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Capítulo Sete

“Você ainda acredita em fantasmas?” Eu perguntei a Charlie.

Ele estava encarando a janela, sem responder, mas eu era audaciosa 25 – assim como a menina no filme que todos estavam comentando. Não conseguia lembrar o nome dela, mas Theo James26 estava nele, então ponto.

“Eu lembro de quando brincamos com o tabuleiro de Ouija,” continuei, me sentando na cadeira do outro lado dele, com as minhas pernas em baixo de mim. “Mas nós tínhamos uns treze anos e um ano antes disso juramos termos visto o chupacabra, mas que seja, eu acho que meu apartamento está assombrado.” Charlie piscou.

Eu inalei profundamente. “O controle remoto foi parar na geladeira no último Sábado e quando eu cheguei em casa do meu turno, a lava-louças estava ligada. Então, depois do meu turno na Quinta, eu cheguei em casa e a TV... do meu quarto estava ligada. Eu não deixei ela ligada quando sai. Então ou tem um fantasma na minha casa ou alguém que eu não saiba está vivendo lá ou estou ficando louca. E eu sei, ficar louca parece bem inacreditável.” Minha risada nervosa ecoou pelo quarto silencioso, me assombrando. Na verdade, qualquer coisa que estivesse acontecendo no meu apartamento estava me assustando. Eu contei sobre isso a minha mãe quando falei com ela essa manhã no caminho da minha visita a Charlie, e ela está convencida de que é um fantasma. Apesar de nunca ter visto um, eu acreditava neles. Quero dizer, muitas pessoas –saudáveis, normais e completamente sanas – no mundo tinham certeza de já ter visto um e muitos desses casos foram provados não serem reais. Mas nada tinha acontecido antes no meu apartamento. Por que agora estariam acontecendo essas coisas? Ou será que já tinha acontecido algo antes e só nunca percebi? Deus, era muito estranho pensar que minha casa estava assombrada.

25 Referência a Divergente 26 Ator que interpreta Quatro na Saga Divergente

Eu precisava comprar sal na próxima vez que fosse ao mercado, como um balde inteiro de sal. É isso o que parece funcionar para os rapazes de Supernatural.

Eu suspirei enquanto pegava a pintura que tinha trazido comigo e mostrava para Charlie. Eu tinha feito outra paisagem, dessa vez era Rehoboth Beach, onde nossos pais nos levavam durante o verão. A areia brilhava na tela, como se milhares de diamantes tivessem sido espirrados sobre ela. O oceano tinha sido divertido de pintar, mas não era exatamente perfeito.

Porque nenhum oceano era tão profundo quanto os olhos de Reece.

Eu precisava de ajuda.

Charlie não reconheceu a pintura então eu a levei para a parede, ao lado da de Devil’s Den. Então eu me virei, passando minha mão sobre meu rosto. Sem meus óculos, eu me sentia estranha. Nua. Mmm. Nua. Isso me fez pensar em Reece.

Eu realmente precisava de ajuda.

Abaixando minhas mãos, eu contive a vontade de bater minha cabeça contra a parede. Alguns momentos se passaram enquanto eu encarava Charlie, desejando que ele se virasse e olhasse para mim, mesmo que só por alguns segundos. Mas ele não fez.

“Reece quer esquecer aquela noite,” eu anunciei para o quarto silencioso. Claro, Charlie sabia tudo o que tinha acontecido. “Ele explicou toda a parte de ter se arrependido, o que” – eu ri – “teria resolvido vários problemas se ele só tivesse, você sabe, dito isso antes. Explicado melhor. E ele não quer ser só amigos. Ele deixou isso bem claro. Ele disse... ele disse que valia o meu tempo.” Eu imaginei Charlie concordando com isso.

Voltando para a cadeira, eu me sentei. “Ele não disse que queria ser meu namorado ou que queria me levar para sair. Nossa conversa não chegou assim tão longe, mas ele veio ao Mona’s na Quarta a noite e nós conversamos, do mesmo jeito como fazíamos antes. Ele flertou comigo.” Eu puxei meus joelhos contra meu peito e apoiei meu queixo nele. Fechando meus olhos, eu soltei outro suspiro. “Eu não disse a ele o que realmente aconteceu. Você sabe como ele odeia mentiras e qualquer coisa do tipo, e de verdade, quando foi a melhor hora para contar? Hey, eu

sei que você acha que conseguiu, mas não. Tanto tempo já se passou que é difícil voltar a esse ponto.” Charlie não disse nada mas eu sabia que se ele pudesse falar, ele teria entendido onde eu estava indo. Onze meses de falta de comunicação não era fácil para qualquer um consertar, mas mesmo entendendo isso, ele iria dizer – se pudesse – que eu precisava confessar.

