v.8, n. 8 2021
Expediente
Sumário Agradecimentos 4 Editorial 5-7
DOSSIÊ A METRÓPOLE EM PRETO E BRANCO: análise das mudanças na paisagem urbana de Belo Horizonte com base no acervo ASCOM (1947-1967) Alessandro Borsagli
8-28
A DIFUSÃO DA FOTOGRAFIA COMO DOCUMENTO ARQUIVÍSTICO: a Praça da Estação nos conjuntos documentais do APCBH Suellen Alves de Melo
29-50
PRINCIPAIS ADQUIRENTES DE LOTES DE BELO HORIZONTE 1895-1931: segundo o índice de lotes urbanos do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH) Maria Lúcia Prado Costa
51-68
A VOZ DELAS: análise de discursos das representantes da ALEM no acervo audiovisual da CMBH (2001-2005) Maria Ferraz
69-94
ENTREVISTA Maria do Carmo Andrade Gomes
95-99
ARTIGOS LIVRES LUGAR E MEMÓRIA: percepções e vivência escolar no contexto da modernidade no Instituto de Educação de Minas Gerais, em Belo Horizonte (MG) Juliana de Lima Caputo Juliana Lima de Almeida Bastos Yasmin Sthefany Xavier Almeida Reis
100-118
UMA BREVE CENA DE MOVIMENTOS CULTURAIS NEGROS EM BELO HORIZONTE (1995-2019) Denilson Alves Tourinho
119-133
“FUTEBOL É PAIXÃO, COPA DO MUNDO É NEGÓCIO”: reforma do Mineirão pelo olhar da imprensa Belo-Horizontina Bryan Douglas Martins de Miranda
134-154
ENTRE A INTEGRAÇÃO E A FRAGMENTAÇÃO: um olhar para a relação entre Sabará e Belo Horizonte Ana Lídia de Paula Santos
155-169
BH: cidade censurada Reynaldo Luiz Calvo Júlia Calvo 170-185
ARQUIVO NA SALA DE AULA Proposta Pedagógica 1 QUEM É ESSA RUA? A escolha dos nomes das ruas como parte do processo legislativo Rúbia Dias
186-194
Proposta Pedagógica 2 URBANIZAÇÃO E MODERNIZAÇÃO BRASILEIRA: aspectos da história local Lucimar Lacerda Machado Coelho
195-199
Agradecimentos
A REAPCBH é uma publicação eletrônica que tem por objetivo divulgar
trabalhos
científicos
que
contribuam
para
o
desenvolvimento dos debates sobre a história de Belo Horizonte, assim como o campo de estudos arquivísticos. Graças à valiosa colaboração de diversas pessoas que aceitaram dispensar seu tempo e seus conhecimentos em avaliações criteriosas, a Revista chega a sua oitava edição. Agradecemos a atenção dispensada e os trabalhos realizados com empenho e dedicação. Agradecemos também ao Conselho Consultivo pela disposição em
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sempre nos orientar no necessário.
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Editorial É com muita satisfação que entregamos ao público a 8ª edição da REAPCBH. Esta edição da revista marca os 30 anos de existência do APCBH e por isso tem um caráter especial, com a publicação do Dossiê “O Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte como fonte de pesquisa da cidade”. Os artigos que compõem o dossiê refletem sobre a importância do acervo do APCBH para o desenvolvimento de pesquisas acadêmicas, em diferentes áreas do conhecimento, assim como o uso de seus documentos em sala de aula por professores.
Ao longo desses anos de existência do APCBH, a instituição enfrentou muitos desafios e também alcançou muitas conquistas. Hoje é reconhecido como uma instituição de referência para diversos arquivos municipais, no que se refere às suas metodologias de trabalho. O seu acervo é estudado por pesquisadores de diversas partes do país, assim como o cidadão comum encontra na documentação sob a guarda do APCBH a possibilidade de comprovar seus direitos, esclarecer suas dúvidas, fazer pesquisas e ampliar seus conhecimentos.
Destaca-se o acervo da Assessoria de Comunicação Social do Município (ASCOM), que possui diversos documentos, com ênfase para as fotografias, amplamente consultadas por pesquisadores. Neste dossiê da revista, temos dois artigos que se debruçaram na análise dessa documentação iconográfica, “A metrópole em preto e branco: análise das mudanças na paisagem urbana de Belo Horizonte com base no acervo ASCOM (1947/1967)”, do pesquisador e geógrafo Alessandro Borsagli, e “A difusão da fotografia como documento arquivístico: a Praça da Estação nos conjuntos documentais do APCBH”, da pesquisadora e arquivista Suellen Alves de Melo. Os artigos ressaltam a importância desse acervo de fotografias para a memória da cidade e para a compreensão das mudanças urbanas. O APCBH também possui outros acervos
coletiva, as transformações sociais e paisagísticas ocorridas ao longo do tempo.
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SUDECAP, que são de grande relevância para o estudo sobre a cidade e sua identidade
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de caráter iconográfico que podem ser encontrados em fundos como BELOTUR e
Partimos para o artigo da historiadora Maria Lúcia Prado Costa, intitulado “Principais adquirentes de lotes de Belo Horizonte: 1895-1931 segundo o índice de lotes urbanos do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH)”, que também tem como fonte de pesquisa os Relatórios dos Prefeitos ao Conselho Deliberativo, que estão sob a guarda do APCBH. Em seguida, temos o artigo de Maria Ferraz intitulado “A voz delas: análise de discursos das representantes do movimento lésbico no acervo audiovisual da CMBH”, que estuda a documentação da Câmara Municipal de Belo Horizonte, que está sob a guarda do APCBH e disponível para pesquisas. A historiadora tem como fonte de pesquisa, neste artigo, os registros de falas em gravações de reuniões da CMBH, um acervo ainda pouco explorado pelos pesquisadores.
Encerramos o dossiê com a reflexiva entrevista de Maria do Carmo Andrade Gomes, que já foi gestora do APCBH, atuando em diversas frentes de trabalho na instituição. A vida da historiadora se entrelaça à trajetória do APCBH de forma marcante para ela e também para a instituição, que Maria do Carmo conduziu enfrentando desafios e alcançando conquistas.
Para além do dossiê, a revista traz artigos que refletem sobre Belo Horizonte em diferentes aspectos, como o trabalho intitulado “Lugar e memória: percepções e vivência escolar no contexto da modernidade no Instituto de Educação de Minas Gerais, em Belo Horizonte - MG”, que aborda a relação de alunos e ex-alunos com o IEMG. Também, nesta edição, temos o artigo “Uma breve cena de movimentos culturais negros em Belo Horizonte (1995-2019)”, que apresenta as atividades culturais que ganham cena na capital, no contexto do tricentenário da luta de Zumbi dos Palmares, sendo uma delas o Festival de Arte Negra (FAN). Em seguida, trazemos o artigo “Futebol é paixão, Copa do Mundo é negócio: a reforma do Mineirão pelo olhar da imprensa BeloHorizontina”, discussão realizada com base nos periódicos jornalísticos da época da reforma do estádio. O artigo “Entre a integração e a fragmentação: um olhar para a relação entre Sabará e Belo Horizonte” aborda as relações de Sabará com a capital
para o seu falecido pai, Reynaldo Luiz Calvo, trazendo à luz um texto cheio de reflexões, escrito pelo arquiteto, e guardado há muito anos em sua gaveta. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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livres, a REAPCBH traz uma homenagem da professora Júlia Calvo, da PUC Minas,
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mineira, no que se refere à questão da metropolização. Encerrando a seção de artigos
A edição comemorativa dos 30 anos do APCBH fecha-se com duas propostas pedagógicas de uso de documentos, na seção “O Arquivo na Sala de Aula”. As propostas de Rúbia Dias e Lucimar Lacerda Machado Coelho foram pensadas com o uso de documentos do acervo do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, que possui grande potencial para professores e escolas da capital mineira, para tratar de diversos temas com os estudantes.
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Por fim, desejamos uma boa leitura, repleta de reflexões!
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Dossiê
A METRÓPOLE EM PRETO E BRANCO: análise das mudanças na paisagem urbana de Belo Horizonte com base no acervo ASCOM (1947-1967) The metropolis in black and white: analysis of the urban landscape of Belo Horizonte based on ASCOM collection (1947-1967)
Alessandro Borsagli*1
RESUMO: O artigo analisa, a partir do acervo de imagens da Assessoria de Comunicação Social do Município (ASCOM), as transformações ocorridas na paisagem urbana da cidade de Belo Horizonte entre os anos de 1947 e 1967, período que corresponde ao processo de metropolização da capital de Minas Gerais. Nesse sentido, a partir das análises realizadas nas imagens do acervo que se encontra sob a guarda do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, torna-se possível dividir os registros fotográficos das administrações municipais em dois períodos, um de cunho técnico e outro de cunho populista. As imagens apresentam não só grande valor para a compreensão das mudanças ocorridas na capital mineira durante o processo de metropolização, mas também um valor de representação visual das administrações municipais do período analisado. Palavras chave: Belo Horizonte. ASCOM. Iconografia. Paisagem urbana. ABSTRACT: This article approaches the transformations occurred at Belo Horizonte urban landscape among 1947 to 1967 based on Assessoria de Comunicação Social do Município (ASCOM) collection. This period is associated to Minas Gerais capital metropolization. In this sense, the analyses of images presented in the ASCOM collection allowed to divide the records of municipal administration in two period, technical and populist. The images represent are a great value for the comprehension of changing occurred in the capital during the metropolization process, in addition, also represented a great value to visual representation of municipal administration in the analyzed period. Keywords: Belo Horizonte. ASCOM. Iconography. Urban landscape.
Introdução A cidade de Belo Horizonte, ao longo dos 124 anos de existência passou por rápidas e profundas transformações de ordem urbana e ambiental, entre outras transformações que modificaram de maneira notável a paisagem urbana da capital de
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Mestre em Geografia pela PUC Minas, autor do site Curral del Rey e de diversos livros sobre a Geografia Histórica de Belo Horizonte. E-mail: borsagli@gmail.com
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Minas Gerais. Nesse contexto, onde a paisagem é modificada e adaptada de acordo com
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os interesses e necessidades de diversos segmentos da sociedade, a fotografia exerce um papel de grande importância para o conhecimento e análise das paleopaisagens. No caso de Belo Horizonte, cidade pensada, planejada e parcialmente construída entre os anos de 1894 e 1897, as mudanças ocorridas na paisagem se deram em um curto intervalo de tempo, onde as transformações urbanas e paisagísticas mais notáveis aconteceram em períodos distintos ligados entre si, deixando fragmentos na paisagem e na memória da população, que nos últimos anos tem se interessado cada vez mais por fotografias que ajudam a compreender a dinâmica da evolução urbana da capital. Nesse sentido, o acervo da Assessoria de Comunicação Social do Município (ASCOM), atualmente sob a guarda do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH), possui grande importância entre os acervos iconográficos que preservam os elementos urbanos existentes, modificados ou demolidos e que em algum momento foi o presente do que hoje é o passado. Portanto, o objetivo deste artigo é analisar, a partir das imagens do acervo da Assessoria de Comunicação Social do Município de Belo Horizonte, as transformações ocorridas na paisagem urbana da cidade de Belo Horizonte entre os anos de 1947 e 1967, que atestam a notável transformação urbana pela qual passou Belo Horizonte, em um período que se caracteriza pelo processo de metropolização da capital mineira e por consequência, pelas profundas modificações em sua paisagem urbana. Nesse contexto, é importante observar que entre os anos de 1950 e 1964, Belo Horizonte apresentou um aumento populacional de cerca de 270%, passando de 352.724 habitantes no ano de 1950 para cerca de um milhão de habitantes no ano de 1966, resultado do processo de metropolização da capital, iniciado por volta de 1950 e desencadeado, entre outros fatores de cunho social, político e econômico, pela consolidação da Cidade Industrial, criada por decreto no ano de 1941 e o aumento da exploração do minério de ferro no Quadrilátero Ferrífero (BELO HORIZONTE, 1979, p.256), onde Belo Horizonte se encontrava em posição geográfica favorável para o estabelecimento de siderúrgicas, indústrias e demais serviços que proporcionaram o
paisagem em um determinado tempo e espaço (SILVA et al, 2017, p.2), possibilitando, no âmbito urbano, compreender como se deu a transformação da paisagem, sendo REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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A linguagem visual, no caso aqui abordado a fotografia, proporciona a leitura da
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acentuado crescimento a partir da primeira metade da década de 1950.
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considerada por parte do meio técnico científico como imagem da realidade (GOLTARA; MENDONÇA, 2015, p.120). Os acervos iconográficos que registram as transformações ocorridas na paisagem de Belo Horizonte podem ser considerados reminiscências de um período de importantes transformações urbanas, políticas, econômicas e sociais, dentro do qual as fotografias exercem um papel muito mais complexo do que apenas o papel associado à contemplação, tornando-se um importante objeto de análise histórica e atestando a mudança paisagística ocorrida na capital, além de atestar, por meio da imagem, as transformações ocorridas ao longo das décadas a partir da constante remodelação do espaço.
Fotografia, paisagem e Belo Horizonte nas primeiras décadas A fotografia surgiu no século XIX, em um momento em que o ocidente passava por profundas transformações científicas, econômicas, sociais e culturais, e rapidamente tornou-se um símbolo da expressão da realidade que deveria ser perpetuada. No caso do Brasil, a fotografia chegou por volta de 1840 no Rio de Janeiro e em poucas décadas já havia se disseminado pelas principais cidades brasileiras possuindo uma função geralmente funcional, se resumindo a uma forma de produção de retrato ou registro documental (MENDES, 2003, p.185). Para John Tagg, a fotografia não é uma ideia, e sim itens materiais “que são produzidos por um modo de produção elaborado, e distribuídas, circuladas e consumidas dentro de um certo conjunto de relações sociais” (TAGG, 1993, p.188). Para o autor, as imagens são significadas e entendidas dentro de inúmeras relações de sua produção, ao mesmo tempo em que elas são plenas de ambiguidades, portadoras de significados não explícitos e de omissões pensadas, calculadas, como observado por Kossoy (2002). Visto a sua natureza físico-química e, atualmente, eletrônica/digital, a fotografia ganhou ao longo do tempo um notável status de credibilidade. Para Kossoy (2002) a imagem fotográfica depende de três componentes que possibilitem sua existência no
técnico.
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registro; o fotógrafo, o autor, quem a idealiza por meio de processos cultural, estético e
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mundo: o assunto, que é o objeto do registro; a tecnologia, que viabiliza tecnicamente o
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Nesse contexto, torna-se necessário ainda observar que, com o advento de novas técnicas, a fotografia a partir da década de 1860 tornou-se cada vez mais popular no ocidente, cujo interesse atendia não só as camadas menos abastadas da sociedade, mas também os interesses governamentais, que utilizava a fotografia como propaganda e registro documental (FATH, 2020). Para Mauad (2005): A fotografia deve ser considerada como produto cultural, fruto de trabalho social de produção sígnica. Nesse sentido, toda a produção da mensagem fotográfica está associada aos meios técnicos de produção cultural. Dentro dessa perspectiva, a fotografia pode, por um lado, contribuir para a veiculação de novos comportamentos e representações da classe que possui o controle de tais meios, e, por outro, atuar como eficiente meio de controle social por meio da educação do olhar (MAUAD, 2005, p.144).
Partindo da ideia de que a fotografia é um produto cultural de grande importância artística, documental e comprobatória, ressaltando que ela não é apenas uma forma de representação da realidade, e sim uma das formas de ver, perceber e apreender a paisagem, ela pode ser considerada um capítulo à parte na história de Belo Horizonte, cidade imaginada, planejada e construída sobre o sítio que anteriormente era ocupado pelo arraial do Curral del Rey, destruído para a construção da nova capital de Minas Gerais (BORSAGLI, 2016a, p.19). A nova capital de Minas Gerais surgiu em um momento onde a fotografia passava por transformações que permitiriam anos mais tarde a sua popularização, possibilitando ainda o estabelecimento de novas atribuições à imagem fotográfica. De início, a fotografia foi utilizada pela Comissão Construtora da Nova Capital (CCNC) como um instrumento que atestava a transformação do real, da paisagem que desapareceria com o avanço das obras de construção da Cidade de Minas 2 (BARTOLOMEU, 2003, p.39), e a criação de um gabinete fotográfico tinha não só finalidades documentais, mas também de propaganda, uma vez que a ideia de construção de uma cidade racional e geométrica, onde o espaço deveria ser hierarquizado e a natureza
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Primeira denominação da nova capital. No ano de 1901 passou a se chamar Belo Horizonte, denominação herdada do antigo arraial do Curral del Rey, que teve o seu nome alterado no ano de 1890 para arraial de Belo Horizonte. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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controlada, era até então inédito no Brasil.
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Nos primeiros anos que se sucederam à inauguração da capital, ocorrida no ano de 1897, a fotografia com finalidades de registro documental continuou a ser feita de maneira regular à quantidade de equipamentos fotográficos que existiam na cidade. Destacam-se os fotógrafos Francisco Soucasseaux e Raimundo Alves Pinto, autores de dois álbuns fotográficos compostos de inúmeras fotografias de uma cidade moderna, que rompia com os becos tortuosos das antigas cidades surgidas no período colonial e exemplo a ser seguido pelos principais centros urbanos do Brasil republicano. Nesse mesmo período, as fotografias passaram também a ilustrar inúmeros cartões postais que levavam para fora do estado e mesmo do país as imagens e perspectivas de uma moderna cidade dos trópicos. Tal projeto político dotado de um plano urbanístico apresentava, nas dezenas de postais veiculados a partir das primeiras décadas do século XX, suntuosos edifícios em meio a grandes espaços vazios e paisagens pitorescas com fortes traços rurais, em grande parte conectadas ao ecletismo dos edifícios e à geometria das vias (BORSAGLI, 2016a, p.79). A partir da década de 1920, uma parte considerável das fotografias feitas pelo poder público possuía como principal característica o registro das obras de urbanização e saneamento realizadas em Belo Horizonte (Figura 1). É uma década que pode ser dividida em duas partes: na primeira metade da década, as fotografias apresentam, em geral, os elementos naturais como entraves à expansão do traçado ortogonal, com imóveis residenciais coexistindo com pastos, matas e cursos d’água em leito natural, responsáveis pela interrupção das vias planejadas. As imagens, como as imagens realizadas pela administração estadual de Mello Viana (1924-1926) serviriam como prova visual para a execução das obras que foram realizadas na segunda metade da década, visto a necessidade de se controlar o meio em
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prol de uma cidade salubre, higiênica e organizada.
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Dossiê Figura 1 - Obras de canalização do Ribeirão Arrudas
Legenda: Perspectiva das obras de canalização do Ribeirão Arrudas no ano de 1925 publicada na Revista Fon Fon a partir de uma matéria patrocinada pelo governo estadual. Fonte: Acervo Biblioteca Nacional, 1925.
Nesse contexto, observa-se que a partir do ano de 1926, as imagens das obras realizadas pelas administrações municipais passaram a ilustrar boa parte dos relatórios anuais apresentados ao Conselho Deliberativo do Município de Belo Horizonte, e após o ano de 1936, à Câmara Municipal. Os primeiros relatórios ilustrados foram elaborados na gestão de Christiano Machado (1926-1929) e contemplavam basicamente as obras de canalização, saneamento e pavimentação de vias (BORSAGLI, 2016a, p.123). Muitas das fotografias, organizadas em álbuns fotográficos denominados Calçamento de Ruas de Belo Horizonte, Obras de Canalização e Saneamento Básico de Belo Horizonte, Aspectos da Cidade de Belo Horizonte, Conjunto de Obras Públicas e
presidente do Estado Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, dentro do acordo político entre São Paulo e Minas Gerais, que elegeu grande parte dos presidentes do período da REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Machado, foram enviadas para diversos estados para fins de propaganda, uma vez que o
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Obras Públicas da Prefeitura de Belo Horizonte durante a gestão de Christiano
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República Velha (1894-1930), tinha pretensões de ser o próximo candidato à presidência da república, nas eleições de 1930. Nesse período, a fotografia em Belo Horizonte já havia se popularizado e os registros fotográficos passaram a ser mais regulares e abrangentes, a partir desse momento também praticado como hobby onde, além dos profissionais já habituados a registrar de maneira documental e artística diversos aspectos da capital, outros fotógrafos como Wilson Baptista e Augusto Guerra Coutinho passaram a registrar cenas do cotidiano de uma cidade que crescia para todos os lados e para cima (BORSAGLI, 2016, p.105). Através da lente dos fotógrafos, a transformação da paisagem urbana de Belo Horizonte a partir da década de 1930 foi sistematicamente registrada, e sob essa perspectiva, pouco estudada. Nesse contexto, é importante observar que a partir da associação homem natureza em um determinado tempo/espaço, e a ação coletiva com a finalidade de adaptar e modificar o meio a partir das necessidades específicas de cada grupo social, na busca de uma melhor adaptação ao sítio habitado, a paisagem urbana passa a existir, tornando-se objeto de análise e de reflexão com o intuito de se compreender as formas e as relações entre o meio e o ambiente construído, onde a fotografia, analisada de maneira criteriosa e ciente das motivações e interesses que envolveram a sua concepção, pode exercer um papel crucial no processo de reconstrução geográfico-histórico.
As imagens do acervo APCBH/ASCOM e a sua importância para a análise e compreensão das mudanças ocorridas em Belo Horizonte (1947-1967) De acordo com Miranda (2015), a Assessoria de Comunicação Social do Município de Belo Horizonte (ASCOM) foi criada no ano de 1992, após as alterações ocorridas nos órgãos responsáveis pela comunicação social da administração municipal e secretarias. No ano seguinte, o Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte recebeu uma
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grande quantidade de documentos da ASCOM, onde se destacam as imagens produzidas
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ao longo das administrações municipais das últimas oito décadas, distribuídas de maneira regular para os meios de comunicação da capital para fins de divulgação3. Possivelmente, os registros feitos pela divisão de comunicação social do município se iniciaram no período do Estado Novo (1937-1945), quando foi criada a Agência Nacional - órgão responsável pela divulgação dos atos realizados pela administração federal de Getúlio Vargas (1930-1945) - que produziu imagens durante os atos do então ditador4. As primeiras imagens do acervo da ASCOM possuem certa similaridade com as imagens produzidas pela Agência, como visitas às obras de infraestrutura urbana e eventos específicos, como inaugurações e cerimônias oficiais. Belo Horizonte era então administrada por Juscelino Kubitscheck de Oliveira (1940-1945), prefeito nomeado pelo interventor estadual Benedito Valadares (19331945), por sua vez, nomeado por Getúlio Vargas no ano de 1933. Ou seja, a criação de uma divisão responsável pelo registro e divulgação dos atos municipais nesse período está em conformidade com os planos federais de difusão e registro dos atos e realizações federais, fato também observado por Miranda (2015) ao se referir ao surgimento de um órgão responsável pela comunicação social do município. É importante observar também que as novas formas de gestão municipal consolidadas após 1930, possivelmente iniciadas na segunda metade da década de 1920, também contribuíram para a criação da divisão municipal de comunicação social em Belo Horizonte. As primeiras imagens identificáveis da ASCOM remetem ao ano de 1947, período em que Belo Horizonte, pela primeira vez em sua história, realizou eleições para a escolha do prefeito, até então nomeado pelo governo estadual. Nesse contexto, o período se caracteriza ainda pela realização das eleições gerais no Brasil após a queda de Getúlio Vargas, ocorrida entre os anos de 1945 e 1947, onde em uma das primeiras imagens do acervo da ASCOM (Figura 2) é possível observar as faixas de cunho político instaladas no vale do ribeirão Arrudas próximo à Estação
Muitas das imagens produzidas pelas administrações municipais do período analisado ainda se encontram nos acervos fotográficos da imprensa escrita de Belo Horizonte, sem identificação de sua origem. 4 Existem muitas imagens das visitas realizadas por Getúlio Vargas e por diversos presidentes da república a Belo Horizonte nos arquivos da Agência Nacional, onde a similaridade com o acervo iconográfico da ASCOM é notável. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Rodoviária e o Abrigo de Motoristas São Cristóvão.
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A imagem apresenta ainda o cotidiano de uma das regiões mais movimentadas de Belo Horizonte, tendo em primeiro plano a ponte da Rua Berilo, construída pela administração de Juscelino Kubitscheck com a finalidade de melhorar a mobilidade urbana de um trecho que já apresentava no período congestionamentos frequentes durante os horários de pico e nas passagens das composições ferroviárias (BORSAGLI, 2017b, p.281). Figura 2 – Ponte da Rua Berilo, no bairro Lagoinha de Belo Horizonte.
Legenda: Perspectiva da ponte da Rua Berilo, demolida no ano de 1981na Lagoinha, 1947. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
A segunda metade da década de 1940 se destaca por ser um período onde as transformações na paisagem urbana dos principais centros urbanos do Brasil ocorriam de forma abrupta e veloz, decorrentes do processo iniciado na Era Vargas, onde o incentivo econômico e os investimentos realizados pelo governo federal para a criação de zonas
na primeira metade da década de 1930.
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Horizonte pode ser considerada uma das protagonistas da reorganização urbana iniciada
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industriais levaram a profundas mudanças de ordem viária e urbana, da qual Belo
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Dentre as mudanças ocorridas nesse período, a modernização/verticalização da área central, a abertura/ampliação de vias, o estabelecimento de uma zona industrial no vale do ribeirão Arrudas no ano de 1936 e a contínua valorização das áreas mais afastadas do centro se encontram em conformidade com as políticas de remodelação urbana disseminadas pelo governo Vargas (BORSAGLI, 2015, p.27). Nesse contexto, as imagens produzidas na segunda administração de Octacílio Negrão de Lima (1947-1951) apresentam em geral as obras e benfeitorias realizadas ao longo da gestão do prefeito, dentre as quais se destacam as obras de construção das barragens de detenção do Leitão e do Acaba Mundo e o alargamento deste último no bairro Funcionários (Figuras 3 e 4). As imagens contemplam ainda as obras de instalação da drenagem pluvial na Cidade Jardim e diversas imagens panorâmicas feitas de pontos específicos da região central, perspectiva que se tornou recorrente nas administrações seguintes, em um momento em que a cidade se encontrava em um embrionário processo de metropolização que se consolidaria na gestão seguinte, de Américo Renné Giannetti (1951-1954). É importante ressaltar que a partir da administração de Negrão de Lima, as imagens não contemplam apenas as ações de infraestrutura urbana promovidas pelas administrações municipais, passando a abranger também os eventos, solenidades e o próprio cotidiano do prefeito e demais servidores do município que se encontravam no exercício de suas funções, possivelmente em consonância com o período político de cunho populista que emergiu a nível nacional após a renúncia de Getúlio Vargas em
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outubro de 1945.
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Dossiê
Figuras 3 e 4 – Obras no Córrego Acaba Mundo.
Legenda: Aspectos das obras de alargamento do canal do córrego do Acaba Mundo e construção da barragem de detenção nas cabeceiras do mesmo curso d’água, 1949. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
A gestão Giannetti possui, entre outras medidas de relevância para o estudo da história do processo de evolução urbana de Belo Horizonte, a criação de um Plano Diretor, a elaboração de um plano rodoviário municipal e a reforma do Parque Municipal (Figuras 5 e 6), realizações que visavam preparar a capital para a inevitável metropolização que, de acordo com a administração municipal do período (BELO HORIZONTE, 1954, p.75), figura como um dos motivos para a elaboração do plano e de obras que visavam resolver o “enclausuramento” da cidade nos horários de pico (BORSAGLI, 2016a, p.246). A ideia defendida pela gestão, de uma continuidade do planejamento estabelecido pela Comissão Construtora da Nova Capital (BELO HORIZONTE, 1952, p.22), também evocado por administrações anteriores demonstra que, mesmo preso a ideais de cunho político-tradicionalistas de ordem urbanística, existia uma preocupação da administração municipal para uma ação planejada, onde as obras que seriam executadas obedeceriam um plano racional, revelando não só a realidade físico-espacial, mas também as condições
que de fato acabou não ocorrendo.
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de trabalho eram imprescindíveis para o crescimento ordenado e equilibrado da capital, o
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socioeconômicas da capital, onde o estabelecimento de um plano e de uma metodologia
Dossiê Figuras 5 e 6 – Obras em Belo Horizonte.
Legenda: À esquerda: obras de canalização do córrego do Acaba Mundo no Parque Municipal, 1954. À direita: trecho recuperado da Estrada dos Borges, bairro Santa Inês no ano de 1954. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
Nesse contexto onde a metropolização já era uma questão concreta e que demandava soluções urgentes, a gestão do prefeito Celso Mello de Azevedo (1955-1959) se destaca pelos primeiros registros fotográficos oficiais dos inúmeros bairros populares que já existiam em Belo Horizonte, em consonância com a criação do Departamento de Bairros Populares (DBP), ocorrida no primeiro ano da administração, assim como a busca pelo estabelecimento de um planejamento que tinha como finalidade compreender a estrutura urbana da capital (BORSAGLI, 2016a, p.252). Os assentamentos informais já existiam em Belo Horizonte desde a sua fundação, no entanto, até o presente momento se conhece poucos registros visuais das primeiras favelas que inicialmente se assentaram dentro dos limites da Avenida do Contorno, ao mesmo tempo em que inexiste qualquer registro cartográfico ou menção de destaque nos relatórios oficiais. À medida em que eram urbanizadas as terras compreendidas dentro da Avenida do Contorno, as favelas foram sendo extintas e os seus moradores expulsos ou realocados em locais fora da zona urbana planejada (Figuras 7 e 8), sobre as quais Roger Teulières
Dentro desse contexto, os registros fotográficos passaram a mostrar não só as favelas, mas também a população de rua que crescia a cada ano, em Belo Horizonte, devido ao REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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um estudo geohistórico descritivo a respeito da formação das favelas da capital mineira.
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(1956), um dos poucos pesquisadores a abordar a questão no período 1897-1955, realizou
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acentuado fluxo, em grande parte causado pelo êxodo rural, que levava a migração de grandes contingentes populacionais para os centros urbanos. Figuras 7 e 8 – Migração em Belo Horizonte.
Legenda: À esquerda: cartaz instalado na Vila São Vicente em apoio ao trabalho realizado pelo DBP. À direita: moradores de rua, possivelmente retirantes, sob o Viaduto de Santa Tereza, 1955. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
Dentro dos estudos sobre o processo de evolução urbana de Belo Horizonte, a gestão de Mello de Azevedo ainda se destaca pela criação de espaços de lazer infantil em algumas das principais vias e praças da capital e a busca pela solução hídrica da capital (Figuras 9 e 10), que nesse período já apresentava uma crescente disparidade entre a disponibilidade e o consumo (BORSAGLI, 2016b, p.146). Os estudos dos locais onde seriam assentados os tubos de aço que levariam as águas para a capital foram registrados pela divisão responsável pela comunicação social do município, assim como as demais obras realizadas pela gestão que havia compreendido que a metropolização era iminente, assim como os problemas decorrentes da disparidade cada vez mais crescente entre o crescimento populacional e urbano e as obras de infraestrutura necessárias para o pleno funcionamento da cidade. Importante ressaltar que uma parte considerável das fotografias produzidas pela gestão se encontram em
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encerrada em 31 de janeiro de 1959.
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consonância com as informações contidas nos relatórios elaborados ao longo da gestão,
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Dossiê Figuras 9 e 10 – Espaços de lazer e obras em Belo Horizonte.
Legenda: À esquerda: um dos “recantos” construídos para o lazer infantil na Avenida Brasil, 1956. À direita: prefeito e técnicos analisam o local para a construção da adutora do Rio das Velhas, [1956?]. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
A gestão do prefeito Amintas de Barros (1959-1963) foi marcada pelo populismo e pelo emprego da palavra metrópole pela primeira vez em seus relatórios, em um momento onde a capital começava a sofrer as consequências causadas pela disparidade entre o acentuado crescimento urbano e a infraestrutura necessária para dar suporte ao crescimento. De acordo com Borsagli (2016a), Belo Horizonte era o retrato do caos gerado pelo processo de metropolização para o qual as administrações municipais não haviam se preparado. A paisagem urbana se encontrava em transformação com a construção de grandes edifícios de uso misto, ao mesmo tempo em que as principais vias fora da Avenida do Contorno eram asfaltadas, obras regularmente visitadas pelo prefeito, que fazia questão de aparecer em eventos oficiais com parentes, e de posar como um operário, um líder que buscava estreitar a sua relação com as massas a partir de imagens minuciosamente preparadas e distribuídas para os meios de comunicação do período (Figuras 11 e 12). Nesse sentido, não só a administração de Amintas de Barros, mas também a de Jorge Carone Filho podem ser consideradas como a materialização de um estágio político
gerados por esse processo.
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geral, se tornava cada vez mais urbana, e consequentemente mais suscetível aos conflitos
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que ocorreu no Brasil entre os anos de 1946 e 1964, quando a sociedade, de um modo
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A administração de Amintas de Barros possui ainda como característica a notável quantidade de registros dos eventos, visitas e demais acontecimentos ocorridos durante sua administração, fato que acabou por se tornar comum nas gestões seguintes. Figuras 11 e 12 – O Prefeito de Belo Horizonte, Jorge Carone Filho.
Legenda: À esquerda: o prefeito com uma ferramenta durante o asfaltamento de vias no bairro Padre Eustáquio. À direita: o prefeito durante a visita do vice-presidente João Goulart em julho de 1960. À direita de João Goulart o candidato ao governo do estado Tancredo Neves. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
A administração de Jorge Carone Filho (1963-1965) foi responsável por profundas transformações na paisagem urbana de Belo Horizonte a partir da adoção de uma postura agressiva frente aos problemas agravados pela metropolização, onde a mobilidade tem destaque em meio ao pacote de obras lançado pelo prefeito no primeiro ano de gestão. Aliado político de João Goulart, Carone conseguiu um financiamento federal para a realização de obras que visavam a melhoria da mobilidade, como a cobertura do córrego do Acaba Mundo, na Rua Professor Morais, a retirada dos trilhos da Rede Mineira de Viação na Praça Vaz de Melo e Avenida Nossa Senhora de Fátima, o asfaltamento e alargamento de vias, como as obras de ligação da Avenida dos Andradas, responsável pelo estreitamento da Praça Rui Barbosa, até então conectada ao canal do ribeirão Arrudas
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de melhoria do tráfego na área central de Belo Horizonte.
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(Figura 13), e o corte dos Fícus na Avenida Afonso Pena e Bias Fortes sob justificativa
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A administração foi ainda responsável pela consolidação da Ferrobel, criada em outubro de 1961 pelo seu antecessor com a finalidade de promover a industrialização do município a partir dos recursos financeiros alcançados pela exploração mineral responsável nos anos seguintes pela mudança no perfil da Serra do Curral. A cobertura do Acaba Mundo e a supressão das árvores na área central da capital, iniciada pela administração Carone inaugurou uma nova estética urbana, onde os elementos naturais, antes integrados e controlados pelo racionalismo geométrico da cidade, passaram a ser erradicados da paisagem urbana como observou Borsagli (2016), que considera que a breve gestão do prefeito, cassado em janeiro de 1965 pela ditadura militar instaurada no Brasil nove meses antes, foi a responsável pela adoção de um modelo urbano que seria seguido pelas gestões municipais seguintes.
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Legenda: (A) Obras de aprofundamento do leito do córrego do Acaba Mundo para a sua posterior cobertura. (B) Obras de ligação viária entre as Avenidas do Contorno e Andradas na Praça Rui Barbosa, 1963. (C) Obras de retirada dos trilhos em trecho próximo à Praça Vaz de Melo, 1963. (D) O prefeito Jorge Carone Filho em palestra a respeito dos resultados obtidos da exploração mineral pela Ferrobel. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
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Figuras 13 – Obras em Belo Horizonte.
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O sucessor de Jorge Carone Filho na administração da capital mineira foi Oswaldo Pieruccetti, indicado pelos militares após a cassação do prefeito e de seu vice. O novo prefeito, em seus dois anos de administração, foi responsável pela continuidade e intensificação das obras na capital, onde se destaca o programa de reforma urbana intitulado Nova BH 66, nascido de uma parceria entre a Prefeitura e a Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais. O programa foi criado com o objetivo de realizar a melhoria na infraestrutura urbana de Belo Horizonte, que apresentava sinais de colapso desde a década de 1950. Com uma população de um milhão de habitantes, a capital apresentava problemas de toda ordem, desde córregos poluídos e esgotos transbordando na região central, até a questão da mobilidade e da segurança, com a população passando a construir muros e grades para se abrigar da crescente violência urbana que se agravou ao longo da década de 1960. Dentro dos objetivos propostos, as bases do projeto eram promover a canalização, cobertura e alargamento dos cursos d’água de Belo Horizonte e o asfaltamento dos logradouros, estreitamento das calçadas, abertura de novas vias e a regularização do
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abastecimento de água (Figura 14).
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Figura 14 – Obras em Belo Horizonte
Legenda: (A) Obras de asfaltamento da Avenida Afonso Pena no ano de 1965, ao fundo o prefeito Oswaldo Pieruccetti e o governador Magalhães Pinto. (B) O prefeito, operários e citadinos observam um curso d’água canalizado, 1966. (C) Obras de alargamento das alamedas da Praça da Liberdade no primeiro ano da gestão de Sousa Lima, 1967. (D) Asfaltamento de um trecho da Avenida João Pinheiro após a retirada das árvores da via, 1967. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
A breve administração de Pieruccetti foi responsável pela consolidação de um modelo urbanístico centrado no automóvel, um processo iniciado na década de 1930 e amplamente registrado pela divisão de comunicação social de Belo Horizonte nas gestões municipais após o ano de 1947. A paisagem urbana da porção do município compreendida dentro do perímetro delimitado pela Comissão Construtora da Nova Capital no ano de 1895, em pouco mais de duas décadas foi modificada de maneira profunda a partir da verticalização,
urbana, tendo o automóvel como elemento conformador do espaço urbano, passaram a ser empregadas não dentro do perímetro, mas também em todo o município. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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urbano, e a partir da gestão de Luiz Gonzaga de Sousa Lima as obras de infraestrutura
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impermeabilização do solo e supressão e ocultamento dos elementos naturais em meio
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Nesse sentido, a análise das imagens do período permite reconhecer não só os processos acima observados, mas também os traços e marcas na paisagem o que permite uma reconstituição do passado (Figuras 15 e 16). Figuras 15 e 16 - Perspectiva norte da parte da área central de Belo Horizonte nos anos de 1947 e 1965 tendo o edifício Acaiaca (à esquerda em construção e à direita concluído) como principal referência.
Legenda: As imagens, apesar da perspectiva aproximada, são importantes para a compreensão das alterações ocorridas na paisagem urbana da área central de Belo Horizonte entre os anos de 1947 e 1967. Fonte: Acervo APCBH/ASCOM
Considerações Finais O artigo buscou analisar as mudanças ocorridas na paisagem urbana de Belo Horizonte entre os anos de 1947 e 1967 a partir das fotografias selecionadas que integram o acervo da ASCOM, uma vez que o acervo possui grande importância para a história da evolução urbana de Belo Horizonte, em um período caracterizado pelo processo de metropolização da capital mineira e por consequência, as profundas modificações em sua paisagem urbana. O conjunto de imagens produzidas no período analisado pode ser dividida em dois momentos: no primeiro momento, entre os anos de 1947 e 1960, é clara a priorização para fins de registro/propaganda, das obras de infraestrutura urbana e de saneamento realizadas pelas gestões de Octacílio Negrão de Lima, Américo Renê Giannetti e Celso Mello de
porém em menor quantidade se comparado com os registros de obras.
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identificados também aparecem nos conjuntos fotográficos das referidas administrações,
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Azevedo. Os registros de eventos, cerimônias e demais compromissos oficiais até agora
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O segundo momento engloba as administrações de Amintas de Barros, Jorge Carone e Oswaldo Pieruccetti, onde os registros dos compromissos oficiais estão na mesma quantidade em relação ao número de registros das obras de infraestrutura urbana e de saneamento. É importante ressaltar que, tanto Barros quanto Carone, realizaram gestões de forte apelo populista, ao mesmo tempo em que a primeira gestão de Pieruccetti representava, em parte, a antítese das administrações anteriores, ao mesmo tempo que deu sequência às obras iniciadas na administração Carone, fato proporcionado por ele ser um preposto do regime militar instaurado no Brasil após o golpe de 1964, uma vez que foi conduzido de maneira indireta para o cargo de prefeito após a cassação de Carone em janeiro de 1965. Nesse sentido, o acervo da ASCOM permite a reconstrução paisagística de uma época de grande importância para a compreensão dos processos que culminaram na metropolização da capital mineira e das políticas urbanas, econômicas e sociais que de alguma maneira nortearam a transformação do espaço urbano de Belo Horizonte, que figura no cenário nacional como a capital que mais cresceu entre os anos de 1950 e 1970. As imagens do período analisado permitem ainda traçar um paralelo de cunho geográfico-urbano com a expansão do tecido urbano da capital, uma vez que grande parte dos registros fotográficos realizados durante a gestão de Negrão de Lima se concentram nas zonas urbana e suburbana da capital, e em alguns pontos de interesse da sua administração e das administrações seguintes, como as obras de captação dos mananciais de abastecimento de Belo Horizonte. Na gestão de Pieruccetti os registros abarcam quase todo o município, em geral obras de canalização de cursos d’água, abertura e pavimentação de vias em locais que oficialmente não possuem registros fotográficos, fato que atesta, de maneira visual, a rápida expansão urbana da capital mineira. Enfim, o acervo da ASCOM é de grande importância para a memória do município de Belo Horizonte, para a identidade coletiva e para o conhecimento de um passado que em algum momento foi o presente, além dos processos que acarretaram na
um futuro próximo, de revelar novas informações sobre o processo de evolução urbana de Belo Horizonte. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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magnitude e abrangência, ainda se encontra em fase de identificação, tendo potencial, em
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transformação da paisagem urbana no período analisado. É um acervo que pela sua
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Referências BARTOLOMEU, Anna Karina Castanheira. Pioneiros da fotografia em Belo Horizonte: o gabinete fotográfico da Comissão Construtora da Nova Capital (1894-1897). Varia História, n. 30, Belo Horizonte, julho 2003. BORSAGLI, Alessandro. A metrópole no horizonte: o desenvolvimento urbano de Belo Horizonte da Era Vargas 19301945. Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 2, p. 24-45, 2015. ____. Rios invisíveis da metrópole mineira. Belo Horizonte, Clube de Autores, 2016a. ____. Belo Horizonte em pedaços: fragmentos de uma cidade em eterna construção. Belo Horizonte, Clube de Autores, 2016b. ____. Sob a sombra do Curral del Rey: contribuições para a história de Belo Horizonte. Belo Horizonte, Clube de Autores, 2017. GOLTARA, Giovani Bonadiman; MENDONÇA, Eneida Maria Souza. O emprego da fotografia como método de análise da transformação da paisagem: o caso de Anchieta. Paisagem e Ambiente: ensaios. n. 36. São Paulo, 2015. p. 119-136. KOSSOY, Boris. Realidades e ficções na trama fotográfica. 3. ed. São Paulo: Ateliê Editorial, 2002. MAUAD, Ana Maria. Na mira do olhar: um exercício de análise da fotografia nas revistas ilustradas cariocas, na primeira metade do século XX. Estudos de Cultura Material. Anais do Museu Paulista, v.13, n. 1, junho 2005. MENDES, Ricardo. Once upon a time: uma história da História da Fotografia brasileira. Anais do Museu Paulista. São Paulo. n 6/7. p. 183-205 (1998-1999). Editado em 2003. MIRANDA, Thiago Henrique Costa. A trajetória e o tratamento destinado aos negativos 35mm do acervo ASCOM. Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v.2, p.98-112, Belo Horizonte, 2015. SALES, Álvaro Américo Moreira. Coleção João Gusman Júnior: registro das obras de saneamento de Belo Horizonte. Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v.6, p.62-83, Belo Horizonte, 2019. SILVA, Itállo Fernando de Freitas et al. A fotografia como recurso mediático no ensino de Geografia: a paisagem urbana em múltiplos olhares e convergências. In: ENCONTRO NACIONAL DE PRÁTICA DE ENSINO EM GEOGRAFIA, 18, 2017. Anais [...] Belo Horizonte, 2017. TAGG, John, The burden of representetion: essays on photographies and histories. Minneapolis: University of Minnessota Press, 1993, 188p. TEULIÈRES, Roger. Bidonvilles du Brésil: les favelles de Belo Horizonte. Revue Les Cahiers d'outre-mer. Bordeaux: v. VIII, 1955, p.30-55.
Fontes documentais BELO HORIZONTE (MG). Prefeitura. Coleção Relatórios anuais de atividades da Prefeitura de Belo Horizonte 19401967. Acervo Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte.
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BELO HORIZONTE (MG). Prefeitura. PLAMBEL: o processo de desenvolvimento de Belo Horizonte (1897-1970). Belo Horizonte, 1979.
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A DIFUSÃO DA FOTOGRAFIA COMO DOCUMENTO ARQUIVÍSTICO: a Praça da Estação nos conjuntos documentais do APCBH La difusión de la fotografía como documento archivístico: la Plaza de la Estación en los conjuntos de los documentos del APCBH
Suellen Alves de Melo*
Resumo: Discute-se a difusão do documento fotográfico como documento de arquivo a partir das fotografias que se relacionam com a Praça da Estação, em Belo Horizonte, as quais estão custodiadas pelo Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Para isso, são analisadas as postagens na página da instituição no Facebook que mencionam a Praça, assim como o guia do acervo do Arquivo. Como resultado, têm-se que os documentos fotográficos relacionados à Praça da Estação mais difundidos no Facebook da instituição são aqueles pertencentes a fundos de assessoria de comunicação, empresa de turismo e fundação de cultura. Todavia, aponta-se outros órgãos produtores de documentos da cidade que podem ter documentos fotográficos da Praça, como superintendências de limpeza e de construção de obras, empresa de transporte e secretaria de meio ambiente. Palavras-chave: Difusão do documento fotográfico. Praça da Estação. Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Resumen: Se discute la difusión del documento fotográfico como documento de archivo a partir de las fotografías que se relacionan con la Plaza de la Estación, en Belo Horizonte, que se encuentran en custodia del Archivo Público de la Ciudad de Belo Horizonte. Para eso, se analizan las publicaciones en la página de Facebook de la institución que mencionan la Plaza, así como la guía de la colección del Archivo. Como resultado, los documentos fotográficos más difundidos relacionados con la Plaza de la Estación en el Facebook de la institución son los pertenecientes a fondos de asesoría de medios, empresa turística y fundación cultural. Sin embargo, existen otras agencias productoras de documentos en la ciudad que pueden tener documentos fotográficos de la Plaza, como las superintendencias de limpieza y construcción, empresa de transporte y secretaría de medio ambiente.
*
Arquivista, Mestra em Ciência da Informação e Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Brasil. E-mail: alvesdemelo.s@gmail.com . REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Palabras clave: Difusión del documento fotográfico. Plaza de la Estación. Archivo Público de la Ciudad de Belo Horizonte.
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Introdução Desde março de 2020, a sociedade brasileira tem vivenciado um novo cotidiano imposto pela pandemia da Covid-19, no qual muitas instituições públicas e privadas tiveram que paralisar suas atividades presenciais e migrar parte de sua comunicação para redes sociais on-line, como Facebook, Instagram, Twitter e YouTube, além de sítios eletrônicos e blogs. Os governos, de maneira geral, passaram a direcionar estratégias para o momento, como o isolamento social. Além disso, nossos lares passaram a ser espaços de convivências diversas – com a família, o trabalho e a escola. Nessa perspectiva também se enquadra o papel que os arquivos públicos tiveram que assumir para estabelecer vínculos efetivos de comunicação com o público, sobretudo por meio de estratégias pautadas na difusão arquivística. Essa função promove a visibilidade de instituições arquivísticas e de serviços de arquivo, assim como a aproximação efetiva à sociedade a partir da realização de estratégias que envolvem os conjuntos documentais custodiados, os produtos e os serviços ofertados. Alguns exemplos são a promoção de eventos institucionais – seminários, palestras, conferências entre outros –, a publicação de livros, revistas e instrumentos de pesquisa, a realização de visitas monitoradas e técnicas, a produção e o compartilhamento de conteúdos nas redes sociais on-line, sítios eletrônicos dentre outros (MELO, 2019). No âmbito da difusão arquivística, os instrumentos de pesquisa e as redes sociais on-line – sem retirar a importância dos repositórios digitais – são fundamentais para tornar os arquivos públicos mais próximos da sociedade, na medida em que são usados, normalmente, para apresentar os fundos e as coleções, assim como os próprios itens documentais custodiados por essas instituições. É a partir dessas duas estratégias de difusão que esse trabalho se pauta, uma vez que parto do Guia do acervo do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH) e da página no Facebook dessa instituição para discutir o lugar de um gênero documental, por vezes, compreendido como
que a fotografia possui a partir dos diferentes lugares que esse gênero assume nos conjuntos documentais custodiados pela instituição. Como esse recorte abrange o registro REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Neste trabalho, de maneira prática, discutirei a nuance de documento arquivístico
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especial, trata-se do documento fotográfico.
