Agronegócio
Agregar valor à produção agrícola é um desafio para todos os brasileiros
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Índice 3
Feirante mundial, sim senhor! Esclarecendo mitos sobre o agronegócio
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Um problema inadmissível No Brasil desperdiça-se comida suficiente para alimentar 19 milhões de pessoas
Um por todos e todos por um
Agronegócio: ame-o ou deixe-o
Cooperativas beneficiam pequenos produtores
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Um Brasil na contramão
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om quantas inspirações se faz uma boa música? Com quantas mãos se produz um país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza? E o que uma coisa tem a ver com a outra? Na década de 1960, e até os dias atuais, absolutamente tudo. Em uma viagem rápida a esse período, sem muito esforço e sem muitos detalhes, nos lembramos do regime militar, da censura e do “milagre econômico” do governo Médici, dos manifestos políticos e culturais e do ufanismo brasileiro. Com um PIB que cresceu a uma taxa média acima de 10% ao ano, era difícil não se exaltar com o horizonte de possibilidades que se formava. O governo militar investiu pesado no agronegócio e somente nessa década a produção de soja, atualmente com um domínio em 35% do mercado internacional, multiplicou-se por cinco, passando para 1,056 milhão de toneladas já em 1969. Como não se sentir motivado com um solo tão fértil e com tanta riqueza sendo gerada? Como não querer expressar que o Brasil é sim um país abençoado e com uma natureza maravilhosa? Sem entrar no mérito das problemáticas de concentração latifundiária, o fato é que o país se sustenta no agronegócio e auxilia também a economia mundial, com grandes chances de emergir, em um futuro não tão distante, como a potência que irá alimentar o mundo. Sendo assim, não faltam justificativas para escolha do tema deste suplemento. O que o Terra Dourada pretende é dar luz a um assunto fundamental à vida humana. O jornalismo aqui presente busca explorar as diversas facetas do Agronegócio Brasileiro: da produção familiar e em cooperativas ao investimento tecnológico e os desafios sustentáveis, das dificuldades de logística e desperdício de alimentos ao uso de transgênicos e defensivos agrícolas. Da mesma forma que Jorge Ben se inspirou nas potencialidades brasileiras, nós, da redação, queremos destacar uma dentre outras tantas possibilidades de crescimento e desenvolvimento do país. Agora que já sabe se relacionar com o solo, é tempo de o homem investir em seu conhecimento para descobrir as melhores maneiras de explorar sua natureza a fim de sempre dar e nunca deixar faltar. Os desafios são imensos e as controvérsias mais ainda. Reverter o cenário que já se instaurou não é mais possível. Gostando ou não, o agronegócio é a realidade de um país bonito por natureza, e que junto com o seu povo, quer e precisa ser ainda mais abençoado.
Calcanhar de Aquiles da área é a Logística
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Do arado às grandes máquinas Tecnologia aumenta produção e, consequentemente, lucros
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As famílias que alimentam uma nação Pequeno produtor é fundamental para abastecer mercado interno
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Dos laboratórios para as lavouras Prós e contras da produção de alimentos transgênicos
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Um mal necessário Agrotóxicos e a sua necessidade
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Para consumir e exportar Cana pode ser considerada o “ouro verde” do país
Da redação
Expediente Publicação realizada por estudantes do 4º termo de Jornalismo da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação (FAAC UNESP-Bauru), para as disciplinas de Impresso e Planejamento Gráfico. Reitor: Julio Cezar Durigan
Diagramação e Infografia: Jéssika Elizandra
Diretor da FAAC: Roberto Deganutti
Reportagens: Ana Carolina Monari; Augusto Junior; Bianca Teixeira Morelli; Camila Nascimento David; Caroline Lima; Jéssika Elizandra; Juliana Garcia; Maria Letícia Marques; Tayane Abib; e Wanessa Medeiros
Coordenação do Curso: Juarez Tadeu de Paula Xavier Chefe do Departamento de Comunicação Social: Ângelo Sottovia Aranha Orientação: Ângelo Sottovia Aranha e Tássia Zanini
Endereço: Av. Eng Luiz Edmundo Carrijo Coube, nº 14-01 Vargem Limpa - Bauru - SP Telefone: (14) 3103-6000 Ramal: 6066
Feirante mundial, sim senhor! Agronegócio brasileiro é vital para economia interna e externa
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Jéssika Elizandra
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taque ao World Trade Center, crise econômica nos Estados Unidos e dificuldades na zona do Euro. Os conhecidos “fortões” da segunda metade do século XX estão enfraquecidos e, em consequência, deixam vagos os espaços de potências. Muito se especula sobre quem os ocuparia, e o Brasil é um forte candidato, mas será que ele dá conta? Jim O´Neill, economista que elaborou a teoria do BRIC, acredita que sim. De acordo com suas projeções, há quatro países emergentes que, em menos de 30 anos, poderão ser mais influentes que o G6. Juntos, Brasil, Rússia, Índia e China terão em torno de 40% da população mundial e um PIB de mais de 85 trilhões de dólares. Mas como eles conseguirão esse feito? Fortalecendo as suas parcerias comerciais e, assim, completando-se. A Rússia forneceria petróleo e gás natural, a Índia tecnologia e formação aos profissionais dessa área, a China, além de um enorme mercado consumidor, mão-de-obra, e o Brasil...? A fome e a vontade de prover Nossa função é garantir a segurança alimentar dos outros países. “O Brasil conta com vários tipos de clima, chuvas previsíveis, sol abundante e por volta de 13% de toda a água doce disponível no planeta. Além disso, há por aqui 388 milhões de hectares de terras agricultáveis férteis e de alta produtividade, dos quais 90 milhões ainda não foram explorados. Esses fatores fazem do Brasil um lugar de vocação natural para o agronegócio, que é hoje a principal locomotiva da economia brasileira e responde por um em cada três reais gerados no país”, explica a Gerente de Assuntos Regulatórios e Relações Governamentais da ArborGen Tecnologia Florestal, Luciana di Ciero. E, no artigo “O Brasil e o desafio de alimentar o mundo”, o Presidente do Conselho Superior de Agronegócio da FIESP, Roberto
