Conecte

Page 1

CONECTE

Entrevista: David Vega conta sua experiência como skinhead p. 10

Tribos existem? Você sabe o que são? p. 3

Faça o teste e descubra de que tribo você seria no passado p. 12


Pedro Hungria Cabral

Reportagem, edição e diagramação: Amanda Tavares Bruno Marise Estevão Rinaldi Ludmylla Rocha Luís Morais Luiz Felipe Barbiéri Marcela Busch Mariana Ribeiro Pablo Marques Vinícius Garcia Ilustração: Pedro Hungria Cabral e Camila Takamune Supervisão: Ângelo Sottovia Aranha, MTB 12870 e Renata Malta, MTB 34600 Suplemento desenvolvido nas disciplinas Jornalismo Impresso II e Planejamento Gráfico II FAAC - UNESP Novembro, 2011

Quando Gabi completou doze anos, seus pais decidiram que já era hora da menina ir ao cinema sozinha com as amigas. Uma sessão que começasse cedo e terminasse cedo, claro. Gabi se produziu toda: sapatilha de plástico, blusa escrita “girl” com glitter, bem como suas amigas também estariam vestidas. A noite foi um sucesso: pipoca grudada na gengiva, troca de olhares com os meninos cheios de espinhas, risadinhas e risadelas. Quando a Gabi fez quinze anos, não quis festa: “festa é muito brega, mãe. Quero algo mais descolado”. A mãe queria uma festa, a filha de vestido rodado... Mas Gabi não queria. Ela desejava um churrasco igual ao da Isa, numa chácara, todo mundo dançando com DJ e uma música eletrônica bem alta e ininteligível. Como a Isa era legal! Os pais da Gabi alugaram uma chácara e contrataram um DJ por inacreditáveis trezentos reais. “Careiro”, sussurrou o pai da Gabi, entre dentes. Aos dezessete, Gá, como era agora conhecida pela galera, não queria nem olhar pras suas fotos de pré adolescente; “blusa

2

rosa, argh! Olha esse cabelo cheio de mechas loiras, afe!”, falava a garota para Fabi; eram umas dez horas da manhã, as duas matavam aula enquanto pintavam os cabelos de azul. A Fabi era tão radical, tinha três piercings e duas tatuagens, com apenas dezessete. A mãe dela era tão jovem, deixava ela ir a acampamentos... “Meus pais são tão caretas, tão quadradões”, repetia Gá aos amigos. Aos dezoito, Gabi se frustrou: deixou de ir às melhores baladas, de tomar todas com o “pessoal” e de frequentar os bares da cidade para estudar. Estudava, estudava, estudava... Mas quando chegou o vestibular, foram embora as fórmulas, frases e regras: branco to-tal. A Gabi chorou, a mãe da Gabi chorou, o pai da Gabi lamentou: “uma fortuna eu pagava naquela escola...”. Aos dezenove, durante o jantar, o pai da Gabs olhou bem e percebeu um fio vermelho preso no cabelo desgrenhado da filha. “É só um dreadlock, pai, relaxa”, respondeu à pergunta muda do pai. Os pais se entreolharam desconfiados. “Essa menina está na

Fase sempre

incompleta Marcela Busch

erva, Deise. Não é normal, anda de pé sujo, ta frequentando uns lugares estranhos”, repetia o pai. “Na erva não, Dorival, nossa filha não fuma nada”, rezava a Deise. Quando fez trinta, a Gabriela acordou, tomou banho, vestiu uma calça que cobria a tatuagem de “paz e amor” na canela e passou um pouco de base para cobrir a marca de furo do antigo piercing que tinha nos lábios; indo para a terceira faculdade que começara e que pretendia largar, assim como as outras, ela pensou: “ah, quando era adolescente, eu bem sabia o que eu queria”. Queria era ser jovem.

Aperte A para reiniciar o jogo; B para salvar bem onde parou


Não cabe na

gaveta Mariana Ribeiro

Migrações constantes entre grupos dificultam a rotulação de jovens

A que tribo você pertence? Se você nunca utilizou, com certeza ao menos já ouviu essa frase. O termo “tribo” é muito usado para designar agrupamentos de pessoas que se diferenciam por gostos ou características estéticas comuns. Sua propriedade, entretanto, vem sendo discutida e aparentemente foi refutada pela maioria dos pesquisadores e até pelos membros desses supostos grupos. O termo surgiu no final dos anos 80 em um momento em que o discurso do “individualismo total” era bastante forte. A antropóloga Rita de Cássia explica que naquele momento pairava um pensamento de que, dali para frente, não existiriam mais pensamentos coletivos e cada um agiria por si mesmo. O sociólogo Michel Maffesoli usou o termo pela primeira vez para negar essa tese e mostrar que as pessoas ainda buscavam sua identidade por meio de convívio em comunidade. O contexto histórico teve participação fundamental nessa classificação, já que a juventude só passou a ser reconhecida como segmento de público após a Segunda Guerra Mundial. Rita explica que apenas a partir década de 50 os jovens passaram a ser considerados criadores e consumidores, seja de ideias ou de mercadorias. Nesse processo, Elvis Presley e James Dean viraram ícones de um público que não era antes considerado pela sociedade como um gru-

po de características próprias. Nos anos 60, os movimentos de contracultura vieram consolidar a capacidade dos jovens para organizar e contestar valores tradicionais. Nas décadas seguintes o punk, o gótico, o hip hop, só para citar alguns exemplos, foram movimentos expressivos próprios da juventude. Para Rita, a terminologia parou de fazer sentido no início da década de 90. Os grupos tornaram-se menos homogêneos, menos institucionalizados e desvinculados de partidos políticos. A efemeridade passou a ser maior, as características estéticas menos marcantes e a transição de pessoas por diferentes grupos passou a ser muito maior. O geógrafo Renato Cavalcanti explica que o momento histórico até o início dos anos 90 contribuía para a segmentação dos jovens em grupos que os diferenciassem da multidão; “o contexto era o da Guerra Fria, das ditaduras na América Latina, no Brasil tínhamos uma ditadura bastante violenta. Existia uma questão ideológica que envolvia os movimentos, uma parte da juventude tinha consciência da situação e queria a transformação”. A partir de então, ficou mais difícil observar as delimitações entre os grupos, as características estéticas se confundiam e as pessoas passaram a transitar mais por diferentes grupos, sem, muitas vezes, se declararem pertencentes a apenas um.

