Ano III
No 27 JUNHO/2018
Informativo jurĂdico especializado
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ENTREVISTA JOSÉ RENATO NALINI ENTREVISTA IVES GANDRA MARTINS
Eu gosto muito quando você fala que o Brasil não cabe no PIB. Você acha que a situação melhorou? Eu tenho a impressão que não. Hoje se concentrou um corporativismo em Brasília que você não acerta, porque lá você decide tudo. Decide no judiciário, no executivo e no legislativo. Há uma promiscuidade. Eles são donos. Vivem como se fossem versais do Luis XVI, que estava há 20 km de Paris, os nobres todos viviam por lá, desconhecendo a realidade da França. No caso deles em Brasília, em nível de reformas, todos os anticorpos contra a reforma saem de lá. Reforma tributária: o número de audiências públicas que eu fiz por reforma tributária, não adianta, você não consegue superar as Secretarias de Fazenda e a Secretaria da Receita 2
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Federal. (...) O mundo está mudando de tal maneira, tão rapidamente, e nós estamos discutindo teses do século XIX, e que não passam em Brasília. Nós temos um sistema tributário que se não for simplificado, vai representar uma simplificação em todo o mundo. Um país com quase 40 partidos políticos pode funcionar neste governo de coalizão que você tem que entregar feudos, setores para inimigos? Não. Na Itália, por exemplo, são 35 partidos. O Brasil tem 35 partidos registrados e, destes 35 partidos, 26 têm assento no Congresso Nacional. A Itália tem 8 partidos com assentos. Nos Estados Unidos tem candidato que se lança em partidos pequenos, mais distritais, mas no fundo são apenas dois partidos. Hoje há um estelionato
eleitoral monumental e isso prejudica, pois, em cada eleição, cada um faz a conta. Se o partido precisar de mais votos para colocar alguém no congresso, começa a trazer figuras que tenham representatividade e possam colocá-los no congresso. (...) Se nós analisarmos, é um fracasso aqui na América Latina. Agora, você falou partido político, quando diz que o Brasil não pode ter parlamentarismo porque não tem partido político, eu diria que o Brasil não tem partido político, porque não tem o parlamentarismo.
medida, a partir daí, quem perde imediatamente recorre ao Poder Judiciário. (...) Quando o Poder Judiciário começou a tirar dinheiro da Secretaria de Saúde para atender procedimento daqueles que recorriam ao Poder Judiciário, a partir deste momento nós passamos a ter uma crise bastante grande no setor da saúde. (...) O judiciário pode decidir? Eu vou intervir, eu vou recorrer, eu vou pressionar. Quantas ações diretas existem no Japão? Sabe quantas? Nenhuma! Lá não se discute, o Judiciário só entra para discutir grandes temas.
Eu fico muito preocupado com o crescimento exagerado do Estado. Aqui em São Paulo nós temos 641 municípios e eu diria que uma grande parcela deles não tem receita. Mas, entretanto, tem câmara municipal, tem todas as secretarias, que replicam o modelo federal e aqui acena-se com mais criação de município, o país vai aguentar? Não vai aguentar. Na verdade, é tudo ambição de político. Porque você vê o seguinte. Nós somos 3900 municípios, em 1988. Quando eu fui daquela comissão do senado para repensar o pacto federativo, com o Luís Roberto Barroso, Nelson Jobim, Fernando Rezende, Bernardo Api, Paulo Carvalho, Everardo Maciel, uma comissãozinha razoável, quando nós fizemos a dúzia de projetos de Emenda Constitucional e entregamos, nenhum deles foi sequer apresentado, e era uma comissão de 13 cidadãos que tinham nome. Pois bem, naquela época, em 2012, tínhamos 5568 municípios, que não tem a menor condição de resistir.
O Supremo do Japão, a Suprema Corte, se reúne a portas fechadas e não há voto vencido, todas as decisões são unanimes. Nós criamos uma dependência, a população fica assim como que tutelada, então as pessoas desistem de conversar, de dialogar, de dizer porque não vão cumprir seus compromissos, porque elas preferem recorrer ao juízo, sabem que alguma coisa sempre virá, o Juiz se sente assim, um Dom Quixote para fazer reequilibrar uma parte vilã, a outra parte hipossuficiente, então você tenta fazer uma redistribuição de riqueza através da justiça. Acho muito ruim porque a sociedade não fica adulta, ela não vai implementar nunca uma democracia participativa, não é verdade?
Você é um Constitucionalista corajoso, você toca nos pontos nevrálgicos, você tem coragem, você repete. Você acha que nós estamos numa judicialização anômala, uma anomalia de tanto uso do judiciário, até para as coisas que não são necessárias? Eu acho e vou dizer por que: no momento em que o judiciário resolveu intervir em nível de política, toda pessoa que não está contente com o que acontece, recorre ao judiciário. Você pega, por exemplo, em política, no momento que houve a primeira ação que o Supremo Tribunal Federal precisou intervir no Poder Legislativo, dando à oposição o direito de tomar uma
Há aqueles otimistas que dizem, “isso é termômetro democrático, a Constituição cidadã permitiu que todos tivessem acesso à Justiça”. Ora, as pessoas têm acesso à Justiça, mas e a saída? Quatro instâncias, 50 oportunidades de reapreciar o mesmo tema, por causa do sistema recursal caótico, eu não vejo perspectiva de alterar, até porque as nossas carreiras não querem mudança. Esse é o problema que eu chamo de corporativismo (...), estão acostumados assim. Estando acostumados, eles estão tranquilos, mas isso evidentemente é um atraso e pior, não permite que o Brasil entre na modernidade. (...) O Brasil está entre as 10 maiores economias do mundo, em nível de PIB, temos 2% do comércio internacional e nós não entramos em competitividade internacional, menos de 2% do comercio internacional é feito no Brasil! Pega a Coreia ARISP JUS 3
do Sul, com a eminência de uma Coreia do Norte, que sofreu uma guerra. Em 1961, quando o Brasil enfim se preparava, a Coreia era um país semelhante aos países africanos. Hoje na Coreia se fabrica um automóvel em 57 segundos, tudo automatizado. Na fábrica Hyundai enquanto você automatiza o setor de produção, tem 10 mil engenheiros de tecnologia e nós continuamos a discutir coisas do século 19.
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A entrevista com o Dr. Ives Gandra Martins foi extraída do programa UniRegistral Entrevista, produzida pela TV Registradores e apresentada pelo Reitor da Uniregistral, Dr. José Renato Nalini. Confira a entrevista na íntegra em: www.youtube.com.br/registradores www.iregistradores.org.br
ARTIGO
prenotação de seus títulos, que ficarão com o prazo prorrogado até a solução do bloqueio.
ALGUNS APONTAMENTOS SOBRE O BLOQUEIO DA MATRÍCULA.
Assim, entregue o título junto à serventia imobiliária, ele deverá ser imediatamente prenotado (protocolado) no Livro 1, e esse protocolo terá validade por 30 dias, conforme art. 188 da Lei de Registros Públicos.
Por Paulo Cesar Batista dos Santos JUIZ DE DIREITO
Caso haja bloqueio da matrícula, então, o prazo de prenotação fica prorrogado até decisão final, ou seja, até que seja decidido pela autoridade competente, seja judicial, seja administrativa, pela cessação dos vícios que levaram ao bloqueio, ou então até que haja o cancelamento da matrícula. A ordem de bloqueio será protocolada e seguirá a ordem de prioridade, ou seja, caso haja outro título já protocolado, aguardando qualificação, ele será qualificado e, se for o caso, registrado antes que ocorra o trancamento da matrícula, salvo se a ordem fizer expressa menção a ele.1 Neste sentido é a orientação contida no item 110.3 do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça:
INTRODUÇÃO Com origem na jurisprudência, o bloqueio da matrícula foi levado à Lei de Registros Públicos pela Lei nº 10.931/94, que acrescentou os §§ 3º e 4º ao art. 214 da Lei nº 6.015/73. Nos termos literais da redação legal, o bloqueio da matrícula deverá ocorrer sempre que o juiz entender que a superveniência de novos registros poderá causar danos de difícil reparação, devendo ser determinado, a qualquer momento, ainda que sem oitiva das partes, o bloqueio da matrícula do imóvel. O § 4° do art. 214 acima referido determina que, uma vez bloqueada a matrícula, o Oficial não poderá mais nela praticar qualquer ato, salvo com autorização judicial, permitindo-se, todavia, aos interessados, a
110.3. Quando se tratar de ordem genérica de indisponibilidade de determinado bem imóvel, sem indicação do título que a ordem pretende atingir, não serão sustados os registros dos títulos que já estejam tramitando, porque estes devem ter assegurado o seu direito de prioridade. Contudo, os títulos que forem posteriormente protocolados terão suas prenotações suspensas como previsto no item 110.2.9.
E também o art. 182 da Lei nº 6.015/73, que tem o seguinte teor: Art. 182 Todos os títulos tomarão, no Protocolo, o número de ordem que lhes competir em razão da seqüência rigorosa 1 Segundo NARCISO ORLANDI NETO: “(...) determina que, no confronto de direitos contraditórios submetidos simultaneamente à qualificação, os registros seguem a ordem de prenotação dos respectivos títulos” (Retificação do Registro de Imóveis, Ed. Oliveira Mendes-Livraria Del Rey Editora, 1997, pág. 62). ARISP JUS 5
títulos judiciais. Todo título judicial resguarda, como antecedente necessário, uma declaração emitida por um órgão do Estado-Juiz e referente à presença de O bloqueio traduz, assim, determinação judicial um título legitimário, de direito material, capaz de para que, a partir daquela ordem, nenhum outro ato dar respaldo causal à mutação jurídico-patrimonial seja realizado naquela matrícula. a ser operada pelo ato de registro. Em se tratando de uma ordem judicial, não há, A ordem de bloqueio pode partir de semelhante correspondência. Cuida-se uma autoridade em processo judicial A ordem de de um comando dirigido ao registrador contencioso, ou pode ser advinda e derivado da atividade jurisdicional, bloqueio pode partir do Juiz Corregedor Permanente em como resposta, especialmente, a de uma autoridade procedimento administrativo, mas situações de urgência e que, dotadas em processo judicial de provisoriedade, demandam certa nunca por decisão do próprio Oficial, elasticidade na conformação da decisão muito embora ele possa perfeitamente contencioso, ou judicial. Tais ordens ostentam uma se originar de um pedido seu, ou dos pode ser advinda aparência externa idêntica à de um título interessados. judicial, mas não ostentam conteúdo do Juiz Corregedor semelhante. Mais adiante, pontua que o Aliás, recomenda-se que tal Permanente em exame qualificador do registrador é mais requerimento seja efetuado pelo procedimento limitado, de sorte que só poderá recusar o Oficial toda vez que observados seus cumprimento ao comando recepcionado administrativo, mas pressupostos, exercendo sua função quando restar caracterizada hipótese de nunca por decisão de guardião dos registros sob sua absoluta impossibilidade. Cita, como exemplos, o caso em que se determina responsabilidade. do próprio Oficial, indisponibilidade de bens que não é muito embora ele titular ou no que há contradição intrínseca A ordem de bloqueio, ao contrário possa perfeitamente entre e o documento instrumentalizador dos títulos judiciais, não sofre da ordem não corresponde ao seu teor. se originar de um de sua apresentação.
qualificação registral e deve ser cumprida, salvo no caso de absoluta impossibilidade, conforme já se decidido nos autos do procedimento CG n° n° 2013/174855 (79/2014-E):
pedido seu, ou dos interessados.