Rodrigues, comenta que os outros países precisam dessa nossa vocação: “Vários fatores têm contribuído para uma alta vertiginosa no preço desses produtos. O primeiro deles é a explosão da demanda nos países emergentes, onde a população e a renda per capita crescem muito mais que nas nações ricas (por exemplo, o crescimento da economia da China transformou o país no principal destino dos produtos brasileiros: enquanto em 2000 exportamos para lá US$ 1,1 bilhão, em 2011 esse valor saltou para US$ 44,3 bilhões)”. Nos últimos anos, complementa o Presidente do Conselho Superior de Agronegócio da FIESP, “problemas de seca na Europa e América Central, além da Austrália, provocaram, ainda, a queda da produção de trigo, encarecendo enormemente esse produto e puxando para cima os preços de milho, soja e arroz, substitutos naturais daquele grão essencial”. Em 2011 o agronegócio foi responsável por 26% das exportações brasileiras e mais do que o triplo do saldo da balança comercial do país. Aí eu vi vantagem! Tudo bem. O país investir na produção de alimentos é muito bom para a economia externa, mas e a interna, como fica? Ainda de acordo com Rodrigues, muito bem, obrigada. “O agronegócio move a gigantesca roda da economia nacional e ainda alimenta nossa balança comercial, criando renda para a cidade e o campo, agregando valor na indústria de alimentos e a de energia e fibras, como vestuário, fiação e moda”. Sobre a crença de que o agronegócio não gera empregos nos centros urbanos, o Presidente do Conselho Superior de Agronegócio da FIESP é taxativo: “Se enfrentarmos os gargalos que nos afligem, geraremos milhões de empregos no país todo, e não apenas no campo, mas também na indústria, no comércio e nos serviços. Afinal, não se produz nada
na área rural sem adubo, semente, defensivo, máquinas agrícolas, equipamentos, corretivos; não se transporta nada sem caminhão, trem, trilhos, portos; não se estoca nada sem silos e armazéns; não se faz nada sem crédito, planejamento, assistência técnica, pesquisa e extensão rural. E tudo isso é urbano”. Vocação ameaçada Os gargalos aos quais o Presidente do Conselho Superior de Agronegócio da FIESP se refere e que ameaçam o crescimento do agronegócio no país são inúmeros: problemas de logística, desperdício de produção, falta de modernização do crédito rural, da implantação do seguro agrícola (inclusive de renda), da reformulação da Política de Garantia de Preços Mínimos, são só alguns deles. Luciana di Cierro chama a atenção para a necessidade de agregar valor às matérias que produzimos: “Um produto bruto vendido tal como encontrado na natureza tem pouco valor agregado. Ao processá-lo, acrescentandose etapas de trabalho manual e/ou intelectual, há mais agregação de valor. Dessa forma, agregar valor significa trabalhar o produto bruto para que seja transformado em algo mais valioso”. Gislaine Balbinot, Assessora de Comunicação da Associação Brasileira do Agronegócio, explica o que é necessário para que isso aconteça: “O Brasil tem potencial para a diversificação da produção e exportação de produtos manufaturados, para isso é preciso que haja políticas públicas que viabilizem esse crescimento. O governo divulgou, no primeiro trimestre deste ano, medidas de estímulo às exportações de produtos manufaturados para reduzir a dependência da balança comercial dos produtos primários e semimanufaturados. O país precisa aumentar a competitividade, mediante a redução dos custos logísticos e desoneração tributária. Essas reivindicações são antigas”. Terra Dourada • Novembro 2012
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Um problema inadmissível A produção é altíssima, mas o acesso à comida é cada vez mais difícil e o destino dos alimentos é o lixo Camila Nascimento David
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onhecido mundialmente por ser um grande produtor agrícola, o Brasil sofre um grave problema que prejudica o cenário social do país: com milhares de pessoas passando fome, as perdas de alimentos se dão das mais variadas formas. Cerca de 10% nem chegam a sair do campo por conta de erros no cultivo como a falta de preparo do solo, fator decisivo para uma boa produção. Nos supermercados e nas mãos dos consumidores a taxa de perda de alimentos também é de 10%, é muito recorrente que acabem estragando por não serem vendidos ou por não serem consumidos no tempo adequado. Em segundo lugar, com 30% dos alimentos desperdiçados, vêm as centrais de abastecimento (por exemplo, o CEASA) onde por conta da falta de pessoal habilitado os produtos acabam sofrendo danos e não servem mais para comercialização. Mas o campeão no detrimento dos alimentos é o transporte. Normalmente é feito por caminhões sem a segurança necessária para suportar o peso carregado, entre outros fatores que acabam ocasionando acidentes
nas rodovias onde, geralmente, toda a carga é perdida, ou tem de ser descartada por conta de possíveis contaminações. A principal consequência desse alto nível de desperdício é a alta no preço dos produtos, o que ocasiona a dificuldade das classes mais baixas para consumir hortifrutigranjeiros. E não é preciso ser um grande especialista para entender que esses alimentos caros, que acabam não sendo vendidos, tem o lixo como destino final. “O que todos deveriam refletir é que não adianta aumentar a produção agrícola do país sem diminuir as perdas, pois dessa maneira estaremos jogando fora cada vez mais produtos e nunca diminuiremos os custos a um nível compatível com a realidade econômica e poder aquisitivo da população brasileira”, relata o pesquisador da Embrapa, Antônio Gomes Soares, em seu artigo “Desperdício de alimentos no Brasil – um desafio político e social a ser vencido”. Conscientização Considerando as taxas preocupantes
Os mais desperdiçados são... 40 % 40 %
40 %
de perdas de alimentos, algumas entidades criaram programas que visam diminuir esse problema social. O Serviço Social da Indústria (SESI) criou em 2004 o programa “Cozinha Brasil – Alimentação Inteligente” em apoio ao programa Fome Zero do governo federal. A iniciativa conta com unidades móveis com cozinhas devidamente equipadas para ensinar à população receitas diferenciadas que utilizam as partes dos alimentos que geralmente são descartadas, como cascas e talos. Já o projeto “Mesa Brasil” é uma iniciativa do SESC e tem como objetivo recolher alimentos que seriam descartados nas centrais de abastecimento, restaurantes, indústrias de alimentos e associações de produtores rurais, entre outras empresas, para que sejam doados a entidades sociais que atendem pessoas carentes. Porém essa doação tem cunho judicial complicado, pois de acordo com a legislação a saúde e bem estar dessas pessoas após consumirem as comidas doadas é de responsabilidade dos doadores. Assim, muitas empresas deixam de doar temendo processos judiciais.