A conversa, de apenas um lado, continuou por mais um tempo e, então, eu peguei New Moon e passei o resto do tempo lendo para ele. Quando chegou a hora de ir, eu coloquei o livro velho de volta na minha bolsa e me levantei.

Charlie era a única pessoa fora da minha família que eu realmente amava e depois de tudo que aconteceu com ele... bem, a ideia de amar tanto alguém como eu amava Charlie e ter de passar pelo mesmo tipo de sofrimento me assustava.

Inferno.

Se eu fosse ser honesta comigo mesma, isso era provavelmente o motivo de ter um péssimo gosto para os caras com quem saia. Nenhum deles eram material para um relacionamento. Nenhum deles era perigoso para meu coração, a não ser Reece, e ele sempre esteve perto. Mesmo que ele quisesse levar as coisas mais adiante comigo, uma vez que ele descobrisse que eu menti, isso seria o fim de tudo. Então, de um jeito, ele era uma escolha segura. Alguém que eu poderia desejar e sonhar, mas sempre saberia que era algo fora do meu alcance antes de me apaixonar.

Eu não conseguia olhar para Charlie enquanto me levantava, silenciosamente ao seu lado. As sombras eram mais profundas em seus olhos e bochechas. Em uma semana, ele parecia mais fraco e magro. Os cabelos perto da sua testa estavam mais finos.

Culpa se acumulava em meu estômago e eu não conseguia evitar em pensar que ele não estaria nessa posição se eu não... se eu tivesse mantido minha boca fechada naquela noite. Simplesmente ter ignorado Henry Williams e seus amigos. Se eu não tivesse ficado incomodada pelas suas acusações. Eu não peguei aquela pedra nem fui eu que a joguei, mas de um jeito, eu tive participação nisso.

E Charlie tinha pagado o preço.

Algo terrível e horrível floresceu. Eu não queria nem mesmo terminar isso, mas era algo que já tinha começado a passar por mim. Eu bati uma mão na minha boca, engolindo os sons.

Teria sido melhor se ele não tivesse sobrevivido?

Oh Deus, eu não podia acreditar que estava pensando nisso. Era tão errado. Eu era uma pessoa terrível. Mas uma voz sussurrava no fundo da minha cabeça mesmo que eu estivesse pedindo para ela se calar.

Isso era uma forma de se viver?

Essa era a pergunta do milhão e eu estava aqui, pensando no que Reece disse para mim sobre viver minha vida por Charlie. Se eu quisesse realmente refletir sobre isso, sendo realmente honesta comigo mesma, eu sabia que tinha tomado algumas decisões simplesmente porque Charlie não poderia.

E talvez... talvez porque eu...

Eu não conseguia terminar essa linha de pensamento também.

Desamparo crescia no meu estômago. A enfermeira Venter tinha explicado quando cheguei que eles ainda estavam com dificuldade de fazer Charlie se alimentar durante o dia. Ela tinha me dado um prato de purê de batata, algo que ele costumava comer, mas mesmo eu tendo passado boa parte da minha visita tentando fazer ele comer, não adiantou nada. Se isso continuasse, eles teriam em entubar, provavelmente antes do fim da próxima semana, e ele não gostava disso. Última vez, ele tinha conseguido tirar e terminou tendo que ser imobilizado. Não havia nada que eu podia fazer para ajuda-lo, mas eu tinha que tentar.

Eu peguei o prato e a colher de plástico, pegando um pouco da massa branca. Logo que a colher chegou perto do seu rosto, ele se virou. Eu não entendia. Ele não conseguia me reconhecer, mas ele tinha virado seu rosto da comida. Dez minutos disso se passaram antes que eu colocasse o prato de volta na pequena mesa perto da cadeira.

Passando entre sua cadeira e a mesa, eu me ajoelhei na sua frente. “Eu preciso que você faça algo por mim, Charlie.” Nossos olhares se conectaram, e foi como receber um soco no estômago, porque mesmo que ele estivesse olhando para

mim, ele não estava me vendo. Emoção fluía pela minha garganta. “Eu preciso que você coma, okay? Quando eles trouxerem seu jantar hoje à noite, eu preciso que você coma.” Nem um pingo de emoção passou por sua expressão.

