Saiba como o grafitti vêm ganhando espaço nas ruas bauruenses
Entrevista:
Lucas Maia, membro do Enxame Coletivo, conta como é organizar eventos culturais em Bauru
A força do hip-hop regional e sua independência através da economia criativa
Diário Cênico: os relatos de um iniciante no teatro
Produzido por alunos de Comunicação Social/Jornalismo da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação - Unesp/Bauru Reitor
Reportagens
Julio Cezar Durigan
Jayme Rosica Sara Souza Vítor Peruch Lígia Maciel João Pedro Vallim Tauã Miranda João Vítor Reis Diego Felício Raphael Freitas Heitor Carvalho Jorge
Diretor da FAAC Roberto Deganutti
Coordenação do Curso de Jornalismo Juarez Tadeu de Paula Xavier
Professores Orientadores Ângelo Sottovia Aranha Tássia Zanini
Diagramação Sara Souza
Faculdade de Arquitetura Artes e Comunicação - Unesp Av. Eng. Luiz Edmundo Carrijo Coube, nº14-01 CEP 17.003-360 - Vargem Limpa - Bauru-SP
Índice Além da arte
Faltam palcos para bandas independentes
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As facilidades e dificuldades da cultura alternativa
Palco na calçada, arte na rua
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Conhecendo o teatro
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A sétima arte mais acessível e democrática
Um centro da cultura musical clássica no centro da cidade
O grito vem da rua
A arte retoma as origens libertárias
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Além da arte
Editorial
A necessidade de expressão humana buscou novos horizontes nos últimos tempos. Têm-se discutido muito sobre como devem ser tratados aqueles que grafitam muros ou que realizam apresentações em semáforos das grandes cidades do mundo. Afinal, qual seria a diferença entre expressão artística e vandalismo urbano? Qual a forma mais justa e correta de se definir a arte? As expressões culturais que acontecem todos os dias, das mais variadas formas, em ruas, becos e calçadas do Brasil e do mundo merecem mais atenção e cuidado? Devem ser consideradas obras de arte? Todas essas perguntas permeiam de discussões mesa de bar, até temas de redação para vestibulares e debates filosóficos. Poucas conclusões definitivas, no entanto, foram de fato alcançadas, mas o fato é que um tema complexo como esse precisa de distanciamento e, ao mesmo tempo, de aprofundamento para ser melhor compreendido e analisado. A arte desde sempre é a forma mais sincera de manifestação da criatividade humana. Não importa de qual modo seja produzida, sempre serviu como aquela que extravasa os sentimentos, a imaginação, e tudo aquilo produzido no nosso intelecto. O lúdico da arte é aquilo que nos salva da maçante rotina social que nos é imposta. Não podemos deixar de dar vazão a nossa imaginação. A arte pode ser definida como qualquer tipo de expressão comunicativa ou estética humana e pode ser feita de diversas maneiras, que vão desde a música, pintura, escultura, arquitetura, desenho, literatura, entre muitas outras áreas de interesse, além das várias subdivisões que compõe cada uma dessas formas artísticas. No entanto, não é apenas o que está restrito aos grandes centros culturais e museus que pode ser definido como arte. Todo ser humano tem uma capacidade artística nata e expressá-la faz parte da nossa natureza. É nesse ponto que entra a arte de rua, a arte “underground”, a arte alternativa, os movimentos artísticos genuínos, populares e, principalmente acessíveis ao grande público. O maior obstáculo enfrentado por esse tipo de arte é a falta de compreensão do que realmente é a arte, e a marginalização dela não só pela academia e pela mídia, mas também pela classe dominante. Neste momento de mudança social e tecnológica no qual estamos inseridos, a arte retoma
suas origens, voltando-se para a mais pura liberdade, fugindo de um estereótipo robótico na qual se encontrava. Pincéis viraram sprays, grandes gravadoras transformaram-se em itens dispensáveis, a economia criativa se mostra fortalecida, o palco não mais separa o público e o elenco de teatro, a produção de eventos culturais agora não mais está nas mãos de poucos. É justamente para mostrar essa mutação e provocar uma reflexão que resolvemos criar um suplemento que cobrisse a vida cultural popular da cidade e região de Bauru. Mais do que isso, aprofundar-se nesse tema é uma oportunidade para ajudar a definir o limiar que divide o crime e a degradação do patrimônio alheio, do direito de se expressar livremente e de exercer suas capacidades artísticas. Queremos mostrar que a cultura alternativa não diz respeito apenas ao conteúdo produzido, antes destinado a um público setorizado. Hoje ela se define pela forma de organização. Seguindo os princípios já anunciados na década de setenta pelo movimento “punk”, o lema é: “DIY, Do it yourself”, ou “faça você mesmo”. Entendendo por alternativo uma opção, uma resposta criativa diferente ao sistema, mais livre, fora do padrão e descentralizada. Preenchendo a lacuna deixada pelo poder público, a ideia da cultura alternativa hoje, é ocupar esse espaço vago, com um movimento no qual cada indivíduo é
um potencial expoente cultural. Propomos ainda que sejam refletidos os aspectos econômicos e as diversas melhorias sociais que essas expressões artísticas acabam por proporcionar à sociedade. O apoio à cultura alternativa ainda se faz necessário, e, além disso, é
preciso que as portas da mídia dominante sejam abertas, assim como a mente da população. Quanto ao público antes segmentado, a ideia principal dessa suplemento é apresentar essa nova forma de produzir cultura e expandi-la ao máximo, deixando assim a arte mais acessível e democrática. Devemos perceber que o que antes estava somente disponível em museus, casa de shows e teatros caríssimos, hoje pode estar disponível gratuitamente. As “telas” estão no passeio público, os shows, espetáculos teatrais, sessões de cinema e apresentações circenses estão nas praças, ruas e viadutos dos centros urbanos. Democratização da cultura é o ponto chave desse movimento. Entendemos que a descentralização e o fim do monopólio cultural é um passo em busca de uma melhora significativa na qualidade de vida dos cidadãos, além de ser uma forma estratégica de inclusão social. Portanto, deixe-se levar, sinta a arte adentrar a sua vida, a sua rotina. Insira um pouco de lúdico à sua mente, dê asas à imaginação, esqueça os problemas corriqueiros, e caso sinta falta de algo, faça você mesmo. Esperamos que ao final desse suplemento você se liberte de velhos conceitos e abra os olhos para o novo e impressionante mundo cultural.
