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Ano I

No 6

Outubro/2016

Informativo jurídico especializado

Ministra Nancy Andrighi ENTREVISTA

A Sra. vê com otimismo a integração das informações contida nos registros públicos pelas Centrais de Registro Eletrônico – desenvolvida para funcionamento em cada Estado da federação? Ministra Nancy Andrighi: Com muito otimismo. A uniformização dos procedimentos dos cartórios de registro de imóveis em todo país trará maior segurança jurídica, transparência e eficácia ao trabalho dos tabeliães. Além disso, acredito que, tanto os responsáveis pelas serventias extrajudiciais quanto a sociedade, se beneficiarão com o funcionamento do Portal de Integração do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis, que congregará as Centrais Eletrônicas Estaduais de Registro de Imóveis. Quais as principais atribuições da Corregedoria Nacional de Justiça na manutenção das atividades jurisdicionais e, também, as extrajudiciais? Quais

as conquistas da gestão da Sra. na esfera do serviço extrajudicial? Em ambas as esferas, a atribuição primordial da Corregedoria Nacional de Justiça é ajudar na organização dos órgãos jurisdicionais e extrajudiciais para que seus trabalhos sejam otimizados e eficazes, estabelecendo diretrizes gerais quando necessário. No período em que estive à frente da Corregedoria Nacional, ingressaram 9.000 procedimentos e foram arquivados 11.184, restando 787 casos em andamento, sendo 60% deles procedimentos de acompanhamento contínuo que não podem ser arquivados. Dediquei-me, intensamente, a colaborar na otimização do funcionamento dos órgãos jurisdicionais, das metodologias e das ferramentas essenciais para que os juízes pudessem cumprir com a máxima eficiência sua missão constitucional. Em relação aos notários e registradores, preocupei-me em uniformizar e atualizar os procedimentos existentes, os quais já atendiam satisfatoriamentes, o Poder Público e a sociedade. Nessa perspectiva, ediARISP JUS 1


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tamos em 16/06/2015, o Provimento 46 que revogou o Provimento 38 de 25/07/2014 e dispôs sobre a Central de Informações de Registro Civil das Pessoas Naturais – CRC. Esta Central, em síntese, congrega toda a base de dados de nascimentos, casamentos, óbitos, emancipações, ausências e interdições lavradas em todo o território nacional, permitindo a localização de assentos em tempo real e a solicitação de certidões eletrônicas e digitais entre cartórios e entre cartórios e o Poder Judiciário. Após consulta pública da minuta do projeto, em 18/06/2015 foi editado o Provimento 47, que estabelece as diretrizes para a implantação do sistema de registro eletrônico de imóveis. Também após consulta pública, editamos o Provimento 48, de 16/03/2016, que estabelece diretrizes gerais para o

vimento 55, de 21/06/2016, facultou aos responsáveis pelos cartórios, titulares ou interinos, definirem atividades que seus funcionários possam realizar fora das dependências físicas das serventias na modalidade de teletrabalho. Editamos, também, o Provimento 50 em 28 de setembro de 2015, que dispõe sobre a conservação permanente ou não dos documentos arquivados nas serventias extrajudiciais. Anoto, finalmente, o Provimento 52 de 14 de março de 2016. Consideramos o reconhecimento pelo STF da união contínua entre pessoas do mesmo sexo como família, e a falta de regulamentação específica para o registro de nascimento para os filhos havidos por técnica de reprodução assistida. Este provimento dispõe sobre o registro de nascimento e emissão da respectiva certidão dos

sistema de registro eletrônico de títulos e documentos e civil de pessoas jurídicas, para permitir o compartilhamento e a integração, em nível nacional, dos dados e informações dos cartórios que possuem essas atribuições. Considerando que a implantação do sistema de registro eletrônico para todas as atribuições de registro e notas possibilitaria a realização do trabalho das serventias extrajudiciais de forma remota, com uso de tecnologias de informação e comunicação, a Corregedoria Nacional de Justiça por meio do Pro-

filhos frutos de reprodução assistida, de casais heteroafetivos e homoafetivos. Além disso, fomos atentos ao grave problema relativo à titularidade das delegações das serventias extrajudiciais, ocasionado pela demora, justificada ou não, do Poder Público na realização de concursos públicos na forma e prazo determinados pelo art. 236 da CF/88 e pela Lei Federal nº 8.935/94. A manutenção e permanência de inúmeros oficiais, sem a devida aprovação em concurso público por longos anos, gera controversos “direitos adquiridos”, que pre-

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judicam a regularização definitiva das serventias extrajudiciais e sobrecarregam o CNJ e o STF. Iniciamos uma análise e revisão no Sistema Justiça Aberta do Conselho Nacional de Justiça, o qual agrega as principais informações sobre as serventias extrajudiciais do Brasil. Este sistema é a principal ferramenta para o acompanhamento da situação das serventias extrajudiciais do Brasil. Sua falta de alimentação pelos notários e registradores, titulares ou interinos, acarreta, inclusive, afastamento justificado das suas atribuições. Em meu último relatório, constavam no referido sistema 13.5691 serventias extrajudiciais ativas no Brasil, e deste número, 5.059 estão aptas a serem oferecidas nos concursos públicos para outorga de delegação de serviços notariais e de registro. Por fim, destaco na minha gestão, os programas de Coordenação de Controle Regional das 5 Regiões do País, o Nacional Redescobrindo os Juizados Especiais, o Nacional de Modernização da Administração das Varas Especializadas de Falência e Recuperação Judicial e o Nacional de Governança Diferenciada das Execuções Fiscais. Na busca da melhoria do serviço extrajudicial, o Conselho Nacional de Justiça editou o provimento 47/2015. Em linhas gerais, quais, são os objetivos e diretrizes do Provimento? Atendendo à necessidade de facilitar o intercâmbio de informações entre os ofícios de registro de imóveis, o Poder Judiciário, a administração pública e o público em geral, para eficácia e celeridade da prestação jurisdicional e do serviço público, editaram o Provimento 47 da Corregedoria Nacional. As diretrizes gerais estabelecidas no Provimento 47 foram (i)o intercâmbio de informações e documentos entre os registros de imóveis, o Poder Judiciário, a administração pública e o público em geral; (ii) a recepção e o envio de títulos em formato eletrônico; (iii) a expedição de certidões em formato eletrônico; e (iv) a formação de repositórios registrais eletrônicos nos cartórios para armazenamento de documentos eletrônicos. Acredito que a adequação do sistema registral imobiliário à nossa realidade atual, se traduz no intercâmbio de informações, por meio eletrônico, entre os ofícios de registro de imóveis, o Poder Judiciário, a administração pública e a sociedade em geral. Nossa iniciativa com a

edição do Provimento 47 objetivou o aprimoramento dos serviços prestados pelos cartórios de Registro de Imóveis, a fim de proporcionar maior segurança para a sociedade e representar uma conquista de racionalidade, de economicidade e de desburocratização dos serviços. Acredito que a integração e a comunicação entre as Corregedorias Estaduais, sobre as reais necessidades e possibilidades de suas serventias extrajudiciais, guiarão os próximos passos para a implementação do Registro Eletrônico de Imóveis nos Estados. Em uma entrevista recente à TV Registradores, a Sra. ressaltou que os serviços extrajudiciais são o segundo pilar do Direito. Qual é a avaliação da Sra. sobre a atividade registral? Sempre observei com muito interesse o trabalho realizado pelos notários e registradores, e, na minha breve passagem pela Corregedoria Nacional, pude verificar a atuação cuidadosa e proficiente das nossas serventias extrajudiciais. Pude, também, confirmar minha percepção de que a atuação dos delegados responsáveis pelos cartórios extrajudiciais, não é mero serviço burocrático, mas instrumento fornecido pelo Estado para regulação de relações jurídicas formais, garantindo segurança, publicidade, e eficácia aos atos e negócios jurídicos. Quem conhece minha jornada como juíza, sabe do meu inarredável posicionamento de que incumbe ao Estado facilitar o acesso à Justiça, aproximando o cidadão dos meios alternativos de composição de conflitos, informando-o de suas vantagens e garantias. Novas formas de resolução de conflitos têm surgido e, empiricamente, comprovado sua eficácia ao evitar a contenda ao invés de direcioná-la ao Poder Judiciário. Nesse contexto, destaco que o notário, no exercício diligente de sua função, assume grande importância como instrumento fornecido pelo Estado, para a regulação das relações jurídicas formais, e com isso, previne a instauração dos litígios. O que, de fato, desonera o Poder Judiciário. Além disso, reafirmo que a capilaridade dos cartórios extrajudiciais, sua presença nos menores e mais distantes municípios, faz com que a Justiça chegue aonde, dificilmente, o juiz pode chegar. Na busca de uma cena judiciária mais humana e eficaz, o fenômeno da desjudicialização no Brasil revela o protagonismo dos nossos notários e registradores, corrente a qual me filio.

1 - Dados obtidos do “Relatório Geral das Situações Jurídicas dos responsáveis por UF” do Sistema Justiça Aberta em 01/08/2016. ARISP JUS 3


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ARTIGO

1ª PARTE: SISTEMÁTICA TRIBUTÁRIA NACIONAL: AS CUSTAS E OS EMOLUMENTOS SOB A ÓTICA CONSTITUCIONAL E JURISPRUDENCIAL

A nossa Constituição Federal dedica um capítulo específico sobre a disciplina tributária, regulando de maneira municiosa a funcionalidade do sistema tributário brasileiro. Mesmo ante a observância de países pelos quais o direito brasileiro sofre influência, nada se compara a sistemática complexa adotada no Brasil. Em sua essência, o Sistema Tributário é nacional, vinculando-se, de igual modo, a todos os entes federativos.

A INCIDÊNCIA DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA PARA OS EMOLUMENTOS: POSSIBILIDADE E PROCEDIMENTO PELO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL Por Alberto Gentil de Almeida Pedroso e Caio Bartine

Alberto Gentil de Almeida Pedroso Juíz de Direito em São Paulo. Juíz Assessor da Corregediria Geral da Justiça nas Gestões 2012/2013, 2014/2015 e 2016/2017. Especialista em Direito Civil e Mestre em Direito. Prrofessor universitário. Professor da Escola Paulista da Magistratura nos Cursos de Pós Graduação em Direito Civil, Processo Civil e Direito Notarial e Registral. Autor de diversas obras jurídicas. Professor de Processo Civil e Registro Públicos do Complexo Educacional Damásio de Jesus. Coordenador do Curso de Atualização e Aperfeiçoamento em Registro de Imóveis da Uniregistral. Caio Bartine MBA em Direito Empresarial - FGV/Management Doutor em Ciências Sociais - UBA-AR Mestrando em Direito - FADISP Coordenador de Direito Tributário - Damásio Educacional Professor dos cursos de pós-graduação de Direito Empresarial, Previdenciário e Tributário do Curso Damásio Professor de Direito Tributário da Escola da Magistratura do Espírito SANTO - EMES Autor de diversas obras jurídicas pela Editora Revista dos Tribunais Advogado e Consultor Jurídico Tributário e Empresarial

É sabido que temos divergências doutrinárias quanto às espécies de tributos. Independentemente das discussões doutrinárias, o Tribunal Constitucional Brasileiro adotou a classificação pentapartida como aquela que embasa a atual sistemática tributária brasileira em posição oposta àquela inserida no Código Tributário Nacional, adotando-se a classificação tripartida, conforme assinalado no art. 5º: “Art. 5º. Os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria”. Nas afirmações do então Ministro Moreira Alves, quando do julgamento do RE 146.733, “de efeito, a par das três modalidades de tributos (impostos taxas e contribuições de melhoria) a que se refere o artigo 145 da Constituição Federal para declarar que são competentes para instituí-los a União, os Estados, o DF e os Municípios, os artigos 148 e 149 aludem a duas outras modalidades tributárias, para cuja instituição só a União é competente: o empréstimo compulsório e as contribuições sociais, inclusive as de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais e econômicas”. O art. 145, II, da Constituição Federal indica a possibilidade dos entes federativos instituírem taxas devidas em razão do exercício do poder de policia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição. Conforme aludido na Constituição Federal, trata-se de uma característica fundamental aplicável às taxas ARISP JUS 5


o desempenho de uma atividade específica do Poder Público, sendo o valor exigido do contribuinte proporcional ao custo estimado do serviço ou da atividade de fiscalização. Nas palavras do Ministro Celso de Mello, no julgamento da ADI 2.551 MC-QO, “se o valor da taxa ultrapassar o custo do serviço prestado ou posto à disposição do contribuinte, dando causa, assim, a uma situação de onerosidade excessiva, que descaracterize essa relação de equivalência entre os fatores referidos (o custo real do serviço, de um lado, e o valor exigido do contribuinte, de outro) configurar-se-á, então, quanto a essa modalidade de tributo, hipótese de ofensa à cláusula vedatória inscrita no art. 150, IV, da Constituição da Répública”. É cediço que a atividade notarial e registral, mesmo executada no âmbito das serventias extrajudiciais, constitui, em decorrência de sua própria natureza, uma função revestida de estatalidade, sujeita a um regime jurídico de direito público. O fato de a Constituição da República estabelecer, em seu art. 236, que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público não descaracteriza a estatalidade que reveste a atividade. As serventiais extrajudiciais, instituídas pelo Poder Público, são destinadas a garantiar a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, constituindo-se órgãos públicos titularizados por agentes públicos e terão a fixação dos emolumentos relativos aos atos praticados mediante lei federal, em conformidade com o disposto no art. 236, §2º da Constituição da República. A temática da natureza jurídica das custas e emolumentos já foi amplamente debatida entre os juristas e na própria Corte Constitucional. No julgamento da ADI 1.378-5, a jurisprudência do STF firmou entendimento no sentido de que as custas judiciais e os emolumentos concernentes ao serviços notariais e registrais possuem natureza tributária, qualificando-se como taxas remuneratórias de serviços públicos, sujeitando-se, em consequência, quer no que concerne à sua instituição e majoração, quer no quer concerne à sua exigibilidade, ao regime jurídico-constitucional pertinente a essa especial modalidade de tributo vinculado, notadamente aos princípios fundamentais que 6

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proclamam, dentre outras, as garantias essenciais da reserva de competência impositiva, da legalidade, da isonomia e da anterioridade. Superada a discussão sobre a natureza jurídica conferidas as custas e aos emolumentos, passamos a considerar a concessão de benefícios fiscais, uma vez que todos os tributos incluídos na Constituição da República – e isto se aplica, de igual forma, às taxas – sujeitam-se ao regime jurídico-constitucional imposto na sistemática tributária brasileira. Reza o art. 150, §6º, in verbis: “Art. 150 (...) §6º. Qualquer subsídio ou isenção, redução da base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativas aos impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, §2º, XII, g”.