Registro de Imóveis – Decisão judicial de antecipação dos efeitos da tutela que determinou o bloqueio da matrícula – Comprovação do trânsito em julgado – Desnecessidade – Recurso Provido. O registrador recusou a averbação do bloqueio aos argumentos de que o título judicial também se submete à qualificação judicial e que inexiste prova do trânsito em julgado.É certo que, conforme antiga e pacífica jurisprudência desta Corregedoria Geral e do C. Conselho Superior da Magistratura, o título judicial é passível de qualificação. É preciso, no entanto, distinguir título judicial de ordem judicial, uma vez que o caminho registral a ser seguido é completamente diferente. As ordens judiciais diferenciam-se dos 6
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O bloqueio da matrícula, dessa forma, não é um fim em si mesmo.
É uma providência cautelar, que serve para evitar atos de escrituração que possam gerar ainda mais prejuízos e, consequentemente, mais danos de difícil ou improvável reparação. A medida menos drástica (bloqueio) sempre deve ser adotada com preferência à medida mais drástica (cancelamento), desde que o bloqueio se apresente como necessária e suficiente para evitar um mal maior. O bloqueio pode ser levado a efeito como medida liminar, inclusive, ou seja, sem a oitiva das partes envolvidas, mas apenas quando a gravidade e o risco sejam tamanhos que imponham que os envolvidos
sejam ouvidos somente após a medida. É possível se perguntar quanto tempo deve durar o bloqueio da matrícula, mas não existe termo certo para que a medida perdure. Aliás, não há prazo algum previsto em lei; contudo, o bloqueio deve ser medida temporária, ainda que no cotidiano dos registros imobiliários se tenha notícia de bloqueios que perdurem por anos. Mas isso não é o ideal, sendo de todo recomendado que se decida sobre os óbices e, consequentemente, pela manutenção ou não do registro. O bloqueio é administrativo; ele não serve de arresto ou indisponibilidade de bens. Sua função é garantir a regularidade do registro, nada impedindo que seja parcial, ou seja, limitado a determinados atos. VÍCIOS QUE JUSTIFICAM O BLOQUEIO DA MATRÍCULA A necessidade do bloqueio pode envolver vícios relativos à existência, validade ou à eficácia do negócio jurídico estampado no título que ingressou no registro de imóveis, ou seja, que foi qualificado positivamente. Como é consabido, nos registros públicos, o Princípio da Fé Pública e da Veracidade do registro público exigem que as inscrições devam corresponder ao plano da existência, validade e eficácia do negócio jurídico estampado no título. E a Lei de Registros Públicos se preocupou com as nulidades do registro, e trata delas nos seus art. 214, 216, 252 e 254. O art. 214 cuida das chamadas nulidades de pleno direito. Elas, uma vez comprovadas, invalidam o registro independentemente de ação direta.
Tais vícios são aqueles que envolvam exclusivamente o registro em si, perceptíveis tão só pela leitura da matrícula, sem a necessidade de exame do título que lhe deu origem. Para essas hipóteses, muito embora seja possível o bloqueio, a nulidade e o cancelamento do registro pode não ocorrer, caso atinja interesse de terceiro de boa-fé que já tiver preenchido as condições de usucapião do imóvel, nos termos do §5° do art. 214 acima citado.2 Já o art. 216 da Lei n° 6.015/73 diz que o registro poderá também ser retificado ou anulado por sentença em processo contencioso, ou por efeito do julgado em ação de anulação ou de declaração de nulidade de ato jurídico, ou de julgado sobre fraude à execução. A diferença entre os art. 214 e 216 é clara, portanto. O art. 214 diz respeito a um vício do registro em si, extrínseco ao título apresentado, de modo que, novamente apresentado o título, na forma correta, ele pode ser registrado. É o exemplo da abertura de matrícula em circunscrição territorial incompetente. Já o art. 216 diz respeito a vícios do negócio jurídico, somente podendo ser reconhecido e desfeito em processo judicial com o devido processo legal, não podendo nunca ser feito pelo Registrador, ou mesmo pelo Juiz Corregedor Permanente. Nesse caso, ainda que determinada pessoa compareça à serventia, por exemplo, munido de certidão de óbito, alagando que o outorgante da procuração que possibilitou a lavratura da escritura de compra e venda, ao tempo do ato, estava morto,
2 Interessante julgado na apelação n° 591.779-4/5, no qual o Eg. TJSP reconheceu os vícios existentes na abertura da matrícula, mas manteve sua validade em razão das consequências gravosas de seu cancelamento. ARISP JUS 7
o Oficial nada poderá fazer quanto ao cancelamento do registro. Poderá, contudo, solicitar ao Juiz Corregedor Permanente, com base nesses argumentos e munido de prova documental, solicitar o bloqueio imediato da matrícula. Ainda que seja o caso de nulidades de pleno direito, quando o exame pode ser feito na própria serventia, perceptível pela simples leitura da matrícula, o registrador não poderá cancelar, por seu ato, a matrícula. E enquanto não cancelado, o registro produz todos os seus efeitos legais, ainda que, como dito, por outra maneira, haja prova de que o título está desfeito, anulado, extinto ou rescindido, nos exatos termos do art. 252 da Lei de Registros Públicos3. Já o art. 254, ainda tratando das nulidades do registro, afirma que, se cancelado o registro, mas subsistirem o título e os direitos dele decorrentes, poderá o credor promover novo registro, o qual só produzirá efeitos a partir da nova data. Naturalmente, a prioridade gerada pela primeira apresentação não prevalecerá. HIPÓTESES DE APLICAÇÃO DO BLOQUEIO DA MATRÍCULA. Pelo Princípio da Inscrição, o registro é constitutivo 3 Quanto aos efeitos do registro inválido, vide o Resp Nº 1.543.567 - ES (2015/0172938-9): agravo interno em recurso especial. compra e venda de imóveis. ação declaratória de nulidade. improcedência. negativa de prestação jurisdicional. art. 535 do cpc/1973. não ocorrência. terceiros adquirentes. boa-fé. teoria da aparência. aplicabilidade. deficiência na fundamentação do recurso. súmula Nº 284/STF. 1. (...). 2. O acórdão recorrido está em harmonia com a jurisprudência desta Corte no sentido de que é possível a aplicação da teoria da aparência para afastar suposto vício em negociação realizada por pessoa que se apresenta como habilitada para tanto, desde que o terceiro tenha firmado o ato de boa-fé. 3. Se o artigo apontado como violado não apresenta conteúdo normativo suficiente para fundamentar a tese desenvolvida no recurso especial, incide, por analogia, a Súmula nº 284/STF. 4. Agravo interno não provido. 8
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de direito real sobre coisa imóvel. Há exceções, naturalmente, como no caso da aquisição originária, quando o registro possui efeitos para a disponibilidade da coisa adquirida. Também na sucessão hereditária, face ao Princípio da Saisine, quando a propriedade se transmite com a abertura da sucessão. A inscrição também leva à presunção relativa de propriedade. Outro princípio nitidamente ligado às medidas de bloqueio de matrícula é o da concentração dos atos na matrícula imobiliária, que ganhou ainda mais relevo após a edição da Lei nº 13.907/2015, de 19 de janeiro de 2015, resultada da conversão da MP 656/14. O art. 54 da referida lei estabelece que atos translativos ou modificativos de direitos reais serão considerados eficazes em relação a atos anteriores que não tenham sido averbados ou registrados na matrícula imobiliária. Dentre as hipóteses de bloqueio, ele poderá ocorrer em razão de problemas envolvendo a circunscrição territorial do imóvel, como mudança de circunscrição e atos praticados na circunscrição errada. Aliás, quanto a questões envolvendo a territorialidade do imóvel, as Normas da Corregedoria estabelecem que, se for o caso de ato de registro, abre-se uma matrícula na nova circunscrição; para atos de averbação, o ato será praticado na origem, enquanto não aberta outra matrícula4: 138.27. Se o imóvel passar a pertencer a outra
4 Vide CGJ Processo CG n° 2015/166783 (17/2016-E): Registro de Imóveis – Retificação de registro – Ato passível de averbação que, portanto, deve ser inscrito no Registro de Imóveis de origem, ainda que o imóvel tenha passado a pertencer a outra circunscrição – Arts. 169, I c.c. 213, § 1º, da Lei n° 6.015/73 – Item 138.27, do Capítulo XX, das NSCGJ – Recurso desprovido, com recomendação.
circunscrição na qual ainda não haja matrícula aberta, a retificação prevista no art. 213, II, da Lei nº 6.015/73, tramitará no Registro de Imóveis de origem.
Contudo, em matéria de conflito de atribuições entre juízos, o juízo competente para examinar a retificação, tanto a apresentada diretamente por meio de procedimento judicial quanto a remetida pelo Oficial na forma do art. 213, II, § 6º, da Lei n° 6.015/73, é o da situação do imóvel. Assim, a retificação de imóvel deslocado de uma circunscrição imobiliária para outra tramita no Registro de Imóveis da origem onde estão seus registros. No caso de impugnação ou de algum requerimento, como, por exemplo, o bloqueio de novas averbações, o Oficial remeterá os autos ao Juiz Corregedor Permanente da situação do imóvel. Voltando às hipóteses de bloqueio da matrícula, é perfeitamente possível sua utilização na hipótese de fraude à execução, que leva à ineficácia da averbação em face do credor prejudicado. O art. 216 da Lei Regente assim dispõe: Art. 216 - O registro poderá também ser retificado ou anulado por sentença em processo contencioso, ou por efeito do julgado em ação de anulação ou de declaração de nulidade de ato jurídico, ou de julgado sobre fraude à execução.
Também se recomenda o bloqueio da matrícula quando há indícios de prática de ilícito penal, quando a apuração dos fatos de ocorrência de crime será imprescindível, sendo recomendada a vedação a novas inscrições até que solucionada a questão5. 5 Ver processo n° 1040707-28.2016.8.26.0100, 1ª Vara de Registros Públicos, 02/05/2016, Juíza Tânia Mara Ahualli: “A dilação probatória é incompatível com o procedimento administrativo que tem curso na Vara de Registros Públicos. A fim de preservar o princípio da segurança jurídica, já que a superveniência de novos registros poderá causar danos de difícil reparação aos interessados e
A duplicidade antinômica também é causa comum de bloqueio da matrícula. Aliás, tal situação, apesar de ser um grave problema no âmbito do registro imobiliário, é comum. O Registrador Imobiliário tem o papel de zelar pelo princípio da continuidade e também pela disponibilidade dos imóveis. Entretanto, por uma diversidade de razões, são inúmeros os relatos de matrículas ou registros do mesmo imóvel, tais como matrículas com correntes filiatórias oriundas de um mesmo tronco, com origem primitiva idêntica; matrículas com correntes filiatórias distintas ou conflitantes de origem diversa; matrículas de uma mesma corrente ou origem, dentre outros. Compete ao Registrador, ao se deparar com duplicidade de matrículas contraditórias, oficiar ao Juiz Corregedor Permanente ao qual está subordinado, noticiando a contrariedade que, como medida cautelar, poderá determinar o bloqueio para que, na esfera própria, seja discutida a validade de um ou de outro registro, apurando-se quem detém o melhor título. Na maioria das vezes, o acionamento da via jurisdicional será é indispensável para o deslinde da matéria, ante à necessidade de dilação probatória, já que não poderá ser examinada nos estreitos limites de um feito de natureza administrativa. A duplicidade de registros não leva necessariamente à conclusão de que um deles é nulo de pleno direito, como já decidido pelo Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, nos autos da Apelação n° 4.094, julgada em 24/6/1985, RT 599/99: A regra do art. 859 do Código Civil, autorizadora do princípio da presunção, não pode ser chamada por nenhum daqueles titulares dos registros duplos. A presunção de que o direito pertence àquele em cujo nome está registrado não pode conviver com o duplo registro (…). Em outras palavras, a presunção de veracidade do registro desaparece quando há a terceiros de boa fé, determina-se o bloqueio da matrícula”. ARISP JUS 9
duplicidade. (...) a consequência é a impossibilidade de prática de qualquer ato em qualquer das correntes filiatórias, até que, na via adequada, se decida pela prevalência de uma ou de outra.