Faltam palcos para bandas independentes
“Em Bauru, desde quando eu comecei, em 93, sempre houveram muitas bandas, e a maioria era de heavy metal” - Vinícius Nogueira
Há quase vinte anos, com alguns colegas de escola, Vinicius Nogueira formou a sua primeira banda, batizada de No Bones. Na época havia poucas bandas em Bauru e ter todos os equipamentos era luxo. Por necessidade, várias bandas começaram a se encontrar para ensaios coletivos. “A gente juntava, umas três ou quatro bandas pra ensaiar, um trazia o amplificador, o outro tinha o pedal, alguém tinha microfone e juntava tudo e uma banda ensaiava e as outras ficavam lá assistindo”, recorda-se Vinícius. Para começarem a fazer shows, arrumaram um barzinho chamado Pau Brasil para as primeiras apresentações.
The Almighty Devildogs, a banda de Vínicius Nogueira O sucesso foi tanto que toda semana eles se apresentavam, e cada vez mais bandas novas apareciam. “No bar que cabiam cem pessoas, a gente colocava quase trezentas”, conta, explicando que os shows só cessaram por causa de intrigas que começaram a surgir entre as
bandas. “As que se destacavam menos tinham ciúmes das mais bem apreciadas pelo público”, afirma Vinicius. Depois de tocar em mais algumas bandas, hoje com trinta e cinco anos, Vinicius é o frontman e guitarrista da Almighty Devildogs, uma banda instrumental de punk rock com surf music formada em 2003 e que já lançou duas demos e um CD. “É importante uma banda ter músicas próprias. Todas as bandas de que eu fiz parte tiveram as suas, porque você se destaca da maioria e dá orgulho de ver sua música gravada”, afirma o músico. O problema de espaço para apresentações solucionado com o então barzinho Pau Brasil, no início da carreira musical de Vinícius, ainda continua atrapalhando os músicos e bandas, principalmente iniciantes em Bauru, como Foto: Divulgação comenta o guitarrista: “a falta de espaço para shows ainda é o principal problema para as bandas de Bauru que estão começando. Existem muitas bandas novas, mas faltam lugares pra elas se apresentarem, e por isso muitas acabam. Show é o estímulo da banda, não basta apenas ensaiar”, lamenta.
João Pedro Vallim
Nas Universidades bauruenses também se formam várias bandas, mas a maioria delas são covers. Entretanto, algumas buscam compor suas próprias músicas e as apresentações ultrapassam as festas de repúblicas. A Projeto Homem Bomba é um exemplo recente. Formada em 2011, a banda começou tocando samba rock nas festas de repúblicas, mas agora mistura gêneros como rock, maracatu e o samba. “Ano passado, a banda surgiu para tocar no aniversário de uma amiga. Precisava de uma banda e a gente formou uma, o pessoal gostou e continuamos”, conta Diogo Azuma, percussionista do Homem Bomba. Em 2012, no Festival Canja, a banda lançou seu primeiro EP, “Consciência Leve”, com cinco músicas. “Conseguimos lançar o primeiro EP, já temos músicas novas, e no ano que vem nada mais justo do que lançar um CD”, afirma Diogo. Em dezembro de 2009, surgiu em Bauru o Enxame Coletivo, que é um empreendimento solidário de comunicação e cultura que usa ferramentas da internet e economia solidária para realizar eventos. Desde então, o maior circuito de cultura livre do país acontece por aqui – o Circuito Fora do Eixo. “Com o Fora do Eixo é possível trazer a cultura independente do Brasil afora para Bauru, colocando assim em contato artistas locais com os de fora e dar oportunidade paras as bandas locais se apresentarem. Além disso, elas também podem ir tocar em outras cidades, devido ao contato criado durante esses eventos. É uma confraternização de vários artistas”, conta Louise Akemi, que faz parte do Enxame.
As facilidades e dificuldades da cultura alternativa
Diretor do Enxame Coletivo fala sobre como é organizar eventos de cultura alternativa em Bauru Lucas Maia é o diretor do Enxame e cuida tanto da parte interna quanto da parte externa do colaborativo, ajudando a monitorar todos os meios de divulgação e de mídia. Ele, em entrevista ao Expressa, explica um pouco mais sobre a cultura alternativa em Bauru e seus respectivos ramos.
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Expressa: É possível explicar a cultura
alternativa existente? Lucas Maia: Eu tenho um pouco de receio em afirmar o que é cultura alternativa, eu acho que toda cultura é alternativa, o que a gente coloca é que essa cultura que não se enquadra dentro do iniciado, uma cultura que não se enquadra nos grandes veículos ou que não
Raphael Araujo e Diego Felício
tem certa repercussão que outros tipos de manifestações têm. Acho bem complicado explicar sobre cultura alternativa. É uma manifestação que não precisa de outros veículos, mas como tudo é cultura, acho que nem nós que somos chamados de underground estamos sabendo o que está sendo produzida, a gama de manifestações é muito grande.
Foto: Divulgação
Lucas Maia (à esqueda) afirma que a prefeitura tem resposta lenta aos pedidos do coletivo Cultura alternativa é a manifestação cultural que tem em diversas sociedades com vários grupos e diversas pessoas diferentes e não é tão vislumbrada. Acho que essa é a melhor definição de cultura alternativa.
E: Quais são os principais movimentos culturais alternativos aqui em Bauru? LM: Bauru é uma cidade que, desde que começou as atividades da ferrovia, é uma cidade de passagem. Então, Bauru é muito característico nessa mistura de culturas, a gente tem a galera da moda de viola, tem a galera da catira, tem vários pontos de terreiro aqui na cidade que é muito forte também. Esse lance da cultura negra tem também o hip-hop que há dez anos está se fortalecendo na cidade. A gente teve uma cena de punk, de rock que foi muito forte no período da década de noventa e inicio dos anos dois mil, mas que depois deu uma parada também. Então acho que Bauru guarda as características da maioria das cidades do interior do estado que tem um numero enorme de manifestações, mas no final acaba ficando preso nessa cultura de massa como o sertanejo, o pagode. Da região não tenho tanto conhecimento assim, mas as cidades tem Bauru como referência, principalmente as mais próximas como Pederneiras, Lençóis Paulista, entre outras. Já cidades como Botucatu, Jaú tem uma cena mais desenvolvida quando se diz respeito à cultura. Jaú, por exemplo, tem coletivo de artes cênicas, no domingo agora (04/11) estava tendo concerto de bandas independentes. Então eu acho por aí, a cultura alternativa de Bauru, não tem somente uma cultura alternativa, e sim uma junção de várias manifestações que foram agregadas durante o tempo. E: Você acredita que há espaço atual-
mente para essas manifestações culturais na cidade? LM: Espaço a gente conquista. Se não tem lugar a gente arranja um lugar, muitas vezes na nossa casa mesmo. Eu acho que infraestrutura da cidade para dar suporte a essas manifestações, para dar suporte para toda a galera que está produzindo assim e que tem muita coisa bem produzida. Às vezes não é nem questão de falta de espaço físico assim, é mais questão da burocracia ou do acesso a esse espaço. Bauru tem varias praças, tem teatros municipais (até mais de um), então até que tem espaço, mas falta estimulo. Já o espaço físico e é o que falta na cidade é mais a questão de não ter lugar onde se divulgar, para poder se articular. Bauruense tem certa pré-disposição de falar que não tem nada acontecendo na cidade, que são sempre as mesmas coisas, só que é pouco divulgado por não ter esse espaço. Então, na verdade, Bauru tem espaço, mas não tem muito estimulo para essas novas manifestações.