A lei que deve ser utilizada para desoneração dos tributos deve ser editada pelo próprio titular da competência impositiva, sob pena de flagrante afronta ao princípio da autonomia tributária das pessoas constitucionalmente previstas. Entretanto, impõese a edição de lei específica, não bastando a edição de uma simples lei genérica editada pelo titular da competência tributária. Ademais, além da observância aos ditames constitucionais, a lei de responsabilidade fiscal limita a ação do legislador na concessão de incentivos de natureza tributária, conforme determina o art. 14 da LC 101/00: “Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário- financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições: I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará


as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias; II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição. § 1o A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado. § 2o Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso. § 3o O disposto neste artigo não se aplica: I - às alterações das alíquotas dos impostos previstos nos incisos I, II, IV e V do art. 153 da Constituição, na forma do seu § 1o; II - ao cancelamento de débito cujo montante seja inferior ao dos respectivos custos de cobrança.”

Busca-se, nesse dispositivo, uma gestão fiscal responsável, transparente, visando prevenir desequilíbrios orçamentários. Entretanto, vemos que o legislador anda em descompasso com os ditames estabelecidos em lei, notadamente na prestação de serviços notariais e registrais, senão vejamos: I) independentemente do serviço notarial e registral ser prestado em caráter privado, por delegação do Poder Público, é cediço que o mesmo está revestido de estatalidade, estando sujeito a um regime jurídico de direito público; II) as custas e emolumentos das serventias extrajudiciais revestem-se de natureza jurídica tributária, notadamente de taxas de serviço a serem cobrados dos usuários pela prestação do serviço público notarial e registral, estando, portanto, sujeitos a toda sistemática constitucional tributária; III) os benefícios fiscais e renúncias fiscais devem ser conferidas pelo próprio ente político dotado de

competência tributária, sendo instituídos mediante lei específica e em consonância com o disposto na Lei de Responsabilidade Fiscal. Pontuadas tais premissas, nos deflagramos com o disposto no art. 98 da Lei 13.105/15 (Novo Código de Processo Civil), que revela: A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei. De fato, estamos diante de uma situação pela qual uma norma geral processual confere a possibilidade de pessoas físicas ou jurídicas terem direito a uma gratuidade de custas, ao arrepio de todos os itens acima expostos. Tal gratuidade soa, mediante simples interpretação, como uma forma de renúncia de receita tributária, vez que as custas e emolumentos, conforme amplamente demonstrado e debatido, têm natureza jurídica de taxa de serviço. Ora, em sendo uma taxa, não se subsume ao disposto no art. 150, §6º do texto constitucional? Não se aplica ao regramento exposto no art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal? A simples indicação do artigo em comento, visando atender o amplo acesso à justiça, não pode repudiar preceitos constitucionais e legais que podem comprometer o bom funcionamento na prestação de serviços públicos das serventias extrajudiciais. Há necessidade de melhor entendimento sistemático e estudo mais aprofundado do tema, que não se faz presente nesse artigo, servindo apenas como uma ponderação sobre a importância do debate à lume dos preceitos constitucionais tributários e da política tributária. 2ª PARTE: PROCEDIMENTO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA E O SERVIÇO EXTRAJUDICIAL

Apresentada a questão inicialmente sob a ótica da possibilidade técnica-legislativa de previsão ARISP JUS 7


ampliativa da gratuidade da justiça aos emolumentos extrajudiciais, passamos a enfrentar criticamente o tema em observância ao modelo criado pelo Código de Processo Civil. Inaugurando o Livro III, Título I, Capítulo II, Seção IV, do Código de Processo Civil, dispõe o art. 98, “caput”, sobre a gratuidade da justiça: A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

Ainda que de fácil compreensão a extensão expressa da gratuidade as pessoas físicas e jurídicas, brasileiras ou estrangeiras, ponto que merece destaque e enfrentamento refere-se ao melhor entendimento do termo “insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas e os honorários (..)”. De fato, a Lei processual civil comum não exigiu expressamente para concessão da gratuidade da justiça à declaração de pobreza do interessado – conforme previa o art. 4º, parágrafo 1º, da Lei 1.060/50, (revogado pelo Código de Processo Civil em seu art. 1.072, III) – mas a ausência de tal condição deve ser entendida de que forma? Para Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero (Novo Código de Processo Civil Comentado, 2ª ed., RT, pág. 241) dispensada a demonstração da condição de pobreza para gratuidade de justiça, basta a afirmação que a parte não tenha recursos suficientes para pagar as custas judiciais, as despesas do processo e os emolumentos extrajudiciais que fará jus a benesse legal. Mesmo que a pessoa tenha patrimônio suficiente, se estes bens não têm liquidez para adimplir com essas despesas, há direito à gratuidade. Todavia, respeitada a opinião dos festejados doutrinadores, entendemos que a melhor compreensão do termo “insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas e os honorários (..)” ainda é exigir da parte interessada na benesse legal à demonstração de insuficiência econômica para o custeio das despesas do processo e emolumentos. Deste modo, prestigiado o 8

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acesso efetivo à justiça na busca da concretização de direitos dos necessitados, ainda manteremos um sistema pautado na boa-fé objetiva e razoabilidade. Boa-fé objetiva, pois trata-se de comportamento leal da parte arcar com as despesas judiciais e extrajudiciais se possui patrimônio suficiente para tanto, ainda que tenha que se desfazer de parte dele. Afinal, prestado um serviço público que exige contrapartida, não se mostra razoável a concessão da gratuidade apenas pela falta de liquidez patrimonial do beneficiado. É nesse sentido, inclusive, que se mantém boa parte da jurisprudência após a vigência do Novo Código de Processo Civil: (...) Com efeito, a gratuidade da justiça é devida apenas àqueles com comprovada insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, conforme vigente regramento do NCPC, art. 98. Mesmo na plena vigência da Lei 1.060/50, os requisitos ali estabelecidos eram avaliados à luz do que dispõe a CF- art. 5º, LXXIV, que determina que a assistência jurídica integral e gratuita é devida aos que efetivamente comprovarem insuficiência de recursos. Assim, é lícito ao Juízo tanto exigir a apresentação de documentos comprobatórios quanto denegar o benefício se os elementos dos autos desde logo indicarem a ausência dos requisitos para a concessão do benefício. No caso concreto, o que se verifica é que um dos agravantes tem valores expressivos em aplicações financeiras (fls. 155), marcadas pela fácil liquidez, situação a elidir a declaração de pobreza apresentada. Disso tudo decorre que os agravantes não são pobres na acepção jurídica do termo, de modo que foi bem o juízo monocrático ao indeferir os benefícios da justiça gratuita. (...) (TJSP, Agravo de instrumento n° 2118797-42.2016.8.26.0000, 1ª C. de Direito Privado, relator Durval Augusto Rezende, data do julgamento 09/09/2016) E AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ORDINÁRIA – POLICIAL MILITAR – Decisão que indeferiu o benefício da justiça gratuita – Pleito de reforma da decisão – Inadmissibilidade – Agravante que não pode ser enquadrado na condição de necessitado, com rendimento líquido de 4,9 salários mínimos – Declaração de pobreza e documentos juntados aos autos que não são


suficientes para demonstrar a hipossuficiência – Decisão mantida – Agravo não provido. (TJSP, Agravo de instrumento n° 2132492-63.2016.8.26.0000, 3ª C. de Direito Público, rel. Kleber Leyser de Aquino, data do julgamento 06/09/2016). O segundo ponto que merece análise é a possibilidade de modulação do benefício da gratuidade da justiça, previsão inovadora do Código de Processo Civil, prevista no art. 98, parágrafos 5º e 6º, nos seguintes termos: (...) § 5º - a gratuidade poderá ser concedida em relação a algum ou a todos os atos processuais, ou consistir na redução percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. § 6º - conforme o caso, o juiz poderá conceder direito ao parcelamento de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento.

Diante do novo quadro legal, poderá o juiz, no caso concreto, conceder o benefício da gratuidade da justiça em relação a um especifico ato ou a todos os atos processuais, ou reduzir o percentual de despesas processuais que o beneficiário tiver de adiantar no curso do procedimento. Torna-se possível também ao magistrado deferir apenas o parcelamento das despesas processuais, após análise pormenorizada da condição da parte, valor das custas para fixação do número de parcelas para pagamento integral das custas, despesas processuais e emolumentos. Entendemos que diante da estrutura criada pelo Código de Processo Civil de acesso concreto à justiça pela parte efetivamente necessitada o sistema de modulação do benefício da gratuidade pode atingir todas as hipóteses de custas e despesas previstas no art. 98, § 1º- I - as taxas ou as custas judiciais; II - os selos postais; III - as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios; IV - a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse; V - as despesas com a realização de exame de código genético - DNA e de outros exames considerados essenciais; VI - os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira;

VII - o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução; VIII - os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório; IX - os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido. A modulação da gratuidade da justiça é uma ferramenta processual muito útil, pois autoriza o magistrado que analise de maneira fundamentada a capacidade econômica do interessado e atribua a cada parte, de forma personalizada, o montante exato da benesse que lhe é devida. Oxalá os juízes utilizem o dispositivo legal para tornar efetivo o espirito da norma jurídica, de maneira a tornar gratuito todos os atos que de fato devem ser, mas sem abusos ou exageros. O último ponto que merece ser destaque e apreciação é o disposto no art. 98, § 8º do Código de Processo Civil, que assim dispõe: § 8a - na hipótese do § 1ª, inciso IX, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, o notário ou registrador, após praticar o ato, pode requerer, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação total ou parcial do benefício ou a sua substituição pelo parcelamento de que trata o § 6° deste artigo, caso em que o beneficiário será citado para, em 15 (quinze) dias, manifestar-se sobre esse requerimento. A autorização do art. 98, em seu § 8º, do Código de Processo Civil, para que o registrador ou tabelião, havendo dúvida fundada quanto ao preenchimento atual dos pressupostos para a concessão de gratuidade, solicite, após praticar o ato que lhe compete, ao juízo competente para decidir questões notariais ou registrais, a revogação do benefício ou mesmo sua modulação (revogação parcial ou parcelamento), reforça a ideia que a concessão e manutenção do benefício deve ser exclusivamente para os necessitados.

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Todavia, entendemos que a norma jurídica precisa de alguns acabamentos interpretativos para sua plena aplicação: a. Prazo para solicitação pelo tabelião ou registrador para que o juiz module o benefício da gratuidade ou até revogue: 15 dias úteis contados da data em que praticou o ato que lhe competia, pois é exatamente esse o prazo concedido no art. 98, § 8º, ao beneficiário da gratuidade para se manifestar sobre o requerimento impugnativo. A solução apresentada respeita o equilíbrio de forças com a concessão de prazos idênticos (igualdade de tratamento) e a observância da segurança jurídica, no tocante a certeza que a impugnação não poderá ocorrer a qualquer tempo; b. O requerimento pode ser formulado diretamente pelo tabelião ou registrador nos autos: ante a falta de ressalva em sentido contrário, entendemos que o próprio titular da Serventia extrajudicial poderá formular o pedido de revogação total ou parcial do benefício da gratuidade ou parcelamento dos emolumentos; c. Competência para apreciação do pedido impugnativo do tabelião ou registrador, ou seja, melhor interpretação da expressão “juízo competente para decidir questões notariais ou registrais”: Tratando de benesse legal conferida na esfera jurisdicional pelo juiz do processo, entendemos que o pedido impugnativo apresentado pelo tabelião ou registrador deverá ser encaminhado e apreciado pelo magistrado que conduz o processo judicial e não pelo juiz corregedor permanente. O juiz do processo é o “juízo competente para decidir questões notariais ou registrais” relativos àquele processo e as partes envolvidas. A via administrativa não se presta a revisar, reformar, modificar ou cancelar decisão judicial proferida no âmbito jurisdicional. Afinal, é entendimento firmado pela Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo e pelo Conselho Superior da Magistratura que a via administrativa não pode rever decisões oriundas da via jurisdicional – precedentes do E. CSM nesse sentido: 0006128-03.2012.8.26.0362, 102529006.2014.8.26.0100,0001717-77.2013.8.26.0071, 1025290-06.2014.8.26.0100. Em reforço, vale trazer à baila parecer da lavra do Juiz Auxiliar da Corregedoria Dr. Álvaro Mirra, nos autos do processo CG n° 2008/66457: Ocorre que a pretendida retificação do tí10 ARISP JUS

tulo judicial referido não pode ser obtida nesta esfera administrativo-correcional, dada a impossibilidade de revisão pela Corregedoria Permanente e mesmo pela Corregedoria Geral da Justiça de decisões proferidas na esfera jurisdicional. De fato, o indeferimento da correção do formal de partilha, na espécie, como referido, se deu por decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz de Direito nos autos do processo de arrolamento, de natureza jurisdicional, de sorte que somente no âmbito jurisdicional poderá ela ser reexaminada e, eventualmente, reformada para finalidade pretendida pelo Recorrente. Em linhas gerais são estas as ponderações que entendíamos pertinentes em relação a previsão da gratuidade da justiça para os emolumentos do extrajudicial no Novo Código de Processo Civil. O tema é relevante e a discussão indispensável, sendo o objetivo deste trabalho simplesmente fomentar a reflexão na busca do constante aprendizado.