O sonho acabou? Mariana Ribeiro

Mudança dos movimentos estudantis preocupam pela aparente desmobilização

Desentorpecendo a Razão (DAR)... E defende que é uma outra forma de fazer política: “ para quem está fora, pode parecer apenas uma carnavalização ou teatralização, mas essa é uma forma de expressão com muita profundidade. O fato de esses movimentos não serem ligados a nenhum partido político, no entanto, causa muito incômodo nos que vêem a política de maneira institucionalizada”. A pesquisadora vê essa mudança como um processo de continuidade temporal natural; “a pós-modernidade influencia os movimentos, a velocidade, o fluxo, a volatilidade. As pessoas circulam por vários grupos, incorporam vários valores e constroem sua identidade a partir dessas múltiplas experiências”. Mas, sendo o termo “tribo” correto ou não, a questão da juventude é muito mais complexa do que a terminologia. Como observa Rita: as identidades são múltiplas, com uma dinâmica muito mais acelerada que a de uma gaveta. Marcha da Liberdade é um dos movimentos organizados por jovens

Vinícius Garcia

A dificuldade de classificação dos jovens e a perda do caráter institucional de seus movimentos intensificaram a discussão sobre sua perda de identidade e capacidade de contestação. Renato defende que “com o fim da Guerra Fria e a globalização, os movimentos de transformação pela via ideológica perderam força. Esses grupos estão muito relacionados à moda, ao que a mídia produz, ao que interessa à indústria do entretenimento, sem buscar uma transformação profunda da sociedade”. Rita, ao contrário de muitos estudiosos, não vê essa mudança como negativa. “Não acredito que a juventude seja menos mobilizada, muito pelo contrário”, defende. Para ela, os movimentos urbanos vêm gerando debates sobre temas que não são propostos pelo poder político, como mobilidade urbana, cultura e corrupção. É o caso da Marcha da Liberdade, do Circuito Fora do Eixo, do Movimento Passe Livre (MPL), da Bicletada, do

3


Mídia explora identidade dos grupos Vinícius Garcia

Meios de comunicação lucram mais com sucesso dos grupos sociais

Em número cada vez maior, os grupos sociais podem ser formados por vários motivos. Seja pelo modo de se vestir, pela música que se ouve ou pelo papel que cada um exerce na sociedade, é perceptível o surgimento e o rápido declínio desses grupos. Algumas vezes, nem chegam a criar identidade própria. Formados quase sempre por jovens que buscam se auto-afirmar, os grupos atuais conquistam um certo caráter de “moda”. O sociólogo Murilo César Soares afirma que “os jovens se reúnem em grupos porque estão ‘livres’ para se associarem a outros”. Além disso, Soares acredita que o casamento pode ser um divisor de águas entre a associação a um conjunto social e o futuro pessoal: “a união conjugal, o nascimento dos filhos, as responsabilidades da vida adulta devem trazer mais estabilidade à maioria dos jovens, fazendo com que se dediquem mais à vida doméstica, com menos energia e pouco tempo li-

vre para andar com os grupos”. Mas a mídia tem alguma influência nessa composição? Para Soares, a televisão, o rádio e a internet exploram esses grupos como potenciais consumidores: “os meios de comunicação podem ter os grupos como ‘mercado’ consumidor de produtos como discos, filmes, roupas e produtos de uso pessoal”. Por outro lado, a mídia divulga os ideais de um certo conjunto social e busca, por meio da visibilidade comunicacional, um maior contingente de indivíduos que se assemelham ao conceito de determinado grupo para venderem ainda mais os produtos que, geralmente, são estipulados pelo próprio meio de comunicação. O sociólogo ainda explica: “pode-se dizer que os meios de comunicação, ao focalizarem um grupo, dão visibilidade a ele e propagam-no, ao mesmo tempo em que reforçam a identidade dos seus membros ao se verem representados, por exemplo, em

Camila Takamune

4

p r o g r a m a s e r e p o r t a g e n s ”. A internet é um dos meios de comunicação que os jovens ligados a grupos sociais têm mais acesso. E é nesse meio que há uma democratização mais clara, como afirma Bia Granja, editora do site youPIX: “o ‘grupo da internet’ é democrático, tem todo tipo de gente. O que importa é estar online, consumir e produzir conteúdo. Esse é o berço, o princípio básico da cultura de internet”. Já Edison Veiga, jornalista do Estado de S. Paulo, afirma que na redação onde trabalha “não há preferência a um grupo social, ao menos deliberadamente”. Veiga ainda estabelece um caráter específico na relação entre a mídia e os grupos sociais: “acredito que hoje em dia haja publicações específicas para esses grupos, assim cada qual consome a publicação que tenha mais a ver com seus princípios. Dessa maneira a ‘mídia grande’ não deve privilegiar um grupo em detrimento de outro e é o que acontece no geral, salvo algumas raras exceções”.  Por outro lado, pode-se dizer que a influência dos meios de comunicação tem um caráter recíproco, além de não ter foco apenas nos jovens, como observa a pesquisadora Juliana Abonizio; “não vejo essa influência restrita às camadas jovens e tampouco considero essa influência uma rua de mão única, pois esses veículos também são influenciados pelos jovens que são ativos, criativos e podem dar sentidos diferentes aos produtos consumidos para além da intenção dos seus produtores”. A pesquisadora ainda acredita que a relação mídia-grupos jovens é duradoura “em razão de ser a esfera do lazer e não do trabalho”. Abonizio finaliza demonstrando um conceito utilizado erroneamente nos dias atuais: “o termo tribos urbanas é muito usado pela imprensa e usado no senso comum para se referir a agrupamentos juvenis contemporâneos, mas a sua utilização não é consenso entre os pesquisadores. Alguns dizem que o termo tribo é impróprio para ser utilizado nesses contextos”.