E: Vendo esse lado dos eventos cultu-
rais, até que ponto a prefeitura ajuda ou atrapalha nos eventos da cidade? LM: O processo da prefeitura, por natureza, é mais lento. A gente entende isso, mas ela acontece com um foco mais lento. Logo, quando a gente manda um ofício para a prefeitura, por diversas vezes, nós vemos que a resposta chega no dia do evento, ou até mesmo depois. Então, eu acho que a Prefeitura ou a Secretaria ajuda o mínimo, é bem pouco que eles fazem. Tem alguns pontos deles que são bons, terminam ajudando, mas deixam a desejar. A secretaria de Cultura ainda não conseguiu concretizar a Lei Municipal de Cultura, o Programa de Lei de Estímulo é um programa muito falho, com um edital que precisa ser revisado.
A verba destinada para a cultura, por exemplo, uma terça é destinada para o Carnaval. A revirada Cultural é uma boa iniciativa, porém ela não expõe de fato a cultura, procura só divertir o público.
E: Você acha que o público consegue
interagir com os projetos Culturais? LM: Eu acho que existem divisões. Há pessoas que reclamam sobre o que não fazer, porém também não procuram nada além da Getúlio ou as baladas da cidade. Já a galera mais aprofundada nisso, sempre tentou se conectar com a cultura alternativa. Esse cenário alternativo em Bauru é efervescente sim, Bauru já esteve melhor, foi até chamado de “Seatle brasileira”, mas a galera alternativa tem essa cultura de se unir e prestigiar. Existe uma situação bairrista, muita gente procura coisa mas consegue se conectar. Com isso, as ações terminam ficando restritas apenas aos seus grupos.
E: Como o Enxame Coletivo atua nos
eventos culturais da cidade e como é feito o processo? LM: O Enxame Coletivo propõe muitas vezes divulgar os eventos que ocorrem. Nós trabalhamos em duas frentes. Uma delas seria o que chamo de trabalho de “Guerrilha”, que é a divulgação no facebook, batalhando bastante para massificar o evento. A outra frente que o enxame tenta atua é a parceria com outras produções culturais, fazendo assim com que aumente a rede de divulgação e causando uma interferência muito grande, sem precisar de um grande patrocínio, ou então um auxílio da prefeitura para conseguir fazer um evento. Eu consigo enxergar o Enxame como um fomentador da cultura local, estimulando uma criação de rede local para que a gente consiga criar, de fato, essa cadeia cultural. Expressa • Novembro 2012
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Palco na calçada, arte na rua
Artistas utilizam das ruas das cidades para suprir a falta de espaço para apresentarem seu trabalho Nos centros das cidades, entre lojas, carros, semáforos e multidões de pedestres, pode-se também encontrar outro tipo de trabalhador. Um homem que se dedica às belas-artes, que revela um sentimento artístico e trabalha com uma economia pouco ou nada palpável, e que não utilizam nem sequer um palco. Seus locais de trabalho são exatamente as ruas dos centros das grandes cidades. Em Bauru não é diferente, e apesar de encontrarmos mais artistas de semáforos, e
normalmente crianças, podemos encontrar também artistas como Rafael Siqueira, de 23 anos que faz malabarismo em locais públicos como no Parque Vitória Régia e semáforos de avenidas como Rodrigues Alves e Nações Unidas, “Muitas vezes eu não recebi um centavo, principalmente quando estou praticando no Vitória Régia, mas nos semáforos nós acabamos sempre recebendo um bom dinheiro”, conta Rafael que diz que mesmo ganhando pouco, trabalha se divertindo. O jovem artista já teve experiências em teatros de outras cidades, mas afirma que gosta muito de trabalhar nas ruas da cidade, pois a rua “sempre está lá, a sua disposição” e com um público a ser surpreendido. “Algumas pessoas se incomodam de ver a gente pedindo nos semáforos enquanto elas estão paradas, mas não há como negar que naquele minuto em que elas estão esperando o sinal abrir eu consigo entreter granFoto: Laís Belline de parte do público. Eu percebo O parque vitória régia é um dos principais locais escolhidos pelos artistas isso pelos olhares e pela atenção e
Sara Souza e Vítor Peruch
não pela quantidade de moedas que saem dos vidros”, lamenta o bem humorado Rafael. Em Campinas, cidade há 265 quilômetros de Bauru, o ex-artista circense Luís Celso de 28 anos trabalha nas avenidas da cidade há mais de três anos e diz que sua renda é feita do dinheiro que arrecada nos semáforos “Eu considero a rua um lugar onde você tem a resposta imediata do seu trabalho. É como se a rua fosse uma rede social analógica. É uma conversa que anda”, afirma o artista. O palhaço conta que teve experiência nas artes cênicas e que já trabalhou em teatros, casas noturnas, e fez pequenos bicos na televisão, mas desistiu de trabalhar no circo após o nascimento de sua filha. “Trabalhar para escolas é muito gratificante, acho que é o que eu mais gostei de fazer desde que saí dos circos. Mas na rua o desafio é maior. Chamar a atenção do público que está com pressa e preocupado com seus problemas não é fácil. Por isso que a gente fica mais feliz com sorrisos do que com dinheiro. Ter o seu trabalho apreciado é sempre bom”, comenta o palhaço que também sabe fazer mágicas e malabarismos.
A sétima arte mais acessível e democrática Cineclubismo se expande na cidade e oferece opções de lazer gratuitas
Se você acredita que cinema se resume a grandes salas, com mega produções, cheias de atores hollywoodianos, você está enganado. Uma forma diferente de cinema é exibida nos chamados “cineclubes”. Os cineclubes são uma alternativa de interagir com a sétima arte. Eles são formados por pequenos grupos de pessoas que tem aversão ao cinema tradicional, e aos filmes “blockbusters” O cineclubismo surgiu em meados dos anos 20 como uma concepção democrática de relacionar o público com a obra cinematográfica. Os locais escolhidos para as exibições são geralmente salas pequenas, voltadas ao intimismo e as exibições de filmes fora do circuito comercial de cinema. Na cidade de Bauru já são cinco cineclubes funcionando semanalmente: Cineextinção, Cineclube Unesp, Cine Ouroverde, Cineclube Aldire Guedes e o Cine Sesc, todos com sessões gratuitas.
