressividade e da dinâmica dos negócios latino-americanos. Uma iniciativa, entretanto, está tomando forma para unir os países da região em um polo de negócios por meio do Brasil. Ela se chama Brain (Brasil Investimentos & Negó-

72 AméricaEconomia Maio, 2010

cios) e é encabeçada pelas entidades do mercado fi nanceiro brasileiro: BM&FBovespa, Febraban (Federação Brasileira de Bancos) e Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais). “Muitos negócios com ativos brasileiros ou latino-americanos que hoje são realizados em Londres e Nova York poderão ser realizados aqui”, afirma o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto. A organização institucionaliza o Projeto Ômega, criado há cerca de dois anos para, entre outros objetivos, tornar São Paulo uma praça financeira de porte semelhante às de centros como Hong Kong e Cingapura. Tudo começou em 2008, quando o Brasil obteve o investment grade, e as três entidades fundadoras viram a oportunidade de lançar um esforço mais ambicioso. A Brain é multissetorial, pois trata de projetos em todas as áreas que possam

Foto: iStockphoto com montagem de Janaína Diniz

ANA BORGES, DE SÃO PAULO


das commodities. A canalização de recursos para uma praça regional permitiria viabilizar um sonho antigo da BM&FBovespa: tornar-se a referência mundial para a formação desses preços. “Somos um dos maiores exportadores de commodities do mundo, mas os preços hoje são defi nidos em Chicago”, diz o presidente da Bolsa.

PROJETOS

promover um ambiente de negócios atraente. “A ideia é ser a plataforma de negócios da América Latina”, disse o presidente da Anbima, Marcelo Giufrida, durante o lançamento da organização, em abril, na capital paulista.

VANTAGENS MÚLTIPLAS Os criadores da iniciativa não poupam palavras na hora de enumerar os benefícios que ela pode gerar. “Com a criação de um polo regional, há o aumento do volume de negócios e mais transparência”, explica o executivo responsável por levar a ideia da Brain adiante, Paulo Oliveira Júnior. Antes de assumir o posto de diretor-geral da organização, Oliveira Júnior ocupava a diretoria de Novos Negócios da BM&FBovespa. Outro exemplo de como a falta de união prejudica os negócios dos países latino-americanos é a formação do preço

A Brain estreia com cerca de 80 projetos, que serão discutidos entre entidades setoriais, empresas e órgãos do governo brasileiro. As ações estão agregadas em três grandes frentes. A primeira consiste em consolidar o Brasil como centro de negócios da América Latina, apoiar a expansão de empresas “multilatinas” e criar um marco regulatório regional. A segunda frente é desenvolver o relacionamento desse centro de negócios globalmente. Para isso, será necessário melhorar a infraestrutura do país, reforçar o comércio exterior e simplificar a legislação cambial. “Queremos preparar o Brasil para ser um polo, e isso é complexo. Estamos construindo o longo prazo”, defi ne Pedro Guerra, vice-presidente da Anbima. O terceiro passo é reforçar a competitividade brasileira. Entre as propostas listadas, destacam-se a redução da burocracia para trânsito internacional de capitais e o enquadramento mais flexível das aplicações dos fundos de pensão. “A questão não é a redução da carga tributária, mas a simplificação dos processos. A desburocratização das regras, maior clareza e a estabilidade já implicam redução de custos”, explica Oliveira Júnior, diretor da Brain. Guerra lembra que não há nada que impeça o capital latino-americano de ingressar no Brasil, mas que esse processo poderia ser mais fácil. “Existem certas assimetrias que podem ser solucionadas”, diz. Entre elas, está a forma pela qual é tributada a indústria de fundos de renda variável e a compra direta de ações. Enquanto os investidores de fundos pagam impostos sobre os ganhos, o mesmo não ocorre quando aplicam diretamente no mercado acionário. As ideias vêm sendo discutidas com o governo desde o início. O raciocínio é o de que, tendo a participação estatal, as

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projetos já estão listados na Brain para serem discutidos

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FINANCAS MERCADO DE CAPITAIS