Mil grupos, mil tendências Moda jovem reflete múltiplas identidades e as tornam acessíveis no mercado

Amanda Tavares

“Não conheço nenhum grupo jovem que seja tão distinto a ponto de utilizar um visual que não possa ser encontrado nas publicidades de moda ou nas grandes lojas de departamentos”. É o que constata Elisabeth Murilho da Silva, cientista social especializada em juventude, moda e cultura urbana. Ela afirma que a moda é uma forma de referência para qualquer grupo etário, pois representa um canal de expressão de preferências culturais. A moda jovem começou, de fato, nos anos 60, inserida num cenário de rebeldia adolescente e

consumismo desenfreado. Finalmente, os jovens podiam comprar e usar roupas diferentes dos mais velhos, criando seu próprio estilo e identidade. A minissaia e as maquiagens marcadas foram as grandes pedidas das mulheres, que estavam cada vez mais despojadas e modernas. Os trajes unissex também fizeram muito sucesso. Nas décadas seguintes, a moda se tornou mais acessível e valorizada, principalmente pelos jovens. Nos anos 80, por exemplo, foram eles os responsáveis por ditar as tendências das roupas de ginástica e dos tecidos coloridos,

contrariando as peças largas dos anos anteriores. Hoje, são tantos movimentos, ideias, estampas e recortes usados por eles que é praticamente impossível traçar um estilo dominante. Com essa popularidade, o público juvenil se tornou um grande mercado fashion, recebendo mais atenção das indústrias. A moda passou a incorporar gradualmente o que as culturas jovens produzem, disponibilizando para as massas as peculiaridades de cada grupo urbano. Isso acontece, principalmente, devido ao grande número de adolescentes que não

desejam ser vinculados a nenhuma “tribo” específica, denominando-se ecléticos. Na contramão, os grupos jovens com estilos particulares procuram se diferenciar cada vez mais das tendências comuns, destacando-se nem que seja pela discrição. “Os grupos, ao serem ‘capturados’ pela indústria, abandonam suas antigas expressões identitárias, buscando novas formas de fugir do comportamento de massa”, explica Elisabeth. Assim, a moda jovem vai sempre se renovando, exatamente por causa dessa oposição entre o individual e o coletivo.

Música acompanha e influencia gerações Entoando ideologias, canções sempre ajudaram a construir a identidade dos jovens

Estevão Rinaldi

Que a música é influência direta na vida de muitas pessoas não é novidade. Música é arte, e já dizia Oscar Wilde: “a vida imita a arte muito mais que a arte imita a vida”. Ao longo dos anos, com o crescimento da cultura pop, a música foi responsável por auxiliar os jovens na escolha de sua própria identidade. O próprio conceito de Tribo Urbana talvez nem existisse se não houvesse a música, que é capaz de unir pessoas e compartilhar ideologias e sensações de forma inigualável. O contato com a música pode moldar inclusive a personalidade de um jovem, que, por vezes, rebela-se contra seu próprio estilo de vida. Passa a contestar aquilo que vem das gerações anteriores justamente porque o que seus artistas preferidos têm a dizer faz pleno sentido para ele. Uma verdadeira revolução interior. Ao longo do século passado, diversas manifestações de cunho político e cultural também foram impulsionadas pela música.

É impossível imaginar, por exemplo, a contracultura e o movimento Hippie sem uma trilha sonora, pela qual era possível se manifestar de maneira direta, simples e chamativa. No panorama atual, porém, a música pop perdeu muito de seu teor ideológico, pelo menos na opinião de Neto Rodrigues, editor do portal “Move That Jukebox”, da MTV. “Independentemente de qual seja a influência, pouquíssima parte dela é ideológica. A politicagem de um Bob Dylan, por exemplo, sumiu com o tempo”. Neto ainda critica a futilidade e a baixa qualidade musical de muitas bandas de hoje: “No Brasil, por exemplo, o que se vê é uma influência muito mais baseada na vestimenta e na moda. Qualquer som de quatro acordes já agrada ao público facilmente”. Para o blogueiro, movimentos como o Grunge, que ganhou força no início dos anos 90 com as bandas Nirvana, Pearl Jam e Alice in Chains e revolucionou o cenário musical da época, também não

devem se repetir. “O que aconteceu naquela época é algo único e, apesar de ter deixado marcas profundas na cultura pop, não vejo no

contexto atual uma situação para que um movimento como esse ocorra novamente”, afirma Neto Rodrigues.

Para assistir: O nascimento do movimento punk no país em “Botinada, a origem do punk no Brasil” (2006), de Gastão Moreira. “Quadrophenia” (1979), de Franc Rodmman, relembra os Mods dos anos 50 e a rivalidade entre tribos. Conversíveis rosas dão o ar da graça em “As Patricinhas de Beverly Hills” (1995), de Amy Heckerling. Somente paz e amor no documentário “Woodstock” (1970), de Michael Wadleigh. A fúria e a ideologia skinhead em “Skinhead: a força branca” (1992), de Geoffrey Right.

