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Capacitar para participar; empoderar para mobilizar:
from Revista "O Hospital" | Nº 33
by APDH
Do Papel E Dos Desafios Das
ASSOCIAÇÕES DE DOENTES, EM PORTUGAL
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Ao longo das últimas décadas, e um pouco por todo o mundo, é notório o crescimento expressivo de Movimentos Sociais em Saúde (Epstein, 1996), cujo papel tem sido crucial não só ao nível dos serviços e apoios que estes têm criado para responder às necessidades manifestadas por doentes, cuidadores/as e/ou familiares que os procuram; mas também no concernente à (re) definição de cada vez mais políticas públicas capazes de salvaguardar os direitos das pessoas em contexto de saúde e, também, no que diz respeito à forma como se pensa e opera no campo da saúde.
Em Portugal, os movimentos sociais na área da saúde tornaram-se expressivos sobretudo após a década de 1970, mais precisamente a partir de 1974, ano em que se iniciou o processo de transição de um regime ditatorial para um regime democrático. Enquadradas nestes movimentos sociais encontram-se as Associações de Doentes.
A elas devemos vários dos direitos que hoje existem e que se consubstanciam em medidas que procuram garantir um acesso mais equitativo à saúde, a melhoria da qualidade dos cuidados prestados para todas as pessoas e um maior envolvimento da participação cidadã nos processos de tomada de decisão em saúde. Não obstante os avanços concretizados designadamente no que diz respeito a direitos conquistados, este é um caminho em continuada construção, o que pode justificar o crescimento progressivo do número de associações de doentes, em Portugal, que diariamente continuam a dar suporte a quem as procura, sem deixarem de se mobilizar para promover a mudança por um sistema de saúde que ainda não consegue, em rigor, ser acessível a todas as pessoas que a ele recorrem.
Sendo as Associações de Doentes relevantes, a todo o tempo, e necessárias por tudo o que acima foi dito e por trazerem para o centro do debate a experiência da doença por quem a vive, importa atentar aos desafios com os quais são confrontadas para cumprir a sua missão.
Um desses desafios está diretamente relacionado com a composição da esmagadora maioria das associações – de base predominantemente voluntária – e com as dificuldades de captar talento e de profissionalizar um setor que se debate constantemente com o problema da sua sustentabilidade. Acrescem, a estes desafios, as dificuldades de um reconhecimento prático, que se consubstancie no envolvimento efetivo destas associações nos processos de tomada de decisão em saúde.
É a partir da tomada de consciência dos desafios acima mencionados que surgiu a Academia para a Capacitação das Associações de Doentes (ACAD), projeto promovido pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP-NOVA), com o apoio da Roche.
Criada em 2018, ano da sua primeira edição, a ACAD tem procurado reforçar os conhecimentos de pessoas e organismos que pretendam advogar pelos interesses dos doentes, contribuindo para a sua preparação para a gestão e tomada partilhada de decisões, em contexto de políticas de saúde. É neste âmbito que tem vindo a proporcionar a introdução e o desenvolvimento de temas considerados relevantes para o eficaz empoderamento dos/as advocates, no exercício da sua cidadania de saúde, sem esquecer o encorajamento e apoio a projetos desenvolvidos pelas associações e a promoção da partilha e a discussão em torno das preocupações e desafios sentidos pelas associações de doentes.
Naquela que é a sua quinta-edição, em curso entre setembro de 2022 e junho de 2023, foram desenvolvidos dois programas de capacitação, um deles com temas transversais às problemáticas partilhadas pela generalidade das associações, e um outro de cariz temático, mais direcionado à resposta a necessidades específicas sentidas pelos/as participantes.
Da mesma forma, e ainda na senda da capacitação, desenvolveu-se um Laboratório Digital destinado à reflexão e ao reforço de conhecimentos e competências que permitissem às associações de doentes e advocates o desenvolvimento de respostas eficazes às exigências criadas pela digitalização da comunicação.
Aliada à preocupação com a forma como qualquer entidade comunica com os seus públicos promoveu-se, ainda no contexto deste Laboratório, a iniciativa “Comunicação em (des)construção: A linguagem enquanto instrumento de transformação social”, que teve como objetivos a consciencialização dos/as participantes para a importância de uma comunicação cada vez mais inclusiva e a criação de um espaço de reflexão a partir do qual fosse possível identificar situações de estigma no acesso aos cuidados de saúde.
A par das atividades supramencionadas, no decurso desta edição foi feito um investimento na comunicação da Academia e das pessoas que a integram, através da produção do podcast “Histórias e Trajetórias e da rubrica “Passos para a Mudança”, vias a partir das quais, são partilhadas vozes das associações, dos membros que as lideram e de pessoas que vivem com doença.
A ACAD tem-se feito nestes espaços de fala e de escuta, que se vão criando para que seja possível tornar mais claros os desafios que atravessam o setor social na voz de quem os vivencia. Também por isso, ainda no âmbito desta edição foi organizado um seminário concebido e desenvolvido por um grupo constituído por seis associações, que procurou desencadear uma discussão sobre a sustentabilidade financeira destas entidades. O evento visou não só discutir os desafios que se colocam à sustentabilidade financeira das entidades do setor social, como compreender que razões estão na génese da efetiva operacionalização da legislação existente que prevê o financiamento das associações de doentes, em Portugal. Reconhecendo que esta iniciativa representou um primeiro passo para a promoção de uma discussão necessária, numa área que preocupa as associações de doentes, importa ter presente que há ainda uma estrada por percorrer.
As associações de doentes são um movimento vivo da sociedade civil, que se vai reinventando de acordo com os desafios que vão surgindo. Da mesma forma, a ACAD tem-se reinventado e inovado, no esforço constante de apoiar as associações no momento de garantir que a voz dos doentes é incluída no diálogo sobre saúde. Acreditamos que os caminhos da capacitação e do empoderamento são diversos e continuaremos a desbravar esses caminhos em parceria com as associações de doentes.
Acompanhe as iniciativas promovidas pela ACAD a partir das suas redes sociais:
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Referências Bibliográficas:
EPSTEIN, S. (1996), Impure Science: AIDS and the politics of knowledge, Berkeley, University of California Press.