“Se não, eles vão ter de te entubar. Lembra o quanto você odiou isso da primeira vez?” Eu tentei de novo, colocando uma mão em sua bochecha. Ele tremeu, mas nada mais. “Então Charlie, por favor, coma.” Eu beijei sua testa enquanto me levantava. “Eu volto na sexta querido.” A enfermeira Venter estava esperando por mim do lado de fora. Seu cabelo escuro, levemente rajado de cinza, estava puxado em um coque. Eu imaginava que ela estivesse esperando para saber se houve alguma mudança no comportamento de Charlie.

“Ele está do mesmo jeito que esteve no último mês,” eu disse a ela enquanto chegava no corredor. “Eu não consegui fazer ele comer o purê de batatas. Eu não entendo. Ele não responde a mim, mas ele definitivamente responde quando uma colher chega perto dele.” “Roxy...” “Ele costumava amar aqueles pirulitos de iogurte,” Eu sugeri enquanto nos aproximávamos das portas duplas que levavam a sala de espera. “Talvez eu possa trazer alguns antes de ir trabalhar amanhã? Eu tenho tempo.” “Querida,” ela disse, pegando meu braço. “Eu tenho certeza que Charlie amava muitas coisas, mas ele... bem, ele não é mais o mesmo Charlie.” “Charlie...” eu a encarei por um momento e, então, soltei meu braço. “Eu sei que ele não é mais o mesmo, mas ele... ele ainda é Charlie.” As linhas em volta dos seus olhos demonstravam simpatia. “Querida, eu sei, mas essa não é a única coisa que precisamos conversar. Tem...” O que quer que ela fosse falar era algo que eu não queria ouvir naquele momento. Provavelmente tinha a ver com a intubação e eu não conseguia pensar

sobre isso porque eu sabia como Charlie iria reagir. Eu também sabia que seus pais não iriam ver isso e até mesmo me perguntava se eles se importavam.

Desviando meu olhar, eu abri as portas.

Meu mundo inteiro parou.

Sentado no mesmo sofá que eu estive esperando várias horas atrás estava Henry Williams. A alça da minha bolsa escapou dos meus dedos e ela caiu no chão com um grande estalo. Eu estava congelada no meu lugar.

“Roxy,” sussurrou a enfermeira Venter. “Eu estava tentando te falar que ele estava aqui.” Henry se levantou. Ele tinha crescido desde a última vez que eu tinha visto ele. Antes era tinha uma altura média, por volta de 1,60m. Agora, ele tinha mais de 1,80m.

A prisão não tinha sido boa para ele, não que me importasse com isso.

Seu cabelo castanho escuro estava cortado próximo da sua cabeça e sua pele estava mais pálida do que me lembrava. Então, novamente, eu não acho que você passa muito tempo no sol quando está preso. Haviam bolsas abaixo de seus olhos, fazendo ele parecer mais velho do que era, ele devia ter vinte e três ou vinte e quatro anos. E ele estava maior. Parecia um cliché total, mas ele deve ter passado um tempo malhando porque seus ombros esticavam o tecido da camiseta branca que ele usava de um jeito totalmente diferente de quando ele era mais novo.

Meus músculos travaram enquanto eu encarava Henry.

Ele passou suas mãos na lateral do seu shorts cáqui. “Roxanne,” ele disse e minha pele arrepiou como se um exército de baratas estivessem andando por mim.

Uma parte de mim queria fugir da sala de espera, correr direto para as portas e ficar o mais longe possível de Henry mas eu não podia. Henry não estava aqui por mim. Ele queria ver Charlie e, como uma mamãe urso, eu não iria deixar isso acontecer.

Meus músculos destravaram e eu me movi para que estivesse no meio das portas duplas. “Você não é bem vindo aqui.”

Henry não parecia surpreso. “Eu não imaginava que seria.” “Então por que está aqui?” Eu ordenei, minhas mãos fechadas em punhos. “Esse é o último lugar que você deveria estar.” Ele olhou para onde a enfermeira Venter estava. Por sorte não havia mais ninguém no Lobby, mas isso logo iria mudar. “Eu sei. Eu não quero começar nada...” “Você nem deveria ter saído da prisão. Você esteve lá por quanto tempo? Cinco anos no máximo e agora você saiu, podendo andar e aproveitar o que quiser, mas e Charlie que perdeu tudo?” Eu balancei minha cabeça, respirando pesado. Puta injustiça. “Você não vai ver ele.” “Roxy,” Enfermeira Venter disse baixo. “Eu sei que você percebeu que...” Eu me virei para ela. “Então você concorda com isso? Está do lado dele?” Traição era um acido no fundo da minha garganta. Eu sabia que isso era desnecessário. Ela estava apenas fazendo seu trabalho, mas minha frustração e desespero estavam a segundos de me tornar irracional. Eu não me importava com seu trabalho. Tudo que eu me importava era sobre o quão injusto isso era para Charlie.