Por vezes, é recomendado, inclusive, o duplo bloqueio, vedando-se inscrições nas duas matrículas sobrepostas, já que não há nada a indicar que a medida automática seria o bloqueio da matrícula mais recente. A presunção de veracidade de ambas está fulminada momentaneamente, e, por isso, nenhuma delas poderá sofrer novas inscrições, até que solucionada a questão6. Também deve ser levado a efeito o bloqueio quando houver claros indícios de alienação sucessiva de fração ideal, com indícios de fraude à lei de parcelamento de solo urbano, o que, também, está a desautorizar qualquer inscrição pretendida. CONCLUSÃO Por esses breves apontamentos, constata-se que o bloqueio da matrícula pode se dar por diversas razões. Muitas vezes, as nulidades gravitam entre matérias intrínsecas e extrínsecas ao registro, envolvendo também outros títulos contraditórios que ingressaram na serventia, razão pela qual, nesses casos, o cancelamento da matrícula deverá ocorrer apenas por decisão de natureza jurisdicional, envolvendo 6 Ver processo 1112495-73.2014.8.26.0100 1a. Vara de Registros Públicos, Juíza Tania Mara Ahualli: “Com razão o Oficial Registrador e o Douto Promotor de Justiça. De acordo com a decisão que determinou o bloqueio da matrícula nº 3.092, objeto deste procedimento, proferida pelo MMº Juiz Drº Asdrubal Nascimberi (fls.120/121), o motivo para realização do ato foi a “duplicidade de linha filiatórias, com o mesmo berço tabular”, sendo imperativo em caráter acautelatório o bloqueio dos registros, diante da impossibilidade do cancelamento com fulcro no artigo 214 da Lei 6.015/73, por não se tratar de nulidade de pleno direito. Neste contexto, apesar da argumentação e documentos trazidos pela requerente, não foram carreados aos autos fatos e documentos novos que permitam a autorização de desbloqueio da matrícula, em preservação a segurança jurídica que os atos registrários devam assegurar a terceiros”. 10 ARISP JUS
diretamente as partes interessadas. Após o bloqueio, a medida seguinte poderá ser o cancelamento da matrícula. Como dito, contudo, o cancelamento talvez não seja a medida jurídica a ser imposta caso a caso, face à possibilidade de eventual direito à usucapião (§ 5° do art. 214 da Lei n° 6.015/73), o que somente poderá ser aferido em ação própria, envolvendo cada um dos litigantes, para que se decida quem detém o melhor título. Somente assim será possível a suspensão do bloqueio, seja para restaurar a registrabilidade junto junto à matrícula, seja para cancelá-la, extirpando do mundo jurídico, consequentemente, todas as inscrições nela realizadas.
ARTIGO A MATA ATLÂNTICA, A PROPRIEDADE E O REGISTRO DE IMÓVEIS. Por Marcelo Augusto Santana de Melo OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE ARAÇATUBA - SP
INTRODUÇÃO À MATA ATLÂNTICA A Mata Atlântica é um dos biomas1 mais importantes encontrados no Brasil, que está presente tanto na região litorânea, como nos planaltos e serras do interior, do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul. Ao longo de toda a costa brasileira a sua largura varia entre pequenas faixas a grandes extensões, atingindo em média 200 km de largura. Não é novidade para ninguém que as florestas da mata atlântica estão ameaçadas. O resultado atual é a perda quase total das florestas originais intactas e a contínua devastação e fragmentação dos remanescentes florestais existentes, o que coloca a Mata Atlântica em péssima posição de destaque, como um dos conjuntos de ecossistemas mais ameaçados de extinção do mundo. De uma área original superior a 1,3 milhão de km² distribuída ao longo de dezessete estados brasileiros, restam hoje apenas 8,5 % de remanescentes florestais acima de 100 hectares do que existia originalmente e somados todos os fragmentos de floresta nativa acima de 3 hectares, restaria atualmente 12,5%. PROTEÇÃO JURÍDICA DA MATA ATLÂNTICA
A MATA ATLÂNTICA, A PROPRIEDADE E O REGISTRO DE IMÓVEIS “No que resta - ainda esplendor - da mata Atlântica Apesar do declínio histórico, do massacre De formas latejantes de viço e beleza. Mostra o que ficou e amanhã - quem sabe? acabará Na infinita desolação da terra assassinada. E pergunta: “Podemos deixar Que uma faixa imensa do Brasil se esterilize, Vire deserto, ossuário, tumba da natureza?” Carlos Drummond de Andrade (A Câmara Viajante)
A Constituição Federal, no artigo 225, § 4º, declara que a Mata Atlântica é patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais. O revogado Decreto Federal nº 750, de 10 de fevereiro de 1993, proibiu o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica (art. 1º), sendo que a supressão e a exploração de vegetação secundária, em estágio inicial de regeneração, seria regulamentada pelo IBAMA. 1 Bioma é uma unidade biológica ou espaço geográfico cujas características específicas são definidas pelo macroclima, solo, a altitude, dentre outros critérios, possuindo características biológicas próprias. ARISP JUS 11
A Lei Federal nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006, dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica e cria como princípio basilar o tratamento diferenciado da floresta atlântica com relação ao corte, supressão e exploração da vegetação primária ou secundária (art. 8º).
De um modo geral, a supressão de vegetação de Mata Atlântica é autorizada excepcionalmente e em apenas alguns casos. O primeiro deles é em casos de utilidade pública relativo à atividades de segurança nacional e proteção sanitária, obras essenciais de infraestrutura de interesse nacional destinada aos serviços públicos de transporte, saneamento e energia; e em casos de interesse social em atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, de manejo agroflorestal sustentável e demais obras, planos atividades ou projetos definidos em resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente – Conama.
A Mata Atlântica, assim, em duas hipóteses merece tratamento diferenciado, quando é primária ou secundária, neste caso em estágios avançado e médio de regeneração (art. 11 da LMA). A definição dessas espécies de vegetação deve ser conferida pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente – Conama (art. 4º), sendo que referida classificação não sofrerá qualquer alteração em A Mata Atlântica, razão de incêndio, desmatamento ou qualquer outro tipo de intervenção assim, em duas não autorizada ou licenciada (art. hipóteses merece 5º). A Resolução Conama nº 388, de 23 de fevereiro de 2007, convalidou as resoluções anteriores que definem as vegetações primária e secundária nos estágios inicial, médio e avançado de regeneração. A resolução Conama nº 10, de 1º de outubro de 1993, traz as definições básicas:
tratamento diferenciado, quando é primária ou secundária, neste caso em estágios avançado e médio de regeneração (art. 11 da LMA(...)
Vegetação Primária: vegetação de máxima expressão local, com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e de espécies (art. 2º, I). Vegetação Secundária ou em Regeneração: vegetação resultante dos processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial da vegetação primária por ações antrópicas (atuação humana) ou causas naturais, podendo ocorrer árvores remanescentes da vegetação primária (art. 2º, II). 12 ARISP JUS
MATA ATLÂNTICA (REGRAMENTO GERAL) A limitação à supressão em áreas rurais está explicitada de forma clara nos artigos 20 a 25 da LMA, dividindo as restrições de acordo com a natureza jurídica da floresta atlântica. Assim, sendo a área confirmada como vegetação primária ou secundária em estágio avançado de regeneração, o corte e a supressão da vegetação “somente serão autorizados em caráter excepcional, quando necessários à realização de obras, projetos ou atividades de utilidade pública, pesquisas científicas e práticas preservacionistas” (arts. 20 e 21).
Sendo a vegetação de mata atlântica secundária em estágio médio de regeneração, a proteção será a mesma que as hipóteses anteriores, incluindo a exceção, permitindo-se a supressão “quando necessários ao pequeno produtor rural e populações tradicionais para o exercício de atividades ou usos agrícolas, pecuários ou silviculturais imprescindíveis à sua subsistência e de sua família, ressalvadas as áreas de preservação permanente e, quando for o caso, após averbação da reserva legal”.
A LMA ainda existe, além da respectiva autorização do órgão ambiental competente (Estadual ou Federal, se for o caso) ainda existe o Estudo Prévio de Impacto Ambiental– EIA para todas as hipóteses e Relatório de Impacto Ambiental- RIMA para vegetação em estágio primário (art. 225, § 1º, IV, CF).
direitos dominiais privados ou sujeita o uso de bens particulares a uma destinação de interesse públicos”3. Seguindo intervenção na propriedade privada como gênero, teríamos como espécies as desapropriações, as servidões administrativas, as requisições, as ocupações temporárias e as limitações administrativas.
Existe também a proteção para a vegetação secundária em estágio inicial de regeneração do Bioma Mata Atlântica, devendo o corte, a supressão e a exploração ser autorizado pelo órgão estadual competente (art. 25), com a observação de que se “a vegetação primária e secundária remanescente do Bioma Mata Atlântica for inferior a 5% (cinco por cento) da área original, submeter-se-ão ao regime jurídico aplicável à vegetação secundária em estágio médio de regeneração, ressalvadas as áreas urbanas e regiões metropolitanas” (parágrafo único, art. 25), permitindo-se ainda a prática agrícola do pousio nos Estados da Federação onde tal procedimento é utilizado tradicionalmente (art. 26).
Configura limitação administrativa a afetação de floresta de mata atlântica primária ou secundária em regeneração, não retirando, assim, a perda da propriedade. Existe uma restrição à utilização da propriedade imobiliária em seus atributos plenos. Leciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro que “se a restrição que incide sobre imóvel for em benefício de interesse público genérico e abstrato, como a estética, a proteção do meio ambiente, a tutela do patrimônio histórico e artístico, existe limitação à propriedade, mas não servidão”4. E como não existe perda do direito de propriedade, mas sim uma restrição, não podemos falar em desapropriação indireta.
NATUREZA JURÍDICA DA MATA ATLÂNTICA A vegetação atlântica é considerada bem imóvel por expressa disposição constante do art. 79 do Código Civil2, de forma que integra o direito de propriedade. No entanto, como vimos, referida propriedade está afetada fortemente à preservação ambiental quando existir vegetação atlântica primária ou secundária em estágios médio ou avançado. Não podendo o proprietário usufruir regularmente do uso do imóvel, malgrado permaneça como dono. Os administrativistas foram os primeiros a estudar as limitações do direito de propriedade, utilizamos como referência os critérios e nomenclaturas de Hely Lopes Meirelles, para o saudoso professor, intervenção na propriedade privada é “todo ato do Poder Público que compulsoriamente retira ou restringe 2 Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente.