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O Cine Extinção volta sua programação ao cinema alternativo, com filmes de proposta “underground”. Ele funciona na loja Empório Extinção e as sessões acontecem aos domingos sob curadoria de Aran Carriel que fala sobre os filmes que exibe: “A programação é bem aberta, não tem uma direção temática. Procuro só não passar filmes carne de vaca, muito conhecidos, e nem tanto coisas cults e também nenhum clássico comum.” O Cineclube Ouro Verde, é voltado ao público infantil, que atende a população do bairro Jardim Ouro Verde. As sessões são realizadas no Centro Cultural Do Ouro Verde e são organizadas por Bruno Rentes. O projeto acontece semanalmente de segunda-feira à noite, no Centro de Cultura do Ouro Verde Cem, uma ONG do bairro. O Cineclube Aldire Pereira Guedes foca nas produções locais, e foi aprovado pelo Governo Federal como ponto de cultura. O projeto é coordenado por
Jayme Rosica e Lígia Maciel
seu fundador José Augusto Vinagre, que conta que “O Cine Clube Aldire foi fundado em 2005, e já tem sede própria. Além das projeções de filmes, nós realizamos oficinas na área de audiovisual também.” Nas dependências da Universidade Julio de Mesquita Filho – Unesp – em Bauru, funciona um Cineclube com sessões às quartas-feiras que explora eixos temáticos, conforme explica o professor João Eduardo Hidalgo, coordenador do projeto: “Nós selecionamos ou um período do cinema, ou uma temática, ou ainda a cinegrafia de algum grande diretor.” Hidalgo ainda relembra: “O público é majoritariamente de universitários, mas a população também pode comparecer.” O Cine Sesc é um projeto permanente do SESC Bauru e funciona às terças-feiras. Os filmes exibidos tratam um eixo temático mensal, as exibições acontecem no auditório com grande capacidade e conforto para os espectadores.
Conhecendo o teatro As artes cênicas aos olhos de quem nunca se envolveu, mas sempre foi curioso
Sedução Comunal: a mística do Teatro Oficina
espaço aberto ainda estavam esperando a concentração da plateia. Assim que começou a peça, notava-se nudez cada vez mais constante, que passava aos olhos frios de um público de classe média, que procurava algo que lhes impressionasse; senão apenas para usufruir de um espaço que já conhecem: perto do início da peça tomavam o vinho tinto como quem estivesse a fim de causar - sabida a temática da peça -, mas mantendo a classe. A tensão criada e o contato com o público durante a peça eram cada vez maiores; também a provocação em nuances sexuais - a quebra da lógica ia até o fundo das mentes
“Peça do Zé Celso”. Era o que me diziam o tempo todo no mês de agosto. Em Bauru, no SESC, tudo bancado, pois Aline me arranjou entrada VIP; o mesmo para Miau, Miguelito, Pixe. Dois dias de apresentação, com a atração da ‘gente pelada, por cinco horas. A peça se chama Macumba Antropófaga, produção da Associação Teat(r) o Oficina Uzyna Uzona - assim, com esse ‘r’ entre parênteses – numa hipótese da linguística vejo como uma “tendência mais céticas. evolutiva da língua portuguesa” sem o ‘r’, que supostamente seria uma adaptação da linguagem popular à norma “Ela voou em minha direção; eu me padrão. Abreviando o nome para Teatro levantei, hipnotizado; ela Oficina, trata-se de uma companhia fundada em 1958 pela Faculdade de Direito subiu a arquibancada, se ajoelhou e da USP, e entre seus fundadores desbaixou minhas calças; ela não taca-se José Celso Martinez Corrêa - o Zé Celso em questão. viveu em meio ao vai me fazer isso...”. tropicalismo sua expressão antropófaga com a peça O Rei da Vela, de Oswald de Andrade, escrita em 1937 e exibida pela Tensão que era catalisada por índi@s primeira vez em 1967. nus - atuadores da Universidade AntroLi na sinopse da peça que O Rei da pófaga -, em um espaço de palco que Vela, de Oswald de Andrade, é aprea companhia chama de ‘sanduíche’: um sentado como um segundo manifesto corredor percorrido por arquibancadas antropófago (sendo o primeiro datado de ambos os lados. Índios que agiam de 1928). Esta Macumba era um terceiro sobre a plateia; havia os que agarravam, manifesto, com contexto dito contemesmagavam (com seu sexo) as pessoas; porâneo, crítico a tudo, caótico. Peça e neles também havia uma atitude de de ideias pós-modernistas que até em si se criticavam – e tinha Oswald como protagonista, interpretado por Marcelo Drummond. Na véspera reformulamos o visual da sala da república e fomos sabendo detalhes do que já foi visto sábado, primeiro dia de apresentação. Alguns até vistos na prática, inspirados pela visita de quem viu a peça. Buba, ex-morador da república e de passagem em Bauru por causa da atração, foi um deles, e passou seu ingresso utilizado no sábado dizendo ao B.B.: “Leve esse ingresso usado ao SESC pela manhã e poderá arranjar um para a peça”. No dia seguinte - dia dos pais - da casa ao SESC fomos nós cinco, atrasados, com o contratempo dos táxis e sem dinheiro vivo. Pegamos o táxi do hotel próximo à república: bastante caro e com limite de quatro pessoas, confortável, que aceitava a única saída para nós, que era o pagamento com cartão. Chegando lá a boa notícia de que a peça ainda não havia começado: Atores da Universidade Antropófaga: olhares surpresos e curiosos para a nudez provavelmente por ser uma peça de
João Vitor Reis