1 2

POLO FINANCEIRO A transformação do Brasil em um polo de negócios internacionais terá como duas de suas principais consequências o aumento da liquidez no mercado fi nanceiro e a redução do custo de captação de recursos por parte das empresas. “Cerca de 70% das operações com ações e 90% dos negócios com derivativos na América Latina são feitos no Brasil. Com a Brain, teremos um grande crescimento”, afi rma Oliveira. Segundo o executivo, a América Latina está sub-representada quando o assunto é investimentos no Brasil. Do total do volume de ações negociado na BM&FBovespa, um terço é realizado por estrangeiros. Essa parte está dividida da seguinte forma: 50% são investidores norte-americanos, 30% vêm de paraísos fiscais e da Europa, e o restante são asiáticos (maior parte) e latino-americanos. Para concretizar esse projeto, segundo o diretor da Brain, já estão em andamento negociações com os reguladores dos mercados fi nanceiros do Chile, Argentina, México e Peru, além das bolsas locais e dos bancos. A iniciativa não é simples, pois requer investimentos em tecnologia e mudanças regulatórias nos diversos países. A BM&FBovespa tem buscado acordos para formar uma rede que ligará São Paulo aos mercados desses quatro países. As conversas com o Chile são as mais adiantadas, e um acordo com o país deve sair ainda neste semestre. Uma das primeiras ações da Brain será a de criar condições especiais para que as empresas brasileiras consigam fazer a dupla listagem de papel, ou seja, negociar na bolsa brasileira e também em uma estrangeira. O caminho inverso será estimulado. Para isso, o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto, afirmou que os reguladores dos diversos países, em especial os asiáticos, serão procurados. A ideia é evitar que as companhias tenham os custos de listagem duplicados. “Vamos facilitar o acesso a capital com um custo menor, viabilizando o crescimento das empresas”, diz.

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milhões de reais é o orçamento da Brain para 2010

EDEMIR PINTO (FOTO MENOR), QUER FACILITAR O ACESSO AO CAPITAL. PAULO OLIVEIRA JÚNIOR (À ESQUERDA) DIZ QUE DESBUROCRATIZAR REDUZ CUSTOS

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Fotos: 1 - Divulgação BM&FBOVESPA; 2 - Divulgação

propostas ganham musculatura para serem implementadas com mais celeridade, inclusive as que dependerem de aprovação legislativa. De acordo com o presidente da Febraban, Fabio Barbosa, a execução do projeto é de longo prazo (entre cinco e dez anos) e, por isso, o objetivo não é tratar de questões pontuais ou fazer com que o governo federal dê maior agilidade às modificações regulatórias. Os criadores da Brain também estabeleceram algumas diretrizes iniciais. Uma delas é o comprometimento financeiro dos candidatos a sócios. Quem quiser participar deve contribuir com R$ 1 milhão anualmente por pelo menos três anos. Por isso, o orçamento da Brain para 2010 conta com R$ 12 milhões. Além das três entidades iniciais que encabeçaram a iniciativa, a Brain conta com outros dez associados (Bradesco, BTG Pactual, Cetip, Citibank, Itaú Unibanco, HSBC, Fecomercio, Santander, Banco Votorantim e Banco do Brasil). Entidades de outros setores da economia, como da indústria, representada pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e pela Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro), mostraram simpatia pela iniciativa. Além de 12 associados que contribuem com R$ 1 m i l hão, haverá outras duas categorias de sócios, que aportarão valores menores.


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OPINIÃO

VANTAGEM ILUSÓRIA N

os últimos nove anos, a economia peruana registrou um rápido crescimento. Mesmo em 2009, quando o mundo inteiro lutou para sobreviver à crise financeira, o país cresceu 1,1%. Os peruanos estão felizes com tal sucesso, mas ainda não sabem explicá-lo muito bem, dando motivos ingênuos e superficiais. Alguns justificam esse resultado apenas como um período de preços altos das commodities que exportam. Eles têm um profundo ceticismo sobre as instituições econômicas do país. Não conseguem esquecer a época da grande fi la do pão, quando seu dinheiro muitas vezes não era suficiente para comprar carne. Quando lhes perguntam qual governo tem mais responsabilidade na transformação, alguns citam o de Alberto Fujimori. Com alguma insistência, pode-se tirar deles algum crédito a Alejandro Toledo, e quase raivosamente sai um reconhecimento de que o segundo governo de Alan García foi muito melhor que o primeiro. Para um visitante estrangeiro, é especialmente notório o fato de os peruanos nunca mencionarem a melhoria de seu sistema financeiro. Quando são questionados, cautelosamente, reconhecem que parece funcionar melhor do que antes. Os mais jovens, às vezes, admitem a possibilidade de o dinheiro de seu fundo de pensão ser suficiente para lhes sustentar quando se aposentarem. Tais jovens inclusive se surpreendem ao saber que o valor total dos fundos de pensão peruanos aumentou de US$ 3,62 bilhões, no fi nal de 2001, para US$ 22,9 bilhões, em setembro de 2009. Nesse mesmo período, o número de afiliados ao sistema passou de 2,4 milhões para 4,4 milhões, e o montante médio por afi liado subiu de US$ 1.509 para US$ 5.226. Essas cifras ainda são tímidas se comparadas às do Chile. Com uma população pouco maior que a metade da do Peru, o sistema chileno registrava, em setembro de 2009, quase o dobro de afi liados que o seu vizinho, e o montante médio de ativos financeiros por afi liado era de US$ 12.529. Nos últimos tempos, houve uma interessante modificação da forma como os chilenos passaram a avaliar a economia de seu país e a do Peru. Os chilenos sempre criticaram a estratégia adotada por seu próprio governo, os defeitos dos fundos de pensão e desprezavam a economia peruana. Enquanto isso, não perceberam o rápido crescimento do