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Um por todos, todos por um Cooperativas agrícolas geram mais de 100 milhões de empregos Juliana Garcia e Maria Letícia Marques
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uito se fala sobre o cooperativismo agrícola, mas poucos sabem definir o seu real significado. As cooperativas são um tipo especial de empresa social que equilibra os objetivos de satisfazer as necessidades de seus membros e, ao mesmo tempo, procurar o lucro e a sustentabilidade. Podem, também, assumir outros nomes e formas, como organizações de produtores, grupos de ajuda mútua, associações e federações de produtores ou câmaras de agricultura. Essa forma de trabalho surgiu há aproximadamente 200 anos, em Manchester, na Inglaterra. Em 1844, cerca de 28 tecelões se uniram com o objetivo de driblar os efeitos da revolução industrial, e com isso deu-se início à primeira cooperativa instituída no mundo. Para o Pesquisador e Assistente de Desenvolvimento Agrário no INCRA-SP, Ralph Panzutti, “o surgimento do cooperativismo é visto como um movimento de reação aos problemas econômi4
Novembro 2012 • Terra Dourada
cos e sociais que surgiram no século XIX com o advento do capitalismo na Europa”. Mais de 800 milhões de pessoas estão associadas a algum tipo de cooperativa, o que corresponde a 12% da população mundial, segundo dados da Aliança Cooperativa Internacional (ACI). Somente no Brasil, são 7.261 cooperativas, com 8 milhões de associados e cerca de 275 mil trabalhadores distribuídos em 13 ramos. O cooperativismo é uma das maneiras mais eficientes do produtor se beneficiar no processo de compra e venda. “Nesse sistema, os organizadores são os próprios produtores, que têm objetivos comuns: comercializar a produção, comprar insumos e ingressar no processo de agroindustrialização”, afirma Panzutti. O sistema de cooperativas favorece, principalmente, os pequenos produtores, que ficam diretamente inseridos no mercado, já que o lucro não é retido por intermediários.
No Brasil, as cooperativas movimentam a economia e são responsáveis por 40% do PIB agrícola e 6% do total das exportações na área. Segundo André Luiz Reis, Presidente da Cooperativa de Produtores de Café Especial de Boa Esperança, “elas são fundamentais nas comunidades em que estão inseridas, devido à distribuição de renda. O capital fica na região, gerando mais empregos nos comércios locais, diferentemente das grandes empresas, que subtraem esse capital levando-o para outros lugares”. As cooperativas exercem um papel fundamental no cenário do agronegócio brasileiro, e estão em constante ascensão, se adaptando às novas formas de produção. Por se tratar de um sistema aceito por todos os governos e reconhecido como fórmula democrática para a solução de problemas sociais e econômicos, o cooperativismo brasileiro tem conquistado um espaço próprio.
Um Brasil na contramĂŁo
Escoamento por rodovias causa desperdĂcio de atĂŠ 30% da produção agrĂcola Bianca Teixeira Morelli
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agronegĂłcio tem um papel muito importante na economia tanto mundial quanto interna. No Brasil, a atividade representa mais de um terço das riquezas geradas no 60% paĂs, alĂŠm de ser a nossa base econĂ´mica. modal 30% O paĂs das mais belas rodoviĂĄrio paisagens naturais tem por vocação a agricultura, sua extensĂŁo territorial e seus diversos climas favorecem 35% modal essa caracterĂstica econĂ´25% ferroviĂĄrio mica nata. Contudo, ao longo da produção, do escoamento e do consumo desses produtos ĂŠ possĂvel apontar erros, os quais, pouco a modal 29% pouco, contribuem para um aquaviĂĄrio 14% desperdĂcio inaceitĂĄvel. Quando se discute desperdĂcios o foco ĂŠ, geralmente, a perda que acontece na mesa do consumidor. vimentadas por rodovias, na prĂĄtica, os nĂşPorĂŠm, o desperdĂcio começa muito antes de che- meros reais mostram muito mais que isso, gar a ele. Algumas situaçþes sĂŁo impossĂveis de talvez perto de 85%. A alta taxa de utilizaserem previstas, e mais difĂceis ainda de serem ção do transporte rodoviĂĄrio pode ser explievitadas, contudo, existem certos vilĂľes do des- cada pelo fato dele ser o mais disponĂvel, perdĂcio que podem e devem ser banidos ou, ao e os outros meios, como o ferroviĂĄrio e o menos, melhorados. Dentre eles estĂĄ o falho es- hidroviĂĄrio, serem esquecidos. Segundo Ricardo Martins, professor de quema de circulação dos produtos agrĂcolas. VitĂłrio Donato, pĂłs-graduado em LogĂs- Operaçþes, LogĂstica e Supply Chain, da Cetica na Universidade EstĂĄcio de SĂĄ, aponta pead/UFMG, chegamos a esta situação por dados preocupantes: “Cerca de 10% da nos- razĂľes histĂłricas: “Nossas ferrovias unem o sa safra de grĂŁos ĂŠ perdida anualmente por interior a um ponto do litoral, ou seja, sentideficiĂŞncia logĂstica (infraestrutura ou baixo do oeste-leste, sendo incapaz de atender uma nĂvel de educação tĂŠcnica dos que trabalham boa parte de nossa demanda. Nos restando nas diversas etapas da cadeia logĂstica). Se mesmo as rodoviasâ€?. formos para a ĂĄrea do hortifrĂşti as perdas Vocação chegam a 30%â€?. Marina Rocha, uma das autoras do artigo Embora os dados oficiais informem que cerca de 60% de nossas cargas sejam mo- “Desempenho logĂstico e inserção econĂ´mi-
ca do agronegĂłcio da soja: as transformaçþes no escoamento da safraâ€?, e Sueli Alves Moreira Souza, Economista e Pesquisadora CientĂfica do Instituto de Economia AgrĂcola, garantem que o ideal seria estimular a construção e/ou recuperação de ferrovias e hidrovias, o que jĂĄ ocorre no resto do mundo, e explicam: “Os modais ferroviĂĄrio e hidroviĂĄrio sĂŁo mais adequados para o transporte de produtos agrĂcolas devido Ă s caracterĂsticas das cargas e movimentaçþes no Brasil, ou seja, grandes volumes, com concentração em curtas ĂŠpocas do ano, baixos quocientes valor/ frete das mercadorias e longas distânciasâ€?. Conforme estudos na ĂĄrea, o transporte por hidrovias, por tonelada transportada, ĂŠ 40% mais barato que o rodoviĂĄrio e 20% mais barato que o ferroviĂĄrio. Investir em diferentes opçþes para o escoamento da produção agrĂcola ĂŠ apenas aceitar a vocação do paĂs, afinal sĂŁo 8 mil quilĂ´metros de costa (10 mil km se considerarmos a extensĂŁo do rio Amazonas atĂŠ Manaus) e 38 mil km de vias navegĂĄveis, e uma extensĂŁo territorial de mais de oito milhĂľes de Km². Apesar dos inĂşmeros pontos positivos encontrados no transporte ferroviĂĄrio e hidroviĂĄrio, essas modalidades encontram resistĂŞncia em temĂĄticas ambientais e de interesses polĂticos, dificultando ainda mais a evolução desses meios.