extremo desejo sexual, dizendo corporalmente sua entrega ou até atenciosos convites para dança - tudo sem restrições de gênero. E com certeza a plateia mirava para o que despertava seu desejo e fantasias. O mesmo ocorria com os atores em trabalho teatral. Miau foi esmagado por um corpo macho; já eu estava uma fortaleza. “São só pessoas nuas nos surpreendendo”, pensava. Tínhamos a inspiração pra tirar a roupa, mas faltava um “estímulo” a mais. Mesmo após o sinal claro de que era a hora de o público participar da peça, de que era hora de tirar a roupa, ficava imóvel, eu preferia analisar, entender, observar tudo e todos. Até que cruzei com os olhos safados de uma das índias: “céus, que olhos são esses”... Ela voou em minha direção; eu me levantei, hipnotizado; ela subiu a arquibancada, se ajoelhou e baixou minhas calças; “ela não vai me fazer isso... ufa”. Quando me dei conta, pulei dentro do palco-corredor, e segui naturalmente dentro do enredo, ainda observando tudo, inclusive aqueles olhos... Fim de primeiro ato. No intervalo, quem me conhecia fez cara de espanto. Daí pra frente o tempo voou, e estava sob hipnose: a temática da peça mudou e se mergulhava nas críticas diversas do segundo ato. A indiazinha, chamada Carolina Castanho, eram olhos me seduzindo pelo resto da peça, seja vestida de Amy Nossa Senhora dos Craques ou de Macaca Xenotransplantada. A hipnose acabou com as palmas do
Foto: Agnes Sofia
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“Saímos em frente à plateia do show – alinhados – ouvindo uns gritos dizendo “viadinho, viadinho”, até perceberem – sério – a força de presença de nossa intervenção”. Então, no domingo, dia 30, o elenco da intervenção, formado por mim, Lary Corrêa, Raissa Prado, Thales Mandelli, Camila Manduca, Xyko Peres e Daniele Freitas partiu em fila da FOB-USP até o Parque, fazendo movimentos de 90º para mudar de direção e alternando a ordem da fila; Foto: Laís Semis isso até interrompermos uma partida Minha participação em coralidade. Da esqueda para a direita: Raíssa, eu, Xyko, Thales e Camila de Rúgbi no campo aberto em frente fim da peça. de mundo, de arte”. Olhando outra peça ao anfiteatro, para andar em grade Nos dias que se passaram, senti o com expressão nua - dessa vez sucinta movimento dentro de um quadrilátero efeito colateral da paixonite pelos olhos - notei que no ambiente os amantes do imaginário - , alternando comandantes e casta-nhos; o arrependimento por não evento eram só da roda do teatro, basi- comandados. ter trocado uma palavra de camarim; ao camente a mesma galera da Macumba... Corremos em direção ao pedregulho menos a sinopse era útil: achei seu perfil Seria mais um típico núcleo de arrogân- e dormimos espalhados, fazendo contano Facebook, não correspondido porém. cia? to com a terra; acordamos e fizemos a A curiosidade teatral permaneceu. Na hora de voltar pra casa, pensei em pergunta: “Aqui é Bauru? O que é Bauru? Na semana da pátria, busquei a oporpegar um contato, uma carona simpática De onde veio Bauru?”; Verô nos ensinou tunidade de conhecer jogos teatrais. pra casa. Conheci Francisco Serpa Peres, uma formação, criação própria dela, que Desinibi meu corpo e aprendi as prátimais conhecido por Xyko Peres. Soube ela nomeou de ‘peitinho’, ’uma espécie cas do Teatro Épico; descobri Brecht – a que ele coor-dena o Teatro da Universi- de formação triangular com o centro um pessoa mais influente do teatro moderdade de São Paulo (TUSP). pouco mais adiantado, se “protuberanno; dominei o conceito de coralidades Todo campus da USP mantém um do” - imagine um mamilo - daí partimos - formações que remetem ao Teatro TUSP. Assim soube que o universo tepara essa formação, atravessando o Grego. Como palhaços, eu e os outros atral em Bauru oferece oportunidades Parque perguntando: “Quem é você? De aprendizes de aprendizes formamos um diversas. onde você veio? Aonde você vai?” - isso coro, um corpo unificado de atuantes Xyko é amigo de Verônica Veloso, chamando a atenção de roqueiros que que destacava um deles, o corifeu, para que coordenou a oficina ‘Bauru Através se reuniam massivamente para um show falar. Os Coros tinham não só forma, do Es-pelho’. Verô (Xyko costuma chade uma banda cover do AC\DC; voltamas também ação coletiva, associada ao má-la assim) foi formada pela ECA-USP e mos a fazer fila contornando a parte corifeu. tem mestrado de Artes Cênicas. A oficina externa do parque, até nos dividirmos e era parte do ‘VIII Circuito TUSP de Teapartirmos para as pontes do parque: elas tro’. O circuito difun-diu as Artes Cênicas têm grades e é possível ver uma através nas Cidades de São Paulo, São Carlos, da outra; as pontes foram usadas para Bauru, Piracicaba e Ribeirão Preto, por fazer pequenas acrobacias, copiadas meio de oficinas e espetáculos. entre os membros de cada ponte. O aprendizado nessa oficina foi Depois, homens e mulheres se divididurante quatro dias: os jogos cênicos ram: elas andaram pelas guias do parque Uma nova oportunidade foi o FACE eram mais avançados, e aprimorei a e nós esperávamos, de roupas de baixo, - Festival de Artes Cênicas de Bauru concepção de coralidades, reconhecen- até um momento de epifania onde um evento realizado pelo Grupo Protótipo do e alinhando-me em conjunto com os após o outro mergulhava na água atrás Tópico. Era sua primeira edição, e minha colegas teatrais que fiz. Comandei e fui do anfiteatro. Saímos em frente à plateia curiosidade, que me levava à procura de comandado, constituí formas de coledo show - alinhados - ouvindo uns gritos algum curso ou espaço para a prática tividade. Verô me ensinou coralidades dizendo “viadinho, viadinho”, até perceteatral, foi atrás. Conheci os organizadoinspirada em formações alinhadas, como berem - sério - a força de presença de res Lidiane, João Lucas e Fábio Valério, uma marcha militar ou de protesto; a nossa intervenção. Causamos um espanatuantes do Protótipo; fiz inscrição para razão disso era na essência apresentada, to que gerou aplausos. uma oficina e presenciei alguns espetátomando como objetivo a presença e a Nos alinhamos com resto do coro e culos. força - a simbologia, de fato, era fortís- partimos para balanços que amarramos Fui à abertura e assisti ‘Viés’, espesima. nas grandes árvores do parque, para táculo de expressão corporal realizado Da mesma maneira, os demais jogos cada um contar como a praça se tornou pela Companhia L2, de Londrina. O corcênicos como os de olhares, contato e seu quintal. As