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imagético de diferentes lugares, pessoas e situações, fiz a opção metodológica de mirar a discussão para documentos fotográficos que se relacionam com a Praça Rui Barbosa ou, como é conhecida pelos belo-horizontinos, Praça da Estação. A escolha da Praça da Estação se deve, em parte, por uma questão pessoal, mas que também transborda na coletividade belo-horizontina. Durante alguns anos, a Praça foi um dos meus pontos de passagem do centro da capital mineira para o bairro Floresta, em direção ao APCBH. Nesse percurso, muitas foram as oportunidades de refletir sobre os espaços que a circunda, o trânsito da Avenida dos Andradas, as pessoas que circulam por ali, o barulho do trem e as manifestações culturais registradas e vivenciadas na região. O lugar também foi alvo de vários cliques fotográficos, os quais estão guardados como lembranças da época. Por isso, pareceu-me oportuno entrecruzar a Praça da Estação, o documento fotográfico e o Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, a partir da perspectiva arquivística. A proposta é apresentar como o documento fotográfico pode ser usado pelos órgãos públicos, neste caso, pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), em diferentes atividades. Busco, nesse sentido, em um primeiro momento, na página do APCBH no Facebook, as expressões “Praça Rui Barbosa” e “Praça da Estação”, com o objetivo de recuperar as postagens que fizeram uso do documento fotográfico (FACEBOOK DO ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2021). A partir do resultado encontrado, fiz o exercício de refletir, por intermédio do guia do acervo da instituição (ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2016), sobre outros conjuntos documentais que certamente possuem documentos fotográficos do local, porém que ainda não foram difundidos na rede social on-line. Esse estudo coloca o leitor frente às discussões em torno da difusão arquivística, dos documentos fotográficos enquanto documentos de arquivo, dos fundos documentais e das possibilidades de atividades que podem empregar a fotografia. Para além disso, também busco trazer a reflexão sobre a importância da Praça como um lugar da cidade e de seus cidadãos, além de evidenciar a importância dos conjuntos documentais
o ambiente virtual.
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novo, e já conhecido, lugar que a pandemia da Covid-19 colocou instituições e pessoas:
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custodiados pela instituição serem disponibilizados on-line, tendo em vista, sobretudo, o
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A Praça da Estação: entre trilhos, formação da cidade e apropriações culturais Caldeira (2007) afirma que, desde a antiguidade, as cidades são conformadas por meio de seus espaços de convivência, sendo a praça o símbolo principal desse processo, pois é o lugar que promove diversos encontros – sociais, políticos, culturais – entre os sujeitos. Nessa perspectiva, como Rivero (2015) discutiu em sua pesquisa de mestrado, apesar de ocupar um único espaço, uma praça é, na verdade, várias praças, como é a Praça da Estação, oficialmente intitulada Praça Rui Barbosa. No final do século XIX, sobretudo a partir de concepções republicanas, a cidade de Ouro Preto deixou de ser o modelo ideal para sede da capital de Minas Gerais, proposta que, em 1891, foi aprovada pelo Congresso Constituinte Mineiro (JULIÃO, 2011). Todavia, apenas em 1893, após estudos de uma comissão técnica, o local para a construção da capital foi escolhido, a saber, Curral Del Rei, área subordinada a Sabará naquela época. A partir disso, foi estabelecida a Comissão Construtora da Nova Capital (CCNC), inicialmente liderada pelo engenheiro Aarão Reis, com a responsabilidade de planejar e construir a cidade que seria a nova capital de Minas (JULIÃO, 1992). O acervo documental produzido por essa Comissão é custodiado por três instituições sediadas em Belo Horizonte, sendo elas o Arquivo Público Mineiro, o Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte e o Museu Histórico Abílio Barreto. Um dos documentos mais simbólicos da construção da nova capital é, sem dúvidas, a Planta Geral da Cidade de Minas de 1895, onde é possível identificar a presença da Praça da Estação no planejamento de obras da CCNC. Neste documento, a cidade foi dividida a partir de três zonas, sendo elas a zona urbana, a zona suburbana e a zona agrícola. A Praça da Estação encontrava-se dentro dos limites da Zona Urbana (RIVERO, 2015). Uma recente publicação do APCBH, o sexto volume da série “O Arquivo e a cidade”, Representações do conjunto da Praça da Estação no acervo do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, apresenta a Praça a partir de alguns lugares de discussão, como a cartografia, o ambiente em movimento, a economia, os símbolos, os usos, as
construção da nova capital, uma vez que as obras que transformariam o pacato Curral Del
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Praça está diretamente relacionado ao transporte ferroviário e, consequentemente, à
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apropriações do local entre outros. Com esse material fica nítido que o surgimento da
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Rei em capital moderna necessitavam de inúmeros insumos, os quais, à época, eram transportados a partir dos trilhos ferroviários (ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2019). Apesar de, ao longo dos anos, o transporte ferroviário ter sido marginalizado no sistema de transporte nacional – sobretudo a partir da extinção da Rede Ferroviária Federal, em 1999 (BRASIL, 1999) –, sem dúvidas, esse é um dos melhores meios de transporte para um país continental como o Brasil, tanto em relação à locomoção de cargas como de usuários. Foi por meio do Ramal Férreo Belo Horizonte, construção atribuída à Comissão Construtora em 1895, que a maior parte dos materiais usados para as obras da nova capital chegou ao antigo Curral Del Rei (ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2019). Para Rivero (2015, p. 28), Estação e Praça foram planejadas conjuntamente. A Praça contava com uma esplanada para receber a arquitetura do prédio da Estação, transpassando as vias públicas do local. A autora destaca que, no Plano Geral da Estação e Dependências, mesmo a Praça ocupando um espaço que cortava o ribeirão Arrudas e uma via pública, a mesma estava identificada “[...] como um único espaço e com o nome de Praça da Estação” (RIVERO, 2015, p. 28, grifos da autora). Ao longo dos anos, a relevância espacial dada à Praça foi modificando-se, sobretudo por conta de alterações na Avenida dos Andradas, atual denominação da via pública que divide a Praça em dois
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espaços (Figura 1).
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Figura 1 – Vista aérea da Praça da Estação
Foto: B&L Arquitetura, on-line, 2013.
Apesar de ter sido projetada por Aarão Reis em 1895, somente alguns anos mais tarde, em 1904, é que a Praça começou a ser construída. Antes disso, o primeiro prédio da Estação já havia sido edificado, em 1897, ano que também foi marcado pela inauguração da nova capital, Cidade de Minas, a qual, em 1901, passou a ser designada como Belo Horizonte (MIRANDA, 2007). Os jardins foram pontos importantes nesse cenário, como destaca Rivero (2015) ao apresentar trechos do Dossiê do Tombamento do Conjunto Arquitetônico e Paisagístico da Praça da Estação. Em 1904, o Estado entregou à sociedade os jardins de estilo inglês da Praça, tornando o local o principal cartão de visitas da cidade, já que ali representava sua ilustre porta de entrada (MIRANDA, 2007). O ajardinamento da Praça permaneceu sendo, por alguns anos, alvo de políticas da capital, sobretudo porque Belo Horizonte, além de ser conhecida por seus ideais modernos, também ficou reconhecida como cidade jardim, devido ao seu planejamento paisagístico, o qual ainda pode ser visto em algumas áreas da
Inicialmente denominada como Praça da Estação, o espaço teve seu nome modificado, em 1914, para Praça Cristiano Otoni e, em 1923, para Praça Rui Barbosa, REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2019; RIVERO, 2015).
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capital, como no Parque Municipal Américo Renné Giannetti (ARQUIVO PÚBLICO DA
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entretanto, de maneira geral, a Praça é conhecida pelos belo-horizontinos como Praça da Estação. Além dos jardins, o local também recebe destaque por seus monumentos – alguns deles, como em um jogo de poder político, mudaram de ambiente em diferentes momentos –, à frente deles está o Monumento à Terra Mineira, obra do escultor italiano Júlio Starace, inaugurada em 1930, que foi colocada em frente ao prédio da antiga Estação como uma espécie de boas-vindas a quem chegava à cidade, conforme é registrado na Figura 2 (RIVERO, 2015). Figura 2 – Monumento à Terra Mineira, Praça da Estação
Foto: Arquivo Pessoal, 2018.
De acordo com Miranda (2007), a atividade industrial em Belo Horizonte iniciouse no entorno da Praça da Estação, processo que pode ser identificado pela presença de serrarias – como a Serraria Souza Pinto –, além da Companhia Industrial de Belo Horizonte – empresa do segmento têxtil –, do Empório Industrial do Conde de Santa Marinha entre outras indústrias. Essa concentração industrial deveu-se, em grande medida, pela presença da estação ferroviária, que facilitava o transporte dos produtos. Além da existência da indústria, também havia no local edifícios que abrigavam serviços de hotelaria, os quais recebiam quem chegava à cidade pelos trilhos da ferrovia, desde chefes de Estado a operários (ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2019; MIRANDA, 2007).
Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA), agrupando, além da Praça, seus jardins e esculturas, os prédios da Estação Central e edificações lindeiras, como a REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Paisagístico da Praça da Estação foi tombado em 1988 pelo Instituto Estadual do
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Principalmente, devido à sua importância histórica, o Conjunto Arquitetônico e
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Casa do Conde de Santa Marinha, o Edifício Chagas Dória, a antiga Serraria Souza Pinto, a Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o antigo Instituto de Química e o Pavilhão Mário Werneck. Além disso, os viadutos da Floresta e de Santa Tereza, assim como os dormitórios e armazéns da Estação, também compõem o tombamento, que está inscrito no Livro de Tombo n. I – Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico – e no Livro de Tombo n. II – de Belas Artes (IEPHA, on-line, 1988, 2016, RIVERO, 2015). A preservação e o reconhecimento desse patrimônio, ocorreu novamente anos mais tarde, dessa vez, em âmbito municipal. De acordo com Minchilo e Passos (2019, p. 527), em 1988, o perímetro do tombamento definido pelo IEPHA foi ampliado a partir da aprovação do Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município, com a incorporação de quadras limiares à Praça no percurso do ribeirão Arrudas e junto à linha férrea. Ainda segundo as autoras, na ocasião, vários imóveis foram protegidos por meio de Tombamento e Registro Documental e ficou definida uma altimetria máxima de 12 metros para intervenções e novas construções. Com um desenvolvimento gradual e executado em diversas etapas deu-se a implantação do projeto de recuperação da área e o incentivo à reocupação, com a restauração do edifício histórico da estação de trem e as obras de revitalização do entorno. (MINCHILO; PASSOS, 2019, p. 527)
Como porta de entrada e saída de muitas pessoas, a Praça da Estação assumiu papéis diferentes ao longo do tempo. Com o declínio do transporte ferroviário, a Estação passou a ser usada principalmente pelo transporte metroviário, que liga Belo Horizonte à parte de sua Região Metropolitana. O espaço da Praça tem sido usado para inúmeras manifestações culturais, como apresentações artísticas e musicais, apresentação de quadrilhas juninas, encontro de blocos carnavalescos, manifestações políticas, Praias da Estação – movimento em oposição ao Decreto Municipal n. 13.798, de 09 de dezembro de 2009, que proibia eventos na Praça –, feiras de artesanato, entre tantas outras (BELO HORIZONTE, 2009;2019).
localizados o Centro Cultural da UFMG, o Centro de Referência da Juventude e a Biblioteca Pública Infantil e Juvenil. Por tudo isso, o espaço é palco de encontro de várias REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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abriga o Museu de Artes e Ofícios desde 2006 e, nas proximidades, também estão
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Além disso, o prédio da atual Estação Ferroviária Central de Belo Horizonte
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tribos urbanas, como no Viaduto Santa Tereza, onde acontece o Duelo de MCs, entre outras manifestações culturais (BELO HORIZONTE, 2019; MUSEU DE ARTES E OFÍCIOS, on-line; VEIGA, 2019). Os trilhos ferroviários ocuparam sua importância na entrada de materiais para a construção da nova capital e de pessoas – as que vinham conhecer a moderna cidade e aquelas que vinham residir e fazer a vida em Belo Horizonte. Todavia, ao longo dos anos, os trilhos foram colocados à margem do protagonismo urbano da capital mineira e a Praça tomou seu espaço como lugar de formação da cidade, lugar que já havia sido previsto em seu planejamento inicial, lugar de encontro, de debate, de desigualdades, de vozes e passos, lugar de passar e de ficar, lugar de ouvir o barulho do trem, dos ônibus, dos carros e das motos, lugar de ver nossa Belo Horizonte transformando-se.
Um pouco de arquivística: documentos de arquivo e documentos fotográficos A presença da humanidade pode ser comprovada, sobretudo, pelos registros documentais produzidos ao longo dos séculos, por meio do emprego de diversos suportes, como pedras, papiro e tecido. A partir disso, alcançamos o conceito básico de documento, ou seja, informação registrada em um suporte. Para que os documentos possam ser considerados arquivísticos e, assim serem tratados e organizados de maneira diferente que os documentos de bibliotecas e museus, acrescentamos à sua definição a questão de produção. É considerado documento de arquivo todo aquele que é produto das atividades de pessoas físicas e jurídicas. Além de seu contexto genético, os documentos de arquivo possuem algumas características que são fundamentais para delimitar suas nuances, como a imparcialidade, a autenticidade, a naturalidade, a organicidade, a unicidade e a fixidez. A seguir apresento uma breve explicação acerca delas e de outros conceitos caros à Arquivologia. Para uma discussão mais aprofundada, recomendo os trabalhos de Duranti (1994), Rondinelli
As três primeiras características relacionam-se à produção do documento arquivístico. A imparcialidade diz respeito aos documentos serem produzidos devido a REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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terminologia arquivística, obra de autoria do Arquivo Nacional (2005).
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(2013), Santos (2015) e Schellenberg (2006), além do Dicionário brasileiro de
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questões do presente e não do futuro, a autenticidade “[...] refere-se ao controle do processo de criação, manutenção e custódia do documento arquivístico [...]” (SANTOS, 2015, p. 122) e, por sua vez, a naturalidade relaciona-se aos documentos serem criados no decurso da execução de atividades, diferenciando-os das coleções, as quais são produzidas a partir da junção de itens de diferentes proveniências. Portanto, essas três características não levam em conta a parcialidade dos produtores dos documentos, tampouco a veracidade do conteúdo documental ou a inexistência da naturalidade no contexto real – questões que, muitas vezes, são criticadas apenas levando em conta o nome das características e não suas definições. A organicidade e a unicidade nos ajudam a compreender como o documento de arquivo é entendido, ou seja, sempre a partir de seu conjunto documental. Assim, o documento é orgânico porque ele é compreendido por meio das interações que estabelece como os demais documentos de seu conjunto. É como se um documento “puxasse” outro. A unicidade revela que cada documento ocupa um lugar único dentro de seu conjunto documental. A fixidez está relacionada à forma fixa e ao conteúdo estável dos documentos. Essa característica tem sido mais evidenciada no contexto digital, visto que os documentos digitais, muitas vezes, têm sua aparência modificada devido às especificidades de algum software. Nesse caso, enquanto o conteúdo permanece estável, a forma fixa pode ser alterada a partir de regras preestabelecidas. Os documentos produzidos por uma mesma pessoa – física ou jurídica – a partir da consecução de atividades compõem o que chamamos de fundos documentais. Duchein (1986) apresenta uma série de problemas e dificuldades para o estabelecimento de fundos documentais, sobretudo em relação às instituições, as quais, muitas vezes, são criadas, extintas ou agregadas a outras instituições, dificultando o processo de identificação do conjunto documental. O autor apresenta vários critérios que podem ser empregados para a delimitação de fundos de organismos produtores de documentos, como possuir um nome e ter existência jurídica, apresentar atribuições específicas que estejam definidas legalmente, possuir organograma entre outros.
das estruturas dos organismos produtores ou por meio de suas funções (GONÇALVES,
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de arranjo – nomenclatura tradicionalmente aplicada aos arquivos permanentes –, a partir
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Existem duas formas principais de organização de fundos, os chamados quadros
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1998). O quadro de arranjo configurado pelas funções é o mais aceito na área arquivística, porque as estruturas administrativas, normalmente, mudam com certa frequência, enquanto as funções tendem a permanecer ao longo do tempo. O quadro de arranjo de fundos do APCBH, por exemplo, está organizado a partir da estrutura administrativa do poder Executivo da cidade (ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2019), o que faz com que a instituição tenha que realizar alguma modificação no instrumento com regularidade, devido às alterações no organograma da Prefeitura, sobretudo a partir da posse de novos prefeitos. Os documentos de arquivo possuem valores primários – administrativos, legais e fiscais – e podem possuir valores secundários – probatórios e informativos (SCHELLENBERG, 2006). Esses valores, assim como os prazos de guarda e a destinação dos documentos, são ações definidas a partir da avaliação documental, função arquivística que deve ser realizada por uma comissão formada por diferentes sujeitos. Em âmbito público, o produto da avaliação é a tabela de temporalidade e destinação de documentos, instrumento que deve ser aprovado por autoridade competente e que promove a racionalização de recursos, na medida em que estabelece os documentos que serão eliminados e os que serão recolhidos aos arquivos públicos, oportunizando a transparência do Estado e a proteção de direitos e deveres. Caso possuam valores secundários, os documentos de arquivo devem ser preservados pelas instituições arquivísticas, as quais também são responsáveis por organizá-los – por meio de descrições e instrumentos de pesquisa –, difundi-los, bem como conceder o acesso aos mesmos. Esses documentos podem ser acessados por qualquer cidadão e são usados para diferentes fins, tanto em pesquisas acadêmicas quanto para a comprovação de direitos, atividades diletantes entre outros. Eles são usados em narrativas históricas e, muitas vezes, são identificados como a própria memória de um munícipio, estado ou nação. Por muito tempo, a definição de documento arquivístico esteve atrelada aos documentos textuais em papel, fazendo com que outros gêneros como os documentos
demanda cuidados de preservação. Essa questão contribuiu para que diversas instituições
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passassem a ser considerados especiais, sobretudo devido à fragilidade de seu suporte que
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iconográficos e audiovisuais fossem colocados à margem do tratamento arquivístico e
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arquivísticas tivessem suas estruturas administrativas divididas em setores voltados aos documentos textuais e setores voltados aos documentos especiais. O resultado dessa divisão, muitas vezes, foi a perda do contexto orgânico dos documentos e a dispersão de fundos, o que contribuiu também que documentos considerados especiais, como os documentos fotográficos, fossem organizados a partir de sua estrutura imagética, levando em conta o conteúdo da fotografia e os assuntos registrados, por exemplo (LACERDA, 2008; MELO, 2019). Ocorre que se a fotografia for produzida para o cumprimento de alguma atividade de pessoa física ou jurídica, a mesma enquadra-se como documento de arquivo, devendo, portanto, ser inserida em programas de gestão documental e receber tratamento arquivístico condizente com sua produção orgânica. Como provas de atividades, as fotografias, por exemplo, podem estar presentes em relatórios de atividades e, se retiradas desse contexto, perdem o sentido de sua produção. No entanto, o que temos visto é a sobreposição do documento fotográfico em relação a outros gêneros documentais, como um representante absoluto da realidade, por registrar espaços e tempos passados. Além de serem amuletos de lembranças e memórias, como se apenas a imagem pudesse ser usada para recordar e saborear o passado. Alguns autores como Lacerda (2008) e Lopez (2001) têm discutido o documento fotográfico no âmbito da arquivística. Lacerda (2008), apresentou o contexto pelo qual a fotografia passou a ser considerada documento de arquivo em manuais e demais publicações da área. Timidamente, o documento fotográfico passou a ser considerado arquivístico a partir do manual de Hilary Jenkinson, em 1922, mesmo assim sendo considerado como “novo documento”, expressão que, mais tarde, assumiu outro viés, a saber, documento especial, devido às especificações de seu suporte e, consequentemente, aos cuidados que sua preservação demanda, como o controle de umidade e temperatura – isto é, enquanto documento analógico, já que, a fotografia digital possui outros critérios de preservação. Lopez (2001) discutiu a questão da fotografia ser, muitas vezes, tratada apenas
assuntos abordados, dando brecha às interpretações pessoais de indexadores, algumas
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produção, sendo assim, classificada e descrita considerando sua representação visual e
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levando em conta seu conteúdo imagético, a partir da marginalização de seu contexto de
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vezes, interpretações preconceituosas. Esse cenário proporciona a perda do vínculo orgânico dos documentos fotográficos e facilita a criação de coleções, como a Coleção de Fotografias Avulsas do Arquivo Nacional (MELO, 2019). Apesar de algumas vezes ouvirmos aquela típica frase de que uma fotografia fala mais que mil palavras, certamente, se o contexto de produção do documento fotográfico estiver identificado, como o produtor, a atividade produtora, data, local, fotógrafo, entre outros elementos, os usuários terão mais embasamento acerca do documento, estando mais aptos a construir narrativas históricas, assim como para subsidiar o cumprimento de seus direitos, entre tantos outros usos. Sem esse contexto, a fotografia se perde em um emaranhado de assuntos, os quais tendem a cada situação para os interesses do sujeito que a observa e, em alguns casos, para a memória de um passado que se firma em questões do presente, buscando alicerçar o futuro. No contexto do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, desde 1997, data da publicação da primeira tabela de temporalidade da instituição, os documentos fotográficos possuem guarda permanente – contudo, com a produção digital, foram estabelecidos critérios para o recolhimento das fotografias dos órgãos da PBH ao Arquivo. Como já discutimos em pesquisas anteriores, o lugar da fotografia na instituição deve-se ao lugar que esse documento teve desde a concepção do projeto de uma nova capital. A fotografia não poderia estar de fora do processo de modernização do Estado mineiro. Assim, a construção de Belo Horizonte contou com o Gabinete Fotográfico da Comissão Construtora, responsável por registrar as mudanças no cenário do Curral Del Rei. Era necessário que fossem documentados visualmente os feitos do Estado (MELO, 2017; 2019). Nas diversas estruturas administrativas da Prefeitura, é possível encontrar a presença da fotografia em vários equipamentos públicos. A partir do momento que esses documentos são recolhidos pelo APCBH, eles recebem tratamento arquivístico e podem ser disponibilizados para consulta. Além da ótica de fotografia pública, eles passam a ter outras leituras pelos consulentes, a partir de seus fundos documentais, por isso, é tão
corretamente. Assim, as novas leituras serão feitas a partir da âncora do contexto orgânico
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e que, quando postados em redes sociais, os documentos sejam identificados
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importante que haja instrumentos de pesquisa descrevendo os conjuntos de documentos
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(MELO, 2019). A Praça pode ser recuperada por meio da expressão que leva seu nome na página do Facebook do Arquivo, todavia, as postagens encontradas apresentarão os documentos fotográficos com a identificação de seu conjunto e não como documento ilustrativo de um texto. Até porque, os fotógrafos do poder público não fazem registros ao léu, por motivações quaisquer, ao contrário, saem às ruas de Belo Horizonte com determinações prescritas pelos órgãos da Prefeitura para registrar atividades do município.
A análise, os resultados A metodologia deste trabalho baseou-se em análise de conteúdo, na medida em que, em um primeiro momento, a partir da página do Arquivo no Facebook, fiz uma pesquisa com as expressões “Praça Rui Barbosa” e “Praça da Estação” e, posteriormente, analisei os resultados encontrados com o objetivo de verificar se as postagens encontradas traziam temáticas relacionadas à Praça ou não, já que a funcionalidade de pesquisa nessa rede social on-line também recupera as palavras isoladas, como, “praça” e “estação”. Além disso, me detive à Praça da Estação e às suas adjacências, como os edifícios lindeiros ao local, os viadutos da Floresta e de Santa Tereza, assim como a algumas vias públicas que estão no entorno, como a Rua da Bahia, a Avenida dos Andradas, a Avenida do Contorno e a Rua Sapucaí. A análise na rede social foi feita no dia 28 de maio de 2021, no campo “Procurando algo” presente na página do APCBH no Facebook, no qual é possível pesquisar publicações, fotos e vídeos postados pela instituição. Com a expressão “Praça da Estação” recuperei 41 publicações que faziam referência à Praça, a busca com a expressão “Praça Rui Barbosa”, por sua vez, recuperou nove postagens. Os textos de algumas publicações utilizaram as duas expressões “Praça da Estação” e “Praça Rui Barbosa”, por isso, parte das postagens se repetiu nas duas pesquisas. Dessa forma, o número total de publicações do APCBH no Facebook até a data analisada relacionada à Praça da Estação foi de 43 postagens, que estão espaçadas entre os anos de 2013 e 2021.
cartográficos e outros iconográficos, assim como divulgação da promoção do evento
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fotográficos, em algumas delas foram difundidos documentos tridimensionais,
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Nem todas as publicações mencionadas dizem respeito à difusão de documentos
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“Representações do Conjunto da Praça da Estação no acervo do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte” que ocorreu em 2019, com o lançamento de uma publicação da instituição sobre os documentos custodiados pelo APCBH que fazem referência à Praça da Estação. Neste trabalho, apresentarei e analisarei as postagens que difundiram documentos fotográficos relacionadas à Praça, com o objetivo de discutir a fotografia como documento de arquivo em diferentes fundos documentais custodiados pelo APCBH. Dessa forma, foram encontradas 30 publicações com fotografias. No Quadro 1, apresento as publicações recuperadas a partir das duas expressões com a identificação do fundo ou da coleção ao qual o documento fotográfico difundido pertence, a quantidade de fotografias compartilhadas e o ano de publicação. À nota de explicação, encontrei vinte fotografias do 1º Forró de Belô, por isso, por uma questão de organização, identifiquei esse resultado a partir da entrada “Álbum 1º Forró de Belô, 1979 – Praça da Estação”, no quadro a seguir. Algumas publicações apresentavam documentos fotográficos da Praça e de outros locais, no entanto, me atenho apenas às fotografias do equipamento cultural analisado neste trabalho.
Quadro 1 – Publicações com documentos fotográficos na página do APCBH no Facebook relacionados à Praça da Estação Nº 1
Descrição Álbum 1º Forró de Belô, 1979 – Praça da Estação
Fundo/coleção Fundo ASCOM
2
Dia do Trabalhador – Praça da Estação
3
Conjunto Arquitetônico da Praça da Estação – Serraria Souza Pinto
4 5 6 7 8 9
Quantidade 20
Ano 2013
Fundo ASCOM
1
2014
Coleção José Goés e Fundo Belotur
2
2014
Rua da Bahia
Fundo FMC
1
2014
Festa Junina – Praça da Estação
Fundo Belotur
1
2014
Quadrilha infantil – Praça da Estação
Fundo Belotur
1
2016
Sem identificação
1
2016
Fundo ASCOM
1
2017
Fundo ASCOM
1
2019
Apresentação de quadrilhas, Arraial de Belô 2008 – Praça da Estação Parque Ferroviário de Belo Horizonte Conjunto Arquitetônico da Praça da Estação – Viaduto Santa Tereza
10
Dia do Ferroviário – Edifício Chagas Dória
Fundo Belotur
1
2019
11
Primeiro prédio que o APCBH ocupou – Edifício Central
Fundo Belotur
1
2021
Coleção José Goés, não irei analisá-lo, visto que o objetivo do trabalho é discutir a
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Embora um dos documentos fotográficos encontrado na pesquisa faça parte da
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Fonte: Dados da pesquisa, 2021.
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fotografia como documento produzido a partir da execução de determinada atividade, ou seja, acumulado organicamente, e não reunido artificialmente, como é o caso dos documentos que compõem coleções. Dito isto, é notório que os fundos identificados na difusão de documentos fotográficos relacionados à Praça da Estação no Facebook dizem respeito às áreas de cultura e turismo, como o Fundo da Assessoria de Comunicação Social do Município (ASCOM), o Fundo da Empresa Municipal de Turismo do Munícipio de Belo Horizonte S/A (Belotur) e o Fundo da Fundação Municipal de Cultura (FMC). Esse resultado está diretamente relacionado às temáticas das publicações, a saber, a divulgação de festas juninas, de edifícios que compõem o Complexo Arquitetônico da Praça da Estação, de temáticas ferroviárias entre outras. O Fundo da ASCOM, por exemplo, reúne documentos fotográficos sobre eventos culturais ocorridos na cidade, intervenções urbanas, como grandes construções, além de registrar a vida política do prefeito. O Fundo da Belotur contempla uma infinidade de eventos promovidos em Belo Horizonte, como festas juninas, carnavais e datas religiosas, dentre outros. O Fundo da Fundação Municipal de Cultura também engloba eventos ocorridos nos equipamentos culturais da Prefeitura de Belo Horizonte, como museus, bibliotecas e centros de referência (ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2016). Nessa perspectiva, a Praça é representada na página do Facebook do APCBH, sobretudo, a partir do viés de palco cultural, no qual diferentes culturas se encontram para celebrar datas importantes do calendário nacional, estadual e municipal. Os documentos fotográficos, então, são produzidos pela Assessoria de Comunicação, Belotur e Fundação Municipal de Cultura como forma de registrar os eventos produzidos por estes órgãos públicos. Sendo assim, certamente, essas fotografias compõem relatórios de atividades, prestações de contas, publicações institucionais, matérias jornalísticas, postagens de redes sociais e álbuns fotográficos, entre outros. Portanto, as fotografias não são produzidas por e simplesmente como forma de registrar e publicizar o evento, mas, também, para provar
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“Z”.
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à administração pública que a Festa Junina “X” foi promovida com os recursos “Y” e
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O fato das postagens com documentos fotográficos relacionadas à Praça da Estação terem empregado os fundos mencionados acima revela e coloca em pauta algumas questões. Apesar de serem fundos abertos – e, por isso, estarem aptos a receberem mais recolhimentos –, os conjuntos documentais da Assessoria de Comunicação, da Belotur e da Fundação Municipal de Cultura já passaram pelo tratamento arquivístico, como higienização, identificação, descrição e digitalização. Dessa forma, são mais facilmente usados nas atividades de difusão da instituição do que aqueles acervos que ainda aguardam para serem tratados pelos setores técnicos do Arquivo (MELO, 2019). Outra questão é que o principal tipo de postagem difundido nas redes sociais são as efemérides, uma tradição de longa data das instituições arquivísticas. Em pesquisa anterior, verificamos que conjuntos documentais que abarcam a produção de eventos de órgãos públicos e empresas privadas são os mais usados para a difusão de documentos fotográficos em postagens de efemérides. Isso ocorre porque, em fundos de assessorias de comunicação e periódicos nacionais, por exemplo, há fotografias que englobam diferentes situações, pessoas e locais, assim, as instituições arquivísticas podem elaborar as postagens a partir de inúmeras possibilidades e, muitas vezes, sem a necessidade de repetir a fotografia ao longo dos anos (MELO, 2019). Contudo, faz-se necessário que outros conjuntos documentais sejam usados na difusão, promovendo o acesso aos documentos custodiados pelos arquivos públicos. Os usuários não podem ser levados a criar um imaginário de que as instituições arquivísticas custodiam apenas acervos de determinadas atividades, como àquelas voltadas à cultura, assim como são detentores somente de preciosidades fotográficas. A imagem dessas instituições não deve perpetuar o senso comum, que, muitas vezes, é levado à ideia de “arquivo morto” e de “tesouro da memória”. É necessário difundir a imagem das instituições arquivísticas como entidades públicas responsáveis, sobretudo, pela viabilização da transparência do Estado, promoção de direitos e escrita de narrativas histórias, entre outras questões.
adjacências. Algumas atividades como construção de obras, gerenciamento de trânsito,
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provavelmente, possuem fotografias relacionadas à Praça da Estação e às suas
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Nesse sentido, fiz o exercício de refletir sobre outros fundos documentais que,
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limpeza de vias públicas e desenvolvimento de políticas ambientais vieram à tona. Ao buscar no Guia do acervo do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, encontrei os órgãos responsáveis por essas atividades na Prefeitura de Belo Horizonte, a partir de seus respectivos fundos documentais. A Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) tem como competência a execução do Plano de Obras do Município, promovendo os serviços de iluminação pública, abastecimento de água entre outros. A Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTRANS) tem suas atribuições voltadas à política de transportes e trânsito do munícipio, como o controle da prestação dos serviços de transporte coletivo e o planejamento operacional do trânsito, entre outras. A Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) é responsável pelos serviços de limpeza da cidade, como varredura de vias públicas, coleta, depósito e tratamento do lixo, entre outras atividades. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA) coordena a política ambiental de Belo Horizonte (ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2016). Nas diversas obras realizadas nas proximidades da Praça da Estação, a Sudecap provavelmente realizou o registro fotográfico das vias públicas no entorno do local, assim como os campos de obras. A BHTRANS, em diversas situações, já precisou alterar o trânsito nas proximidades da Avenida dos Andradas devido a eventos culturais, por exemplo. Essas alterações compõem relatórios dos agentes da Empresa, os quais podem conter documentos fotográficos. Nesses mesmos eventos, outro equipamento público também atua, trata-se da SLU, responsável pela limpeza urbana. Assim, os relatórios dessa Superintendência também devem conter fotografias, no sentido de prestar contas dos serviços realizados nos eventos da cidade ocorridos na Praça da Estação. Os jardins do local são alvos das ações da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, as quais são registradas em processos, por meio de documentos textuais, fotográficos e audiovisuais, entre outros. A reflexão apresentada acima, certamente, seria mais coerente se eu tivesse
pandemia da Covid-19, época em que este trabalho foi produzido – e também de maneira
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poderia ter ocorrido presencialmente – oportunidade com restrições no período da
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consultado os fundos documentais dos equipamentos públicos elegidos. Essa consulta
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virtual, caso o Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte tivesse um repositório digital on-line. Sabe-se, no entanto, que para uma instituição arquivística ofertar o acesso aos documentos pela internet várias estratégias são demandadas, que vão muito além da digitalização. É preciso o desenvolvimento, a aplicação e, consequentemente, a remodelação de uma política de acesso, em conjunto com a alocação de recursos técnicos, humanos e, sobretudo, financeiros. Contudo, não retirarei o mérito da reflexão apresentada, uma vez que os fundos documentais da Sudecap, BHTRANS, SLU e Secretaria Municipal de Meio Ambiente possuem documentos fotográficos, os quais alguns estão indicados no Guia do acervo do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte e outros, estavam nas etapas de processamento técnico à época da elaboração desse instrumento de pesquisa – como as fotografias produzidas pela Superintendência de Desenvolvimento da Capital, conforme registra uma postagem no Facebook da instituição publicada em abril de 2017 (FACEBOOK DO ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE DE BELO HORIZONTE, 2017). Cada órgão da PBH tem sua produção fotográfica alicerçada a partir de suas competências na administração pública. Nessa perspectiva, um mesmo aspecto da municipalidade pode ser fotografado por dois ou mais equipamentos da Prefeitura, entretanto, com objetivos diferentes. Por isso, um dos desdobramentos deste trabalho, certamente, é uma análise mais criteriosa a respeito dessa temática, com o levantamento dos fundos documentais da Sudecap, BHTRANS, SLU e SMMA.
Algumas considerações A difusão arquivística é uma atividade que envolve poder, na medida em que são eleitos quais os conjuntos documentais serão discutidos em eventos, que irão compor exposições, postagens de redes sociais on-line entre outros. Dessa forma, é necessário que
Também é importante que essas políticas sejam desenvolvidas a partir de diversos
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forma que todos os critérios que perpassam sua execução sejam debatidos e planejados.
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as instituições arquivísticas tenham políticas institucionais que abarquem a função, de
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olhares, das instituições e dos cidadãos, assim, os arquivos públicos se posicionarão como entidades sensibilizadas com o lugar que possuem na sociedade. Com a apresentação da história da Praça da Estação, vimos que esse espaço, desde antes de sua fundação, foi tomado como porta de entrada e de encontro dos sujeitos em Belo Horizonte. A questão ferroviária foi perdendo espaço no cenário da capital mineira e a Praça tomou lugar, sobretudo, a partir dos encontros culturais que seu espaço viabiliza. Essa nuance do local foi vista por meio da análise das postagens do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte em sua página no Facebook, já que as publicações privilegiaram comemorações culturais, como festas juninas e carnavais. Embora o documento fotográfico tenha esse caráter festivo, já que culturalmente nossas comemorações são marcadas pela fotografia, é importante destacar que esse gênero documental também pode ser empregado por outras atividades do município, como na construção de obras, alteração no trânsito, limpeza de vias públicas, plantio de árvores entre outras atividades. Assim ficou nítido o caráter arquivístico que o documento fotográfico possui e que, muitas vezes, é colocado de lado por conta de seu conteúdo imagético e por nossas memórias pessoais e coletivas. O período da pandemia da Covid-19 tem sido desbravador, no sentido de que pessoas e instituições tiveram que se redescobrir e criar novas formas de comunicação. Sítios institucionais e, sobretudo, redes sociais têm sido lugares on-line privilegiados para os arquivos públicos manterem seus discursos com a sociedade, a partir da difusão de seus acervos documentais, produtos e serviços. Muito embora existam filtros técnicos e sociais, como a própria estrutura política do Estado e os algoritmos das redes sociais, é fundamental que as instituições arquivísticas aproveitem esse momento para estabelecerem sua identidade, a partir do apontamento de seu lugar, ou seja, da área arquivística. Por isso, os documentos devem ser difundidos sob a perspectiva arquivística, privilegiando o contexto orgânico dos mesmos, assim como também mais fundos e coleções devem ser compartilhados, promovendo o acesso a outros conjuntos
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documentais custodiados pelos arquivos públicos.
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PRINCIPAIS ADQUIRENTES DE LOTES DE BELO HORIZONTE 1895-1931: segundo o índice de lotes urbanos do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH) Main purchasers of lots in Belo Horizonte 1895-1931: according to the index of urban lots in the Public Archives of the City of Belo Horizonte (APCBH)
Maria Lúcia Prado Costa1*
Resumo: o Índice de Lotes Urbanos do APCBH, depois de revisado em 2019, permitiu o levantamento dos 15 principais adquirentes de lotes no perímetro urbano da Capital, entre 1895 e 1931. Como já evidenciado em estudo anterior, a especulação imobiliária foi uma das atividades a que se dedicou a elite local. No presente texto, são apresentados, o perfil dos 15 principais adquirentes, o respectivo número de lotes e o período de aquisição deles, com base no mesmo Índice. Evidenciou-se, mais uma vez, a força da especulação sobre os lotes urbanos, inclusive por agentes públicos ligados à Prefeitura ou ao Conselho Deliberativo da nova Capital. Trata-se de um exercício historiográfico baseado, portanto, em fontes primárias, sob a guarda do APCBH. Palavras-chave: Adquirentes. Lotes Urbanos. Belo Horizonte. Índice APCBH Abstract: The APCBH Urban Lot Index, after revised in 2019, allowed the survey of the 15 main buyers of lots in the urban perimeter of the Capital, between 1895 and 1931. As evidenced in a previous study, real estate speculation was one of the activities to which the local elite was dedicated. This paper presents the profile of the 15 main buyers, their respective number of lots, and their acquisition period, based on the same Index. The strength of speculation on urban lots became evident again, including by public agents linked to the City Hall or the Deliberative Council of the new Capital. This paper is a historiographical exercise based, therefore, on primary sources, under the guardianship of the APCBH. Keywords: Byers. Urban Lots. Belo Horizonte. APCBH Index.
Introdução A atualização do Índice de Lotes Urbanos de Belo Horizonte (1895-1931) do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH), realizada em 2019, permite, entre outras pesquisas, o levantamento dos principais adquirentes de lotes na capital
* Historiadora e Mestre em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável. Consultora da Bios Consultoria. E-mail: lucia@biosconsultoria.com.br - Bios Consultoria: www.biosconsultoria.com.br 1
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naquele período.
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Como já se constatou, em estudo anterior, publicado na edição número 6 desta Revista (COSTA; SILVA, 2019), o Índice evidenciou que a especulação imobiliária sobre os lotes urbanos foi uma das atividades a que se dedicou a elite mineira, nos primeiros anos da nova capital e mesmo um pouco antes. A atual proposta de identificar os principais adquirentes de lotes se insere no esforço de se repensar a história da cidade a partir de fontes primárias, evitando-se generalizações consagradas pela força do tempo. Esclarece-se que, no Índice, não há necessariamente equivalência entre incidências de proprietários e o número de lotes, haja vista que alguns nomes são citados duplamente em razão de permutas ou mesmo de mudança da razão social do mesmo adquirente. Há ainda a situação em que única incidência de proprietário se refere a grupos de lotes de um mesmo quarteirão. Outra situação é aquela em que os lotes foram comprados por mais de uma pessoa, o que gera duplicidade da incidência do nome, apesar de tratar-se do mesmo lote. Em outros casos, o nome do adquirente é associado ao da empresa do qual é sócio, expandindo o número de incidências do adquirente – seja como pessoa física ou jurídica. Por tais razões, só o levantamento lote a lote, no Índice, poderia esclarecer o exato número de lotes adquiridos por cada um, como primeira aquisição ou posteriores. No presente texto, se fez o cotejamento preliminar dos principais adquirentes com mais de 30 incidências no Índice. Essa linha de corte resultou em 15 principais compradores, conforme está no Quadro 1. Quadro 1 – Principais compradores e respectivos números de incidências no Índice de Lotes Urbanos Nº
Proprietário/ Proprietária
Incidências
1 2 3 4 5 6
José Francisco de Macêdo / José Francisco de Macedo / Jose Francisco de Macêdo Antonio Antunes de Almeida Aurélio Lobo Felicissima de Paula Teixeira/ Felicíssima de Paula Teixeira/ Filhos de Felicíssima de Paula Teixeira José Benjamin/ José Benjamim/ José Benjamim e sua mulher/ Jose Benjamin e Joaquim Daniel Rocha Antonio Garcia/ Antonio Garcia de Paiva/ Garcia de Paiva & Cia./ Garcia de Paiva & Pinto/Antônio Garcia de Paiva & Cia. Antonio Daniel da Rocha/ Cel. Antônio Daniel da Rocha Joaquim Daniel da Rocha Silverio Silva/ Silvério Silva/ Silvério Silva & Cia./ Silverio Silva e Alvim/ Coronel Silverio Silva Francisco de Assis Duarte/ Francisco Assis Duarte/ Francisco de Assis Duarte e Ildeu Duarte Joaquim Severiano de Carvalho/ J. Severiano de Carvalho/ Joaquim Severiano & Companhia/ J. Severiano & Co. / J. Severiano & Co. Clemente de Faria Antonio Alves Martins/ Antonio Alves Martins Junior Avelino Fernandes Juventino Dias Teixeira
150 111 86 69 64 57
34 32 30 30
Fonte: Índice de Lotes Urbanos APCBH, 2019 Elaboração: Autora, 2020 REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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12 13 14 15
43 42 42 36 35
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Perfil dos principais proprietários O perfil político e social desses 15 maiores proprietários de lotes foi esboçado a partir de consulta ao Almanak Laemmert (1891-1940), ao Jornal Minas Gerais e ao livro de Abílio Barreto (1936) sobre Belo Horizonte. Consultaram-se ainda os Relatórios dos Prefeitos ao Conselho Deliberativo, do período, e outras fontes do Arquivo Público Mineiro (APM) e da Hemeroteca Pública de Minas Gerais, entre outras.
José Francisco de Macedo, Zé dos Lotes (1873-1950) Um dos famosos especuladores imobiliários da cidade foi José Francisco de Macedo (Macêdo), o Zé dos Lotes. Abílio Barreto informa que Zé dos Lotes, ainda em novembro de 1895, junto com outros homens de negócio, já visitava o Curral del Rey, “percorrendo os pontos principais da localidade, a fim de escolherem os terrenos para as casas que pretendiam construir” (BARRETO, 1936, p. 462). Ainda esclarece que o apelido “Zé dos Lotes” decorria do fato de anos mais tarde José Francisco de Macedo ter “comprado por preço ínfimo considerável número de lotes em Belo Horizonte, inclusive na avenida Afonso Pena, dentre os quais haviam sido sorteados para os proprietários em Ouro Preto” (Ibidem, 1936). Zé dos Lotes, associado “ao gordo negócio imobiliário”, foi também mencionado por Carlos Drummond de Andrade, numa crônica em homenagem aos sessenta anos da cidade, comemorados em 1957: “decerto, não mudaste, cresceste e ameaças crescer mais, crescer sempre; e não errou aquele Zé dos Lotes, lembras-te? De caroço no pescoço, que em teu alvorecer prefigurou o gordo negócio imobiliário”. (ANDRADE, 1957) O Jornal Estado de Minas, de 7 de outubro de 1950, registrou o falecimento de Zé dos Lotes e fez a seguinte rememoração:
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Desaparece uma das figuras tradicionais da cidade. Faleceu o capitalista José Francisco Macedo – vulgo Zé dos Lotes. Acreditou no futuro da capital e ficou milionário com o comercio imobiliário. Sabia efetuar bons negócios. Distribuiu sua fortuna em vida. Uma frase que define o homem de negócios [...] Zé dos Lotes explicava as razões de seu êxito na vida, dizendo pitorescamente “Comprei lotes de quem pensava que Belo Horizonte nunca passaria de Curral del Rey e vendi para os que supunham que a cidade em breve seria Nova York”. (O ESTADO DE MINAS, 1950, p. 10 apud ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, 2019)
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Ela já figurava na “Relação dos Proprietários com casa em Ouro Preto com direito a lotes de terreno para construção na futura capital, conforme a Lei n. 3 de 17 de dezembro de 1893”, publicada no Jornal Minas Gerais, em 1895. No Índice, o nome dele, grafado também José Francisco Macedo e José Francisco de Macêdo, aparece sozinho e também associado ao de Alberto Gomes de Carvalho, que figura 13 vezes isoladamente no Índice. A primeira aquisição feita por Zé dos Lotes data de 15/05/1897 – a capital seria inaugurada ao final deste mesmo ano – e a última, de 21/11/1919. Ao todo foram 150 incidências. As relações de Zé dos Lotes com a Prefeitura parecem variar ao longo do tempo. Há tanto conflitos quanto favorecimentos. No Relatório ao Conselho Deliberativo do Prefeito Silviano Brandão, de 1909-1910, há referência a duas ações movidas por Jose Francisco Macedo e sua mulher contra a Prefeitura. Uma, em relação ao Hotel Monte Verde e outra, referente à manutenção de posse de cafuas nas proximidades do 1º Batalhão, das quais se diziam donos. (BELO HORIZONTE, 1910, p. 7) Já em 1917, ele foi beneficiado nominalmente por uma lei municipal – evidência inequívoca de seu prestígio. A Lei n. 128 determinou em seu artigo 1º: Fica o Prefeito auctorizado a prorrogar os prazos para construção nos lotes de terrenos urbanos de propriedade dos srs. Benjamin Moraes, d. Virginia Fernandes Monteiro, capitão Christiano Alves Pinto, Domingos Fleury da Rocha, José Francisco de Macedo e dr. José Fellipe de Santa Cecilia, cobrando as respectivas taxas. (BELO HORIZONTE, 1917) (grifo nosso)
Antonio Antunes de Almeida Curiosamente em todos os 111 lotes referentes a Antonio Antunes de Almeida, identificados no Índice, não consta a data nem a forma de transação. Todos referem-se ao quarteirão 1 da XIV seção urbana. Esta seção fica nas imediações da estação ferroviária de Belo Horizonte e tem por peculiaridade o fracionamento dos lotes, como lote 1A, 1B, etc. Não foi identificada, entretanto, qualquer menção a Antonio Antunes de Almeida nas fontes consultadas que permitisse algum esboço de seu perfil.
07/06/1926. A maioria (76) dos lotes referentes a ele são do quarteirão 2 da XIV seção
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Incide 86 vezes no Índice, sendo o primeiro registro em 24/09/1896 e o último em
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Aurélio Lobo
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urbana, já mencionada. Estes 76 lotes tampouco têm data ou forma de transação, no Índice. Ele foi tesoureiro da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, segundo o Almanak Laemmert, de 1909 a 1926. Abílio Barreto faz três citações a ele. Duas como construtor de um teatrinho provisório em 1895 (BARRETO, 1936, p. 433) e do Ginásio – depois Fórum (Ibidem, p. 509). A terceira citação é a seguinte: No dia 20 de fevereiro [de 1897] consorciavam-se em Sabará, e vinham morar em Belo Horizonte, o Sr. Aurélio Lobo e a Exma. Senhorinha Altina Costa, duas ilustres figuras que até hoje se acham incorporadas ao escol social horizontino, sendo que o Sr. Aurélio Lobo já se achava aqui anteriormente, desde os primeiros dias da Comissão Construtora. A ele, desde esta época, deve Belo Horizonte boa parte do seu progresso, como construtor, como tesoureiro da Prefeitura e como proprietário. (BARRETO, 1936, p. 660) (grifo nosso)
Na obra Dicionário Biográfico de Construtores e Artistas de Belo Horizonte (1894-1940) (IEPHA, 1997), há o seguinte verbete sobre ele: LOBO, Aurélio (1871 -?) Engenheiro e construtor. Chegando ao Curral del Rei, montou em 1895 uma casa comercial de secos e molhados. Mais tarde, em sociedade, com Francisco Soucassaux, fundou a empresa construtora F. Soucassaux e Cia. Participou da construção de vários prédios em Belo Horizonte, como o do antigo Forum (1897/98), atual Instituto de Educação [...]. Foi responsável pelas obras do Hotel Sul-Americano (Edifício Aurélio Lobo, 1920). Ocupou os cargos de Tesoureiro e construtor da Prefeitura. (IEPHA, 1997, p. 141)
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Legenda: Praça Rui Barbosa em tendo ao fundo o Edifício Aurélio Lobo, atual Hotel Sul América Palace, Belo Horizonte (1929). Fonte: Sistema Integrado de Acesso do Arquivo Público Mineiro – SIAAPM, 2019.