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RESTRIÇÕES CONVENCIONAIS E SUA EQUIPARAÇÃO ÀS LEGAIS. Por Hélio Lobo Jr. Promotor Público de novembro de 1971 a setembro de 1975. Magistratura, por concurso, de 24 de setembro de 1975 até 1 de fevereiro de 2002 – no período foi Juiz Titular da 1ª Vara de Registros Públicos da Capital e Juiz Auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça. Aposentou-se como Juiz do 1º Tribunal de Alçada Civil e foi alçado à Desembargador do Tribunal de Justiça já na inatividade. Atuação como advogado, atualmente, sócio do Escritório Lobo e Orlandi Advogados, cuja especialidade é a área imobiliária e, principalmente, registraria. Publicou diversos artigos e participou de livros sempre na área dos Registros Públicos.

1 - INTRODUÇÃO:

No ano de 2007 tivemos a oportunidade de escrever artigo cujo título era “As restrições urbanísticas no parcelamento do solo urbano e o Registro de Imóveis”, publicado na Revista do Advogado nº 90, paginas 62/70 e nele, após análise geral do tema, aludimos de modo superficial ao artigo 247 da Lei Municipal de São Paulo nº 13.885, de 25.8.2004, então vigente, que equiparou as restrições convencionais às normas legais. Esse dispositivo, após mencionar as zonas de uso, rezava que “as restrições convencionais de loteamentos aprovados pela Prefeitura, estabelecidas em instrumento público registrado no Cartório de Registro de Imóveis, referentes a dimensionamento de lotes, recuos, taxa de ocupação, coeficiente de aproveitamento, altura e número de pavimentos das edificações, deverão ser atendidas quando mais restritivas que as disposições desta lei”. Assim, resumindo, dispunha que em determinadas zonas de uso, as restrições convencionais de loteamentos deverão ser atendidas quando mais restritivas do que as disposições daquela lei, prevendo, no parágrafo primeiro, uma limitação legal para esses usos, ao passo que no parágrafo segundo a possibilidade de alteração das restrições convencionais dos loteamentos. Finalmente, no parágrafo terceiro, cuidou da supressão, sempre mediante prévio procedimento junto à Municipalidade. Atualmente, com a vigência da Lei Municipal nº 16.402, de 23 de março de 2016, editada em consonância com a Lei nº 16.050, de 31 de julho de 2014 (Plano Diretor Estratégico), as regras foram praticamente mantidas, como se verifica dos artigos 59 e parágrafos, abaixo transcritos. Art. 59. Nas ZER-1, ZER-2, ZERa, ZCOR-1, ZCOR-2, ZCOR-3, ZCORa e ZPR, as restrições convencionais de loteamentos aprovadas pela Prefeitura, estabelecidas em instrumento público registrado no Cartório de Registro de Imóveis, referentes a dimensionamento de lotes, recuos, taxa de ocupação, coeficiente de aproveitamento, altura e número de pavimentos das edificações, deverão ser atendidas quando mais restritivas que as disposições desta lei.

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§ 1º Os usos permitidos nos loteamentos referidos no “caput” deste artigo serão aqueles definidos por esta lei para as respectivas zonas. § 2º A alteração das restrições convencionais dos loteamentos deverá atender às seguintes condições:

nais, constantes do memorial de loteamento ou contrato padrão, integrantes do procedimento registrado no Cartório de Registro de Imóveis, que se transformam em legais.

I – realização de acordo entre o loteador e os proprietários dos lotes atingidos pela alteração;

A regra confere, portanto, de forma explícita, força de lei às restrições impostas, unilateralmente, pelo loteador aos adquirentes de lotes, bem como a todos aqueles inseridos no âmbito de seus efeitos.

II – emissão de parecer técnico favorável da CTLU; III – anuência expressa do Executivo. § 3º A exigência constante no inciso I do § 2º deste artigo poderá ser suprida por acordo entre os proprietários dos lotes atingidos pela alteração, nos casos de encerramento de atividades da empresa loteadora ou de sua inércia quando legalmente notificada sobre a necessidade de manifestar-se a respeito do acordo, desde que haja a anuência de 2/3 (dois terços) dos proprietários do loteamento atingido.

A reiteração e continuidade dessas disposições, que acreditamos pudessem ser alteradas ou revogadas, nos induziu a um aprofundamento na questão, como tentaremos demonstrar nestas breves considerações. 2 - UMA POSSÍVEL INTERPRETAÇÃO ÀS DISPOSIÇÕES:

As disposições constantes da legislação municipal são interessantes, mas, a sua análise demanda certa reflexão. Já tivemos a oportunidade de diferenciar, no estudo publicado e acima referido, as restrições legais das convencionais. As legais decorrem da legislação. As convencionais teriam natureza obrigacional, embora um instrumento auxiliar do Poder Público quanto à urbanização da cidade. Mantemos esse entendimento, notadamente quanto aos seus efeitos jurídicos, sem, contudo, ignorar e tentar interpretar a novidade contida nas normas municipais. Com base na legislação do Município (artigo 59, da Lei nº 16.402, de 23 de março de 2016, que repete o revogado artigo 247) passou a existir um hibridismo representado pelas restrições urbanísticas convencio12 ARISP JUS

Assim, embora as restrições convencionais tenham natureza obrigacional, com regulamentação prevista no Código Civil, Lei do Parcelamento do Solo Urbano e Lei de Registros Públicos, razoável é considerar que os aspectos urbanísticos decorrentes podem ser compatibilizados com a competência constitucional do Município. Alguns dispositivos da Lei nº 6.766, de 1979, referem-se às restrições convencionais. O artigo 26, inciso VII, menciona que devem constar, no contrato padrão, as restrições convencionais do loteamento, “supletivas da legislação pertinente”. Por outro lado, o artigo 9º, § 2º, inciso II, estipula que o projeto do loteamento deverá conter “as condições urbanísticas do loteamento e as limitações que incidem sobre os lotes e suas construções, além daquelas constantes das diretrizes fixadas”. É verdade que nenhuma dessas regras erigiu restrições convencionais às normas legais, embora as tenha mencionado como instrumentos auxiliares da urbanização. A legislação do Município de São Paulo, porém, inovou e, certamente, considerou que, diante da necessidade de aprovação do projeto, com tais restrições urbanísticas, decorre a presunção de que as convenções estabelecidas pelo loteador foram examinadas, aceitas e aprovadas. Além disso, deve ter animado o legislador a menção das restrições convencionais como “supletivas da legislação pertinente” (artigo 26, inciso VII) e resolveu erigi-las a essa condição “quando mais restritivas que as disposições desta lei” (artigo 59, da Lei nº 16.402, de 23 de março de 2016).


Sem adentrar aspectos referentes à constitucionalidade da norma, ou, ainda, sobre a amplitude conferida ao loteador e ao próprio Executivo Municipal quanto à regulamentação de restrições que passam a ter força de lei, o que, certamente, será melhor definido na esfera jurisdicional, vamos tentar compatibilizar o direito positivo posto com a sua aplicação e efeitos. A premissa básica desse enfoque coloca o loteador apresentando restrições e se estas não conflitam com a legislação municipal, sendo, inclusive, mais restritivas do que as por ela estabelecidas, devem ser atendidas, pois, equiparam-se à própria legislação. Decorre a obrigação conferida ao Município de fiscalizar efetivamente a edição das restrições estabelecidas no parcelamento. Elas precisam ser verificadas em relação à região e à espécie de empreendimento. E isso porque, se forem extremamente rigorosas ou estapafúrdias, sem atender ao interesse de todos, notadamente ao interesse público, não devem ser aceitas. Essas as considerações básicas, embora muitos outros aspectos devam ser esclarecidos e interpretados, como tentaremos na sequência expor. 3 - ASPECTOS POLÊMICOS A CONSIDERAR:

Nada obstante essa aparente conformidade das regras com o sistema jurídico vigente, muitos pontos ainda causam perplexidade ao intérprete. Destacaremos a seguir, sem, no entanto, tentar solucioná-los, salvo por meras induções ao raciocínio. Isso porque a tarefa se mostra difícil e dependerá, certamente, das apreciações jurisdicionais e administrativas futuras. 3.1- UMA ESPÉCIE DE NORMA EM BRANCO:

O legislador municipal conferiu uma espécie de “cheque em branco” ao loteador. Inexistindo conflito com a legislação municipal, se as restrições são mais restritivas, devem ser aceitas, mediante a singela aprovação do projeto e memorial. Como consequência o empreendedor pode dizer os termos da legislação, aplicável a todos que, no presente e futuro, ingressarem naquele espaço delimitado.

Outro aspecto interessante diz respeito ao binômio tempo e espaço referente a tais restrições, como se verá a seguir. 3.2 – A INCIDÊNCIA SOBRE ESPAÇO DELIMITADO:

Começando pelo espaço é preciso considerar que as normas urbanísticas, decorrentes das restrições, só incidem sobre a área efetivamente ocupada pelo loteamento ou desmembramento, conforme o projeto aprovado. Assim, como consequência, os espaços delimitados no parcelamento recebem tratamento diverso dos demais, às vezes no mesmo bairro e região. Não podemos esquecer que o loteamento tem duração transitória e, ao ser executado, após o recebimento pela Municipalidade, integra-se à cidade. Logo, por óbvio, as restrições impostas pelo loteador e constantes, por exemplo, de um pequeno parcelamento, não subsistem para imóveis vizinhos, com outras origens, embora sejam todos integrantes do mesmo bairro. Competirá à Municipalidade catalogar e disciplinar todos os projetos, inclusive de desmembramentos, que também admitem a imposição de restrições convencionais, de molde a evitar situações incompatíveis e contraditórias dentro de uma mesma região. 3.3 – AS LEGISLAÇÕES NO TEMPO:

Importante é considerar que a equiparação entre restrição convencional e legislação municipal só pode existir a partir da vigência dos diplomas que regularam o tema, ou seja, após a atualmente revogada Lei nº 13.885, de 25.8.2004, artigo 247 e parágrafos, que, todavia, teve as mesmas regras repetidas pela Lei Municipal nº 16.402, de 23 de março de 2016. Os loteamentos anteriores, que previam restrições convencionais, não estão abrangidos pela regra. Há que se preservar o direito adquirido e o ato jurídico perfeito.

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Há, atualmente, uma espécie de fatiamento das disposições urbanísticas dentro de uma mesma região, embora com característicos semelhantes. Todos esses aspectos precisam ser levados em conta pela Municipalidade ao aprovar o empreendimento. 3.4 – A ALTERAÇÃO OU REVOGAÇÃO DAS RESTRIÇÕES COM FORÇA DE LEI:

Importa refletir sobre a possibilidade de alteração ou cancelamento das restrições convencionais. Assentada a premissa de que a restrição convencional, diante dos termos da legislação municipal, se equipara à própria legislação, em princípio só poderia ser revogada ou alterada por outra superveniente. No entanto, não é o que decorre dos termos da norma vigente. Esta permite uma alteração e, porque não dizer, a própria revogação, por acordo entre o loteador e proprietários de lotes atingidos, mediante parecer técnico, além de expressa anuência do Poder Executivo Municipal. Há inclusive, no parágrafo 3º, do artigo 59, um “quórum” de dois terços dos proprietários de lotes na área. Assim, a qualquer tempo, os proprietários de imóveis no perímetro parcelado podem revogar ou alterar as restrições anteriormente impostas. Logo, naquele espaço representado pelo parcelamento, os proprietários dos lotes, obtidas as anuências necessárias, podem alterar ou cancelar as restrições e, também, a própria legislação municipal em que elas se transformaram. Nesse ponto nova indagação se mostra pertinente: a legislação municipal superveniente em dissonância com as restrições, aprovada para toda a região, revoga aquelas específicas da área loteada? A resposta há de ser positiva, salvo se a própria legislação ressalvasse a situação excepcional.