falas de todos se baseiam po seguia, segundo Agnaldo Souza, difigurino foram constituindo entrosamen- em suas experiências. A minha foi “Adoretor da peça, “um encadeamento de ceto. Com toda a técnica desenvolvida, rava subir em um pé de abacate quando nas, umas coreografadas, outras criadas o objetivo final era explorar o espaço era criança; hoje ele não existe mais; pelo grupo”. Disse que “se você faz uma das cidades. Éramos uma consonância agora uso o parque como meu quintal”. ginástica corporal é feita uma ginástica (Harmonia) revelando a dissonância À noite, com o fim do evento, ainda da imaginação”. Confirmei isso olhando (instabilidade) do espaço em relação à rolou uma festa da roda teatral. Foi na o corpo nu, causando impacto. Era um mensagem do coro. O espaço usado foi casa de Raissa, que atuou comigo na espetáculo sem linearidade e “todo moo Parque Vitória Régia. oficina. Ela divide uma república de ar vimento era preenchido de questões em bucólico com mais três rapazes, próxima que os atores pensam sobre sua visão ao Bar da Rosa. Havia a presença de al-
Oficinas e intervenção: teatro de rua
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ventar bastante, ventava frio lá), porém, nada que o improviso não disfarçasse; na segunda (‘Completo’), era um jogo de xadrez dele com ele mesmo - me agradou muito por causa da quebra de lógica com o jogo que ele fazia de forma bastante expressiva, engraçada. Tom mora com Raissa, que conheci no FACE. No segundo dia da oficina fui aprendendo técnicas que, além de intensas, surpreendiam: nas moças, desmaios às vezes ocorriam; o treinamento envolvia o movimento do corpo com toda a musculatura enrijecida, em alternância com o relaxamento, o que causava a liberação Estava acompanhando uma banda de energia - parecia até uma concepção chamada ‘Raulzitos’. Longe do teatro, realista das animações japonesas com eu e a re-pública Risca-Faca começasuas diversas concepções de energias mos a viciar no Raul Seixas, aquele que interiores, como o ‘Ki’, em Dragon Ball. todos pedem pra tocar naqueles shows Comprovei meu lúdico raciocínio na dede “bandinha alternativa”. No início do monstração técnica realizada no Centro semestre descobri o Raul além dos hits Cultural - Prisão Para a Liberdade - Ele de sempre. chegava a explodir em vermelho em cerAbadá implantou uma nova tradição: tos momentos! descobri como Raul foi um anarquista, diNa semana até o dia da apresentação tando em sua opinião individual dos palda banda, me dediquei nos ensaios. E encos a formação da dita ‘sociedade altersaiava tanto os conceitos da oficina ennativa’, através de letras surtadas, como quanto soltava o berro. Ouro de Tolo; de uma vida underground, No dia da festa, apreensão: a tensão porém só “para os fortes”, como em Não me tomava como no meu primeiro vestiquero mais andar na contramão. Um Raul -bular; todos em casa decorando os últique unia o rock ao baião, Blue Moon com mos detalhes das letras das músicas de Asa Branca. Isso nos inspirou a formar última hora; eu errava a letra de ‘Al Capouma banda e debulhar Raul; todos pratine’. O clima era de pressão e de um leve cavam cantar Raul de algum jeito em toar pessimista vindo daqueles que acredidos os intrumentos, toos cantando, meio tavam em um show caótico. No final um que nas coxas... relaxamento sublime curou a ansiedade Uma república amiga chamada Babiatravés de uns copos de cerveja até a lônia, aliás, tratou de chamar a banda pra hora do show; então resolvi ficar no meio tocar na sua festa Jornal Safado dia 20 da galera, à espreita, como um diretor; a de outubro. Beethoven, Pixe, Miguelito e “(...)parecia até uma concepção primeira música foi ‘Loteria da Babilônia’. Abadá são ótimos músicos, e estavam a realista das animações japonesas Daí em diante tudo fluía; Migué enfim do desafio de estrear a banda. A uma semana e meia de nos apresentarmos, tocom suas diversas concepções de cantava as menininhas com seus “headshakings” em ‘Let Me Sing’; Beethoven car numa festa me pareceria interessanenergias interiores, como o ‘Ki’, em suavizava com ‘Medo da Chuva’. te (mesmo sem saber nada de música), Chegada a minha vez, atravessava a mas estava sem entrosamento com os Dragon Ball”. multidão até o pedestal enquanto Pixe músicos em casa; B.B. seria um vocalista me anunciava; Soltei meu primeiro som, em potencial, não fosse pelas “fritações” Na mostra, o destaque foi Tom Pina, ‘Metamorfose Ambulante’. Chapados da atravessadas no compasso das músicas. A curiosidade teatral andava dimi- com duas apresentações solo. Na primei- minha sala e a Aline - curtindo uma de nuindo, mas Daniela - outra que atuou ra (‘Sacolá’) houve um pequeno contra- animadora de auditório - ecoavam meu comigo na oficina do FACE - me lembrou tempo com o vento do palco aberto, que nome, mas nada que elevasse meu espírito; A Gringa estava diante de mim, gosde próximas oficinas pelo Facebook, fica no fundo do Centro (aliás, além de tando, mas nem tanto ao me enrolar em uns trechos de ‘Al Capone’... Hora da última música, ‘Maluco Beleza’, e busquei amar o microfone, alcançar meu melhor agudo; busquei minhas energias interiores - Elevei meu Ki ao máximo. Quando me dei conta, vi uma ovação plena, me dei conta que tinha realmente cau-sado. “A banda deu certo!”, pensei. Daí até o fim do show peguei uns duetos como vocal de apoio em ‘Não Quero Mais Andar na Contramão’ , ‘Rock das Aranha’ e ‘Aluga-se’; Finalizamos com ‘Rockixe’, e pediram bis: Abadá emendou ‘Tu és o MDC da Minha Vida’. Foi uma noite prestigiada. E devo Foto: João Vítor Reis Carlos Simioni , da cia. LUME de teatro, em sua demonstração de Butoh no Centro Cultural Paulo Neves tudo ao teatro.
guns conhecidos meus, e os organizadores (Protótipo) estavam presentes. Bem: andei aprendendo a causar choques no público, mas também saí espantado, após ver a mania pós-moderna e românticos beijos triplos!