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Figura 1 – Inauguração do Monumento à Nação Mineira
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Felicissima de Paula Teixeira/ Filhos de Felicissima de Paula Teixeira É citada 66 vezes no Índice. A primeira em 28/09/1899 e a última em 05/07/1920. Cerca de 59 lotes referem-se apenas ao quarteirão 1 e ao 2 da XIV seção urbana já mencionada. Ela era casada com o advogado Antônio Teixeira de Siqueira Magalhães. Segundo o livro Memória das Ruas (GOMES, 1992), a rua Teixeira Magalhães, antiga rua Aiuruoca, na Floresta, seria uma homenagem ao marido de D. Felicíssima. Com apenas um quarteirão, esta rua começa na avenida do Contorno n. 1610 e acaba na rua Itajubá n. 294. “É mais uma das vias públicas surgidas em decorrência das modificações por que passou a XIV zona urbana” (Ibidem, p. 207). Segundo a mesma fonte, o vendedor era exatamente Antonio de Almeida, o segundo maior proprietário de lotes urbanos aqui informado: ao se enviuvar [década de 20), D. Felicíssima abriu uma rua na propriedade da família, adquirida em 1908 de Antonio de Almeida, tendo mandado construir vários chalezinhos para alugar, hoje já demolidos ou reformados. (GOMES, 1992) (grifo nosso)
No prefácio da mesma obra, lê-se, que a rua Teixeira Magalhães seria um dos exemplos de alteração do traçado original da cidade para que os terrenos fossem melhor aproveitados, favorecendo seus proprietários, “que ainda tiveram o prêmio de ter seu nome perpetuado na geografia da cidade”. (Ibidem, p. 14) No Índice, o marido de D. Felicíssima, Antônio Teixeira de Siqueira Magalhães, figura como proprietário de sete lotes urbanos, sendo seis de 06/11/1897 e apenas um de 1899 - este em nome dos filhos menores Samuel, Amadeu e Colombino. Estes filhos – sem menção aos pais – também aparecem no Índice com compradores, em 1906, de lotes adquiridos do mesmo Antonio Antunes de Almeida, já mencionado. O filho de D. Felicíssima, Columbino Teixeira de Siqueira, por sua vez, consta no mesmo Índice com 19 incidências, sendo sete por herança, duas por carta de adjudicação (ato judicial que dá a alguém a posse e a propriedade de determinados bens), duas por doação, duas por cessão e seis por compra. Trata-se do único caso do Índice, dentre os 15
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pesquisados, de menção a herdeiros de uma mesma família.
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Jose Benjamin/José Benjamim Consta com 42 incidências com seu nome isoladamente e 20 com seu nome conjugado ao de Joaquim Daniel da Rocha (o oitavo maior proprietário de lotes aqui estudados), uma em seu nome conjugado ao de sua mulher e ainda uma como associado a ‘outro’ não mencionado. Ao todo, há 64 incidências. A primeira menção data de 14/10/1895 e a última de 29/08/1916. Curiosamente, das 20 incidências referentes a José Benjamin e Joaquim Daniel da Rocha, 19 são da mesma data: 02/12/1897 – dias antes da inauguração da Capital. José Benjamin é citado por Abílio Barreto, na relação dos proprietários das edificações em construção em Belo Horizonte, em maio de 1896: uma, referente ao primeiro sobrado da cidade no lote 1 do quarteirão 19 da seção I, e outra, ao lote 2 do mesmo quarteirão (BARRETO, 1936, p. 547 e p. 549). A Manufactura de fumos dos Sr. José J. da Silveira e Jose Benjamin aguardava a instalação de energia elétrica pela Prefeitura, em relatório de 1907-1908 do prefeito Benjamin Jacob ao Conselho Deliberativo de Belo Horizonte. Jose Benjamin figurava no Almanak Laemmert como membro do Conselho Deliberativo de Belo Horizonte em 1903, 1904, 1906, 1907, 1908. Como presidente da Junta Comercial de Belo Horizonte de 1905 a 1908. É mencionado como coronel e tenente-coronel, indistintamente. Decreto n. 3 de 9 de outubro de 1924, do prefeito Flavio Fernandes dos Santos, criava o bairro Bela Vista, atendendo ao requerimento do “dr. João Carvalhaes de Paiva, coronel José Benjamin e Victorio Marçolla” (BELO HORIZONTE, 1924). Há ainda uma referência a um José Benjamin como acionista da Companhia Manufactora de Calçados Sabarense, conforme publicação do Jornal Minas Gerais de 1894 (edição 00202).
Antonio Garcia de Paiva/ Antônio Garcia de Paiva & Co/ Garcia de Paiva & Pinto No Índice, as incidências somam 57, conforme Quadro 2. A primeira incidência
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data de 08/10/1895 e a última de 01/02/1930.
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Quadro 2 – Antonio Garcia de Paiva e suas empresas segundo incidências no Índice de Lotes Urbanos Proprietário
Número de Incidências
Antonio Garcia de Paiva Antonio Garcia de Paiva & Cia Garcia de Paiva & Co. Garcia de Paiva & Pinto Antonio Garcia Total
30 5 2 19 1 57
Fonte: Índice de Lotes Urbanos APCBH, 2019 Elaboração: Autora, 2020
A Revista O Malho, de 1914, traz extensa reportagem sobre o Coronel Antonio Garcia de Paiva. O texto destacava: Dias depois [da comemoração de aniversário], regressou para Bello Horizonte, onde reside, o Sr. coronel Garcia de Paiva, que foi um dos heróes da fundação daquella capital e que tem concorrido para o embellezamento de suas avenidas e ruas, como provam os bellos palacetes por si construídos, como a Faculdade de Medicina, o Collegio Anglo-Mineiro, a reconstrução do Grande Hotel, etc. Alli na Capital, mantém o coronel Garcia o seu estabelecimento industrial, com uma bella serraria modelo, movida a electricidade, onde trabalha um grande número de operários que tiram o necessário para a subsistencia de suas famílias. (REVISTA O MALHO, 1914)
No livro de Abílio Barreto, Antonio Garcia de Paiva é mencionado como proprietário do Hotel Lima, no Largo do Rosário. Neste hotel, houve o almoço para os membros do governo mineiro que visitavam a capital em 31 de julho de 1896. (BARRETO, 1936, p. 643). Antonio Garcia de Paiva foi citado também, pelo mesmo autor, como membro da Comissão encarregada dos festejos para inauguração da cidade (Ibidem, p. 734). A Figura 2 reproduz foto do livro de Abílio Barreto, na qual se veem o Largo do
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Rosário e o Hotel Lima, “mais tarde propriedade do Sr. Antônio Garcia de Paiva”.
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Figura 2 – Foto do Largo do Rosário
Legenda: a casa em cuja porta está um homem em pé era o Hotel Lima, mais tarde propriedade do Sr. Antônio Garcia de Paiva. Fonte: BARRETO, 1936
No Dicionário Biográfico de Construtores e Artistas de Belo Horizonte (18941940) (IEPHA, 1996), há o seguinte verbete sobre este proprietário: PAIVA, Antonio Garcia de (? -?). Construtor e industrial. Em 1903, associouse ao genro Augusto de Souza Pinto, estabelecendo um depósito de madeira, na rua Rio de Janeiro. Em 1906, inauguraram o primeiro engenho de serra a vapor para o preparo de madeira, marco inicial da indústria da capital, que deu origem à Serraria Souza Pinto [...]. Inicialmente denominada Garcia de Paiva e Pinto, a empresa foi responsável pela cessão de materiais diversos para construções e reformas de prédios públicos e particulares em Belo Horizonte [...] Na época da construção da cidade era proprietário do Hotel Lima, localizado no Largo do Rosário, do antigo Curral del Rei, área hoje correspondente ao cruzamento da Avenida Álvares Cabral com a rua da Bahia. (IEPHA, 1996, p. 190)
A empresa Garcia Paiva & Pinto é mencionada como serraria na rua da Estação, no Almanak Laemmert, de 1911. Na mesma fonte, há a propaganda de Garcia de Paiva & Pinto – A Industrial, serraria, marcenaria e construções, à avenida Tocantins, n. 809. O escritor Pedro Nava também se refere à firma Garcia de Paiva & Pinto, por diversas vezes
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em sua obra memorialística.
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Antonio Daniel da Rocha/ Coronel Antonio Daniel da Rocha Grafado também Antônio Daniel Rocha e ainda Coronel Antônio Daniel da Rocha, figura em 43 incidências na série consultada, mas há 59 lotes citados. Ou seja, algumas citações compreendem mais de um lote. A primeira incidência data de 27/07/1899 e a última, de 18/12/1930. Ele figura como acionista da Companhia Manufactora de Calçados Sabarense – 30 ações - cuja ata de constituição de 17 de junho de 1894 foi publicada no Jornal Minas Gerais. Devia ser alguém importante, pois sua chegada em Belo Horizonte vindo de Sabará era noticiada pelo mesmo jornal em 1899 (edição 239, 243 e 283) e em 1900 (edição 024 e 036). No livro de Abílio Barreto, é mencionado duas vezes como Coronel Daniel da Rocha (BARRETO, 1936, p. 179 e p. 433). Numa delas, é citado como o anfitrião do almoço em Sabará oferecido a Afonso Pena, então presidente do estado, e a Crispim Jacques Bias Fortes, seu sucessor, em agosto de 1894, antes da viagem dos estadistas ao Curral del Rey.
Joaquim Daniel da Rocha Aparece com 42 incidências no Índice, sendo 20 em associação com José Benjamin, também citado neste estudo. A primeira data de 22/05/1899 e a última, de 15/03/1909. Também Joaquim Daniel da Rocha é mencionado como acionista da Companhia Manufactora de Calçados Sabarense, na ata publicada no Jornal Minas Gerais, em 1899. Era ainda cessionário de D. Anna Ermelinda Alvares Antunes, uma das proprietárias de casa em Ouro Preto com direito a lote na nova capital, conforme convocação veiculada pelo Jornal Minas Gerais, do mesmo ano. Também devia ser alguém importante, pois sua chegada em Belo Horizonte vindo de Sabará era noticiada pelo mesmo jornal em edições de 1900.
Silverio Silva /Silvério Silva & Cia /Silveiro Silva e Alvim/ Coronel Silverio Silva
No Jornal Minas Gerais de 20 de maio de 1912, há referência à Belo Horizonte Industrial Serraria e Fábrica de Ferros dos Srs. Silverio Silva & Co. (ARQUIVO REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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é de 29/09/1909 e a última, de 07/02/1929.
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São citados 42 vezes no Índice, sendo 12 delas como empresa. A primeira citação
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PÚBLICO MINEIRO, 2019). No Almanak Laemmert de 1918, há propaganda de Silverio Silva & Co – Grande Serraria São José, à avenida Tocantins, 729. As referências à empresa seguem até 1926, na mesma fonte. A empresa Silvério Silva & Co. é citada no relatório do Prefeito Affonso Vaz de Mello de 1918-1919 ao Conselho Deliberativo como uma das indústrias que goza de favor de energia da Prefeitura. Silvério Silva e Alvim era o nome da sociedade dele com seu genro, Aristóteles Juvenal de Faria Alvim (1891-1965). Verbete do Dicionário Biográfico do ICAM sobre Aristóteles Juvenal informa: Engenheiro civil, formado na primeira turma da Escola de Engenharia da UMG, 1916. Prestou serviços em Belo Horizonte, onde construiu diversos edifícios e por meio de suas firmas, organizou e planificou bairros e vilas. [...]. Em 1922, fundou a firma Empreendimentos Silvério Silva e Alvim, em sociedade com seu sogro e um irmão, ocupando até a sua morte o cargo de diretor-presidente, bem como a SS Companhia, Empreendimentos e Participações. (ICAM, 2013) (grifo nosso)
Francisco de Assis Duarte/ Francisco Assis Duarte Tinha 36 incidências no Índice. A primeira em 19/10/1910 e a última em 20/06/1928. Em 09/07/1929 há uma última incidência dele associado a Ildeu Duarte. Ele consta também como acionista (dez ações) da Companhia Manufactora de Calçados Sabarense, conforme edição do Jornal Minas Gerais de 1894 (edição 00202). Joaquim Severiano de Carvalho/ J. Severiano de Carvalho/ Joaquim Severiano & Companhia/ J. Severiano & Cia Aparece 35 vezes no Índice, individualmente ou sob as razões sociais de sua empresa, conforme Quadro 3. A primeira em 10/02/1897 e a última em 03/03/1911. Quadro 3 – Incidências de Joaquim Severiano de Carvalho no Índice Denominação
Incidências
Joaquim Severiano de Carvalho J. Severiano de Carvalho Joaquim Severiano & Companhia J. Severiano & Cia Total
28 2 2 3 35
anúncio informando a dissolução da firma J. Severiano & Machado. Em 1895 e 1897, a
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Em 1894, Joaquim Severiano de Carvalho publicou, no Jornal Minas Gerais,
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Fonte: Índice de Lotes Urbanos APCBH, 2019 Elaboração: Autora, 2020
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empresa figurava, entretanto, como um dos maiores contribuintes de Ouro Preto. Não se identificou, entretanto, o ramo de negócios da empresa. Joaquim Severiano é citado na “Relação dos Proprietários de casas em Ouro Preto com direito a lote de terrenos na futura capital, conforme a lei 3 de 17 de dezembro de 1.893”, já informada. Em 1897, Joaquim Severiano de Carvalho, junto com vários outros, foi convidado a comparecer à Comissão Construtora para legalizar a concessão do lote na nova Capital, em razão de ser residente em Ouro Preto.
Clemente de Faria Consta 34 vezes no Índice, sendo duas em seu nome conjugado ao de J. Maciel de Paiva. A primeira em 01/08/1921 e a última em 06/02/1929. Em 1925, na inauguração do Banco da Lavoura, em Belo Horizonte, ele consta como gerente; Major Aurélio Lobo como secretário; e Dr. Hugo Werneck como presidente, conforme o Jornal Minas Gerais de 13 de junho daquele ano (ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, 2019). Há 13 lotes em nome do Banco da Lavoura no Índice. Quando do falecimento de Clemente de Faria em 1948, a imprensa destacava sua atuação: Afastado das atividades políticas, após uma eficiente atuação no Congresso estadual e federal dedicou-se ao comércio e indústria tendo feito parte de diversas organizações. Deputado ao Congresso Mineiro em 1915, agitou a questão dos limites entre Minas e Bahia, questão que teve grande repercussão na imprensa. Foi eleito deputado federal em 1930. Em 1925 fundou o Banco da Lavoura de Minas Gerais e pouco depois o Banco de Crédito Predial, hoje Banco de Minas Gerais. Além de presidente do Banco da Lavoura, presidiu várias organizações imobiliárias da capital. Era presidente também de sociedades comerciais e industriais. (PERDA..., 11 out. de 1948)
Antonio Alves Martins/ Antonio Alves Martins Junior Figuram com 32 incidências no Índice, sendo apenas duas em nome do primeiro. Não se sabe tratar-se da mesma pessoa ou de pai e filho. A primeira menção é de 12/08/1896 e a última, de 05/06/1925. Antonio Alves Martins Junior é citado como proprietário de Fazendas e Modas
em Comissões e Consignações e Gêneros do Paiz; Refinação de Assucar, até 1918, também na capital. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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figura sob os títulos Comissões e Consignações e Molhados, na avenida Paraná. Em 1910,
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em Belo Horizonte, no Almanak Laemmert em 1900 e 1901. Em 1909, na mesma fonte,
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Avelino Fernandes (? – 1935) O português Avelino Fernandes, natural de Vila da Barca, região do Minho, aparece com 30 citações no Índice. A primeira em 09/02/1899 e a última em 28/09/1927. É mencionado como representante do próprio Almanak Laemmert – fonte primária principal do presente estudo –, em Ouro Preto, em sua edição de 1897 e de 1899. Nesta segunda edição, é citada a empresa Avelino Fernandes & Cia. em Ouro Preto, do setor de mantimentos, informação que se repete em 1901, 1902, 1903. O Grande Armazem de Seccos e Molhados Avelino Fernandes e Companhia tinha sua sede em Ouro Preto (MG) e uma filial na Companhia D. Pedro North Del Rey, em Mariana (MG). Em 1894, era o único do gênero na cidade de Ouro Preto (JORNAL MINAS GERAIS, 1894. p. 4). Avelino Fernandes é mencionado, associado ao Capitão Candido Rodrigues da Cruz, como responsável pelo escritório de procuratórios e de negócios comerciais, no mesmo ano, em Ouro Preto, segundo o Jornal Minas Gerais. Em 26 de novembro de 1893, ele, junto com vários peticionários, publica no mesmo jornal, reclamação ao Congresso Mineiro contra a mudança da Capital de Ouro Preto. Em 1895, a empresa Avelino Fernandes & Co. é citada como os maiores contribuintes de Ouro Preto, para fins eleitorais. Em 23 de abril deste mesmo ano, a firma publica um anúncio no Jornal Minas Gerais, informando que Bernardo Pinto Monteiro, futuro prefeito de Belo Horizonte (1899-1902) e o Capitão Candido Augusto da Cruz estavam se retirando da sociedade. Também em 1895, Avelino Fernandes foi nomeado vice-cônsul de Portugal, em Belo Horizonte. Em 1898, publicou um anúncio sobre a liquidação da firma Avelino Fernandes & Co., assumindo ele próprio a gestão dos negócios. Há propaganda do comércio de Avelino Fernandes, no Jornal Diário de Minas, de 1899, como vendedor de livros, formicida, manteiga, vinhos, confetes, chás, material elétrico, passagem de navio para a Exposição Internacional de Paris de 1900. Em 1904, no Almanak Laemmert, Avelino Fernandes é mencionado no item
se mudar da Serra para a rua Aimorés n. 1.016, teria alugado uma casa do comendador. No volume “Beira-Mar”, Nava conta: REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Pedro Nava o cita reiteradamente, em sua obra. A família de Nava, em 1925, ao
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Armazem de Viveres e Mantimentos, na avenida Liberdade, em Belo Horizonte.
Dossiê [D. Diva, mãe do escritor] alugou por 25$000 uma casinha tipo B das construções da fundação de Belo Horizonte, pequena de fachada, portão lateral de madeira, duas janelas de frente, propriedade do Comendador Avelino Fernandes. (NAVA, 2013 p. 250) (grifo nosso)
O comendador Avelino Fernandes é personagem da descrição que Nava faz da rua da Bahia, de seu tempo: “Em cima dessa loja [Casa Decat], morava o comendador Avelino Fernandes, cônsul de Portugal, nosso amigo (NAVA, 2013)” (grifos nossos). De seu obituário, em 1935, a imprensa destacava: Aqui residindo desde o começo da construção da Capital, Avelino Fernandes de tal maneira se radicou em nosso meio que teve seu nome ligado à própria história da cidade [...]. Foi um dos fundadores da Associação Commercial, presidente da Colonia Portugueza, provedor da Irmandade do Santíssimo Sacramento da Matriz de Boa Viagem [...], provedor da Santa Casa. (MINAS GERAIS, 26 nov. 1935, p. 11) (grifo nosso)
Juventino Dias Teixeira Possui 30 menções no Índice. A primeira em 17/06/1923 e a última em 12/03/1931. O Novo Dicionário Biográfico de Minas Gerais (ICAM, 2013) traz verbete, do qual se extraíram as seguintes informações até 1930. Juventino Dias (Betim, 13/03/1884 - 1976): comerciante, empresário e industrial. Nasceu em Capela Nova, atual Betim, Minas Gerais. Atuou como sócio da firma Duarte e Companhia, em Caeté/MG (1908), e de uma das maiores casas comerciais de Sabará/MG. Proprietário da Casa Juventino em Santa Bárbara/MG (1912), de estabelecimento de mesmo nome em Belo Horizonte/MG (1920). [...] Fundou a Torrefação de Café Minas Gerais (1930) em Belo Horizonte. [...]. Foi vereador de Belo Horizonte entre 1926-1929. (ICAM, 2013)
O Coronel Juventino Dias Teixeira era membro do Conselho Deliberativo de Belo Horizonte, em 1930, segundo o Almanak Laemmert.
Temporalidade Interessante também mensurar o tempo em que os principais adquirentes se mantiveram no negócio imobiliário, segundo dados do Índice. O Quadro 4 traz esta periodização, embora precária, haja vista que há ausência de datas em muitas transações
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informadas na fonte consultada.
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Dossiê Quadro 4 – Período de Atividade Imobiliária dos Principais Adquirentes de Lotes de Belo Horizonte – 1895-1931 Nome Adquirente José Francisco de Macêdo / José Francisco de Macedo / Jose Francisco de Macêdo (*) Antonio Antunes de Almeida Aurélio Lobo (*) Felicissima de Paula Teixeira/ Felicíssima de Paula Teixeira/ Filhos de Felicíssima de Paula Teixeira (*) José Benjamin/ José Benjamim/ José Benjamim e sua mulher/ Jose Benjamin e Joaquim Daniel Rocha Antonio Garcia/ Antonio Garcia de Paiva/ Garcia de Paiva & Cia./ Garcia de Paiva & Pinto/Antônio Garcia de Paiva & Cia. Antonio Daniel da Rocha/ Cel. Antônio Daniel da Rocha Joaquim Daniel da Rocha Silverio Silva/ Silvério Silva/ Silvério Silva & Cia./ Silverio Silva e Alvim/ Coronel Silverio Silva Francisco de Assis Duarte/ Francisco Assis Duarte/ Francisco de Assis Duarte e Ildeu Duarte (*) Joaquim Severiano de Carvalho/ J. Severiano de Carvalho/ Joaquim Severiano & Companhia/ J. Severiano & Co. / J. Severiano & Co. Clemente de Faria Antonio Alves Martins/ Antonio Alves Martins Junior Avelino Fernandes Juventino Dias Teixeira
Datas de início e término
Número de Anos
1897 -1919
22
NI 1896-1926 1899-1920
NI 30 21
1896-1916
20
1895-1930
35
1899-1930 1899-1909 1909-1929
31 10 20
1910-1929
19
1897-1911
14
1921-1929 1896-1925 1899-1927 1923-1931
8 29 28 8
Fonte: Índice de Lotes Urbanos APCBH, 2019 Elaboração: Autoras, 2020 Nota: (*) = há lotes sem data informada no Índice. NI = Não Informado
Os dados acima indicam que o mais longevo dos principais adquirentes foi Antônio Garcia de Paiva e suas empresas, com 35 anos de especulação imobiliária. Em segundo lugar, figura Antonio Daniel da Rocha, com 31 anos de atividade. Aurélio Lobo, com 30 anos de atividade imobiliária, aparece em terceiro lugar.
Considerações Finais O presente estudo confirmou a hegemonia de José Francisco de Macedo, o Zé dos Lotes, na especulação imobiliária urbana de Belo Horizonte, no período analisado. Foram 150 lotes adquiridos durante 22 anos. Além dele, outros personagens florescem deste breve estudo. Se alguns perpassam quase toda a série temporal estudada, como Antonio Garcia de Paiva e suas empresas (35 anos, de 1895 a 1930), outros se concentram em
Dos 15 nomes citados, não se obteve dado algum sobre o segundo principal especulador: Antonio Antunes de Almeida. Se não há data das suas transações, sabe-se, REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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1923 a 1931).
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períodos mais breves, como Clemente de Faria (de 1921 a 1925) e Juventino Dias (de
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contudo, que seus 111 lotes se concentraram na XIV seção urbana, nas proximidades da Estação Ferroviária. Quarteirões dessa mesma seção foram também objeto de aquisição de outros proprietários majoritários. Entre os 15 especuladores, três atuavam como agentes públicos municipais durante o marco temporal aqui adotado. Aurélio Lobo foi tesoureiro da Prefeitura entre 1909 e 1926; José Benjamin foi membro do Conselho Deliberativo entre 1906 e 1908; e Juventino Dias, membro do mesmo Conselho, em 1930. Chama especial atenção o vínculo de quatro dos 15 especuladores com a Companhia Manufactora de Calçados Sabarense: José Benjamin; Antonio Daniel da Rocha; Joaquim Daniel da Rocha e Francisco de Assis Duarte. Há três proprietários ligados ao ramo da construção civil e serraria: Aurélio Lobo, Antonio Garcia de Paiva e Silvério Silva – os dois últimos também constituintes de empresas do mesmo ramo. Alguns nomes exerceram amplo espectro de atividades, seja no comércio, seja na indústria, ou nas atividades beneméritas, como o comendador Avelino Fernandes ou Juventino Dias. Curiosamente, há intrincada relação entre alguns dos proprietários citados, como José Benjamin e Joaquim Daniel da Rocha. Ambos compraram em sociedade 19 lotes, dias antes da inauguração da capital. O engenheiro Aurélio Lobo, tesoureiro da Prefeitura (1909-1926) e ligado à atividade de construção civil, emerge, portanto, como o principal adquirente de lotes urbanos, se conjugadas duas variáveis: número de lotes (86) e temporalidade (30 anos). O desvelamento dos 15 principais adquirentes de lotes urbanos de Belo Horizonte, com base em fontes primárias, procurou apontar, dentro de suas limitações, quem foram os principais membros da elite que fizeram do espaço da cidade um negócio nos primeiros
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anos da Capital.
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A VOZ DELAS: análise de discursos das representantes da ALEM no acervo audiovisual da CMBH (2001-2005) Sus voces: análisis de los discursos de representantes de la ALEM en la colección audiovisual del CMBH (2001-2005)
Maria Ferraz1* Resumo: Este artigo tem como objetivo apresentar o acervo da série “Registros Audiovisuais de Eventos Diversos” da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) através de um estudo de caso. A partir da análise de alguns discursos realizados na CMBH por integrantes da Associação Lésbica de Minas – ALEM (1998-2014), buscou-se demonstrar a versatilidade desta documentação. A série, que se encontra sob guarda no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH), dispõe de gravações de reuniões e eventos ocorridos na casa legislativa municipal. Por isso, contém registros de falas de diferentes lideranças políticas e sociais da cidade desde a década de 1970 até os dias atuais. O artigo objetiva, ainda, apresentar parte da trajetória da ALEM e analisar alguns dos debates políticos que envolveram a história deste movimento social. Palavras-chave: Câmara Municipal de Belo Horizonte. Associação Lésbica de Minas. Arquivo. Resumen: Este artículo tiene como objetivo presentar la serie de “Registros Audiovisuais de Eventos Diversos” de la “Câmara Municipal de Belo Horizonte” (CMBH) a través de un estudio de caso. A partir del análisis de algunos discursos pronunciados en el CMBH por miembros de la “Associação Lésbica de Minas” – ALEM (1998-2014), se buscó demostrar la versatilidad de esta documentación. La serie, que se encuentra custodiada en el “Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte” (APCBH), presenta grabaciones de reuniones y eventos que tuvieron lugar en la casa legislativa municipal. Por tanto, contiene registros de discursos de diferentes líderes políticos y sociales de la ciudad desde la década de 1970 hasta la actualidad. El artículo también tiene como objetivo presentar parte de la trayectoria de ALEM y analizar algunos de los debates políticos que involucraron la historia de este movimiento social. Palabras clave: Câmara Municipal de Belo Horizonte. Associação Lésbica de Minas. Archivo.
Introdução Quando pensamos em documentos produzidos pelo poder legislativo, instantaneamente imaginamos projetos de leis, atas de reuniões, documentos de comissões, entre outros acervos que correspondem à função típica deste poder e que remetem a pilhas de documentos textuais. De fato, parte importante da atuação das casas
Graduada em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mestre e doutoranda em História Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Atualmente, trabalha no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH) em Convênio de Cooperação Técnica entre o APCBH e a Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH). Endereço eletrônico: mariaferraz.hist@gmail.com. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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legislativas está registrada nesses tipos documentais e é comumente acessada quando
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pesquisadoras/es desejam saber as perspectivas e propostas de vereadoras/es e deputadas/os sobre determinado tema. Existe, entretanto, outro grupo de documentos, igualmente relevante, que, embora seja bastante explorado por jornalistas, talvez ainda possa ser melhor utilizado por historiadoras/es: as gravações audiovisuais das sessões e eventos ocorridos nas casas legislativas. É fato que nem sempre este tipo de acervo está disponível para consulta. Algumas instituições disponibilizam apenas as notas taquigráficas2 das reuniões, o que, evidentemente, constitui um tipo de documento completamente diferente das gravações audiovisuais. Entretanto, quando esses registros podem ser devidamente acessados, eles possibilitam não só ouvir/assistir ao pronunciamento de vereadoras/es e deputadas/os sobre determinados projetos e/ou situações, mas também analisar a participação de diferentes forças políticas nas instituições legislativas. Portanto, do ponto de vista histórico, nesse acervo de gravações, é possível escutar a voz de líderes comunitárias/os, dirigentes sindicais, especialistas técnicas/os, militantes, membros de governos, e uma infinidade de outras personalidades que fazem parte do debate público sobre determinado assunto em período específico. Essas manifestações, de grupos sociais diversos, podem ser ouvidas ou vistas, especialmente, nas gravações das audiências públicas, eventos que, muitas vezes, simbolizam o incômodo da sociedade com determinado tema e a busca por espaço de fala junto ao poder público. Entretanto, outros tipos de eventos também podem trazer pronunciamentos de diferentes personagens sociais, como as reuniões especiais, as reuniões de comissões e, até mesmo, as entregas de homenagens. O importante é compreender como, a partir dessas gravações, é possível desenvolver pesquisas múltiplas sobre grupos, personalidades e debates públicos ao longo da história. A partir delas, é possível analisar um tema nacional ou local, de curta, média ou longa duração, focar nas/os legisladoras/es ou nas organizações civis, discorrer sobre políticas públicas e/ou a ação de movimentos sociais. Enfim, seja como fonte de pesquisa principal ou como
As notas taquigráficas são as transcrições dos discursos realizados nas casas legislativas. No caso da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), por exemplo, os pronunciamentos são revisados e as notas disponibilizadas para o acesso público. Em acervos mais antigos da ALMG só é possível ter acesso às notas taquigráficas, não estão disponíveis as gravações das reuniões. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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documentação acessória, este tipo de acervo, presente nos arquivos das mais diferentes
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casas legislativas, possibilita explorar e analisar discursos de temas variados e em diferentes períodos históricos. Buscando dar visibilidade a este tipo de fonte documental e apresentar abordagens possíveis para a pesquisa histórica, tenho como proposta, para este artigo, utilizar gravações em áudio de reuniões da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) para analisar a trajetória da Associação Lésbica de Minas (ALEM), primeira organização política e social da capital mineira voltada para a luta por direitos e igualdade das mulheres lésbicas. Partindo desta análise como exemplo, procuro, dessa forma, explicitar a relevância deste acervo para estudos sobre a história da cidade. Busco, ainda, contribuir para a divulgação dos estudos das lesbianidades como tema da historiografia e, com isso, elaborar um trabalho que se integra aos debates da história pública enquanto campo (SANTHIAGO, 2016). Para facilitar a compreensão do artigo, o texto foi dividido em três partes com os seguintes temas: breve apresentação da trajetória da ALEM (1998-2014) e das suas principais ações; síntese do acervo de registros audiovisuais de reuniões da CMBH e suas características; e, por fim, a análise de alguns pronunciamentos da ALEM na CMBH. Ao final do texto, encerro com algumas considerações que buscam instigar leitoras/es e pesquisadoras/es a pensar sobre como estes documentos podem contribuir para o desenvolvimento de futuros estudos. Antes de iniciar a discussão do tema, cabe uma observação em relação às terminologias utilizadas ao longo do artigo para designar pessoas e organizações lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queer, intersexo, assexuais, pansexuais, entre outras. A sigla atualmente utilizada pelos movimentos sociais que trabalham com esta população é a LGBTQIAP+, que corresponde, justamente, às sexualidades/afetividades e gêneros listados anteriormente. Entretanto, as identidades mobilizadas por esta sigla estão inseridas em contexto atual e específico, não podendo ser tratadas de forma equivalente em outros períodos históricos. Por isso, ao longo do artigo, diferentes termos e siglas serão utilizados, de acordo com a época à qual fazem referência. Por exemplo, na década
falava-se nas organizações “GLBTs” (gays, lésbicas, bissexuais e travestis). A Parada do Orgulho LGBTQIAP+ era denominada, em 1998 quando surgiu, de “Marcha do Orgulho REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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travestis eram denominadas de “movimentos homossexuais”. No início dos anos 2000,
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de 1970, as organizações que lutavam por igualdade e direitos para gays, lésbicas e
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Gay”. Ou seja, uma infinidade de termos que, apesar de parecerem confusos no texto, têm relação com a tentativa de não tratar de forma anacrônica as identidades e organizações sociais do passado. Em alguns casos específicos acrescento, ainda, notas de rodapé para que seja possível compreender algumas questões de época.
A trajetória da ALEM (1998-2014): alguns apontamentos A história dos movimentos lésbicos no Brasil remete ao final da década de 1970 quando, a partir de uma cisão com o Grupo Somos (SP)3, surgiu o Grupo Lésbico Feminista de São Paulo4. Ao longo dos anos 1980, muitos dos movimentos sociais vinculados às temáticas homossexuais acabaram deixando de existir. A partir dos anos 1990, por outro lado, várias organizações voltadas para estes grupos se fortaleceram e se consolidaram. No caso das militâncias das mulheres lésbicas, muitas surgiram a partir de eventos nacionais. Foi neste contexto, de reorganização de forças políticas e de busca por ampliação dessas mobilizações no país, que surgiu, em 1996, o Seminário Nacional de Lésbicas (SENALE). O evento, iniciado na cidade do Rio de Janeiro (RJ), tinha como objetivo abordar as especificidades das vivências lésbicas e fortalecer a luta deste grupo social em diferentes partes do território nacional (CAMPOS, 2014, p.145). Para além disso, existia, por parte das militantes, a insatisfação com eventos mistos (de gays, lésbicas, bissexuais e travestis), em que o “lesbianismo” era pouco debatido. Os SENALEs foram, portanto, importantes por incentivar o surgimento de organizações sociais de mulheres lésbicas em diferentes partes do país, entre elas, em Minas Gerais. Soraya Menezes, uma das fundadoras da ALEM, era sindicalista e estava no Rio de Janeiro (RJ) no momento em que ocorreu o I SENALE. Ao conhecer o evento e os movimentos lésbicos vinculados a ele, se interessou pela pauta e, em 1997, quando ocorreu o II SENALE em Salvador (BA), foi convidada a integrar a programação do
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O Grupo Somos (SP) surgiu em 1978 e esteve em atividade até 1983. Foi o primeiro grupo de homossexuais a surgir com pautas políticas definidas. No início era composto majoritariamente por homens gays, entretanto, em 1979 surgiu em seu interior o Grupo Lésbico Feminista (LF). 4 A organização foi a primeira voltada para a pauta lésbica a ser criada no Brasil. Surgiu em 1979, ainda vinculada ao Grupo Somos (SP), e esteve em atividade até 1990. Teve, ao longo da sua história, vários nomes. Enquanto estava vinculada ao Somos, em 1979, era chamada de Facção Lésbico-Feminista (LF). Ao se tornar autônoma, em 1980, passou a ser o Grupo Lésbico-Feminista. Depois, Grupo de Atuação Lésbico-Feminista e, em 1983, Grupo Ação Lésbica Feminista (GALF).
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encontro. A partir deste evento, decidiram pela organização do III SENALE em Minas Gerais. Tal situação culminou no surgimento da ALEM em 1998 (MACHADO, 2007, p.110). Em entrevista de história oral realizada com Soraya Menezes 5, a fundadora do grupo retoma suas memórias sobre a importância do SENALE para a organização da ALEM: (...) em 1996, aconteceu o primeiro Seminário de Lésbicas no Rio de Janeiro. Foi o Coletivo de Lésbicas do Rio de Janeiro que organizou este seminário. Foram várias mulheres de outros estados para lá. Nesse momento, eu estava participando de encontros sindicais no Rio e fiquei sabendo. E, logo em 1997, eu fui convidada para estar no II SENALE (segundo Seminário Nacional de Lésbicas), que foi em Salvador, e eu fui falar sobre as lésbicas nos espaços de poder. Porque, naquela época, eu já era presidente do Sindicato, e não é que eu era a única lésbica presidente de sindicato, com certeza existiam muitas, mas não eram assumidas. Tinha uma necessidade de se colocar uma pauta enquanto lésbica, não somente enquanto trabalhador, não somente de reivindicação de salário, mas de reivindicação da gente ser dona do nosso próprio corpo, não existia esse debate. E aí quando eu volto para Minas, já com a responsabilidade de tá trazendo o III Seminário Nacional de Lésbicas para cá, eu vim com muito medo e com muito temor porque eu era a única lésbica, em Salvador, de Minas Gerais. Então, tinha a responsabilidade de trazer um seminário daquele porte e eu estava sozinha ali. E aí me deu um calafrio muito grande. Mas, naquele momento, as lésbicas sentiram a necessidade de que fosse importante realizar um evento desse porte para além da visibilidade, para ajudar a organizar as lésbicas aqui em Minas Gerais. (...) então, dentro desse contexto, nós tivemos, dentro do SENALE (do III SENALE), a fundação da ALEM. Ali, tinham mulheres do interior, mulheres de vários lugares, e eu coloquei a necessidade da gente se organizar enquanto mulheres lésbicas. E tinham várias mulheres de alguns sindicatos, de algumas categorias, como professor, bancário. O pessoal da Saúde que foi em peso, né? Mesmo de outras cidades.6
A partir da perspectiva de Soraya Menezes, e de outras integrantes da ALEM (MACHADO, 2007), a realização do III SENALE foi, dessa forma, o momento de fundação do grupo que, em 1999, foi oficializado em formato de organização não governamental (ONG). A ALEM surgiu, portanto, no contexto de expansão dos movimentos GLBTs pelo país e em formato aproximado ao de outras organizações que nasceram no período (FACCHINI, 2002). A partir da leitura das fontes documentais sobre este movimento social, inclusive nos acervos produzidos pela CMBH e pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais
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Entre 2019 e 2021, realizei seis entrevistas de história oral com Soraya Menezes, durante o processo de escrita da minha dissertação de mestrado intitulada: “Em busca da visibilidade: o movimento de mulheres lésbicas em Belo Horizonte (1998-2014)”. Apenas a primeira foi realizada de forma presencial, todas as outras foram feitas via plataforma virtual (Google Meet ou Zoom). Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas. 6 Entrevista pública de história oral realizada em 24/09/2019 com Soraya Menezes, fundadora da ALEM.
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(ALMG)7, é possível identificar a importância da atuação de Soraya Menezes para o surgimento, manutenção e direcionamento da organização. Nesse sentido, para compreensão do contexto e dos valores (sociais e políticos) presentes nos pronunciamentos que analisaremos na terceira parte deste artigo, é imprescindível conhecer um pouco da biografia desta liderança. Soraya Menezes nasceu em Belo Horizonte (MG) em 1962. Formou-se em Magistério e como técnica em Enfermagem, profissão que exerceu durante parte considerável da sua vida. No início dos anos 2000, se graduou em Pedagogia e retomou o trabalho com a área de educação, deixando, portanto, a atuação em hospitais. Começou sua militância política ainda na juventude, dentro da Igreja Católica, fez parte da Convergência Socialista8, do Partido dos Trabalhadores (PT) e ajudou a fundar o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU) em Minas Gerais. Durante décadas, participou da luta sindical, chegando a ser dirigente do Sindicato dos Empregados dos Estabelecimentos de Saúde de Belo Horizonte (SINDEESS). Na atuação partidária e sindical, fez parte de segmentos das lutas feministas, dos movimentos negros e da população GLBT. Por fim, fundou, em 1998, a ALEM junto com sua companheira Suely Martins. Esta diversidade de lutas e de perspectivas políticas se entrelaçam em seus discursos e aparecem nos pronunciamentos, de forma mais ou menos evidente, a depender do objetivo da fala. Pelas entrevistas de história oral, é possível perceber, no presente, a referência marcante e constante às “lésbicas negras, pobres e trabalhadoras”, uma projeção de si e a busca em falar para suas iguais. Esse mesmo direcionamento pode ser observado já na primeira década dos anos 2000, em que é possível analisar as diferentes falas proferidas por ela na CMBH e na ALMG. A busca por integrar as pautas socialistas, trabalhistas e lésbicas é o que aparece de forma mais evidente nesses discursos, em que a
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A ALEM participou de diversas reuniões também na ALMG. Foi possível, a partir de notas taquigráficas, ter acesso às falas realizadas por suas integrantes na casa legislativa estadual. 8 Segundo verbete disponível no site do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a Convergência Socialista foi uma “Organização política de orientação socialista criada em 28 de janeiro de 1978, em São Paulo. Uma das correntes atuantes dentro do Partido dos Trabalhadores (PT) desde a fundação deste em 1980 até sua expulsão do partido em 1992, deixou de existir em 1994, quando seus membros passaram a integrar o Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU).” Informação disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/convergencia-socialista. Último acesso: 05 nov. 2021.
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militante defende uma união desses grupos sociais para a construção de uma luta conjunta. O direcionamento de Soraya Menezes, que unifica essas diferentes pautas, se reverberou, portanto, na atuação da ALEM enquanto organização. Principalmente por não ser a única participante do grupo que estava em frentes sindicais e partidos de esquerda, é possível identificar, especialmente nos primeiros anos de ação da ONG, a partir das falas de outras integrantes do grupo, a mesma perspectiva de defesa do entrelaçamento entre pautas trabalhistas, socialistas, feministas, negras e de diversidade sexual. Ao analisar o contexto de surgimento deste movimento social, é possível compreender alguns dos principais objetivos do grupo: garantia de direitos e de visibilidade para as lésbicas mineiras. Com a criação da ALEM, buscou-se inserir essas mulheres no debate público, realizando reuniões em instituições do Estado, organização de Paradas do Orgulho GLBT e de Caminhadas de Visibilidade Lésbica e Bissexual, proposição de medidas de combate à lesbofobia, oferecimento de oficinas de autoconhecimento e de formação política do grupo e, ainda, assessoramento jurídico para este segmento. A leitura de trecho do estatuto da ALEM permite apontar as finalidades da organização e o enfoque nas dimensões voltadas para as lesbianidades: Associação Lésbica de Minas, enquanto instituição social e política, é constituída para fins de coordenação, estudo, proteção, luta, reivindicação e representação legal das lésbicas na base territorial de Belo Horizonte e Estado de Minas Gerais, atuando no sentido de articular e expressar o conjunto de reivindicações deste segmento social, visando a melhoria das condições de vida de suas representadas, a defesa da liberdade e cidadania das lésbicas e fortalecimento da participação democrática em igualdade de condições com outros setores da sociedade brasileira, a nível Municipal, Estadual e Federal (Estatuto da ALEM apud MACHADO, 2007, p.118).
A busca por cidadania e igualdade para este segmento social era, portanto, fundamental para a ONG e elas poderiam ser conquistadas, em partes, com a mobilização junto a legisladoras/es dispostas/os a pautar o tema nas casas legislativas. Com isso, é possível perceber, a partir de meados de 2001, a presença constante da ALEM em reuniões especiais e audiências públicas voltadas para a discussão sobre diversidade
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O Clube Rainbow de Serviços, o Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual de Minas Gerais (CELLOS/MG) e Associação das Transexuais, Travestis e Transgêneros do Estado de Minas (ASSTRAV) REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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CELLOS/MG, ASSTRAV, entre outras)9, este grupo ajudou a debater e a construir leis e
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sexual e de gênero. Junto a outras organizações da cidade (Clube Rainbow,
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políticas públicas de combate à homofobia, de apoio social e psicológico, e de assessoria jurídica a LGBTs. Por ser a entidade que organizou as sete primeiras Paradas em Belo Horizonte, a ALEM era vista como uma das principais lideranças no debate sobre o assunto e esteve presente em quase todas as reuniões organizadas na CMBH voltadas para a temática nos primeiros anos da década de 2000. Para compreender os discursos proferidos na CMBH por integrantes da ALEM, é importante conhecer, portanto, o papel do grupo na organização das Paradas do Orgulho GLBT. Antes da consolidação da ONG, ocorrida em 1998, iniciou-se a busca por formação de um grupo que seria responsável por organizar o evento. Com esse objetivo, em 1997, foi criado o Grupo Lésbico e Simpatizante (GLS) por Soraya Menezes, entidade que antecedeu e que se transformou, posteriormente, na ALEM. Esta organização, segundo ela, se juntou a militantes gays da cidade, criou a Associação Mineira de Gays, Lésbicas e Simpatizantes (AMGLS) e organizou, em 1997, a Primeira Marcha do Orgulho Gay da capital mineira10 (MACHADO, 2007). A participação deste grupo de mulheres na organização deste evento na cidade e sua conversão, em 1998, na ALEM, reverberou nos discursos que, ao longo dos pronunciamentos nas casas legislativas, remetiam à memória deste acontecimento. Nesse sentido, a todo momento, este tema era retomado, ressaltando a importância de o evento ter sido organizado principalmente por lésbicas. Para além disso, a ALEM esteve à frente do evento até 2004, o que também se refletiu nas falas que iremos analisar logo mais. Como muitas das reuniões com a participação da ONG na CMBH ocorreram na véspera das Paradas, este costuma ser o tema principal das falas de suas integrantes. É possível pensar, portanto, nestes pronunciamentos gravados pelo legislativo municipal, como “prévias” dos discursos que foram proferidos nos carros de som destes eventos. Daí a
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são organizações GLBTs que surgiram em Belo Horizonte entre o final dos anos 1990 e início dos anos 2000. 10 Segundo Machado (2007, p.102 e 103), há divergências quanto ao nome e a formação do grupo que passou a se reunir a partir de 1997 no Sindicato dos Bancários. A versão apresentada por Itamar Santos é que o nome correto seria o AMGLS, resultado da junção do grupo gay GURI - Conscientização e Emancipação Homossexual - com o Grupo de Lésbicas e Simpatizantes (GLS). As integrantes da ALEM, por outro lado, afirmam que o GURI foi posterior ao Gays, Lésbicas e Simpatizantes (GLS-MG) e que, portanto, este era o nome correto no período. Uma publicação do grupo de novembro de 1997, intitulada Expressão GLS, se refere ao grupo como Associação Mineira GLS.
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relevância dos registros para o estudo deste e de movimentos sociais correlatos.
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Para além das Paradas, as Caminhadas da Visibilidade Lésbica e Bissexual também foram organizadas pela ALEM enquanto a ONG esteve em atividade (19982014). Foi, justamente, o objetivo de se dedicar a este evento o que motivou a transferência da coordenação da Parada para o grupo CELLOS/MG. As Caminhadas, que eram focadas nas vivências específicas de mulheres que se relacionavam com mulheres, passaram a acontecer a partir de 2005, em Belo Horizonte, e também são parte importante da trajetória da organização. O tema da (in)visibilidade de mulheres lésbicas é, provavelmente, o que perpassa toda a história dessas militâncias no Brasil desde a década de 1970. Embora o termo não fosse amplamente utilizado no início da mobilização política deste segmento, estava presente nas entrelinhas dos debates promovidos pelo GALF. Especialmente a partir dos anos 1990, ele passou a ser foco importante da luta das organizações lésbicas e, portanto, um dos temas principais discutidos também pela ALEM. O tema ganhou relevância a partir da percepção de que as vivências afetivas e sexuais de mulheres lésbicas não eram consideradas pela sociedade. Para além disso, com o nascimento da mobilização política de homossexuais, muitas das organizações eram formadas majoritariamente por homens gays, o que, na percepção das militantes lésbicas, impedia o avanço de debates sobre o machismo e as especificidades das relações entre mulheres (CAMPOS, 2014). Logo, o “tornar-se visível” passou a ser pauta importante para dentro e para fora das organizações de homossexuais. Buscando, por meio da ocupação do debate e do espaço público, romper com o silenciamento dessas vivências e reafirmar a existência deste grupo social. De certa forma, a tensão entre gays e lésbicas, oriunda dessas discussões nos movimentos sociais nacionais, pode ser percebida também nos eventos realizados na CMBH. Como questão fundamental a partir dos anos 1990 e que constitui uma das principais finalidades que levaram ao surgimento de diversas organizações lésbicas pelo país, a visibilidade se coloca como uma das principais razões para realização de eventos públicos, como as Paradas e as Caminhadas, e também reflete a relevância deste grupo
sem considerar as tensões políticas envolvidas, a vinculação do movimento social com as militâncias nacionais e, obviamente, os objetivos específicos da ALEM, especialmente o REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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do contexto das falas que serão analisadas na terceira parte deste artigo não pode ser feita
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social ocupar as instituições públicas, como a ALMG e a CMBH. Por isso, a compreensão
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de participação dos debates públicos para conquista da cidadania, igualdade e visibilidade para as mulheres lésbicas em Minas Gerais.
Registros audiovisuais de eventos na CMBH: breve esboço sobre o acervo A resolução nº 1.480/1990 da CMBH, atual Regimento Interno da casa, definiu em seu artigo nº 89: “As reuniões da Câmara e das comissões serão gravadas, sendo livre a audição das fitas respectivas, respeitadas as regras definidas pela Secretaria da Câmara”. Antes disso, entretanto, outros regimentos internos já tinham previsto tal regra, o que possibilitou a constituição do acervo de mais de 3600 fitas de gravação em áudio, em diferentes formatos (de 1970 a 2012)11, além das gravações digitais que têm sido feitas na última década, em áudio e vídeo. Esta documentação se encontra sob guarda e acessível no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH), dentro do Fundo Câmara Municipal (DR) e, especificamente, na série “Registros Audiovisuais de Eventos Diversos” (DR.02.02.00). Embora este acervo tenha começado a ser recolhido pelo APCBH há mais de uma década, as poucas informações presentes na descrição prévia das fitas e a falta de equipamentos capazes de fazer a leitura dos mesmos, tornou o acervo, por muito tempo, menos acessível, dificultando a busca de pesquisadoras/es por temas de interesse. Nos últimos anos, por outro lado, o início da digitalização das fitas eletromagnéticas e cassete tem possibilitado melhor descrição do acervo e facilitado o seu acesso12. Com isso, tem sido possível conhecer os mais diferentes temas presentes nesta documentação. Como o regimento interno prevê a gravação de todas as reuniões, é possível encontrar nestas fitas desde o registro das sessões plenárias até as homenagens. Todas as reuniões de comissões, audiências públicas, reuniões especiais, concessão de títulos e votação de projetos que acontecem na CMBH são, ou pelo menos deveriam ser, gravadas.