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Há entendimento da Corregedoria Geral da Justiça de que a Lei Municipal posterior, dispondo expressamente sobre a restrição convencional e a revogando, prevaleceria sobre a cláusula do contrato padronizado (PARECER Nº 396/2009 E PROCESSO CG Nº 2009/79569 Data inclusão: 19/01/2010(396/2009 _E), cuja ementa é a que segue: “REGISTRO DE IMÓVEIS-Desdobro-Lote-Aprovação pelo Município que faz presumir o respeito à legislação urbanística-Restrição urbanística prevista no contrato padrão arquivado com o registro do loteamento, por outro lado, que foi expressamente revogada por legislação municipal posterior- Recurso provido para afastar a recusa da averbação do desdobro”. É interessante considerar que essa afirmação remete a outra indagação pertinente: se a restrição era convencional, embora com força de lei, o que lhe foi atribuído pela norma municipal, revogado esse efeito previsto expressamente no artigo 59, o que se fará pelo próprio procedimento que o dispositivo prevê, subsistirá a restrição convencional do contrato apenas entre as partes? A resposta parece também ser positiva. A restrição convencional subsiste e isso porque mesmo desaparecendo a força legal conferida pela legislação municipal em exame, restariam os efeitos da obrigação assumida, notadamente quanto aos direitos de vizinhança, principalmente em consonância com as disposições do Código Civil. Sempre se entendeu que as restrições convencionais legais não poderiam interferir com os aspectos contratuais. Isso porque as restrições convencionais podem ser livremente impostas pelas partes por força do contrato. Eventuais limitações ao direito de contratar ou de alterar o seu conteúdo deverão estar previstos em Lei Federal, como o Código Civil, cuja competência constitucional é exclusiva da União Federal. Logo, não pode o Município interferir nos contratos do loteamento celebrados entre as partes, por invadir competência privativa da União Federal. Se existe a obrigação entre vizinhos, por força do Código Civil, a legislação municipal não pode interferir. Haveria invasão de competências constitucionais. A solução para


tais impasses deverá ser obtida na esfera jurisdicional. Para melhor compreensão basta formular a seguinte hipótese: se um dos adquirentes de lotes, que não anuiu para a alteração, resolver fazer cumprir uma restrição que existia em contrato com o loteador ou terceiro, poderá fazê-lo, pois, a regra municipal não interfere com a relação obrigacional celebrada com base no Código Civil. A restrição pode ter perdido a força legal, mas manteve a obrigacional, decorrente do contrato. É interessante lembrar, também, que o Conselho Superior da Magistratura tem admitido alterar a restrição convencional, até para revogá-la totalmente, se houver a anuência de todos os adquirentes de lotes, com direito real registrado. Duas, pois, as situações que devem ser consideradas: a) a revogação dos efeitos legais da restrição; e b) a prevalência, conforme o caso, dos seus efeitos obrigacionais e decorrentes do contrato. Logo, por absurdo que possa parecer, conclui-se que a revogação da restrição convencional com força de lei, se alterado ou revogado esse efeito, não interfere com aquelas constantes do contrato padronizado e que poderão, autonomamente, subsistir. Cabe aí outra indagação: a revogação dos efeitos que equiparou a restrição convencional à legal, caso o contrato ou cláusula do memorial seja cancelada, seria automática ou, ainda, depende do procedimento junto à Municipalidade, previsto na legislação municipal? Parece-nos que desaparecendo a causa que constituiu a restrição, os efeitos não mais se produzem. A Municipalidade poderia argumentar que a restrição convencional incorporou-se ao sistema legal e, por isso, dele só deixaria de fazer parte pelos mecanismos que sua legislação instituiu. Incidiriam, aí, diplomas legais diversos. Os decorrentes da legislação federal e municipal. Parece estranho que a mesma restrição que constou do contrato tenha sido revogada ou alterada, conforme

as regras obrigacionais, com base em legislação federal aplicável, enquanto seus efeitos estão incorporados pela legislação municipal. O normal seria que as regras obrigacionais observem o seu curso natural, enquanto que as municipais, no caso, sigam apenas o aspecto supletivo das restrições, enquanto juridicamente existentes. Se estas desaparecem, por outros meios permitidos na legislação federal, os seus efeitos também estariam extintos. Essa simbiose de competências legislativas, portanto, além da duvidosa legalidade, causa perplexidade ao intérprete e, porque não dizer, insegurança jurídica aos contribuintes. A responsabilidade, pois, é do próprio sistema instituído pela legislação municipal. Enfim, a situação é nova e ainda não foi devidamente enfrentada, mas, no futuro, esse emaranhado de normas deverá ser solucionado, certamente as duras penas, nas esferas próprias. 4 - O REGISTRADOR E A POLÊMICA:

Temos acompanhado a evolução das interpretações, especialmente na esfera jurisdicional, sobre restrições convencionais. As decisões têm sido surpreendentes e só não são comentadas neste breve estudo por demandarem muitas outras considerações. Quanto ao registrador, no entanto, o que deve prevalecer é a regra prevista no item 191, Capítulo XX, das Normas de Serviço. “191. Todas as restrições presentes no loteamento, impostas pelo loteador ou pelo Poder Público serão mencionadas no registro do loteamento. Não caberá ao oficial, porém, fiscalizar sua observância”. Além dessa recomendação, sábia por sinal, ao Oficial compete apenas seguir as regras registrarias e normativas, sem adentrar a polêmica que o sistema jurídico integrado pelo Código Civil, Leis do Parcelamento e de Registros Públicos, além das Municipais, causaram, quanto ao tema, ao operador do direito em geral. ARISP JUS 15


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Apelação nº 0001157-04.2015.8.26.0189 Apelante: Paulo de Souza Apelado: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Fernandópolis Voto nº 29.496

DECISÃO ADMINISTRATIVA Selecionada por: Alberto Gentil de Almeida Pedroso

REGISTRO DE IMÓVEIS – INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPROMISSO DE VENDA E COMPRA – NECESSIDADE DE DESCRIÇÃO DOS IMÓVEIS E INDIVIDUALIZAÇÃO DE SEU PREÇO – ESPECIALIDADE OBJETIVA – INSTRUMENTO PARTICULAR QUE, SALVO QUANTO À FORMA, DEVE CONTER TODOS OS REQUISITOS ESSENCIAIS DO CONTRATO A SER ELABORADO (ART. 462 DO CÓDIGO CIVIL) – HIPOTECA CEDULAR – NECESSIDADE DA ANUÊNCIA DOS CREDORES HIPOTECÁRIOS – ARTIGO 59, DO DECRETO LEI N. 167/67 – REGISTRO DO INSTRUMENTO PARTICULAR QUE DÁ AO COMPROMISSÁRIO COMPRADOR DIREITO REAL DE AQUISIÇÃO – NECESSIDADE DE QUE A ANUÊNCIA CONSTE JÁ DO INSTRUMENTO E NÃO APENAS DA ESCRITURA - RECURSO DESPROVIDO. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 000115704.2015.8.26.0189, da Comarca de Fernandópolis, em que são partes é apelante PAULO DE SOUZA, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE FERNANDÓPOLIS. ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP E SALLES ABREU. São Paulo, 4 de agosto de 2016. PEREIRA CALÇAS CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Registro de Imóveis – instrumento particular de compromisso de venda e compra – necessidade de descrição dos Imóveis e individualização de seu preço – especialidade objetiva – instrumento particular que, salvo quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais do contrato a ser elaborado (Art. 462 Do Código Civil) – hipoteca cedular – necessidade da anuência dos credores hipotecários – Artigo 59, do decreto Lei N. 167/67 – registro do instrumento particular que dá ao compromissário comprador direito real de aquisição – necessidade de que a anuência conste já do instrumento e não apenas da escritura - recurso desprovido. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou procedente dúvida suscitada pelo Oficial do Cartório de Registro de Imóveis de Fernandópolis. A negativa de registro de Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra deveu-se a cinco exigências, feitas na nota de devolução: completa descrição dos imóveis mencionados no Instrumento; atribuição de valores individuais aos imóveis, que se referem a três diferentes matrículas; juntada de certidão de casamento do compromissário comprador, a fim de esclarecer o regime de bens; necessidade de constar, do Instrumento, o conhecimento do compromissário comprador acerca dos ônus incidentes sobre o imóvel; necessidade de anuência dos credores hipotecários quanto à alienação. A exigência da juntada de certidão de casamento foi cumprida, mas postulou-se a suscitação de dúvida no tocante às quatro outras exigências. A sentença albergou o entendimento do Oficial. O apelante alega, em síntese, que o Instrumento faz menção às características essenciais dos imóveis, notadamente o número de suas matrículas. Diz que não há óbice em que o Instrumento refira-se a um preço global de venda dos três imóveis, bastando que se divida o valor em três, utilizando-se, como critério, a área de cada um. No que respeita à exigência da ciência do compromissário comprador acerca dos ônus incidentes sobre o imóvel, afirma que, embora ela não conste do Instrumento, sua existência é inegável. Por fim, sobre a anuência dos credores hipotecários quanto à alienação, ressalta que se trata de mero Instrumento Particular e não de Escritura Pública, razão pela qual a transmissão da propriedade não se faz nesse momento.

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A Procuradoria de Justiça manifestou-se pelo desprovimento do recurso. É o relatório. O recurso não comporta provimento. A descrição insuficiente dos imóveis compromissados fere o princípio da especialidade objetiva. Para Afrânio de Carvalho, o princípio da especialidade do imóvel significa a sua descrição como corpo certo, a sua representação escrita como individualidade autônoma, com o seu modo de ser físico, que o torna inconfundível e, portanto, heterogêneo em relação a qualquer outro (Reg de Imóveis: comentários ao sistema de registro em face da Lei 6015/73, 2a ed., Rio de Janeiro, 1977, p. 219). Por isso, o imóvel deve estar perfeitamente descrito no título objeto de registro de modo a permitir sua exata localização e individualização, não se confundindo com nenhum outro. Narciso Orlandi Neto, ao citar Jorge de Seabra Magalhães, lembra que “as regras reunidas no princípio da especialidade impedem que sejam registrados títulos cujo objeto não seja exatamente aquele que consta do registro anterior. É preciso que a caracterização do objeto do negócio repita os elementos de descrição constantes do registro” (Narciso Orlandi Neto, Retificação do Registro de Imóveis, Juarez de Oliveira, pág. 68). Por esta razão, não se permite o registro de escritura pública ou instrumento particular que descreva o imóvel de forma diferente – ou deficitária - da que consta no registro de imóveis. O art. 176, § 1º, II, 3, da LEI Nº 6.015/73, arrola os elementos de identificação dos imóveis rural e urbano: a - rural, o código do imóvel, os dados constantes do CCIR, a denominação e suas características, confrontações, localização e área; b - urbano, suas características e confrontações, localização, área, logradouro, número e sua designação cadastral, se houver. Na hipótese dos autos – imóveis rurais – não basta a descrição de apenas parte dos elementos característicos. A especialidade objetiva, derivada de expresso texto legal, determina a completa congruência entre os elementos da matrícula e do título. No mesmo diapasão, exige-se o preço de cada imóvel, dado que cada um corresponde a uma matrícula. Novamente é a Lei 6.015/73 que o determina, ao rezar, no art. 176, §1º, III, 5, que deve contar, no Livro 2 (Registro Geral, destinado à matrícula dos imóveis), “o valor do contrato, da coisa ou da dívida, prazo desta, condições e mais especificações, inclusive os juros, se houver.” Ora, não cabe ao Oficial presumir o preço de cada um dos três imóveis compromissados, fazendo a divisão conforme a área de cada um, seja porque não há lei que o permita, seja porque 18 ARISP JUS

os valores dos imóveis podem sofrer influência de uma série de variáveis que não somente a área de cada um. Não fosse apenas isso, o valor de cada imóvel tem influência direta no cálculo dos emolumentos devidos pelos registros. A exigência da ciência acerca da existência de ônus reais sobre os imóveis também decorre de norma. Cuida-se do Decreto n. 93.240/86, que, ao tratar dos requisitos para a lavratura de escrituras públicas, diz, no art. 1º, §3º: § 3º A apresentação das certidões previstas no inciso IV, deste artigo, não eximirá o outorgante da obrigação de declarar na escritura pública, sob pena de responsabilidade civil e penal, a existência de outras ações reais e pessoais reipersecutórias, relativas ao imóvel, e de outros ônus reais incidentes sobre o mesmo. A regra vale para as escrituras e, via de consequência, para os instrumentos particulares de venda e compra, a teor do art. 462, do Código Civil, que reza: “O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.” Isso porque, à escritura pública, se bem vistas as coisas, remanesce apenas a função de, uma vez registrada, transmitir a propriedade. Mas todos os elementos do negócio estão, na verdade, já na promessa de venda e compra. Quanto à última exigência – anuência dos credores hipotecários -, vale ressaltar que prestigiada doutrina, destacando-se Orlando Gomes e José Osório de Azevedo Junior como seus defensores, vislumbra no compromisso de compra e venda, sem cláusula de arrependimento, um contrato preliminar impróprio. Diz José Osório, a respeito do compromisso de compra e venda: “Neste, as partes não se obrigam a uma nova manifestação de vontade e sim a reiterar, a reproduzir, a manifestação anterior, pois foi neste momento anterior que o consentimento foi dado de forma cabal e irreversível – motivo por que deste momento anterior devem ser considerados produzidos todos os efeitos concretos do ato. ... Assim é que a ‘escritura’ não se constitui em outro negócio jurídico, caracterizando-se – isto, sim – como um ‘ato devido’ que expressa o cumprimento da obrigação assumida no primeiro contrato (Compromisso de compra e venda, 6ª ed., São Paulo:Malheiros, 2013, p. 22/23). Logo, dada a vital importância do compromisso de venda e compra, não faz sentido afirmar que a anuência dos credores hipotecários – necessidade derivada do art. 59, do Decreto Lei n. 167/67 – poderá ser dada somente quando da lavratura da escritura. Aliás, uma vez registrada a promessa, adquiriria o promissário comprador direito real de aquisição, a teor dos artigos 1.417 e 1.418 do Código Civil, com possibilidade de execução forçada,