Suas sobrancelhas demonstravam simpatia. “Não é um problema de estar de um lado. Os pais de Charlie – seus guardiões – deram permissão. E, a não ser que Charlie diga que não quer vê-lo, por pior que isso soe, ele está permitido.” Minha boca caiu aberta. “Charlie não fala uma sentença a mais de seis anos! E como ele, de repente, vai expressar sua desaprovação com algo?” Eu me virei, olhando para Henry. “Você sabia disso? Que Charlie não fala há anos?” Ele desviou o olhar, um músculo pulsando em seu maxilar.

Eu dei um passo para frente. “Oh, isso é difícil de ouvir? Por que foi algo que você fez para ele?” “Roxanne.” Enfermeira Venter pegou meu braço com seus dedos frios. “Eu acho que seria melhor se você fosse embora.” Soltando meu braço, eu estava a segundo de explodir em insultos e palavrões, mas meu olhar furioso encontrou o seu. Ela não estava apenas olhando

para mim, ela estava implorando com seu olhar para deixar isso para lá – para ir embora daqui porque não havia nada que ela pudesse fazer.

Não havia nada que eu pudesse fazer.

Eu tomei vários fôlegos que não me levaram a lugar nenhum. Tudo que eu pude fazer foi concordar em sua direção antes de pegar minha bolsa. Era como andar pela areia movediça. Cada célula no meu corpo dizia para eu não sair do prédio, mas eu sai. Usando toda força de vontade para me conter, eu consegui levar minha bunda para fora do prédio, abaixo do céu e cheguei na metade do caminho para meu carro no estacionamento.

“Roxanne.” Meu olhos arregalaram. Oh puta merda. Embasbacada, eu me virei vagarosamente.

Henry estava logo atrás de mim. “Eu sei que você está triste...” “Você é tão bom observador.” Ele ignorou isso. “E você tem todo o direito de estar.” Encarando ele, eu sabia que iria acabar fazendo algo estúpido se eu não me tirasse dali tanto quanto eu sabia que aquelas nuvens negras iriam derramar.

“Me deixe em paz,” eu disse, agarrando minha bolsa mais forte enquanto me virava. Eu aumentei o passo, dando volta em uma van.

Um raio iluminou as nuvens negras sobre minha cabeça e o trovão ressoou, tão alto que percorreu meu peito. Outro clarão brilhou como uma bola de discoteca e eu me foquei em contar os segundos entre a luz e o trovão.

Então eu vi meu carro.

Melhor ainda, eu vi o que estava do lado do meu carro. Era um Mustang velho – direto dos anos 70, cor cereja. A placa também era familiar. Estava escrito BBRB e eu sabia o que isso significava.

Bad Boys Are Better27 .

Puta merda era o carro de Henry – o mesmo que ele tinha no colegial e que ele e seu pai haviam restaurado. O mesmo carro que ele e seus amigos usavam para pegar meninas, como algo saído direto de um filme ruim.

Henry saiu da prisão logo depois de destruir a vida do meu melhor amigo e seu maldito carro – seu orgulho e felicidade – estava esperando por ele.

“Por favor, me dê apenas alguns segundos. É tudo que estou pedindo.” Henry segurou meu braço.

E eu me descontrolei.

Fúria explodiu dentro de mim como uma faísca em uma poça de gasolina. Meu cérebro disparou e o senso comum pulou do alto de um prédio. Eu não estava pensando mais, apenas sentindo raiva, tanta que parecia que ela saia do meu corpo. Eu enfiei a mão na minha bolsa e peguei a primeira coisa substancial que meus dedos encontraram e atirei, usando meu braço como uma lançadora perfeita para a MLB.

A pesada cópia de capa dura de New Moon voou pelo ar como uma pedra –parecida com a pedra que destruiu nossas vidas – e foi direto para o para brisas do Mustang de Henry.

O vidro quebrou.

Assim como nossas vidas tinham quebrado naquela noite no lago.

27 Meninos Maus São Melhores.

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