vizinho. Entretanto, a partir de 2007, o nível de autocrítica passou a ser maior, e o de desprezo ao Peru, menor. Como um atleta que lidera uma corrida e nota que seu concorrente está se aproximando, os chilenos começaram a se preocupar com o risco de a economia peruana um dia ultrapassar a sua. Suas apreensões aumentaram ainda mais quando o valor de seus fundos de pensão minguou e a economia estancou. Já os peruanos continuaram temendo e admirando o sucesso chileno, e não pareciam tão conscientes de que sua própria economia crescia mais rapidamente do que a chilena. Ao contrário, se preocupavam com que os chilenos, tirando vantagem de sua superioridade financeira, pudessem continuar comprando grandes companhias no Peru. Ainda não se viam como um rival econômico do vizinho. Agora, o Chile precisa se recuperar do que, provavelmente, foi o maior desastre natural de sua história, o pior terremoto desde 1960. Desastres naturais dessa magnitude são tão severos que levam para longe a fachada de unidade, harmonia e civilidade que as sociedades constroem tão cuidadosa e diligentemente durante os períodos de prosperidade. Os desastres sempre revelam o grau de coesão de uma sociedade, divisões escondidas, preconceitos arraigados. Agora, enquanto o Chile se foca em sua recuperação, as pessoas de fora da região podem pensar que o Peru aproveitará a vantagem que o destino lhe deu e irá superar e economia chilena. Mas isso seria uma conclusão superficial, pois vejo que o Chile logo poderá se fortalecer novamente, com uma onda de crescimento e inovação.

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JOHN C. EDMUNDS é doutor em Administração pela Universidade de Harvard, professor do Babson College e coautor de Wealth by Association.

Ilustração: Samuel Casal

Os peruanos continuam temendo o sucesso chileno


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Foto: iStockphoto

NOVO ETANOL

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A indústria láctea da Argentina descobriu que seus resíduos servem como matéria-prima para produzir álcool combustível. O desafio é conseguir escala e rentabilidade JUAN PABLO DALMASSO, DE CÓRDOBA

U

m desperdício. Isso era o que pensava um grupo de produtores argentinos ao ver que cada quilo de queijo fabricado por eles representava 9 litros de soro lácteo que eram jogados fora. Só uma pequena parte desse resíduo se destinava à alimentação de suínos; o restante era simplesmente descartado, podendo contaminar a água. Em 2009, entretanto, uma equipe de cientistas de Córdoba, liderada pelo pesquisador Pablo Rodríguez, resolveu mudar o final dessa história. Converteu cada 37 litros do resíduo em 1 litro de etanol. E, como uma espécie de bônus track, também conseguiu gerar 1 quilo de dióxido de carbono e 35 litros de água limpa. Caso consiga gerar escala a preço competitivo, essa estratégia poderá transformar o setor de laticínios em um importante fornecedor de biocombustível. A notícia dos pesquisadores soou como música aos ouvidos de Tulio Del Bono, secretário de Ciência e Tecnologia da província de Córdoba. A média de produção anual de litros de soro lácteo desse setor no território argentino é de 3,8 bilhões, o que significaria um potencial de fabricação de 102 milhões de litros de etanol. “Poderíamos atender mais de 50% da demanda interna de etanol sem destruir um hectare de bosque nativo ou de cultivo alimentar, nem aumentar um centavo do preço do açúcar”, diz Del Bono. Tendo como base os preços do etanol fi xados pelo governo argentino, a tecnologia poderia gerar um negócio de US$ 70 milhões ao ano onde antes só havia o mau cheiro exalado do soro. Com esses números em mãos, Del Bono convidou o governo federal da Argentina a investir, junto com Córdoba, US$ 215 mil em uma planta piloto para testar sua viabilidade econômica e, só então, abrir o projeto ao setor privado.