esvaziando-se a exigência de anuência dos credores hipotecários. A circunstância já foi bem apreendida por este Conselho Superior da Magistratura, no julgamento da apelação n. 544-6/4: “O artigo 59 do Decreto-lei nº 167/67 estabelece que os bens objeto de penhor ou de hipoteca constituídos por cédula de crédito rural não podem ser vendidos sem prévia anuência do credor, por escrito. E, por disposição contida no artigo 1.420 do Código Civil de 2002, as pessoas que não podem alienar também não podem empenhar, hipotecar ou dar em anticrese, assim como não podem ser dados em penhor, anticrese e hipoteca os bens que não podem ser alienados. Ao assim dispor criou o legislador garantia exclusiva em favor dos órgãos financiadores da economia rural, o que fez por meio de norma cogente, contida em lei especial que não foi revogada pelo Código Civil de 2002. Esta espécie de indisponibilidade relativa, também instituída por outras leis em favor dos detentores de hipotecas vinculadas à cédula de crédito à exportação (artigo 3º da Lei nº 6.313/75), cédula de crédito comercial (artigo 5º da Lei nº 6.840/80) e cédula de crédito industrial (artigo 51 do Decreto-lei nº 413/69), não conflita com as normas gerais estatuídas para a hipoteca no Código Civil de 2002, assim como não conflitava com as normas da mesma natureza contidas no Código Civil de 1916. Certo é que, no presente caso, houve tão só a promessa de venda e compra, mas esta, em sendo irrevogável e irretratável, uma vez registrada e quitada, conferirá direito real de aquisição a possibilitar posterior adjudicação compulsória, com fulcro nos artigos 1.417 e 1.418 do Código Civil, ‘verbis’: Artigo 1.417 - Mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel. Artigo 1.418 - O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel. O mesmo se depreende da leitura dos artigos 5º e 22 do Decretolei n° 58/37, bem como do artigo 25 da Lei nº 6.766/79. Atente-se para o decidido pelo E. Conselho Superior da Magistratura nos autos da Apelação Cível nº 71.416.0/3-00: REGISTRO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA — Imóvel gravado com cédula de crédito comercial hipotecária. Necessidade da anuência prévia e expressa do credor. Aplicação do

decreto-lei n° 413/69. Recurso a que se nega provimento. (...) O art. 51 do dec.-lei 413/69 regulamenta que ‘a venda dos bens vinculados à cédula de crédito industrial depende de prévia anuência do credor, por escrito’. O ato de registro do compromisso de compra e venda encontra previsão no art. 167, I, 9 da lei nº 6.015/73, por constituir ele um direito real, que se formaliza no fólio real para garantia do comprador. O instrumento particular de compromisso de venda e compra (...), ao contrário do que afirma a apelante, não é apenas uma cessão, ele transfere direitos sobre o imóvel, em consonância com sua cláusula nona, onde textualmente a apelante e os vendedores pactuaram que o compromisso é celebrado com ‘cláusula de irrevogabilidade e irretratabilidade, não admitindo arrependimento unilateral’. O compromisso de venda não é verdadeiramente um contrato preliminar. Não é por diversas razões que completam a originalidade do seu escopo, principalmente a natureza do direito que confere ao compromissário. Tem ele, realmente, o singular direito de se tornar proprietário do bem que lhe foi prometido irretratavelmente à venda, sem que seja inevitável nova declaração de vontade do compromitente (‘Direitos Reais’, Orlando Gomes, Forense, 6ª ed., 1978, pág. 329). Portanto, diante do registro da cédula de crédito comercial hipotecária, o imóvel a ela ficou vinculado, permanecendo subordinado à prévia anuência do credor no caso de sua alienação.” Do exposto, tem-se que as exigências feitas pelo Oficial do Registro de Imóveis de Fernandópolis são todas pertinentes e decorrem de lei.

DECISÃO ADMINISTRATIVA “REGISTRO DE IMÓVEIS - CESSÃO DE DIREITOS DE AQUISIÇÃO DE BEM IMÓVEL - RECUSA FUNDADA NA FALTA DE RECOLHIMENTO DE ITBI - JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NO STF E NO STJ NO SENTIDO DE QUE NÃO INCIDE ITBI SOBRE O COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA, PORQUE NÃO TRANSFERE O DOMÍNIO DO IMÓVEL - RACIOCÍNIO QUE TAMBÉM SE APLICA À CESSÃO DOS DIREITOS DO PROMITENTE COMPRADOR - RECURSO PROVIDO.” ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 002284324.2015.8.26.0554, da Comarca de Santo André, em que são parARISP JUS 19


tes é apelante OSNI DE OLIVEIRA, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SANTO ANDRÉ.

Sustenta o apelante, em resumo, que o registro do título que apresentou, ao contrário do que constou na sentença, não fere o princípio da continuidade (fls. 41/44).

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Por maioria de votos, deram por prejudicada a dúvida e não conheceram do recurso, com observação. Vencido o Desembargador Ricardo Dip, que declarará voto.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão.

A Procuradoria de Justiça opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 57/58).

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PAULO DIMAS MASCARETTI (Presidente), ADEMIR BENEDITO, XAVIER DE AQUINO, LUIZ ANTONIO DE GODOY, RICARDO DIP E SALLES ABREU. São Paulo, 4 de agosto de 2016. PEREIRA CALÇAS CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação nº 0022843-24.2015.8.26.0554 Apelante: Osni de Oliveira Apelado: 1º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Santo André Voto nº 29.507 Registro de Imóveis - Recusa ao ingresso carta de arrematação - Irresignação parcial - Dúvida prejudicada - Recurso não conhecido - Análise das exigências a fim de orientar futura prenotação. Princípio da continuidade – Registro de compromisso de compra e venda – Necessidade de registro do instrumento anterior a fim de viabilizar o encadeamento dos títulos. Falta de comprovação da representação das empresas cedentes, ausência de qualificação da esposa do cessionário, falta de reconhecimento de firma das duas testemunhas e ausência de apresentação de certidão de valor venal do imóvel para o cálculo de custas e emolumentos - Óbices que decorrem respectivamente do artigo 1.060 do Código Civil, item 63 do Capítulo XX das Normas de Serviço, artigo 221, II, da lei nº 6.015/73 e artigo 7º da Lei Estadual nº 11.331/02 – Exigências mantidas. Trata-se de recurso de apelação interposto por Osni de Almeida contra a sentença de fls. 31/32, que manteve a recusa ao registro de instrumento particular de cessão e transferência de direitos, no qual constam como promitentes cedentes MF Construção e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Telles & Telles Desenvolvimento Imobiliário Ltda, como anuentes Emilton Tofanelli e Ângela Italiana Buffone Tofanelli e como cessionário Osni de Almeida. 20 ARISP JUS

É o relatório. O instrumento particular de cessão de direitos acostado a fls. 8/13 foi prenotado no Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Santo André em 16 de setembro de 2015 (fls. 19). A recusa ao registro, conforme nota devolutiva de fls. 19/20, ocorreu por sete motivos: a) ofensa à continuidade; b) falta de comprovação da representação das empresas cedentes; c) ausência de qualificação da esposa do cessionário; d) omissão no instrumento acerca da cientificação das partes da possibilidade de obtenção prévia de prova de inexistência de débitos trabalhistas em nome da vendedora; e) falta de reconhecimento de firma das duas testemunhas; f) não comprovação do pagamento do ITBI; e g) ausência de apresentação de certidão de valor venal do imóvel para o cálculo de custas e emolumentos. Ocorre que o recorrente, em seu recurso (fls. 34/35), impugnou apenas a primeira exigência, declarando expressamente que cumpriria oportunamente as demais (fls. 34). A jurisprudência deste Conselho Superior é tranquila, porém, no sentido de que a concordância, ainda que tácita, com qualquer das exigências feitas pelo registrador ou o atendimento delas no curso da dúvida, ou do recurso contra a decisão nela proferida, prejudica-a: A dúvida registrária não se presta para o exame parcial das exigências formuladas e não comporta o atendimento de exigência depois de sua suscitação, pois a qualificação do título é feita, integralmente, no momento em que é apresentado para registro. Admitir o atendimento de exigência no curso do procedimento da dúvida teria como efeito a indevida prorrogação do prazo de validade da prenotação e, em consequência, impossibilitaria o registro de eventuais outros títulos representativos de direitos reais contraditórios que forem apresentados no mesmo período. Em razão disso, a aquiescência do apelante com uma das exigências formuladas prejudica a apreciação das demais matérias que se tornaram controvertidas. Neste sentido decidiu este Colendo Conselho Superior da Magistratura na Apelação Cível n.º 60.460.0/8, da Comarca de Santos, em que foi relator o Desembargador Sérgio Augusto Nigro Conceição, e na Apelação Cível n.º 81.685-0/8, da Comarca de Batatais, em que foi relator o Desembargador Luís de Macedo (Apelação Cível n.º 220.6/6-00). (grifei) Desse modo, prejudicada a dúvida, o recurso não pode ser conhecido, o que não impede o exame - em tese - das exigências, a fim de orientar futura prenotação. a) Ofensa à continuidade.


O óbice está correto. Consoante a matrícula nº 121.605 do 1º Registro de Imóveis de Santo André, a residência nº 1 do Residencial Aparecido Alberto Tizo é de propriedade de Ângela Italiana Buffone Tofanelli e Emilton Tofanelli. Assim, é inviável o registro de instrumento particular (fls. 8/13), por meio do qual terceiros (MF Construção e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Telles & Telles Desenvolvimento Imobiliário Ltda.), com a anuência dos proprietários (Ângela Italiana Buffone Tofanelli e Emilton Tofanelli) compromissam a venda do imóvel ao apelante. Aplica-se ao caso o artigo 195 da Lei nº 6.015/73: Art. 195 - Se o imóvel não estiver matriculado ou registrado em nome do outorgante, o oficial exigirá a prévia matrícula e o registro do título anterior, qualquer que seja a sua natureza, para manter a continuidade do registro. Ora, se o imóvel permanece em nome de Ângela Italiana Buffone Tofanelli e Emilton Tofanelli, é imprescindível que, antes do ingresso no fólio real do instrumento de fls. 8/13, registre-se o título que transfere a propriedade do bem a MF Construção e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e a Telles & Telles Desenvolvimento Imobiliário Ltda.. Só assim preservar-se-á a continuidade registral. É certo que, juntamente com o instrumento de fls. 8/13, os interessados apresentaram o contrato acostado a fls. 14/16, por meio do qual Ângela Italiana Buffone Tofanelli e Emilton Tofanelli, para a quitação de três contratos de compromisso de compra e venda relativos a três imóveis, transferiram a propriedade do imóvel matriculado sob o nº 121.605 no 1º Registro de Imóveis de Santo André a MF Construção e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e a Telles & Telles Desenvolvimento Imobiliário Ltda.. Esse contrato anterior, firmado em 2008, em tese, conservaria o princípio da continuidade. No entanto, salvo raras exceções (parte final do artigo 108 do Código Civil, artigo 89 da Lei nº 6.404/76, artigo 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79), em que se admite o uso de instrumento particular, a transferência da propriedade de bens imóveis se dá com o registro da escritura pública no registro imobiliário. Se por vício de forma o instrumento particular de fls. 14/16 não pode ser registrado, a consequência inevitável é a desqualificação do instrumento de fls. 8/13, porquanto, para a preservação do princípio da continuidade, o ingresso registral do segundo título dependia do registro anterior do primeiro. b) Falta de comprovação da representação das empresas cedentes.

Tem razão o registrador também nesse ponto. Prescreve o artigo 1.060 do Código Civil: Art. 1.060. A sociedade limitada é administrada por uma ou mais pessoas designadas no contrato social ou em ato separado. Parágrafo único. A administração atribuída no contrato a todos os sócios não se estende de pleno direito aos que posteriormente adquiram essa qualidade. Desse modo, somente com a apresentação dos contratos sociais das empresas, comprovar-se-ia que Manoel Telles da Cruz tem efetivamente poderes para representar MF Construção e Empreendimentos Imobiliários Ltda. e Telles & Telles Desenvolvimento Imobiliário Ltda. (fls. 8). c) Ausência de qualificação da esposa do cessionário. Essa exigência encontra amparo no item 63 do Capítulo XX das Normas de Serviço, que tem a seguinte redação: “63. A qualificação do proprietário, quando se tratar de pessoa física, referirá ao seu nome civil completo, sem abreviaturas, nacionalidade, estado civil, profissão, residência e domicílio, número de inscrição no Cadastro das Pessoas Físicas do Ministério da Fazenda (CPF), número do Registro Geral (RG) de sua cédula de identidade ou, à falta deste, sua filiação e, sendo casado, o nome e qualificação do cônjuge e o regime de bens no casamento, bem como se este se realizou antes ou depois da Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977”. Ainda que o item acima transcrito se refira ao proprietário, não há motivo para que o detentor dos direitos de compromissário comprador – como ocorre na hipótese em análise (fls. 8/13) – seja tratado de modo diverso. A correta qualificação do titular de direito inscrito decorre do princípio da especialidade subjetiva e implica, de acordo com o item 63 do Capítulo XX das Normas, a obrigatória referência ao nome de seu cônjuge e ao regime de bens de seu casamento. d) Omissão no instrumento acerca da cientificação das partes da possibilidade de obtenção prévia de prova de inexistência de débitos trabalhistas em nome da vendedora. Esse óbice, embora baseado nos itens 42 e 44, do Capítulo XIV das Normas de Serviço[1], não deve aqui ser analisado, uma vez que se trata de requisito necessário para a escritura pública, instrumento esse que, no caso em análise, sequer foi lavrado e apresentado. e) Falta de reconhecimento de firma das duas testemunhas. Correta a exigência. Preceitua o artigo 221, II, da lei nº 6.015/73: ARISP JUS 21