O ‘Butoh’ em uma banda universitária
como havíamos combinado, no fim da intervenção. O FESTIMBAU - Festival de Teatro Independente de Bauru reuniu, dos dias 8 a 14 de outubro, diversas competições de esquetes teatrais - cenas de curta duração, apresentações de gente renomada do teatro e também oficinas contando com eles. Carlos Simioni, um dos sete atores da Cia. LUME de Teatro, de Campinas nos apresentou a oficina ‘Da Energia à Ação’, feita nos dois últimos dias do evento - sábado e domingo. Soube de última hora e parti direto para o Teatro Municipal de Bauru assim que acordei, no dia da oficina. Cheguei um pouco atrasado - cheguei chegando. E nessa oficina Simioni apresentou técnicas do treinamento energético da companhia, baseados principalmente na arte do Butoh, dança teatral que teve ascensão no Japão pós-guerra; é uma oposição à invasão cultural ocidental - diga-se de passagem estadunidense - através de toda a tradição milenar japonesa. Muito mais que uma arte, o Butoh é visto como uma filosofia. Nesses dois dias, ainda participei da Mostra Competitiva de Cenas Curtas do evento, realizadas no Centro Cultural Paulo Neves, único local onde encontrei um curso pago: o Centro descende e outro curso de teatro realizado pela mãe, Celina Lourdes Alves Neves, nome homenageado na fachada do Teatro Municipal. Paulo Roberto Neves é reconhecido por ser grande revelador de talentos, além de fazer trabalhos jornalísticos especializados sobre o assunto.
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O grito vem da rua O hip hop bauruense vem da periferia para fazer dançar, pensar e cutucar algumas feridas No final da década de 60, o Bronx, bairro principalmente de negros e hispânicos da estadunidense Nova York, se tornaria o berço do movimento Hip Hop, que surge como uma alternativa à violência que imperava na região devido às disputas de gangues, substituindo as brigas por disputas criativas de rimas e danças. O movimento surgiu para falar da cultura das ruas, dos guetos, dos conflitos sociais e da violência urbana sofrida pela população da periferia dos grandes centros urbanos ao redor do mundo, que se identificaram com as letras carregadas de relatos pessoais. E as batidas firmes do som tornaram o rap um dos mais fortes e importantes estilos musicais da indústria fonográfica, já na década de 80. No Brasil, São Paulo se tornou o ponto de partida desse movimento na década de 80, do qual surgiram alguns dos nomes mais lembrados até hoje quando o assunto é rap nacional, como Thaíde, Rappin Hood, Racionais MC’s e Sabotage. O atual cenário do rap no Brasil é próspero, com o surgimento de bons nomes nos últimos anos, como os paulistanos Criolo e Emicida, que conseguiram certo destaque nos últimos meses com suas músicas. Apesar do bom momento que vive o estilo no país, não é nada simples se lançar como rapper e viver das rimas para garantir o dinheiro do mês. Em Bauru, o Ponto de Cultura Acesso Hip Hop, em ati-
vidade há pouco mais de um ano, busca trabalhar em conjunto com os rappers da cidade, disponibilizando equipamentos para gravação em estúdio e resolvendo questões burocráticas para, então, transformar o hobby em trabalho remunerado. O trabalho feito pelo Acesso Hip Hop exemplifica um novo campo de atividade que articula economia, cultura e tecnologia e vem crescendo no mundo inteiro e em sentido contrário à velha economia, baseada na matriz energética do petróleo, a economia criativa. Também denominada como indústrias criativas ou economia da cultura, a economia criativa é baseada na criatividade humana e tenta mobilizar os aspectos intangíveis da criação, para a inovação de produtos, serviços e processos culturais. E um dos aspectos econômicos mais importantes é o processo de desterritorialização da produção de bens, serviços e processos culturais. Interferindo diretamente na indústria fonográfica, novas cadeias de produção foram criadas e a dependência da indústria para a produção de cultura é cada vez menor. Isso reflete diretamente no Hip Hop, como comenta o Professor Doutor Juarez Xavier, do projeto Neo Criativa. “O cenário da música independente é todo recheado pela economia criativa. O hip hop, a exemplo de outras áreas de cultura negra, como o candomblé, a capoeira
Sara Souza e Tauã Miranda
e o samba, são exemplos de arranjos produtivos locais de cultura”, explica Juarez. O professor ainda comenta uma importância social direta e decisiva na vida dos cidadãos envolvidos com essas formas que por muito tempo estiveram marginalizadas na produção cultural. “A produção de CDs, DVDs, serviços, grafismo urbano, e cursos de DJs, street dance, grafite, e a realização de cadeias criativas, ateliês de produção, geram renda e emprego para os envolvidos. Por isso, precisa de políticas públicas favorecedoras para se desenvolver”, comenta Juarez Xavier. Renato Moreira, mais conhecido como Magu, é coordenador geral do Acesso Hip Hop e conta que “a ideia é atuar com processos de formação, pensando na gestão da carreira independente, focando sempre na profissionalização dos indivíduos”. Além disso, o Ponto de Cultura está produzindo um documentário sobre o hip hop na cidade de Bauru. “Com esse documentário nós buscamos manter viva a essência do hip hop bauruense, até para servir de base para aqueles que estão começando no movimento”. É o caso do Coruja BC1, que está começando a dar seus primeiros passos na carreira como rapper agora, aos 18 anos de idade. “O Ponto de Cultura é um lugar que está fortalecendo muito o meu
Foto: Tauã Miranda
Rappers bauruenses ensaiam para evento na cidade
10 Novembro 2012 •Expressa
trabalho e também de outros rappers da cidade. Está sendo minha principal ferramenta de trabalho, já que recebemos todo o suporte que precisamos para mixar uma base, produzir um vídeo ou gravar num estúdio”, comenta BC1.
“Quem parar pra chorar não vai chegar pra sorrir” O Hip Hop em Bauru vem se fortalecendo, com eventos voltados à discussão e apresentação de temas ligados ao movimento, como aconteceu em agosto deste ano, no Fórum de Hip Hop do Interior Paulista. O projeto “Rima de Roda”, do grupo de rap Fábrica de Rima, caminha para a sua quarta edição em novembro, com prestígio de um pequeno público bauruense, que realmente comparece nos locais onde acontecem os desafios de mc’s e os improvisos de rima. Mas, nem sempre foi assim. Dom Black, rapper bauruense, comenta sobre a marginalização do rap há alguns anos: “as vezes, por você mexer na ferida da sociedade, falar o que as pessoas não querem ouvir, você acaba sendo marginalizado”. E acrescenta: “o preconceito era mútuo, ninguém queria se aproximar dos playboys. Mas hoje
Coruja BC1 “o Acesso hip hop fortaleceu meu trabalho” o rap está deixando de ser ignorante, quem quiser atribuir valor ao movimento é só chegar”.
“O rap é compromisso” Já diria Sabotage: “o rap é compromisso”. Mas compromisso com o que? Com quem? Compromisso com a realidade, com a educação e com a conscientização, como esclarece Dom Black: “o rap não me deixou ficar alienado. Graças a ele penso sozinho. E graças ao rap, um monte de moleque ainda vai deixar de ir para o mundo do crime”.