5


“Eu quero uma pra viver” A identidade do jovem depende do mundo. E de seu mundinho, é claro

Marcela busch

Esq. p/ Dir.: Edgard, Felipe, Gabriele e Mirele antes de bater o sinal Mariana Ribeiro

Madame Cotinha, 56 anos, socialite. Vida difícil, muitas preocupações. Arrecadar dinheiro para o baile beneficente, arranjar horário para manicure entre os apontamentos de tingir os cabelos e de tirar as sobrancelhas. E o filho, que se veste de preto, pinta os olhos de preto e adora seu gato preto. Madame Cotinha não sabe o que fazer. Vai à escola e conversa com os diretores; sai de lá meio confusa, afinal, é dito que é normal os adolescentes buscarem suas identidades em grupos específicos. Isso que disseram para Madame Cotinha é a mais pura verdade. A psicopedagoga e orientadora de uma escola particular em Campinas, Mariza Nascimento, afirma que jovens e adolescentes se reúnem em grupos para se afirmar; “existem grupos que se juntam por se identificarem uns com os outros e têm objetivos comuns. Há alguns que se caracterizam como emos, “patricinhas” e outros que se agrupam por gostarem de tocar violão, algum tipo de música ou atividade física”. Adultos também se relacionam por seus gostos particulares; a psicóloga Maria José Kuntz diz que “é comum que exista a procura, por conta da necessidade do indivíduo se auto-afirmar perante si mesmo e a sociedade”. A identidade pessoal é refletida no meio

6

em que se vive. “As crianças são o reflexo de sua casa, o adolescente é o reflexo da mídia e das influências de moda e música e o adulto é o reflexo do que a sociedade espera dele”, ressalta Maria José, lembrando que “é por esse motivo que as crianças repetem e os adolescentes se distanciam dos pais”. É na escola que os grupos costumam se formar e crescer. E também é nesse ambiente que às vezes há atritos entre os diferentes grupos. Mariza diz já ter presenciado alguns desentendimentos e que é comum e importante que a escola interfira: “a mediação dos adultos na Escola, nas situações de conflitos entre as crianças/adolescentes/jovens possibilita uma reflexão a respeito dos sentimentos entre eles e favorece encaminhamentos adequados. Esses procedimentos contribuem para o autoconhecimento e a formação da personalidade moral dos mesmos”.

porém, não é uma diferença que se meça por cores, cabelos ou músicas, mas sim por diferentes ideais. Na escola estadual Dr. Luiz Zuiani, em Bauru, Mirele Ramalho, 18 anos, diz que no período em que estuda, noturno, não há muita divisão por conceitos pré-estabelecidos, que muito da formação de grupos ocorre em função dos bairros. “Você conhece as pessoas dependendo de onde elas moram. Na escola, a gente se junta mais por causa dos bairros mesmo”, diz. Edgar Santos, 18 anos, conta que no período da manhã, onde os alunos são mais novos a separação é maior: “algumas meninas vêm de salto, tem os ‘manos’, que são bem fechados...”. Felipe Ramos, 18 anos, acha que muitos que não gostam dessa divisão tão delineada vão para o noturno. Para ele, os mais velhos gostam de se integrar mais. Segundo os alunos, os grupos Quando bate o sinal escolares não são mais levados para fora do portão. “As pessoas No intervalo das aulas, trabalham, tem outros comproacontece o maior encontro de dimissos e outros amigos, de escoferentes gostos, cores e opiniões. las mais antigas ou vizinhos, que Tanto no sistema de educação parcresceram juntos”, aponta Mirele. ticular quanto no público é possível A rivalidade não acontece observar essa grande diversidade;

mais dentro dos muros das escolas. Edgar afirma não haver brigas: “muito difícil o pessoal se ‘pegar’ aqui na escola, não rola mais isso. Acho que os jovens estão mais tolerantes”. Embora os grupos não sejam mais rivais, o preconceito ainda não “mata aula”. Gabriela Vereda, 17 anos, conta um episódio tenso ocorrido na escola: “duas pessoas da minha classe brigaram muito feio, um menino e uma menina. Ela é racista, ele é negro. Não deu certo, né?”. Realmente, não deu certo e eles tiveram de ser separados. A menina não levou nenhuma advertência para casa.

Para acessar: Encontre sua tribo online: Spiner - www.spiner.com.br Saiba tudo sobre o universo feminino... e geek: www.garotasgeeks.com


LINHA DO TEMPO ANOS 50

Greasers/Rockers No contexto pós-guerra, jovens ingleses da ascendente classe operária sofreram forte influência da música e cinema norte-americanos, além do Rock’n roll de Elvis Presley, Chuck Berry e Jerry Lee Lewis. O estilo era composto por jaquetas de couro, calças jeans, botas e topetes moldados com brilhantina. Também eram adeptos da motocicleta.

Mods Diferente dos rivais Rockers, eram jovens da classe média britânica, obcecados por tendências da moda e estilos musicais vanguardistas, como o Soul, Ska e Bluebeat. De vida social agitada, se reuniam em pubs para dançar e ouvir música. The Who e The Kinks, em suas fases iniciais, foram bandas influenciadas pelo movimento.

ANOS 60

Skatistas Na falta de ondas, surfistas californianos da década de 60 inovaram colocando rodinhas em suas pranchas. O movimento cresceu e foi muito além do skate, influenciando o estilo de vida de jovens, tanto no vestuário quanto na música, que abrange desde o Hip-Hop até o Punk Rock.

Hippies Movimento símbolo da contracultura nos anos 60, trazia ideais pacifistas e era praticamente apolítico. Rejeitavam o conservadorismo da classe média ocidental e eram adeptos à liberdade sexual e ao uso de drogas como forma de expansão mental. Gêneros como Rock Psicodélico (The Doors, Jefferson Airplane, Janis Joplin) e Folk (Bob Dylan, Neil Young) era as grandes influências musicais. Vestiam roupas velhas e simplistas em oposição ao consumismo.

ANOS 70

Hip Hoppers Iniciado nos subúrbios de grandes centros afro-americanos, latinos, jamaicanos e norte-americanos, o Hip-Hop é, até hoje, um dos movimentos mais fortes em todo o mundo. Seus adeptos têm como costume o uso de gírias e camisas largas, correntes e bonés. O Hip-Hop é influenciado por diversos gêneros musicais como Rap, Ska, R&B, Disco e Blues falado. O Grafite e a Break Dance são exemplos de artes influenciadas pelo movimento, que tem como grandes nomes Afrika Bambaataa, Grandmaster Flash, Public Enemy e Tupac Shakur.