Art. 221 - Somente são admitidos registro: (...) II - escritos particulares autorizados em lei, assinados pelas partes e testemunhas, com as firmas reconhecidas, dispensado o reconhecimento quando se tratar de atos praticados por entidades vinculadas ao Sistema Financeiro da Habitação; (grifei) Não tendo havido o reconhecimento das firmas das duas testemunhas que assinaram o instrumento (fls. 13), correta a devolução do título por essa razão. f) Não comprovação do pagamento do ITBI. Aqui se aplica o mesmo raciocínio utilizado no item “d” supra. A comprovação do pagamento do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis para o registro do título, exigência que emana do item 119.1 do Capítulo XX das Normas de Serviço[2], é necessária somente nos casos em que há transferência de propriedade. É entendimento pacífico neste Conselho que não incide ITBI em contratos de compromisso de compra e venda e em cessões desses instrumentos. Nesse sentido: “REGISTRO DE IMÓVEIS - CESSÃO DE DIREITOS DE AQUISIÇÃO DE BEM IMÓVEL - RECUSA FUNDADA NA FALTA DE RECOLHIMENTO DE ITBI - JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NO STF E NO STJ NO SENTIDO DE QUE NÃO INCIDE ITBI SOBRE O COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA, PORQUE NÃO TRANSFERE O DOMÍNIO DO IMÓVEL - RACIOCÍNIO QUE TAMBÉM SE APLICA À CESSÃO DOS DIREITOS DO PROMITENTE COMPRADOR - RECURSO PROVIDO.” (Apelação nº 1002630-12.2014.8.26.0587, Rel. Des. Xavier de Aquino, j. em 15/12/2015). “REGISTRO DE IMÓVEIS - Instrumento particular de contrato de promessa de venda e compra de unidade condominial a ser construída e outras avenças - Reconhecimento de firmas e informação sobre o estado civil do promitente comprador - Exigências pertinentes não questionadas nem cumpridas - Irresignação parcial - Dúvida prejudicada - Comprovação do recolhimento do ITBI e anuência da credora hipotecária - Exigências descabidas - Tributo não incidente - Precedentes do STF e do STJ - Inaplicabilidade do parágrafo único do artigo 1.° da Lei n.° 8.004/1990 ao caso dos autos - Súmula n° 308 do STJ - Recurso não conhecido.” (Apelação n° 9000007-68.2011.8.26.0577, Rel. José Renato Nalini). No entanto, tendo em vista que a transferência da propriedade somente poderia ocorrer mediante o registro de escritura pública[3] – instrumento esse que sequer foi lavrado e apresentado –, a comprovação do recolhimento do imposto de transferência não condiciona o registro do contrato de fls. 8/13, mas sim o do título cujo ingresso deve ser anterior. g) Ausência de apresentação de certidão de valor venal do 22 ARISP JUS

imóvel para o cálculo de custas e emolumentos. Com razão o Oficial. Prescreve a Lei nº 11.331/02: Artigo 7º - O valor da base de cálculo a ser considerado para fins de enquadramento nas tabelas de que trata o artigo 4º, relativamente aos atos classificados na alínea “b” do inciso III do artigo 5º, ambos desta lei, será determinado pelos parâmetros a seguir, prevalecendo o que for maior: I - preço ou valor econômico da transação ou do negócio jurídico declarado pelas partes; II - valor tributário do imóvel, estabelecido no último lançamento efetuado pela Prefeitura Municipal, para efeito de cobrança de imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana, ou o valor da avaliação do imóvel rural aceito pelo órgão federal competente, considerando o valor da terra nua, as acessões e as benfeitorias; III - base de cálculo utilizada para o recolhimento do imposto de transmissão “inter vivos” de bens imóveis. Nota-se que a apresentação de certidão do valor venal do imóvel negociado é imprescindível para o cálculo dos emolumentos decorrentes do registro. Isso ocorre porque, de acordo com o artigo acima transcrito, três valores devem ser comprados – dentre eles o valor venal – e o maior deles é utilizado para o cálculo dos emolumentos. Com tais observações, dou por prejudicada a dúvida e não conheço do recurso. Após, com cópia deste voto, abra-se expediente, no bojo do qual será analisada a conveniência da alteração dos itens 42 e 44, letra “s”, do Capítulo XIV das Normas de Serviço. PEREIRA CALÇAS Corregedor Geral da Justiça e Relator VOTO (com divergência): 1.Acompanho a conclusão do respeitável voto de Relatoria. 2.Peço reverente licença, entretanto, para não aderir à “análise de mérito” a que se lançou após afirmar não conhecer do recurso. 3.Ao registrador público, tendo afirmada, per naturam legemque positam, a independência na qualificação jurídica (vidç arts. 3º e 28 da Lei n. 8.935, de 18-11-1994), não parece possam impor-se, nessa esfera de qualificação, “orientações” prévias e abstratas de caráter hierárquico.


Assim, o registrador tem o dever de qualificação jurídica e o direito de efetivá-la com independência profissional, in suo ordine. 4.Vem a propósito que a colenda Corregedoria Geral da Justiça paulista, em seu código de normas, enuncia:

transmissão e prova de recolhimento do laudêmio, quando devidos, nenhuma exigência relativa à quitação de débitos para com a Fazenda Pública, inclusive quitação de débitos previdenciários, fará o oficial, para o registro de títulos particulares, notariais ou judiciais.

“Os oficiais de Registro de Imóveis gozam de independência jurídica no exercício de suas funções e exercem essa prerrogativa quando interpretam disposição legal ou normativa. (…)” (item 9º do cap. XX das “Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo”).

[3] Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

5.Se o que basta não bastara, calha que os órgãos dotados de potestas para editar regras técnicas relativas aos registros públicos são os juízes competentes para o exercício da função correcional (o que inclui a egrégia Corregedoria Geral da Justiça; cf. inc. XIV do art. 29 da Lei n. 8.935/1994). Essa função de corregedoria dos registros, em instância administrativa final no Estado de São Paulo, não compete a este Conselho Superior da Magistratura, Conselho que, a meu ver, não detém, ao revés do que respeitavelmente entendeu o venerando voto de relação, “poder disciplinador” sobre os registros e as notas (v., a propósito, os incs. XVII a XXXIII do art. 28 do Regimento Interno deste Tribunal). 6.Averbo, por fim, que a admitir-se a pretendida força normativa da ventilada “orientação”, não só os juízes corregedores permanentes estariam jungidos a observá-la, mas também as futuras composições deste mesmo Conselho. Deste modo, voto no sentido de que se exclua a r. “orientação para casos similares”. É, da veniam, meu voto de vencido.

DECISÃO JURISDICIONAL EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO. Imóvel rural matriculado em gleba maior, com sucessivas alienações e transmissões hereditárias de partes ideais dentro do todo. Autores titulares de cessão de direitos hereditários sobre parte ideal, ainda não levada ao registro imobiliário. Impossibilidade de se postular a extinção apenas parcial do condomínio, em face de co-titulares de parte ideal, sem a citação de todos os demais condôminos da gleba maior. Próprio título dos autores sem comprovação de idoneidade. Cessão de direitos hereditários de fração ideal de imóvel rural por parentes colaterais de terceiro grau de condômino. Não foram apresentados inventários ou qualquer comprovação da titularidade dos direitos hereditários sobre o imóvel. Não se sabe com a indispensável dose de certeza se os colaterais de terceiro grau cedentes eram reais herdeiros do condômino. Autores supostamente esbulhados da posse certa em gleba de condomínio pro diviso. Inviabilidade de extinção do condomínio. Manutenção da sentença. Recurso não provido. ACÓRDÃO

Des. RICARDO DIP Presidente da Seção de Direito Público [1] 42. O Tabelião de Notas deve cientificar as partes envolvidas de que é possível obter, nos termos do artigo 642-A da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, nas seguintes hipóteses: a) alienação ou oneração, a qualquer título, de bem imóvel ou direito a ele relativo; b) partilha de bens imóveis em razão de separação, divórcio ou união estável. 44. A escritura pública, salvo quando exigidos por lei outros requisitos, deve conter: (...) s) referência, quando for o caso, ao cumprimento do item 42 deste capítulo das NSCGJ;

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0007242-41.2012.8.26.0082, da Comarca de Boituva, em que são apelantes ISABEL CRISTINA SOLFA GUISARD ROCHA, ISABELLA SOLFA GUISARD ROCHA, AYRAN SOLFA GUISARD ROCHA e KAYO SOLFA GUISARD ROCHA, são apelados ROSANGELE CARVALHO DE REZENDE CORREA, ANDRÉ GABRIEL CORREA NETO, CINTHIA PAULA CARVALHO CORREA e SAINT CLAIR CARVALHO CORREA. ACORDAM, em 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores CLAUDIO GODOY (Presidente) e CHRISTINE SANTINI. São Paulo, 13 de setembro de 2016 FRANCISCO LOUREIRO RELATOR

[2] 119.1. Com exceção do recolhimento do imposto de ARISP JUS 23


Apelação Cível nº_ 0007242-41.2012.8.260082 Comarca: Boituva Juiz: Heloisa Helena Franchi Nogueira Lucas Apelante: Isabel Cristina Solfa Guisardi Rocha e Outros Apelado: Rosangele Carvalho de Rezende Correa e Outros VOTO Nº 29.937 EXTINÇÃO DE CONDOMÍNIO. Imóvel rural matriculado em gleba maior, com sucessivas alienações e transmissões hereditárias de partes ideais dentro do todo. Autores titulares de cessão de direitos hereditários sobre parte ideal, ainda não levada ao registro imobiliário. Impossibilidade de se postular a extinção apenas parcial do condomínio, em face de co-titulares de parte ideal, sem a citação de todos os demais condôminos da gleba maior. Próprio título dos autores sem comprovação de idoneidade. Cessão de direitos hereditários de fração ideal de imóvel rural por parentes colaterais de terceiro grau de condômino. Não foram apresentados inventários ou qualquer comprovação da titularidade dos direitos hereditários sobre o imóvel. Não se sabe com a indispensável dose de certeza se os colaterais de terceiro grau cedentes eram reais herdeiros do condômino. Autores supostamente esbulhados da posse certa em gleba de condomínio pro diviso. Inviabilidade de extinção do condomínio. Manutenção da sentença. Recurso não provido. Cuida-se de recurso de apelação interposto contra a r. sentença de fls. 268/271, que julgou extinta sem resolução de mérito a ação de extinção de condomínio proposta por ISABEL CRISTINA SOLFA GUISARD ROCHA E OUTROS em face de ROSANGELE CARVALHO DE REZENDE CORREA E OUTROS. Fê-lo a r. sentença, basicamente sob o fundamento de que não houve o registro da cessão de direitos hereditários na matrícula do imóvel. Acrescentou que inexiste notícia de inventário e partilha dos bens deixados pelo condômino de cujus. Portanto, não é possível aferir com certeza se os sobrinhos do falecido são titulares do direito cedido, havendo dúvidas quanto à eficácia da cessão. Destaca ainda a MM. Juíza a quo a impossibilidade de extinção de condomínio somente de fração ideal de imóvel rural, sem a participação de todos os demais condôminos no polo passivo da demanda. Quanto ao pedido de indenização suplementar de lucros cessantes, salienta a inexistência da causa de pedir e a falta de interesse processual. Os autores apelantes alegam, em síntese, que adquiriram 50% da acessão industrial imobiliária sobre a fração ideal de 2,949% de direitos hereditários em imóvel rural com área total de 12 alqueires. Aduzem a ocorrência de esbulho possessório por parte dos réus apelados, que os impediram de usar e fruir da casa conjuntamente adquirida em condomínio voluntário. 24 ARISP JUS

Pugnam pela extinção do condomínio. Em razão do exposto e pelo que mais argumentam às fls. 277/284, pedem o provimento de seu recurso. O apelo foi contrariado (fls. 291/295). É o relatório. 1. O frágil recurso não comporta provimento. Segundo se depreende dos autos, em 07.06.1999, os autores apelantes adquiriram conjuntamente com os apelados direitos hereditários correspondentes à fração ideal de 2,949% do imóvel rural localizado no município de Iperó, Comarca de Porto Feliz, conforme escritura pública de cessão de direitos hereditários às fls. 13/14. Os apelantes ISABELLA SOLFA GUISARD ROCHA, AYRAN SOLFA GUISARD ROCHA, KAYO SOLFA GUISARD ROCHA conjuntamente com os apelados ANDRÉ GABRIEL CORREA NETO, SAINT CLAIR CARVALHO CORREA e CINTHIA PAULA CARVALHO CORREA adquiriram, em condomínio voluntário, a nua propriedade da fração ideal do imóvel rural acima descrito. Enquanto que a apelante ISABEL CRISTINA SOLFA GUISARD ROCHA e a apelada ROSANGELE CARVALHO DE REZANDE CORREA adquiriram o co- usufruto sobre a fração ideal. Aparentemente ambas as famílias entraram na posse direta do imóvel, incluindo nus proprietários e usufrutuárias. Na sequência, construíram duas casas de madeira, livremente utilizadas pelas partes de comum acordo. Ocorre, porém, que após os apelantes manifestarem desejo de alienar sua fração ideal, houve esbulho possessório por parte dos apelados. Requerem os autores a extinção do condomínio e subsequente alienação judicial do imóvel comum, com pedido cumulativo de indenização por perdas e danos. 2. Inviável o pedido de extinção de condomínio, e por mais de uma razão. Primeiro, porque não há sequer certeza e segurança da situação jurídica das partes em relação ao imóvel. Não se tem notícia de inventário ou arrolamento e partilha de bens do condômino Benedito Antunes Oliveira, legitimo proprietário da fração ideal de 2,494% do imóvel rural, conforme matrícula às fls. 15/17 dos autos.


Evidente que por direito de saisine, aberta a sucessão com a morte do de cujus, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários (art. 1.575 do CC/02). Ocorre que, no caso concreto, os cedentes dos direitos hereditários são parentes de terceiro grau em linha transversal na vocação hereditária, e não se têm a exata noção dá existência, ou não, de classes anteriores na linha sucessória. Dizendo de outro modo, como não foi aberto, ou ao menos disso não se tem notícia, o inventário do condômino Benedito, persiste situação de incerteza se os sobrinhos cedentes de direitos hereditários eram os reais herdeiros.