que o processamento industrial de resíduos lácteos poderá ser mais econômico que o processamento da cana-de-açúcar. Nada mal para um país que gera 5 bilhões de litros de soro de leite ao ano. No Chile, a Universidade Tecnológica Metropolitana acaba de lançar um projeto de US$ 270 mil para fazer sua própria planta piloto de transformação de resíduo de leite. A iniciativa, que conta com fi nanciamento da agência alemã de desenvolvimento sustentável GTZ e da ONG britânica GVEP International, está de olho no 1,3 milhão de toneladas de soro de leite que este país gera anualmente. Contudo, nem todos estão otimistas. “Até agora, o único etanol competitivo é o feito a partir da cana-de-açúcar”, assegura Juan José Gonzalez, que trabalha no escritório argentino da empresa belga De Smet Ballestra, líder mundial em tecnologias para a indústria de biocombustíveis. “Fizemos contas e os números não batem porque o rendimento é baixo e os custos de logística, altos.” Segundo González, isso motivou a De Smet Ballestra a descartar um projeto semelhante na Áustria, onde está seu centro de pesquisa e desenvolvimento. Richard Ling, economista do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, calcula que a viabilidade econômica do etanol do leite depende de um ajuste na integração dos processos. As escalas, segundo ele, não deveriam ser menores do que uma produção diária de 60 mil litros de etanol. Como exemplo, ele conta a experiência da Nova Zelândia. A empresa neozelandesa Fonterra, maior fornecedora mundial de produtos lácteos, criou, em 2007, a Anchor Ethanol Ltda., companhia que conta com duas plantas capazes de produzir 19 milhões de litros de etanol obtido do soro lácteo por ano. O caso da Fonterra não é bem-sucedido somente por causa de sua escala. O segredo também está na integração de processos, como colocar plantas processadoras em fontes de energia geotérmica. Isso lhes permite “enfrentar um processo energético intensivo, como é o destilado, a um baixo custo”, diz David Reid, analista da Energy for Industry, consultoria neozelandesa especializada em energia, com sede em Oakland. Em abril, a empresa láctea argentina Sancor, em sociedade com a sueco-dinamarquesa Arla Foods, começou a processar 2,7 toneladas de soro diárias para extração de proteínas, cujo valor pode superar os US$ 8 mil por tonelada. Somar a fabricação de etanol seria um passo natural, ainda que a companhia, por enquanto, negue o interesse. Mas Del Bono não desanima. “É muito provável que hoje não sejamos competitivos. Mas a regra de ouro é não descartar uma tecnologia por conta dos preços atuais, já que as variáveis podem mudar”, afirma.

O soro obtido com a fabricação de lácteos da Argentina possibilitaria produzir cerca de 102 milhões de litros de etanol por ano

OUTROS TESTES Iniciativas como essas estão se multiplicando na América do Sul. A Universidade do Norte do Paraná, em Londrina, montou uma destilaria semelhante à de Córdoba. O coordenador do projeto, Hélio Suguimoto, está tão otimista que afirma

Maio, 2010 AméricaEconomia 79


CLICS & CHIPS NETBOOK RECICLADO A Sony lançou no Brasil o Vaio W Eco, que se diferencia por causar menos impacto ambiental. O novo mininotebook tem 80% das peças plásticas feitas com material reciclado, a partir de CDs e DVDs descartados. Já o manual de instruções é eletrônico, reduzindo o consumo de papel. O produto está disponível na cor branca, tem tela de 10,1 polegadas, memória de 2 GB e disco rígido de 320 GB, com bluetooth e wi-fi integrados, e bateria de até 3,5 horas de duração. O preço sugerido é de R$ 2.099.

www.sony.com.br/vaioeco

NOVA NA FAMÍLIA A Panasonic do Brasil traz ao mercado a primeira câmera da linha Lumix 2010, a FP1. Entre os diferenciais estão o design ultrafino, tampa frontal deslizante e conectividade com o YouTube. O modelo conta com 12.1 megapixels e visor LCD de 2,7 polegadas, com a função Intelligent LCD, que detecta as condições de iluminação e controla o nível de brilho. O valor sugerido é de R$ 699.