Obje vos que o governo pretende a ngir com o Programa de Inves mento em LogĂs ca *
2015
2025
O programa prevĂŞ, ainda, a criação da Empresa de Planejamento e LogĂs ca, de 9 trechos rodoviĂĄrios e 12 ferroviĂĄrios * BR-040 DF/GO/MG
Obje vos da
EPL
• estudar a logĂs ca brasileira • antecipar inves mentos • estruturar projetos • atrair a inicia va privada
BR-050 GO/MG BR-060 DF/GO
BR-153
BR-101
BR-163
BR-153 TO/GO BR-153 GO/MG
BR-116
BR-262
BR-262
BR-163 MT
BR-040
BR-060
BR-101 BA BR-116 MG
BR-163 MS BR-262 ES/MG
BR-163 BR 153
BR-050
BR-262
BR-262 MS BR-262 MS
* Fonte: Sofit4 Terra Dourada • Novembro 2012
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Do arado às grandes máquinas:
Agricultura desafia agrônomos, p
Bianca Teixeira Morelli, Caroline Lima, Tayane Abib e Wanessa Medeiros
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os últimos quarenta anos, o agronegócio brasileiro tem assistido a avanços verticais na cadeia produtiva, resultado direto da inserção da tecnologia nos processos agrícolas. Do preparo do solo à plantação e colheita, a mecanização das técnicas tornou-se parte da rotina produtiva do agricultor. A modernização dos processos vai além da qualidade e eficiência no resultado final. As consequências implicam também uma mudança do perfil do trabalhador e das empresas, em uma crescente necessidade de adaptação e capacitação do profissional do campo. Em uma agricultura muito mais empresarial com altos investimentos, maquinários modernos e mais rápidos tomam o espaço do trabalho manual, em uma transição cujo objetivo é atender à demanda produtiva. O agricultor, que antes plantava, esperava e colhia, agora assume outras funções. Com computadores de bordo, informações instantâneas sobre o cultivo e colheita, e utilização de novas técnicas de plantação, o trabalhador passa a interferir na produção de maneira menos braçal e mais decisiva. Assim pensa Vander Renato Giacon, Agricultor há cerca de 20 anos. Tendo como principal cultivo o pimentão, ele sente as consequências das inovações tecnológicas na necessidade de um trabalho com interferências diárias. “A diferença entre aquela época de plantio manual e agora é muito grande. Hoje temos que seguir e nos adaptar às novas tecnologias, se não ficamos fora do mercado”, comenta. De acordo com o chefe do Departamento de Engenharia Rural da UNESP de Jaboticabal, Rouverson Pereira da Silva, o impacto da tecnologia no que se refere à mecanização agrícola é, sobretudo, social. Ao utilizar uma colhedora, por exemplo, o trabalho de 80 a 100 homens é substituído. “A consequência são os trabalhadores braçais procurando outros tipos de emprego, havendo, portanto, a necessidade de se criar condições de capacitação desses trabalhadores para exercerem outras funções no meio rural”, argumenta.
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Novembro 2012 • Terra Dourada
Capacitação Acompanhando essa crescente tendência do agronegócio brasileiro de aplicar a tecnologia nos procedimentos produtivos, aumenta a exigência de mão de obra especializada e treinada para a operação de máquinas modernas e controle de processos cada vez mais complexos. “Os novos empregos a serem gerados demandam maior nível técnico, sendo que programas de treinamento têm se difundido, para solucionar as dificuldades que se têm encontrado na contratação de mão de obra capaz e com escolaridade para os cargos existentes”, explica o orientador do Grupo de Estudos em Cana-de-Açúcar da ESALQ/ USP, Edgar Gomes Ferreira de Beauclair. Com a missão de desenvolver na área ações de formação profissional e atividades de promoção social, foi criado, em 1991, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), uma instituição de direito privado e paraestatal. Com programas de inclusão digital e empreendedorismo rural, o SENAR busca profissionalizar o trabalhador e assim incentivar sua inserção nos processos mecanizados da agricultura. Sustentabilidade Para movimentar o agronegócio, setor correspondente a 26% das exportações, é necessário usar recursos naturais e tecnológicos. Então o atual desafio do Brasil é inserir práticas sustentáveis no setor, o que exige equilíbrio entre as áreas de conservação da biodiversidade e de produção agrária. Nas melhorias das condições socioeconômicas, levando em consideração a questão humana, há uma série de conflitos entre agronegócio e sustentabilidade. Porém, “o que ainda falta no Brasil é uma fiscalização mais eficaz e severa, por parte dos órgãos dos governos e uma atuação mais eficiente dos centros de pesquisa, na busca de novas soluções para as questões ainda pendentes no setor”, critica Adalberto Cunha, Mestre em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente. Ainda de acordo com Cunha, algumas áreas do agronegócio não se adéquam às
práticas sustentáveis, gerando uma relação muito delicada. Um delas é o modelo de grandes grupos que dominam as cadeias produtivas e colocam os pequenos e médios produtores em segundo plano. Há também o uso de produtos tóxicos ou agressivos para o meio ambiente e para o homem e um grande conflito entre a produção (que visa o aumento dos os lucros) e a preservação. Devido às grandes pressões dos consumidores e de ONG`s ligadas ao setor, já é possível encontrar alguns grupos que buscam o equilíbrio. Próximos anos Segundo Gislaine Balbinot, Assessora de Comunicação da Associação Brasileira do Agronegócio, o setor tem contribuições para a sustentabilidade e metas estabelecidas para os próximos anos. Duas delas são reduzir a taxa de desmatamento em 80% no Amazonas e 40% no Cerrado e ampliar a eficiência ener-
os, políticos e todos os brasileiros
© Igepri
produtividade nas mesmas áreas. Alguns aspectos ainda devem ser questionados: o uso duvidoso das sementes transgênicas; o conflito entre as empresas e os trabalhadores com a redução da mão-de-obra por conta do aumento da tecnologia; e as monoculturas extensivas, que podem causar a destruição da biodiversidade em determinadas regiões.