O Tribunal de Justiça de São Paulo já admitiu, em oportunidades anteriores, a extinção de co-titularidade de direitos sobre coisa comum, ainda que sem domínio pleno formal. Porém, na fattispecie, além de não ser possível se afirmar ao certo se houve ou não transmissão da propriedade do imóvel aos cedentes, em vista de possíveis classes sucessórias anteriores, os autores não mais se encontram nem mesmo na posse do imóvel. 5. Em suma, por qualquer ângulo que se analise a questão a sentença se mostra correta, pois inviável a extinção do condomínio. Nego provimento ao recurso.

3. Não fosse suficiente, a certidão da matrícula no. 20407 do Oficial de Registro de Imóveis de Porto Feliz (fls. 15/17dos autos) dá conta que o imóvel rural em questão tem área de superfície de 12,13 alqueires, e ao longo dos anos foi objeto de sucessivas alienações de partes ideais. Aparentemente foi o solo parcelado, mediante sucessivas alienações de partes ideais com posses localizadas, criando a figura de condomínio pro-diviso. Os condôminos são titulares de frações ideais, mas com posses localizadas dentro do todo. Sucede que não podem os autores, como pleiteiam na inicial, pedir a extinção do condomínio somente no tocante à pequena parte ideal de 2,949% sobre o todo, da qual são cessionários de supostos direitos hereditários, sem registro do título. A extinção do condomínio, como corretamente anotou a sentença, deve abranger a totalidade do imóvel, com inclusão de todos os condôminos como litisconsortes passivos necessários. Admitir o pedido inicial criaria contradição em termos: seria extinto o condomínio sobre parte ideal, o que não geraria aos autores domínio pleno sobre parte certa do todo. 4. O que se deduz da confusa situação descrita nos autos é que os autores almejam, na realidade, discussão sobre a posse exclusiva dos requeridos sobre parte ideal de condomínio pro-diviso. A solução do conflito não passa pela extinção do condomínio, como acima visto, mas sim no campo estritamente possessório. É certo que não há propriedade formal sobre o imóvel comum. É texto expresso dos artigos 1.228 e 1.245 do Código Civil que a propriedade imobiliária se adquire pelo registro, de natureza constitutiva. Disso decorre que, enquanto não regularizada a titularidade do domínio, a situação das partes não é de condomínio propriamente dito, mas, no máximo, de composse, ou de co-titularidade de direitos pessoais sobre o imóvel.

FRANCISCO LOUREIRO Relator

DECISÃO JURISDICIONAL CIVIL. IMÓVEL RESIDENCIAL DE PROPRIEDADE DA UNIÃO. TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO ÚTIL A PARTICULARES. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DE LAUDÊMIO. LEI 9.636/98. IRREGULARIDADE FORMAL QUE NÃO ATINGE A ESSÊNCIA DO ATO. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA NÃO PROVIDAS. RECURSO ESPECIAL Nº 1.590.022 - MA (2016/0066470-8) RELATOR: MINISTRO HERMAN BENJAMIN RECORRENTE: UNIÃO RECORRIDO: EMPRESA MARANHENSE DE ADMINISTRAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS E NEGÓCIOS PÚBLICOS S/A - EMARHP ADVOGADOS: JOSÉ CARLOS ROLIM FERNANDO DA ROCHA SANTOS RAMOS E OUTRO(S) RECORRIDO: CARTÓRIO DE REGISTRO G E R A L DE IMÓVEIS 1A CIRCUNSCRIÇÃO DE SÃO LUIS - MA RECORRIDO: JOAO DAMASCENO CUTRIM COSTA RECORRIDO: DEUSAMAR FERREIRA COSTA ADVOGADO: SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS RELATÓRIO O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Cuida-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, “a”, da Constituição da República, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região assim ementado (fl. 206, e-STJ):

ARISP JUS 25


CIVIL. IMÓVEL RESIDENCIAL DE PROPRIEDADE DA UNIÃO. TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO ÚTIL A PARTICULARES. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DE LAUDÊMIO. LEI 9.636/98. IRREGULARIDADE FORMAL QUE NÃO ATINGE A ESSÊNCIA DO ATO. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA NÃO PROVIDAS. 1- Além de não comprovado o alegado prejuízo ao patrimônio público, a falta de pagamento do laudêmio previsto pela Lei n° 9.336/98 para transferência do domínio útil de imóvel residencial de propriedade da União, caracteriza mera irregularidade formal, não atingindo a essencialidade do ser convalidado com o saneamento posterior do vício. 2 - Portanto, este não e o caso de decretação de nulidade do registro imobiliário, senão de execução posterior do laudêmio exigido em lei, com a conseqüente responsabilização dos titulares dos cartórios pelos eventuais prejuízos suportados pela recorrente. 3 - Apelação e remessa oficial que se negam provimento.

Os Embargos de Declaração foram rejeitados (fls. 211-214, e-STJ). A parte recorrente alega violação do art. 535, II, do CPC e do art. 166, IV, do CC. Afirma que o acórdão é omisso, porquanto deixou de apreciar diversas questões de direito (fl. 226, e-STJ). Aduz que a EC 46/2005 não poderia atingir os direitos adquiridos da União sobre os imóveis registrados no cartório em seu nome (fl. 232, e-STJ). Sem contrarrazões. É o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 1.590.022 - MA (2016/0066470-8) VOTO O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Os autos foram recebidos neste Gabinete em 16.5.2016. A irresignação merece parcial acolhimento.

1. Não se conhece da alegada violação do art. 535, II, do Código de Processo Civil - CPC quando são apresentadas alegações genéricas sobre as suas negativas de vigência. Óbice da Súmula 284 do STF. (...) 3. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 44.316/SE, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 18/02/2014).

ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. MILITAR. LICENCIAMENTO. OMISSÃO DO JULGADO REGIONAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA 284/STF. PRECEDENTES. INEXISTÊNCIA DE INVALIDEZ TOTAL E DEFINITIVA PARA O TRABALHO CASTRENSE. REFORMA INCABÍVEL. SÚMULA 7/STJ. 1. É deficiente a fundamentação do recurso especial em que a alegação de ofensa ao art. 535 do CPC se faz de forma genérica. Aplica-se, assim, o óbice da Súmula 284 do STF. Precedentes do STJ. 2. A alteração das conclusões adotadas pela instância ordinária quanto à inexistência de invalidez total e definitiva para o trabalho castrense, tal como colocada a questão nas razões recursais, exigiria, necessariamente, novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1.341.229/RJ, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe 17/2/2014).

Trata a presente demanda de pedido de anulação de contrato de compra e venda de imóvel entabulado e registrado pelos requeridos no Cartório do Registro Geral de Imóveis da 1ª Circunscrição de São Luis/MA sem o prévio recolhimento do laudêmio, em quantia correspondente a 5% do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias. O acórdão recorrido não vislumbrou prejuízo ao patrimônio público, porque a irregularidade formal do contrato não atingiria a essencialidade do ato de compra e venda. Ademais, o valor devido do laudêmio poderia ser cobrado posteriormente através de Ação de Execução.

A parte recorrente sustenta que o art. 535, II, do CPC foi violado, mas deixa de apontar, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Assim, é inviável o conhecimento do Recurso Especial nesse ponto, ante o óbice da Súmula 284/STF. Cito precedentes:

Para melhor compreensão da controvérsia, transcrevo o art. 3º do Decreto-Lei 2.398/1987, que dispõe sobre foros, laudêmios e taxas de ocupação relativas a imóveis de propriedade da União, e dá outras providências, prequestionado implicitamente no acórdão vergastado.

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA 284/STF. ARTIGOS INFRACONSTITUCIONAIS APONTADOS COMO VIOLADOS NÃO PREQUESTIONADOS. SÚMULA 211/STJ. LAUDOS TÉCNICOS DIVERGENTES. VALORES EM DESCOMPASSO. REVISÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ.

Art. 3o A transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil e da inscrição de ocupação de terreno da União ou cessão de direito a eles relativos dependerá do prévio recolhimento do laudêmio, em quantia correspondente a 5% (cinco por cento) do valor atualizado do domínio pleno do terreno, excluídas as benfeitorias. §1° As transferências parciais de aforamento ficarão sujeitas a novo foro para a parte desmembrada. § 2o Os Cartórios de Notas e Registro de Imóveis, sob pena de responsabilidade dos seus respectivos titulares, não lavrarão nem registrarão escrituras relativas a bens imóveis de propriedade da União,

26 ARISP JUS


ou que contenham, ainda que parcialmente, área de seu domínio: I - sem certidão da Secretaria do Patrimônio da União - SPUque declare: a) ter o interessado recolhido o laudêmio devido, nas transferências onerosas entre vivos; b) estar o transmitente em dia, perante o Patrimônio da União, com as obrigações relativas ao imóvel objeto da transferência; e c) estar autorizada a transferência do imóvel, em virtude de não se encontrar em área de interesse do serviço público;

II - sem a observância das normas estabelecidas em regulamento.

Os bens públicos podem ser classificados como bens de uso comum do povo, bens de uso especial e bens dominicais. A diferença principal entre eles reside no fato de que as duas primeiras espécies possuem destinação pública, enquanto a terceira não a possui. Os terrenos pertencentes à União são bens públicos, apesar de os bens dominicais terem destinação precipuamente particular. Seguindo o escólio da ilustre professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, que alerta em sua obra Direito Administrativo, 5ª edição, ed. Atlas, pg. 425, de que “o regime dos bens dominicais é parcialmente público e parcialmente privado”. Por isso, devemos ter consciência de que a sua natureza não é exclusivamente patrimonial, pois a Administração Pública não deseja apenas auferir renda, mas, também observar o interesse coletivo representado pelo domínio direto do imóvel. Conforme explicitado os bens dominicais possuem especificidades com relação à propriedade privada, que é regulada exclusivamente pelo Código Civil. Dentre elas, existe o direito de transferir onerosamente o domínio útil do imóvel mediante o pagamento de laudêmio, pois se trata, como dito alhures, de relação de natureza híbrida. Portanto, o contrato de compra e venda desses imóveis devem revestir formalidades sem as quais desnaturam a sua natureza jurídica. Não é somente o pagamento do laudêmio que diferencia essa espécie de transferência onerosa entre vivos, mas, e, principalmente, a autorização da união para a realização do negócio jurídico. Como se trata de bem público de interesse da União, ela deve acompanhar de perto, através da Secretaria de Patrimônio da União, a realização de sua transferência, pois, como dispõe a lei, pode ocorrer a vinculação do imóvel ao serviço público. A propósito: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO FISCAL. IMÓVEIS DA UNIÃO. TERRENO DE MARINHA. TAXA ANUAL DE OCUPAÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. TRANSFERÊNCIA DA OCUPAÇÃO DO IMÓVEL A TERCEIRO. CESSÃO DE POSSE. NÃO OPONÍVEL EM FACE DA UNIÃO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO. PAGAMENTO. RESPONSABILIDADE DE QUEM FIGURA COMO OCUPANTE NO CADASTRO DA

SECRETARIA DE PATRIMÔNIO DA UNIÃO - SPU. 1. A controvérsia posta no recurso especial decorre da cobrança de crédito pelo não recolhimento da Taxa de Ocupação dos exercícios 1999, 2000 e 2001, referentes à imóvel da União (terrenos de marinha), efetuada originariamente pela Fazenda Nacional por meio de execução fiscal. O recorrente além de apontar divergência jurisprudencial acerca da interpretação dada pelo acórdão recorrido ao artigo 7º da Lei n. 9.636/98, a qual difere do entendimento esposado pela Tribunal Regional Federal da 4ª Região, alega violação do artigo 535 do CPC, ao argumento de que o Tribunal de origem incorreu em omissão quanto ao exame do artigo 7º da Lei n. 9.636/98, que eximiria o recorrente de responsabilidade pelo pagamento da dívida referente à taxa de ocupação. Para tanto aduz o seguinte: a) que não é proprietário da área da qual é cobrada a taxa de ocupação, mas sim a União, ocupando o referido imóvel até 1997, e que o atual ocupante é quem deveria arcar com o débito, em face da alienação do imóvel; b) a taxa de ocupação cobrada não é espécie tributária, tendo natureza jurídica de preço público; c) que não há como transcrever o título de alienação junto ao Registro Geral de Imóveis uma vez que se trata de cessão de posse e não de domínio; e d) a transferência de responsabilidade pelo recolhimento da taxa de ocupação, independe de pagamento de laudêmio. 2. O Tribunal de origem sobre o tema em discussão assim se pronunciou: a) a Taxa de Ocupação tem como fato gerador o domínio útil dos terrenos de marinha e é exigida de quem detém os poderes inerentes à propriedade, sendo certo que a promessa de compra e venda não tem o condão de transferir a propriedade, o que, segundo disciplinam o art. 1.245 e seus parágrafos do Código Civil, se dá mediante o registro do título translativo perante o Registro de imóveis; b) o objeto do contrato de promessa de compra e venda é o imóvel sobre o qual incide a taxa exigida nos autos, não havendo notícia da transcrição no Registro de Imóveis do título translativo da propriedade, não há como deixar de reconhecer a responsabilidade do devedor, que a toda evidência, figura como real proprietário do imóvel; e c) a cláusula de transferência de responsabilidade dos créditos exeqüendos é inoponível em face da Fazenda Pública, porquanto as normas reguladoras da responsabilidade tributária são de ordem pública, portanto insuscetíveis de modificação pelas partes (art. 123, do CTN). (...) 4. Os terrenos de marinha são bens públicos que se destinam historicamente à defesa territorial e atualmente à proteção do meio ambiente costeiro, permitindo-se a ocupação por particulares, mediante o pagamento de taxa de ocupação e de laudêmio quando da transferência, em relação eminentemente pública, regida pelas regras do direito administrativo. 5. A responsabilidade de pagamento da referida a taxa nasce com a inscrição do terreno de marinha na Secretaria do Patrimônio da União (SPU), do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, responsável por seu registro, consoante preconiza o artigo 7º da Lei n. 9.636/98. A inscrição do terreno pela Administração Pública é o ato em que se define quem efetivamente aproveita o imóvel, e que se tornará obrigado ao pagamento da taxa de ocupação. A partir desse momento, não são oponíveis contra a Administração Pública o não aproveitamento do imóvel, negócios jurídicos, desocupação, senão pelo estreito caminho que leva à Administração a ciência da situação real do bem cujo poder-dever de administrar lhe compete. 6. O processo de inscrição de ocupação do imóvel junto à SPU guarda semelhança como o próprio registro de imóveis. Isso porque a ARISP JUS 27