www.panasonic.com.br

O One-Touch Scanner é um scanner de fotos fabricado pela PanDigital, com apenas 16 cm de largura, 300 gramas e portátil, que é capaz de reproduzir fotos em alta resolução sem a necessidade de conexão a um computador. O One-Touch vem acompanhado de adaptador de energia, cabo USB e cartão de memória. O preço sugerido é de R$ 399.

www.tecnoworld.com.br 80 AméricaEconomia Maio, 2010

Fotos: 1 - Click & Grow; 2 e 3 - Divulgação

SCANNER MINIATURA


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LINHA DIRETA

REDES GEOSSOCIAIS? Q

uando achava que já tinha dominado as redes sociais, com uma bonita página da empresa no Facebook e no LinkedIn e finalmente consegui configurar o Twitter para atualizar notícias minuto a minuto em consonância com nosso site, aparece um geek, com seu iPhone, e pergunta: - Você ainda não conhece o Foursquare? Um frio me percorre a espinha. Há algumas semanas não leio o TechCrunch e meu Google Reader tem mais de 6 mil feeds em negrito, sem ler. Forço a memória para resgatar algo relacionado a esse nome, e solto uma frase de efeito, para não ficar mal na fita: - Ah, essa rede social que se atualiza por telefone? Claro que conheço, mas ainda não se pode usá-la no Chile. Bola fora. O garoto ri. Placar: Nativo digital 1 x Imigrante 0. Dez minutos de pesquisa depois, fiquei sabendo que: 1) desde janeiro o Foursquare está disponível no mundo inteiro e;

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2) esse serviço não é apenas mais uma redezinha em que se preenche um perfi l: trata-se de uma mistura de jogo, rede social e guia de cidades. Entro no Wikipédia, que tinha sido atualizado no dia anterior, e aprendo que o Foursquare é uma rede “geossocial” e que, dentro dela, fazer check-in é ter passe livre para localizar amigos, ganhar pontos e condecorações e até se transformar no mayor de um bar ou qualquer outro antro: algo como o primeiro a chegar e o último a sair. Viajo a Buenos Aires e descarrego no Blackberry da empresa o aplicativo do Foursquare para provar a novidade do ano. Tal como senti em relação ao Twitter, há três anos, o resultado foi imediato: uma epifania. Percebo que estou diante de uma dessas tecnologias disruptivas que podem mudar completamente a forma de fazer marketing e negócios, ou simplesmente a forma de interagir com os amigos. Como o aplicativo utiliza o GPS do telefone, ou triangula as antenas de telefonia, consegue identificar o ponto exato da cidade em que uma pessoa está e indica restaurantes, bares, cinemas, teatros e outros serviços disponíveis nas redondezas. Penso que não terei mais de andar com o jornal da cidade ou o pesado guia turístico, pois outros usuários já deixaram pistas sobre o que fazer e em que lugar, e recomendam o que comer e o que evitar. Assim, fica óbvio prognosticar que o marketing urbano não será mais o mesmo. De volta a Santiago, leio que, nos Estados Unidos e na Europa, cafés e restaurantes dão descontos e presentes aos que fazem check-in no Foursquare. Já o jornal Financial Times trabalha conjuntamente com o Foursquare para oferecer assinaturas gratuitas àqueles que façam check-in em lugares selecionados, como cafés universitários e escolas de negócios. Quem se interessa em explorar essa nova rede precisa de um aparelho iPhone, Android, webOS, BlackBerry ou Windows Mobile, independentemente de este ter GPS. Depois, deve baixar a aplicação no site (www.foursquare.com), criar uma conta e começar a dizer ao mundo onde está. A graça é que quem acessa depois do horário comercial ganha mais pontos, o que pode se converter em uma boa desculpa para um happy hour: - É que estou provando uma nova tecnologia para a empresa, meu amor…

Ilustração: iStockphoto

RODRIGO GUAYQUIL, DE SANTIAGO



2000º JULHO DE 2009

Atingir a entrega de duas mil unidades do Falcon é mais do que apenas uma celebração de êxito. É uma confirmação de que todas as qualidades que temos desenvolvido desde 1963 são essenciais para um voo excelente. A força das tecnologias dos aviões de caça. A capacidade intelectual da liderança informática. A disciplina

da engenharia apaixonada. Tudo isto faz com que as máquinas de negócios de elevado desempenho dos Falcons atuais sejam mais econômicas e ecológicas do que qualquer outra na sua classe. Para conhecer a história completa, visite a nossa “Visita histórica interativa da Falcon” em falconjet.com/tour.

E NG I N E E R E D W IT H PASS ION


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