gética, fazendo uso de biocombustíveis e de fontes renováveis (como a eólica e a hidrelétrica). Juntas, as duas medidas podem impedir a emissão de 686 milhões de toneladas de gás carbônico na atmosfera. Há também seis objetivos para 2020: plantio direto na palha; recuperação de áreas degradadas; integração entre lavoura, pecuária e floresta; plantio de florestas comerciais; fixação biológica do nitrogênio; e tratamento de resíduos animais. O agronegócio brasileiro já evolui em pontos como a aplicação de tecnologias de produção menos agressivas e que mantêm as qualidades do solo e da água, o uso de equipamentos modernos com menores impactos no campo, os plantios consorciados que reduzem os desgastes comuns do solo, a manutenção das áreas obrigatórias para conservação das florestas e água, o uso de defensivos agrícolas menos agressivos e mais eficazes e o uso de sementes mais eficientes, que aumentam a
Mudar para crescer O agronegócio corresponde a 1/3 do Produto Interno Bruto do Brasil (PIB). Segundo a Food and Agriculture Organization (FAO/ OCDE), organização ligada a ONU, a produção agropecuária nacional poderá crescer em torno de 37% nos próximos 10 anos. “É preciso resolver questões que são entraves no crescimento e eficácia do setor”, lembra Tanice Andreatta, Doutora em Economia Rural, para quem “apesar dos avanços alcançados, o Brasil precisa investir mais em tecnologias e em formas de produção mais limpas. O agronegócio deve ser capaz de fornecer alimentos para a população mundial, mas também ter ações concretas no que se refere às questões sociais e ambientais”. Tecnologia, a chave da ascensão O uso dessa ferramenta na produção e no cultivo agrário tem como princípio aumentar a produtividade e melhorar a qualidade dos produtos, tanto para o mercado interno quanto para a exportação. A tecnologia permite que em um espaço menor se consiga produzir muito mais, como exemplifica Beauclair: “O emprego de tecnologias possibilitou que, utilizando apenas 9% do território, por exemplo, a área plantada com oleaginosas aumentasse 27% e a produção 213%, ou seja, a produtividade aumentou em 2,5 vezes”. Como consequência, há também a diminuição do número de trabalhadores sem especialização e o aumento da procura por mãode-obra especializada. No caso da colheita mecanizada, as máquinas agrícolas chegam a substituir até 100 trabalhadores. Assim, os novos empregos a serem gerados exigem maior nível técnico dos trabalhadores, além
de mudanças e adequações na produção. Para isso, certas empresas oferecem programas de treinamentos para que os antigos trabalhadores se realoquem em outra área do processo. Nesse ambiente tecnológico agrícola, o Brasil vem ganhando espaço e se tornando referência em relação ao sistema de produção. Um exemplo disso são as entidades de pesquisas agropecuárias criadas, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e os estudos desenvolvidos nas universidades do país. Esses investimentos têm como objetivo “contribuir para transformar os biomas brasileiros através da expansão das fronteiras agrícolas, não visando apenas à produção, mas também uma produção que gere resultados com sustentabilidade social, econômica e ambiental”, defende o pesquisador da ESALQ-USP, Fábio Luiz Consoni. Agregando valor à produção Atualmente, o país investe em pesquisas nos setores relacionados ao agronegócio, como ressalta o professor Wanderley José de Melo, da UNESP: “na geração de álcool combustível, por exemplo, o Brasil é dos mais desenvolvidos do mundo e técnicos de outros países vêm para cá em busca de conhecimento”. Contudo, tal avanço ainda não é o suficiente para a demanda. O cenário é positivo e algumas empresas brasileiras estarão se destacando no mercado interno e externo, no entanto, o país ainda é dependente de tecnologias estrangeiras, como fertilizantes, defensivos e mecanização. Dessa forma, empresas do exterior veem no Brasil uma possiblidade de expansão de seus negócios e acabam fazendo com que as nacionais deixem de ser competitivas e percam espaço no mercado mundial. Ou seja, além do incentivo às pesquisas e experimentos nos processos de produção, há a necessidade de investimentos também no processo de criação de novas tecnologias para que a importação seja menor e, em um futuro próximo, se possa agregar valor aos nossos produtos, deixando de exportar apenas matéria-prima.
© Laboratório de Máquinas e Mecanização Agrícola (LAMMA) Terra Dourada • Novembro 2012
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As famílias que alimentam uma nação É do pequeno agricultor a função de abastecer o mercado interno
Ao centro, Elisa Paes de Oliveira, acompanhada do genro Antonio Ferreira da Silva, e da filha Lucimara Paes da Silva, vendem na feira as hostaliças que produzem em lote de terra, em Ibiúna.