Lei exige que antes de levada a transferência a registro, é imprescindível, além do pagamento do laudêmio, a ciência da Administração para que ela autorize a transferência. Feitas essas diligências, poderá o Cartório averbar a transferência e permitir que o adquirente altere a inscrição do registro na SPU. Só a partir daí o adquirente terá justo título para ostentar a situação de “ocupante de direito” do imóvel pertencente à União. Enquanto isso não ocorrer, permanecerá na inscrição do imóvel o antigo ocupante, podendo responder pelo adimplemento da taxa, caso dos autos. 7. A comunicação do negócio jurídico formalizado entre o ocupante e terceiro à SPU não se reveste de ato de mera formalidade, mas se constitui em medida de essencial importância e que produz efeitos jurídicos relevantes, uma vez que a União é a proprietária do terreno de marinha (artigo 1º, “a”, do Decreto-lei n. 9.760/46) e, nessa qualidade, deverá estar sempre a par e consentir com a utilização de bem que lhe pertence. 8. É pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que o título de propriedade do particular não é oponível à União nesses casos, pois os terrenos de marinha são da titularidade originária deste ente federado, na esteira do que dispõem a Constituição da República e o Decreto-lei n. 9.760/46. 9. Recurso especial não provido. (REsp 1.201.256/RJ, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe 22/2/2011).

Ademais, os Cartórios de Registro de Imóveis têm a obrigação de não lavrar nem registrar escrituras relativas a bens imóveis de propriedade da União sem a certidão da Secretaria do Patrimônio da União - SPU, sob pena de responsabilidade dos seus titulares. Por tudo isso, conheço parcialmente do recurso e, nessa parte, dou-lhe provimento para declarar a nulidade do negócio jurídico de compra e venda do imóvel; consequentemente, condeno os recorridos ao pagamento das custas e honorários advocatícios que fixo em R$ 5.000,00, em conformidade com o art. 20, § § 3º e 4º, do CPC de 1973. E, por fim, determino que se oficie a corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão para que averigue a responsabilidade do titular do Cartório do Registro Geral de Imóveis da 1ª Circunscrição de São Luis/MA.

TES. PROVA TESTEMUNHAL. IRRELEVÂNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. A VENDA DE IMÓVEL POR MEIO DE ESCRITURA PÚBLICA, EM OBEDIÊNCIA AO ART. 108 DO CC, ENSEJA QUE O DISTRATO SIGA A MESMA FORMA (ART. 472 DO CC), SENDO QUE A MERA ASSINATURA DE INSTRUMENTO PARTICULAR, AINDA MAIS SEM QUALQUER CANCELAMENTO DA AVERBAÇÃO DA VENDA NO REGISTRO IMOBILIÁRIO, NÃO TEM O CONDÃO DE DESFAZER O NEGÓCIO, INCLUSIVE, QUANTO À TRANSMISSÃO DA POSSE À ADQUIRENTE. RETOMADA DA POSSE PELOS VENDEDORES-EMBARGANTES QUE SE MOSTRA ILEGÍTIMA, O QUE ENSEJA A IMPROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS DE TERCEIRO. SE O DISTRATO SOMENTE PODERIA SER FEITO POR MEIO DE ESCRITURA PÚBLICA, A PROVA TESTEMUNHAL MOSTRA-SE IRRELEVANTE PARA DEMONSTRAÇÃO DE TAL FATO, PELO QUE NÃO SE HÁ DE FALAR EM CERCEAMENTO DE DEFESA. RECURSO DESPROVIDO. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n.º 0012473-79.2012.8.26.0072, da Comarca de Bebedouro, em que são apelantes FRANCISCO AMADO TRINDADE SANTANA e SIRLEI APARECIDA DOS SANTOS SANTANA, é apelado IRACEMA DIRCE MARTINS, ACORDAM, em 35ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ARTUR MARQUES (Presidente sem voto), MORAIS PUCCI E FLAVIO ABRAMOVICI. São Paulo, 12 de setembro de 2016. Gilberto Leme RELATOR Assinatura Eletrônica

É como voto.

DECISÃO JURISDICIONAL LOCAÇÃO DE IMÓVEL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE IMÓVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO OPOSTOS PELOS VENDEDORES. ALEGAÇÃO DE DISTRATO E DE DEVOLUÇÃO DA POSSE PELA ADQUIRENTE. VENDA E COMPRA FIRMADA POR ESCRITURA PÚBLICA E DISTRATO POR INSTRUMENTO PARTICULAR. NÃO DESFAZIMENTO DO NEGÓCIO. ARTIGOS 108 E 472 DO CC. POSSE ILEGÍTIMA DOS EMBARGAN28 ARISP JUS

Apelação n.º 0012473-79.2012.8.26.0072 Comarca: Bebedouro Apelantes: Francisco Amado Trindade Santana; Sirlei Aparecida dos Santos Santana Apelada: Iracema Dirce Martins Juíza sentenciante: Vanessa Aparecida Periera Barbosa LOCAÇÃO DE IMÓVEL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE IMÓVEL. EMBARGOS DE TERCEIRO OPOSTOS PELOS VENDEDORES. ALEGAÇÃO DE DISTRATO E DE DEVOLUÇÃO


DA POSSE PELA ADQUIRENTE. VENDA E COMPRA FIRMADA POR ESCRITURA PÚBLICA E DISTRATO POR INSTRUMENTO PARTICULAR. NÃO DESFAZIMENTO DO NEGÓCIO. ARTIGOS 108 E 472 DO CC. POSSE ILEGÍTIMA DOS EMBARGANTES. PROVA TESTEMUNHAL. IRRELEVÂNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. A venda de imóvel por meio de escritura pública, em obediência ao art. 108 do CC, enseja que o distrato siga a mesma forma (art. 472 do CC), sendo que a mera assinatura de instrumento particular, ainda mais sem qualquer cancelamento da averbação da venda no registro imobiliário, não tem o condão de desfazer o negócio, inclusive, quanto à transmissão da posse à adquirente. Retomada da posse pelos vendedores-embargantes que se mostra ilegítima, o que enseja a improcedência dos embargos de terceiro. Se o distrato somente poderia ser feito por meio de escritura pública, a prova testemunhal mostra-se irrelevante para demonstração de tal fato, pelo que não se há de falar em cerceamento de defesa. Recurso desprovido. VOTO N.º 17.445 Trata-se de recurso de apelação interposto à r. sentença de fls. 227/229 que rejeitou os embargos de terceiro, condenando os embargantes ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que foram fixados em 10% do valor atualizado da causa, determinando-se o prosseguimento da execução. Apelam os embargantes, alegando que houve cerceamento de defesa, tendo em vista que pretendiam a oitiva de testemunhas para demonstrar a rescisão da venda e compra do imóvel, bem como sua boa-fé contratual. No mérito, argumentam que a venda e compra do imóvel penhorado foi desfeita em data anterior ao início da execução, sendo irrelevante a forma em que foi firmada. Recurso tempestivo, preparado e respondido. É o relatório. Infere-se do processado que a embargada Iracema Dirce Martins locou à Marfisa de Ricardo Rabello o imóvel localizado na Rua Visconde do Rio Branco n.º 821, na cidade de Bebedouro/SP, para fins residenciais, tendo os coexecutados Marilandy Ricardo Rabello e Sérgio Pereira figurado como fiadores. Alegando inadimplemento dos aluguéis vencidos a partir de 5.7.2011 e de outros encargos locativos, a locadora ajuizou, contra a locatária e os fiadores, execução de título extrajudicial (processo n.º 072.01.2011.009938-9000000-000). Sem o pagamento do débito, houve a penhora do imóvel de propriedade da coexecutada Marilandy Ricardo Rabello, situado na Rua Domingues Madeira n.º 32, na cidade de Bebedouro/SP,

inscrito na matrícula n.º 25004, junto ao Cartório de Registro de Imóveis de Bebedouro, o que foi reduzido a termo em 4.5.2012 (fl. 51 dos autos da execução). Diante disso, os embargantes opuseram os presentes embargos de terceiro, alegando que, embora conste da matrícula do imóvel a venda por eles realizada à co-executada Marilandy Ricardo Rabello, o negócio foi desfeito em 14.12.2010, ou seja, muito antes do ajuizamento da execução de título extrajudicial em 20.9.2011, pelo que pretende a liberação da penhora. Pois bem. Prescreve o art. 1.245 do Código Civil: “Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis (caput). Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel (§ 1.º). Enquanto não se promover, por meio de ação própria, a decretação de invalidade do registro, e o respectivo cancelamento, o adquirente continua a ser havido como dono do imóvel (§ 2.º).” Infere-se do aludido dispositivo que, como nos atos inter-vivos somente se adquire a propriedade com o registro do título de transferência no registro de imóveis, enquanto não se der tal registro, continua o alienante como dono do imóvel, o mesmo ocorrendo em relação ao adquirente que, uma vez registrado como titular do domínio, somente perde tal qualidade com o cancelamento do aludido registro. É exatamente o caso dos autos em que os embargantes firmaram com a coexecutada Marilandy escritura pública de venda e compra do imóvel em questão em 28.5.2010 (fls. 20/21v.º), o que foi devidamente averbado no registro imobiliário em 2.6.2010 (fl. 15), pelo que passou ela a figurar como titular do imóvel. Note-se que a execução de título extrajudicial foi ajuizada em 20.9.2011 e a penhora realizada em 4.5.2012, sendo que nenhum cancelamento do registro da aquisição do imóvel pela coexecutada tenha sido anotado na matrícula do imóvel. Aliás, os próprios embargantes confirmam que tal anotação não foi feita, mesmo porque procederam à rescisão da venda e compra por instrumento particular justamente por falta de recursos para arcar com tais formalidades. Dessa forma, nos termos do § 2.º do art. 1.245 do CC, sem que tenha havido o cancelamento do registro da aquisição do imóvel, a adquirente, ora coexecutada, continua a ser havida como proprietária do bem. Não se ignora que, conforme preceitua o art. 1.046 do CPC/1973, aplicável ao caso, para caracterizar o direito defendido por meio de embargos de terceiro, não é preciso que fique comprovada a propriedade do bem, sendo possível a defesa do mero possuidor. No entanto, de se ressaltar que é imprescindível a legitimidade da posse defendida, o que não se infere no caso dos autos, ARISP JUS 29


tendo em vista que, uma vez transmitida a posse do bem à coexecutada em decorrência da venda do imóvel (fl. 20v.º), somente o distrato do negócio ensejaria a retomada da posse de forma legítima pelos embargantes, o que não se infere no caso dos autos. Isso porque, conforme bem observado pela Magistrada a quo, “o distrato faz-se pela mesma forma exigida para o contrato” (art. 472 do CC), que, no caso dos autos, exigia a escritura pública, tal como procederam as partes quando firmaram a venda e compra, seguindo os termos do art. 108 do Código Civil que preceitua: “Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no país”. Assim, verificando-se a irregularidade do distrato firmado entre as partes por meio de instrumento particular , continua a coexecutada como legítima proprietária do imóvel, sendo que a retomada da posse pelos embargantes mostrou-se mesmo precária, pelo que de rigor o reconhecimento da improcedência dos embargos de terceiro por eles opostos. Por fim, de se consignar que, exigindo a lei a escritura pública para a efetivação do distrato, a oitiva de testemunha para confirmar tal ato mostra-se irrelevante, pelo que o julgamento antecipado da lide não ensejou cerceamento de defesa. Pelo meu voto, pois, nego provimento ao recurso. GILBERTO LEME Relator

30 ARISP JUS


DIRETORIA

Presidente: Francisco Raymundo Vice-Presidente: Flauzilino Araújo dos Santos Diretor Financeiro: Rosvaldo Cassaro Diretor da Coordenadoria Geral: George Takeda Diretor de Tecnologia da Informação: Armando Clapis Secretário: Jersé Rodrigues da Silva

CONSELHO FISCAL

Carlos André Ordonio Ribeiro Adriana Aparecida Perondi Lopes Marangoni Frederico Jorge Vaz de Figueiredo Assad

SEDE

Ano I

No 6

Outubro/2016

Informativo jurídico especializado

Rua: Maria Paula, 123 - 1º Andar São Paulo - SP - CEP: 01319-001 Telefone: 11 3107-2531 Homepage: www.arisp.com.br | www.registradores.org.br www.iregistradores.org.br e-mail: imprensa@arisp.com.br

EQUIPE

Gestão: Francisco Raymundo Coordenação: Alberto Gentil de Almeida Pedroso Jornalista: Dêni Carvalho Diagramação: Alessandra Giugliano Russo e Vaner Caram Fotografia: Vaner Caram Revisão: Graziela Castro e Vaner Caram

ARISP JUS 31


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