Foto: Tauã Miranda
O caso do bauruense Fua foi ao contrário. “Participei do tráfico, participei de assalto, viciei certas pessoas, e o rap foi a forma que Deus encontrou para me resgatar”, comenta. O mesmo aconteceu com o BBoy Bruxão, que relatou ter tido diversos problemas com drogas na adolescência: “Fui muito envolvido no mundo do crime, até que conheci o movimento. Curtia o rap, mas nunca tive voz. Então conheci a dança e hoje sou Bboy. Tiro a minha alimentação disso. Atividades em comunidades carentes foi o que afastou Fua e Bruxão do crime, aproximando-os da arte. Dom Black é enfático: “é a chance que temos de salvar a molecada. Do mesmo jeito que o esporte e a igreja salvam, o hip hop também pode salvar”.
Um centro da cultura musical clássica no centro da cidade
O Automóvel Clube, convertido em sede da Orquestra Sinfônica bauruense, é um importante, porém pouco conhecido, centro cultural do município. Quem chega à Praça Rui Barbosa, no centro de Bauru, pode sequer notar o belo edifício branco em estilo arquitetônico neoclássico que ornamenta uma das laterais do logradouro, mas o prédio, e a instituição que ele abriga, o Automóvel Clube de Bauru, há tempos contribuem para a promoção de atividades culturais no município. Construído na primeira metade do século XX e inaugurado em 1939, o prédio é um reflexo da pujança econômica da cidade à época, quando Bauru ainda era um grande entroncamento ferroviário e um importante centro produtor de café. A construção do prédio foi inspirada nos demais Automóveis Clubes erguidos pelo Brasil nesse período e que surgiram com o objetivo de reunir as elites políticas e econômicas de cada
região em torno do automóvel, um forte símbolo de poder na época. Atualmente, o edifício é tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Bauru (Codepac) desde 2001 e alugado, desde 2005, pelo governo municipal. O local também serve como a sede da Banda e da Orquestra Sinfônica Municipal da cidade, além de receber um fluxo diário de mais de duzentas pessoas, entre visitantes e alunos, além de contar com cerca de dez funcionários próprios, segundo dados da própria instituição. A Secretaria de Cultura da cidade também promove outras atividades culturais no edifício histórico, como aulas e ensaios de música para a população da região, além de palestras, lançamentos de obras literárias, entre outras atividades.
Heitor Carvalho Jorge
No entanto, apesar da importância histórica e das atividades culturais que a instituição promove na cidade, o edifício tem problemas com a falta de manutenção. No ano de 2011, foi constatada uma infestação de cupins no forro do telhado do prédio, o que causava grande transtorno para aqueles utilizam os serviços oferecidos pelo Automóvel Clube todos os dias. Em janeiro de 2012, porém, uma reforma foi iniciada pela empresa Construart, coordenada pela Secretaria de Cultura e custeada pelo proprietário do imóvel para reparar o problema. O Automóvel Clube localiza-se na Praça Rui Barbosa, 1-23, no centro de Bauru. O telefone de contato para quem quiser participar de alguma das atividades oferecidas pelo Clube é (14) 3212 1058. Expressa • Novembro 2012
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A arte retoma as origens libertárias
Movimentos artísticos das ruas como o grafiti ganham espaço no cenário da cidade de Bauru
Jayme Rosica e Lígia Maciel
Desde a época em que os homens pintavam desenhos em cavernas, a arte expressa de forma visual é a que mais mexe com o potencial lúdico da mente humana. As formas artísticas de pintura mudaram muito desde então, passando pelas pinturas em quadros, em tetos com pinturas sacras, até evoluírem para a arte urbana que observamos hoje, onde todo lugar pertencente ao passeio público pode se tornar uma tela para dar vazão a criatividade humana.
O grafite, antigamente visto pela maioria da população como forma de vandalismo, cada vez mais ganha espaço e reconhecimento na atual sociedade. Desenhos que chamam a atenção e buscam causar impacto se espalham pelas ruas da cidade, dando voz aos artistas que tentam passar sua mensagem através da arte. Em Bauru o movimento artístico teve seu inicio em 1995 e com o passar dos anos foi crescendo e ganhando força. Hoje em dia a cidade conta com vários artistas que seguem variados estilos e temas, conforme conta Matheus Pinheiro, ou Fino, como é conhecido “ Hoje em Bauru a galera segue várias linhas. Eu tenho um estilo mais puxado para os desenhos rupestres, mas os estilos dos outros artistas aqui de Bauru são bem vãriados, tem espaço para todo mundo.”. Ele também conta que a população vem respeitando cada vez mais o trabalho: “ Quando eu estou fazendo algum desenho, sempre passa alguém, para para olhar, pergunta e até elogia.”
Segundo ele a questão de lugar nunca foi problema, pois algumas pessoas cedem seus espaços para que os artistas possam se expressar “ Lugar nunca foi problema, hoje em dia o pessoal até cede espaço para a gente fazer. Mas no começo se não tinha, a gente sempre dá um jeito.”
Mas o grafite nem sempre se dá de forma individual, ele também pode ser feito em coletividade, como é o caso do grupo Ilustrutura. Formado por Guilherme Hass, Akaua Pascoal, Felipe Xavier e Breno Bitencur, os jovens começaram suas atividades em 2010, com instalações e design de superficies, partindo depois para outros ramos de expressões artísticas, como o Grafite e o “Lambe-lambe”. Eles já fizeram seus trabalhos em lugares como o Jack Music Pub, de Bauru, e também na boate Clash Club em São Paulo.
Guilherme Hass, vê nas artes visuais uma forma de expressão genuína, pois faz acontecer sem a ajuda do governo “ A arte é meio que uma valvula de escape, meio que fazer por si. O que a cidade não supre com arte, as pessoas se indignam, sentem falta e criam sua demanda. Buscamos fugir do padrão que a sociedade impõe.” Outra prova desse prestígio que essas artes tem conquistado na cidade, é a exposição “Fragmentos” que, durante o mês de novembro, acontece na Galeria Municipal “Angelina W. Messemberg”, de autoria do grafiteiro Luis Gustavo Martins, conhecido por L7M.
As obras do grafiteiro se compõe de instalações e telas, e, se baseia em simplicidade de cores e e geomtrias livres. L7M teve seus primeiros contatos com a arte aos 13 anos e já expôs seus trabalhos em Portugal, na Malásia e em Israel. O grafiti impõe seu respeito e se consolida como uma manifestação artística importante na cidade de Bauru, demonstrando que a arte nada mais é que a livre exteriorização da criatividade humana. Seja pelos pincéis ou pelos sprays.