Desta forma, os efeitos da Lei nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006, caracterizam limitação administrativa, não subtraindo do proprietário os poderes inerentes ao domínio, motivo pelo qual não há que se falar em indenização5. Interessante que o art. 3 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São
Paulo: Malheiros, 1992. P. 505. 4 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 144. 5 Administrativo e processual civil. Embargos de divergência em recurso especial. Decreto n. 750⁄93. Preservação da mata atlântica. Limitação administrativa. Inexistência de esvaziamento do conteúdo econômico da propriedade. Precedentes de ambas as turmas e da própria seção de direito público do STJ. 1. A desapropriação indireta pressupõe três situações, quais sejam: (i) apossamento do bem pelo Estado sem prévia observância do devido processo legal; (ii) afetação do bem, ou seja, destina-lo à utilização pública; e (iii) irreversibilidade da situação fática a tornar ineficaz a tutela judicial específica. 2. A edição do Decreto Federal n. 750⁄93, que os embargantes reputam ter encerrado desapropriação indireta em sua propriedade, deveras, tão somente vedou o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou em estados avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica, sendo certo que eles mantiveram a posse ARISP JUS 13
35 da LMA expressamente declara que “a conservação, em imóvel rural ou urbano, da vegetação primária ou da vegetação secundária em qualquer estágio de regeneração do Bioma Mata Atlântica cumpre função social e é de interesse público, podendo, a critério do proprietário, as áreas sujeitas à restrição de que trata esta Lei ser computadas para efeito da Reserva Legal e seu excedente utilizado para fins de compensação ambiental ou instituição de Cota de Reserva Ambiental – CRA”. MATA ATLÂNTICA, DIREITO PROPRIEDADE E REGISTRO DE IMÓVEIS
DE
O artigo 1.228 do Código Civil de 2002 declara que “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”. Porém, seguindo a Constituição Federal (artigos art. 5º, XXIII, 170, 182, 186 e 225), em seu Parágrafo Primeiro, introduziu na legislação civil infraconstitucional regra inovadora e moderna: § 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.
Não podemos restringir a função socioambiental da propriedade a aspectos jungidos a mera restrição do direito de propriedade. A propriedade de hoje não é a mesma de outrora tão-somente por aspectos restritivos, do imóvel. Logo, o que se tem é mera limitação administrativa. Precedentes: REsp 922.786⁄SC, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 18 de agosto de 2008; REsp 191.656⁄SP, Relator Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 27 de fevereiro de 2009; e EREsp 901.319⁄SC, Relatora Ministra Eliana Calmon, Primeira Seção, DJ de 3 de agosto de 2009. 3. As vedações contidas no Decreto Federal n. 750⁄93 não são capazes de esvaziar o conteúdo econômico da área ao ponto de ser decretada a sua perda econômica. 4. Recurso de embargos de divergência conhecido e não provido (EREsp 922.786⁄SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 15⁄09⁄2009). 14 ARISP JUS
justificados meramente pelo direito administrativo. É o que defende Edésio Fernandes ensinando que “não se pode mais reduzir a noção de função socioambiental da propriedade meramente à ideia de limitação administrativas externas ao exercício do direito, o que é muito do gosto dos administrativistas” 6. O direito de propriedade está, assim, sofrendo influências outrora jamais observadas em nosso direito, refletindo movimentos do mundo fenomênico. E referidos reflexos não se restringem tão somente ao aspecto social, mas também ao econômico, estando nesse aspecto, no nosso entendimento, ou conceito ou caráter pós-moderno da propriedade imobiliária7. A propriedade não mais ostenta aquela concepção individualista do direito romano, reproduzida no Código Civil (CC) de 1916; cada vez mais forte está o seu sentido social, transformando-se em fator de progresso, de desenvolvimento e de bem-estar de todos. Em conformidade com isso, a nova lei civil brasileira acabou por contemplar a função ambiental como elemento marcante do direito de propriedade, ao prescrever que tal direito ‘deve ser exercitado em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas’ (CC, art. 1.228, § 1º).8 A CF ao instituir em cláusula pétrea a função social da propriedade (art. 5º, XXIII), ao estabelecer a função social das cidades (art. 182) e declarando que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225), atribuiu ao Registro de Imóveis 6 FERNANDES, Edésio. A nova ordem jurídico-urbanística do Brasil. Minas Gerais: Del Rey, 2006, p. 15 7 MELO, Marcelo Augusto Santana. Meio ambiente e o Registro de Imóveis. Coordenadores. Marcelo Augusto Santana de Melo, Francisco de Asis Palácios Criado e Sérgio Jacomino. São Paulo. Ed. Saraiva: 2010. 8 MILARÉ, Edis. Direito do ambiente. 3. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 146-147.
características que outrora não possuía. Dentre elas, casos não expressamente autorizados pela lei, mas é está a necessidade de incorporação do conceito de pacífico que podemos interpretar que qualquer ato função social da propriedade e do meio ambiente, que, mesmo reflexamente, possam limitar o direito percepção claramente observada pelo legislador no de propriedade ou ainda de grande relevância para o Estatuto da Cidade e na legislação direito inscrito, justifica o ingresso por ambiental. Nesse aspecto, o meio de averbação de institutos decorrentes Os atos Registro de Imóveis tem sido do direito ambiental, estabelecendo-se registráveis (lato utilizado estrategicamente uma fusão entre as publicidades ambiental sensu) não são para potencializar a função e registral. É o que alguns registradores social da propriedade. Na taxativos, ou seja, as denominam “princípio da concentração”, regularização fundiária (Lei mas que nada mais é um efeito ou n. 11.977/2009) tem exercido averbações previstas consequência da própria transformação do papel importantíssimo para a direito de propriedade que pelo art 1.228 no art. 167, II, da materialização dos direitos de do CC, explicita integrar ao conceito de Lei nº 6.015/73 moradia, inclusive controlando propriedade também aspectos ambientais.9 a aquisição pela usucapião não somente administrativa ou tabular. Com Nesse sentido, já se pronunciou a CG as definidas relação à publicidade inerente ao do Estado de São Paulo consagrando a expressamente. Registro de Imóveis, é inegável o não taxatividade do rol do art. 167, II, da avanço nos últimos anos. Lei 6.015/73, quando analisou a averbação da reserva legal (Processo CG 53873 – PUBLICIDADE DA AFETAÇÃO DA ÁREA decisão proferida em 30 de janeiro de 1980) e áreas COMO MATA ATLÂNTICA PRIMÁRIA OU contaminadas (Processo CG 167/2005). SECUNDÁRIA EM RECUPERAÇÃO COMPROVAÇÃO DOCUMENTAL Não resta dúvida que a vegetação de mata atlântica nas hipóteses previstas por lei possui a natureza jurídica A comprovação de que determinada propriedade de limitação administrativa/ambiental, passível de imobiliária possui vegetação protegida especialmente averbação, assim, na matrícula dos imóveis rurais do Bioma da Mata Atlântica como mata primária ou a exemplo do que já ocorre com inúmeros espaços secundária em estágio secundário de regeneração ambientais protegidos como as áreas de proteção e em níveis médio e avançado pode ser obtida através recuperação de mananciais, reserva florestais legais, de certidão do respectivo órgão ambiental, estadual, limitações administrativas provisórias, tombamentos federal ou municipal, neste último caso, nos municípios etc. que possuam o plano municipal de conservação e recuperação da mata atlântica previsto no art. 38 da Lei FUNDAMENTOS PARA A PUBLICIDADE NO nº 11.428/2006. REGISTRO DE IMÓVEIS Outra hipótese de comprovação é aquela apresentada Os atos registráveis (lato sensu) não são taxativos, por meio de “laudo técnico com a respectiva ART, de ou seja, as averbações previstas no art. 167, II, da Lei profissional habilitado (art. 7º, inciso VIII, do Decreto nº 6.015/73 não somente as definidas expressamente. O artigo 246 da referida lei, permite a averbação de qualquer ato que altere o registro, outorgando publicidade para 9 PAIVA, João Pedro Lamana. Revista de Direito Imobiliário, v. 49, jul.-dez. 2000.
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nº 6.660, de 21 de novembro de 2008), devendo conter, extraindo de requisitos constantes do próprio regulamento, “inventário fitossociológico10 da área a ser cortada ou suprimida, com vistas a determinar o estágio de regeneração da vegetação e a indicação da fitofisionomia original (flora típica de determinada região), elaborado com metodologia e suficiência amostral adequadas (art. 20, V). Os profissionais habilitados para a confecção do laudo que comprova tratar-se de mata atlântica primária ou secundária e estágios médio e avançado de recuperação, são, pela própria natureza da profissão, os biólogos (art. 2º, inciso I, da Lei nº 6.684, de 31 de setembro de 1979) e engenheiros florestais (Lei nº 4.643, de 31 de maio de 1965, resolução nº 186, de 14 de novembro de 1969) podem elaborar referidos laudos e inventários, não excluindo, ainda, outros profissionais cujos laudos são comprovadamente aceitos pelas autoridades ambientais NATUREZA JURÍDICA DA AVERBAÇÃO O Registro de Imóveis brasileiro, como é cediço, confere a seus atos publicidades distintas, quer para a averbação, quer para o registro em sentido estrito. Para não adentrarmos em espécies de publicidade que não utilizaremos no presente trabalho, restringiremos o estudo apenas à publicidade-notícia. A publicidade utilizada no direito ambiental é a publicidade-notícia que apresenta pouca eficácia perante terceiros, não apresentando qualquer efeito sobre a eficácia do fato registrado. A averbação da Mata Atlântica tem particularidades próprias, obviamente tem a natureza de reforçar ou 10 Fitossociologia é o estudo das características, classificação, relações e distribuição de comunidades vegetais naturais. Os sistemas utilizados para classificar estas comunidades denominamse sistemas fitossociológicos. A fitossociologia visa obter variáveis quantitativas sobre as vegetações do planeta (Moro & Martins, Marcelo Freire & Fernando Roberto (2011). Métodos de levantamento do componente arbóreo-arbustivo (Viçosa: Editora da Universidade Federal de Viçosa). p. 174-212) 16 ARISP JUS
publicar uma informação na matrícula do imóvel para conhecimento de terceiros, às vezes do próprio proprietário. Além disso, ela permite, no âmbito da qualificação do Oficial de Registro de Imóveis, permitir que os licenciamentos especiais criados com a LMA sejam efetivamente fiscalizados e exigidos quando da apresentação de títulos submetidos à análise do cartório. A função da averbação também é de prevenção de conflitos já que a publicidade constante da matrícula do respectivo imóvel de que existe vegetação protegida por lei facilitará o acesso da informação por eventuais empreendedores e compradores que não poderão alegar desconhecimento face à publicidade registral. QUEM PODERIA REQUERER A AVERBAÇÃO? Considerando que o meio ambiente é bem de uso comum do povo e o fato do § 1º do art. 246 da Lei nº 6.015/76 permitir que qualquer11 averbação seja realizada por qualquer interessado, não vislumbramos qualquer problema de legitimidade para se requerer a averbação de constatação de mata atlântica na respectiva matrícula do imóvel, obviamente munido de documentação comprobatória que referimos. A Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo vem entendendo o mesmo, permitindo que qualquer pessoa possa, por exemplo, averbar áreas contaminadas nas matrículas dos imóveis, conforme item 12.6, Capítulo XX, das Normas de Serviço. Obviamente o Ministério Público, em razão de sua vocação natural e constitucional (art. 129, inciso III), possui muitas ferramentas para tornar pública a averbação da constatação da Mata Atlântica nos respectivos imóveis, dentre eles podemos relacionar o inquérito e ação a civil pública (Lei nº 7.347/1985), ressaltando-se, ainda, a existência de precedente administrativo permitindo a 11 “Independentemente de ser ou não proprietário da propriedade rural, qualquer pessoa e, portanto, o Ministério Público e as associações poderão promover o registro e a averbação, incumbindolhes as despesas respectivas, e desde que ofereçam elementos fáticos e documentais” (LEMES MACHADO, Paulo Affonso. Direito Ambiental Brasileiro. 22ª edição, 2014, p. 723).