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O acervo “Registros Audiovisuais de Eventos Diversos” (DR.02.02.00) é composto por fitas de gravação em áudio de três formatos: fitas de rolo, eletromagnéticas e cassete. Recentemente, também começaram a fazer parte da série gravações nato digitais em áudio e vídeo. Para mais informações ver: APCBH, Inventário do acervo da Câmara Municipal no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, 2008. 12 Desde 2015, vem sendo realizado o trabalho de digitalização das fitas eletromagnéticas e cassete deste acervo no APCBH. Com isso, tem sido possível descrever melhor as gravações presentes nessas fitas e tornar o acervo mais acessível.
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Além disso, também é possível encontrar registros audiovisuais de seminários, mesas de debates, entre outros eventos que ocorreram na instituição. Compreender a multiplicidade de temas que podem ser encontrados neste acervo é importante para que pesquisadoras/es interessadas/os passem a tratar esta documentação como fonte possível de estudos. É relevante como, por exemplo, problemas corriqueiros da história da cidade (enchentes, falta de moradia, violências, comércio irregular, educação, entre outros) aparecem em diversos momentos nas gravações das reuniões. É possível encontrar desde pronunciamentos de vereadoras/es na sessão plenária até sequências de reuniões inteiramente dedicadas a um assunto, como ocorre no caso das comissões parlamentares de inquérito (CPI). Por outro lado, mapear tais gravações não é tarefa simples. É necessário compreender a natureza das gravações e optar por buscas nos tipos específicos de reuniões que podem ajudar na pesquisa. Se o interesse está relacionado à atuação de um/a vereador/a, é importante buscar suas falas para além das sessões plenárias, nas comissões as quais faz/fez parte, em homenagens convocadas por ela/ele, em audiências públicas relacionadas aos temas de interesse da/o parlamentar. Caso a pesquisa se relacione a algum evento ou tema da história da cidade como, por exemplo, “as enchentes da capital mineira na década de 1990”, pode ser interessante buscar as audiências públicas realizadas no período, ouvir às reuniões da Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana13 e procurar sessões em que projetos de leis sobre o tema foram debatidos. Independente do assunto que se deseja pesquisar, é importante pensar o registro audiovisual dos eventos na CMBH como uma fonte documental conectada a outras. Ou seja, é preciso entender que as gravações das reuniões são apenas parte da documentação produzida sobre aquele tema. Se um assunto foi gravado, é provável que ele também esteja presente em atas de reuniões, projetos de leis, documentos de comissões, requerimentos, fotografias, enfim, em diversos outros acervos produzidos pela casa legislativa que ajudam a compreender o contexto das falas proferidas nas reuniões. Por isso, tais gravações são documentos que complementam e se relacionam a outros. Ao
A Comissão de Meio Ambiente e Política Urbana é uma das atuais comissões permanentes da CMBH. A depender do período que se deseja pesquisar, a questão ambiental pode estar vinculada a uma comissão permanente com outro nome. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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descobrir uma fonte documental sobre determinado tema é provável que, buscando em
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outros tipos documentais e subséries, seja possível encontrar outras novas. Para ilustrar tal situação, irei descrever os caminhos percorridos por mim na busca de documentos sobre a ALEM dentro do Fundo CMBH. Quando realizei minha pesquisa sobre este movimento social, o meu foco principal era trabalhar com história oral, especialmente com as entrevistas realizadas com a Soraya Menezes. Ao dialogar com a minha entrevistada/colaboradora, descobri que ela havia participado de encontros na CMBH e que, provavelmente, haveria registros de sua passagem por lá. A partir desta informação, passei a buscar no Inventário do Fundo CMBH por palavras-chave (lésbica, gay, homossexual(is), diversidade, etc..) que poderiam levar a documentos sobre a temática. Com isso, encontrei na descrição prévia das fitas eletromagnéticas e na lista de projetos de leis alguns documentos que poderiam ser interessantes. Como um fio de novelo que vai se desenrolando, cheguei a seis reuniões onde há registros de que ALEM esteve presente. A leitura das atas foi importante nesse processo de delimitação das reuniões, trazendo informações básicas, como data, participantes e um resumo das falas que foram feitas. Como este acervo ainda não está devidamente descrito e não possui transcrição, o mapeamento das atas ajudou a filtrar o que poderia ser interessante ou não em relação às gravações. A especificidade das gravações em áudio permite analisar para além do texto que é falado, auxilia na compreensão da forma como determinadas palavras foram usadas e da receptividade do discurso pelo público presente nos eventos. Aumento e diminuição da entonação da voz, pausas, interrupções e aplausos são elementos que não podem ser captados pela leitura de transcrições ou notas taquigráficas. Por isso, reafirmo a importância de, quando possível, ver/ouvir as gravações e não apenas ler o que foi dito nessas reuniões legislativas. O acervo por mim consultado não dispunha de imagens, mas, com certeza, traria ainda mais elementos importantes caso existissem arquivos em vídeo dessas reuniões. Por fim, este acervo auxilia na compreensão dos contextos em que as falas estão inseridas. Foi possível identificar, por exemplo, as razões para algumas manifestações
determinados grupos, a construção da memória da ONG quando ela ainda estava em atividade, denúncias de atos de discriminação por parte de agentes públicos. Enfim, uma REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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GLBT, o apoio a outros movimentos sociais, os termos utilizados para designar
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nos eventos, as percepções da ALEM sobre as políticas públicas direcionadas à população
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série de questões importantes que não estavam presentes nas entrevistas de história oral, em outros documentos da CMBH consultados ou em periódicos do período. Conhecendo a especificidade desta fonte documental e cuidando para que a análise da mesma seja feita de forma criteriosa, como com quaisquer outros documentos, as gravações das reuniões legislativas podem se tornar um material excepcional de pesquisa para historiadoras/es. O importante, em todo caso, é ter um tema bem delimitado e buscar no acervo legislativo como um todo (documentos textuais, fotográficos e audiovisuais) para, dessa forma, constituir uma análise mais completa dessas gravações. Devido ao espaço que disponho para a escrita deste artigo, não será possível apresentar todos os caminhos e cotejar este acervo com outras fontes documentais. Também tive que optar por analisar falas de apenas duas reuniões em que a ALEM esteve presente. De toda forma, espero contribuir pelo menos um pouco com a divulgação deste acervo para que outras/os pesquisadoras/es possam desenvolver trabalhos mais completos sobre.
Participações da ALEM na CMBH: um estudo de caso A aproximação entre os movimentos GLBTs de Belo Horizonte e a CMBH se deu, pelo que constatei com a análise das fontes, no início da década de 2000. Especialmente pela elaboração da Lei nº 8.176/0114, de autoria formal do vereador Leonardo Mattos, e que, segundo Soraya Menezes, teve seu texto construído pelo grupo GURI - Conscientização e Emancipação Homossexual15. Com o contato mais próximo entre vereadoras/es e lideranças GLBTs da cidade, iniciou-se, a partir de 2001, a participação destes grupos sociais em eventos promovidos na CMBH com o objetivo de discutir temas relacionados às homossexualidades. Em grande parte, os eventos ocorriam em meados de junho e julho, mais próximos ao dia 28 de junho, que já era internacionalmente definido como Dia do Orgulho Gay16. As datas escolhidas também se
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A Lei, originária do Projeto de Lei nº 1.672/00, foi um marco importante para a cidade de Belo Horizonte. A sua ementa diz: “Estabelece penalidade para estabelecimento que discriminar pessoa em virtude de sua orientação sexual, e dá outras providências”. 15 O Grupo GURI – Conscientização e Emancipação Homossexual – surgiu em Belo Horizonte no final dos anos 1990. Segundo Soraya Menezes, em entrevista de história oral concedida em 10/07/2020, o grupo foi o responsável por elaborar o texto do projeto de lei nº 1.672/00. 16 Em 28 de junho de 1969, aconteceu o que ficou conhecido como a “Revolta de Stonewall”, um conflito entre homossexuais e travestis e a polícia no Bar Stonewall em Nova York. Em homenagem ao dia, a data
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relacionavam com a proximidade da Parada do Orgulho GLBT, integrando, portanto, uma série de eventos e comemorações importantes para este segmento social. A duração total desses eventos, que ocorreram ao longo da primeira década dos anos 2000, impossibilita que façamos aqui uma análise completa de todos os elementos discursivos presentes nessas fontes documentais. O que desejo ressaltar, portanto, a partir de alguns fragmentos de falas de integrantes da ALEM, é a relevância destes documentos para a discussão sobre a história do movimento social. Especialmente a partir das falas de Soraya Menezes, é possível identificar traços da sua vinculação político-partidária e a busca por construir uma memória GLBT local e nacional que incluísse a participação das mulheres lésbicas. Para além disso, o tema da garantia de direitos e da igualdade perpassou quase todos os discursos proferidos e gravados pela CMBH no período. Em 28 de junho de 2001, a Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor realizou uma Audiência Pública com o objetivo de debater o seguinte tema: “Homossexualidade – Do preconceito à cidadania”17. O evento foi o primeiro, identificado entre as atas de reuniões e gravações, que contou com a presença da ALEM, representada pela presidente do grupo, Soraya Menezes. Para discutir a temática, foi composta uma mesa de debates com a presença de vereadoras/es, lideranças dos movimentos GLBTs, membros do Executivo municipal e do poder Judiciário. Com quase três horas de duração, a audiência contou com falas de todas/os as/os integrantes da mesa e também do público que estava presente no plenário. O eixo principal da maioria dos discursos se relacionava com a importância da conquista de direitos para esta população, em especial sobre a defesa de leis que garantissem o combate à homofobia, e pela regulamentação da parceria civil registrada (PCR)18. Para além disso, algumas lideranças falaram da importância das conquistas advindas com o Mercado GLS19, das memórias dos movimentos GLBTs nacional e das violências sofridas por esta
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ficou estabelecida como o “Dia do Orgulho Gay” e, atualmente, é denominado “Dia do Orgulho LGBTQIAP+”. 17 As informações foram obtidas a partir da gravação em áudio da reunião (DR.02.02.00-2266) e da sua ata (DR.01.01.04-040). 18 A Parceria Civil Registrada foi proposta a partir de um projeto de lei federal nº 1.151/95, de autoria da deputada Marta Suplicy. 19 É importante ressaltar que o tema do “Mercado GLS” gerava polêmica entre diferentes setores dos movimentos GLBTs. Para os segmentos mais vinculados às perspectivas socialistas, a exploração do
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população.
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Neste evento, a fala da Soraya Menezes se voltou para uma série de temas: a apresentação da ALEM enquanto grupo e suas ações; a memória da militância homossexual do país, especialmente a do Grupo Somos (SP), e da organização da 1ª Marcha Gay em Belo Horizonte; a importância em integrar as lutas homossexuais com as pautas trabalhistas e socialistas; a dificuldade de aprovação da parceria civil registrada; e o embate dos movimentos GLBTs com setores religiosos. Cabe ressaltar, entretanto, que todos esses temas aparecem de forma misturada e que, caso a/o ouvinte/leitor/a desconheça o contexto de suas falas, é possível que não se compreenda todos os elementos que são levantados. Embora não seja possível, devido ao espaço, reproduzir aqui a transcrição de todo o seu discurso, gostaria de ressaltar alguns trechos que são importantes para analisar a trajetória da ALEM. Começaremos pelo início da sua fala:
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chamado “pink money” criava uma falsa ideia de conquista de direitos. Para saber mais ver: FRANÇA, 2007. 20 Neste trecho, Soraya Menezes faz referência à fala do Juiz Reinaldo Portanova que também integrou a mesa de debates desta reunião.
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Um bom dia a todos! Eu sou Soraya, da Associação Lésbica de Minas, coordenadora da Associação Lésbica de Minas e também da Secretaria Nacional de Gays e Lésbicas do PSTU. Bom... antes de tá falando um pouco da história da Associação Lésbica de Minas, acho que é importante tá falando um pouquinho da situação de como que tá as organizações de gays e lésbicas do Brasil antes na década de 80 e como está agora. Bom... Na década de 80, no Primeiro Encontro de Gays, Lésbicas, Travestis e Bissexuais que aconteceu no Rio de Janeiro, eu acho que foi um marco no divisor de águas para a gente estar no movimento como ele está até hoje. Teve uma plenária, onde estava discutindo se gays, lésbicas e travestis iriam estar ajudando os Metalúrgicos do ABC Paulista, numa greve, aquela greve histórica de 80. Então houve um tumulto na plenária e foi votado que o movimento não iria. Perdeu por poucos votos, mas mesmo assim tiveram 50 gays e lésbicas e travestis que entraram na Vila Euclides apoiando o movimento e eles ficaram admirados, porque muitas pessoas do movimento disseram que eles iam ser apedrejados, porque eram peões, que eram operários, e, muito pelo contrário, eles foram aplaudidos de pé. E o resto do movimento foi fazer um piquenique. Então, existe hoje um movimento que acredita que a discriminação e o preconceito vão terminar e vai acabar quando a gente juntar com outros setores oprimidos: mulheres, negros, trabalhadores, assalariados. Porque se a gente não tiver uma unidade para tá lutando contra o preconceito, com certeza, não vai acontecer nada. E, tem uma outra parte do movimento, como a gente sabe, que é carnaval, que é... que não tem uma discussão. (...) Que eu acho que isso tem que ser um campo, porque quando a gente discute do movimento gay, lésbico estar nas lutas junto com outros setores, tem muita gente que fala: “Não, nós não vamos estar misturando política”. Mas não é… é a solidariedade que a gente tem que tá mostrando para o setor que é oprimido também. Gostaria de tá pegando um pouco da fala do juiz, de que “todos são iguais diante da lei”. 20 A gente vê, claramente, até as notícias mesmo nos mostram que não é algo que acontece. (...) E na cidadania, por exemplo, quando a gente discute de cidadania gay é um ponto bem complexo para nós. Por exemplo, como que a gente vai estar
Dossiê discutindo uma cidadania gay para um gay que é, por exemplo, um trabalhador? Que ele é desempregado e ele tem direito igual a todos? Além dele sofrer preconceito e discriminação, ele é oprimido, ele é explorado, então há uma diferenciação: todos os gays, todas as lésbicas, todos os travestis, sofrem preconceito e sofrem discriminação, mas alguns também sofrem a opressão, porque sofrem exploração.21
Este trecho inicial da fala da Soraya na audiência pública, embora possa parecer confuso para quem desconhece as discussões sobre a memória deste segmento, constitui um posicionamento em direção à sua vinculação política. O evento ao qual a fundadora da ALEM faz referência logo no início da fala é o I Encontro Brasileiro de Homossexuais (EBHO), em 1980. Nesse contexto, o debate sobre a participação do Grupo Somos (SP) em ações dos partidos de esquerda e na Greve do ABC Paulista, acabou por rachar este movimento social, o que levou, após um tempo, ao fim da organização. Tal debate se relaciona a perspectivas políticas diferentes dentro dos movimentos de homossexuais e travestis da época em relação à integração, ou não, com outros segmentos de lutas, como os partidos de esquerda e os sindicatos (SIMÕES & FACCHINI, 2009, p.107). Na visão da Soraya Menezes, enquanto socialista e militante ativa do PSTU e do movimento sindical, foi importante a participação de gays, lésbicas e travestis na Greve do ABC Paulista. Nas entrelinhas, ela manifesta, ainda, descontentamento com a parte do movimento social que “foi fazer um piquenique”. Para não perder o foco deste artigo, não será possível fazer uma análise mais completa dos debates de memória presentes neste discurso e nem apontar as visões divergentes sobre este mesmo evento histórico. Interessa apenas ressaltar que tal narrativa está vinculada ao grupo político do qual Soraya Menezes fazia parte. Sem a pretensão de apontar “verdades” sobre tais acontecimentos, é relevante compreender que, por sua aproximação com a perspectiva marxista, Soraya demonstrava acreditar que a superação das desigualdades (socioeconômica, de gênero, de raça e de sexualidades) se daria a partir de uma luta conjunta em que o combate ao sistema econômico era fundamental. Nesse sentido, ela inicia seu discurso por uma narrativa histórica para introduzir o eixo principal
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Transcrição da gravação de áudio do discurso de Soraya Menezes realizado em 28/06/2001 na CMBH. (DR.02.02.00-2266). REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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da sua fala, delimitando a relevância de pensar a classe social quando se fala da
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discriminação: “todos os gays, todas as lésbicas, todos os travestis22, sofrem preconceito e sofrem discriminação, mas alguns também sofrem a opressão, porque sofrem exploração”. Após remeter à memória dos movimentos homossexuais de São Paulo e demarcar sua posição a favor da integração das lutas, Soraya Menezes passou a falar um pouco das ações realizadas pela ALEM e tratou da memória da 1ª Marcha do Orgulho Gay de Belo Horizonte: A primeira Marcha do Orgulho Gay foi puxada pelas lésbicas em 1998, onde não tinha quase ninguém, mas tivemos a grande presença de uma grande militância do PSTU, uma militância que também ajudou nessa Marcha, a qual nem ia acontecer porque tinha tão poucas pessoas lá... devia ter umas três ou quatro. Mas aí o partido segurou. E aí (...) o pessoal falou: “Soraya, essa marcha vai sair?”. Aí eu fiquei em dúvida, que só tinha umas trinta pessoas e eu falei: “A Marcha vai sair!”. E saiu. (...) Estamos aí agora na Quarta Marcha, maravilhosamente, porque existiu pessoas ali falando: “Não, nós vamos sair sim! Com três ou quatro…”. E estamos avançando.23
A memória sobre a 1ª Marcha do Orgulho Gay é, talvez, um dos temas que mais aparece nas falas da fundadora da ALEM, tanto nos discursos realizados na CMBH, na primeira década dos anos 2000, quanto nas entrevistas de história oral que realizei com ela entre 2019 e 2021. Para Soraya Menezes, é motivo de orgulho que a capital mineira tenha sido a primeira cidade em que as mulheres lésbicas iniciaram a realização do evento. Além disso, é relevante que ela destaque também a importância do PSTU neste processo. Demonstra, mais uma vez, a indissociabilidade da sua ação enquanto liderança lésbica e como militante partidária. Tal perspectiva sobre a realização do evento, embora tenha recebido alguns questionamentos por parte de outros participantes, se tornou parte da memória LGBT local (MACHADO, 2007, p.116). De forma que, sempre que a trajetória das Paradas é retomada, diferentes militantes reforçam a importância de a iniciativa ter partido de mulheres lésbicas. A relevância de marcar o protagonismo deste grupo social no principal evento do calendário LGBTQIAP+ se relaciona, ainda, com a busca por visibilidade. No contexto
Cabe ressaltar que, neste trecho, o uso do artigo masculino “o” para se referir a pessoas travestis tem relação com o contexto histórico. É comum que, neste período, mesmo militantes dos movimentos GLBTs não se referissem às mulheres travestis com artigos e pronomes femininos. 23 Transcrição da gravação de áudio do discurso de Soraya Menezes realizado em 28/06/2001 na CMBH. (DR.02.02.00-2266). REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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em que, nacionalmente, as mulheres se viam apagadas nos eventos mistos, era de extrema
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importância que a ação das mesmas fosse ressaltada. Nesse sentido, é possível compreender o porquê de, sempre que perguntadas sobre o passado da militância lésbica em Belo Horizonte, este segmento reforçar como indispensável as suas ações na construção da 1ª Marcha do Orgulho Gay. Se retomarmos o trecho do estatuto da ALEM que apresentamos na primeira parte do texto, encontraremos entre as suas finalidades as seguintes questões: “a defesa da liberdade e cidadania das lésbicas e fortalecimento da participação democrática em igualdade de condições com outros setores da sociedade brasileira” (Estatuto da ALEM apud MACHADO, 2007, p.118). Como parte desse propósito, a organização participou ativamente de reuniões com o poder público e buscou a aprovação de medidas legais que permitissem a conquista de igualdade e de cidadania. No período em que ocorreu a audiência pública na CMBH, duas pautas principais eram abordadas pelos movimentos GLBTs no que se referia a direitos: a conquista da parceria civil registrada e a criminalização da homofobia. O primeiro tema esteve em alta por mais de uma década e foi amplamente debatido pelos movimentos sociais na expectativa de que o Projeto de Lei federal nº 1.151/95, de autoria da deputada Marta Suplicy, fosse aprovado. Tal expectativa nunca se converteu em realidade e, apenas com o reconhecimento feito pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em 2011, foi possível equiparar as uniões de casais homoafetivos com o casamento civil (COITINHO FILHO & RINALDI, 2018). A outra pauta teve destino semelhante. Até o momento, a nível nacional, não foi aprovada nenhuma norma legal que combatesse a LGBTfobia. O que houve, da mesma forma, foi uma decisão do STF que definiu a equiparação da mesma com o crime de racismo24. Ao escutarmos as falas das/os diferentes integrantes da mesa na audiência pública realizada na CMBH em 28/06/2001, é possível compreender a relevância desses dois temas no período. Todos os discursos se voltaram, de alguma forma, para essas questões. Principalmente porque figuravam entre os temas da reunião daquele dia. Cumprindo o propósito do Estatuto da ALEM, Soraya Menezes também abordou tais questões no final
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Em 13 de junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal formou maioria para equiparar o crime de LGBTfobia com o crime de racismo previsto na Lei nº 7.716/89. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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da sua fala:
Dossiê Nós ficamos discutindo, por exemplo, a questão de cidadania, mas nós não queremos migalhas, por exemplo, o que a burguesia quer dar para a gente. A gente quer na totalidade. O juiz falou aí muito bem sobre a questão dos semterra, sobre a questão das mulheres, dos negros e nós não queremos simplesmente ficar pegando migalhas. Por exemplo, a lei é muito importante. Essa lei que foi votada agora em Belo Horizonte, em Juiz de Fora, é importante sim, mas nós não podemos ficar simplesmente atrelados na lei. (...) Porque não adianta ter leis e mais leis se gays e lésbicas não tiverem cientes dessas leis. Por isso que é importante a organização de gays e lésbicas, é importante ter consciência dos seus direitos, porque senão a gente vai ter lei e, muitas vezes, a pessoa vai ser discriminada e não vai saber o que tem ali para protegê-la. Em relação, por exemplo, à parceria civil. (...) Várias pessoas dizem: “Olha, o casamento... (que o pessoal nem fala parceria)25 o casamento de gays e lésbicas é uma violência contra a sociedade”. Nós, da Associação Lésbica de Minas, sempre temos falado que a violência contra sociedade, por exemplo, é um salário mínimo de miséria, é o desemprego, é a fome, é o analfabetismo que assola. [Aplausos] Isso é a violência. Quando se discute de parceria civil, quando, na época foi implementado [o projeto de lei], houve muitas pessoas que distorciam essas coisas: “olha... mulher com mulher vai entrar na igreja, homem com homem... como é que vai ficar?”. Há falta de conhecimento. Por isso que eu acho um debate como esse muito importante, quando a gente fala para o conjunto da sociedade, para um conjunto de liderança, o quão importante é sermos respeitados.26
No início do trecho, Soraya Menezes faz referência a duas leis municipais que tinham sido aprovadas nos últimos anos em duas cidades diferentes: Juiz de Fora (MG) e Belo Horizonte (MG)27. Ambas penalizam a discriminação de homossexuais em lugares públicos e foram construídas pelos movimentos sociais. Com temática parecida, a lei nº 14.170 também foi aprovada a nível estadual, em 200228. Neste caso, houve participação ativa da ALEM na elaboração do texto. Destaca-se, nesta parte do discurso, a ponderação em relação à necessidade de dialogar com a sociedade sobre as normas legais. Ressaltando a relevância tanto do debate junto ao público GLBT quanto do debate social
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Na época, existia um debate sobre o uso do termo “casamento” para casais homoafetivos. Pelas discussões que estão gravadas no acervo da CMBH, é possível perceber que os movimentos sociais buscavam desvincular a união entre pessoas homoafetivas do termo “casamento”. Acreditava-se que o casamento era ligado ao contexto religioso. Por isso, defendia-se o uso do termo “parceria” ao invés de “casamento”. 26 Transcrição da gravação de áudio do discurso de Soraya Menezes realizado em 28/06/2001 na CMBH. (DR.02.02.00-2266).
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A lei estadual nº 14.170/02, de autoria do deputado João Batista de Oliveira, possui a seguinte ementa: “Determina a imposição de sanções a pessoa jurídica por ato discriminatório praticado contra pessoa em virtude de sua orientação sexual”. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Além da lei nº 8.176/01 de Belo Horizonte, já citada anteriormente, Soraya Menezes se refere também à lei nº 9.791, de 12 de maio de 2000, aprovada em Juiz de Fora (MG). A ementa desta última diz o seguinte: “Dispõe sobre a ação do município no combate às práticas discriminatórias, em seu território, por orientação sexual”.
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mais amplo, para que as pessoas pudessem conhecer melhor os objetivos das leis que estavam sendo propostas. Na sequência do discurso, Soraya Menezes rebate o argumento de que a conquista da PCR significaria “uma violência contra a sociedade”. Voltando-se para o debate socioeconômico, ela diz: “a violência contra a sociedade, por exemplo, é um salário mínimo de miséria, é o desemprego, é a fome, é o analfabetismo que assola”. Mais uma vez observamos, portanto, a vinculação entre as pautas GLBTs e os direitos sociais e trabalhistas. Para além do texto falado, este trecho é um dos que melhor exemplifica a diferença entre ler a transcrição ou a nota taquigráfica e ouvir o discurso: ao escutar a gravação da fala, é possível observar o crescimento da entonação de voz da Soraya Menezes, o aumento da comoção do seu discurso até culminar, no final desta parte, com os aplausos do público que estava presente no plenário. Mesmo com a ausência de imagens registrando a cena, é possível perceber, com a escuta do áudio, o aumento da empolgação. Observam-se, portanto, as nuances da construção do discurso feita por uma líder política experiente que, ao começar a se encaminhar para o fim da sua participação, busca aumentar a comoção do público e causar impacto no uso das palavras. Com isso, ela ironiza que uma sociedade marcada por desigualdades sociais veja como violenta a possibilidade de casais homoafetivos regularizarem suas uniões e recebe, pelo menos de parte do público presente, o apoio a este posicionamento. Em 08 de julho de 2005, véspera da 1ª Caminhada de Lésbicas e Simpatizantes e dois dias antes da realização da 8ª Parada do Orgulho GLBT de Belo Horizonte, houve uma mesa de debates no Plenário Juscelino Kubitschek da CMBH voltada para a discussão sobre as lesbianidades. Mais uma vez, a ALEM esteve presente, realizou falas na tentativa de divulgar as ações da organização e relacionadas, especificamente, com a questão da visibilidade, tema principal da Caminhada que estava sendo organizada por elas. Tratando da temática, Josiane Mota (integrante da ALEM) fez um longo discurso argumentando das diferenças de visibilidade entre lésbicas e gays, e da importância da
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(...) Eu penso que a visibilidade tá colocada sim, mas de uma maneira desigual. Nós não podemos afirmar categoricamente que se processa de maneira igual para gays e lésbicas. As lésbicas ainda não tão vivendo essa visibilidade. Porque, se a gente caracteriza que essa visibilidade se dá da maneira como foi colocado, nós estaremos equivocados e a nossa política para o movimento de lésbicas vai ser equivocada. E aí vai ser uma perda muito grande daquilo que
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pauta para o segmento ao qual ela fazia parte:
Dossiê a gente quer construir, que é a verdadeira visibilidade. Porque que eu tô dizendo isso? Primeiro: a questão da saúde. Já foi colocado, a lésbica quando ela se identifica para o ginecologista, normalmente, o que a gente percebe é que ela não é atendida, “porque lésbica não contrai DST”. Isso é um mito, é uma mentira, uma falácia. É porque os profissionais da área da saúde não estão capacitados pra lidar, pra trabalhar com esse público, ou seja, com a lésbica. (...) Então não existe uma política de prevenção direcionada para a lésbica. Isso é uma verdade. Porque tudo isso? Invisibilidade. Ela não existe para a sociedade de uma maneira geral. E outra questão que eu coloco é a questão da família. A garota, a mulher, que se coloca lésbica, que vivencia a sua lesbianidade dentro da família, que se assume, ela sofre as piores violências: física, psicológica. Ontem mesmo a gente tava com um caso, a Soraya já citou, de uma menina que tá dormindo na Praça Sete, de 21 anos. Porque assumiu, arrumou uma namorada e que foi colocada no olho da rua. Porque a mãe dela falou que tava com nojo dela. Isso é um caso, são vários outros que a gente tem que lidar no dia a dia. Porque? Invisibilidade. Ela tem que ser invisível pra se proteger da família. Ou seja, do pai, da mãe, dos irmãos, da tia, da avó, do gato, do cachorro. E também da sociedade de uma maneira geral. Ela não pode viver com dignidade a sua sexualidade por conta disso, de todo o preconceito que permeia o núcleo familiar, a sociedade. No mercado de trabalho, se desconfiam que ela é lésbica, já começa as piadinhas. (....) Então ela não tem visibilidade na família, ela não pode se colocar como lésbica no emprego. Então é muito importante a gente ter isso muito claro, porque a nossa luta, ainda que ela esteja colocada durante as Paradas, a questão da visibilidade, ela não tá resolvida. Ela é árdua, ela é dolorosa e ela ainda vai demorar um pouco. Prova disso é que amanhã a gente tá chamando a 1ª Caminhada de Lésbicas pra a gente ver em que pé que está essa coragem dessas mulheres de se colocarem, de vivenciarem suas lesbianidades. E pra nós vai servir como termômetro de tudo que temos feito para favorecer a visibilidade.29
O discurso construído por Josiane Mota traz alguns elementos importantes de integração das perspectivas da ALEM com a militância lésbica nacional. É relevante como, a partir do levantamento de alguns exemplos (relacionados à saúde, família e trabalho), ela coloca a invisibilidade como eixo principal de muitos dos problemas vivenciados por essas mulheres. Para elucidar como este segmento social ainda é invisível se comparado a outros, ela começa discorrendo sobre o “mito” de que “lésbicas não contraem DSTs”. Tal pauta era recorrente dos debates realizados pelos movimentos lésbicos desde os anos 1990. Especialmente nos SENALEs, que contavam com verbas do Ministério da Saúde e das secretarias de saúde, buscou-se, durante décadas, construir políticas públicas de saúde voltadas para este grupo social (CAMPOS, 2014). Na sequência, ela se utiliza de uma situação concreta para exemplificar o
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Transcrição da gravação de áudio do discurso de Josiane Mota realizado em 08/07/2005 na CMBH. (DR.02.02.00-2760). REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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problema do “assumir a sexualidade” para a família: “Ela [a mulher lésbica] tem que ser
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invisível pra se proteger”. Os problemas advindos das relações familiares e de trabalho para as pessoas que se assumiam enquanto GLBTs também foram amplamente discutidos, não só pelas integrantes da ALEM, mas por diferentes participantes que, ao longo dos anos, estiveram em reuniões na CMBH. A especificidade desta fala da Josiane Mota se relaciona com outros discursos que foram elaborados nesse dia, em que houve comemoração pelo aumento da visibilidade GLBT a partir do sucesso das Paradas. Sua fala se conecta com a discussão, que vinha ocorrendo na ALEM e que acabou por determinar a decisão pela criação da Caminhada, de que a visibilidade nos eventos mistos, especialmente nas Paradas, ainda era muito baixa para as mulheres lésbicas. Faltava espaço de fala para este segmento e de discussão das lesbianidades. Por isso, Josiane Mota abre este trecho do seu discurso argumentando que “a visibilidade tá colocada sim, mas de uma maneira desigual”. É importante compreender, portanto, que a fala da integrante da ALEM acontece em um contexto em que a Parada do Orgulho GLBT de Belo Horizonte já tinha se tornado um grande evento e que atraía dezenas de milhares de pessoas. Nesse sentido, os movimentos sociais presentes na CMBH naquele dia estavam debatendo como, a partir daquele momento, poderiam ampliar a visibilidade de suas pautas para além do evento. No caso da ALEM, interessava focar as suas ações para a visibilidade específica das vivências lésbicas. A realização da 1ª Caminhada seria, portanto, um momento de avaliação dessas questões, de busca por aumentar os espaços de discussão sobre o tema. Com o desenvolvimento do debate na CMBH, surgiu, novamente, a discussão sobre a integração, ou não, dos movimentos GLBTs com outras lutas sociais. Como pauta que fazia parte das discussões desde os movimentos homossexuais da década de 1970, surgiram opiniões divergentes sobre o tema. De um lado, havia a preocupação de que os movimentos GLBTs fossem cooptados por partidos de esquerda, governos e sindicatos; do outro, havia a compreensão de que não se podia debater sobre cidadania e conquista de direitos sem pensar de forma ampla e correlacionada com a luta de outros movimentos sociais. Sobre o tema e em resposta a um militante presente na reunião que se posicionava
assunto:
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Mota pediu novamente a palavra e discorreu sobre a posição da ALEM em relação ao
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contra a participação das organizações GLBTs nos protestos de outros segmentos, Josiane
Dossiê O que eu gostaria de falar, um pouco sobre essa questão que foi colocada, do movimento social, do movimento GLBT, GLBTS, que é o seguinte… Eu não consigo ver as coisas muito separadas e, ao mesmo tempo, ignorar as especificidades. Por exemplo, aqui em Beagá a gente tem uma experiência. Quem vai pra Praça Sete e organiza atos contra violência contra a mulher, somos nós. Greve dos professores, quem vai lá dar a cara, apanhar da polícia junto com os professores, somos nós. Quem faz os cartazes, as faixas de protestos, somos nós. Nós somos linhas de frente desse movimento. E isso não tira de nós a nossa especificidade. Nós ‘tamos’ num país que não existe “outras bandeiras” do “outro movimento”, o desemprego é uma bandeira que todos nós devemos levantar, contra o desemprego. Porque existe um desemprego maciço no Brasil. E tem muito gay, muita lésbica desempregada. Essa é a realidade nossa aqui de Beagá. Na ALEM, por exemplo, a maioria são mulheres negras. E não dá pra gente sair, por exemplo... Amanhã, na nossa passeata, nós vamos fazer um protesto contra a corrupção, porque é dinheiro que tá saindo pro bolso da elite política e da elite empresarial que tá faltando na escola pública. Onde o negro, onde a lésbica e o gay tá excluído. (...) Não dá pra ignorar esse tipo de coisa que tá acontecendo no nosso país e dizer que são bandeiras de outros movimentos, que vez ou outra podem ser anexadas ao nosso movimento. É tudo junto, não tem problema. A nossa campanha pela visibilidade, tá lá: “Visibilidade! Nós estamos aqui, mas nós queremos emprego, nós queremos saúde, nós queremos escola de qualidade pra todo mundo”. Nós não podemos ignorar e fazer de conta que não é bandeira nossa. Porque são cidadãos e cidadãs que vivem num país corrupto, de exclusão, cuja maioria da população é negra e que vivem ainda como escravos, só que com meios mais sofisticados. São meios sofisticados de escravidão que nós vivemos hoje, né? Qualificados. E nós não podemos dizer que o movimento GLBT não vai incorporar essas bandeiras porque tem suas especificidades. Nós não vamos perder a nossa identidade por erguer outras bandeiras. Nós somos trabalhadores, negros, sim! E nós não podemos ignorar isso. (...) Então eu acho que é importante a gente continuar fazendo essa discussão dentro do movimento e rever essas posições com relação a essas bandeiras sociais. De fazer essa separação. Essa dicotomia, eu acho que ela não pode existir.30
Pela fala elaborada por Josiane Mota, é possível perceber que, para além da Soraya Menezes, outras integrantes da ALEM também estavam vinculadas a diferentes lutas sociais. Tal vinculação era característica da Organização. Ao narrar sobre a conexão com outros movimentos sociais, a militante afirma que elas eram parte da “linha de frente” de diversos protestos e que, assim como ponderou Soraya Menezes na audiência pública em 28/06/2001, não era possível separar as “bandeiras de luta”, pois, o direito ao emprego, à educação e à saúde de qualidade deveriam ser pautas de todas as organizações GLBTs. Nesta fala, destacam-se as questões raciais e socioeconômicas. Pela ALEM ser composta, segundo ela, em sua maioria por mulheres negras, não seria possível dissociar o debate
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Transcrição da gravação de áudio do discurso de Josiane Mota realizado em 08/07/2005 na CMBH. (DR.02.02.00-2760). REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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mobilizações não significaria abrir mão da especificidade de suas identidades.
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sobre lesbianidades da questão social e racial. Para ela, o fato de se unir a outras
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A apresentação das transcrições das falas de Soraya Menezes e Josiane Mota em reuniões da CMBH, embora representem trechos muito pequenos dos debates ocorridos nos eventos, teve como objetivo elucidar e analisar algumas das pautas da ALEM a partir deste acervo documental. Pensadas no contexto em que os movimentos GLBTs de Belo Horizonte começavam a se fortalecer, é relevante que esta organização tenha participado ativamente da construção do debate sobre lesbianidades nas esferas públicas. O fato de terem conquistado espaço para realizar mesa de debates específica sobre as vivências homoafetivas das mulheres, em período em que a resistência a tal temática era grande, também revela a capacidade de articulação do movimento social junto à casa legislativa. Cabe ressaltar, ainda, que só foi possível analisar alguns poucos aspectos desses discursos e que debates importantes não foram tratados neste artigo. Há tensões e divergências nesses eventos que, por causa da opção por trazer apenas as falas da ALEM, não puderam ser elucidadas. Fica, portanto, o convite a pesquisadoras/es da área para que explorem este acervo e tragam novas perspectivas sobre os debates dos movimentos GLBTs ocorridos na CMBH. Especialmente no campo das construções de memória, há diferentes narrativas que foram mobilizadas ao longo das reuniões. Uma análise mais completa deste acervo permitiria, dessa forma, localizar melhor esses pontos de discordância entre os movimentos sociais. Por fim, a trajetória da ALEM e a construção dos seus discursos poderiam ser melhor analisadas se incluíssemos também o cotejamento com outras fontes documentais. Neste artigo, optei por focar apenas nas gravações das reuniões da CMBH para mostrar a riqueza deste acervo. Assumo, com isso, a problemática de não confrontar diferentes documentos, mas reitero a intenção de, mais do que narrar fatos e acontecimentos, historicizar estes discursos, apontando a correlação dos mesmos com visões políticas da época. É relevante que se compreenda, portanto, que, embora não tenha sido uma organização longeva, a ALEM levantou pautas importantes para o debate dos movimentos GLBTs, participou ativamente da construção da memória sobre este segmento na capital mineira e auxiliou na criação de políticas públicas para esta
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população.
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Considerações finais Ao longo deste texto, tentei apresentar algumas possibilidades de pesquisa que o acervo de Registros Audiovisuais de Eventos Diversos (DR.02.02.00) da CMBH oferece. Partindo das falas da de militantes ALEM, apontei como a casa legislativa municipal serviu de espaço para debates das mais diferentes naturezas. Entre elas, as pautas políticas relacionadas às lesbianidades. Como local em que foram realizadas e gravadas audiências públicas, reuniões especiais, seminários e mesas de debates, a CMBH produziu, ao longo das últimas décadas, uma série de documentos que, se forem devidamente explorados, oferecem inúmeras possibilidades de pesquisas. Ao trabalhar com os discursos das militâncias lésbicas, e não com os que foram proferidos por vereadoras/es, por exemplo, busquei demonstrar que o acervo aponta para atuações que vão além dos seus membros oficiais, possibilitam conhecer a trajetória de diferentes líderes políticas/os da cidade. Cabe a pesquisadoras/es interessadas/os nesta e em outras temáticas, buscar por reuniões e eventos em que os seus objetos de estudo foram pautados. Com isso, será possível construir trabalhos sobre meio ambiente, cultura, educação, saúde, direitos humanos, entre vários outros temas, que tratem sobre a história da cidade, utilizando os acervos legislativos municipais. Para além disso, será possível integrar os diferentes tipos documentais produzidos pela CMBH, e por outros locais, e construir um estudo complexo sobre temas diversos da capital mineira. Como ressaltado anteriormente, algumas escolhas foram feitas para tornar este artigo viável. Entre elas, a opção por analisar os discursos de trechos de entrevista de história oral e de duas reuniões ocorridas na CMBH em que a ALEM esteve presente. Reforço, entretanto, que, mesmo dentro desta temática, há múltiplas possibilidades e caminhos. Há, inclusive, análises que serão divergentes da leitura que fiz destas fontes documentais. Na minha perspectiva, decidi ressaltar algumas pautas específicas da ONG e analisar a conexão destas com o contexto histórico e político. Para outras/os
existência de inúmeras possibilidades de estudos para este acervo e demonstrar que a
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nestes mesmos eventos. De qualquer forma, o ponto central deste artigo foi apontar a
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pesquisadoras/es pode ser importante elucidar outras dimensões dos discursos proferidos
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especificidade do mesmo o torna diferente de outros documentos que também são produzidos no contexto das reuniões.
Referências
ARQUIVO PÚBLICO DA CIDADE BELO HORIZONTE. Inventário do acervo da Câmara Municipal no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte: 1947-2005, Belo Horizonte, 2008. CAMPOS, Núbia Carla. A lesbianidade como resistência: a trajetória dos movimentos de lésbicas no Brasil – 19792001. Dissertação (Mestrado). Políticas Públicas e Formação Humana. UERJ, Rio de Janeiro, 2014. COITINHO FILHO, Ricardo Andrade; RINALDI, Alessandra de Andrade. O Supremo Tribunal Federal e a “união homoafetiva”: onde os direitos e as moralidades se cruzam. Civitas. Porto Alegre, v. 18, n. 1, p. 26-42, jan.-abr. 2018. FACCHINI, Regina. “Sopa de Letrinhas”? Movimento homossexual e produção de identidades coletivas nos anos 90: um estudo a partir da cidade de São Paulo. Dissertação (Mestrado) Antropologia Social. Campinas: Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, 2002. FRANÇA, Isadora. Identidades coletivas, consumo e política: a aproximação entre mercado GLS e movimento GLBT em São Paulo. Horizontes Antropológicos. Porto Alegre: UFRGS, v. 28, p. 289-311, 2007. MACHADO, Frederico. Muito além do arco-íris. A constituição de identidades coletivas entre a sociedade civil e o estado. Dissertação (Mestrado). Pscicologia Social, UFMG, Belo Horizonte, 2007. MENEZES, Soraya. Entrevista pública de história oral sobre a ALEM. Entrevistador: Maria Ferraz [24 set. 2019], Belo Horizonte, 30 minutos e 44 segundos de duração, 6 páginas de transcrição. SANTHIAGO, Ricardo. Duas Palavras, muitos significados. Alguns comentários sobre a História Pública no Brasil. In: MAUAD, Ana Maria e ALMEIDA, Juniele Rabêlo de e SANTHIAGO, Ricardo. História Pública no Brasil: sentidos e itinerários. São Paulo: Letra e Voz, 2016. SIMÕES, Júlio; FACCHINI, Regina. Na trilha do arco-íris: do movimento homossexual ao LGBT. 1. ed. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2009.
Fontes documentais Ata da terceira reunião extraordinária da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor da Câmara Municipal de Belo Horizonte, na primeira sessão legislativa. Fundo Câmara Municipal, 28/01/2001. Notação: CMBH/APCBH//DR.01.01.04-040. Plenário Amynthas de Barros: Comissão de Direitos Humanos e Defesa do Consumidor – Homossexualidade. Fundo Câmara Municipal, 28/01/2001. Notação: CMBH/APCBH//DR.02.02.00-2266.
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Plenário Juscelino Kubitschek: Discussão de propostas dos gays, lésbicas e transexuais. Fundo Câmara Municipal, 08/07/2005. Notação: CMBH/APCBH//DR.02.02.00-2760.
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Entrevista Maria do Carmo Andrade Gomes
Foto: Acervo Pessoal.
Historiadora, Mestre em Biblioteconomia e Doutora em História pela UFMG. Pesquisadora aposentada da Fundação João Pinheiro. Foi diretora do APCBH em dois períodos, entre 1999 e 2000; entre 2005 e 2011, atuando em diversas frentes de trabalho, em especial na construção de parcerias, como no caso da Câmara Municipal de Belo Horizonte e negociações e projetos por uma sede própria para o APCBH. Como pesquisadora, desenvolveu diversos projetos
viabilizando patrocínios importantes.
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criação e ocupou diferentes cargos à frente da Associação Cultural do APCBH - ACAP-BH,
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relativos às atividades arquivísticas tanto no APM como no APCBH. Como cidadã, participou da
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1. Comente sobre a sua trajetória profissional e como ela se relaciona com o Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Ainda quando estudante de História na UFMG, fui por três anos estagiária do Arquivo Público Mineiro, onde eu adquiri minha paixão pelos arquivos. Quando me formei e fui trabalhar no IEPHA-MG, em 1980, meu primeiro trabalho como profissional foi a participação na elaboração dos primeiros tombamentos estaduais de conjuntos arquitetônicos em Belo Horizonte. Ainda não existia o APCBH e nossas pesquisas realizavam-se no Museu Histórico Abílio Barreto ou diretamente nos acervos disponíveis dos órgãos municipais, como a antiga Secretaria Municipal de Assuntos Urbanos, além de órgãos estaduais, como o próprio APM e o extinto Plambel.
Assim, posso dizer que vivenciei as dificuldades de se pesquisar a história de Belo Horizonte antes da criação do APCBH, seja pelo desconhecimento dos acervos, seja pela dificuldade de acesso ou pela falta de qualquer instrumento de pesquisa. Desenvolvi dissertação de mestrado em 1994 sobre a relação entre a pesquisa histórica e o uso dos arquivos, o que me proporcionou uma formação mais teórica no campo arquivístico.
Participei do seminário de criação do APCBH em 1990 e de muitos eventos promovidos ao longo desses anos. Em 1994, no cargo de Diretora de Apoio Cultural e Extensão do APM, participei da elaboração do projeto de criação do Banco de Dados da Comissão Construtora da Nova Capital, numa parceria entre o Museu Abílio Barreto, o APM e o APCBH.
Também tive oportunidade, como historiadora da Fundação João Pinheiro, de pesquisar no APCBH para outros projetos que desenvolvi, dos quais destaco as obras Panorama de Belo Horizonte, Atlas histórico e Omnibus, uma história dos transportes coletivos em
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Pinheiro).
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Belo Horizonte (ambos publicados em 1997 na Coleção Centenário da Fundação João
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2. Comente sobre a sua experiência como diretora e os desafios de se estar à frente de uma instituição arquivística como o APCBH. Por dois períodos tive o privilégio de dirigir o APCBH: entre os anos de 1999 e 2000 e no período entre 2005 e 2011. Foram experiências muito importantes e gratificantes para minha vida profissional. Exerci o cargo em governos democráticos e progressistas, o que facilitou muito o diálogo com as autoridades municipais.
Embora o APCBH seja ainda uma instituição pequena em termos organizacionais, seus desafios sempre foram gigantescos. Estar à frente do APCBH significou enfrentar certa invisibilidade da instituição frente às prioridades dos governos municipais, arcando com a enorme responsabilidade de preservar materialmente, com recursos financeiros e humanos sempre insuficientes e uma sede inadequada, um acervo documental sempre crescente, frágil, único e de imenso valor histórico e probatório para a cidade e os cidadãos de Belo Horizonte.
Para dirigir o APCBH é necessário munir-se de argumentos técnicos, vontade e muita diplomacia para dialogar permanentemente com os órgãos da administração municipal, na busca do entendimento da importância da gestão documental. Significa ainda a busca constante por conferir sentido a essa preservação, ou seja, organizar, divulgar e dar acesso a toda a documentação.
Enquanto diretora busquei estar à altura desses enormes desafios. Destaco alguns resultados, de forma não cronológica: a construção de parcerias importantes, particularmente com a Associação Cultural - ACAP∕BH e a Câmara Municipal de Belo Horizonte; o recolhimento de acervos acumulados de grande importância como os projetos arquitetônicos, BHTrans, Câmara Municipal e Cemitério do Bonfim; a
Exposições Itinerantes, História de Bairros, Descrição da documentação cartográfica da Comissão Construtora da Nova Capital, entre outros.
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acervo; e a promoção de projetos de pesquisa, divulgação e educação patrimonial -
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conservação preventiva do acervo audiovisual; os primeiros projetos de digitalização do
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Embora diversas iniciativas tenham proporcionado a melhoria das condições dos ambientes de trabalho, consulta e das áreas de guarda do APCBH, permaneceu sem solução definitiva a questão da sede própria do Arquivo, apesar de muitos esforços que levaram à produção de dois projetos arquitetônicos e à desapropriação de um imóvel para esse fim.
3. Como você vê o papel do APCBH ao longo desses 30 anos? Que lugar a instituição ocupa na cidade? É cada vez mais significativo o papel do APCBH em Belo Horizonte. Hoje o Arquivo é referência obrigatória para quem pesquisa a história da cidade e de suas políticas públicas, para o cidadão em busca de determinados direitos e informações, para o professor que leciona sobre a história e a memória locais. Muitos outros usos ainda podem e devem ser mais explorados, mas destaco a procura do Arquivo pelos próprios agentes públicos, entre autoridades e servidores da PBH e da Câmara Municipal.
4. Como cidadã, quais são as suas perspectivas futuras para o APCBH? Quais são os desafios da instituição para que ela se fortaleça? Como cidadã, eu busco ser otimista quanto ao futuro do APCBH, tanto quanto o futuro de nossa democracia e do nosso projeto como nação, que passa hoje por uma crise sem precedentes. Como uma instituição que sempre teve que lutar muito pelo reconhecimento de sua importância, a APCBH desenvolveu uma musculatura e uma flexibilidade que lhe permite sobreviver às crises orçamentárias, à carência de pessoal, numa constante busca por alternativas para consecução de sua missão institucional.
necessariamente pela implementação da gestão de documentos em toda a PBH, pela maior
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importância no seio da administração municipal. Esse reconhecimento passa
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O APCBH já é uma referência cultural na cidade, mas ainda precisa ver reconhecida sua
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autonomia do Arquivo como órgão central da administração municipal e pela instalação de uma sede própria à altura de sua importância para a Prefeitura e para a cidade de Belo Horizonte. O APCBH conta para enfrentar o futuro com uma tradição de 30 anos: as gerações de técnicos e servidores qualificados e comprometidos com a casa. A eles rendo
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minha homenagem.