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© Jéssika Elizandra
Caroline Lima e Tayane Abib
costumado a se questionar sobre o va- de R$ 15 bilhões do Governo Federal para in- ção, indissociáveis do avanço tecnológico na lor nutritivo dos alimentos, nem sem- vestimento em safra. No entanto, José Hum- busca do desenvolvimento”, explica Xavier. pre o brasileiro, ao fazer uma refeição, está berto Xavier, Pesquisador da Empresa Brasihabituado a considerar as etapas produtivas leira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), Políticas de investimento agrário Entre passos curtos e longos, o Governo dos itens que compõem o seu cardápio. Cor- observa que o apoio não deve se resumir à riqueiramente utilizados no preparo de um concessão de créditos subsidiados: “Deve- Federal realiza projetos de incentivo e desenprato, os principais produtos de uma ces- mos ter políticas articuladas que contemplem volvimento à agricultura familiar. No final ta básica, como o arroz e o feijão, recebem a melhoria da qualidade de vida dos agricul- de 2011, o Ministério do Desenvolvimento influência direta do trabalho de pequenos tores e de suas famílias, e isso engloba mais Agrário lançou o programa Rede Brasil Ruagricultores que, mesmo em disputa com as do que os aspectos produtivos”. ral, em uma iniciativa de oferecer oportuniindústrias do agronegócio, garantem seu esNesse sentido, além de alocar recursos e dades de comercialização dos produtos do paço na economia nacional. aplicá-los na produção, as entidades federais de- segmento através de uma plataforma virtual. O agricultor familiar deve atender a três veriam disponibilizar assistência técnica cons- A intenção do projeto é permitir que o conrequisitos para ter sua prática garantida cons- tante e de qualidade, capacitação gerencial e sumidor compre diretamente dos pequenos titucionalmente, isso desde 2008: não possuir infraestrutura aos pequenos agricultores, já que, produtores via internet. propriedade rural maior que quatro módulos segundo o Censo Agropecuário de 2006, entre Outra modalidade de mercado também foi fiscais, contar predominantemente com a as 11 milhões de pessoas do segmento familiar, criada recentemente para o setor familiar. Em mão-de-obra da própria família e ter a maior um pouco mais de quatro milhões de pessoas setembro de 2012, entrou em vigor uma moparte da renda proveniente das atividades (37%) declararam não saber ler e escrever. dalidade que permite ao pequeno agricultor a agropecuárias desenvolvidas em seu sítio. Para preencher essa lacuna, as coopera- venda de sua produção para instituições púEm oposição ao papel majoritário desem- tivas tornaram-se espaços privilegiados não blicas que oferecem refeições regulares. Com penhado pelo agronegócio na exportação de só para a discussão de temas técnicos, mas a nova medida, além das escolas públicas, que commodities, os pequenos empreendedores também para a troca de conhecimentos, resul- já investem cerca de 30% da renda destinada à rurais se destacam pelo fornecimento de pro- tante da diversidade de experiências entre os merenda em produtos familiares, as compras dutos ao mercado interno. Com uma participa- participantes. “As associações se transforma- poderão ser feitas por presídios, restaurantes ção de 70% na produção dos alimentos consu- ram em instrumentos valiosos para a solução universitários, quartéis e hospitais, visando midos pelos brasileiros, a agricultura familiar de problemas no campo da saúde e da educa- aumentar o acesso a produtos diversificados corresponde a um terço da e mais saudáveis. Para os $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ $ pequenos produtores, o receita dos estabelecimentos agropecuários do país e $ benefício está em um au$ Crédito acessível emprega 74% dos trabalhamento significativo de até O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) $ $ dores do setor. Em determioito mil reais anualmente, financia projetos individuais ou coletivos dedicados à agricultura familiar. Esse nadas cadeias produtivas, $ programa oferece facilidades como baixas taxas de juros em financiamentos ru- $ prevê a Resolução do Grucomo a da mandioca, do po Gestor do Programa de rais e pequenas taxas de inadimplência entre os sistemas de crédito. Para fazer $ $ parte do projeto, a família envolvida na agricultura deve decidir em que âmbito leite e de aves, por exemAquisição de Alimentos o crédito será usado: para custeio de safra, investimento em máquinas, infraesplo, a atividade demonstra $ (PAA), coordenado pelo $ trutura, entre outros. Em seguida, o pequeno produtor deve procurar um sindisua importância na geração do Ministério do Desen$ cato rural que emitirá uma declaração baseada na renda anual e nas atividades $ de mais da metade do valor volvimento Social e ComApós o procedimento, o agricultor com CPF regularizado e livre de $ $ exercidas. bruto da produção. bate à Fome, em parceria dívidas será encaminhado para as linhas de crédito a que tem direito. AnualA agricultura familiar $ mente, o Plano Safra da Agricultura familiar é divulgado com as formas de pa- $ com Ministério do Desengamento, taxas de juro e condições de acesso atualizadas. recebe uma média anual volvimento Agrário. 8
Novembro 2012 • Terra Dourada
Dos laboratórios para as lavouras Funções e história dos transgênicos no Brasil Augusto Junior e Maria Letícia Marques
P
or serem pouco conhecidos pela população brasileira, os transgênicos ainda são objeto de discussão e receio. Afinal, muito se fala sobre esses organismos geneticamente modificados, mas poucos são aqueles que realmente sabem quais são as suas finalidades. Transgênico é uma palavra sucinta para se referir à “Organismo Geneticamente Modificado”. Esses organismos são fruto da tecnologia do DNA recombinante, criada em 1973, que permite a transferência de material genético entre espécies. Segundo Walter Colli, Doutor em Biotecnologia, “o termo transgênico está profundamente ligado a uma técnica ou metodologia que é, simplesmente, a de isolar um gene de um organismo e introduzi-lo em outro visando uma vantagem, econômica, de segurança alimentar, de saúde, de obtenção de medicamentos mais seguros, entre outras”. Desse modo, pode-se perceber que esses organismos foram idealizados para contribuir para o bem estar do ser humano, melhorando sua qualidade de vida. “O primeiro transgênico utilizado para fins comerciais, foi uma bactéria que recebeu o gene da insulina humana e a produz para o tratamento de diabéticos”, afirma a doutora em Biologia Funcional e Molecular, Luciana Di Ciero. Após ser utilizada para o tratamento do diabetes, a agricultura percebeu que a tecnologia do DNA recombinante seria uma excelente ferramenta para realizar o melhoramento genético de plantas. “A primeira planta transgênica utilizada comercialmente foi um tomate mais resistente, que demorava mais para apodrecer. A partir daí, muitas plantas foram melhoradas com a introdução de características de interesses agronômicos e nutricionais para resistirem a pragas e doenças, aumentar o teor de compostos benéficos a saúde, entre outros”, aponta a Bióloga. Há um intenso conflito entre defensores e críticos da tecnologia transgênica. Para a Doutora em Saúde Pública, Maria Clara Coelho Camara, “grande parte dessa polêmica emerge da falta de informações completas e confiáveis sobre situações de risco, benefí-
Prós
cios e limitações dessa aplicação”. Verde e Amarelo Atrás apenas dos Estados Unidos, o Brasil é hoje o segundo maior produtor de transgênicos do mundo. Enquanto na terra do Tio Sam a última safra de organismos geneticamente modificados ocupou 69 milhões de hectares, na terra do futebol foram 30 milhões. Porém, bem antes de alcançar a vice-liderança, a relação entre o Brasil e os transgênicos era outra. Na década de 90, como explica Colli, agricultores do sul contrabandeavam soja modificada vinda da Argentina. “Essa soja passou a se denominar soja Maradona”, conta. Até então, os transgênicos ainda não eram regulamentados. Em 1995, sua comercialização foi proibida pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), embargo este que foi derrubado em 2003, com a edição de uma nova Medida Provisória (MP) para autorizar a comercialização. Toda essa novela só teve fim em 2005, quando o congresso aprovou a Lei de Biossegurança (11.105/05), a qual, além de regulamentar as pesquisas nas áreas de biotecnologia, também instaurou a nova Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Segundo o Biotecnologista, essa comissão é a responsável pela liberação da produção de organismos geneticamente modificados em nosso país, e tem como objetivo assegurar que um determinado produto não causará danos à saúde e ao ambiente. Um dos motivos para o Brasil adotar essa tecnologia é a facilidade trazida por ela ao agricultor, já que eles não precisam mais se preocupar tanto em proteger as plantações de pragas. “Além disso, os que plantam transgênicos têm de 10 a 25% mais rendimento do que os que não plantam. Pelo fato de terem que roçar menos não usam tratores e, portanto, gastam menos óleo diesel (poluindo menos o ar com gás carbônico), e usam menos água por usarem menos agrotóxicos”, diz Colli.