publicidade registral desses instrumentos12. CONSIDERAÇÕES FINAIS A vegetação decorrente do Bioma da Mata Atlântica em estados primário e secundário (estágios médio e final) de regeneração exercem juridicamente uma influência sensível no direito de propriedade, merecendo em decorrência da importância ambiental e por meio de tratados internacionais e legislação pátria, de uma ampla publicidade que atinjam a todos (erga omnes), o que somente poderá ocorrer com a utilização dos livros do Registro de Imóveis que refletem a situação jurídica do direito de propriedade através de princípios jurídicos sólidos. A jurisprudência administrativa e os estudos acadêmicos são unânimes em admitir publicidade de eventos ambientais no Registro de Imóveis, desde que criados e estruturados legalmente, o que é o caso do Bioma Mata Atlântica que possui legislação e regramento consolidados. O principal problema para a preservação da Mata Atlântica é o conflito fundiário, já que os remanescentes sofrem grande pressão dos grandes centros urbanos, sendo que a utilização da publicidade registral servirá de importante ferramenta de prevenção de conflitos, utilizando ainda a qualificação registral (análise do Oficial do Registro de Imóveis) para fiscalizar as restrições e licenciamentos exigidos pela legislação em decorrência do regime especial de proteção que o Bioma da Mata Atlântica possui.
12 DOE 28.07.2000 – Protocolado CG-8.505/2000 – Piracicaba – Juízo de Direito da 1ª Vara Cível. Ementa: Registro de Imóveis. Recepção e arquivamento, pelo Oficial de Registro de Imóveis, de ofício expedido pelo Ministério Público com notícia da instauração de procedimento ou ação que versa sobre irregularidade no parcelamento do solo. Inclusão dessa informação nas certidões imobiliárias referentes aos registros correspondentes. Possibilidade. Medida que não se confunde com ato de averbação, nem impede a prática de atos de registro ou averbação nos registros atingidos.
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DECISÕES EM DESTAQUE
ÍNDICE DECISÃO ADMINISTRATIVA #1
Apelação nº 1081978-80.2017.8.26.0100 - Pág.19 DECISÃO ADMINISTRATIVA #2
Apelação nº 0000694-24.2016.8.26.0352 - Pág. 21 DECISÃO ADMINISTRATIVA #3
Parecer 223/2018 -E - Pág. 22 JURISPRUDÊNCIA CONTENCIOSA #1
Apelação nº 1056671 - 98.2015.8.26.0002 - Pág. 25
Selecionadas por Alberto Gentil de Almeida Pedroso
DECISÃO JURISDICIONAL #2
Agravo de Instrumento nº 2066196-88.2018.8.26.0000 Pág. 28 DECISÃO JURISDICIONAL #3
Agravo de Instrumento nº 2096362-06.2018.8.26.0000 Pág. 29
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DECISÃO ADMINISTRATIVA #1 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do(a) Apelação nº 1081978-80.2017.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que são partes é apelante PORTO SEGURO ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIOS LTDA, é apelado 8º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL. ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso, V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL). São Paulo, 7 de junho de 2018. PINHEIRO FRANCO CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR Apelação nº 1081978-80.2017.8.26.0100 Apelante: Porto Seguro Administradora de Consórcios LTDA Apelado: 8º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital Voto nº 37.486 REGISTRO DE IMÓVEIS – Escritura de Compra e Venda com Pacto Adjeto de Alienação Fiduciária Casamento e divórcio no estrangeiro - Regime de bens - Sentença homologatória proferida pelo Superior Tribunal de Justiça que não alcançou o bem imóvel situado no território brasileiro - Recurso desprovido.
PORTO SEGURO ADMINISTRADORA DE CONSÓRCIO LTDA interpõe apelação contra r. sentença de fl. 227/229, que julgou procedente a dúvida suscitada pelo apelante e manteve o óbice levantado pelo 8° Oficial de Registro 20 ARISP JUS
de Imóveis as Capital, obstando registro de escritura de compra e venda com pacto de alienação fiduciária em garantia. Após discorrer sobre o regime jurídico do casamento e posterior divórcio, ambos ocorridos nos Estados Unidos da América, o recorrente afirma a desnecessidade de qualquer participação da ex-esposa do vendedor no negócio jurídico entabulado, já que, pelas leis americanas, o imóvel objeto da avença restou como sendo de exclusiva propriedade do marido. Alega, ainda, a desnecessidade de partilha do bem imóvel no Brasil, já que exclusivo proprietário o outorgante, após a dissolução da sociedade conjugal. D. Procuradoria opinou pelo desprovimento do recurso. É o relatório. DECIDO. Presentes pressupostos processuais e administrativos, conheço do recurso. No mérito, a r. sentença recorrida deve ser confirmada. O título consiste em escritura pública de compra e venda, com pacto adjeto de alienação fiduciária em garantia (fl. 195/204), lavrada no 21° Tabelião de Notas da Comarca de São Paulo, figurando como vendedor Luiz Antonio Simões Lopes, cujo objeto é o imóvel descrito na matrícula n° 15.252, do 8° Registro de Imóveis da Capital (fl. 205/207). O apelante figura como credor fiduciário. O vendedor Luiz Antonio Simões Lopes adquiriu o imóvel em 21 de julho de 1977, em estado de solteiro, conforme R.2/15.252 (fl. 205/206). Ocorre que, em 4 de outubro de 1986, Luiz Antonio Simões Lopes se casou com Ana E. Antao, nos EUA, em regime de bens não informado quando da averbação do referido matrimônio na matrícula do imóvel, já que consta apenas que tal regime seria “segundo as leis vigentes naquele País” (Av-4, fl. 206). Desse modo, não há como se afirmar, como quer o recorrente, que ao casamento seriam aplicáveis as regras da comunhão parcial de bens, já que tal informação não consta
da matrícula do imóvel, tampouco da carta de sentença de homologação da sentença estrangeira (fl. 93/142). Aliás, na mesma averbação também consta o divórcio dos cônjuges, por sentença proferida em 14 de junho de 1999, pelo Superior Tribunal de New Jersey, EUA, conforme carta de sentença expedida em 2 de maio de 2007, após homologação pelo Superior Tribunal de Justiça. E muito embora à fl. 187, de fato, conste a deliberação nos autos do divórcio que: “a casa localizada em São Paulo (San Paolo), no Brasil, será de propriedade única e exclusiva do marido”, também é inegável que a referida homologação não acolheu a partilha do imóvel objeto da escritura, como se vê expressamente da r. decisão proferida pelo STJ (fl. 136/137): (...) A sentença, além de decretar a dissolução do casamento dos requerentes, regulamentar o exercício do pátrio poder dos filhos do casal (concessão da guarda conjunta dos filhos menores) e outras questões de interesse dos menores (como regras de visitação), versou ainda sobre bem imóvel situado no Brasil. O Ministério Público federal, na pessoa do Subprocurador Geral da república, Edson Oliveira de Almeida, opina pela homologação da sentença, com ressalva em relação à partilha do bem imóvel situado no Brasil, ‘verbis’: ‘afastada a divisão de bens imóveis situados no Brasil, que não resulta de pacto formulado pelas partes, respeitada a menção exigida pela legislação brasileira não alcança, por óbvio, a deliberação pretendida, devendo portanto ser objeto de ação própria na justiça competente, ou seja, no local da sede do imóvel’ (fl. 51). Decido. Examinados os autos, verifico que se trata de sentença proferida por juiz estrangeiro em sede de divórcio, na qual foi partilhado bem imóvel localizado no Brasil. Em princípio, por não ferir o disposto na Lei de Introdução ao Código Civil, art. 12 e tampouco no Código de processo Civil, art. 89, não haveria óbice à homologação, desde que a divisão do bem imóvel tivesse sido pactuada livremente pelo casal. (...)
Contudo, a sentença que se pretende homologar não informa se a divisão de bens é decorrente de pacto firmado entre os requerentes e ratificado em juízo. Assim, no que se refere ao imóvel localizado no Brasil, a presente homologação encontra óbice na evidente incompetência do juízo estrangeiro para decidir a questão (art. 5°, I, da Resolução n° 9/2005 do STJ). (...) Posto isso, homologo o título estrangeiro, sem, contudo, alcançar o bem imóvel situado em território brasileiro. Ainda nos termos da r. decisão, não haveria ofensa ao art. 89 do CPC/73, ou mesmo ao art. 12 da Lei de Introdução ao Código Civil, caso a sentença estrangeira deliberasse sobre o imóvel situado em território nacional. Mas desde que a divisão do bem fosse pactuada livremente pelo casal, o que não aconteceu. O ato praticado na referida matrícula, portanto, fora tão somente a averbação das núpcias e do posterior divórcio, tanto que realmente se tratou de ato de averbação, ao passo que, se partilha houvesse, o ato seria de registro, nos termos da Nota constante do Item 11, alínea a, 23, do Capítulo XX das NSCJG. Assim, mostra-se imprescindível a partilha do imóvel ou declaração judicial de propriedade exclusiva de Luiz Antonio Simões Lopes, ou ainda a lavratura de retificação com a participação de sua ex-esposa, em atenção, inclusive, ao Provimento n° 53/2016 do CNJ, já que, se partilha houvesse, a homologação dela pelo STJ seria impositiva (art. 1°, inciso 3°). Sendo assim, de fato, mostra-se inviável o registro buscado, ficando mantido o óbice levantado pelo Sr. Oficial. Ante o exposto, nego provimento ao recurso. PINHEIRO FRANCO Corregedor Geral da Justiça e Relator
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DECISÃO ADMINISTRATIVA #2 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação nº 0000694-24.2016.8.26.0352, da Comarca de Miguelópolis, em que é apelante BANCO DO BRASIL, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE MIGUELÓPOLIS. ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso e mantiveram a recusa do registro do título, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este Acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PEREIRA CALÇAS (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), ARTUR MARQUES (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), EVARISTO DOS SANTOS(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), CAMPOS MELLO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E FERNANDO TORRES GARCIA(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL). São Paulo, 7 de junho de 2018. PINHEIRO FRANCO CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR Apelação nº 0000694-24.2016.8.26.0352 Apelante: BANCO DO BRASIL Apelado: OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE MIGUELÓPOLIS Voto nº 37.351 REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida julgada procedente para manter a recusa do registro – Cédula rural pignoratícia – Prazo de garantia dissociado do prazo de vencimento da obrigação – Impossibilidade – Precedentes deste Col. Conselho Superior da Magistratura – Apelação não provida.