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LUGAR E MEMÓRIA: percepções e vivência escolar no contexto da modernidade no Instituto de Educação de Minas Gerais, em Belo Horizonte (MG) Place and memory: perceptions and school experience in the context of modernity at the Institute of Education of Minas Gerais, in Belo Horizonte (MG)
Juliana de Lima Caputo1* Juliana Lima de Almeida Bastos2** Yasmin Sthefany Xavier Almeida Reis3*** RESUMO: As vivências conseguem contar histórias sobre lugares que não passam por livros, mas que podem ser captadas e representadas através de mapas mentais que, por sua vez, mostram uma possível relação de “lugar” ou mesmo de “não-lugar”. Portanto, essa pesquisa buscou reconstituir a relação dos alunos e ex-alunos do Instituto de Educação de Minas Gerais com o espaço da escola, compreendendo se existia/existe um senso de pertencimento, a partir da concepção geográfica de “lugar” (TUAN, 2012), com a utilização da análise de mapas mentais produzidos por esses pares. Assim, reconstrói-se não só a relação escolar, que passava por reformulações, mas também vivências da cidade de Belo Horizonte em meio à sua modernidade. Palavras-chave: Lugar. Modernidade. IEMG. ABSTRACT: Experiences can tell stories about places that are not told by books, but that can be captured and represented through mental maps, which in turn, show a possible relationship, of "place" or even of "non-place". Therefore, this research sought to reconstruct the relationship of students and former students of the Institute of Education of Minas Gerais with the school space, understanding if there was or exists a sense of belonging, from the geographical conception of place (TUAN, 2012), with the analysis of mental maps produced by these pairs. Thus, we reconstruct not only the school relationship, which was undergoing reformulations, but also experiences of the city of Belo Horizonte in the midst of its modernity. Keywords: Place. Modernity. IEMG.
Introdução As lembranças do lugar vivido revelam histórias particulares dos indivíduos e grupos sociais, histórias essas que são capazes de informar sobre a relação estabelecida entre a sociedade e o espaço geográfico através das experiências vividas sobre ele. Com a chegada da modernidade, em um país que até meados do século XX foi marcado pela
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Doutoranda em Educação Cartográfica. Mestra em Geografia. Professora do Departamento de Geografia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) – Belo Horizonte/MG. E-mail: jugrafiabh@gmail.com 2 ** Graduanda em licenciatura e bacharelado em Geografia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) – Belo Horizonte/MG. E-mail: julianajlab@gmail.com 3 *** Graduanda em licenciatura e bacharelado em Geografia pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) – Belo Horizonte/MG. E-mail: yasminreisgeo@gmail.com
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oralidade e o analfabetismo, os contadores de histórias mais antigos, que também se viam na posição de educadores de seus filhos e netos, perdem lugar. Logo, a educação desenvolvida fora de um estabelecimento de ensino e sem planejamento desaparece e os grupos escolares passam a emergir. Esses grupos escolares nas instituições públicas que emergem no contexto da modernidade, geralmente, possuem uma extensa rede documental e descritiva, gerando uma contribuição histórica, que pode ser encontrada na obra de Gonçalves (2004). Porém, pouco se aborda acerca do papel desempenhado pelos grupos escolares enquanto espaço vivido e de relações de pertencimento, denominado pela Geografia Humanista de “lugar”. As pessoas que viveram nesse período em Belo Horizonte, da construção da nova Capital no contexto da República, presenciaram muitas mudanças em relação à educação, seja na própria forma do ensino, como nos métodos, ou mesmo nos novos lugares que passaram a abrigar essa prática. Muitas dessas mudanças podem ter contribuído para um novo estabelecimento de relações de pertencimento com esses espaços, mas, também pode ter provocado uma sensação de não pertencimento a esse respeito, onde elas teriam que passar grande parte de seu tempo e, até mesmo, de suas vidas. Para entender como essas relações de vivência ocorrem e se exprimem, utilizando do recorte espacial do Instituto de Educação de Minas Gerais (IEMG), localizado em Belo Horizonte (MG), buscou-se reconstituir este espaço escolar a partir da percepção de dois perfis diferentes: alunos e ex-alunos, analisando se o espaço da instituição se configura enquanto lugar, de vínculo, de afeto, de pertencimento, tais como contribui Tuan (2012) a respeito dessa categoria de análise geográfica. Diante disso, é importante indagar se existe por parte dos alunos e ex-alunos do IEMG uma identificação em relação à escola, dando a ela uma noção de lugar? E mais, como eles percebem esse espaço diante de sua vivência escolar? A partir das questões norteadoras da pesquisa, acredita-se que a inclusão do IEMG, na lógica da cultura escolar, proveniente da construção da capital de Belo Horizonte, pode não ter efetivado um sentimento de pertencimento por parte dos alunos daquela época. Da mesma forma, a construção de um ambiente controlado pode não ter auxiliado na construção de um lugar
Dessa forma, o objetivo geral desta pesquisa foi analisar a relação dos alunos e ex-alunos do Instituto de Educação de Minas Gerais com o espaço da escola, compreendendo se existia/existe um senso de pertencimento, a partir da concepção REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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velhos, da ruptura com o modelo educacional que possuíam antes.
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para os alunos atualmente, principalmente, pela premissa de controle e, para os mais
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geográfica de lugar, no contexto do desenvolvimento da modernidade. Para isso, foi necessário analisar o espaço vivido e percebido pelos alunos, sob a ótica da categoria “lugar”, tal como, analisar e comparar os relatos de espaço vivido dos alunos e ex-alunos e por fim investigar se o contexto da modernidade, na qual a escola foi pensada, possibilita(ou) aos alunos e ex-alunos o estabelecimento de uma relação de pertencimento. É importante ressaltar que as lembranças dos ex-alunos e alunos trazem informações não só de interesse para este trabalho, pois além de retratar a relação humanista e de afetividade que eles têm com a escola, é possível reconstruir como a educação se fazia presente na vida das pessoas de Belo Horizonte, na medida em que cada época, expressões únicas se revelam e se constituem na formação de identidades.
Metodologia O presente estudo, realizado no ano de 2018, teve como objetivo analisar as percepções dos indivíduos em um determinado espaço. Por esse motivo, apresenta um caráter fenomenológico, uma vertente da linha de pesquisa qualitativa. A fenomenologia pode ser entendida como a busca pela “essência ou estrutura, que se manifesta nas descrições ou discursos de sujeitos” (GARNICA, 1997). Segundo Merleau Ponty (1999) a fenomenologia, na perspectiva da percepção, apresenta um caráter substancial, o qual traz pontos chave sobre a percepção, a relação do corpo com o objeto, do mundo vivido, das experiências contidas de significação, da história de vida de cada sujeito de acordo com a sua vivência social e afetiva, de desejos e paixões, isto é, de suas subjetivações. Assim, como ponto de partida para a realização do estudo, utilizou-se de revisões bibliográficas de importantes autores que abordam a temática. Dessa forma, para analisar sobre o surgimento de uma cultura escolar em Belo Horizonte e o papel da escola moderna na origem da cidade, foi necessário utilizar os marcos teóricos elaborados por Vincent (1980), Veiga e Faria Filho (1997), Faria Filho (1998) e Gonçalves (2004). Para elaborar uma síntese referencial acerca da arquitetura escolar de Belo Horizonte, utilizou-se revisões bibliográficas pautadas em Faria Filho (1998), Monarcha
natureza, utilizou-se como base as postulações de Tuan (2012), Entrikin (1980), Carlos (2007), Rocha (2007), Pessanha (2016), e Nogueira (2002, 2013). Dessa forma, o
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concepção humanista e o mapa mental como produto da relação entre sociedade e
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(1999), Holanda (2006), Ferreira (2010), e Campos (2013). Para analisar o lugar na
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aprofundamento teórico sobre as postulações teóricas dos autores foi fundamental para a construção da análise do estudo de caso da pesquisa. Na etapa seguinte da pesquisa, foram realizadas entrevistas estruturadas com os alunos e ex-alunos do Instituto de Educação de Minas Gerais, com o intuito de comparar a relação vivida por cada um deles. A entrevista estruturada foi escolhida na medida em que é “aquela em que o entrevistador segue um roteiro previamente estabelecido; as perguntas feitas ao indivíduo são predeterminadas” (MARCONI; LAKATOS, 2003, p. 197). A fim de analisar possíveis relações de “topofilia” - que segundo Tuan (2012, p. 19) é o “elo afetivo entre a pessoa e o lugar ou ambiente físico” e a “topofobia”, sendo o sentimento de medo, aversão e não vínculo ao lugar - entre os alunos e ex-alunos e o Instituto, foi solicitada a elaboração de mapas-mentais que remetessem à memória do espaço escolar. A metodologia dos mapas mentais foi definida, pois trata-se de uma forma de linguagem capaz de refletir o espaço vivido representado em todas as suas nuances, cujos signos são construções sociais, evidenciadas através de lembranças vivenciadas pelos indivíduos, sendo essas boas ou más. Para coletar informações com os alunos, foi realizada uma visita ao IEMG durante o período da manhã, no ano de 2018, com o intuito de realizar as entrevistas estruturadas e solicitar a elaboração dos mapas mentais. A identificação desses alunos foi feita pela diretora da escola, que indicou aos pesquisadores uma turma específica para a realização das entrevistas. Desse modo, as entrevistas foram gravadas em áudio e, posteriormente, transcritas. Já os mapas mentais foram elaborados individualmente em folha A4, que posteriormente foram escaneadas para compor o trabalho. Dessa forma, foram realizadas o total de dez entrevistas com os alunos do terceiro ano do ensino médio que estavam matriculados no Instituto no ano da realização da presente pesquisa. Em relação aos ex-alunos, foi feita uma pesquisa prévia em grupos dispostos em redes sociais, como Facebook, Instagram, Whatsapp etc., a fim de identificar os exestudantes. A escolha dos ex-alunos entrevistados não seguiu um padrão específico, como faixa etária, renda, local de residência, etnia e outros. Essa escolha se deu pela
entrevista com dez ex-alunos de diversas faixas etárias por meio de áudios na plataforma Whatsapp. Os mapas mentais foram elaborados individualmente em folhas A4, fotografados e enviados aos entrevistadores em formato jpeg. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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conhecidos das autoras e indicações dos próprios alunos. Ao localizá-los, foi realizada a
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disponibilidade dos mesmos a realizarem a entrevista, através de contatos prévios com
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Assim, a interpolação das informações entre as entrevistas e os mapas mentais foi fundamental para analisar se, de fato, os alunos se sentiam pertencentes ao espaço do Instituto, por meio de representações detalhadas, ou se havia uma relação de repulsa, representada através do pouco detalhamento sobre o espaço. As análises dessas representações tiveram por objetivo tornar visíveis pensamentos, atitudes e sentimentos sobre o referido espaço.
O surgimento de uma cultura escolar em Belo Horizonte e o papel da escola moderna na origem da cidade A educação escolar em Belo Horizonte se consolida no contexto republicano moderno a partir do governo estadual de João Pinheiro, eleito em 1906, com a reforma da educação pública com ênfase na formação de professores e com a criação dos Grupos Escolares (GONÇALVES, 2004). A construção desses espaços físicos evidencia a importância que a educação escolar em Belo Horizonte passa a ter. A novidade dos Grupos Escolares “viabilizava para os que se encontravam fora dos ‘muros’ o sinal visível, na beleza e suntuosidade da arquitetura, do empreendimento desenvolvido para a realização do ‘banquete da modernidade’” (VEIGA; FARIA FILHO, 1997, p. 216). Essa modernidade, segundo Berman (1987), pode ser compreendida como um processo dialético, isto é, dicotômico, paradoxal e contraditório. Juntamente com as contribuições de Ianni (1995) é possível entender a dialética da modernidade através dos distintos processos que a atravessam, pois, se por um lado há a promessa de ruptura de fronteiras, da superação da noção dos Estados Nacionais, da integração de todos os povos dentro de uma “aldeia global’’ e de democratização, por outro, se verifica que a modernidade se apresenta como um processo hegemônico, europeizante, massificante, de instabilidade e de fragmentação. Tanto Berman (1987) quanto Ianni (1995) postulam acerca das rápidas transformações técnicas e tecnológicas, o encurtamento das distâncias através dos avanços na comunicação e a constante reinvenção que caracteriza a modernidade. Consequentemente, segundo ambos, há uma dissolução das particularidades em meio à
espaços, prédios e população, implicou na construção de monumentos que se impusesse aos demais, a construção dos grupos escolares significou, também, “a estruturação de um espaço específico, adaptado a uma função específica” (VINCENT, 1980, p. 21). Dessa REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Se a relação da educação escolar com a cidade no contexto moderno, com seus
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instabilidade e a hegemonia decorrentes do período.
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forma, os grupos escolares deveriam significar, ao mesmo tempo, um distanciamento do mundo doméstico e religioso, bem como a criação de uma nova cultura escolar que evidenciasse, simbólica e materialmente, a vinculação da escola com o mundo secular, público e urbano. As postulações acerca da consolidação da escola enquanto espaço de função específica espelham as contradições modernas. Através das contribuições de Faria Filho (1998) fica explicitado o surgimento da escola no contexto da fundação de Belo Horizonte enquanto mecanismo de controle e hegemonia, além do processo dialético que separa o público e o privado: apesar de serem de domínio público, buscava-se afastar a escola da noção de espaço público, a fim de controlar o corpo docente de forma mais eficiente. Nesse contexto segregador, a escola surgia com o objetivo de “amansar’’ e “civilizar’’ as camadas populares. Desta forma, a escola visava promover a civilidade e a racionalidade, pilares da modernidade homogeneizante, através da cultura escolar. Além disso, a cultura escolar adotada utilizava-se de mecanismos que evidenciavam e controlavam as diferenças, principalmente de gênero. Com entradas independentes e separadas para meninos e meninas, tal como pátios de recreio e outros. Era comum também que diretoras, inspetores e professoras tivessem dificuldade de evitar que os alunos e alunas ficassem dispersos próximos à entrada das escolas e, ao mesmo tempo, impedir que pessoas que não possuíam vínculo com a escola tivessem acesso. Dessa preocupação surgiu a necessidade de construção de um muro de divisão da escola com a rua, que teria um valor simbólico e material, a delimitação de um espaço próprio, apartado da rua e que se instituiu como significativo, ao mesmo tempo em que reproduziu a rua como lugar hostil às crianças.
A arquitetura escolar do Instituto de Educação de Minas Gerais IEMG Holanda (2006) define a arquitetura como o processo das construções que expressam esteticamente as relações sociais, econômicas e culturais em um lugar vivido, além de demonstrar o contexto histórico da época. No contexto da cidade de Belo Horizonte, a arquitetura foi pensada e construída com forte influência francesa moderna
Com isso, Faria Filho (1998) elabora postulações acerca do estabelecimento do espaço físico da escola enquanto reflexo da modernidade e da ruptura com o pensamento REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Pós-República.
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para acabar com a aparência de colônia que possuía, visto que a cidade foi inaugurada
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tradicional monárquico através da construção de escolas monumentais, adaptadas à função específica do fazer escolar, concomitantemente à busca por maior aproximação com o urbano. O autor ressalta a instauração de uma “pedagogia do olhar’’ através da espetacularização das edificações escolares, possibilitando a elaboração de um espaço controlado, partindo de preceitos de higiene e economia. O prédio que hoje abriga o Instituto de Educação de Minas Gerais começou a ser construído em 1897, segundo o Guia dos Bens Tombados do IEPHA-MG (Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais). Esse prédio foi pensado inicialmente para abrigar o Ginásio Mineiro que, antes sediado em Ouro Preto, foi transferido para a nova Capital, sendo projetado pelo arquiteto Edgar Nascentes Coelho. O prédio possuía diversos estilos arquitetônicos de tradição neoclássica europeia, já com o pensamento de “afrancesar” os prédios de Belo Horizonte. Com o desejo de inserir a cultura europeia nas paisagens belo-horizontinas, o prédio do Ginásio Mineiro passou por intervenções e adaptações para abrigar a escola Normal Modelo, que inicialmente seria exclusiva para mulheres que cursavam o magistério. Sendo assim, sob o comando do arquiteto Carlos Santos, a nova escola teria uma fachada eclética com uma aparência monumental, na qual estão postos colunas de dupla altura e capitéis jônicos. Apesar das adaptações, o prédio continuou com sua aparência neoclássica. Para Monarcha (1999), os prédios escolares da nova Capital procuravam despertar um sentimento de devoção, pois apresentavam fachadas grandiosas. Percebe-se essa intenção, visto que os prédios das mais antigas escolas são monumentais. Entre os anos de 1926 a 1930, a Escola Normal passou por reformas e recebeu uma nova fachada. Segundo Ferreira (2010), esta fachada foi elaborada pela artista Belga Jeanne Louise Milde, que idealizou dois baixos relevos decorativos representativos do ensino artístico e do ensino das ciências naturais. Milde retratou nos painéis de baixo relevo, na forma de dois grupos de cinco mulheres, o sentimento de amor e dedicação dos alunos às artes, às ciências e à cultura. Cada uma das figuras femininas representadas na obra de Milde tem a posse e,
(Figura 1), a primeira jovem segura um martelo; a segunda, um formão; na parte central, o sol; a quarta mulher segura um livro; e a quinta uma paleta de pintor. No outro, na representação das ciências, há também um grupo de cinco mulheres: a primeira segura REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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iluminadas pela luz do sol, que representa o conhecimento. No painel do ensino das artes
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por consequência, o domínio de um elemento associado ao conhecimento. E todas estão
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um galho de café; a segunda, um globo; na parte central, o sol, a quarta jovem segura um livro; e a última um compasso e um esquadro (CAMPOS, 2013).
Figura 1: Alegoria do ensino das artes, obra de Jeanne Louise Milde
Fonte: Ronaldo Campos (2013).
A artista belga, ao invés de associar a figura da mulher à maternidade e ao erotismo como comumente se observa em uma sociedade patriarcal e machista a qual a realidade está inserida, propõe uma representação que rompe com a imagem tradicional da mulher, associando-a ao conhecimento e projeta uma nova representação do feminino. Dessa forma, a obra emite um caráter revolucionário e é uma imagem que simboliza a conquista dos direitos à educação e à profissionalização. Com a nova fachada, a Escola Normal viria a ser, anos mais tarde, o Instituto de Educação de Minas Gerais (IEMG). Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 1982, o prédio do IEMG foi tombado como patrimônio histórico estadual pelo Instituto Estadual de Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA-MG). Apesar do tombamento e do reconhecimento por parte do Governo como patrimônio histórico e artístico, o IEMG enfrenta, desde a década de 2010, problemas relacionados à infraestrutura. A precarização dos sistemas de drenagem de chuva, bem como a deterioração dos espaços físicos da escola, em um ambiente que reflete o descaso dos
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precariedade em que o Instituto se encontra (Figura 2).
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órgãos públicos para com o IEMG. Ao realizar a visita a campo, foi possível constatar a
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Artigos Livres Figura 2: Espaço interditado da escola
Fonte: (PROJETO...,2018).
Apesar dos problemas estruturais no prédio do Instituto de Educação de Minas Gerais, sua arquitetura e seu estilo neoclássico foram mantidos. Sua fachada monumental ainda está presente nos dias atuais, e torna-se um espaço de estranhamento arquitetônico, na medida em que a verticalização se apossou do centro de Belo Horizonte.
O lugar na concepção humanista e o mapa mental como produto da relação entre sociedade e natureza A ciência geográfica passou por uma série de reformulações e se diferenciou em seus métodos, e, após o declínio da Geografia Cultural na década de 1940, começa a surgir uma nova corrente de pensamento que baseia os seus estudos nas localizações. Com isso, o espaço não era mais visto como naturalista, e sim funcionalista, pois estaria estruturado em “redes de relações sociais e econômicas, em redes de vias de transporte e de comunicação, e em redes urbanas” (CLAVAL, 2002 apud ROCHA, 2007). Por esse momento de ascensão da Geografia de Localizações, a Geografia Cultural volta a ganhar força e, em 1960, os seguidores dessa corrente, como John Wright e David Lowenthal, começam a pensar em uma renovação da Geografia Cultural. Nesse movimento de renovação, os autores queriam pensar em uma nova
(HOLZER, 1996 apud ROCHA, 2007). Essa corrente passou a ser reconhecida como Geografia Fenomenológica, Geografia da Percepção ou Geografia Humanista.
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inconsciente, o objetivo e o subjetivo, o fortuito e o deliberado, o literal e o esquemático”
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Geografia que considerasse “os vários modos de observação, o consciente e o
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Nesta perspectiva de ascensão da Geografia Humanista, as categorias “paisagem” e “lugar” passam a ter mais reconhecimento e exaltação, sendo vistos como essencial para essa nova perspectiva, que até o instante era secundário na disciplina. O humanismo despertou na Geografia “a investigação do pensar, da experiência e dos sujeitos em sua individualidade recuperando o elo perdido entre o mundo acadêmico e as pessoas” (PESSANHA, 2016, p.3). Nessa perspectiva, Tuan (2012) propõe uma Geografia dedicada ao estudo do amor do homem pela natureza, denominado por ele de “topofilia”. Essa relação com a paisagem e o espaço causa sentimentos, que podem ser classificados de maneira topofílica ou topofóbica, que, assim como a etimologia do sufixo dessas palavras, representa a afeição/gosto e desgosto/medo, respectivamente. Essas categorias de análise são importantes por conceituar experiências sensoriais vividas por todos, em diferentes espaços, e que não são fixas, podendo sofrer alterações de acordo com outros fatores como companhia, horário, iluminação etc. Segundo Rocha (2007), na Geografia Humanista, o enfoque está sobre a valorização das experiências, os sentimentos, a intuição e a intersubjetividade das pessoas no espaço em que habitam. Nessa perspectiva, os seres humanos utilizam o corpo, com seus sentidos, paladar, tato, olfato, audição e visão para sentir o ambiente e a ele conectarse, que com o tempo torna-se familiar, lar, lugar tão essencial para a sobrevivência humana (TUAN, 2012). Quando essa conexão ocorre, todas as pessoas que ali convivem tendem a atribuir significados e guardá-los com afeto em suas memórias, a partir da relação de apropriação da realidade (CARLOS, 2007) que gera identificação e por consequente pertencimento. Em contrapartida, o espaço que, quando desconhecido, pode se mostrar frio e estranho, causando um diferencial em relação ao lugar, denominando-o como "não-lugar''. Mas, de qualquer forma, essa experiência leva um sentimento consigo. O espaço passa a ser lugar por meio da convivência, experiência repetida e do significado (TUAN, 2012). Os lugares, enquanto ambientes conhecidos, são dotados de significados impregnados de emoções e histórias. O lugar supera o seu sentido de localização por meio
mundo. A memória eidética e fenomenológica ocorre durante o conhecimento de um espaço, que implica no esquecimento do senso comum e no aprofundamento do conhecer verdadeiro, por isso, “os fenomenólogos procuram conhecimento através da descrição da REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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meio desses sentidos e memórias, o homem passa a produzir um mapa mental do seu
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da existência, experiência, sentimentos e memórias humanas (NOGUEIRA, 2013). Por
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experiência [...] a fenomenologia, melhor que o empirismo é a ciência da experiência” (ENTRIKIN, 1980, p. 9). Desta forma, mapas mentais são produtos da imagem percebida através dos sentidos e sentimentos, passando a ser “compreendido por nós para além de seus aspectos físicos e geométricos, aqui compreendido como lugar de vida” (NOGUEIRA, 2002). As representações dos mapas mentais conseguem mostrar uma possível relação, de “lugar” ou mesmo de “não-lugar”, que o autor mantém com o espaço físico, pela quantidade de signos e afetividade que este mapa acaba por representar. É possível evidenciar e analisar como a pessoa se relaciona com um determinado ambiente, principalmente quando trata-se de memórias antigas, pois a idade tende a selecionar somente as lembranças de mais afetividade ou as mais traumáticas para se armazenar a longo prazo.
Os mapas mentais e sua relação com o estabelecimento do lugar no Instituto de Educação de Minas Gerais - IEMG Para a realização da pesquisa, foram conduzidas um total de 20 entrevistas com alunos e ex-alunos do IEMG, que buscaram trazer à tona os enunciados desses sujeitos em relação à identificação com o espaço da escola. Dessa forma, foram entrevistados 10 alunos e 10 ex-alunos da instituição. Após as entrevistas, foram elaborados pelos entrevistados mapas mentais mediante orientações dos pesquisadores, os quais sugeriram a livre representação gráfica da instituição, buscando identificar as expressões sentimentais e sensoriais dos alunos e ex-alunos em relação à escola. Desta forma, objetivou-se compreender se o IEMG é percebido como lugar, de acordo com o proposto por Tuan (2012), que afirma que os seres humanos utilizam o corpo com seus sentidos para se conectar com o ambiente físico, atribuindo-lhe significados e o tornando familiar. Os alunos entrevistados estavam cursando o terceiro ano do Ensino Médio no Instituto. Posto isso, foram analisados os relatos dessas entrevistas e a identificação dos alunos e ex-alunos será feita através de números e letras, respectivamente, a fim de se
gestão da escola, o que revelou inclusive ser um empecilho no processo de identificação, conforme apontado por um dos entrevistados que pontua que:
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Durante a entrevista, alguns alunos revelaram preocupação em relação à atual
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preservar a identidade de cada um.
Artigos Livres Aluno 1 - Na verdade, quando eu entrei aqui eu me identificava muito, muito, muito mesmo, só que aí com o passar do tempo foram entrando novas direções, essas coisas assim... mudou muita coisa na escola que eu acho que a escola não tem nada a ver hoje em dia, não representa os alunos. (PROJETO...,2018).
Com isso, é possível notar que a gestão escolar influencia diretamente na maneira como os alunos percebem a escola e seus espaços. Entretanto, o estado precário no qual se encontram as instalações da escola também é um problema para o uso dos outros espaços escolares para além da sala de aula. Apesar disso, a maior parte dos entrevistados afirmou, de fato, se sentirem acolhidos pela instituição e pela comunidade escolar. Desses alunos, confirmou-se que o tempo de estudos é um elemento relevante, ou seja, os alunos que estudavam por um período maior de tempo aprofundaram mais nos tópicos da entrevista, e demonstraram maior preocupação em relação ao estado do espaço físico do IEMG. Na produção dos mapas mentais representados a seguir, parte dos alunos buscou representar a quadra do colégio, conforme a Figura 3. Trata-se de um espaço externo onde muitos utilizam para práticas esportivas e outros, como um meio recreativo, visto que a quadra possui uma localização central no colégio onde todos os alunos têm acesso e podem circular livremente.
Figura 3: Mapa mental do aluno de número 2
Fonte: (PROJETO...,2018).
Nogueira (2002), tendo os mapas mentais como lugar de vida, expressa uma relação de afetividade com o espaço, atribuindo a ele a qualidade de lugar. Devido às respostas dadas
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dos alunos, conforme o proposto por Tuan (2012), na construção do lugar afetivo, e
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A presença frequente da representação das quadras esportivas do colégio por parte
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pelos alunos durante as entrevistas, por ser o espaço de convívio com colegas, uma das justificativas mais frequentes no acolhimento e na identificação em relação à instituição, e se destinar principalmente à sociabilidade, é possível justificar a importância afetiva deste espaço, expressa nos mapas mentais. Outra representação gráfica recorrente pelos alunos é a expressão do hall de entrada do colégio e a fachada do Instituto, conforme a Figura 4.
Figura 4: Mapa mental do aluno de número 3
Fonte: (PROJETO...,2018).
O aluno 3 afirmou se identificar com o espaço do IEMG, porém ressaltou sua preocupação com a precariedade do espaço da instituição, e buscou representar os danos à estrutura causados pela infiltração no hall de entrada. O hall do Instituto apresenta arquitetura com um dos elementos mais marcantes à percepção. A monumentalidade da arquitetura pode ser responsabilizada pelas expressões gráficas do hall de entrada e da fachada do colégio, uma vez que, conforme abordado por Monarcha (1999), os prédios escolares de Belo Horizonte possuíam o intuito de despertar o sentimento de devoção e sensações de grandiosidade e imponência. A questão do sucateamento do espaço do Instituto se faz presente na entrevista de parte dos alunos, porém a fachada do colégio é uma das partes que se mantém relativamente preservadas. Portanto, é possível inferir que ambos os entrevistados, com
Outro aluno, que respondia às perguntas de forma desinteressada e pouco aprofundada, representou no mapa mental uma planta simples do colégio, sem nenhum
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se encontra danificada, a fim de preservar memórias.
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muito tempo de estudos no colégio, se identificam com a parte da estrutura que ainda não
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tipo de detalhe, com exceção da piscina, que apresentava uma descrição um pouco mais minuciosa do que o restante dos elementos. O distanciamento, a ausência de identificação e pertencimento pontuados pelo aluno na entrevista se materializa numa representação distante e pouco aprofundada, corroborando o estabelecimento de um “não-lugar”. Nesse sentido, quando indagado acerca do sentimento que estabelecia com relação ao IEMG, o aluno afirmou: “Ah, eu tenho raiva, né?’’ (Aluno 4). Apesar de não especificar o motivo de tal sentimento, o aluno demonstrou desinteresse em relação à escola ao responder às perguntas. Ele afirmou que a escolha em estudar no Instituto não foi sua, mas de sua mãe. Além disso, o estado precário do espaço escolar também se fazia presente na fala do aluno que, segundo ele, é “meia boca”. Quanto aos ex-alunos, foram entrevistadas diversas faixas etárias, que concluíram seus estudos no Instituto de Educação em diferentes momentos. Há uma grande divergência por parte dos ex-alunos de cada faixa etária. Assim, os ex-alunos mais recentes revelam grande descontentamento em relação à equipe da instituição e valorizam a diversidade com a qual tiveram contato. Em contrapartida, os ex-alunos mais antigos valorizam o tradicionalismo e carregam um discurso classicista, conforme explicitado nos seguintes trechos: “A maior parte era da mesma classe social... era todo mundo amigo” (Ex-aluno A). “Hoje sou uma pessoa tradicional, continuo com comportamentos tradicionais. Sou uma pessoa bem exigente, onde que a escola nos preparou dessa forma, ela nos engessou em relação a isso” (Ex-aluno B). Por outro lado, o acolhimento por parte da instituição é defasado em relação aos alunos mais jovens. Conflitos com a equipe da escola e descaso por parte de professores e funcionários foram frequentemente relatados, como é possível observar no trecho ressaltado pelo ex-aluno B: “Eu não me sentia acolhida quando eu tinha que resolver alguma coisa. Parecia que tratavam o aluno como “f*, tanto faz”, mas pelos professores eu me sentia” (Ex-aluno C). Com isso, apesar das dificuldades e desavenças, houve apenas uma exceção por parte dos ex-alunos quanto à identificação com a instituição, o entrevistado, que dizia não se identificar com o colégio, se mostrou desinteressado e reproduziu a fachada do IEMG,
A monumentalidade da arquitetura do Instituto se fez ainda mais presente na representação dos ex-alunos, porém, desta vez com maior detalhamento, principalmente por parte dos ex-alunos mais velhos. O mapa mental produzido pelo ex-aluno E (Figura REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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conservação do espaço físico do IEMG durante o tempo em que estudou na instituição.
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sem atribuir ao desenho muitos detalhes. O ex-aluno D também criticou o estado de
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5) apresenta alto nível de detalhamento, que pode ser atribuído tanto à maior aproximação deste aluno com a instituição, quanto um reflexo da arquitetura monumental da escola que, na época, ainda representava um pilar da modernidade.
Figura 5: Mapa mental do ex-aluno E
Fonte: (PROJETO...,2018).
O mapa mental produzido pelo ex-aluno F, representado na Figura 6, remete a um espaço específico da escola. O ex-aluno buscou representar a sala de música, pois para ele é o retrato de um lugar, ou seja, a fração do espaço onde ocorria uma identificação vivida por ele. Figura 6: Mapa mental do ex-aluno F
Fonte: (PROJETO...,2018).
“Portão de acesso à quadra. Local onde o aluno Luiz foi agredido e caiu da escada”. O ex-aluno retrata em sua entrevista a violência, o descaso com o ensino, a depredação e a REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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do Instituto. O ex-aluno G incluiu, no mapa mental, uma pequena legenda com os dizeres:
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Em contrapartida, a Figura 7 retrata um “não-lugar” sobre um espaço específico
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negligência em relação ao espaço da escola. A nitidez e a riqueza de detalhes com a qual o local foi retratado não revela a construção de uma memória a partir do pertencimento e do estabelecimento identitário, mas sim a partir de memórias de segregação e marginalidade. Figura 7: Mapa mental do ex-aluno G
Fonte: (PROJETO...,2018).
Dessa forma, é possível perceber que diferenças geracionais contrapostas revelam diferentes maneiras de se estabelecer um lugar. Assim, para as novas gerações, a diversidade e a liberdade, propostas diferentes das tradicionais surgem como fatores importantes na impressão da identidade sobre uma fração do espaço. Em contrapartida, para os ex-alunos mais velhos a ordem e a disciplina são os elementos constituintes do lugar. Apesar das discrepâncias, a arquitetura e o zelo pelas boas condições da estrutura do colégio seguem presentes no imaginário de alunos e ex-alunos: a monumentalidade do prédio segue presente em todas as gerações que contribuíram para o estudo. As más condições do espaço físico da instituição são um grande pesar tanto para os alunos quanto para os ex-alunos, podendo inclusive influenciar nos mapas mentais produzidos.
Considerações finais
partes do colégio que, a partir da ótica de diferentes gerações, eram mais percebidas e vivenciadas que outras. Lugar, nessa ótica, é entendido como locais conhecidos e REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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dos casos, não foi todo o espaço do Instituto que se configurou como um lugar, mas sim
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Após as análises efetuadas no IEMG, foi possível perceber que, na maior parte
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afetivamente guardados em sua memória, dotados de significados impregnados de emoções e histórias. O lugar supera o seu sentido de localização por meio da existência, experiência, sentimentos e memórias humanas (NOGUEIRA, 2013). Entretanto, o espaço IEMG pode ser separado, com claras divisões por seus pátios, quadras e prédios. Por isso, das partes entrevistadas, as representações mais frequentes foram a quadra da escola, local onde os alunos se reúnem para atividades extraclasse, e a fachada da escola, na qual a monumentalidade está expressa de forma exuberante em relação aos outros prédios da região, em sua maioria, verticalizados. Diante das hipóteses apresentadas, comprovou-se que a modernidade, responsável pela criação de um espaço controlado e segregacionista, foi capaz de selecionar e envolver alunos e ex-alunos. Em um primeiro momento, o espaço do Instituto foi o espaço da hegemonia: os ex-alunos mais antigos formavam o lugar a partir do tradicionalismo, do valor ético, moral e da semelhança com os colegas. Num segundo momento, a partir da ótica dos alunos e de ex-alunos que se formaram mais recentemente, o lugar aparece a partir do contato com a diversidade de culturas, gêneros, classes sociais, e principalmente pelo convívio com colegas. O fator institucional e arquitetônico aparece como um elemento relevante, entretanto secundário quando comparado aos demais relatos. O tempo de permanência no Instituto também é um fator proeminente, pois os alunos que estudam na escola há mais tempo podem perceber as diferenças que ocorreram no espaço escolar, e assim, identificar melhor sua relação com a escola. Desta maneira, foi possível constatar que o colégio se configura majoritariamente como lugar para a maior parte dos entrevistados, tanto para os alunos quanto para os exalunos. A má relação com as questões institucionais, dificuldades na socialização e, para os alunos que ainda frequentam o IEMG, o estado precário das instalações, foram alguns fatores que não permitiram o estabelecimento de identificação em relação ao colégio. Diante disso, as hipóteses elaboradas previamente foram refutadas, pois não foi o estabelecimento da modernidade que produziu uma relação de não-lugar para parte dos alunos e ex-alunos, mas sim, as questões sociais e a deterioração do prédio da escola.
estudantes possuem desse espaço. Ver um prédio como esse, construído no início da capital se deteriorando com o tempo, impacta fortemente os envolvidos na relação com esse espaço. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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grandiosa da escola e sua deterioração implica diretamente nas memórias afetivas que os
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Através das análises dos mapas mentais ficou nitidamente expresso que a arquitetura
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Diante deste cenário, coloca-se em pauta as políticas públicas implantadas na cidade de Belo Horizonte e, principalmente, nas escolas. O IEMG, por ser um prédio tombado pelo IEPHA (1982), deveria ser um espaço valorizado e com sua preocupação voltada para as práticas pedagógicas e às relações sociais. Ao contrário, tem-se um prédio abandonado, com problemas nas instalações elétricas e problemas para drenar a água da chuva. Dessa forma, compreende-se a importância da valorização das políticas públicas para que, além de preservar os patrimônios históricos da cidade e do país, o valor do espaço escolar seja reconhecido.
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UMA BREVE CENA DE MOVIMENTOS CULTURAIS NEGROS EM BELO HORIZONTE (1995-2019) A brief scene of black cultural movements in Belo Horizonte (1995-2019)
Denilson Alves Tourinho1*
Resumo: Este texto é resultante do capítulo “Negro ‘Afro-Horizonte’: eventos culturais de Belo Horizonte em Movimento Negro Educador”, da dissertação de mestrado Artes Cênicas Negras e a Educação das Relações Étnico/Raciais em Belo Horizonte, concebida na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, concluída em fevereiro de 2020. Os eventos culturais negros apontados na predita pesquisa são brevemente abordados neste artigo, como parte do passado, presente e futuro da capital mineira, um recorte historiográfico sócio-político-cultural do Tricentenário de Zumbi dos Palmares (1995) ao Fórum Taculas (2019), assim como enaltecimento das produções negras belo-horizontinas em trajetórias emancipatórias. Palavras-chave: Eventos Culturais Negros. Movimento Negro. Belo Horizonte Negro. Abstract: This text is a result of the chapter “Black 'Afro-Horizonte': cultural events in Belo Horizonte in Black Movement Educator”, from the master’s thesis “Black Performing Arts and the Education of the Ethnic/Racial Relations in Belo Horizonte”, conceived at the Faculty of Education at the Federal University of Minas Gerais, completed in February 2020. The black cultural events identified in the predicted research are briefly discussed, in this article, as part of the past, present and future of the capital of Minas Gerais, a socio-political-cultural historiographical profile from the Tercentenary of Zumbi of Palmares (1995) to the Taculas Forum (2019), thus as an exaltation of black productions from Belo Horizonte in emancipatory trajectories. Keywords: Black Cultural Events. Black Movement. Black Belo Horizonte.
Introdução Em 1995, celebrou-se 300 anos da imortal luta de Zumbi dos Palmares com o propósito coletivo de resistência e emancipação da população negra brasileira. Em Belo Horizonte, as atividades culturais pautadas nesse tricentenário marcaram a história da cidade, tal como a criação do Festival de Arte Negra (FAN), idealizado por agentes
Ator e mestre em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (FaEPromestre/UFMG). Idealizador e curador do Prêmio Leda Maria Martins de Artes Cênicas Negras de Belo Horizonte. Também curador do 8º Festival de Arte Negra de Belo Horizonte (FAN). Atua em espetáculos teatrais com circulação no Brasil e exterior. E-mail: denilsontourinho@gmail.com REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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culturais negros e realizado pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. O FAN tem
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abrangência internacional e, desde 2016, faz parte do calendário oficial da cidade, instituído por lei. Marcos Antônio Cardoso, escritor, filósofo, historiador, mobilizador cultural, pesquisador, professor, cientista político e representante do Movimento Negro, em sua obra O Movimento Negro em Belo Horizonte: 1978-1998, no capítulo “O significado do tricentenário de Zumbi dos Palmares em Belo Horizonte”, destaca que: as comemorações dos 300 anos da imortalidade de Zumbi dos Palmares ensejaram também a articulação e execução de projetos institucionais referentes à importância do patrimônio cultural da população negra na cidade de Belo Horizonte e iniciando um novo, conflituoso e rico, processo de relação política entre o Movimento Negro e o Poder Público Municipal. (CARDOSO, 2002, p. 206-207).
Cardoso registra que a articulação da Secretaria Municipal de Cultura de Belo Horizonte com organizações da sociedade civil, para o projeto Tricentenário de Zumbi dos Palmares, suscitou ações de reconhecimento e promoção de patrimônios culturais negros da cidade; realização de exposições e mostras artísticas cênicas, visuais, audiovisuais e literatura; ciclos de debates; oficinas; seminários; publicação do jornal Áfricas Gerais: organização do afoxé 300 Filhos de Zumbi, com o cortejo Afro-horizonte; e a criação do sobredito FAN. O autor também destaca que uma das prioridades do Movimento Negro nesse Tricentenário era a criação do Centro de Referência da Cultura Negra (CRCN), como um espaço de reconhecimento e fomento do patrimônio cultural negro da capital mineira, compreendendo, nesse projeto, perspectivas estruturantes de combate ao racismo e valorização da historicidade negra belo-horizontina. Mas esse empreendimento não teve encaminhamento por parte do Poder Público. Diante desses atos sociais, vale destacar a proposição “Movimento Negro Educador” da pesquisadora Nilma de Lino Gomes (2017), ideia que negrita o vigor pragmático e epistemológico do movimento negro em perspectivas sociais educadoras, também no campo das artes e culturas. Desde o marco histórico Tricentenário de Zumbi dos Palmares em Belo Horizonte, temos um profícuo cenário de movimentos culturais
Terreiro Contemporâneo, Mostra Benjamim de Oliveira, Solo Negro, Polifônica Negra,
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supracitado Festival de Arte Negra, assim como o Aldeia Kilombo Século XXI, Rede
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negros belo-horizontinos para lançarmos luzes. Neste artigo, entram em cena o
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Mostra Puxadinho, Teatro na Quebrada, Encontro EnegreSer, Segunda Preta, Aquilombô, Prêmio Leda Maria Martins, Mostra Negras Autoras e Fórum Taculas.
Festival de Arte Negra (FAN) – 1995 O Festival de Arte Negra de Belo Horizonte (FAN) estreou em 1995, teve a segunda edição em 2003 e, em seguida, passou a ser realizado bienalmente. Inovador e longevo, o FAN destaca-se no cenário artístico nacional e mundial. Na 4ª Conferência Municipal de Cultura de Belo Horizonte, em agosto de 2015, agentes representativos do movimento social negro propuseram a institucionalização do FAN no calendário oficial da cidade, legítima proposta em reconhecimento artístico cultural e manutenção do festival. O texto foi aceito e enviado para tramitação na Câmara Municipal, paralelamente, representantes de movimentos sociais organizados lançaram uma petição virtual em apoio ao projeto e, em março do ano seguinte, 2016, o festival foi oficializado com a lei municipal nº 10.919. Ter um festival de arte negra no calendário oficial de Belo Horizonte não figura privilégio cultural negro, pois representa reparações de desigualdades sociais históricas, promoção e valorização da diversidade cultural e étnico/racial, como direitos instituídos por políticas culturais e educacionais, do âmbito municipal ao nacional. Cardoso (2002) foi um dos fomentadores do Festival de Arte Negra, sua dissertação de mestrado resultou no livro que vem sendo citado, o autor traz aos nossos conhecimentos, ou restaura em nossas memórias, notáveis entidades, associações e grupos culturais com trajetórias atreladas ao Tricentenário de Zumbi dos Palmares e ao FAN, tais como representações das artes cênicas negras: Cia Danç’Arte, dirigida por Marlene Silva, pioneira da dança afro-brasileira, em Belo Horizonte; Cia Bataka, dirigida por Evandro Passos; Cia Primitiva de Arte Negra, dirigida por Mestre João. Esses movimentos culturais belo-horizontinos negros figuram lugar de encruzilhadas (MARTINS, 2002), local em que se entrelaçam fés, artes, epistemes,
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emancipatórias e educadoras para implementação de uma cidade pluricultural.
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tecnologias, resistências, estéticas, denúncias e políticas se engendraram como ações
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Aldeia Kilombo Século XXI - 20052 Desde o Tricentenário de Zumbi dos Palmares, as produções culturais negras belohorizontinas se tornaram redes incessantes criações que dialogam com projetos, programas e políticas do campo das artes e educação, resultando em realizações institucionais e independentes. Multifacetada, essa rede negrita a diversidade das artes e culturas negras. O Aldeia Kilombo Século XXI é uma produção dessa rede de eventos, realizada desde 2005, pela Associação Cultural Eu Sou Angoleiro (ACESA), entidade fundada por Mestre João Angoleiro, em 1993. O evento contempla expressões culturais negras como os reinados, candombes, candomblé, capoeira angola, dança afro, reggae, hip hop e samba. Assim, o Aldeia fomenta as identidades culturais locais, os saberes populares e as produções dos mestres de cultura popular do Estado de Minas Gerais. Na edição de 2012, o referido evento teve na programação uma atividade que reuniu referências culturais locais como o percussionista Carlinhos de Oxóssi com os grupos culturais, Fala Tambor e Filhas da Mãe, Companhia Primitiva, Companhia Baobá, Grupo Carlos Afro e Capoeira, Grupo Odum Orixás, Grupo Couro e Cabaça, Banda Black Sonora e os/as artistas das danças negras Evandro Passos, Haroldo Alves, Rô Fatawa, Marlene Silva, Marilene Rodrigues, Marilda Cordeiro, Benjamim Abras, Patrícia Alencar e Rui Moreira.
Rede Terreiro Contemporâneo de Dança - 20093 Já em 2009, Belo Horizonte foi contemplada com a primeira edição da REDE Terreiro Contemporâneo de Dança, arquitetada como uma rede de encontro que se propõe local de difusão de estudos e produções do campo cultural e artístico das danças negras. A REDE foi idealizada pelo bailarino, coreógrafo e pesquisador Rui Moreira e
Disponível em: http://centroculturalvirtual.com.br/conteudo/aldeia-kilombo-seculo-xxi. Acesso em: 27 de out. de 2019. 3 Disponível em: http://centroculturalvirtual.com.br/conteudo/1o-encontro-rede-terreiro-contemporaneode-danca-2009. Acesso em: 27 de out. de 2019. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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promovida pela Associação SeráQuê? Cultural, entidade da qual Moreira também foi
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fundador. O evento, nacional e internacional, reúne professores das artes cênicas, dançarinos, bailarinos, pesquisadores, músicos, artistas de outras áreas e demais interessados nas artes e culturas negras. O Ilê Wopo Olojukan, terreiro de candomblé, fundado em 08 de dezembro de 1964 pelo Babalorisa Carlos Olojukan, e tombado em 09 de novembro de 1995 como patrimônio cultural de Belo Horizonte pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte 4, acolheu a primeira edição da REDE. A relevância simbólica e cultural desse lugar, Ilê, patrimônio cultural negro da cidade, ensejou as discussões estéticas, sociais e políticas ligadas ao fazer artístico. Na programação da edição inaugural da REDE Terreiro, aconteceram oficinas, apresentações de danças, performances, vivências, trocas e conversas, com as/os artistas e grupos: Evandro Passos (Cia. Bataka - Belo Horizonte/MG); Luli Ramos (Abieié Cia de Dança - São Paulo/SP); Cia Rubens Barbot Teatro de Dança (Rio de Janeiro/RJ); Babalorisà Sidney Ti Odè, Iyakekerê Izabel e Ekede Denísia Martins (Ilê Wopo Olojukan - Belo Horizonte/MG); Evandro Nunes (Negraria Coletivo de Artistas Negros (as) - Belo Horizonte/MG); Elísio Pitta (Companhia C - Salvador/BA); Carmen Luz (Cia Étnica - Rio de Janeiro/RJ); Mestre João Bosco (Cia Primitiva - Belo Horizonte/MG); Renato Negrão (Belo Horizonte/MG); Cia Enki de Dança Primitiva Contemporânea (Vitória/ES). Já em quinta edição, ano 2017, o encontro REDE Terreiro Contemporâneo realizou ciclos de discussão e mostra de espetáculos, que aconteceram no Teatro Espanca, Teatro João Seschiatti, Parque Municipal Américo René Gianetti, Sesc Palladium e Tambor Mineiro. Essa REDE configura, por meio de atividades e convidadas/os, uma representação das diversidades das produções de artes e culturas negras. Nesse Terreiro Contemporâneo, conduzido por perspectivas do Movimento Negro na área da dança, congregam-se companhias de dança, artistas, professores mestres, doutores,
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Disponível em: https://www.facebook.com/pg/EgbeOlojukan/about/?ref=page_internal. Acesso em: 19 de out. de 2019. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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pesquisadores, Babalorisà, Iyakekerê, Ekede, entidades do Movimento Negro e público.