Em países como Argentina, Índia, Canadá, China, Paraguai e Uruguai os transgênicos foram bem recebidos, além, claro, dos EUA. Muitos outros não manifestam sua oposição a esses organismos. Quais são? A CTNBio já aprovou no Brasil 18 variedades de milho, 5 de soja, 8 de algodão, uma de feijão e 14 de vacinas. Porém, não há como dizer qual é a quantidade desses produtos consumida diretamente pelo homem, uma vez que boa parte é destinada à alimentação animal e também utilizada como matéria-prima para outros alimentos. Há uma lei que determina que os produtos que contenham mais de 1% de transgênico devem ter estampado em sua embalagem um triângulo amarelo com um T em preto no centro. Na opinião de Colli, “essa providência é um exagero, porque nos saquinhos de camarão não está escrito que ele pode ser altamente alergênico, nem quando compramos kiwi -vindo da Ásia e que plantamos alegremente no Brasil- que ele também pode ser alergênico. No entanto, se há uma lei, devemos obedecê-la”. Portanto, a única forma de identificar se um produto contém transgênicos ou não é por meio da informação do fabricante ou por análise química das agências fiscalizadoras. Futuro Essa tecnologia veio para ficar, é o que afirmaColli. Quanto ao futuro dos organismos geneticamente modificados, o pesquisador conta que haverá alimentos mais ricos em substâncias essenciais. Exemplo disso é a alface que vem sendo desenvolvida pela EMBRAPA, e que será rica em ácido fólico. “Esse ácido é fundamental para o fechamento do tubo neural no 23º dia de gravidez, quando normalmente a mãe ainda não sabe que está grávida. Quando essa alface estiver no mercado certamente teremos menos anencéfalos e portadores de spina bífida”, explica o Biotecnologista.
Contras
• Expansão do conhecimento científico
• Ignora os agrossistemas sustentáveis e os possíveis efeitos de seu uso no ambiente
• Sementes com qualidade nutritiva aumentada
• Só atende os grandes produtores
• Aumento e melhoria na produtividade pela maior resistência a doenças e pragas • Redução de custos • Utilização de tecnologias que permitem o uso mais eficiente do solo, como o plantio direto, evitando a erosão
• Aumento do número de casos de alergias • Insetos mais resistentes • Perda de biodiversidade e erosão genética • Surgimento de “super” ervas daninhas Fontes: Luciana Di Ciero e Maria Clara Coelho Camara Terra Dourada • Novembro 2012
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Um mal necessário
Apesar dos pontos negativos, os defensivos agrícolas garantem grande parte da produção Ana Carolina Monari e Camila Nascimento David
O
consumo de alimentos que foram cultivados com o uso de defensivos agrícolas pode causar vários efeitos colaterais e doenças como diarreia, vômitos, problemas renais e até câncer. Mas, em contrapartida, sem a utilização desses produtos cerca de 40% dos alimentos produzidos no mundo seriam perdidos, segundo dados da Organização das Nações Unidas (ONU). O agrotóxico é um mal necessário para manter a produção em níveis elevados sem a infestação de pragas, doenças, fungos e ervas daninhas. Assim, os preços também podem se manter estáveis de maneira que não afetem o bolso do consumidor final. O professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais, Nildimar Gonçalves Madeira, cita que o Brasil é o maior consumidor de defensivos agrícolas no mundo. Apesar do Ministério da Agricultura trabalhar na fiscalização sobre a legislação vigente para compra, venda, manuseio e descarte, o alto índice de consumo no Brasil está intimamente ligado à venda clandestina dos produtos. “Devido ao extenso território nacional onde se pratica agricultura e ao pequeno número de fiscais torna-se impossível realizar uma fiscalização eficiente que torne a utilização dos defensivos uma atividade segura e funcional. Por essas razões, temos que conviver com o risco de estarmos consumindo produtos hortifrutigranjeiros com alto teor de contaminação”, relata o professor Nildimar. Falta informação Por consumirem defensivos clandestinamente, os produtores acabam não tendo as devidas instruções e o professor Madeira conta que “na maioria das vezes, o pequeno produtor não sabe das características do invasor que se pretende controlar, de que forma mais eficiente deve ser feita a aplicação e desconhece a composição básica do produto a ser usado”. Além disso, alguns fatores como armazenamento e condições climáticas favoráveis podem alterar o resultado da aplicação. Nildimar também comenta que a falta de informações mais aprofundadas so10
Novembro 2012 • Terra Dourada
bre a produção faz com que os agricultores acreditem no mito de que “o agrotóxico é um remédio que cura as plantas” quando na realidade trata-se de um veneno que erradica pragas. Isso afeta as medidas de segurança adotadas pelos agricultores na hora da aplicação. A maioria deles não utiliza equipamentos de proteção individual e os resíduos dos produtos geralmente são descartados de forma indiscriminada na natureza causando contaminação de rios, lagos, e de água que serve para consumo animal e humano, além da morte de espécies da fauna. Também falta informação a respeito das embalagens dos produtos, que são incineradas sem as devidas precauções e muitas vezes reutilizadas para fins domésticos. É possível observar que os recipientes são apenas lavados de maneira inadequada e o agricultor acaba se expondo diretamente ao contato com o produto. Solução distante Ainda de acordo com o professor Madeira, “substituir os agrotóxicos é inviável econômica e financeiramente”, pois a produção cairia, não sendo suficiente para atender a população e os preços teriam um aumento excessivo (haja visto os valores de
produtos orgânicos). Porém, o professor traz boas notícias para a área. Segundo ele, os estudos sobre o assunto vêm crescendo e há novas formulações disponíveis no mercado com princípios ativos mais eficazes que permitem o uso em menor escala. Além disso, Madeira afirma que “o monitoramento da lavoura por satélite é o que há de mais moderno no setor”. A técnica consiste no mapeamento da lavoura para detectar as áreas onde há maior ataque ou presença das pragas e ervas daninhas. O equipamento que aplica os defensivos tem um computador instalado no qual são inseridas essas informações via satélite, permitindo assim, que seja feito o controle do volume aplicado nas áreas mais ou menos contaminadas. Essa ação ajuda na fiscalização, torna os efeitos do produto mais eficientes, reduz os custos da produção e também diminui o volume de produtos descartados na natureza. Mas o professor Madeira lembra que “as tecnologias alternativas no controle de pragas e doenças ainda são incipientes no Brasil e o caminho mais fácil para se produzir grandes volumes de alimentos é através da utilização de agrotóxicos. A busca pela produção limpa sem utilização destes ainda está longe de terminar”.