ANOS 80

ANOS 90 Clubbers Apareceram com a popularização das discotecas e da música eletrônica nas décadas de 80/90. O grupo não é engajado socialmente e as principais influências musicais envolvem os gêneros Techno, Jungle, Trance e Trance Psicodélico (Psy), House e Trip Hop. Os adeptos adotam um estilo estravagante e eclético, com muitas cores e pulseiras. Atualmente, os maiores pontos de encontro do grupo são as Raves e clubes de dança.

Otakus Termo japonês usado para designar um aficionado por um tema qualquer. Porém, a palavra é geralmente utilizada para caracterizar fãs de Anime e Mangá, que influenciam fortemente o estilo do grupo.

Punks Surgido como um estilo musical na cidade de Nova York em meados dos anos 70 com os Ramones, o Punk casou perfeitamente com os valores da sociedade britânica decadente da época. A juventude inglesa o adotou e o transformou em um movimento cultural, social e ideológico. Inicialmente apolítico, mais tarde associou-se ao anarquismo. Cabelo moicano, calças rasgadas, jaquetas com alfinetes e tênis surrados ou coturnos são a marca do movimento.

Góticos É uma subcultura que apareceu no Reino Unido, no final da década de 70. É considerada um estilo de vida por seus integrantes. Tem como influencias musicais Pós Punk, Gothic Rock e o Ethereal Wave, os temas abordam o sombrio e a decadência. O visual envolve maquiagem e roupas escuras e cabelos despenteados. Grunges O Grunge é uma vertente do Rock originada em Seattle, por bandas como Nirvana, Pearl Jam e Alice in Chains e ganhou muitos adeptos no início dos anos 90. Abordava temas como angústia, apatia e desejo de liberdade. O visual é “largado”, com roupas simples e baratas, já que não se preocupavam com a moda.

ANOS 2000

Emos É uma abreviação para Emocore, vertente surgida na década de 80. Porém, atingiu seu auge no início e meio dos anos 2000, ganhando muita força com bandas como Good Charlotte, Simple Plan, Fall Out Boy e Panic! At the Disco, consideradas Emo-pop. De comportamento emotivo, os adeptos abusam da maquiagem, além de usar franjas, cabelos coloridos e acessórios xadrez.

Coloridos Agregando características do New Wave (gênero musical forte nos anos 80), é um movimento teen que ganhou força no Brasil a partir de 2009, com as bandas Cine e Restart. Os Coloridos são conhecidos pelos e por idolatrar seus ídolos excessivamente. O visual, extravagante, vai da franja nos cabelos até as calças coloridas.

7


Laboratórios de Metrópoles oferecem condições para a criação dos movimentos juvenis

São Paulo. 11 milhões de habitantes. Famílias tradicionais, famílias sem pai, famílias com dois pais, famílias sem pai nenhum. Famílias católicas, protestantes e judias. Indivíduos sem família. Trabalhadores assalariados e desempregados. Racheiros, rockeiros, skatistas, funkeiros e skinheads. E a metrópole é o encontro de tudo isso. As grandes cidades são os cenários das manifestações juvenis, os ambientes onde se lançam ten-

ideais

Mariana Ribeiro

dências e são movimentos culturais e políticos. Para a antropóloga Rita Alves, os centros urbanos dão mais liberdade ao indivíduo. As instituições tradicionais, como a família, a igreja e os partidos políticos vão ter menos influência sobre a formação do jovem e cobranças sobre suas decisões são amenizadas. “A cidade permite que o indivíduo circule anonimamente pelas ruas, que seja, por exemplo, uma pessoa de dia e outra à noite”, explica.

A movimentação pela cidade permite ao jovem novas experiências e a convivência todos os dias com o diferente. A transição por diversos grupos e o intercâmbio de ideias são condições para a organização de movimentos propriamente juvenis. Eles se diferenciam dos tradicionais. “Nas grandes cidades nós encontramos todas as características necessárias para que o jovem batalhe sua própria identidade”, completa Rita.

A relação dos jovens do interior com a cidade é bem diferente das encontradas nos grandes centros urbanos. Não existe um local específico para cada tribo. Isso leva a uma convivência relativamente pacífica entre todas. A cultura urbana chega ao interior pela mídia, mas não encontra o mesmo ambiente para ser aplicada. Isso provoca formações de identidades contaminadas por várias influências. Skatistas que são emo e escutam rock são facilmente encontrados pelas ruas das cidades. Ou, então, inimigos vorazes como punks e skinhad convivendo em aparente harmonia. Segundo Isaac Benici, 19 anos, que se considera da tribo do hip hop, faltam iniciativas da prefeitura para a organização de mais atividades culturais. Ele afirma que os “bailes black” que ele e seus amigos gostam de frequen-

tar raramente acontecem e quando ocorrem são organizados por ele ou pelo movimento Hip Hop. A vivência dos jovens com pessoas de outras tribos é saudável, aconselha Marcelino Brandão, skatista, hoje com 34 anos. As tribos segregam muito os jovens, acredita. Hoje, apesar de andar de skate, não se considera parte de uma tribo específica e convive bem com amigos que não compartilham as mesmas preferências. Segundo a pesquisa da IFDM, Bauru é a décima terceira melhor cidade para se morar, mas não se leva em consideração a produção cultural para jovens. Os shoppings continuarão sendo o principal espaço de lazer e, por conseqüência, os únicos pontos de encontro dos jovens de todas as tribos, até que criem mais opções de lazer para adolescentes.