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Mostra Benjamin de Oliveira - 20125 Entre 2012/2013, surgiu a primeira Mostra Benjamin de Oliveira, criada pela Cia Burlantins e Maurício Tizumba. O nome do evento é homenagem ao celebrado primeiro palhaço negro do Brasil, Benjamin de Oliveira. A mostra tem programação nacional e visa contemplar e valorizar a cultura negra brasileira, via protagonismo de corpos negros em produções artísticas e culturais com elencos, predominantemente, formados por negros e negras. A primeira edição da Mostra Benjamin teve como programação de Teatro: Besouro Cordão-de-Ouro (Rio de Janeiro/RJ); O Alabê de Jerusalém (Rio de Janeiro/RJ); Carolina, o luxo do lixo (Rio de Janeiro/RJ); Parem de falar mal da rotina (Rio de Janeiro/RJ); O cheiro da feijoada (Rio de Janeiro/RJ); O Negro, a Flor e o Rosário (Belo Horizonte/MG);
Zumbi
(Belo
Horizonte/MG);
Galanga,
Chico
Rei
(Belo
Horizonte/MG); Oratório – A Saga de Dom Quixote e Sancho Pança (Cia. Burlantins – Belo Horizonte); Clara Negra (Cia Burlantins – Belo Horizonte); Munheca (Cia Burlantins – Belo Horizonte); Abolição, um novo olhar (Grupo de Teatro Filhos de Zambi, Comunidade dos Arturos – Contagem). E na área da dança os espetáculos: Masemba (Benjamin Abras – Belo Horizonte); Aula-espetáculo de dança-afro (Evandro Passos – Belo Horizonte); Faça algum barulho (Rui Moreira Cia. de Danças – Belo Horizonte); Afrikar (Código Movimento – Belo Horizonte); Mulheres de Baobá (Companhia Baobá de Dança – Belo Horizonte). Destacar a programação da primeira Mostra Benjamin de Oliveira enriquece a análise crítica e o reconhecimento de produções cênicas negras em cartaz na época, em Belo Horizonte e no Brasil. Em 2018, a mesma equipe de criação e realização da Benjamin criou o projeto intitulado Solo Negro, como o próprio nome indica, nesse
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Disponível em: http://burlantins.com.br/benjamin/a-mostra-2/. Acesso em 27 de out. de 2019. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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evento são pautados trabalhos em versão solo de cênicas negras.
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Polifônica Negra - 20136 Ainda em 2013, estreou em Belo Horizonte a mostra Polifônica Negra, idealizada por Aline Vila Real e Anderson Feliciano. O evento é um espaço artístico e cultural de compartilhamento de criações e investigações embasadas nas questões raciais negras, reflexões em torno de elaborações estéticas e poéticas, palco para apresentação e ensaio de produções dramatúrgicas. A mostra recebe artistas da capital mineira e de outras localidades do Brasil. O evento foi pensado como um quilombo, na acepção de congregação de pessoas, predominantemente negras, e tem como um dos pilares o engendramento de estéticas e epistemes negras, subvertendo representações, muitas vezes, negativas acerca das negritudes. A primeira edição da Polifônica foi realizada no espaço cultural CentoeQuatro, na região central de Belo Horizonte, articulada à programação do 7º Festival de Arte Negra, essa composição indica a possibilidade e efetivação de parceria entre eventos. A edição 2017, da referida mostra, teve atividades no espaço cultural Tambor Mineiro, Teatro Espanca, Espaço Lira, quintal da casa da família do curador Anderson Feliciano e na Praça Sete, percorrendo avenidas do centro da cidade, onde ocorreu a apresentação da performance Panfleto Itinerante, do Selo Homens de Cor reunindo artistas de três capitais (o ator Sidney Santiago - São Paulo/SP, a atriz Sol Miranda - Rio de Janeiro/RJ e o ator e autor deste texto, Denilson Tourinho – Belo Horizonte/MG). Faz parte da cultura negra cultuar, conceituar, ressignificar e perpassar o lugar das encruzilhadas, tal qual é a Praça Sete de Setembro, onde se cruzam as avenidas Amazonas
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Disponível em: http://polifonicanegra.com/2017/polifonica-negra/. Acesso em: 08 de ago. de 2019. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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e Afonso Pena com as ruas Rio de Janeiro e Carijós.
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Mostra Puxadinho - 20147 Em 2014, houve o lançamento da Mostra Puxadinho, sendo essa a primeira produção do Coletivo Mutirão, criado pelo Grupo Teatro Negro e Atitude e a Cóccix Companhia Teatral, com objetivo de estabelecer uma rede de artistas, grupos e parceiros, em movimentos de atuação cultural em regiões periféricas de Belo Horizonte, no caso dessa rede, na região de Venda Nova. A Puxadinho afirma-se na diversidade cultural com foco em territórios periféricos de aglomerados, ocupações, vilas, conjuntos habitacionais, escolas e espaços culturais. A 3ª edição da Mostra Puxadinho, ano 2019, teve o Centro de Vivência Agroecológica (CEVAE) da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte – unidade Serra Verde – como palco para atividades como o Café Cultural, apresentação musical com SOMDI2, oficinas abertas com o Programa Fica Vivo, espetáculo de dança Nada Mais É (Laia Cia Produções), espetáculo teatral À Sombra da Goiabeira (Grupo Teatro Negro e Atitude). E, nas ruas, avenida e Comunidade da Baixada o Cortejo Cultural, atividade artística que percorreu a região com apresentações de dança, teatro, bloco musical e produção de grafite.
Teatro na Quebrada - 20148 A mostra Teatro na Quebrada, também artística e periférica como a Puxadinho, estreou em 2014, sendo um projeto educacional artístico e social. A Teatro na Quebrada tem programação teatral como sustentáculo e atende, principalmente, ao Programa ProJovem Adolescente. O espetáculo E se todas se chamassem Carmem? (Belo Horizonte/MG), da Breve Cia, foi apresentado na Teatro na Quebrada no dia 25 de julho, reverenciando o “Dia
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Disponível em: https://www.facebook.com/MostraPuxainhoVendaNova2019/. Acesso em: 27 de out. de 2019. 8 Disponível em: http://picdeer.com/tarolandopj. Acesso em: 27 de out. de 2019. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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questões representativas, afetivas e de opressões geralmente vivenciadas por mulheres
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Internacional da Mulher Negra Latino Americana e Caribenha”. O espetáculo aborda
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negras brasileiras. No elenco dessa peça teatral consta a atriz Renata Paz, também arteeducadora do ProJovem Adolescente. A peça Xabisa (BH/MG) também já foi apresentada na referida mostra, mais de uma vez, nessa encenação atua Michelle Sá, arte-educadora do ProJovem Adolescente, criadora e curadora do Teatro na Quebrada. Teatro na Quebrada é uma mostra periférica e, assim como a Mostra Puxadinho, levanta parcerias para a realização e manutenção das atividades. Nesse sentido, a realização da mostra Teatro na Quebrada tem sido desenvolvida com apoio do Programa ProJovem Urbano Belo Horizonte e suas/seus educadoras/es.
Projeto EnegreSer - 20169 Em 2016, o Projeto EnegreSer foi criado na Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, por alunas e alunos do curso de Licenciatura em Dança, que inauguram um espaço de ações, diálogos e estudos pautados nas questões étnico/raciais negras em perspectivas artísticas de afirmação de epistemes e estéticas, a partir do campo universitário. O EnegreSer abre espaço para as artes e culturas negras, dentro e fora do espaço acadêmico, promove produções e estudos por meio de encontro entre artistas, coletivos artísticos e culturais, educadores, estudantes e agentes de movimentos sociais. A primeira edição foi intitulada Projeto EnegreSer: Corporeidade Negras em Cena, realizada com apoio institucional da UFMG, teve na programação: a intervenção Belas Artes Negras; o espetáculo Não Conte Comigo para Proliferar Mentiras, com Igor Leal e Will Soares (Belo Horizonte/MG); a cena curta Refém Solar, com Elisa Nunes (Belo Horizonte/MG); as rodas de conversa Corporeidades Negras em Cena, com Rainy Campos, Will Soares e Gil Amâncio (todos de Belo Horizonte/MG), e Corpo em Diáspora, com Luciane Ramos (São Paulo/SP), a qual ofereceu uma oficina de dança homônima. Luciane Ramos é bailarina, intérprete/criadora, antropóloga, pesquisadora,
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Disponível em: https://www.facebook.com/pg/EnegreSer/about/?ref=page_internal. Acesso em: 27 de out. de 2019. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Campinas (UNICAMP). Em 2012, a artista participou da 2ª edição da Rede Terreiro
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doutora em Artes da Cena e mestre em antropologia pela Universidade Estadual de
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Contemporâneo de Dança, ministrando a oficina Corpo Atento: África do Oeste, Diáspora Negra e os Dilemas Contemporâneos na Dança. E em 2018, Ramos fez parte da equipe de curadores do Festival Internacional de Teatro Palco e Rua de Belo Horizonte (FIT-BH), evento integrante do calendário cultural oficial do município.
SegundaPRETA - 2017 10 Laroyê, Exú! Segunda-feira é dia de Exú. Com referências como o dia e a saudação a Exú, nasce a SegundaPRETA, em janeiro de 2017. O evento surge empretecendo o cenário belo-horizontino com apresentações cênicas, bate-papos, exibições de filmes, homenagem, feira e festa. Na proposta da Segunda, artistas e agentes culturais pretas, pretes e pretos se reúnem dentro e fora do Teatro Espanca em movimentos de produção artística e combate às opressões sociais. Diante das situações de engajamento para realização do evento, a equipe de organização da PRETA descreve o projeto como ação de reunir para “bater laje”. A cada temporada a SegundaPRETA elege uma mulher negra, em vida, para prestar homenagem. Na primeira edição, realizada de janeiro a fevereiro de 2017, a atriz carioca Ruth de Souza foi homenageada por sua atuação artística e social. As homenageadas das temporadas subsequentes da PRETA: Zora Santos (maio a junho de 2017), Leda Maria Martins (setembro a outubro de 2017), Ana Maria Gonçalves (março a abril de 2018), Conceição Evaristo (maio a julho de 2018), Capitã Pedrina de Lourdes (outubro a novembro de 2018), Mazza Rodrigues (março a abril de 2019), Nilma Lino Gomes, na 8ª temporada (setembro a outubro de 2019) e na 9ª temporada, interrompida pelo isolamento social causado pela pandemia do novo coronavírus, a artista Rosana Paulino (março de 2020 e retornou, em formato online, de maio a julho de 2021). SegundaPRETINHA é a programação da SegundaPRETA atenta ao público infantojuvenil e escolar. As escolas da Rede Municipal de Educação de Belo Horizonte
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Disponível em: http://segundapreta.com/. Acesso em: 07 de set. de 2021.
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têm acessado a PRETINHA por meio de projetos e programas educacionais da prefeitura,
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representados pela Secretaria de Educação, Secretária Municipal de Cultura e Fundação Municipal de Cultura.
Fórum Permanente Aquilombô - 201711 Ainda em 2017, estreou o Aquilombô – Um Arquipélago, primeiro, como mostra de artes negras e, em edição posterior, como Fórum Permanente das Artes Negras. O encontro reúne produções artísticas e manifestações culturais de Belo Horizonte e do Brasil que dialogam com as questões étnico/raciais negras. Na programação constam apresentações de trabalhos musicais, artes cênicas, obras das artes visuais e literatura, além de realização de residência artística. O projeto tem estabelecido parcerias institucionais como a Prefeitura Municipal de Belo Horizonte e Governo do Estado de Minas Gerais. Em 2019, o Aquilombô levou para o palco e arredores do Teatro Francisco Nunes (Parque Municipal Américo Renné Giannetti) uma diversificada programação estética e temática das artes. Como o espetáculo Mata Rasteira, solo do artista Rodrigo Negão, a peça tem como fundamento a corporeidade e musicalidade da capoeira, além de contação de histórias. Esse Fórum tem se desdobrado em movimentos permanentes, exemplar pela criação da Série Editorial Aquilombô, publica obras literárias de autoria negra. Nesses movimentos culturais negros belo-horizontinos foram negritados, em 2017, a SegundaPRETA, o Aquilombô e, já no último mês do ano, o Prêmio Leda Maria Martins de Artes Cênicas Negras de Belo Horizonte.
Prêmio Leda Maria Martins de Artes Cênicas Negras - 201712 O Prêmio Leda Maria Martins de Artes Cênicas Negras de Belo Horizonte surgiu
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Disponível em: https://www.facebook.com/Aquilombô-Um-Arquipélago-2751510208225036/. Acesso em: 27 de out. de 2019. 12 Disponível em: http://premioledamariamartins.com/. Acesso em: 27 de out. de 2019. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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mineira. Premiação conceitual, reverencia a pesquisadora, artista e rainha de Nossa
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levantando reconhecimento e valorização das produções cênicas negras da capital
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Senhora das Mercês do Reinado de Nossa Senhora do Rosário do Jatobá Leda Maria Martins, e tem em estudos de Martins as referências para elaboração das categorias do projeto cultural de honrarias. O Prêmio Leda apresenta um tema para cada edição e desenvolve uma catalogação com montagens cênicas negras de Belo Horizonte e região metropolitana, de todos os tempos e estilos variados. Esses trabalhos cênicos são analisados por uma comissão júri especializada em artes e culturas negras, as/os juradas/os fazem apreciação das montagens cênicas de acordo com o tema e as 10 categorias: Encruzilhada – área, Direção; Muriquinho – área, Infantojuvenil; Oralitura – área, Texto | Trilha Sonora; Corpo Adereço – área, Dança; Performance do Tempo Espiralar – área, Performance; Lugar da Memória – área, Cena Curta; Afrografia – área, Atuação; Cena em Sombras – área, Cenário | Figurino | Luz; Palco em Negro – área, Espetáculo Longa Duração; Ancestralidade – área, Personalidade | Homenagem | revelação. Em 2017, o Prêmio Leda teve o tema Afeto Emancipatório de Nilma Lino Gomes; em 2018, Escrevivência: escrever, viver, se ver de Conceição Evaristo; em 2019, Exuzilhar de Cidinha da Silva; e em 2020, edição especial online, Quilombismo inspirado no livro O Quilombismo: documentos de uma militância pan-africanista, de Abdias Nascimento. O Prêmio Leda Maria Martins, idealizado e coordenado pelo artista e autor deste artigo Denilson Tourinho, figura originalidade ao se desvencilhar do padrão de premiação estruturada em categorias adjetivadas como “melhor”, e por provocar leituras e interpretações conceituais ampliadas acerca das obras premiadas.
Mostra Negras Autoras - 201813 2018 foi o ano de estreia da Mostra Negras Autoras, realizada pelo Negras Autoras, coletivo formado pelas artistas Elisa de Sena, Júlia Tizumba, Manu Ranilha, Nath Rodrigues, Vi Coelho e, originalmente, com Eneida Baraúna. Esse evento se
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Disponível em: http://polifonicanegra.com/2017/polifonica-negra/. Acesso em: 08 de ago. de 2019.
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culturais de mulheres negras de Belo Horizonte e região metropolitana.
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estrutura nas questões negras étnico/raciais e de gênero, acolhendo produções artísticas e
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A 1ª edição da referida mostra aconteceu no e com apoio do Teatro Espanca, em três terças-feiras de novembro, culminando no Dia Nacional da Consciência Negra, dia 20. Nesse dia foram apresentados os shows de Priscila Magela, Juliana Floriano e Carolina Andrade, a dança de Aryane Soares e Laura Alves, e também a performance Crisálidas, de Scheilla Sol. A Mostra Negras Autoras negritou o dia da consciência negra com produções e visibilidade das questões negras étnico/raciais e de gênero, negras mulheres em cena, na idealização, produção, programação e, majoritariamente, no público.
Fórum Taculas - 201914 Já em 2019, foi criado o Fórum Taculas – Performances de Mulheres Negras BH e Região Metropolitana, idealizado pela atriz, Danielle Anatólio, o evento aconteceu em dois dias, na periferia de Belo Horizonte, também com foco nas questões negras étnico/raciais e de gênero. Em cena, negras produções de artes cênicas, vídeo-performance e bate-papos pautados em políticas públicas culturais, periferia, feminicídio, afetos, feminilidade, transexualidade, violência de raça e gênero, transfobia e ancestralidade. Cenas de um negro belo horizonte que exaltam as negritudes e combatem opressões sociais. O Taculas estreou prestando homenagem à artista Madu Santos, mentora da Associação Cultural Odum Orixás, tradicional grupo de Dança Afro-brasileira, de Belo Horizonte. Os passos da Mostra Taculas remetem aos propósitos das celebrações e reivindicações do tricentenário da memorável resistência de Zumbi dos Palmares. Nesse sentido, Belo Horizonte tem sido palco de realizações que contemplam as artes e culturas
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Disponível em:https://www.facebook.com/pages/category/Art/Fórum-Taculas-Performances-MulheresNegras-MG-2124562310965998/. Acesso em: 27 de out. de 2019. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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negras, sendo ações que remetem às mais variadas configurações de ativismo social.
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Considerações finais - 1995 a 2019 Os movimentos sócio-político-culturais apresentados neste artigo figuram engendramentos culturais negros belo-horizontinos que seguem em perene realização, como meios de ação afirmativa, instrumentos de resistência às opressões sociais e em atualizações interseccionais. O Tricentenário de Zumbi dos Palmares pode ser lido como ponto inaugural de amplas produções culturais negras na capital mineira, assim como exemplar transladar de organização sociocultural “quilombo” como método de arte, tal qual uma vertente do Movimento Negro: “ator coletivo e político, constituído por um conjunto variado de grupos e entidades políticas (e também culturais) distribuídos nas cinco regiões do país” (GOMES, 2017, p.27). Este texto pode contribuir para restauração de feitos e memórias que fazem parte da historicidade de Belo Horizonte. A forma textual, estrategicamente, inspira-se em aquilombamento cultural, tange movimentos culturais negros belo-horizontinos reunidos num agrupamento que figura disparador para abordagens merecidamente mais aprofundadas, em cada supracitada produção.
Referências BURLANTINS. Mostra Benjamin de Oliveira. Burlantins. Disponível em: <http://burlantins.com.br/benjamin/amostra-2>. Acesso em: 27 de out. de 2019. CARDOSO, Marcos Antônio. O movimento negro em Belo Horizonte: 1978-1998. Belo Horizonte: Mazza Edições. 2002. CENTRO CULTURAL VIRTUAL. Aldeia Kilombo Século XXI. Centro Cultural Virtual. 2012. Disponível em: <http://centroculturalvirtual.com.br/conteudo/aldeia-kilombo-seculo-xxi>. Acesso em: 27 de out. de 2019.
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ENCONTRO ENEGRESER. Formas africanizadas de escritas de si. Encontro Enegrecer. 2016. Disponível em: <https://www.facebook.com/pg/EnegreSer/about/?ref=page_internal>. Acesso em: 27 de out. de 2019.
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______. REDE Terreiro Contemporâneo de Dança. Centro Cultural Virtual. 2009. Disponível em: <http://centroculturalvirtual.com.br/conteudo/1o-encontro-rede-terreiro-contemporaneo-de-danca-2009>. Acesso em: 27 de out. de 2019.
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Artigos Livres FÓRUM PERMANENTE DAS ARTES NEGRAS. Aquilombô, um arquipélago. Fórum Permanente das Artes Negras. 2017. Disponível em: <https://www.facebook.com/Aquilombô-Um-Arquipélago-2751510208225036>. Acesso em: 27 de out. de 2019. FÓRUM TACULAS. Fórum-Taculas-Performances-Mulheres-Negra. Fórum Taculas. 2019. Disponível em:<https://www.facebook.com/pages/category/Art/Fórum-Taculas-Performances-Mulheres-Negras-MG2124562310965998>. Acesso em: 27 de out. de 2019. GOMES, Nilma Lino. O movimento negro educador. v. 1. Petrópolis: Editora Vozes, 2017. MARTINS, L.M. Performance do tempo espiralar. In: RAVETTI, Graciela e ARBEX, Márcia. Performance, exílio, fronteiras: errâncias, territoriais e textuais. v. 1. Belo Horizonte: FALE/UFMG, 2002. p. 69-91. MOSTRA PUXADINHO. Mostra puxadinho – Venda Nova. Mostra Puxadinho. 2019. Disponível em: https://www.facebook.com/MostraPuxainhoVendaNova2019/. Acesso em: 27 de out. de 2019. NEGRAS AUTORAS. Mostra Negras Autoras. Negras Autoras. 2018. Disponível em: <https://www.facebook.com/events/1227786884028627>. Acesso em: 27 de out. de 2019. POLIFÔNICA NEGRA. Mostra Polifônica Negra. Polifônica Negra. Disponível em: <http://polifonicanegra.com/2017/polifonica-negra>. Acesso em: 08 de ago. de 2019. PRÊMIO LEDA MARIA MARTINS. Prêmio Leda Maria Martins. Prêmio Leda Maria Martins de Artes Cênicas Negras de Belo Horizonte. 2018. Disponível em: <http://premioledamariamartins.com>. Acesso em: 27 de out. de 2019. SEGUNDA PRETA. Segunda preta. SegundaPRETA. 2017. Disponível em: <http://segundapreta.com>. Acesso em: 27 de out. de 2019. TA ROLANDO PJ. Teatro na Quebrada. Tá Rolando. Disponível em: <http://picdeer.com/tarolandopj>. Acesso em: 27 de out. de 2019. TOURINHO, Denilson Alves. Artes Cênicas Negras e a Educação das Relações Étnico/Raciais em Belo Horizonte. 2020. 132f. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Educação. Belo Horizonte. 2020.
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____.; GAYE, Ibrahima; DIOGO, Rosália. Festival de Arte Negra, 20 anos: encontros. v. 1. Belo Horizonte: Fundação Municipal de Cultura, 2015.
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“FUTEBOL É PAIXÃO, COPA DO MUNDO É NEGÓCIO”: a reforma do Mineirão pelo olhar da imprensa Belo-Horizontina1 "Soccer is passion, the world cup is business": The reform of the Mineirão through the eyes of the Belo Horizonte press
Bryan Douglas Martins de Miranda2*
Resumo: Este estudo tem como objetivo investigar as mudanças estruturais executadas na cidade de Belo Horizonte e no estádio Governador Magalhães Pinto, “Mineirão”, no contexto da copa do mundo sediada no Brasil em 2014. Pretende-se analisar os sentidos históricos atribuídos pelos jornais para a reforma ou modernização do estádio. Para isso, este trabalho apresenta a investigação dos periódicos da capital mineira a partir da análise de diferentes veículos em busca de identificar a articulação entre a difusão do referido tema no imaginário sobre o futebol em Belo Horizonte e as questões políticas e sociais referentes ao contexto analisado. Como resultados, observamos o alinhamento do olhar dos jornais com o regime de historicidade presentista. Palavras-chave: Reforma. Mineirão. Presentismo. Abstract: This study aims to investigate the structural changes executed in the city of Belo Horizonte and in the Governador Magalhães Pinto stadium, "Mineirão", in the context of the World Cup hosted in Brazil in 2014. It is intended to analyze the historical meanings attributed by newspapers to the reform or modernization of the stadium. To this end, this paper presents an investigation of the newspapers of the capital city of Minas Gerais from the analysis of different vehicles in an attempt to identify the articulation between the diffusion of the referred theme in the imaginary about soccer in Belo Horizonte and the political and social issues concerning the analyzed context. As results, we observe the alignment of the newspapers' gaze with the presentist historicity regime. Keywords: Renovation. Mineirão. Presentism.
O Estádio Mineirão O estádio Governador Magalhães Pinto, mais conhecido como Mineirão, é, desde o momento de sua construção, um espaço do esporte e do lazer da cidade de Belo Horizonte. Na época de sua construção era reconhecido como o segundo maior estádio coberto do mundo,
O título faz referência à fala de Sérgio Barroso, secretário da Secretaria Extraordinária de Estado da Copa do Mundo em 2011. 2 * Graduado em História. Professor de História. E-mail: bryanmartins@outlook.com. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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com capacidade para 130 mil pessoas. Com o Brasil escolhido para sediar a copa do mundo de
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2014, o estádio passou pela sua maior reforma que transformou não só suas estruturas físicas, mas também simbólicas. Antes de poder completar 45 anos de sua inauguração, o Mineirão foi fechado no dia 6 de junho de 2010. Com um vasto público ao longo dos anos, algumas formas de convívio foram se construindo ao redor do estádio. Pereira (2004) analisa o Mineirão como um espaço público onde floresceram redes de sociabilidade. Segundo Pereira (2004), nas adjacências do estádio, a concentração de muitos torcedores ocorria em frente às barraquinhas credenciadas pela Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Ali os torcedores se divertiam, bebiam, conversavam, cantavam músicas referentes aos clubes, provocavam o adversário. Segundo a autora, os encontros eram breves, conversas rápidas e sem abordar temas mais polêmicos, como também havia grupos que se conheciam e se reconheciam como frequentadores daquela barraca, estabelecendo, assim, sociabilidades específicas daquele espaço. Podemos perceber essa sociabilidade na reportagem “Novo Mineirão mostra sua cara” do jornal Hoje em dia do dia 29 de abril de 2011. Todo mês junto R$ 50 para comprar ingressos para mim e minha esposa. Sei que vai ser caro, então comecei cedo. Quero vir num jogo da Copa”, garantiu atleticano, ele diz sentir saudade do tropeiro e do clima de amizade da barraca da Dona Naná, que ficava em frente ao portão 12. (MORENO, 2011).
O montador de ferragens Fábio Nascimento demonstrava sua saudade do Mineirão antes dos portões serem fechados e sua expectativa e esforço para voltar ao estádio durante a Copa do Mundo. Além disso, o Mineirão foi palco de grandes conquistas do futebol mineiro que ficaram marcadas na história esportiva da cidade. Tais momentos tornaram o estádio, de certa forma, num espaço “sagrado”, principalmente quando, no início das obras de modernização em 2010, a rede do estádio foi retirada e veio a se tornar artigo de museu. (CASTRO,2010). Belo Horizonte e o futebol têm uma história bem próxima. Ambos estão ligados à modernidade que alicerçou a construção da cidade. Se nos seus primeiros anos quem praticava e vivia um estilo de vida voltado para o esporte eram as elites da cidade moderna, com o passar dos anos, as multidões, ou as massas, tomaram o protagonismo e os estádios passaram a ser
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Para saber mais sobre os primeiros anos do esporte na cidade de Belo Horizonte, veja o estudo de COUTO (2003). REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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erguidos.3
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O Mineirão também é reconhecido como uma das causas do sucesso do futebol mineiro. Afinal, após a sua inauguração, o Cruzeiro venceu a Taça Brasil de 1966 e a Libertadores de 1976 enquanto o Atlético Mineiro venceu o Campeonato Brasileiro de 1971. Esses, e muitos outros títulos que vieram depois, transformaram o Mineirão, que antes era um monumento da modernidade, em um templo do futebol Mineiro. Para pensar este imaginário em torno do papel dos jornais para a difusão de uma imagem em volta da reforma do Estádio Governador Magalhães Pinto, este trabalho pretende analisar os jornais como construtores de discursos que serão aqui analisados de modo contextualizado. Para Marc Bloch, a história consiste não apenas em saber como os acontecimentos ocorreram, mas igualmente como foram percebidos (BLOCH, 2001). Dessa forma, não basta saber somente que houve a reforma do Mineirão. É necessário entender como tal acontecimento foi percebido pela opinião pública da capital mineira. Em outras palavras, o objetivo da investigação presente neste trabalho é compreender como a reforma foi vista, de certa forma, pelos periódicos da cidade de Belo Horizonte. Num país onde a imprensa é livre, todos os aspectos da opinião pública têm chance de se refletir nos jornais: uma análise bem feita, isto é, que faz uma seleção judiciosa, que utiliza uma imprensa tão variada quanto possível, constitui, portanto, uma abordagem qualitativa da opinião pública que não se deve desprezar. (BECKER, 2006, p. 196).
A citação de Becker nos dá alguns importantes apontamentos para articularmos nossos jornais à procura da compreensão acerca do debate público sobre a reforma do estádio. Devemos lembrar que os veículos de imprensa são empresas e têm um propósito mercadológico na difusão de seus produtos. Entretanto, segundo Becker (2003), se não pretendermos extrair uma abordagem quantitativa dos jornais e não nos contentarmos com um único jornal, tudo o que reunirmos ilustra a opinião pública. Dessa forma, neste artigo, serão analisados os jornais: O Estados de Minas, O Diário da Tarde, O Diário do Comércio, Hoje em Dia, Minas Gerais e O Tempo, entre 2007 e 2012, que estavam disponíveis no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, com o objetivo de entender os sentidos históricos atribuídos pela imprensa ao processo de reforma do estádio.
medida, o regime que compõe a conjuntura do período de construção do estádio. Em outras palavras, Hartog (2013) propõe que um regime de historicidade é apenas uma maneira de engrenar passado, presente e futuro de um determinado tempo, ou melhor, a proposta é que REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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de regime de historicidade de François Hartog. Dessa forma, tentaremos entender, em certa
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Por fim, para podermos pensar no contexto de reforma do estádio usaremos o conceito
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existe em cada contexto temporal e/ou local, um presente específico. Tal presente é o que trataremos como imaginário a ser entendido através dos periódicos. No dia 5 de setembro de 2010, o jornal Hoje em Dia, na reportagem intitulada "Copa abre mercado milionário para construtora”, nos dá pistas sobre os sentidos históricos da referida reforma e do papel do Mineirão no imaginário da população de Belo Horizonte. No lugar do Governo do Estado, gestor do estádio nos últimos 45 anos, deve entrar em campo o consórcio formado pelas empresas mineiras Egesa Engenharia e Hap Engenharia, lideradas pela paulista Construção, em um modelo de gestão compartilhada com clubes inéditos no país. [...] Hoje o Mineirão é um estádio deficitário, que só em 2009 custou ao Tesouro de Minas Gerais uma suplementação financeira de R$ 3,395 milhões, por meio da Administração de Estádio dos Estado de Minas Gerais (Ademg), uma autarquia estadual. Para se transformar em um negócio lucrativo, o Mineirão deixará para trás o conceito de sede de jogos de futebol para reabrir as portas como um espaço multiuso, com centro de serviços, lojas, melhor infraestrutura para eventos, centro de convenções e, possivelmente, até um hotel, caso o concessionário avalie que sua implantação é viável: Só na vizinha UFMG há uma demanda potencial de 55 mil pessoas por dia. [...] Durante as obras realizadas em 2011 e 2012, o Mineirão será transformado em um espaço multiuso com potencial de arrecadação mensal de R$ 2,8 milhões. (EPONINE, 2010)
A partir do que pode ser observado no jornal, para obter mais lucro, o estádio deveria criar condições para lucrar de várias formas, aproveitando da melhor forma possível seu espaço. De acordo com a reportagem, a criação de lojas e estruturas para outros tipos de eventos é uma saída para combater o déficit que o Estado não conseguiu. Ainda de acordo com a reportagem, o estádio também se tornaria “palco para mega shows''. Em outras palavras, o Mineirão, além de se tornar um centro comercial com potencial lucrativo, poderia se tornar o destino de megashows. “O novo Mineirão colocará a cidade nos circuitos mais importantes”. Para alcançar esse patamar de importância, algumas obras entram em destaque como o rebaixamento do gramado, que facilitaria a entrada de caminhões para descarregar equipamentos. Uma vez que a logística estivesse mais eficiente, mais condições de capitalizar no Mineirão seriam abertas. O Mineirão começava a deixar seus aspectos de Estádio para trás e os planos para transformá-lo em Arena já começavam a ser postos em prática. Primeiro, o Mineirão deveria se
com a necessidade de realizar eventos e estabelecer lojas para poder lucrar o máximo possível dentro do espaço disponível.
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extrapolando sua identidade principal ligada ao esporte. Agora se tratava de um espaço multiuso
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tornar um espaço comercial com capacidade de retorno financeiro para seus administradores
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A modernização do Mineirão dos anos 2000 O Mineirão, fechado em 2010 para se preparar para a Copa do Mundo de 2014, passaria, nos anos seguintes, por uma grande reforma física e simbólica. Dessa forma, vamos focar nos significados que estiveram ao redor do Estádio durante todo esse processo. Em reportagem do dia 28 de outubro de 2010 do jornal O Tempo, observamos uma articulação temporal com a reportagem apresentada na primeira seção. Novo Mineirão já tem “dono” O governo de Minas Gerais divulgou ontem que o consórcio formado pelas empresas Construcap S.A. Indústria e Comércio, Egesa Engenharia S.A. e Hap Engenharia Ltda foi o vencedor do processo de licitação para a terceira e última fase do projeto de modernização do Mineirão. [...]. A terceira etapa tem início previsto para dezembro, quando será executado o projeto arquitetônico. Ele prevê toda a adequação final do Mineirão aos padrões exigidos pela Fifa, garantindo mais segurança, visibilidade e conforto, além de melhores condições de trabalho para os profissionais que atuam no estádio em eventos esportivos e não esportivos. Será feita ainda a cobertura adicional das arquibancadas e a esplanada no entorno do Mineirão, onde funcionarão o estacionamento coberto e a área de serviço, com a abertura de lojas e restaurantes. [...] No modelo de gestão compartilhada proposto para o Mineirão, o Estado não investe recursos públicos diretamente na obra. Em contrapartida, ele cede ao parceiro privado o direito de explorar comercialmente o complexo durante 27 anos, [...]. O modelo de gestão compartilhada adotado pelo governo de Minas já é utilizado na Alemanha, Holanda, França e Cingapura. (ANDERSON, 2010). (grifo nosso)
De acordo com o jornal, os vencedores da licitação se tornaram os “donos” do Mineirão. Mesmo que o repórter tenha colocado a palavra “dono” entre aspas ela nos chama bastante atenção. As empresas Construcap S.A. Indústria e Comércio, Egesa Engenharia S.A. e Hap Engenharia Ltda seriam as responsáveis por mais uma etapa da modernização do Mineirão. Tal modernização é justificada para dar mais segurança, visibilidade e conforto ao estádio. O debate sobre segurança nos estádios não é uma novidade. Dois episódios na década de 80 acabaram em tragédias que acarretaram mudanças nos estádios de futebol. O primeiro foi na final da liga dos campeões de 1985 entre Liverpool e Juventus que acabou com 39 mortos e 600 feridos. O segundo foi a semifinal da copa da Inglaterra entre Liverpool e Nottingham Forest que acabou com 96 mortos. A partir disso, algumas mudanças foram sugeridas como
Entretanto, podemos observar nos jornais que ela também está ligada à capacidade de lucro que as empresas poderiam obter na administração do estádio. Percebe-se, na reportagem, REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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evitar a superlotação. (ROUBICEK, 2020)
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retirada de alambrados e a colocação de cadeiras em todos os lugares da arquibancada para
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que os “parceiros” privados teriam o direito de explorar comercialmente o complexo durante 27 anos. Dessa forma, nota-se que o processo de modernização que não é mencionado diretamente nos jornais está conectado à capacidade do estádio de gerar lucro para seus gestores e/ou investidores. Nesse novo complexo, a participação popular só se tornaria real através do consumo nos espaços planejados como as lojas, os restaurantes e até o estacionamento. Para Hartog (2013), o mundo após o fim da Guerra Fria entrou em um “presentismo”, onde nosso campo de experiência foi encurtado juntamente com nosso horizonte de expectativa. Em outras palavras, é como se nossa experiência com o passado tivesse se encurtado e nossa expectativa para o futuro não tivesse um longo alcance. Dessa forma, mais reagimos do que agimos de acordo com ganhos ou perdas imediatas. (KOSELLECK, 2006). Razão do valor tranquilizador de uma fórmula como "a retomada"(retomar significa, de fato, repartir de onde se estava), diretamente ligada à nossa incapacidade coletiva de escapar ao que agora é usual chamar, na França, de "court-termisme", ou seja, a busca do ganho imediato, e que eu prefiro denominar "presentismo". O presente único: o da tirania do instante e da estagnação de um presente perpétuo. (HARTOG, 2013, p. 11)
O autor ainda argumenta que o imediatismo do tempo dos mercados e do capitalismo financeiro são os grandes protagonistas do presente perpétuo voltado para o ganho imediato. Podemos perceber, nos periódicos abordados, certa aproximação com um imaginário presentista, que busca formas variadas de lucrar, e pouco se pensa nas questões culturais do espaço. Em reportagem do dia 22 de dezembro de 2010 do jornal Hoje em Dia, intitulada “Novo Mineirão começa em janeiro” nota-se um alinhamento no olhar para o Mineirão entre os periódicos abordados e com o conceito de presentismo proposto por Hartog. Além disso, o conceito de “novo Mineirão” começa a aparecer, sugerindo uma ruptura entre o velho e novo
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estádio.
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Novo Mineirão Começa em janeiro [...] o Mineirão será administrado pela iniciativa privada, com acompanhamento e fiscalização do Governo estadual, seguindo modelo já adotado em outros países. Para marcar este momento histórico do principal estádio de Minas Gerais, que terá como primeiro grande capítulo o recebimento dos jogos da Copa do Mundo de 2014, os envolvidos passaram a chamá-lo de Novo Mineirão. “(A terceira etapa) vai significar não só um novo estádio, completamente sob o ponto de vista físico, mas também uma gestão inovadora, que vai permitir aos mineiros e aos brasileiros que venham aqui muito mais conforto e uma forma mais adequada de termos um estádio bem administrado entre os clubes, as empresas e o Governo”, afirmou Anastasia.O investimento estimado do consórcio para as obras de modernização será de R$ 743,4 milhões. Parte dos recursos, num total de R$ 400 milhões, será disponibilizada pelo BNDES, por meio de linha de crédito especial concedida às 12 cidades-sedes da Copa. (SILVA, 2010) (grifo nosso).
Nota-se que a “iniciativa privada” ganha espaço nos jornais acompanhada da fiscalização do Estado. O modelo adotado em outros países é tratado como inovador pelo então governador do Estado Antônio Anastasia. Novamente, temas como segurança e conforto são levantados como pontos altos do processo de modernização do Mineirão. Além disso, fica evidente, mais uma vez, que o Estado não tem interesse em participar da gestão do “Novo” Mineirão, pois, o próprio Estado financia as obras de reforma do estádio com uma “gestão inovadora” e vê com otimismo a futura gestão que seria “bem administrado entre os clubes, as empresas e o governo”. Nesta terceira etapa, considerada a mais complexa, estão previstas três importantes obras, como a cobertura adicional das arquibancadas e a construção de uma esplanada de 70 mil metros quadrados no entorno do Mineirão, com área reservada para estacionamento coberto, restaurante e lojas de serviço. (SILVA, 2010) (grifo nosso)
Através desse trecho, podemos observar novamente o destaque para o estacionamento, o restaurante e as lojas de serviço. O que está em jogo é preparar o Mineirão para receber consumidores. Embora a justificativa da obra seja a realização da Copa do Mundo de Futebol, o Mineirão precisa se tornar um lugar rentável para além do esporte. Dessa forma, estacionamento, restaurante e lojas são de grande importância para a estabilidade financeira e para o potencial de lucro do espaço. Uma nova forma de torcer começa
para se entreter. Ele deixa de ser somente o torcedor apaixonado e se torna, também, um consumidor de múltiplos produtos naquele espaço. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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torcedor, nessa nova lógica, não estaria indo mais ao estádio para vibrar com a partida, mas sim
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a ser exigido pelo novo espaço físico, o que torna a mudança, em grande medida, simbólica. O
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Além do Mineirão, quando Belo Horizonte foi escolhida como uma das cidades sede da Copa do Mundo FIFA, alterações visando à melhoria em sua infraestrutura, segurança pública e de mobilidade urbana começaram a ser pensadas e executadas.
Governo federal vai criar Secretaria O ministro do Esporte, Orlando Silva Júnior, anunciou ontem a criação de uma secretaria para cuidar da segurança durante a Copa do Mundo de 2014. [...]. “Vai integrar as forças de segurança das 12 cidades que receberão a Copa. [...] Teremos um esforço especial para que o Mundial ocorra com segurança e conforto”. O ministro afirmou que a reunião de Dilma com prefeitos e governadores está marcada para 30 de maio. A intenção é acelerar as ações do transporte urbano. Segundo ele, 70% das obras devem começar ainda neste ano, e 54 projetos já foram selecionados para melhorar a mobilidade nas cidades. Sobre os aeroportos, Orlando Silva revelou que a recomendação de Dilma é conceder parte das reformas à iniciativa privada para acelerar as obras. (MINEIRÃO..., 2011) (grifo nosso)
O que estava em jogo na cidade nos anos que precederam a copa eram investimentos de curto prazo que foram justificados pelo Estado como possíveis legados do megaevento. Segundo Oliveira Júnior e Freitas (2014), a gestão municipal e estadual indicava um planejamento urbano que se subordinava às demandas do mercado neoliberal e criava condições para sua realização. No que diz respeito à mobilidade urbana, as obras tinham forte tendência de privilegiar o empreendimento do setor imobiliário, uma vez que articulou as obras entre a expansão do vetor norte e a requalificação da região centro sul que historicamente concentra investimentos do mercado imobiliário. De acordo com dados levantados por Oliveira Júnior e Freitas (2014), 53% dos valores totais foram destinados às obras no vetor norte da cidade. Grande parte da tendência identificada para o vetor norte está relacionada à combinação de dois processos: a viabilização de grandes projetos de estruturação urbana, que, em parte, recuperam a infraestrutura deficiente da região; e a demanda reprimida do setor imobiliário em busca de novas frentes de atuação diante da saturação das frentes mais tradicionais do município de Belo Horizonte [...] Em 2005, teve início um expressivo conjunto de intervenções que incluiu o início da duplicação da Antônio Carlos; a construção da Linha Verde ao longo do corredor da Cristiano Machado, até o Aeroporto de Confins – ambas relacionadas ao vetor norte; além do primeiro trecho do Boulevard Arrudas (que melhora a articulação deste corredor à área central) e parte da Requalificação do Anel Rodoviário. (OLIVEIRA JÚNIOR; FREITAS, 2014, p. 82).
vetor norte, financiada pelo Estado, agradava os olhares do mercado imobiliário. Em reportagem do dia 10 de dezembro de 2012, o jornal O Estado de Minas trouxe um breve trecho
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que a região tivesse uma valorização considerável. Além disso, a expansão da cidade para o
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A entrada de pessoas através do Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) fez com
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demonstrando o contentamento de empresários com as ações do governo no vetor norte da cidade. De acordo com Luiz Alberto, o anúncio do governo em agosto de um aporte de R$ 572 milhões para obras de infraestrutura no local reforçou a confiança dos empresários no desenvolvimento do Vetor Norte. “Esse é considerado o segundo maior investimento do Executivo na região, que integra o pacote de mobilidade para a Copa de 2014: duplicação da rodovia que dá acesso ao Aeroporto Internacional Tancredo Neves, em Confins, além da revitalização de 29 quilômetros de vias e construção de viadutos e trincheiras ao longo da Avenida Cristiano Machado”, acrescenta. O impulso para esse crescimento foi dado com o pleno funcionamento do aeroporto em Confins, a partir de 2005. “Depois, foi consolidado com o início das atividades na Cidade Administrativa, sede oficial do governo de Minas”, completa. (VETOR..., 2012).
Dessa forma, o governo está mais envolvido com a ideia de presentismo de Hartog, uma vez que suas ações são voltadas para a maior possibilidade de ganho no mercado especulativo. As demandas advindas de problemas estruturais da cidade acabam sendo deixadas de lado em prol do mercado imobiliário e, dessa maneira, um planejamento de longo prazo para a melhoria da mobilidade urbana de Belo Horizonte como um todo foi rapidamente descartado. Sendo assim, o prometido legado para a Copa do Mundo não seria algo aproveitado por todos os cidadãos de Belo Horizonte, mas sim por um pequeno grupo de empresários. Na área da segurança pública, o Estado brasileiro mobilizou recursos para a integração das forças de segurança para a Copa do Mundo. Para os jogos em Belo Horizonte, a proposta foi criar um órgão específico, o “Centros Integrados de Comando e Controle” (CICC) que, no caso da cidade, teria profissionais das polícias Militar, Civil e Federal, além de agentes da Defesa Civil, do Corpo de Bombeiros e da própria Prefeitura. Investimentos de R$ 60 milhões foram destinados à construção do prédio e equipamentos como telões, com imagens das câmeras da cidade, 200 computadores de bordo acoplados às viaturas e um sistema composto por um robô e um conjunto de roupas especiais para o desarmamento de explosivos (SEDS, 2012). Para Sousa, Marinho e Shynnier (2014), a realização pacífica e bem-sucedida de um megaevento como a Copa do Mundo, serve para os grandes capitalistas envolvidos na promoção
o evento ocorresse de forma ordeira e que o público dos jogos e os turistas da cidade pudessem ter seus direitos humanos respeitados. Segundo a segurança era importante naquele momento
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A preocupação com a segurança era importante por vários motivos. Primeiro, para que
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desses empreendimentos, como uma espécie de indicador sobre o contexto social dos países.
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em Belo Horizonte pois imagens da cidade seriam transmitidas para todo o mundo, o que poderia resultar em investimentos futuros. Dessa forma, podemos dizer que os esforços na infraestrutura da mobilidade urbana e na segurança da cidade têm um forte compromisso com a especulação financeira e com a potencialidade da cidade em atrair futuros investimentos. Mesmo que seja importante para a sustentabilidade da cidade, pouco foi feito para a população em geral. Além disso, ao falar dos aeroportos, a então presidente da república Dilma Rousseff sugeriu conceder parte das obras em aeroportos para a iniciativa privada para acelerar as obras. Dessa forma, as transformações no Mineirão e na cidade seguiram uma lógica de mercantilização dos espaços públicos. Segundo Souza (2006, apud TONUCCI FILHO; SCOTTI; MOTTA, 2014, p. 27), o que acontece na cidade é o enfraquecimento do planejamento de longo prazo ditado por investimentos públicos e a sua substituição por perspectivas mercadófilas. Dessa forma, seriam criados planejamentos estratégicos sobre áreas fragmentadas do espaço urbano, ações necessárias para a cidade ou o país se inserir competitivamente no mundo globalizado. Entretanto, esse modelo de administração urbana não é algo que a Copa do Mundo trouxe e sim algo que ela amplificou. Essa modernização que ocorreu em Belo Horizonte não foi algo isolado, mas fez parte de um processo em escala nacional. O governo federal de Lula e, posteriormente, de Dilma, já haviam elaborado um projeto de equilíbrio fiscal e feito menções a reformas estruturais que favoreciam uma política neoliberal, como as reformas tributária, agrária, previdenciária e trabalhista (SILVA, 2002). Para Rudá Ricci (2006), trata-se de um discurso pragmático que procura declarar compromissos com a estabilidade da ordem econômica e política, aumentando a competitividade internacional do país. O imediatismo do lucro, a necessidade das reformas para agradar e estimular os movimentos do mercado financeiro foram aos poucos se tornando a cara da política brasileira.4 Dessa forma, o Brasil estava no cenário econômico internacional e Belo Horizonte, potencializada pela Copa do Mundo, entrava cada vez mais nessa conjuntura. Norteada por um
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Para saber mais sobre os anos do Governo Lula ler: ANDERSON (2011). REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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sustentáveis em um curto período, mesmo que várias pessoas fiquem de fora. As transformações
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projeto político que não pensa no desenvolvimento a longo prazo, mas sim nos lucros
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dos estádios em arenas e as reformas estruturais das cidades seguiram uma lógica de mercantilização das cidades que estão dentro do regime de historicidade presentista. Tal percepção pode ser encontrada na reportagem intitulada “Pontapé inicial para sediar copa de 2014” do dia 1 de agosto de 2007 no jornal O Tempo. A matéria noticiava que a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) formalizava o Brasil como sede para a Copa do Mundo de 2014. Em um evento em Zurique, o Brasil apresentava um vídeo divulgando o país que foi comentado pelo jornal.
Vídeo maquia graves problemas do país Foram 12 minutos de promoção do Brasil como destino de investimentos e discursos de potência. Enquanto as imagens mostravam cidades e cenários do país, dados eram projetados na tela, como o crescimento do PIB, o fato de ser a décima maior economia do mundo e o fato de ter o décimo maior complexo industrial do planeta. Segundo o vídeo da CBF, o Brasil ainda representa a 35% do PIB da América Latina, registrou o maior programa de privatização do mundo, com US$ 130 bilhões de investimentos, e um fluxo de capital que aumentou em 3.000% em dez anos. Com imagens de um país industrializado e urbano, a campanha apresentou o Brasil como “um país de oportunidades sem fim”. (PONTAPÉ..., 2007) (grifo nosso)
Mesmo com o filtro do jornal, é possível observar alguns pontos relevantes do vídeo reproduzido. Nele, o Brasil se mostrava para o mundo como um país de oportunidades pela sua capacidade de se integrar ao cenário neoliberal. O destaque para o programa de privatização, o aumento do capital e o tamanho do PIB brasileiro em relação à América Latina são sintomas de uma conjuntura presentista. Além disso, um dossiê com 900 páginas, projetos para as cidades que queriam ser sede, e uma declaração governamental assinada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com 11 garantias, foram encaminhadas na proposta brasileira para sediar o megaevento. Entre elas, havia garantias de isenção de impostos para importação e exportação de mercadorias e bens relacionados à Copa, isenção de impostos para estrangeiros, entre outros. 5 Em um seminário intitulado “Soberania e política externa: o embate entre "nacionalistas" e ‘entreguistas’” realizado pelos professores Loque Arcanjo, Juarez Guimarães e Dawisson Lopes, foi debatido sobre a soberania (ou a falta dela) das nações latino-americanas.
se alinhando com potências neoliberais. Juarez Guimarães complementa dizendo que o Brasil 5
Ibidem. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Para Lopes, o Brasil falhou em implementar um projeto de soberania nacional, sempre
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(CICLO DE DEBATES, 2018).
