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RESIDÊNCIA FARMACÊUTICA:

UMA (NOVA) FORMA DE SER FARMACÊUTICO?

Lanço um mote inicial: para que serve um farmacêutico em 2023?

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Qual a utilidade social do seu acto profissional, não apenas na farmácia de proximidade, mas também nos hospitais e nos laboratórios?

A profissão farmacêutica está disposta a assumir o seu papel como profissional de saúde através de um novo modelo de exercício profissional de saúde, responsabilidade primeira é o cuidado ao ser humano doente?

Existe uma vontade e um esforço de contribuir para racionalizar o uso da tecnologia do medicamento, do dispositivo médico, dos exames laboratoriais e genéticos, no sentido de serem mais eficientes?

É da resposta que decidamos dar a estas perguntas que teremos (ou não), o fundamento da existência da residência farmacêutica.

Comecemos por responder que não.

Então, de facto, não precisamos de residência farmacêutica. Nem de farmacêuticos mais ou menos diferenciados. Nem sequer de escolas farmacêuticas.

Estaremos a falar apenas de um instrumento formativo com custos elevados para a sociedade, diletante porque desnecessário, e uma manifestação de corporativismo.

Neste caso, o tempo encarregar-se-á de pôr as coisas no seu devido lugar, como já aconteceu em momentos passados. E começaremos a discutir como podemos pôr a robótica e a inteligência artificial a fazer as mesmas coisas, com menos erro e menos custos.

Experimentemos agora responder que sim.

Neste caso, precisamos absolutamente da residência farmacêutica. Mas para quê?

Para que os farmacêuticos que nela ingressam tenham oportunidades de trabalho com outros profissionais, para o melhor cuidado dos cidadãos. Sabe-se dos receios iniciais que o “diferente”, o “outro” pode causar em qualquer grupo humano. Aí, está a oportunidade de treinar a capacidade de diálogo com pontos de vista diferentes e de aportar mais-valia com a "segunda opinião", um tema candente - inclusive na discussão sobre o financiamento do sistema de saúde.

Para ajudar a contribuir para a melhoria da utilização das tecnologias de saúde. Com profissionais mais treinados e qualificados é mais fácil fazê-lo e conseguir libertar recursos para o reinvestimento na modernização do sistema de saúde. É interessante pensar que, se bem aplicada, a residência farmacêutica pode ser autosustentável, em termos económicos, a longo prazo.

Para afirmar a presença do farmacêutico nos distintos contextos da prestação de cuidados. Se as tecnologias de saúde estão envolvidas, o farmacêutico há-de ter papel activo nas decisões sobre elas. O facto de até agora "ter corrido tudo bem", não quer dizer que as coisas estejam "bem". Aliás, a falta de uma análise sistemática de resultados em saúde é uma fragilidade do sistema de saúde português, desde os grupos de trabalho internos até às comissões técnicas das instituições prestadoras de cuidados. Os internos de residência farmacêutica podem contribuir para mudar este panorama.

E, sobretudo, para reforçar, acima de qualquer dúvida, o farmacêutico como especialista do medicamento, com conhecimento profundo e holístico sobre o mesmo, incluindo sobre a sua monitorização analítica e sobre a influência que a genética tem sobre os seus efeitos. É uma obrigação ética devolver à sociedade o investimento que esta fez na educação dos internos de residência farmacêutica.

E para as instituições? Que mais-valia lhe oferece a aposta na residência farmacêutica, que exige investimento para obtenção de idoneidade e capacidade formativa?

Uma nova abordagem à gestão dos recursos humanos, dando-lhe uma perspectiva diferente de carreira a longo prazo, com a valorização do conhecimento como eixo estruturante da valorização profissional.

Um plano estratégico de mudança, cuja visão terá de estar alinhada com a estratégia das instituições prestadoras de cuidados e do Serviço Nacional de Saúde, mas também com as novas tendências na área da saúde.

Um factor disruptivo que agite a rotina de equipas e serviços, no sentido de fazer cair conceitos ultrapassados e pôr sobre a mesa novos temas, e também de infundir novo ânimo aos profissionais mais velhos, sem excluir a sua experiência.

Uma oportunidade para refazer esquemas organizacionais obsoletos, fazendo da prática assistencial farmacêutica o campo de trabalho da investigação aplicada na área do medicamento e do laboratório clínico, propondo um novo modelo de relação com as escolas farmacêuticas e com as unidades de investigação a nível hospitalar.

Perante isto, estamos a falar num novo modelo de exercício profissional, que implica uma mudança cultural. E que esperamos deste processo?

Conseguir resultados mais facilmente mensuráveis, de acordo com indicadores previamente definidos, que permitam avaliar a evolução da situação a cada momento.

Utilizar melhor as tecnologias operativas ao nosso dispor, que ultrapassam hoje largamente o medicamento e o reagente, e compreendem toda a gama das tecnologias de informação, da ciência de dados e da genética.

Melhorar os resultados em saúde dos cidadãos através de uma melhor prática farmacêutica, facilitada por uma formação pós-graduada devidamente estruturada nas diferentes áreas de actividade.

A residência farmacêutica pode ser, assim, o ponto de inflexão que a profissão farmacêutica precisa. O mundo está em mudança, a saúde também… e urge questionar onde queremos estar daqui a um ano. A uma década. A um século.

Aprender com a experiência de quem já fez caminho. Assegurar a coesão territorial na prestação de cuidados farmacêuticos, evitando nivelar por baixo.

Criar relações com colegas de outras realidades geográficas e que podem aportar valor ao processo.

Dialogar, sem preconceitos e sem complexos, com os outros elementos das equipas de saúde.

Estar abertos ao que as pessoas com doença têm para nos dizer.

Fazer de todos os lugares onde se prestam cuidados, oportunidades de intervenção farmacêutica.

Garantir a continuidade formativa, com exigência e sem subterfúgios.

Gerar redes de comunicação e partilha de conhecimento. Promover a colaboração e a articulação entre os diferentes serviços onde os internos de residência farmacêutica realizam a sua formação específica. Transformar as farmácias e os laboratórios das caves dos hospitais em serviços com “paredes de vidro”.

A residência farmacêutica pretende formar, antes de mais, pessoas. Homens e mulheres que, através do seu saber e competência, ajudem a mudar a profissão e a vida daqueles que precisam.

Aceitamos o desafio?

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