Opinião Pablo Marques

8

Pablo Marques

O P Ç Ã Ú ON I C A

O interior de São Paulo vive uma carência cultural para o público jovem. Não existem opções de entretenimento, os shopping centers representam a única opção de lazer. O contato do jovem com a cidade em que vive ocorre na adolescência, mesmo período em que é formada a sua identidade. Nas grandes cidades é comum grupos de jovens de diversas tribos se encontrarem em determinados locais para compartilharem ideias e gostos semelhantes. Na cidade de São Paulo, a Galeria do Rock reúne roqueiros de toda a região metropolitana para escutarem música ou discutirem qual é a melhor banda de todos os tempos. Espaços como esse são raramente encontrados nas cidades do interior paulista, como Bauru. A vivência em grupo ocorre principalmente nas escolas. Fora delas, os adolescentes convivem com os amigos dentro de suas casas. De acordo com Renan Médici Penteado, 20 anos, o único ponto de encontro da cidade é o shopping nos dias em que o cinema é mais barato ou nas sextas, depois das aulas. Por isso o público jovem nesses dias costuma ser tão heterogêneo. As cidades próximas a Bauru também sofrem desse mal. Jéssica Gonçalves de Oliveira, 17 anos, moradora de Arealva, afirma que a única opção de convivência, além das escolas, são as praças onde todos costumam marcar encontros.

Bauru Shopping é um dos únicos pontos de encontro dos jovens da região


Coloridos, uma tribo volúvel

Tendência do momento, os coloridos já estão fadados ao fim A denominação “colorido” foi criada pela mídia para classificar a febre das bandas de happy rock que dominaram o cenário nacional em resposta a uma das maiores tendências dos anos 2000, a moda emo. As bandas Cine, Hevo 84, Replace e Restart são as principais representantes do estilo. O termo se refere às roupas usadas pelas bandas e, em consequência, pelos fãs. Camisetas, calças skinny, tênis e acessórios chamativos ganharam as ruas e os adolescentes do fim dos anos 2000. Viviani Nogueira, 14 anos - criadora do perfil @family_restart com mais de 129 mil seguidores no twitter - define o estilo: “é um som alegre, contagiante, que faz você se divertir com a galera e a roupa colorida meio que combina com o som vibrante dessas bandas”. Mesmo tão recente, essa tendência já está fadada ao fim. Os precursores do movimento como a banda Cine abandonaram aos poucos o estilo. A Restart, maior representante, apareceu com dourado, preto e prateado no seu novo trabalho “Geração Z” prometendo um som futurista.

Tribos

urbanas

Ludmylla Rocha, Luís Morais, Luiz Barbiéri e Pablo Marques

Os nerds mudaram

Já foram os “excluídos”. Hoje são a tendência

“Muito inteligentes, mexem bem em computadores, tem medo de conversar com garotas”. Há alguns anos, essa frase era frequentemente designada aos “nerds”. Severamente estereotipada, hoje esse preconceito parece finalmente estar saindo da cabeça das pessoas. “Agora tá começando a tudo ficar no seu devido lugar”, conta o programador Ivan Ozores. “Quando contava que jogava Doom, as pessoas já ‘sabiam’ como eu era. Agora sabem que é somente um Funk carioca: mania nacional passatempo”, observa. Popularizado nos anos 80, o funk já chegou às rádios europeias A mudança é tão significativa que até o nome mudou. Agora não é mais “nerd”, e sim “geek”. E por mais que venha de um sentido Apesar do nome, o funk nacional mais conhecido como funk carioca nada tem negativo, a nomenclatura começa a ter mais adjetivos bons ao seu a ver com o movimento dos anos 60 que se une ao jazz, soul e R&B. redor do que ruins. “Hoje ser nerd tá na moda”, conta o estudanNascido no Rio de Janeiro, na década de 80, foi a batida do Miami Bass mistu- te Diogo Leal. E talvez esteja mesmo. A chegada da “geração 2.0” rada a letras nacionais que gerou o novo ritmo. Tendo se destacado nas comu- - como é dito nos blogs de tecnologias – fez com que mais e mais nidades periféricas, associado ao tráfico e as brigas de galeras da década de 90, pessoas queiram usufruir das máquinas, principalmente do computajá começou sendo menosprezado por outras parcelas da população. dor e da internet. E sem medo de serem taxadas de algo por isso. Nos anos 2000, novelas aderiram ao funk em suas trilhas sonoras e ajudaram na divulgação nacional junto ao sucesso Furacão 2000, inclusive fora do Brasil. Apesar de ter se espalhado pelo país e sido declarado movimento cultural e musical pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro em 2009, Fernanda Ferreira, estudante de16 anos e frequentadora de bailes funk, reclama que ainda hoje há muita desconfiança em relação ao gênero e que já sofreu com isso. Mesmo assim, explica porque gosta do som: “o funk é um ritmo alegre e dançante e fala dos temas da nossa realidade”. A força do Hip Hop Rap e dança de rua alavancam o estilo, que já figura entre as “tribos” com maior número de adeptos no Brasil

O berço do Hip Hop brasileiro foi a cidade de São Paulo, onde começou a se “multiplicar” a partir de 1980. Com influências de filmes como Flash Dance, e de consagrados artistas como Michael Jackson, que com passos como o back-slide popularizaram a dança de rua, o Hip Hop cresceu e hoje está entre as seis tribos com maior número de adeptos no país. As outras são as dos Ecléticos, Surfistas, Clubbers, Roqueiros e Esportistas. O projeto “Acesso Hip Hop”, na cidade de Bauru, é um exemplo do esforço dos membros dessa “tribo” para manter vivo o ideal do movimento. “O Hip Hop nasceu no cenário urbano. Trata, na maioria das vezes, de temáticas das periferias das cidades de médio e grande porte”, observa Sérgio Segal, participante do projeto. Ele destaca que, musical“A gente vai para a balada como se fosse gente morta” Os góticos andam pelas ruas como mórbidos:roupas pretas e maquiagem carregada mente, “o Hip Hop já é música popular, e tem se tornado cada vez mais pop. O interessante é que ainda assim, sendo O movimento gótico, começou nos anos 70 no Reino Unido, é uma tribo que surgiu mais comercial, é um movimento de resistência, conscienno período pós-punk. Chegou no Brasil nos anos 80 e recebeu a denominação Dark. tização, e de grande importância social nas periferias das Os integrantes desse grupo costumam ter um visual sombrio composto pela cor preta, cidades”. por maquiagens e por cabelos desfiados e desgrenhados. É marcado por uma referência literária e filosófica associada ao niilismo e ao hedonismo. Sônia Aparecida da Silva, 25 anos, pertence a tribo dos góticos desde os 13: “ Eu gosto de música gótica do final dos anos 70, início dos anos 80 como o death rock e vou para a balada como se fosse gente morta, a cara com bastante maquiagem mais clara parecendo filme de terror mais antigo”. Sônia afirma que os góticos sofrem preconceito por ter um visual pouco comum e podem ser confundidos com outras tribos que utilizam o preto no vestuário, como os punks e os skinheads, mas costumam ter uma postura menos agressiva e uma aparência mais depressiva.