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sempre foi um país cosmopolita, que nunca se colocou para o mundo com sua cultura, sua economia e sua política. No futebol, podemos perceber como esse alinhamento se dá de forma mais clara. As ligas no Brasil e na América Latina como um todo mudaram seus formatos de acordo com formatos europeus como os sistemas de ligas e, mais recente, a final da Taça Libertadores da América substituindo os jogos de “ida e volta” por apenas um jogo em um estádio sorteado. Juarez ainda argumenta que, ao tentar se adaptar aos “ares do mundo”, o país entra na terceira fase do neoliberalismo em que a própria ideia de democracia vem sendo desorganizada por programas neoliberais. O país estaria vivendo desde os anos 90 o ápice do cosmopolitismo, em outras palavras, o Brasil não se colocava para o mundo com suas identidades, sua cultura e sua forma de pensar, pelo contrário, sempre acabava se alinhando às demandas internacionais. Quando o governo assinou as 11 exigências da FIFA, ficou claro um alinhamento político com o que Juarez Guimarães chama de cosmopolitismo. O Brasil abre mão de sua soberania para receber não só a Copa do Mundo, mas para receber a mercadoria dos parceiros da FIFA. Além disso, o Estado isenta a organização de impostos e possíveis danos. Por fim, a Copa do Mundo serviu, também, para o Estado brasileiro aprofundar um projeto de mercantilização das cidades e “arenização” dos estádios. Ainda em 2008, o jornal O Diário do Comércio debatia como o projeto do Mineirão era pensado para receber marcas e melhorar as viabilidades econômicas. Estado vai licitar obras do Mineirão [...]. As obras incluirão painéis eletrônicos de última geração, proteções em todo o entorno do estádio nas áreas que atualmente separam os bares e a criação de segurança. O objetivo do contrato é a consultoria técnica especializada para elaboração de estudos preliminares de modernização do complexo. As cinco etapas estão divididas em custos iguais de R$ 486,560 mil, segundo informações da SEEJ. A primeira delas consiste em um diagnóstico e análise do mercado para a implementação das adequações. A segunda etapa compreenderá a pesquisa e associação de marcas ao complexo, sendo que a terceira contemplará estudos de viabilidade econômica e elaboração do plano de negócios. A quarta fase consistirá no projeto conceitual e quinta etapa na conclusão e recomendação de alternativas de implementação. (FERNANDES, 2008). (grifo nosso)
Nota-se que a grande preocupação era tornar o Mineirão em um polo lucrativo. Através
do sustentável, a necessidade era torná-lo lucrativo para quem fosse administrar o consórcio do estádio.
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de viabilidade econômica tinham o objetivo de tornar o Mineirão em um negócio muito além
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das análises de mercado, possíveis marcas que poderiam ser associadas ao estádio e outros tipos
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Tais aspectos também faziam parte das exigências da FIFA, as quais foram prontamente adotadas desde os primeiros projetos do estádio. Por exemplo, os painéis eletrônicos de última geração, que possibilitariam outros tipos de entretenimento dentro da arena como câmera do beijo e momentos em que os torcedores deveriam vibrar ao aparecerem na tela. Nota-se, portanto, no imaginário construído pelos jornais, que a modernização do Mineirão para a Copa do Mundo significa transformá-lo em um polo lucrativo. Entretanto, não se trata só do Mineirão, mas sim de um projeto nacional que aparece nas diversas arenas reformadas e construídas no país. Percebe-se uma articulação com esse imaginário no jornal Hoje em dia de 04 de novembro de 2012 em reportagem intitulada “Caldeirão para dar Lucro”. O Mineirão seria transformado num complexo de negócios que iria “muito além do futebol”. Dessa forma, de deficitário, passaria a gerar lucros. Caldeirão para dar lucro O Mineirão será transformado num complexo de negócios que irá muito além do futebol [...] Já o novo Mineirão, com reabertura prevista para janeiro do próximo ano, terá a carteira de negócios diversificada e multiplicadas várias vezes. E, de deficitário, deverá passar a gerar lucro. O princípio é simples: o fim do subsídio do governo do estado e a profissionalização do futebol mineiro. [...] Agora, a expectativa é que o consórcio Minas Arena, que irá gerir o estádio até 2037, tenha um faturamento de R$ 76 milhões já no próximo ano, com uma receita líquida de R$ 66 milhões anuais. Para atingir essa expectativa de receita, a Minas arena vai oferecer produtos diferentes do que existiam no antigo Mineirão, tais como áreas comerciais, área vip, camarotes, restaurantes, espaço para eventos não esportivos (shows, feiras, convenções, seminários etc), naming rights, apoios e patrocínios. (MORENO, 2012). (grifo nosso)
Esse trecho já projeta um Mineirão completamente diferente do que era antes de todo o processo de reforma, sugerindo que ele irá muito além do futebol. Percebe-se um grande alinhamento com o imaginário presentista que temos apontado ao longo do artigo. Todos os aspectos do “novo” Mineirão são vistos como positivos, incluindo até a possibilidade de profissionalização do futebol mineiro. Baseada em uma projeção feita em 2009, a transformação do Mineirão em um complexo de negócios poderia oferecer múltiplos produtos que transformaria o estádio em um
apoios e patrocínios”. É importante lembrar que existia uma preocupação em manter o Mineirão sustentável após a realização da Copa do Mundo de 2014. A saída encontrada foi entregar um bem público REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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espaço para eventos não esportivos (shows, feiras, convenções, seminários etc.), naming rights,
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“caldeirão para dar lucro” através “de áreas comerciais, área vip, camarotes, restaurantes,
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nas mãos da iniciativa privada. Dessa forma, as mudanças foram planejadas para que se pudesse arrecadar a maior quantidade de lucro dentro dos limites do território do estádio. Tais mudanças acabariam, também, modificando os significados simbólicos do estádio, uma vez que seu objetivo principal, antes, eram jogos de futebol, no novo Mineirão esse esporte seria só mais um dos atrativos do espaço. Produtos - O consórcio pretende fazer o lançamento dos produtos no final de novembro, mas alguns deles já foram revelados. O plano da Minas arena é implementar as unidades comerciais em 2 etapas. Na primeira, serão ofertadas 25 lojas, entre 52 metros e 198 metros, com possibilidade de uma loja âncora de até 1.680 metros. Na segunda etapa estão previstas outras 27 lojas de 60 metros cada. Entretanto, as datas não estão fechadas e segunda etapa pode ficar para após o Mundial de 2014. Uma área de aproximadamente 10765 m² abrigará 98 camarotes totalizando 2100 lugares, além do restaurante panorâmico, lounges e sanitários. Os camarotes contaram com ar-condicionado, TV de plasma, mobiliário e cadeiras exclusivas, alimentação e bebidas não alcoólicas, os camarotes 18 e 20 pessoas terão até 5 vagas de estacionamento. (MORENO, 2012). (grifo nosso)
A partir disso, podemos observar que o que está em jogo no “novo” Mineirão, ou no Mineirão moderno e confortável é a potencialidade de consumo dentro do espaço. Aos poucos, a tentativa era transformar o Mineirão em uma espécie de “não-lugar”. Shopping centers, caixas eletrônicos, elevadores, vagões de metrô, saguões de aeroportos, interiores de avião, máquinas de café expresso são alguns desses não lugares, semelhantes em todo o mundo, com as mesmas cores, a mesma ambiência e até o mesmo aroma, independentemente dos países. (SILVA; MORAIS, 2017, p. 121)
A partir da reforma, o Mineirão representaria um padrão que se aplica em contextos socioculturais diferentes. Ao mesmo tempo, estão presentes nos mais diversos lugares, tornando-se parte e palco da vida de milhões de pessoas ao redor do planeta, como os outros estádios preparados para a Copa de 2014 ou os que serviram de inspiração em outros países. Contudo, existem vários valores ligados ao Mineirão como “Gigante da Pampulha” que se articulam nesse contexto e, de várias formas, esses princípios emergem no cotidiano do
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À primeira vista, a imponência impressiona. [...] a imensa estrutura da esplanada de 80 mil metros quadrados chega a encobrir os 88 pórticos de concreto armado [...]. Parece até que o Mineirão sumiu. De certa forma faz sentido: do velho estádio inaugurado em 5 de setembro de 1965, palco de momentos memoráveis do futebol mineiro, pouco restou. [...] Do conforto do acesso por meio de catracas eletrônicas e elevadores à chegada aos 62.170 assentos numerados, passando por um restaurante que proporcionará visão completa do gramado, foi essa a impressão do Estado de Minas ao conhecer ontem em detalhes o remodelado Gigante da Pampulha. Praticamente pronto, com mais de 96% das obras executados, o novo Mineirão, que será inaugurado no clássico Atlético x Cruzeiro em 3 de fevereiro, está em fase de finalização de detalhes de acabamento com a expectativa de ser muito mais que um estádio de futebol: soluções e recursos preparados pelo consórcio Minas Arena – que o administrará nos próximos 25 anos por meio de
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estádio.
Artigos Livres parceria público-privada (PPP) com o governo de Minas Gerais – apontam que num curto espaço de tempo ele poderá se tornar também um saudável espaço de convivência para a família. O vasto sistema de ar condicionado em praticamente todos os setores, lojas, bares e estacionamento (distribuído em níveis subterrâneos semelhantes aos de shoppings) e uma inédita central de segurança dão uma ideia do que está por vir. (FREITAS, 2012). (grifo nosso)
Esse trecho, dias antes da reabertura, já projeta um Mineirão completamente diferente do que era antes de todo o processo, sugerindo que ele sumiu ou pouco restou do “velho estádio”, a não ser por sua imponente grandeza. Percebe-se que há uma naturalização de um “novo” Mineirão que abrirá suas portas no dia 21 de dezembro de 2012 e a expectativa é que seja muito mais do que um estádio de futebol. Nesse novo Mineirão, nota-se novamente um alinhamento a um imaginário ligado à possibilidade de lucro quando o jornal valoriza os setores comerciais como lojas, bares, estacionamento, ar condicionado e medidas inéditas de segurança. O conforto dos assentos, catracas eletrônicas e restaurante com vista para o gramado, poderiam criar as condições perfeitas para que o indivíduo pudesse consumir em paz naquele espaço. Além disso, esse texto demonstra um tom conservador ao afirmar que o Mineirão se tornaria um lugar saudável para a convivência da família. Nota-se também, em reportagem do jornal O Tempo intitulada “Muito mais que um estádio” do dia 27 de maio de 2012, certo saudosismo com o Mineirão de outros tempos. Segundo a reportagem, o Mineirão voltará a ser, após a reabertura, um lugar de família, paz e lazer como nos “bons tempos do Gigante da Pampulha”. Muito mais que um estádio Atrativos farão com que as pessoas possam chegar mais cedo ao estádio, evitando confusões ao que tudo indica, está sendo dado um grande passo para que o Mineirão volte a ser dedicado às famílias, à paz e ao lazer da população, assim como acontecia nos bons tempos do Gigante da Pampulha. Nada de chegar em cima da hora e no desespero para acompanhar partidas de futebol, shows ou qualquer tipo de evento. O conceito de arena multifuncional aplicado na construção do novo Mineirão promete trazer uma nova realidade para os torcedores. Com muito mais conforto, segurança e opções de entretenimento, as pessoas poderão chegar bem mais cedo, com mais tranquilidade e tendo várias opções para usufruir dos benefícios que estarão à disposição no estádio. (RIBEIRO, 2012). (grifo nosso)
Para que tais valores fossem recuperados e as famílias pudessem ter paz no Mineirão,
variedades de benefícios seriam essenciais, em outras palavras, é graças a esse projeto que o
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estádio voltaria “nos bons tempos do Gigante da Pampulha”.
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o jornal sugere o modelo de arena “multifuncional” que proporciona conforto e segurança. As
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Para acabar com a aglomeração que acontece nos momentos que antecedem os jogos e deixar o Mineirão mais atrativo, serão criados restaurantes, lanchonetes e lojas. Porém, a grande aposta para transformar o palco de jogos em um espaço de convivência para a população está na esplanada que vai envolver a arena. No local, que será liberado durante todos os dias da semana, as pessoas poderão caminhar, correr, passear com familiares, amigos e cachorros, andar de bicicleta, patins e skate, enfim haverá uma interação da sociedade. “[...]. As pessoas poderão chegar mais cedo, já que terão opções. Depois do jogo, as pessoas poderão jantar nos restaurantes e ficar nos bares por mais tempo. O fluxo de 60 mil pessoas entrando e saindo ao mesmo tempo é muito ruim para o estádio e para a cidade”, explicou Silvio Todeschi. (RIBEIRO, 2012) (grifo nosso).
O arquiteto Silvio Todeschi, em entrevista ao jornal, demonstra como todo o espaço do Mineirão é pensado para que o torcedor fique mais tempo no estádio. Em dias de jogos, poderia chegar mais cedo para aproveitar os diversos benefícios. Tal mentalidade sugere que a arquitetura do novo estádio foi planejada como a de um shopping, pois é pensada com o mesmo princípio: criar condições para que as pessoas fiquem confortáveis e permaneçam no espaço por mais tempo. Os shopping Centers assumem uma característica ambígua. Não se constituem a partir da cultura local e, ao mesmo tempo, tornam-se espaços de vivências, consumo e desejo dos indivíduos na região em que se encontram (SILVA; MORAIS, 2017, p. 122).
A reforma deixaria como legado a interação social familiar na esplanada. Além de um lugar com potencialidade para shows e eventos, o jornal ressalta que quando não houver jogos, a população poderia utilizar a área para atividades de lazer, como patins, bicicletas, skate, corridas e caminhadas. A arena se firmaria ainda mais como uma das atrações da Pampulha. A população poderia, segundo os jornais, se beneficiar do conforto e da segurança e, dessa forma, consumir com mais tranquilidade. Nesse periódico, o Mineirão, ou melhor, o novo Mineirão, já é definitivamente tratado como arena cheia de possibilidades. A esplanada viria para substituir a difícil acessibilidade ao estádio, pois antes o entorno era formado por um imenso parque de estacionamento no qual as pessoas precisavam “desafiar os carros e, depois, enfrentar os degraus para que chegassem às
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Agora, com a nova esplanada, não haverá a obstrução dos veículos nem das escadarias e declives em volta do Mineirão, o que vai dar um campo maior de visão e ação para que os policiais realizem a segurança. (RIBEIRO, 2012)
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bilheterias e às catracas”.
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Agora, o estacionamento estaria abaixo da esplanada, que consiste em uma área de 80 mil m². O público estaria livre para se deslocar em volta do estádio. Mas, além disso, o projeto da “nova Arena Mineirão” facilitaria o trabalho da polícia, pois com o terreno nivelado seria mais fácil conter os avanços das “tropas alvinegras e celestes”. Percebe-se, no jornal Hoje em Dia, certa articulação temporal dentro desta lógica. Segundo a reportagem do dia 22 de dezembro de 2012 intitulada “Um novo Gigante da Pampulha”, foi construído um centro comercial com aproximadamente cinco mil metros quadrados para tornar as horas do torcedor na arena mais agradáveis. O novo Mineirão vai inaugurar uma maneira inédita de o torcedor acompanhar as partidas do seu time do coração. São 98 camarotes, com 2.024 assentos e serviços exclusivos, como elevador, vaga no estacionamento, banheiros VIPs, varanda, ar condicionado e serviço de buffet. [...]. As arquibancadas superiores comportam 39.084 pessoas, e a inferior 20.842, todas com lugares numerados. [...] Para tornar as horas no local mais agradáveis, foi construído um centro comercial com aproximadamente cinco mil metros quadrados. Serão 19 lojas nesta primeira fase, com possibilidade de ampliação em mais 28 num segundo momento. (UMO NOVO..., 2012) (grifo nosso)
O jornal não deixa claro como o novo Mineirão mudaria a forma de torcer do torcedor. Porém, como demonstrado até aqui, tal maneira de torcer se dá através da individualidade. Os lugares numerados sugerem a exclusividade do indivíduo. Além disso, a ideia de que o centro comercial tornaria as horas do torcedor mais agradáveis reforça ainda mais a hipótese do “nãolugar”. Os jornais sugerem um novo perfil de torcedor que frequenta o estádio. Um torcedor que tira o dia para andar tranquilamente pela esplanada do Mineirão, enquanto espera a partida de futebol começar. Enquanto caminha, terá o conforto e a segurança garantidos pela arquitetura do local. Os carros não atrapalhariam mais, pois estariam em um piso abaixo. Por fim, teria sossego para poder se tornar um consumidor naquele espaço, comprando produtos das lojas oficiais. A matéria do Hoje em Dia se parece muito com a do O Tempo citada anteriormente. Aqui, se ressalta também a esplanada como um local de convívio social, algo teoricamente possível só no novo Mineirão. Além disso, para a cidade, o espaço é de grande importância,
ele traria grandes avanços em conforto, segurança, acessibilidade e visibilidade. Entretanto, se olharmos em retrospecto, o Mineirão desde seu nascimento já era um estádio moderno. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Nota-se que o imaginário em torno do projeto de modernização do Mineirão sugere que
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pois teria a capacidade de atrair shows ou outros eventos (UM NOVO..., 2011).
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O que está em jogo na modernização do Mineirão planejada e executada entre 2008 e 2012 não era simplesmente a realização da Copa do Mundo de 2014. Percebe-se, pela articulação temporal dos jornais, que a modernização do Mineirão que traria conforto, segurança, acessibilidade e visibilidade significa transformá-lo em um polo lucrativo para o pós-Copa além da sustentabilidade e isso não é uma política particular do Mineirão ou de Belo Horizonte. Trata-se de um projeto de governo que adota a mesma fórmula nas diversas arenas construídas e reformadas ou modernizadas no país. Porém, o Mineirão já é carregado de valores. As reportagens recuperam e articulam na temporalidade valores, representações e sentidos. Os jornais lembram do estádio e de seus grandes públicos, de seus grandes jogos, dos grandes jogadores que recebeu e das grandes emoções vividas em todos os setores possíveis. Dessa forma, as antigas formas de torcer no Mineirão deveriam encontrar uma nova possibilidade na sua reabertura ligada ao consumo. Por fim, é relevante trazer a fala do presidente da BWA em 2012 quando tentou entrar na licitação para administrar comercialmente o Mineirão. A empresa havia acabado de se unir com outra internacional e se tornado uma das maiores administradoras de arenas do mundo. Segundo o presidente, “quanto mais arenas melhor”. Nessa linha de raciocínio, a frase “futebol é paixão, Copa do Mundo é negócio” de Sérgio Barroso têm campo fértil para emergir. (MORENO, 2012). Segundo o secretário extraordinário da Copa, a obra estaria ocorrendo sem nenhum viés político, mas sim para o povo, “para o torcedor mineiro, e principalmente para Belo Horizonte, Minas Gerais, que briga pela abertura do mundial” (RIBEIRO, 2011). Entretanto, baseado no que foi exposto, a Copa tem sim um lado e não está livre de viés político. A obra está alinhada com um imaginário presentista, consumista e de mercado.
Considerações Finais Em 2007, escolhida como cidade-sede da Copa do Mundo FIFA, novamente um discurso de modernização recaiu sobre a cidade de Belo Horizonte. Quando o país foi escolhido
Para Hartog (2013), um regime de historicidade é apenas uma maneira de engrenar passado, presente e futuro de um determinado tempo, ou melhor, a proposta é que existe em cada contexto temporal e/ou local, um presente específico. Dessa forma, o desenvolvimento do REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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jornais, como o velho Mineirão, que precisaria passar por um processo de modernização.
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como sede do megaevento, o estádio moderno passou a ser reconhecido, aos poucos, pelos
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presente artigo possibilitou uma análise de como a reforma do Mineirão e, em certa medida, da cidade de Belo Horizonte, foram percebidas dentro de seu tempo pelos jornais da capital mineira. A partir da análise dos jornais, podemos perceber uma articulação no imaginário que se aproxima ao regime presentista proposto por Hartog. Ao longo dos anos da reforma de preparação para a Copa do Mundo FIFA 2014, os jornais detalharam diariamente aspectos de como o novo estádio seria após a abertura. As descrições, em grande medida, apontavam para um velho estádio que havia fechado as portas para dar lugar a uma arena moderna com grandes características de um não-lugar. A arena reforçaria a ideia de um espetáculo que precisa ser apreciado individualmente, se tornando um espaço de consumo, rompendo com as tradições de torcida coletiva. Dessa forma, percebe-se que o Mineirão, no imaginário dos jornais, está, em grande medida, ligado ao regime de historicidade presentista, pois sua nova configuração preza pelo ganho imediato em cima de um bem público. Tal perspectiva não é necessariamente boa ou ruim, pois é preciso ser sustentável para continuar funcionando, a questão aqui é perceber quais são os significados das ações no contexto estudado. Entretanto, o Mineirão é uma arquitetura com mais de 50 anos de idade. Várias formas de apropriação ocorreram ao longo do tempo. Apropriações que se chocaram com o Novo Mineirão, aberto em 2013. Nesse sentido, uma pesquisa oral com torcedores, que frequentavam o estádio antes da reforma e não vão mais, ou torcedores que iam e continuam indo, ou torcedores que só conhecem o novo Mineirão, poderia render um rico estudo sobre como o estádio é percebido.
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ENTRE A INTEGRAÇÃO E A FRAGMENTAÇÃO: um olhar para a relação entre Sabará e Belo Horizonte Between integration and fragmentation: a view at the relationship between Sabará and Belo Horizonte
Ana Lídia de Paula Santos1*
Resumo: O objetivo deste artigo é analisar o processo de integração de Sabará à Região Metropolitana e sua relação com o espaço da metrópole Belo Horizonte, perpassando por discussões no que diz respeito à compreensão das novas conformações da vida em Sabará, que ultrapassam os seus limites oficiais. Para melhor compreender o recorte escolhido, a pesquisa buscará investigar a transformação de Sabará frente ao processo de crescimento das regiões metropolitanas, realidade recorrente em todo Brasil. Devido à quantidade de estudos no âmbito da fragmentação e novas configurações do espaço urbano, e como esse fenômeno também se aplica ao recorte espacial escolhido, buscar-se-á realizar uma revisão de literatura sobre a temática da metropolização e suas repercussões. Os conceitos de integração e fragmentação conduzirão a discussão a fim de compreender como se aplicam à relação Sabará-Belo Horizonte. Palavras-chave: Metropolização. Região Metropolitana. Sabará.
Abstract: The objective of this article is to analyze the process of integration of Sabará to the Metropolitan Region and its relationship with the space of the metropolis Belo Horizonte, passing through discussions regarding the understanding of the new conformations of life in Sabará, which go beyond its official limits. To better understand the chosen subject, the research will seek to investigate the transformation of Sabará regading the growth process of metropolitan regions, a recurrent reality in Brazil. Due to the amount of studies in the scope of fragmentation and new configurations of urban space, and as this phenomenon is also applied to the chosen space, we will seek to carry out a literature review on the theme of metropolization and its repercussions. The concepts of integration and fragmentation will lead the discussion in order to understand how they apply to the Sabará-Belo Horizonte relationship. Keywords: Metropolization. Metropolitan Region. Sabara.
Introdução Este artigo tem como objetivo promover discussões acerca da integração e da
dicotômico centro-periferia. Dessa forma, cria-se a necessidade de uma ampliação 1*
Bolsista CNPq, Mestranda em Ciências Sociais pela PUC Minas e Licenciada em História pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. E-mail: alidiaps@gmail.com REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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as relações socioespaciais se tornaram mais complexas, extrapolando o modelo
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fragmentação, resultantes do processo de urbanização. Com o crescimento das metrópoles
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conceitual no campo dos estudos urbanos. É preciso reconhecer que grande parte das cidades latino-americanas, devido ao processo parecido de industrialização, possuem fortes semelhanças e pontos de congruência, contudo, uma análise de caso se faz de extrema necessidade para compreender os diferentes reflexos que a urbanização é capaz de produzir. O presente artigo é uma parte da pesquisa de mestrado que vem sendo desenvolvida no Programa de Pós graduação em Ciências Sociais da PUC Minas, pertencente à linha de pesquisa Cultura, identidades e modos de vida. Essa pesquisa busca compreender as relações entre história e lugar na cidade de Sabará, bem como a reorganização desta cidade e entender até que ponto a influência da metrópole em seus arredores se faz crucial para o desenvolvimento da cidade. Além disso, a existência de estudos sobre os impactos da metropolização sobre cidades como Brumadinho, Nova Lima, que pertencem à Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), foi também motivação para investigar como esse processo ocorreu no município de Sabará, visto que os dois primeiros citados passaram recentemente a abrigar novos condomínios de médio e alto padrão, enquanto Sabará é marcada historicamente pelo processo de periferização. É necessário frisar que o artigo tem maior foco na discussão dos conceitos do que apresentar resultados conclusivos, visto que o campo é bastante vasto e os debates conceituais são os principais objetivos dessa investigação, elencando os estudos para tratar de suas metodologias e construção conceitual. O recorte escolhido tem o objetivo de compreender de que forma o processo de fragmentação e integração se manifesta no espaço de Sabará e Belo Horizonte. Para isso, foi adotada a metodologia de revisão bibliográfica acerca dos conceitos abordados em território brasileiro, com enfoque nas metrópoles cujas características se aproximam a Belo Horizonte. Então, para elencar as obras que serão discutidas nesse artigo, utilizouse a Biblioteca Digital do Observatório das Metrópoles, onde se encontram pesquisas de relevância sobre a temática central deste estudo, buscando pelas palavras-chave
Integrada de Desenvolvimento e Arranjos Urbanos (RMs, RIDEs e Aus) à dinâmica da metropolização” (RIBEIRO, 2014) serão um importante ponto de partida para entender
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obra “Níveis de integração dos municípios brasileiros em Regiões Metropolitanas, Região
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“integração” e “fragmentação”. Para discutir sobre a integração, os debates propostos na
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como o conceito se aplica na realidade das metrópoles brasileiras e quais as novas conformações do espaço urbano. Para discutir sobre fragmentação, utilizar-se-á as definições elencadas por Chetry (2014), que traz para o centro do debate a multiplicidade desse conceito e suas aplicações para a classificação do território como um espaço social, e seus desafios para a construção de uma política capaz de atender as demandas das cidades. É importante destacar que os fenômenos da integração e da fragmentação nesse estudo não serão considerados interdependentes, mas elementos coexistentes no que diz respeito à relação entre metrópole e região metropolitana. Há possibilidade de se enxergar novos arranjos criados ao longo dos anos e com o vertiginoso crescimento urbano, que devido a suas múltiplas facetas, acaba por dificultar uma conceituação precisa. Além dos conceitos debatidos a partir das referências bibliográficas, serão utilizados os estudos produzidos pelo Observatório das Metrópoles sobre a cooperação das Regiões Metropolitanas.
Destacam-se
duas
publicações,
“Como
andam
as
Regiões
Metropolitanas: Como anda Belo Horizonte” (2008) e “Belo Horizonte: Transformações na ordem urbana (2015)”, que abarcam estudos sobre as cidades que integram a Região Metropolitana e discutem os últimos dados censitários (2000 e 2010). Antes de adentrar o recorte temático, é preciso explicitar o conceito de fragmentação que guiará esse debate, elaborado por Salgueiro (1998), embora esse fenômeno se expresse em múltiplos campos, aqui será abarcado exclusivamente no âmbito espacial: Entendemos por fragmentação uma organização territorial marcada pela existência de enclaves territoriais distintos e sem continuidade com a estrutura socioespacial que os cerca. A fragmentação traduz o aumento intenso da diferenciação e a existência de rupturas entre os vários grupos sociais, organizações e território. (SALGUEIRO, 1998, p.38).
O processo de fragmentação extrapola o padrão de segregação centro-periferia, no centro há a concentração das atividades econômicas alocando as classes média e alta, enquanto a periferia é marcada pelo empobrecimento e precariedades de recursos. O
transformação. Milton Santos (1993) enxerga a origem da fragmentação sob a ótica da globalização e intensificação da divisão do trabalho, onde a totalidade dá origem a um
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da totalidade, mas como uma organização extremamente complexa e em constante
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surgimento de uma nova cidade, marcada por fronteiras simbólicas, não é vista no aspecto
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“outro”, que por sua vez não deixa de estar integrado ao todo e, somada a essa percepção, a discussão feita por Chetry (2014) evidencia que esse processo no âmbito espacial é como uma “fratura” incapaz de ser resolvida. O processo de integração é também um dos reflexos da metropolização em estágios bastante avançados, aproximação das cidades, formando uma rede conectada interdependente, construindo polos que exercem maior importância econômica, política e social. Para analisar e mensurar esse processo são considerados fatores como mobilidade, ocupação territorial, população, grau de urbanização. Assim, os espaços são classificados de acordo com uma hierarquia, quanto mais expressivos os fatores citados, maior influência é exercida. O Registro de Influência das Cidades (Regic)2 realiza um trabalho de levantamento das informações com o propósito de analisar a rede urbana brasileira e identificar quais cidades desempenham centralidade e a construção da hierarquização dos espaços. Este artigo está dividido em três partes, primeiramente será discutida a formação das metrópoles e suas relações socioespaciais, pontos fundamentais que irão conduzir ao conceito de fragmentação e integração e como estão relacionados ao processo de intensificação urbana e metropolização. Num segundo momento, será abordado o caso de Sabará e Belo Horizonte, e como os processos de fragmentação e integração se fazem presentes a partir do crescimento da capital mineira, além de buscar entender a formação de novas conexões entre as cidades, que extrapolam os limites físicos. Por fim, uma conclusão para elencar os pontos de interseção dessas teorias debatidas com o caso da cidade de Sabará e Belo Horizonte.
A modificação das metrópoles brasileiras e suas integrações Tratar sobre o assunto urbanização no contexto das cidades brasileiras requer um cuidado, visto que em um mesmo espaço podem ser encontradas múltiplas facetas. É importante realçar também o processo de formação das cidades não como uma maneira
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Aqui utilizo o da publicação mais recente, datada de 2018. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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de explicação pragmática da atualidade sem ignorar as consequências da organização
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colonial3, mas para compreender a construção da dinâmica urbana atual, como Gorelik diz, as cidades latino-americanas são “realidades construídas” (2005, p.112). O processo de crescimento das cidades brasileiras e a intensificação da urbanização nesse território após a década de 1950 se deu a partir dos interesses dos países ditos como desenvolvidos, que enxergavam potencial de firmar uma zona produtiva em algumas cidades, devido à oferta de matéria-prima e mão de obra abundantes4. Contudo, a questão da permanência do fator desigualdade é um dos alvos do debate, visto que o processo de urbanização nos países de capitalismo periférico não ocorreu de forma homogênea, assim essa questão se tornou um problema evidente à medida que a população abandona os campos em direção às cidades. O crescimento rápido, intenso e muitas vezes desordenado, contribui fortemente para a obtenção do modelo de urbanização que temos. No caso do Brasil, é perceptível através dos dados estatísticos a acentuação dos espaços periféricos em grandes cidades como Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte, e como essas localidades trazem à tona a desigualdade socioeconômica. A explosão rápida dessas cidades acaba por gerar um inchaço das metrópoles, que concentram serviços e maiores oportunidades, tendo como resultado um grande déficit, seja de moradia, de acesso a serviços, de empregos, desencadeando os subempregos (principalmente no setor do comércio informal), aglomerações e a marginalização desses sujeitos. De acordo com Castells (2001) esse desequilíbrio urbano tem como uma das consequências a falta de serviço para todos, fato que mais uma vez contribui para a piora da desigualdade. Além disso, a intensificação da modernização das cidades traz à tona a discussão em torno do agravamento das disparidades sociais, como Gorelik levanta: “Como acelerar a urbanização sem exacerbar os problemas que estão associados ao crescimento urbano?” (2005, p. 119). O autor ressalta a questão da necessidade dos estudos sociológicos para que a expansão econômica não se fundasse sobre grande sofrimento humano, mas que fossem construídos planos para lidar com essa questão. Um dos desdobramentos dessa problemática nas cidades brasileiras é a tendência
Castells ressalta a importância de considerar o processo de colonização ibérica pelo qual os países latinos passaram longos séculos, sendo inegável que boa parte dos problemas atuais são resquícios desse contexto. Além disso, o modelo de cidade e suas funcionalidades já eram existentes nas circunstâncias coloniais, além da permanência das centralidades. 4 Para Lefebvre (2001), questões como oferta de mão de obra, matéria-prima, proximidade a recursos hídricos e fontes energéticas, tiveram papel decisivo para a expansão industrial. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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de crescimento do espaço metropolitano. Há uma transformação nos arranjos das cidades,
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aumentando o grau de conexão entre elas, questão que será retomada posteriormente nessa discussão. O grau de dependência entre metrópole e cidades menores é algo recorrente e, no caso do Brasil, essa dinâmica ganhou tamanha complexidade a ponto de cunhar novos conceitos acerca da disposição do espaço urbano.5 Passando para a análise do caso brasileiro, o processo de urbanização ocorre com maior expressão durante os anos de 1940 e 1980, sobre o qual o geógrafo Milton Santos (1993), ao tratar do processo de urbanização brasileiro, mostra que a população urbana triplicou durante esses quarenta anos e, junto a isso (que pode ser visto também como um reflexo), o PIB brasileiro se encontrava em ascensão. No entanto, a melhora econômica do país não impactou as camadas menos privilegiadas da sociedade, que permanecem invisibilizadas e à margem das políticas sociais que buscam equidade social, sendo a desigualdade um grave problema das metrópoles (Maricato, 2000). Após 1980, o declínio econômico evidenciou a exclusão social que persiste na organização urbana brasileira, problemas sociais como a expansão das condições precárias de habitação, desemprego, aumento da violência, passaram a crescer vertiginosamente após o adensamento das grandes cidades. Sobre a questão habitacional, Maricato (2000) ressalta que o Sistema Financeiro de Habitação, criado durante a ditadura militar, não combateu as atividades de especulação, mantendo as classes médias no centro e direcionando a população de baixa renda a ocupar locais afastados e sem infraestrutura planejada com a construção dos Conjuntos Habitacionais populares e a expansão das ocupações irregulares. O crescimento intenso e acelerado das metrópoles desencadeou também o aumento das cidades que se avizinham, formando as regiões metropolitanas6, assim, as relações de proximidade transformam não só espaço físico, mas a dinâmica de troca entre essas localidades, abarcando um fluxo econômico, trânsito de pessoas e,
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Para explicar melhor a questão dos espaços metropolitanos e seus arranjos, retomarei mais adiante a ideia de arranjos urbanos discutida na pesquisa feita por Rosa Moura (2009). 6 Apresento o conceito de Região Metropolitana a que me refiro, publicado pelo Observatório das Metrópoles: “Corresponde a uma porção definida institucionalmente, como, no Brasil, as nove RMs institucionalizadas pela Lei 14 e 20/73 ou as atuais definidas pelas legislações dos estados brasileiros, com finalidade, composição e limites determinados. A absorção legal do termo “região metropolitana” e a materialização da faculdade constitucional de forma indiscriminada, esvaziou de conteúdo o conceito consagrado de região metropolitana na sua correspondência ao fato metropolitano. A Constituição de 1988 também incorpora a categoria “aglomerações urbanas” sem tornar preciso o conceito. Apenas sugere que corresponde a uma figura regional diferente da região metropolitana, podendo-se inferir, portanto, que não tenha o polo na posição hierárquica de metrópole.” (PONTES; PEDREIRA, 2008, p.30)
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consequentemente, desencadeando intercâmbios sociais. A pesquisa desenvolvida por Moura (2009) discute essa nova ordenação do espaço, abordando o conceito de arranjo urbano-regional: São arranjos concentradores de população, com relevância econômico-social e na infraestrutura científico-tecnológica, elevada densidade urbana e forte articulação regional, e extrema complexidade, devido à multiplicidade de fluxos multidirecionais de pessoas, mercadorias, finanças e de relações de poder, que se materializam em seu interior. (MOURA, 2009, p. 26)
Essa forma de organização é vista como um produto de uma transformação de ordem econômica, causada pela divisão do trabalho, assim os centros urbanos abrigam grande parte das atividades laborais e, consequentemente, atraem maior fluxo de pessoas. Dessa maneira, são constituídas áreas de integração entre as localidades, condições propícias à expansão territorial de tal maneira que impossibilita a distinção dos limites municipais. Conforme Moura (2009), o processo de desenvolvimento econômico brasileiro, no âmbito urbano, foi responsável por desencadear profundas mudanças na dinâmica metropolitana e a integração entre as cidades, reafirmando a questão centro e periferia, na qual os municípios mais distantes dos centros acabam por se tornar “cidadesdormitório”, constatando a dependência das que possuem menor recurso para a movimentação do capital, considerados municípios de baixa arrecadação. As cidades próximas aos polos metropolitanos passaram por um intenso processo de crescimento populacional, visto que os custos para adquirir um imóvel são mais baixos. Somado a isso, o fluxo intenso entre as diversas cidades e a metrópole favoreceram o movimento de expansão territorial, tornando recorrente a migração pendular, devido à boa parte da população economicamente ativa desenvolver suas atividades econômicas nos polos. Uma das consequências da formação de novo arranjo urbano-regional são os entraves encontrados pela governança municipal, principalmente em localidades mais limítrofes. Por conta da dificuldade em identificar os limites municipais, as administrações muitas vezes travam embates para solucionar problemas e pensar políticas
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públicas que alcancem as zonas de fronteira.
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O processo de metropolização como ponto de partida O que deve ser destacado na realidade das metrópoles brasileiras é que o aumento da urbanização não se concretizou como um plano, seguiu desordenado nas cidades, fator que impacta na transformação do espaço e está diretamente conectado à lógica da financeirização (RIBEIRO,2018), como uma das reações nos países de capitalismo periférico, capaz de ressoar no campo econômico e socioespacial. No estudo produzido pelo Observatório das Metrópoles acerca das integrações dos municípios brasileiros, destaca-se a seguinte consideração: A metropolização está ligada ao processo de urbanização, capaz de gerar dinâmicas territoriais de concentração e difusão dos artefatos econômicos, políticos, sociais e culturais em determinados aglomerados metropolitanos. (RIBEIRO, 2012, p. 2)
A expansão da urbanização das cidades que se tornaram metrópoles pode ser interpretada como um desdobramento da concentração de renda, local onde circula maior quantidade de capital, consequentemente engloba grande parte de recursos, visto que concentra serviços e bens, produzindo assim reflexos sociais e espaciais. Assim, a segregação passa a fazer parte da rotina dessas cidades, os espaços centrais se tornam mais valorizados por estarem próximos aos serviços ofertados pela metrópole. Nesse sentido, grande parte dos indivíduos responsáveis por manter a metrópole em pleno funcionamento residem em um espaço distante de onde está localizado seu trabalho. A partir dessa realidade, a hierarquização dos espaços se faz presente e impacta diretamente no âmbito social, onde fronteiras simbólicas se tornam nítidas. A hierarquia entre os espaços foi construída conforme fatores como a concentração populacional, a relevância socioeconômica, ofertas a uma grande diversidade de serviços, assim, conectando outras cidades, criando uma rede complexa, convergindo os fluxos para o centro, que é uma referência. A metrópole ocupa o papel de destaque, construindo um elo entre as cidades circundantes e, nessa rede formada, as que possuem menor expressão
baixas dessa hierarquia. Sob essa ótica a fragmentação se torna ainda mais evidente como
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um processo e desdobramento de uma cadeia complexa possível de ser vista em múltiplos
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econômica e populacional, desempenham menor influência, ocupando camadas mais
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campos da sociedade, espacial, governamental, identitário. Contudo, o presente artigo aborda apenas a fragmentação socioespacial. A partir das colocações feitas para o contexto espacial e temporal que este artigo trata, deve-se ressaltar que ser parte da região metropolitana implica ter considerável densidade populacional e estar próxima à metrópole espacialmente e em fluxo de pessoas, além de retroalimentar uma relação de dependência entre algumas das cidades pertencentes a essa estrutura, principalmente as que possuem alta integração com a capital. O estudo apresentado por Cano (2011) traz uma importante reflexão sobre os efeitos do crescimento das cidades e a dinâmica financeira associada à alocação da população de acordo com sua renda. Belo Horizonte é uma das cidades que foi marcada pelo crescimento acelerado e pela segregação espacial desenvolvida ao longo dos anos, dessa forma a urbanização promoveu, gradativamente, o afastamento da população de baixa renda dos centros urbanos, e a especulação imobiliária se tornou recorrente pela facilidade de acesso a serviços que esses espaços oferecem. Dessa maneira, as cidades próximas aos centros econômicos e de serviços tornam uma opção mais viável para os indivíduos que se encaixam como operário, operário-popular e popular, visto que oferecem um custo de manutenção menor do que residir nas proximidades do local de trabalho/estudo. Embora boa parte das relações de intercâmbio social entre as cidades vizinhas de Belo Horizonte já existissem, a região metropolitana só foi criada institucionalmente no ano de 1973 através da lei complementar número 14, que considerou as cidades de Betim, Caeté, Contagem, Ibirité, Lagoa Santa, Nova Lima, Pedro Leopoldo, Raposos, Ribeirão das Neves, Rio Acima, Sabará, Santa Luzia e Vespasiano, como parte integrante dessa conformação. Então, compreende-se que a metrópole de Belo Horizonte passa a ser uma cidade capital que ocupa um espaço de influência para além de sua limitação geográfica. Como o estudo de Geddes (apud FREITAS-FIRKOWSKI, 2020) sugere, a metropolização do espaço ocasiona a expansão em uma grande mancha urbana que tratamos como conurbação. Assim, ao analisar a ocupação do espaço, é difícil distinguir
proximidade entre Sabará e Belo Horizonte que se intensificou ao longo dos anos. A cidade de Sabará, fundada como Villa Real em 1710, foi uma das mais relevantes REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Em uma breve contextualização histórica é possível identificar a relação de
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onde começa ou termina uma cidade, fenômeno que caracteriza as metrópoles.
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comarcas exercendo centralidade político-administrativa durante o século XVIII e conserva até hoje traços do período colonial, com um centro histórico preservado. Barreto (1996) narra em sua obra sobre a história da capital mineira importantes ocorridos que revelam a aproximação entre Curral Del Rey e Sabará, em 1702 já havia uma estrada a conectar as atuais cidades (que à época eram respectivamente arraial e vila), usada inclusive para abastecer a cidade de Sabará, fluxo que posteriormente se tornou mais intenso durante meados do século XX com a construção das linhas férreas, importante ponto de escoamento de mercadorias e trânsito de pessoas. Teixeira e Souza (2003) afirmam que desde a inauguração, a moderna Belo Horizonte desempenha um papel metropolitano e as primeiras relações de proximidades foram firmadas a partir de uma rede rodo-ferroviária, assim, a região metropolitana foi inicialmente constituída por cidades como Sabará, Santa Luzia, Caeté. Por ser uma cidade planejada, Belo Horizonte foi regulada por legislações que prezavam pelo ordenamento espacial, e buscou afastar as periferias do centro, delimitar áreas agrícolas, industriais e definir o subúrbio. Assim, em 1908 o estado de Minas Gerais criou o primeiro loteamento próximo à divisa entre Sabará e Belo Horizonte, no bairro General Carneiro, que sempre apresentou características de periferização. A partir dos anos de 1970, o crescimento das cidades da região metropolitana se acelera e o fenômeno da conurbação se torna recorrente em quase todos os limites da capital, em intensidades diferentes. O crescimento dessas áreas está diretamente ligado a questões econômicas e grau de dependências. Pertencente à RMBH desde a criação da lei em 1973, Sabará é uma das cidades mais próximas a Belo Horizonte, localizada a 17 km, 48% de sua população praticam o movimento pendular, sendo em sua maioria em direção à capital mineira, uma das taxas mais elevadas se comparadas aos demais municípios integrantes. A partir desses dados citados, é clara a dependência entre as duas cidades, elevando a integração para além dos espaços físicos limítrofes, mas para a dinâmica das relações socioeconômicas. A figura abaixo, construída a partir dos dados censitários de 2010, ilustra a taxa líquida de migração e pendularidade, que corresponde ao número de pessoas que diariamente se
atinge os maiores níveis das taxas citadas, mais alto dentre a classificação das cidades pertencentes à RMBH, variando de -59,4 a -48,9:
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de origem no fim do dia. Percebe-se que Sabará, cuja área está circulada na figura abaixo,
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deslocam para outras cidades a fim de trabalhar e/ou estudar e retornam ao seu município
Artigos Livres Figura 1 – Taxa líquida de migração metropolitana e taxa de pendularidade por população ocupado por município da RMBH - 2010.
Fonte: DINIZ; ALVIM, 2019
Em uma amostra feita pelo Censo de 2010 de pessoas com mais de 10 anos, ocupadas na semana de referência, revela que no município de Sabará 33.594 pessoas se deslocam para outro município para trabalhar, enquanto 24.779 trabalham e residem na mesma cidade. Além disso, a pesquisa mostra a seção das atividades7, sendo as mais recorrentes entre os que praticam movimento pendular as seguintes: comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas, construção e serviços domésticos, já entre os que residem e trabalham em Sabará, as maiores seções de atividades são: comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas, indústria de transformação e serviços domésticos. Esses dados são essenciais para o conhecimento do perfil dos trabalhadores do município, de acordo com os estudos do Observatório das Metrópoles, Sabará se encaixa como um município operário e operário popular de acordo com suas
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Setor produtivo ocupado pelo trabalhador e qual a função desempenhada. Definição construída pelo Censo de 2010. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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como espaço marcado pela proletarização e popularização. De acordo com o IBGE, os
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características socioespaciais, além de ser considerado no período entre 1980 a 1991
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dados mais recentes (2015) constatam que 71,5% da receita municipal são de origem externa, ponto que pode ser associado à dependência econômica para com a metrópole devido à baixa geração de empregos, oportunidades de estudos e acesso a serviços mais especializados. No entanto, esses ocorridos não são exclusivos da relação Sabará-Belo Horizonte, sendo recorrentes em ambientes metropolitanos, considerados como reflexo da centralidade exercida pela metrópole, fato já tratado ao longo deste artigo. Figura 2 – Nível de integração metropolitana dos municípios da RMBH - 2010
Fonte: ANDRADE; DINIZ (2015)
A proximidade entre Sabará e Belo Horizonte é um ponto importante para compreender o processo de integração entre essas cidades, visto que a facilidade das vias
como um município de alta integração pelo censo de 2000 e mantendo essa aproximação também no censo de 2010, como a figura 2 ilustra. A intensificação desse processo e a aproximação das cidades em questão podem ser lidas como reflexo do processo de REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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atender os que efetuam o movimento pendular, contribuíram para que fosse considerado
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que ligam as cidades e, posteriormente, a ampliação da oferta de transporte público para
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dependência. Sabará não abriga nenhuma estrutura produtiva de grande expressão para a região e, ao compararmos as taxas de movimento pendular, o número de entrada é bastante inferior ao de saída, tendência recorrente nas cidades da região metropolitana e que não exercem influência.
Considerações finais O espaço da metrópole e seus arredores estão em constante transformação e ao longo dos anos as interrelações entre os municípios mais próximos à metrópole intensificaram a dinâmica de trânsito populacional, uma das resultantes é o processo de conurbação e inchaço das regiões metropolitanas como um todo. No contexto espacial em que este presente artigo se dispôs a analisar, é inegável que as cidades de Belo Horizonte e Sabará são territórios altamente integrados por conta do fluxo de pessoas, renda, serviços e outros fatores elencados ao longo de texto, que demonstram o grau de dependência da metrópole para a manutenção de renda de grande parte da população economicamente ativa de Sabará. É notório que a integração desses municípios coexiste com a fragmentação espacial, mas com menor nitidez se comparado aos casos de cidades pertencentes à RMBH, que passaram a abrigar nos últimos dez anos novas classes que optaram em viver em enclaves fortificados, como o caso de Nova Lima e parte de Brumadinho. De acordo com a Prefeitura de Sabará, os bairros localizados na divisão municipal são marcados pela desigualdade e a constante expansão territorial. Embora esses bairros tenham perfil parecido com os bairros da capital que ali fazem limite, recebem menores recursos aplicados em infraestrutura, saúde e educação, reflexos diretamente ligados à disponibilidade de investimentos dos municípios. Aqui apresenta-se um grande desafio para as governanças municipais. O que chama atenção no caso de Sabará é o fato de que em meio a essas transformações socioespaciais causadas pelo processo de metropolização, a cidade mantém simultaneamente um centro histórico setecentista
Portanto, compreende-se que devido à proximidade geográfica entre as cidades de Sabará e Belo Horizonte, a relação entre esses espaços antecede a consolidação da área
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economia local.
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preservado com grande potencial turístico, mas que, por hora, não é expressivo para a
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metropolitana, a integração é considerada como alta de acordo com seu arranjo populacional, assim o processo de conurbação ocorreu ao longo da intensificação dessas relações de confinidade e dependência. É interessante ressaltar que o município de Sabará não possui crescimento uniforme de seus limites territoriais e sofre seu processo de conurbação de forma mais intensa nas áreas de divisa com a capital mineira. As reflexões abordadas neste texto levam a compreender as particularidades dessa cidade e a transformação do perfil de Sabará e sua relação com a metrópole Belo Horizonte, demonstrando heterogeneidade dos impactos da metropolização.
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BH: cidade censurada BH: censored city
Reynaldo Luiz Calvo1*, em fevereiro de 1995 (in memoria)
Júlia Calvo2**, em março de 2020 RESUMO: Esse é um texto escrito em dois tempos e a quatro mãos. O texto em si, que originou este artigo é um manuscrito escrito pelo meu pai, falecido em 2018. A apresentação é minha, escrita em 2020. Em novembro de 1994, Belo Horizonte passou por uma política patrimonial muito agressiva: tombou ao mesmo tempo toda a região do hipercentro incluída como Conjunto Urbano Avenida Afonso Pena – Rua da Bahia e Adjacências. Casas, palacetes, edifícios residenciais e comerciais, praças e outros equipamentos foram deliberados para uma política de tombamento. No texto B.H. – Cidade Censurada, Reynaldo Calvo, arquiteto e cidadão, reflete sobre a cidade e suas transformações e sobre a relação da cidade com o passado, trazendo contribuições sobre as diretrizes de patrimônio e de cultura no mundo contemporâneo e em Belo Horizonte. Palavras-chave: Belo Horizonte. Área Central. Tombamento. Políticas de Patrimonialização. ABSTRACT: This was written twice and by four hands. The text itself, which was the origin for this article, is a manuscript written by my father, who died in 2018. The presentation is mine, written in 2020. In november 1994, Belo Horizonte underwent a very aggressive patrimonial policy: at the same time, the entire hyper-center region, including the Afonso Pena avenue – Rua da Bahia Urban Complex and its surroundings with their houses, mansions, residential and comercial buildings, squares and other equipment were deliberated for a heritage policy. In the text BH – Censored City, Reynaldo Luiz Calvo, architect and Citizen, reflects on the city, its transformations and relationship with the past, which effectively contributes to the guidelines of heritage and culture preservation in the contemporary world and in Belo Horizonte.