Trata-se de apelação interposta pelo Banco do Brasil S.A. contra r. sentença que julgou procedente a dúvida e manteve a recusa do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Miguelópolis em promover o registro da Cédula de Crédito Rural Pignoratícia e Hipotecária nº 40/06146-9 porque o prazo da garantia é distinto do prazo do vencimento da obrigação. O recorrente alega, em suma, que o art. 61 do Decretolei nº 167/67 não impede a utilização de outros tipos de documentos para a renegociação de dívidas. Disse que o contrato apresentado para registro da garantia versa sobre direito disponível e deve ser preservado em atendimento aos princípios da conservação dos negócios jurídicos e da boa-fé. Afirmou que o Manual de Crédito Rural MCR e a Resolução nº 4.106 do Banco Central do Brasil, editados em conformidade com as normas do Conselho Monetário Nacional que atua por força da Lei nº 4.559/64, permitem a renovação simplificada do crédito, razão pela qual a data de vencimento da cédula corresponde à da futura renovação. Asseverou que a possibilidade de renovação simplificada do crédito dispensa a lavratura de aditivo ou menção adicional aos instrumentos de crédito, o que não equivale a negócio condicional. Esclareceu que estará obrigado a promover a renovação simplificada se presentes os requisitos previstos nas normas que citou. Por essa razão, constou na Cédula apresentada para registro que a última parcela para pagamento do débito atualmente existente terá vencimento em 2016 (fls. 112), mas diante da possibilidade de Renovação Simplificada, também prevista no contrato celebrado, terá a Cédula de Crédito Rural Pignoratícia e Hipotecária vencimento final em 2020 (fls. 112). A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 135/136). É o relatório. O art. 61 do Decreto-Lei 167/67 prevê que o prazo do penhor rural, agrícola ou pecuário não excederá o prazo da obrigação garantida: “Art. 61. O prazo do penhor rural, agrícola ou pecuário não excederá o prazo da obrigação garantida e, embora vencido o prazo, permanece a garantia, enquanto subsistirem os bens que a constituem. Parágrafo único. A prorrogação do penhor rural,
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inclusive decorrente de prorrogação da obrigação garantida prevista no caput, ocorre mediante a averbação à margem do registro respectivo, mediante requerimento do credor e do devedor”.
O art. 1.439 do Código Civil, de igual modo, determina que os prazos do penhor agrícola e do penhor rural não podem ser superiores aos das obrigações garantidas: “Art. 1.439. O penhor agrícola e o penhor pecuário não podem ser convencionados por prazos superiores aos das obrigações garantidas. § 1º Embora vencidos os prazos, permanece a garantia, enquanto subsistirem os bens que a constituem. § 2º A prorrogação deve ser averbada à margem do registro respectivo, mediante requerimento do credor e do devedor”.
No presente caso, a Cédula Rural Pignoratícia e Hipotecária apresentada para registro tem vencimento em 05 de abril de 2021 (fls. 10 e 12, “FORMA DE PAGAMENTO”), mas o vencimento da última prestação devida pela obrigação garantida ocorreu em 20 de agosto de 2017 (fls. 12, “FORMA DE PAGAMENTO, PARÁGRAFO PRIMEIRO”). A divergência entre a data do vencimento da cédula e a data do vencimento da prestação prevista para pagamento da obrigação garantida decorre da previsão contratual sobre a possibilidade de Renovação Simplificada de Crédito (fls. 17). A renovação, porém, dependerá da eventual concessão de novo crédito, se estiverem presentes as condições previstas no contrato e nas normas editadas pelo Banco Central do Brasil, inserindo-se entre essas condições o integral pagamento do débito que teve seu vencimento previsto para 20 de agosto de 2017 (fls. 17, letra “b”). Verifica-se, desse modo, que a dissonância entre a data de vencimento da cédula e a data de vencimento das obrigações tem como causa a previsão contratual de possibilidade da concessão de novo financiamento que será diverso daquele objeto da obrigação inicialmente garantida, visando o custeio de atividade agropecuária, hipótese que não se coaduna com a vedação legal de previsão de vencimento da cédula com prazo que excede o da obrigação atualmente garantida.
do Banco Central do Brasil e do Conselho Monetário Nacional sobre a possibilidade de concessão de novo crédito mediante Renovação Simplificada, porque não se sobrepõem à legislação aplicável. Importa anotar, ademais, que a atual redação dos arts. 61 do Decreto-Lei 167/67 e 1.439 do Código Civil foi introduzida pela Lei nº 12.873/13, com isso afastando antiga divergência sobre a recepção do texto original do art. 61 da Lei 167/67 pela Constituição Federal de 1988. Prevalece, portanto, a jurisprudência deste Col. Conselho Superior da Magistratura que não admite o registro de Cédula de Crédito Rural Pignoratícia com prazo de vencimento superior ao da obrigação garantia: “Registro de Imóveis – Recusa de ingresso de cédula rural pignoratícia – Prazo de garantia dissociado do prazo de vencimento da obrigação – Impossibilidade – Precedentes desse Conselho – Apelação desprovida” (Apelação Cível 0006933-25.2014.8.26.0575, Rel. Des. Pereira Calças, j. 02/06/16).
Ante o exposto, nego provimento ao recurso e mantenho a recusa do registro do título. PINHEIRO FRANCO Corregedor Geral da Justiça e Relator
DECISÃO ADMINISTRATIVA #3 Parecer 223/2018-E PROCEDIMENTO DECONTROLE ADMINISTRATIVO - ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA CONTRATAÇÃO POR INTERMÉDIO DE INSTRUMENTO PARTICULAR POR ENTIDADES QUE NÃO INTEGRAM O SFI - CONSULTA DA EG. CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA - PRECEDENTES DESTA CORREGEDORIA GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - NSCGJ - POSSIBILIDADE.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:
Essa vedação, por seu turno, não é afastada por normas ARISP JUS 23
Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo instaurado em razão de requerimento formulado por ALESAT COMBUSTÍVEIS em que formulada consulta pela Eg. Corregedoria Nacional de Justiça sobre a existência de norma administrativa que impeça o uso de instrumento particular na efetivação dos contratos de alienação fiduciária por entidades que não integram o Sistema Financeiro Imobiliário - SFI. Opino. A respeito da possibilidade de celebração de contrato de alienação fiduciária de bem imóvel por instrumento particular, com pessoa jurídica integra o Sistema Financeiro Imobiliário, cumpre transcrever o ilustrativo trecho do parecer da lavra do Juiz Assessor desta E. Corregedoria Geral da Justiça, Dr. Iberê de Castro Dias, lançado nos autos do Processo nº 0049648-26.2012.8.26.0002, devidamente aprovado pelo então Corregedor Geral da Justiça, Dr. Manoel de Queiroz Pereira Calças, no sentido de que: “( ... ) a matéria é regulada pela lei 9.514/97, que cuida, em capítulos distintos, tanto do Sistema Financeiro Imobiliário (Capítulo 1), quanto da alienação.fiduciária de coisa imóvel (Capítulo li). Por se tratar de regra mais específica, sobrepõese ao Código Civil, ao menos quanto à disciplina dos temas referidos. Assim é que não incide à espécie o aventado artigo 108 do Diploma Civil, cuja redação, não bastasse, contém, logo de início, expressa ressalva de que sua força somente se fará sentir “não dispondo a lei em contrário”. Em síntese, o próprio artigo 108 do Código Civil abre explícita ensancha à aplicação da lei 9.514/97. Neste passo, o artigo 22, §!º, da lei 9.514/97 prevê, às claras, a possibilidade de a alienação fiduciária ser contratada por pessoa jurídica que não integre o Sistema Financeiro Imobiliário: “Ar/. 22. A alienação fiduciária regulada por esta lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a tram.ferência ao credor, ou .fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel. §!º. A alienação .fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SF!, podendo ter como objeto, além da propriedade plena: ( ..).1 1 Processo: 0049648-26.2012.8.26.0002 ; Autor(es) do Parecer: lberê de Castro Dias; Corregedor: Manoel de Queiroz Pereira Calças; 24 ARISP JUS
Questão idêntica já havia sido analisada por esta Egrégia Corregedoria Geral de Justiça, em parecer elaborado pelo então Juiz Assessor, Dr. Gustavo Henrique Bretãs Marzagão, assim ementado: “NORMAS DE SERVIÇO DA CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA - CAPÍTULO XX - Requerimento apresentado pelo Colégio Notarial do Brasil, Seção São Paulo - Alienação fiduciária de imóveis - Forma - Escritura pública ou instrumento particular para quaisquer dos contratos previstos na Lei nº 9.5 I 4/97 ou resultantes de sua aplicação - Proposta de utilização do instrumento particular com efeitos de escritura pública apenas nos lavrados por entidade integrante do SFI - Não acolhimento. 11 (Processo nº 131.428/2012, Corregedor Des. Elliot Akel, DJ 19/3/2014).
A propósito do tema, as Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo dispõem, em seu Capítulo XX, que: 230. A alienação fiduciária, regulada pela lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, e suas alterações, é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a tramferência da propriedade resolúvel de coisa imóvel ao credor, ou fiduciário, que pode ser contratada por qualquer pessoa, fisica ou jurídica, e não é privativa das entidades que operam no Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) (g.n.). 231. A alienação fiduciária será constituída mediante registro do contrato na matrícula do imóvel. 232. Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse da coisa imóvel, tornando-se o fiduciante, possuidor direto, e o fiduciário, possuidor indireto. 233. O imóvel enfitêutico pode ser objeto de alienação .fiduciária, sem necessidade de anuência do senhorio e do pagamento do laudêmio, uma ·””’ vez que a transmissão se.faz em caráter apenas.fiduciário, com/escopo garantia. 234. O pagamento do laudêmio será exigível quando houver a consolidação do domínio útil em favor do credor fiduciário. Data da Decisão: 20/07/2016; Data do Parecer: 19/07/2016; Ementa: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEL - Possibilidade de o contrato ser.firmado por pessoajurídica que não integre o SFI Contrato que pode validamente revestir.formas pública ou particular - Arts. 22 e 38 da lei 9.514/97, e item 230, Capítulo XX, das NSCCJ - Precedente - Recurso Desprovido.
235. Os atos e contratos referidos na Lei nº 9.514/1997, ou resultantes da sua aplicação, mesmo aqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública. 235.1. As entidades vinculadas ao Sistema Financeiro da Habitação estão dispensadas do reconhecimento de firma. 236. O contrato que serve de título ao negócio fiduciário deverá conter os requisitos previstos no artigo 24, da Lei nº 9.514/97: 1 - o valor do principal da dívida; II - o prazo e as condições de reposição do empréstimo ou do crédito do fiduciário; I /J - a taxa de juros e os encargos incidentes; IV - a cláusula de constituição da propriedade fiduciária, com a descrição do imóvel objeto da alienaçãofiduciária e a indicação do titulo e modo de aquisição; V - a cláusula que assegura ao fiduciante, enquanto adimplente, a livre utilização, por sua conta e risco, do imóvel objeto da alienação fiduciária; VI - a indicação, para efeito de venda em público leilão, do valor do imóvel e dos critérios para a respectiva revisão; VII - a cláusula que dispõe sobre os procedimentos do eventual leilão do imóvel alienado fiduciariamente; Vlfl - o prazo de carência a ser observado antes que seja expedida intimação para purgação de mora ao devedor, ou fiduciante, inadimplente. 237. O termo de quitação emitido pelo credor fiduciário é o título hábil para averbar a reversão da propriedade plena para o nome do devedor fiduciante, mediante cancelamento do registro da propriedade fiduciária, só substituível por quitação constante de escritura pública, ou de instrumento particular com força de escritura pública, ou por se11tet]ç,2 ... judicial, transitada em julgado. 238. O devedor fiduciante, com anuência expressa do credor fiduciário, poderá transmitir seu direito real de aquisição sobre o imóvel objeto da alienação fiduciária em garantia, assumindo o cessionário adquirente as respectivas obrigações, na condição de novo devedor fiduciante. 239. O título que instrumenta a transferência de direitos e obrigações deverá ingressar para ato de averbação na matricula do imóvel, cabendo ao Oficial observar a regularidade do recolhimento do imposto de transmissão.
e obrigações inerentes à propriedadefiduciária em garantia e independe de anuência do devedor fiduciante. 240. J. Havendo cessão da posição do credor fiduciário, indispensável prévia averbação dessa circunstância na matrícula do imóvel, para fins de substituição do credor e proprietário fiduciário originário da relação contratual pelo cessionário, o qual fica integralmente sub-rogado nos direitos e obrigações do contrato de alienaçãofiduciária. 240.2. Nos casos de transferência definanciamento para outra instituição financeira, com a sub-rogação de divida, da respectiva garantia fiduciária ou hipotecária e da alteração das condições contratuais, em nome do credor que venha a assumir tal condição, a averbação será realizada em ato único, mediante apresentação conjunta do instrumento firmado pelo mutuário com o novo credor e documento de quitação do anterior, dispensada a assinatura do mutuário neste último. 241. Dispensável a averbação da cessão de que trata o subitem anterior no caso de crédito negociado no mercado secundário de créditos imobiliários, representado por Cédula de Crédito Imobiliário sob a forma escriturai, hipótese em que o credor será o indicado pela entidade custodiante mencionada na cédula. (conforme texto contido no site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, com acesso pelo link http://www.tjsp.jus.br/Corregedoria/Comunicados/ NormasExtrajJdiciais ) realizado em 04 de junho de 201 8).