9


Entrevista Bruno Marise

O escritor e estudante de sociologia, David Vega tem 22 anos e durante dois foi membro de um grupo skinhead social-nacionalista, uma das vertentes mais radicais e polêmicas do movimento. Toda a experiência de David como “careca” foi relatada no livro Cadarços Brancos, lançado em 2010. Confira nessa entrevista exclusiva.

Conecte: Como foi a sua entrada Conecte: Tem alguma coisa época que você sente falta? no movimento Skinhead?

da

ficou desiludido?

David: Não teve nenhum acontecimento específico, eu realmente não estava mais afim. Hoje já mudei minha cabeça, mas na época quando saí, continuei com a ideologia, eu só não queria mais fazer parte e nem defender grupo nenhum. As ideias começaram a perder o valor pra mim, e tempo depois eu comecei a ler bastante sobre outras ideologias que antes eu só pesquisava com o intuito de criticar, e passei a extrair o que tinha de bom em cada uma delas, como continuo fazendo até hoje. Não fico mais restrito apenas a uma ideologia e defendendo-a até a morte.

10

Conecte: O

que leva um adoles-

cente a aderir a uma tribo é a busca por uma identidade?

David: Tem um pouco disso também, mas no caso do grupo de que participei, a maioria entrava porque gostava mesmo e tinha aquela vontade de mudar o mundo. Essas coisas são muito atraentes para um jovem, fazem ele se sentir importante. Qualquer um ali dá muita importância. Às vezes nem ligam muito pra ideologia, até simpatiza com ela, mas o verdadeiro motivo de entrar no grupo é alguma carência, algum vazio na vida.

rivalidade entre ski-

nheads e punks já vem desde sua origem na Inglaterra, ou no

Bra-

sil, por exemplo, ela existe mais por ganguismo?

David: Sempre existiu uma rivalidade, o problema é que hoje existem muito segmentos. Basicamente falando, os punks são anarquistas e os skinheads são nacionalistas, e alguns são social nacionalistas, conhecidos como neonazistas. Mas, desde que o movimento skinhead surgiu existe essa rivalidade, ideológica ou não, às vezes por visual, uma coisa de

grupo mesmo. Existiram na história alguns segmentos de grupos opostos, que tinham alguma ideologia em comum, como os anarco-punks e skinheads comunistas e anarquistas que acabaram se unindo. Aqui no Brasil, principalmente em São Paulo, a tendência tem sido essa, de união dos grupos. Antigamente elas eram bem raras, mas têm crescido bastante e acabam se formando gangues maiores. Antes eram várias menores, que em sua maioria era de uma molecada desocupada, mas agora o negócio tá organizado, tem uns movimentos verdadeiramente engajados, com uma base política forte. Acervo pessoal

David: Quando se é adolescente, você não tem muita responsabilidade e ainda mais num grupo desses, onde querendo ou não você fica livre pra fazer o que quiser, xingar quem dá vontade. É uma liberdade que depois da vida madura não existe, se você continua fazendo acaba indo para o lado criminoso. Um fator interessante desses grupos é que têm um código de conduta muito forte, um verdadeiro código de honra. Têm pessoas que você nem conhece, nem é amigo, mas existe um respeito muito grande, por todo mundo ter um pensamento igual. Mesmo você não conhecendo direito a pessoa, passa a defendê-la até a morte e ela faz o mesmo por você. Isso é uma parte boa do movimento. Mas Conecte: Como aconteceu sua em compensação, essa conduta só saída? Mudou de ideia de repente, existe entre as pessoas que fazem parte do grupo. David: Eu sempre gostei de história, e cresci numa família com descendência espanhola, onde inclusive meu avô lutou na guerra civil espanhola, e eu sempre gostei dessa parte, principalmente do lado nacionalista, fascista e comecei a ler bastante sobre o assunto. Quando cheguei à adolescência, comecei a defender isso, e por consequência conheci pessoas que faziam parte do movimento, e acabei entrando. Fiquei dos 16 até os 18 anos. Depois de um tempo comecei a não ver mais propósito em tudo aquilo, fui morar fora, tive contato com outras culturas, e não via mais um porque em toda aquela ideologia.

Conecte: A


Conecte: Existe mesmo uma conotação política, ou a maioria dos grupos tem como objetivo a violência, o vandalismo? David: Depende, existem alguns grupos que não necessariamente são violentos, mesmo com um discurso mais conservador, mas que repudiam o ganguismo e buscam realmente um ativismo político, sem violência. Porém, geralmente os casos de violência se dão entre molecada mesmo. A ideologia vira só pretexto.

Conecte: Como você vê a cobertura da mídia em casos de violência ligados aos skinheads?

David: O problema é que a mídia não trata muito do assunto, e quando trata é baseada apenas em algum caso mais pontual, e os grupos acabam sendo associados só à violência. Porém, esses grupos também têm sua parcela de culpa, pois não colaboram para se ex-

pressar de uma maneira diferente. Claro que é complicado, porque eles são perseguidos, é difícil defenderem suas ideias abertamente em um país onde a constituição não permite. Mas eles poderiam expressar seus pensamentos através de blogs, textos e tentar mudar o pensamento dos demais acerca do movimento. E quando um repórter tenta entrevistar alguém de um grupo, a pessoa se nega. Os poucos que aceitam falar acabam querendo demonstrar poder, são arrogantes e aí todo mundo acaba se posicionando contra. E quando a mídia não está bem informada e retrata - até por causa dos próprios membros, por se manterem quase na clandestinidade - acaba se baseando só na violência.