*Arquiteto premiado pelo IAB-MG em 1966 com projeto de Escola pública e no Concurso de projetos da CARPE/IAB-MG de 1981. Graduado em Arquitetura pela Universidade Federal de Minas Gerais em 1964. Foi presidente do IAB-MG, da UIBH e do IHIM. Falecido em 2018. 2 **Graduada em História e Doutora em Ciências Sociais pela PUC Minas e professora do Departamento de História da PUC Minas. E-mail: juliacalvo1@gmail.com REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Keywords: Belo Horizonte. Central Areas. Listing. Patrimonialization Policies.
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Apresentação Esse texto BH – Cidade Censurada, nunca foi publicado. Foi descoberto pela minha mãe, após o falecimento do meu pai no final de 2018, como um manuscrito ainda datilografado e com destaques, correções e alterações. Nele, o arquiteto e o cidadão, faz uma crítica aberta à política patrimonial que levou ao tombamento dos edifícios da área central, da cidade de Belo Horizonte, em 1994, com a criação da Diretoria de Patrimônio Cultural. Suas críticas se referem ao Conjunto Urbano Avenida Afonso Pena – Rua da Bahia e Adjacências, tombado compulsoriamente em novembro de 1994 que reúne, além de edifícios e casas, a Praça Rio Branco, o Terminal Rodoviário Governador Israel Pinheiro e a Antiga Secretaria de Estado da Agricultura e Pecuária, todos tombados conforme Deliberação 03/94 (por meio dos processos 01.059218.95.78, apenso ao processo 01.059220.9510 - Bens culturais com tombamento específico: Rodoviária Praça Rio Branco (fachadas e volume); Hotel Vitória – Rua 21 de Abril, 202 / 230 (fachadas e volume); Edifício Mauro Queiroz (Centro dos Chauffers) – Rua Acre, 107 (fachadas e volume); Hotel Madrid – Rua dos Guaranis, 12 (fachadas e volume); Secretaria de Estado de Agricultura e Pecuária – Praça Rio Branco, 56 (fachadas e volume); Camisaria Cadillac – Avenida Afonso Pena, 385, e Rua São Paulo, 380 (fachadas e volume); Edifício São Paulo – Rua São Paulo, 387 (fachadas e volume); Edifício Thibau – Rua São Paulo, 401 (fachada e volume); Edifício Sarandy – Rua dos Tupinambás, 498 (fachada e volume); Edifício Santa Tereza – Hotel São Miguel – Rua dos Tupinambás, 643 (fachada); Rua dos Tupinambás, 597 / 605 (fachada e volume); Edifício Ibaté – Rua São Paulo, 498 (fachadas e volume); Avenida Afonso Pena, 505 / 525 (fachadas e volume); Agência do Banco do Progresso – Avenida Afonso Pena, 529 (altimetria); Avenida Afonso Pena, 541 / 549 (fachada e volume); Avenida Afonso Pena, 551 / 565 (fachada e volume); Edifício Mariana – Avenida Afonso Pena, 526 (fachadas);
Estado de Minas Gerais – Avenida Amazonas, 478 (fachadas e volume); Avenida Amazonas, 287 (fachada e volume); Cine Brasil - Avenida Amazonas, 333 (integral) (tombamento de uso: atividades artítico-culturais); Edifício Cruzeiro – Avenida Afonso REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Lutétia – Rua São Paulo, 679 (fachadas e volume); Agência do BEMGE – Banco do
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Hotel Estoril (Antigo Hotel Cecília) – Rua dos Carijós, 454 (fachadas e volume); Edifício
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Pena, 774 (fachada e volume); Agência do UNIBANCO – Avenida Afonso Pena, 737 (fachada e volume); Avenida Afonso Pena, 749 (volume); Lojas Hamiltom – Avenida Afonso Pena, 771 (volume); Edifício Acaiaca – Avenida Afonso Pena, 867 (fachadas); Rua Espírito Santo, 757 (fachadas e volume); Igreja Metodista do Brasil – Rua Tupis, 51 (fachada e volume); Edifício Parc Royal – Rua da Bahia, 902 (fachadas e volume); Hotel Metrópole – Rua da Bahia, 1025 (fachadas e volume); Rua Goiás, 60 (fachada e volume); Museu de Mineralogia Djalma Guimarães – Rua da Bahia, 1149 (fachadas e volume); Rua da Bahia, 1155 (fachadas e volume); Clube de Belo Horizonte (Sociedade Recreativa de Minas Caixa) - Rua da Bahia, 1201 (fachadas e volume); Pizzaria Giovani – Avenida Afonso Pena, 1124 (fachada e volume); Avenida Afonso Pena, 1156 (fachada e volume); Museu do Telefone – Avenida Afonso Pena, 1180 (fachada e volume); Correios e Telégrafos – Avenida Afonso Pena, 1270 (fachadas e volume); Edifício sede do Automóvel Clube – Avenida Afonso Pena, 1394 (fachadas e volume); Tribunal de Justiça Rodrigues Alves – Avenida Afonso Pena, 1420 (fachadas e volume); Secretaria do Tribunal de Justiça (antigo Fórum) – Rua Goiás, 229 (fachada e volume); Conservatório Mineiro de Música – Avenida Afonso Pena, 1534 (fachada e volume); Palácio das Artes – Avenida Afonso Pena, 1537 (fachadas e volume); Teatro Francisco Nunes (fachadas e volume); Abrigo de Bondes Santa Tereza (integral) 3 Reynaldo Luiz Calvo é arquiteto, formado pela Faculdade de Arquitetura da UFMG. Suas digitais e concepções estão espalhadas por Belo Horizonte de muitas formas e em diferentes tempos. Além de projetos residenciais e obras estruturais e prédios públicos como a Câmara Municipal de Belo Horizonte, a adequação do terminal de passageiros do Aeroporto da Pampulha, o Hospital Belvedere. Tem histórico de representação como suplente, secretário e presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil, seccional de Minas Gerais (IAB-MG), Presidente do Instituto Israelita Mineiro (IHIM) e membro de sua diretoria por muitos anos, Presidente da União Israelita de Belo Horizonte (UIBH) e membro de sua diretoria por muitos anos. Também foi premiado pelo IAB-MG
3
Disponível em:https://prefeitura.pbh.gov.br/sites/default/files/estrutura-de-governo/politicaurbana/2018/planejamento-urbano/cca_diretrizes_de_protecao_ao_patrimonio_cultural.pdf. Acesso em: 2021. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Projetos da CARPE/IAB-MG (Projeto Escola de Vila).
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em 1966 com projeto de Escola pública e em 1981, com seu escritório, no Concurso de
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O texto de Reynaldo Luiz Calvo está apresentado na sua integralidade. As poucas interferências que se fizeram aqui, importante relatar foram, após a transcrição, a separação de parágrafos e correção dos erros de datilografia. Foram mantidos os grifos, os destaques e todas as observações que marcam sua vertente literária e que aparecem entre parênteses ao longo do texto. Cabe, entretanto, algumas observações. O texto se assenta na discussão entre memória, lugar de memória, na perspectiva de pensadores que foram tratados pelo autor. Reynaldo cita, sem preocupação da normatização acadêmica, desde Abílio Barreto, para a descrição da cidade e sua história, até autores da História da Cidade, da Arquitetura e das Ciências Sociais como Lewis Munford, Henri Lefebvre, Sylvio de Vasconcellos e Edgar de Albreguernue Graeff. Reynaldo transita entre a História da Cidade e das políticas urbanas. Enaltece-se aqui seu conhecimento amplo e sua experiência com as quais pauta sua reflexão e argumento. O texto B.H. – Cidade Censurada vai tratar com competência as diretrizes e regulamentações urbanas, constituindo-se quase também, embora essa não era a pretensão, numa História das intervenções urbanas na cidade. Assim, Reynaldo vai conduzindo suas análises sobre o espaço em transformação e seus sentidos, dialogando com os empreendimentos e as políticas urbanas e patrimoniais e filosofando sobre os sentidos da memória e as finalidades da preservação patrimonial. Empreende com lucidez uma reflexão sobre temas da cultura, da memória, da História, da Cidade de Belo Horizonte, da Gestão Cultural e da patrimonialização. Torna-se interessante perceber a atualidade do tema e a forma como foi tratado no manuscrito em que incorpora à discussão patrimonial atual, ampliada a Patrimônio Cultural desde 1988 (antes era Patrimônio Histórico e Artístico), e as mudanças na concepção do Patrimônio advindas com a Carta de Atenas (1933), que traduzia as preocupações com o crescimento urbano no século XX e o Movimento Moderno (na arquitetura e no urbanismo) que caracterizou-se pela força que recebeu nos regimes
preservação, principalmente a defesa das organizações nacionais e internacionais voltadas à preservação. Essa defesa insistente foi importante para pressionar cada nação a assegurar sua legislação de proteção. Reynaldo já discutia, em 1995, as diretrizes atuais REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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A Carta de Atenas merece destaque por formular pautas importantes para a
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totalitários para preservação dos monumentos.
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das políticas culturais de preservação, considerando não o valor histórico e artístico do bem, mas os sentidos de identidade e memória que o bem recebe da sociedade e comunidade em que se insere. Preservar é antes de tudo uma discussão de cidadania e do próprio direito à memória. É preciso ouvir as comunidades sobre suas interpretações e sentidos aproximando identidade, memória e lugar. Com relação aos usos, Reynaldo, mesmo sem conhecer, incorporou a célebre análise de Pierre Nora com relação aos bens patrimoniais transformarem seus usos e celebrarem o casamento entre cultura e sociedade. Ele também antecipa uma discussão de sustentabilidade muito em voga atualmente nas políticas de preservação: a relação ambiente, constituída na relação com o homem, é preciso ser considerada. Castriota (2009) analisou as mudanças nas políticas de patrimônio. Antes, cerceado por uma visão restrita, o papel de decisão era limitado aos arquitetos, historiadores da arte e intelectuais do IPHAN. Com o processo de redemocratização e as lutas que o contexto abarcou, os cidadãos passaram a compor o grupo responsável pelas decisões e pela manutenção do bem. Um bem deve estar assegurado também por sua comunidade e servir a ela, quando lhe impõe prejuízos, deve ser revisto. O ato do tombamento e da decisão à conservação do bem é de responsabilidade do Estado, mas os valores dados aos bens patrimoniais devem ser avalizados e reiterados constantemente pela sociedade, nos seus dinamismos e variações no tempo e no espaço (FONSECA, 2009). O tombamento é o último e mais importante registro para preservar o bem, mas não pode ser vinculado a uma noção de imutabilidade. Deve incorporar a existência de mudança e transformação e trazendo o foco mais para os sentidos que se atribui ao objeto ao longo do tempo. Belo Horizonte sofreu ao longo das décadas um misto de inovação de destruição. Foram erguidas grandes obras e grandes arranha céus que acompanharam a destruição
transformou o centro da cidade com um processo de verticalização que Vera Chacham (1996) denomina de “Ciclo dos Arranha-céus”. Foi um processo de desenvolvimento frenético de construção de edificações altas e modernização da área central. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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conhecido como o Ciclo dos Arranha Céus, ao longo das décadas de 1930 e 1940
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das casas na área central e de alterações nas políticas públicas. O processo que ficou
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A questão da preservação histórica da cidade veio juntamente com a percepção do centro como um lugar de memórias. Da interpretação e das lembranças sobre o que existia e de uma nostalgia que definia o pertencimento afetivo de gerações que passaram e viveram o centro. E, diante de uma transformação contínua, de descaracterização e desvalorização da área central, trazia uma pressão latente por uma política de preservação. A preservação é importante, a crítica trazida por Reynaldo Calvo, o arquiteto e o cidadão é na forma como foi realizada, sem o devido processo da escuta e da análise dos sentidos e dos significados e, assim, para finalizar e partimos de fato ao texto de Reynaldo, que é o que interessa mesmo aqui, é interessante contextualizar a criação da Diretoria de Patrimônio e o processo acelerado de tombamento da área central. É nos anos 1980 que se inicia na cidade um movimento para a criação da política de proteção de bens culturais como uma reação da sociedade à demolição do antigo Cine Metrópole (que ficava na Rua da Bahia com Rua Goiás). Tombar as edificações foi uma forma de garantir que não se destruíssem bens históricos da cidade. A crítica de Reynaldo não se dirige à preservação em si, mas à preservação desenfreada e sem filtro que foi promovida. O que se percebe na história de Belo Horizonte é que as políticas municipais interferiram na valorização e na desvalorização da área central ao longo da história da Cidade. A verticalização da Avenida Afonso Pena e a Pampulha são exemplos disso. O Poder Executivo, porém, não conseguiu controlar todos os processos. A Savassi, e posteriormente os Shoppings Centers manifestam uma mudança dos hábitos de consumo e a atuação das elites na conformação dos espaços, mesmo sem a anuência do poder público. O centro atual de Belo Horizonte, mesmo tombado, não conseguiu alcançar uma consciência de identidade do lugar nas novas gerações. Muitos dos processos de revitalização acabaram por agravar a relação social do espaço central da cidade, levando aos movimentos de gentrificação que acabam por gerar a exclusão dos antigos
sentidos e o lugar nas diversas mudanças e dinâmicas que o espaço e a sociedade revelam ao longo do tempo. As ações são importantes como garantia para que não se perca bens
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Preservar foi e continua sendo um grande desafio, pois altera a relação entre os
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frequentadores do lugar.
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de valor para a memória da cidade, mas refletir sobre elas, em 1995 e hoje, são ainda mais importantes. Vamos ao texto: B.H. – CIDADE CENSURADA
Sob o impacto da chusma de tombamentos de bens culturais (sic) em nossa B.H. (diria no sentido lato que tombam ou desabam sobre nós) embora reconhecendo a seriedade das intenções neles instituídos, considero representar uma censura à criatividade e produzirá efeito inverso ao imaginado pelos seus realizadores. Talvez suposição que sejam uma barreira à famigerada especulação imobiliária (leia-se espigões) explique a passividade e a omissão da sociedade civil à qual ainda não foi bem explicado que um adensamento bem produzido é melhor que grandes distâncias e ruas caras e inúteis. Além de ilegal que certeza tenho o seja (o que não é minha seara) representa uma camisa de força exercida por censores nomeados, que como qualquer tranca-ruas, se arvoram no direito de fazer o que nem a revolução bolchevique nem a pior das ditaduras se atreveu a fazer, “tombar o USO”: Cultura ou povo não existem sem passado que deve ser a alavanca do presente, não podendo porém ficar num limbo, como se tempo e espaço fossem únicos. Ligo-me tanto aos acontecimentos passados que, em noites de libação chego a afirmar – considerando a velocidade da luz – que o que vemos já é passado. Evidentemente não estou só, com meus anos de janela e conscientemente – a maioria das vezes – apropriar-me-ei de pensamentos de indivíduos que aprendia a admirar e do estofo de um Lewis Munford e de um Henri Lefebvre de um Lúcio Costa entre outros e amigos e mestres mais diretos que já se foram como Sylvio de Vasconcellos e Edgar de Albreguernue Graeff. Como em qualquer cidade, espontânea ou planejada nada se realiza ao acaso, lembrando que a opção primeira de Aarão Reis foi a Várzea do Marçal e não o nosso arraial.
brilhante engenheiro nenhuma experiência ou qualquer antecedente em questões urbanas, além das filosofias políticas em voga não alcançarem a dinâmica da sociedade industrial emergente, e com seus efeitos nas cidades, já tão visíveis na América do Norte, não REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Aarão dominava completamente 3e era então marco de erudição. Não tinha porém o
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A cidade projetada foi fruto consciente da escola francesa, cuja língua o nosso
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podendo dele esperar-se uma reflexão ou forma urbana apropriada aos novos tempos. Cidade para o qual não se pretendeu marcar por um estilo, mas com ruas de excelente caixa, na planície aos pés da Serra do Curral, definida por um contorno do núcleo urbano, o Ribeirão dos Arrudas e uma ferrovia, mas surpreendendo pelas perspectivas limitadas pela topografia, chegando inclusive a aparecer barroca quando alcançando-se o topo da larga avenida da Liberdade depara-se com uma surpresa pasmante com a bela esplanada do palácio. Porém nem “urbs”, nem “civitas”, mas motivo de muito orgulho dos “papudos” como pejorativamente eram tratados pelos ouropretanos os habitantes do arraial, que via crescer uma obra ciclópica, com as serrarias a vapor, os vários ramais ferroviários e as grandes galerias subterrâneas. A grandiosidade necessária a uma capital, seria medida pela beleza do sítio e pelas obras arquitetônicas a implantar, belas, porém fruto da pior fase histórica da arquitetura que foi a do século XIX, um verdadeiro período de desintegração, onde as construções são desprovidas de raízes na paisagem, exclusiva, forma externa, o estereótipo morto de outra cultura. Embora não entendida senão pelos eruditos, era decisivo motivo de orgulho, tanto pela beleza de muitas das obras neoclássicas, como pelo troco pesado que seria dado nos despeitados ouropretanos com sua “pobre” arquitetura, como por constituir-se na sensação de nivelamento social com a elite. A fraca personalidade urbanística produziu alterações imediatas, e em menos de um quarto de século inúmeros e pomposos prédios foram derrubados e substituídos, as secretarias foram implantadas em local diverso do projeto, as obras do parque municipal (restaurante, cassino, observatório meteorológico) foram sequer iniciadas. A indefinição de zonas de uso como é hoje – e isto foi bom – produziu o nosso primeiro especulador urbano, o José dos Lotes (José Francisco de Macedo) que procurando com outros comerciantes locais para instalar sua mercancia ia também adquirindo os lotes sorteados para proprietários de Ouro Preto, que definitivamente para aqui não viriam. “Extinta”
200.000 ao final) explodindo após 1930, exigindo regulamentos de construções mais modernos como o de 1933 (Octávio Goulart Penna), logo substituído pelo do Juscelino de 1940, até hoje vigente. Definia ele um centro comercial no núcleo urbano e que muito REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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se procurasse alcançar de imediato os 30.0000 habitantes da primeira demarcação (+
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após a inauguração a Comissão Construtora, o ritmo de ocupação continuou célere como
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consolidado em 46 com Otacílio, e que muita dor de cabeça iria nos trazer, gabaritos de altura, normas de ventilação e iluminação, enfim, “moderno”, mas ainda como quase tudo nosso, cópia de “algo” ou de algum lugar que desconhecemos. A verticalização desenfreada do centro gerou nas palavras de um amigo ex-reitor uma “cidade de costas” pois só existiam fachadas de frente e fundo e a última nunca tratada pelos arquitetos, permitia que, pela distância, se avistasse a triste perspectiva das casas de máquinas e reservatórios (como pombais) e essas fachadas sem preocupação, e acabamento inferior. Como náufragos urbanos como até hoje sem saber o que fazer, caminhamos até 1976 (com ligeiro agito no cinquentenário, passando pelo primeiro plano diretor /Sagmags que ficou no papel e com alguns outros que o sucederam) quando da primeira lei do solo elaborada pela PLAMBEL – Plano Metropolitano de Belo Horizonte – infelizmente de longa data esvaziado – calcado em diretrizes nacionais e metropolitanas de planejamento (auge da ditadura) que ia implantando nas principais cidades do país as “taxas de ocupação”, os “coeficientes” (como se esses regulassem necessidades) os corredores de tráfego, enfim alto que respeitadas algumas peculiaridades, era genérico. De qualquer modo buscou-se hierarquia, relações metropolitanas, revalorização da área central, a primeira grande via de tráfego rápido que somada ao anel de contorno isola o que antes constituía vizinhança, fragmentando o tecido urbano. Sua revisão em 1985 não trouxe nada de novo e surge agora o plano direto e a nova lei que poderão trazer seríssimas mudanças - boas e más - no desenvolvimento da cidade, uma má lá identificada pelo engessamento do núcleo urbano tradicional, agora chamado de hipercentro e ao bairro da floresta (atenção, sem ser pejorativo, o nome em função do bar e bordel “Hotel Floresta”) tudo sob uma égide presumida de preservação do patrimônio cultural. A análise que agora faço é aplicável a todo centro urbano tradicional, centro e hipercentro, embora em certos momentos amarre-se no antigo centro comercial e ficará claro que embora tenhamos muito pouco da cidade original sua preservação é questão básica, mas deve sêlo de forma pacífica, respeitosa e não reacionária como se pretende.
arte totalmente consciente eu não diria pois seria como chutar uma bola – que contém em si inúmeras outras formas de arte. O espaço e o tempo são reorganizados nas cidades, onde o homem por diferenciar-se dos animais como criador de cultura e capacidade de REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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nosso fazer, nosso viver, um “fato da natureza”, um gruta, um formigueiro, uma forma de
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Antes de tudo, a cidade é a casa do homem urbano, nosso espaço educacional,
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intervenção e alteração, atua, com todo o direito no sítio natural, respeitando-o ou negando-o – quase sempre de forma não a mais adequada -, em cada época, diante dos fatos primordiais de sua existência. Buscando a eterização (Toynbee), “processo de cultura, quando uma comunidade assume o domínio do ambiente e dos meios físicos da vida” o homem inventou e inventa seus espaços na procura da criação de modelos lógicos na busca da sua meta que é a perfeição. Como ninguém vive para si, nem a cidade, e viver é uma contínua troca de experiências e evolução, todos sabemos que a preservação de espaços e monumentos urbanos é que irá permitir nossa inserção em cada época. Muito foi e tem sido dito sobre as cidades nas suas várias épocas, muita coisa já está sedimentada em vários mestres, restando a nós a modesta análise de uma cidade somente centenária, nem ainda adolescente, que sofreu e continua a sofrer um processo histórico ainda não alcançado pelos seus planejadores, desde sua concepção, pela falta de uma visão cosmopolita do seu universo (atenção, não é globalidade). Estamos ainda numa época de cultura burguesa, (quando sairemos?) que a partir do renascimento, em seu absolutismo ainda emergente submeteu e vez por outra destruiu as que lhes eram contemporâneas. Belo Horizonte, bem ou mal já formada, poderia provavelmente superar melhor – não fora a malfadada área comercial do regulamento de 1946 – a verdadeira agressão, posse e destruição que a sociedade industrial, traz ao meio urbano e em especial à área central – o coração comercial, lúdico e centralizador da personalidade coletiva desde a cidade medieval. Para a sociedade industrial as obras da cidade, seus prédios, suas ruas e praças, seus monumentos e obras de arte são exclusivos objetos de uso para onerar o seu valor de troca. Neste tipo de comportamento e enfoque ela dirige-se obstinadamente à produção, considerando, em tese, qualquer outro investimento que não o objeto fim, “um luxo”, negando sempre o social urbano pelo econômico industrial: o nosso núcleo central é tomado já e a partir da década de 50 pelo duplo caráter da centralidade capitalista que o vê exclusivamente como lugar de consumo e lugar que deve ser consumido.
os meios de apropriação da sociedade industrial capitalista. O crescimento com novos habitantes e o deslocamento populacional para a periferia (residencial ou produtiva) vai esvaziando o núcleo central liberando-o como o que para os “pobres”, deixando à mostra, REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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a riqueza imobiliária já está móvel com o capitalismo comercial e bancário e são muitos
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Não é só especulação imobiliária, pois o fenômeno não se restringe à terra já que
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de forma clara e explícita a feiura burguesa, a relação custo/ganho, a pobreza do produto/obra que se instalou no lugar de um conjunto sem luxo, eclético, frio, mas sobretudo agradável. Nosso centro, planejado que foi facilmente identificado no espaço, não sucumbe porém (aliás historicamente os centros tradicionais sempre reagem) e continua a ser para o cidadão a “cidade” ir à “cidade” segundo velho amigo da PLAMBEL- Plano Municipal de Belo Horizonte (que já se foi, é sinônimo de “ir ao centro”). Mas, fato histórico, o núcleo estático envelhece e o que era suave e quase orgânico vai ficando decrépito, já é um produto que quase não se presta ao uso, não conseguindo sequer gerar contraste positivo com a outra feia obra que dele quis se apoderar. A lei de 1976, que tenta dar-lhe ganho em produto com atrativos aumentos de coeficiente, não contempla o necessário apoio ou incentivo aos planos que visavam sua revitalização, propostos por urbanistas oficiais ou não, alguns com a veemência de um velho amigo professor emérito da Escola de Arquitetura. Na última administração belos planos foram feitos e deles nenhuma notícia temos. A nossa falta de personalidade urbana (sem consolação não é só nossa), onde toda proposta de longo prazo é visionária e inatingível mede nossa incultura. Hoje não se vende um imóvel mas uma ilusão, um urbanismo que passa a ser valor de troca, oferecendo-se um imaginário habitat (os Alphavilles da vida aqui chegando) que tenta “prescindir” da cidade como que fechado em si, em local privilegiado “um lugar de felicidade e segurança”. E mais, temos os Shoppings Centers reinando com profissionalismo absoluto impedindo qualquer comércio periférico, os famosos “templos do consumo” que oferecem de tudo, à contemplação e ao dito lugar de consumo e consumo do lugar. Precisamos do núcleo? Sim, pois o homem vive na cidade e da cidade e a cidade não deixa de viver do homem e seu núcleo, seu centro histórico é parte essencial do conceito de cidade. Além do mais ele tem de ser visto como local franco, aberto, “grátis”, o local da festa (como antes) voltado à maioria da população que move-se agora mais rápida na malha urbana em função da variação acentuada dos pontos
de consumo”, assim o deseje. Como fortalecê-lo, como torná-lo a realização de um imaginário teórico não ouso dizer, embora possa dizer como não fazê-lo. Resguardá-lo todo (o centro) e esperar que uma mão divina ou as forças de um capital sem lucro para REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Outros centros a serem criados não são concorrentes destes, embora o “urbanismo
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de emprego não tendo mais sentido a casa própria, o habitat permanente.
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ele sejam guiadas, enxergando burocraticamente a perspectiva desta atração e não a prospectiva de novas necessidades, que não preexistem como objetos, mas serão descobertas no decorrer dessa prospecção, não é correto. “A obra permanece depois que o tempo superou sua utilidade funcional, quando se apresenta como criação plástica ainda válida, porque capaz de comover (o grifo é meu)”. O que comove na área furiosamente tombada? Por que preservar-se fachadas de gosto duvidoso quando o importante é o todo? Por que impor um padrão estético a uma população cuja média provável na cidade mal chega à quarta parte de sua idade? Por que não imaginar um “novo” centro preservandose o significativo, o marcante, o histórico feio ou bonito? Por que não novas intervenções que devolvam a ele o local de convívio, de festa, de comércio, de “uso” como antes onde se desenvolvia o sucesso? Qual a mais-valia deste tombamento senão um iminente risco de criar-se um enorme balcão de negócios? Tombar “conjuntos” que não o são? Como pode a Avenida Afonso Pena (porque não os “nn” e os “ff” tão mais bonitinhos) da rodoviária à Rua da Bahia ser um conjunto? (tenho de jogar fora os meus “pais dos burros” dicionários). Tombemos pelo patrimônio de uso, pela qualidade artística, por respeito àquele que historicamente o utilizou; tombemos agora no sentido de derrubar, desprezando o inútil e feito, destacando e valorizando o corretamente tombado. Transformá-lo (o hipercentro) em museu de arte, em local de peregrinação estética de mau gosto é na realidade transformá-lo em museu de história social, que necessariamente procura conservar e consagrar o passado. Devemos ter em mente que é “por nossas interpretações errôneas é que o passado revive e pelo fato de ser “diferente” é que o passado enriquece nosso presente”. O que faz uma arte ser eterna, no sentido humano, não são os detalhes que ela nos traz do passado morto, mas o que significa em nossa própria experiência. Não é preciso morar numa casa renascentista para apreciar uma obra de arte da época porque, mesmo que tivéssemos a casa, não poderíamos ver o ambiente, o quadro com olhos da renascença, mas pelo contrário, quanto mais completo é o nosso afastamento e quanto
No caso da cidade museu – e dificilmente pode deixar de ser assim, confunde-se “aquisição” com apreciação, conhecimento de fatos com “intuição estética” e “imitação mecânica” como intercurso cultural. Sem seus habitantes “normais” o núcleo se REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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geração, tanto mais pronta e decisiva nossa própria reação.
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mais efetivamente possamos separar um símbolo do que ele possa significar para outra
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transformará num amontoado de ruínas e rapidamente morrerá como qualquer ser vivo. Numa cidade nessas condições (museu) não tem sentido e representa um atordoamento intelectual, mas, uma cidade que preserva com base numa “cultura” e não num “padrão aquisitivo de vida” permitirá que cada geração possa assumir o controle coletivo de seu passado. Em todo o mundo, bens preservados com critério tem sido muitíssimo bem reutilizados e ganham nova vida, mas, imaginemos nossos edifícios, em cada terreno, onde uma fachada tradicional ou parte de seu volume, acopla-se a outra arquitetura que com ela nada tem de comum tornando-as, as duas, grotescas ou no mínimo de mau gosto. Pretende-se o “museu” e custo zero pela adoção de transferência do direito de construir. Em 1933 foi realizado em Atenas – Grécia – o IV Congresso Internacional de Arquitetura Moderna (CIAM) onde foram estabelecidos princípios para uma carta de urbanismo. Suas conclusões publicadas em 1941, como a “Carta de Atenas” no capítulo “Patrimônio Histórico das Cidades”, reza em alguns tópicos que extraí com comentários reduzidos: Os valores arquitetônicos devem ser salvaguardados [....] primeiro pelo seu valor histórico, segundo, porque alguns levam em si mesmos uma virtude plástica na qual toma corpo o mais alto grau de intensidade do gênio humano; serão salvaguardadas se constituem expressão de uma cultura anterior e se respondem a interesse geral [...] nem tudo que é passado tem direito, por definição, à perpetuidade; convém eleger com sensatez o que deve ser preservado. Se sua conservação não implica no sacrifício de populações mantidas em condições malsãs...um estreito culto ao passado não poderia fazer desconhecer as regras da justiça social; O emprego de estilos passados, sob protesto da estética, em construções novas erguidas em zonas históricas tem consequências nefastas [...] as obras mestras do passado nos mostram que cada geração tem sua maneira de pensar [...] copiar servilmente o passado é condenar-se à mentira, é erguer a falsificação [...] (CARTA ..., 1933).
Um dos mestres citados enxergou mais que a porta entreaberta por Paul Valéry Dize-me (pois tão sensível aos efeitos da arquitetura) se tens observado, em seus passeios por esta cidade, que entre os edifícios que a povoam, uns são mudos, outros falam; e outros, enfim, os mais raros, cantam... (Eupalyos – o arquiteto). Os edifícios mudos só merecem o nosso desprezo, fiquemos com os que cantam as grandes ideias dos homens,
o amor, o ódio, a alegria, o pranto... e tudo isso o homem relaciona com as coisas que
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foram o cenário da sua vida”. Tentemos ficar pelo menos com o menos feio. Agora, sem
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esses movem, conduzem, e levam os homens. “A vida do homem é o trabalho, o repouso,
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divagações, de volta ao solo pergunto: será que não poderemos criar condições para trair pelo menos os edifícios que murmuram?
Considerações Finais Esse texto de Reynaldo Calvo é um texto da época, escrito logo após o tombamento em massa do Circuito da Avenida Afonso Pena. É interessante refletir que nos anos 1990, as decisões acerca do tombamento já estavam partilhadas entre outros profissionais para além dos arquitetos, considerando os impactos sociais e as demandas populacionais. O fato de criticar o tombamento da forma como já foi realizado, não sustenta uma rejeição ao tombamento e outras políticas de preservação. Patrimonializar na nossa percepção é importante para conservação dos espaços, dos lugares e da memória, porém deve-se considerar a preservação e suas escolhas de forma ampliada, promovendo a inserção do cidadão no processo, como parte interessada e que tem, na preservação, a definição de um direito. É preciso garantir a ligação do espaço preservado com a sociedade que ele acolhe, até mesmo para que a população se aproprie e cuide desses espaços e, para tanto, eles precisam fazer sentido para a comunidade e para a cidade. Não um sentido histórico distante, mas a partir de uma sensibilização, um sentido da história dos sujeitos nos lugares da memória, como um espaço que integra ambiente e cidadão. Não se atribui valor a um patrimônio sob o quesito nem apenas histórico e nem apenas estético como foi no início da política patrimonial no país. O valor de um bem (se é que é possível a atribuição de uma valoração de bem já que ele deve ser estabelecido a partir de valores de pertencimento e de afeto e, portanto, subjetivos) não deve ser a meta. Tomar um bem melhor que outro é uma atitude excludente por natureza e a proposta de registro e tombamento tem como princípio ampliar a ligação das pessoas com o lugar, com a história. Nessa perspectiva é que o texto de Reynaldo é atual já que faz uma reflexão de
municipal de cuidado com o patrimônio e a importância das ações em relação à área central que foi, ao longo do tempo, fruto de várias intervenções públicas e privadas que REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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estabeleceu. Olhando a partir do presente, entendemos a importância que teve a atuação
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alguém que viveu o tombamento da área central como crítico do processo que se
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ameaçavam sua descaracterização e necessitavam de uma valorização como parte integrada da história da Cidade. A política de patrimonialização precisa de cada vez mais atenção. A criação de um órgão de Patrimônio naquele contexto dos anos 1990, atendia a este requisito fundamental de valorizar e, principalmente, não negligenciar o que existia na área central. Entretanto vale o recado de que toda política precisa se voltar para as comunidades mais amplas, escutar suas demandas e melhorar sua atuação para incluir e, com certeza, sensibilizar e valorizar o que existe e os sentidos da cidade. Os pareceristas deste artigo, contribuíram com reflexões importantes, e nos levaram a atualizar que hoje a comunidade se faz mais presente e tem ocupado com qualidade o espaço público, destaque aqui para os movimentos “Ocupação”, “Praia da Estação”, “CurArte” que integram/reintegram as pessoas à cidade e dão aos espaços públicos sentidos renovados e democráticos. A crítica de Reynaldo também é uma reflexão importante de que é preciso sempre e cada vez mais investir na construção de uma equipe ampla, multidisciplinar e com apoio institucional que possa, cada vez mais, adequar a política pública às demandas da cidade e da sua sociedade, realizando a pesquisa, a escuta, valorizando a memória e seus atores, a promoção e ocupação dos espaços públicos e o cuidado da cidade, as expressões culturais e a memória enquanto cidadania. Compreender a história como princípio do passado deve englobar a percepção de sua dinamicidade que acompanha a transformação da sociedade no espaço e no tempo. Toda cidade é histórica, ou seja, está em transformação, alinhando presente e passado e produzindo leituras de mundo e de seus grupos plurais e de suas condições contemporâneas. Cuidar do Patrimônio é cuidar da própria cidadania, dando sentido ao viver na própria cidade. A política patrimonial tem que se iniciar pelas pessoas, pelos moradores e sua relação com a cidade e o pertencimento. Nesse sentido, cabe dizer que os processos patrimoniais devem ampliar-se, sempre que possível, na inclusão das comunidades tanto
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reavaliação por parte da comunidade.
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no momento decisório como também pautando-se no acompanhamento e até em uma
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MARQUES, Robson dos Santos. Região de Belo Horizonte e a urbanização: notas sobre uma dinâmica imobiliária. In: MEDEIROS, Regina et.al. Permanências e mudanças em Belo Horizonte. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. p. 113-140.
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O Arquivo na Sala de Aula
Proposta Pedagógica 1 Quem é essa rua? A escolha dos nomes das ruas como parte do processo legislativo.
Autora: Rúbia Dias1* Nível de ensino: Fundamental – Séries Iniciais - 3º ano Tema: Quem é essa rua? A escolha dos nomes das ruas como parte do processo legislativo. Disciplina: História Interdisciplinaridade: Geografia Transversalidade: Lugares de memória, história da cidade Descrição sumária do(s) documento(s) : Leis e Projetos de Lei transformado em leis do acervo da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH). Documentos Título: Leis e Projetos de Lei transformado em leis do acervo da Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH). Gênero: Textual - Projetos de Lei - Folhas avulsas Instituição de guarda: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte Notação do documento: Fundo Diretoria Geral da CMBH. Subfundo Diretoria do Legislativo. Série Projetos de Lei Transformados em Lei e Série Proposições. Objetivos da atividade Conhecer o processo de denominação das ruas da capital mineira. Essa proposta se enquadra na Unidade Temática: O lugar que vive da BNCC (Base Nacional Curricular Comum)
1*
Licenciada e bacharel em História pela UFMG. REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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da memória: os lugares de memória (ruas, praças, escolas, monumentos, museus etc.)” e as
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do 3º ano do ensino fundamental. Na qual o objeto de conhecimento é: “A produção dos marcos
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habilidades a serem desenvolvidas: (EF03HI06) Identificar os registros de memória na cidade (nomes de ruas, monumentos, edifícios etc.), discutindo os critérios que explicam a escolha desses nomes. A proposta pedagógica foi pensada para instigar a curiosidade dos alunos nos anos iniciais do ensino fundamental acerca de seu entorno: a casa, a vizinhança, a escola, o bairro e, em uma escala ampla, a cidade. Além da proposta de uma reflexão sobre o lugar que o aluno habita, propõe-se expandir esse horizonte aos poucos, na medida que é apresentada a Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) e o Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH) enquanto instituições com papéis sociais voltados para a sociedade. Além da dimensão de identidade local dos alunos, esta sequência propõe pensar na cidade em um dos seus aspectos mais burocráticos: o processo legislativo. Entretanto, esta proposta não objetiva uma análise do legislativo belo-horizontino em seus aspectos densos e complexos, o que se propõe é simplesmente apontar que muitas decisões que dão forma a Belo Horizonte são tomadas por pessoas eleitas, de forma consciente dentro de um processo legal.
Procedimentos/estratégia de ensino 1. Mapeamento O levantamento de conhecimento prévio dos alunos é um dos passos mais importantes da atividade. Em uma situação que se busca problematizar parte do cotidiano da criança, é muito importante deixar que esta exponha seus pensamentos logo no começo da discussão. Perguntas como: “Quais as ruas mais famosas do bairro? Qual o nome da rua onde ficam os principais pontos comerciais? Qual o nome da rua da escola? etc”, são boas opções para começar uma conversa e despertar o interesse dos estudantes. O próximo passo é organizar a turma em grupos pequenos ou médios (4-6 alunos), cada grupo deve escolher uma ou duas ruas que foram citadas durante o primeiro momento da aula. É aconselhável que o professor já tenha uma lista com algumas ruas em mente, caso a discussão anterior não tenha sido efetiva. A partir daí, propor que os grupos criem personagens para aqueles
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interesses, etc. Ao final da aula, os grupos devem apresentar seus personagens-ruas para a turma.
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nomes, que eles imaginem como seria aquela pessoa: aparência, ocupação, personalidade,
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Atividade 01 Em grupo, escolha o nome de uma rua do seu bairro e crie um personagem para essa rua. Descreva como essa pessoa seria: Onde ela morava? O que gostava de fazer? Ela tinha muitos amigos? Qual a idade dela? Ela tinha animais de estimação? Como ela se vestia? Com o que ela trabalhava? Lembre-se: quanto mais completa a descrição, mais interessante o personagem vai ser. 2. Processo legal O segundo momento da atividade consiste em entender como as ruas são nomeadas. É possível começar com uma provocação mais leve, perguntas como “Como as ruas nascem? Quem dá nomes para as ruas?” são possíveis pontos de partida. O professor deve explicar que esse processo acontece na Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH), por meio de uma proposta de lei. Para mudar o nome de uma rua é necessário enviar a sugestão do novo nome para um vereador, esse, por sua vez, vai criar um projeto de lei que será votado pelos outros vereadores. Caso o projeto ganhe a votação e seja aprovado, o nome da rua será alterado. Os vereadores também podem criar projetos sem que sejam sugeridos pela comunidade. Algumas palavras chaves devem ser trabalhadas nesse momento para maior esclarecimento dos alunos, elas são: Lei, logradouro, Projeto de Lei, CMBH, etc. Uma atividade
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básica de conectar a palavra ao significado pode ser aplicada e corrigida em seguida.
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Atividade 02 Conecte as palavras ao seu significado: 1.
Lei
( ) Proposta, sugestão para criação de uma lei.
2.
Logradouro
( ) Pessoa escolhida por um grupo para representá-los nas decisões referentes à cidade.
3.
Projeto
4.
Câmara Municipal de Belo Horizonte
5.
Vereador
( ) Espaço público: ruas, praças, parques, etc. ( ) Uma regra que todos precisam obedecer. ( ) Um dos lugares onde se aprovam as mudanças para a cidade por meio de votações.
Atividade 03
___ A lei em papel segue para o APCBH para ser guardada
___ O projeto de lei aprovado na CMBH se torna Lei
___ O projeto de lei é entregue na CMBH
___ Os outros vereadores fazem uma votação para decidir se o projeto será aprovado ou não
___ A comunidade sugere um nome para a rua e apresenta essa sugestão a um vereador
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___ O vereador aceita a sugestão e cria um projeto de lei
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Numere de 1-6 para colocar em ordem o processo para dar nome às ruas:
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Apresentar esses conceitos de forma sucinta e situar a CMBH como um local onde são tomadas decisões referentes ao funcionamento da cidade e o ato de nomeação de ruas, como um processo de criação de leis, consiste na segunda parte da sequência didática. 3. Contato com as fontes O terceiro momento da atividade é quando as fontes serão usadas. Os projetos de leis da CMBH tem em sua guarda garantida no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH) devido a um convênio de colaboração entre as entidades. O professor pode solicitar ao arquivo uma cópia digital dos projetos que nomeiam as ruas que foram usadas na primeira parte da atividade. Para descobrir qual o número da lei que nomeia determinada rua, basta ir no portal da CMBH, seguir para atividade legislativa e selecionar legislação. Uma página com campo de pesquisa irá aparecer, basta digitar o nome da rua no campo “Assunto” e anotar o número da lei responsável pela nomeação. O próprio site disponibiliza um documento textual com a lei digitada, porém, a parte de discussão e justificativa do projeto só pode ser encontrada no documento original, que está sob guarda do APCBH. O professor pode pedir a versão digitalizada dos documentos no arquivo, imprimir e distribuir aos grupos de alunos. A atividade que se segue é um exercício de investigação com fontes históricas. Contudo, a linguagem rebuscada e complexa dos documentos pode dificultar a interpretação dos alunos. Cabe ao professor elaborar algumas perguntas básicas para guiar essa investigação. Segue um exemplo:
Atividade 04 Analise o projeto de lei e tente encontrar respostas para as seguintes perguntas: ● Quando esse projeto foi escrito? ● Quem o escreveu? ● Quantas páginas esse projeto tem? ● Esse projeto tem uma parte chamada “Justificativa”? ● É possível entender a justificativa? ● Quais as características dessa pessoa, é possível identificar?
● Escolha três palavras que são difíceis de entender. ● Aponte uma das palavras que foram usadas na aula anterior.
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● Como você imaginava que seria uma Lei?
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● Por que essa pessoa foi considerada importante?
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Exemplo de Projeto de Lei/ Lei para realização da atividade:
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Projeto de Lei transformado em Lei 7362 de 1997.
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encontrar respostas para as perguntas. Muitos projetos não possuem uma justificativa clara, assim, cabe ao professor decidir incorporar esses casos da forma que são ou fazer uma seleção de projetos REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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É muito importante que o professor já tenha lido os projetos e saiba auxiliar os alunos a
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com justificativa clara que possam criar mais envolvimento com os alunos. O professor também pode optar por escolher trabalhar com ruas de destaque que possuem nomes de personalidades famosas, ao invés das ruas locais. Cabe uma análise da documentação previamente para concluir qual caminho poderá ser mais efetivo. Essa parte da atividade tem como objetivo colocar o aluno em contato direto com as fontes históricas, não se espera que nessa fase os alunos possam compreender e interpretar textos tão densos como os legislativos. Ao mesmo tempo, incentivar a busca pela informação e atiçar a curiosidade dos estudantes são por si só o resultado dessa parte da atividade.
4. Desfecho Para finalizar essa sequência, podem ser feitas algumas atividades interessantes: A primeira consiste em uma visita agendada ao Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte. Os alunos terão a oportunidade de ver os depósitos onde esses documentos estão guardados, além de se envolverem com o processo de guarda desses documentos e conhecerem um pouco da função do Arquivo na cidade. A segunda proposta é em conjunto escolherem um novo nome para alguma rua do bairro e entregar essa sugestão a um vereador. Esse tipo de contato pode ser feito por email. O interessante dessa atividade é que os alunos escolham em conjunto e assinem todos juntos o pedido de substituição do nome. O professor pode optar por sortear alguns nomes apontados pelos alunos também. É importante lembrá-los de que a sugestão precisa ter uma justificativa plausível. Uma última possibilidade seria imprimir um mapa no qual a escola é o centro e deixar que os alunos a nomeie como bem entenderem. Novamente, é preciso pedir que escrevam uma justificativa para cada uma das ruas. Esta proposta foi criada para ser uma possibilidade de introdução de discussão sobre temas relativos à cidade de Belo Horizonte. Mas é possível extrair muitos outros debates a partir do que foi apresentado. Também é possível adaptar a sequência para o último ano do ensino médio, durante as discussões acerca de cidadania e democracia.
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BELO HORIZONTE (MG). Câmara Municipal. Câmara Municipal: a voz da cidadania. Pesquisar a atividade legislativa. Disponível em: <https://www.cmbh.mg.gov.br/atividade-legislativa/pesquisar-legislacao>. Acesso em: 14 de dez. de 2021.
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Referências
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Proposta Pedagógica 2 Urbanização e modernização brasileira: aspectos da história local
Autora: Lucimar Lacerda Machado Coelho1* Nível de ensino: Fundamental – Séries Finais 9º. série/ciclo
Tema: Urbanização e modernização brasileira: aspectos da história local
Disciplina: História
Interdisciplinaridade: Geografia e Português
Transversalidade: Impacto social e ambiental, Gênero textual
Descrição sumária do(s) documento(s): Discurso proferido pelo político e intelectual Nelson Coelho de Senna por ocasião das comemorações do Cinquentenário de Belo Horizonte no ano de 1947 realizado no salão do Instituto de Educação. Título: SENNA, Nelson C. de. O Cinquentenário de Belo Horizonte. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1948. O documento é parcialmente reproduzido nesta edição da REAPCBH. Gênero: Textual Instituição de guarda: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte – Fundação Municipal de Cultura
1*
Bacharel-licenciado em História – Doutoranda em História UFMG REAPCBH – Revista Eletrônica do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, v. 8, n. 8, dezembro de 2021 - ISSN: 2357-8513
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Notação do documento: NCS.6.1(31)
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Objetivos da atividade O tema sobre a modernização nacional envolve diferentes perspectivas de análise e tem sido objeto de estudo em diferentes áreas do conhecimento. No campo historiográfico, tornou-se um conceito importante para a interpretação da realidade brasileira e da compreensão dos atrasos e antagonismos consolidados ao longo de nossa história. Assim, a presente proposta pretende analisar o processo de modernização tomando como eixo norteador as transformações sociais, econômicas e políticas advindas da implantação da ordem republicana, episódio que, do ponto de vista retórico e discursivo, demarcou a ideia da entrada do Brasil no rol das nações modernas. Nessa direção, a atividade tem como objetivo principal compreender o processo de urbanização e modernização brasileira identificando suas particularidades locais e regionais. Por meio do uso documental e sua interface com o livro didático, analisar o contexto socioeconômico da sociedade belo-horizontina, possibilitando (re) significar a realidade vivida pelos alunos. Também pretende-se refletir sobre as potencialidades do uso do documento como leitura da realidade histórica, problematizando o discurso como um gênero textual.
Procedimentos/estratégia de ensino Como estratégia de trabalho e realização da atividade, pretende-se: 1. Distribuir a turma em pequenos grupos disponibilizando o documento para leitura. 2. Solicitar que os alunos identifiquem no documento as informações básicas, como: autor, tipologia documental e assunto. 3. A partir da análise coletiva, solicitar aos alunos que apresentem os aspectos mais significativos sobre o tema destacando os impactos da modernização para as diferentes camadas sociais.
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4. Finalizar com uma conclusão do grupo sobre os impactos da modernização na cidade de Belo Horizonte.
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Referências AGUIAR, Tito F. Rodrigues de. Panorama fotográfico de Belo Horizonte: a imagem de um espaço em transformação. Belo Horizonte, 2001. ANDRADE, Luciana Teixeira de. A Belo Horizonte dos modernistas: representações ambivalentes da cidade moderna. Belo Horizonte: PUC Minas: C/Arte, 2004. GOMES, Ângela Maria de Castro (Org.). Minas e os fundamentos do Brasil moderno. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005. MAGALHÃES, Beatriz de Almeida; ANDRADE, Rodrigo Ferreira. Belo Horizonte: um espaço para a República. Belo Horizonte: Editora UFMG, 1989. PEREIRA, Nilton M.; SEFFNER, Fernando. O que pode o ensino de história? Sobre o uso de fontes na sala de aula. Anos 90, Porto Alegre, v.15, n.28, p. 113-128, dez. 2008.
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PINSK, Carla B. Fontes Históricas. 2ª. ed, 1ª. reimpressão. São Paulo: Contexto, 2008.
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