Para consumir e exportar
Estado de São Paulo garante 50% da produção de cana do país
© Augusto Junior
Ana Carolina Monari e Wanessa Medeiros
A
cana foi trazida para o Nordeste brasileiro pelos portugueses, em meados do século XVI, com a finalidade de ser a matéria-prima do açúcar, produto que nossos colonizadores queriam exportar para os países europeus. Hoje, porém, 55% da produção da fruta dá origem ao álcool (ou etanol), que, sendo um combustível alternativo, contribui para o desenvolvimento sustentável de energia. A produção de cana localiza-se em maior extensão na região interiorana de São Paulo, com destaque para os municípios de Piracicaba, Ribeirão Preto e Araçatuba. Nessas áreas, em geral, o processo é altamente mecanizado (faz-se uso de tecnologia de ponta) e tem elevada produtividade, se comparado às demais regiões produtoras brasileiras. O plantio dessa cultura no Centro-Sul do país é realizado durante todo o ano, já que o espaço disponível é vasto, o solo arenoso e fértil, e as condições climáticas são favoráveis para a alta produtividade, sendo a colheita mecanizada em cerca de 75% das áreas canavieiras. Já no Nordeste, “a área cultivada de cana apresenta uma situação diversa, uma vez que o plantio se dá em locais com relevo ondulado, o que impede a mecanização. Além disso, a região apresenta pouca área de expansão frente ao grande percentual de espaços não mecanizados”, explica Fabio Luiz Consoni, do Grupo de Estudos em Cana de Açúcar (GECA) da ESALQ-USP. A produtividade paulista é pouco inferior à obtida nas novas regiões de produção do Cerrado brasileiro (Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Sul de Goiás e Sudoeste de Minas Gerais). Apesar de essas novas usinas construídas apresentarem alto nível tecnológico, com colheita e plantios mecanizados e produção de energia elétrica altamente eficiente, “a grande
dificuldade encontrada é a de que os solos disponíveis para a ocupação são de baixa fertilidade e há falta de mão-de-obra especializada para a operação das colhedoras e tratores; além da distância das áreas consumidoras de açúcar e álcool no país, que se encontram, sobretudo na região Sudeste”, avalia o Pesquisador do GECA-USP. Commodity agrícola O Brasil é o maior produtor de cana do mundo. Tratando-se de seus derivados, o açúcar brasileiro tem como principais destinos Rússia, Índia, Emirados Árabes e Nigéria, enquanto o etanol é exportado para Estados Unidos, Japão, Holanda e Suécia. O cultivo dessa cultura apresenta maior visibilidade na esfera econômica quando se trata da exportação de etanol, uma vez que a temática da sustentabilidade está tão inserida nos contextos político e social. O setor sucroenergético representa 15% da matriz energética brasileira e movimen-
Viva o etanol! • Desde 1975, quando foi lançado o Pró-Álcool, a utilização de cana-deaçúcar continua a ser a maior aplicação de biomassa na produção e uso de energia no mundo; • Ao longo dos últimos 25 anos , um montante de 1,8 bilhão de dólares ao ano fo economizado devido à substituição de aproximadamente 200 mil barris de gasolina por dia; • A fabricação do combustível gerou mais de 400 mil empregos diretos e 200 mil indiretos na zona rural, o que diminui as rupturas sociais e ambientais nos grandes centros urbanos.
ta cerca de US$ 48 bilhões de dólares. Pode chegar a gerar mais de um milhão de empregos por ano, apesar da participação de trabalhadores vindos de outras partes do país para São Paulo estar caindo fortemente no setor, devido ao avanço da colheita mecanizada, segundo informações da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ-USP). As diferenças entre o custo de produção da colheita manual e da mecanizada, além da rapidez e eficiência da produtividade, fizeram com que o campo dependesse cada vez mais da tecnologia, substituindo-se a mãode-obra humana nas lavouras por máquinas. Essa mudança no processo de produção também possibilitou um cultivo mais sustentável, já que a mecanização da colheita dispensa a queima do canavial. “Além disso, a palhada que é queimada para a colheita pode ser utilizada na cogeração de energia pela queima na caldeira junto ao bagaço, durante o processo industrial sucroenergético, havendo a possibilidade de comercialização dessa energia”, explica o Engenheiro Agrônomo especializado em Planejamento e Produção Sustentável de Cana de Açúcar, Edgar Gomes Ferreira de Beauclair. Com os altos preços do petróleo (> US$ 40/barril), houve maiores incentivos ao programa do etanol e, além da questão econômica, também ganha importância a ecológica. A biomassa da cana pode ser uma alternativa viável porque usará uma energia limpa e renovável para a fabricação de açúcar, etanol, energia elétrica e biodiesel a partir do bagaço da cana. Dessa forma, “a maior expectativa do Brasil, é que seja estabelecido um mercado global para o etanol como commodity agrícola, possibilitando uma maior movimentação na economia brasileira e contribuindo para um modelo sustentável de produção mundial”, avalia Beauclair. Terra Dourada • Novembro 2012
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A exportação dos produtos agrícolas em números cereais, legumes e oleaginosos 29%
outros 29% bovídeos 7% produtos florestais 9% café 10% suínos e aves 10%
Quem compra da gente? EUA 10% Outros 17% UE
(União Europeia)
22%
Ásia 28% AL
(América La na e Caribe)
23%
cana 18%
E a China? O que exporta de nós? O total do gráfico, em dinheiro, dá quase 16 bilhões de dólares!
produtos florestais 8%
cereais, legumes e oleaginosos 68%
cana 8%
gorduras vegetais têxteis 5% outros suínos 4% e aves 4% 3%
Dados de 2011 (gráficos 1 e 3) e de 2010 (gráfico 2) - Fontes: Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) e Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MIDC)