Conecte: Existe diferença e gangue? Qual é?

entre tribo

de pessoas com um pensamento igual, com roupas iguais, que cultuam uma ideologia em comum. Já as gangues estão relacionadas ao crime. Até a própria palavra têm uma conotação agressiva, que remete aos gângsteres.

Para ler: “Tribos Urbanas, você e eu – conversas com a juventude”, Wilma Regina Alves da Silva. Paulinas, 2009 “Retratos de uma tribo urbana: rock brasileiro”, Almerinda Guerreiro. Centro Editorial e Didático da UFBA, 1994.

David: A tribo não necessariamente está ligada à violência, é uma união

Conflito de Ideias

Bruno Marise

Devido à multiculturalidade, ideologias diferentes e influências bastante diversas, as tribos urbanas tendem a ter conflitos entre si. Alguns já são históricos e registram casos de violência e muitas manchetes na mídia. O professor da USP Arthur Laura, com doutorado nessa área, acredita que a violência derivada das tribos existe há muito tempo, mas que atualmente são esporádicos e bastante específicos. Ele também afirma que o termo está um pouco desgastado, pois antigamente esses grupos tinham um ponto de encontro, uma verdadeira convivência e frequentavam os mesmos lugares, e agora tudo se tornou predominantemente virtual, o que perde a caracterização de “tribo”, e a definição mais correta é a de “performance”. Talvez a rivalidade mais grave e que mais se destaque é entre os Punks e Skinheads Comunistas e Anarquistas e os Skinheads Neonazistas. O movimento Punk surgiu no final da década de 70, derivado do Punk Rock, estilo musical que prezava por tirar todos os

excessos do Rock, e simplifica-lo ao máximo, resgatando o frescor e energia das décadas passadas. O gênero, nascido nos Estados Unidos com os Ramones, se espalhou e fez enorme sucesso na Inglaterra, onde o estilo musical ganhou proporção de movimento político, cultural e ideológico, geralmente de contestação social e com uma guinada para a esquerda e até o anarquismo. Já o movimento Skinhead, ao contrário do que pensa a grande maioria, não tem sua origem em ideais Neo Nazistas. Ele nasceu no final da década de 60 na Inglaterra, devido á união de operários britânicos com imigrantes jamaicanos, que cultuavam a virilidade, o futebol (que daria origem aos hooligans) a cerveja, e o ska e rocksteady, (estilos precedentes do reggae) além de serem totalmente apolíticos. Essa vertente ficou conhecida como Tradicional. Dessa cultura, surgiram vários segmentos, mais influenciados pela política, como os RASH, abreviação de Red and Anarchists Skinheads (Skinheads comunistas

e anarquistas) e os White Power, esses sim com ideais nacionalistas, homofóbicos e neonazistas, também conhecidos como boneheads. A última, totalmente conservadora acabou entrando em conflito com os ideais políticos dos Punks e Skinheads anarquistas e comunistas, que tem uma maior aproximação. E a violência, sempre esteve presente nessa briga. Mesmo sendo uma cultura estrangeira, no Brasil existem inúmeros casos de violência entre essas duas facções que ficam muito famosos na mídia, a mais recente ocorreu no mês de setembro, em São Paulo, onde um grupo de Skinheads anarquistas e punks enfrentou Skinheads neonazistas em uma violenta briga que resultou na morte de um jovem, e vários feridos. Arthur defende que casos como esses são pontuais, e que a violência no mundo das tribos se dá mais contra órgãos de repressão como a polícia, e que mesmo assim, atualmente são muito menores, já absorvidos pela sociedade.

As rivalidades entre os grupos urbanos de jovens foram inevitáveis. Mas será que elas ainda existem?

11


QUADRINHO Pedro Hungria

TESTE E você? Com qual tribo do passado você mais se identifica? Descubra agora no nosso teste!

1– Qual lugar você gostaria de frequentar? a) sorveteria b) uma campina florida 4– Qual seria seu meio de transporte favorito? c) um beco escuro a) scootter d) o jockey clube da cidade b) carona c) a pé 2– Com que roupa você sairia? d) esportivo conversível a) jaqueta de couro e calça jeans 5– O que você faria para mudar o mundo? b) bata florida e sandália de dedo a) dividiria um milkshake gigante c) coturno e calça rasgada b) daria flores para policiais d) suéter de poliéster e meia 3/4 c) quebraria tudo e todos 3– O que você escutaria? d) compraria um mundo novo com o a) Chuck Berry, Elvis Presley e Buddy Holly dinheiro do meu papai b) Janis Joplin, The Doors e Grateful Dead c) Ramones, Dead Kennedys e Sex Pistols d) The Beatles, Beach Boys e Monkees Se você marcou mais... A: GREASER: Você deve vibrar no balanço do filme “Grease”. Milkshake é a melhor pedida pra qualquer hora do dia. Com uma jaqueta de couro ou um vestido rodado, a diversão é dançar muito rock’n’roll com a galera. B: HIPPIE: Tá tudo bem, tá tudo beleza, é tudo lindo! Essas seriam suas frases motivacionais, pois você seria um “ripongo” que adora festivais de música, ser desencanado e curtir uma “fumaça amiga”. C: PUNK: Se o seu resultado foi esse, você adoraria andar por aí com a sua gangue de moicano, roupas rasgadas e tocando o terror. Usar as bandas que ouve na camiseta e odiar o mundo seriam alguns dos seus passatempos favoritos. D: PREPPY: Provavelmente você adoraria passar uns dias em Palm Beach e fazer compras na Lacoste. Se você fosse preppy, não perderia um jogo de polo e passaria horas na beira da piscina do clube.

12


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.