Note-se que o aludido item 230 das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça reforça a noção de que a alienação fiduciária de bem imóvel é regulada pela Lei 9.514/97, prevendo seu art. 38 que: “Art. 38. Os atos e contratos referidos nesta Lei ou resultantes da sua aplicação, mesmo aqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública.” (g.n.).
Importa também lembrar a lição de Melhim Namem Chalhub que, sobre a questão, assim entende: “A lei não faz restrição alguma quanto às modalidades de contrato passiveis de ser formalizados mediante instrumento particular em relação à Lei 9.517/97; ao confrário, esfende apossiblidade dejormalizar por instrumento particular todos ‘os atos e
240. A cessão do crédito objeto da alienação fiduciária implicará a transferência ao cessionário de todos os direitos ARISP JUS 25
contratos referidos nesta lei ou resultantes de sua aplicação’”.2 Diante do exposto, o parecer que submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de encaminhar cópias deste parecer, e da r. decisão que eventualmente o aprovar, à Eg. Corregedoria Nacional de Justiça, em atendimento à solicitação formulada no PCA 000014556.2018.2.00.0000 (fls. 727/729). Sub censura. São Paulo, 05 de junho de 2018. STEFÂNIA COS,íA AMORIM REQUENA
CONCLUSÃO Em 05 de junho de 2018, conclusos ao Excelentíssimo Senhor Desembargador GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, DD. Corregedor Geral da Justiça do Estado de São Paulo. Eu, , Natalia Firmeza Amaral, Escrevente Técnico Judiciário, subscrevi. Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora da Corregedoria Geral da Justiça, por seus fundamentos, que adoto. Remetam-se à Egrégia Corregedoria Nacional de Justiça cópias do parecer e da presente decisão, em atendimento à solicitação formulada no PCA 0000145- 56.2018.2.00.0000. Publique-se. São Paulo, 05 de junho de 2018. GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO Corregedor Geral da Justiça
2 ln “Alienação Fiduciária - Negócio Fiduciário”; ed. Forense; 5” edição; p. 256. 26 ARISP JUS
DECISÃO JURISDICIONAL #1 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1056671- 98.2015.8.26.0002, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes PAULO CESAR SCHIAVONE (JUSTIÇA GRATUITA) e MARLENE DA ROCHA SCHIAVONE (JUSTIÇA GRATUITA), são apelados GOLD FLORIDA EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS SPE LTDA “PDG” (EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL) e GOLDFARB INCORPORAÇÕES E CONSTRUÇÕES S/A E OUTRO. ACORDAM, em 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ALVARO PASSOS (Presidente) e GIFFONI FERREIRA. São Paulo, 19 de junho de 2018. MARCUS VINICIUS RIOS GONÇALVES RELATOR Apelação nº 1056671-98.2015.8.26.0002 Apelantes: Paulo Cesar Schiavone e Marlene da Rocha Schiavone Apelados: Gold Florida Empreendimentos Imobiliarios Spe Ltda “PDG” (em recuperação judicial) e Goldfarb Incorporações e Construções S/A e Outro Comarca: São Paulo Voto nº 1.100 RESPONSABILIDADE CIVIL – Indenização por dano material e moral – Aquisição de imóvel em empreendimento - Processo administrativo para apuração de contaminação do solo – Procedimento administrativo que conclui pela inexistência de riscos para os moradores e de prejuízo à habitabilidade, determinando a reabilitação da área, com a averbação no Oficial de Registro de Imóveis – Órgão ambiental que reconhece a regularização da área –
Danos não configurados - Recurso desprovido.
Trata-se de apelação contra a r. sentença de fls. 473/478, cujo relatório se adota, que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, condenando os autores nas custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios de R$ 2.000,00, observada a gratuidade da justiça. Os autores ajuizaram ação de reparação de danos alegando que, por força de instrumento particular de promessa de compra e venda, celebrado em 25 de setembro de 2009, adquiriram das rés o apartamento 46 do edifício situado na Av. Carlos Liviero, no. 561, Torre 1, Vila Liviero. Na ocasião, eles não foram informados da existência de um procedimento administrativo de apuração de contaminações do solo, subsolo ou lençol freático. Eles cumpriram rigorosamente as obrigações contratuais, mas depois da formalização do financiamento, a administração do condomínio, por meio de circular datada de 07 de maio de 2014, informou aos condôminos do procedimento aberto na CETESB, no qual se tinha apurado a contaminação do solo, com a inclusão do imóvel na relação de áreas contaminadas. Foi feita, por determinação da CETESB, a averbação no Oficial de Registro de Imóveis. A informação a respeito, embora de conhecimento das rés, não foi repassada aos autores no momento da contratação. Em razão disso, ela sofreu danos materiais e morais, razão pela qual postularam indenização. Irresignados com a sentença de improcedência, os autores apelaram (fls. 480/488) alegando que houve má-fé das rés, em omitir a informação a respeito da contaminação do solo, embora elas soubessem disso antes mesmo que o contrato tivesse sido celebrado. Além disso, a restrição ao uso do lençol freático causou danos aos condôminos, pela desvalorização do imóvel. Assim, requereram a condenação das rés ao pagamento de indenização por dano moral. O recurso foi processado, tendo as rés apresentado contrarrazões (fls.491/502). É o relatório. A decretação da recuperação judicial da ré Gold Flórida Empreendimentos Imobiliários não justifica nem a extinção, nem a suspensão do processo. É que há recurso pendente, neste processo, em que se discute a existência do crédito. Assim, até para que possa haver eventual habilitação, é preciso que primeiro se conclua a fase de conhecimento, na qual se decidirá sobre o crédito postulado pelos autores.
Nesse sentido, já decidiu este. E Tribunal de Justiça:
“A propositura de recuperação judicial não determina suspensão do processo, pois no caso sub judice ainda não há crédito líquido, tendo a parte direito de prosseguir na ação de conhecimento para definição da existência do débito, inclusive para que lhe seja possível participar de eventual recuperação. Inaplicável a suspensão do processo, nos termos do art.6º, §1º da Lei nº 11.101/05. Neste sentido a jurisprudência, afastando a pretensão de suspensão do processo: ‘RESPONSABILIDADE CIVIL Contrato de transporte marítimo Cobrança derivada de sobre-estadia de contêiner devolvido a destempo Recuperação judicial da Ré Extinção ou suspensão do processo Pretendida suspensão ou extinção da ação diante do deferimento do processamento da recuperação judicial da Ré Inadmissibilidade - Tratando-se de ação de conhecimento que demanda quantia ilíquida e não de execução, não é caso de suspender-se ou extinguir-se o processo (cf. art. 6º, § 1º, da Lei nº 11.101/2005) - desprovido.’ (TJSP - 20ª Câmara de Direito Privado - Ap. nº 1014299-06.2015.8.26.0562 - Rel. Álvaro Torres Júnior - j. 24/04/2017). Também não é caso de extinção do processo pela eventual indicação da presente ação no quadro de credores, pois ainda nem determinado em definitivo o valor devido, o que inviabilizaria pagamento naquela ação, salvo se houvesse expressa concordância com a sentença, o que não se constata.” (Apelação nº100400827.2015.8.26.0309, de 08 de agosto de 2017, Rel. Des. Enéas Costa Garcia).”
Os autores celebraram o contrato em 25 de setembro de 2009, e o relatório de inspeção da CETESB, juntado a fls. 131 e s, data de 07 de maio de 2009. As rés, assim, tinham ciência de potencial contaminação da área, antes da negociação celebrada com os autores, o que deveria ter sido a eles informado. Mas a responsabilidade civil exige, além da ação ou omissão voluntária, a comprovação do dano, e do nexo de causalidade entre uma e outro. O dano, no caso presente, não é “in re ipsa”, não decorre do fato em si, mas exige demonstração do prejuízo. Como mostra os documentos de fls. 431 e s, houve a reabilitação do imóvel, com a neutralização da contaminação, tanto que a CETESB determinou a averbação do termo de reabilitação para uso declarado, restringindo apenas o uso do lençol freático. A averbação da restrição foi feita em 14 de abril de 2014, sendo declarada e averbada a reabilitação do imóvel apenas alguns meses depois, em 19 de setembro de 2014 (fls. 461/462). ARISP JUS 27
Ora, não tendo havido nenhum risco para os moradores, que não consumiam a água do lençol freático, e tendo havido a neutralização posterior da contaminação, sem que houvesse desvalorização ou qualquer outro problema no imóvel, não há falar-se em dano material e moral. Em casos semelhantes, tem decidido esta E. 2ª Câmara: “Apelação Cível Indenização Sentença que corretamente concluiu pela inocorrência de violação à boa-fé objetiva e inexistência de ofensa anormal à personalidade da apelante Eventual anotação de contaminação do solo na matrícula do bem imóvel negociado não se afigura suficiente a evidenciar o dano alegado Posterior reconsideração da CETESB no sentido de que a contaminação não apresentava risco aos moradores, com consequente determinação de retirada da averbação Irregularidade imobiliária que restou sanada Inocorrência de óbice ao uso do imóvel para fins residenciais Ausência de prejuízo suportado pela apelante em razão de suposta desvalorização do imóvel Regularização do imóvel que ocorreu sem maiores repercussões desfavoráveis à apelante. Dano moral Ausência de comprovação Apelada que não pode ser responsabilizada pela forma como a Cetesb tratou o caso, primeiro tornando pública a conclusão de contaminação da área através da averbação da matrícula imobiliária e, posteriormente, reconsiderando a referida decisão por via administrativa Apelante que continuou residindo no imóvel, não se constatando a necessidade de abandonalo durante o período de regularização Precedentes Sentença mantida Recurso improvido.Sucumbência recursal Majoração da verba honorária Observância do disposto no art. 85, §§ 8º e 11, do NCPC (Apelação nº 111621429.2015.8.26.0100, de 15 de dezembro de 2017, Rel. Des. José Joaquim dos Santos).
“COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. IMÓVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ALEGADA CONTAMINAÇÃO DO SUBSOLO DO TERRENO EM QUE CONSTRUÍDO O EMPREENDIMENTO. INFORMAÇÃO QUE TERIA SIDO OMITIDA PELAS CONSTRUTORAS AOS ADQUIRENTES. ADIMPLEMENTO CONTRATUAL INADEQUADO OU FALTOSO, TODAVIA, QUE SE INSERE NO RISCO DO NEGÓCIO E QUE NÃO TRADUZ ABALO MORAL. CIRCUNSTÂNCIA QUE, EM TESE, AUTORIZARIA A REPARAÇÃO DO PREJUÍZO MATERIAL, MEDIANTE A REDIBIÇÃO DO CONTRATO OU O ABATIMENTO PROPORCIONAL DO PREÇO. DANO MORAL QUE NÃO É SEU SUCEDÂNEO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO IMPROVIDO.” (6ª Câmara D. Privado, Apelação cível nº 1012920-34.2015.8.26.0011, Rel. Des. Vito Guglielmi, j. 28.03.2017, v.u.); “Indenização por dano material e moral. Alegação de que a vendedora do imóvel omitiu a existência de contaminação do solo no momento da compra. Contaminação que se restringiu às águas subterrâneas que não são utilizadas pelo empreendimento. Inexistência de prova da desvalorização do imóvel. Dano não demonstrado. Autores que não se desincumbiram do ônus que lhes é imposto pelo art. 373, I, do NCPC. Improcedência acertada. Recurso improvido.” (4ª Câmara D. Privado, Apelação cível nº 100687792.2013.8.26.0127, Rel. Des. Maia da Cunha, j. 26.09.2016, v.u.)
Em síntese, não há prova de prejuízo material, porque o empreendimento foi regularizado, com a reabilitação do imóvel, devidamente averbada na matrícula. Tampouco houve dano moral, porque não houve ofensa a direito da personalidade. E a restrição ao uso do lençol freático não “APELAÇÃO. AÇÃO I N D E N I Z A T Ó R I A . implica desvalorização do imóvel, já que não há comprovação COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. Apelantes que de que o edifício se servia do lençol subterrâneo para captação alegam ter sofrido danos materiais e morais, em virtude da de água. omissão da apelada, quanto à existência de contaminação do solo em que fora edificado o empreendimento. Inadmissibilidade. Ausência de prova de efetivo prejuízo ou desvalorização ao imóvel. Já fora expedido, inclusive, termo reabilitação do imóvel para uso residencial pela CETESB. Violação aos direitos de personalidade não caracterizada. Sentença de improcedência mantida. SUCUMBÊNCIA. Majoração dos honorários advocatícios, segundo as disposições do art. 85, §11, do CPC/2015. RECURSO NÃO PROVIDO” (Apelação nº 1011281-74.2016.8.26.0001, de 30 de outubro de 2017, Rel. Des. Rosângela Telles).
No mesmo sentido 28 ARISP JUS
Ante o desprovimento do recurso, com fundamento no art. 85, par. 11, do CPC, ficam os honorários advocatícios fixados na sentença elevados para R$ 2.500,00, observada a gratuidade da justiça. Isto posto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso, nos termos da fundamentação acima. MARCUS VINICIUS RIOS GONÇALVES RELATOR
DECISÃO JURISDICIONAL #2 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2202755-86.2017.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que são agravantes CARLOS NOGUEIRA DA SILVA (INTERDITO(A)) e WAGNER NOGUEIRA DA SILVA (CURADOR(A)), é agravado GASPAR ODAIR NOGUEIRA DA SILVA. ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores DONEGÁ MORANDINI (Presidente) e BERETTA DA SILVEIRA. São Paulo, 19 de junho de 2018. Alexandre Marcondes Relator Agravo de Instrumento nº 2202755-86.a2017.8.26.0000 Comarca: São Paulo (2ª Vara da Família e Sucessões - F.R. do Tatuapé) Agravante: Carlos Nogueira da Silva Agravado: Gaspar Nogueira da Silva Juíza: Glaís de Toledo Piza Peluso Voto nº 13.554 Penhora. Executado casado no regime da comunhão parcial de bens. Penhora da integralidade do imóvel registrado em nome do devedor. Admissibilidade. Meação do cônjuge que recairá sobre o produto da alienação (art. 843 do CPC/2015). Decisão reformada. Agravo provido. Trata-se de agravo de instrumento interposto contra a r. decisão reproduzida a fl. 72, que em ação de exigir contas na qual foi reconhecida a existência de valores a serem pagos
pelo agravado, ora em fase de cumprimento de sentença, indeferiu o pedido de ampliação da penhora de do recorrido para alcançar a meação de sua esposa, que não faz parte do processo. Insurge-se o agravante, sustentando, em síntese, ser admissível a penhora da totalidade do imóvel pertencente ao agravado, na medida em que os valores por ele indevidamente apropriados foram revertidos também em benefício da esposa, sendo, portanto, a obrigação decorrente deste ato comunicável, conforme dispõe o artigo 1.659, IV, do Código Civil, cabendo a cônjuge meeira o ônus de provar que não foi beneficiada. Contraminuta às fls. 83/94. A D. Procuradoria de Justiça opinou pelo parcial provimento do recurso (fls. 127/134). Não há oposição ao julgamento virtual (fl. 78). É o relatório. Prospera o inconformismo. Ao contrário do que decidido em primeira instância, é perfeitamente possível a penhora da integralidade do imóvel registrado em nome do cônjuge do devedor por força da regra do artigo 843 do CPC/2015, recaindo a meação que cabe à esposa do devedor sobre o produto da alienação do bem, devendo ser ela intimada para acompanhar a execução, sendo irrelevante, ao menos neste momento, a discussão sobre eventual reversão dos valores em questão em benefício do casal, assim como a quem recai o ônus de tal prova. É este o entendimento da jurisprudência desta E. Corte: “Execução de título judicial Decisão que afastou a penhora sobre totalidade de imóvel pertencente ao executado, ora agravado, restringindo-a a 50% do bem para preservar a meação de sua esposa Penhora que deve recair sobre a totalidade do imóvel Bem indivisível que deve ser levado à hasta pública por inteiro, cabendo à esposa do executado o levantamento de sua quota-parte no preço alcançado na alienação Reforma da decisão agravada. Dá-se provimento ao recurso.” (Agravo de Instrumento nº 2112580-46.2017.8.26.0000, 1ª Câmara de Direito Privado, Relatora Desembargadora Christine Santini, j. 10.11.2017). ARISP JUS 29
“Ação Monitória. Penhora da totalidade do imóvel do agravante. Possibilidade. Bem que é indivisível. Meação resguardada nos termos do artigo 843 do CPC. Inexistência de nulidade do edital de hasta pública. Recurso improvido.” (Agravo de Instrumento nº 2039700-56.2017.8.26.0000, 4ª Câmara de Direito Privado, Relator Desembargador Maia da Cunha, j. 29.06.2017). “Cumprimento de sentença. Pretensão à suspensão da alienação judicial e decretação de nulidade de atos praticados após a penhora. Não acolhimento. Penhora de integralidade de bem. Possibilidade. Bem indivisível. Artigo 843, do CPC/15. Alegação de falta de intimação acerca da penhora. Não reconhecimento. Recurso desprovido. De acordo com a regra disposta no artigo 844 do CPC/15, basta a averbação do arresto ou da penhora no registro competente para que se verifique a presunção absoluta de conhecimento por terceiros. Assim, considerando a certidão de matrícula juntada aos autos, verifica-se que o exequente adotou tal providência, razão pela qual não subsiste a alegação de nulidade pela ausência de intimação acerca da penhora. Está autorizada a penhora sobre a totalidade do bem, por se tratar de bem indivisível, desde que observado que o equivalente à quota- parte recairá sobre o produto da alienação do bem (art. 843, CPC/15).” (Agravo de Instrumento nº 2018575-32.2017.8.26.0000, 32ª Câmara de Direito Privado, Relator Desembargador Kioitsi Chicuta, j. 20.04.2017). Na mesma linha: STJ, 4ª T., REsp 697.892-MS, Rel. Min, Jorge Scartezzini, j. 21/06/2005, DJU 01/08/2005; TJSP, Agravo de Instrumento nº 2130268-26.2014.8.26.0000, 3ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Egidio Giacoia, j. 21/10/2014. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso. ALEXANDRE MARCONDES Relator
DECISÃO JURISDICIONAL #3 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2096362-06.2018.8.26.0000, da Comarca de Vinhedo, em que é agravante ITAÚ UNIBANCO S/A, são 30 ARISP JUS
agravados RAFAEL NUNES ROCHA e CAMILA TIEMI DE OLIVEIRA NUNES ROCHA. ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 28ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento em parte ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Desembargadores DIMAS RUBENS FONSECA (Presidente), CESAR LUIZ DE ALMEIDA E CELSO PIMENTEL. São Paulo, 19 de junho de 2018. Dimas Rubens Fonseca Relator AG. INST. Nº 2096362-06.2018.8.26.0000 COMARCA: VINHEDO (3ª VC) AGTE: ITAÚ UNIBANCO S/A AGDOS: RAFAEL NUNES ROCHA E CAMILA TIEMI DE OLIVEIRA NUNES ROCHA JD 1º GRAU: EVARISTO SOUZA DA SILVA VOTO Nº 23.456 ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO ANULATÓRIA. Contrato de financiamento de bem imóvel com alienação fiduciária em garantia, sob a égide da Lei nº 9.514/97. Pleito de revogação da medida liminar deferida para suspender os leilões do imóvel. Devida a intimação pessoal dos devedores, que não foi realizada em tempo hábil. Possibilidade de purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação. Faculdade que não exige a suspensão de eventual leilão, que pode ocorrer desde que encerrado o prazo de cinco (5) dias úteis para a purgação da mora pelos agravados. Recurso parcialmente provido.
Trata-se de agravo de instrumento interposto por ITAÚ UNIBANCO S/A contra a r. decisão proferida nos autos da ação anulatória que lhe movem RAFAEL NUNES ROCHA e CAMILA TIEMI DE OLIVEIRA NUNES ROCHA, que determinou a suspensão dos leilões do imóvel sub judice, designados para 05 de abril e 12 de abril de 2018. Sustentou, em síntese, que os agravados foram devidamente notificados para purgar a mora; que após o decurso do prazo, foi consolidada a propriedade do imóvel em seu favor, evento que extingue a possibilidade de purgação da mora; que houve comunicação aos devedores a respeito
das datas, horários e locais dos dois leilões designados; que o Decreto-Lei nº 70/66 não se aplica à alienação fiduciária. O pedido de efeito ativo foi parcialmente deferido para permitir o prosseguimento do processo, com a realização do leilão extrajudicial, garantindo aos recorridos o prazo de cinco (5) dias úteis para o exercício do direito à purgação da mora (fls. 333/334). Foi apresentada contraminuta com pleito de desprovimento do recurso e requerimento de concessão do prazo de 30 (trinta) dias para a purgação da mora (fls. 338/343). É o relatório. O presente recurso preenche os requisitos de admissibilidade, eis que o tema se ajusta à hipótese prevista no inciso I do artigo 1.015 do CPC/20151.1 As partes celebraram contrato de financiamento de bem imóvel com alienação fiduciária em garantia, sob a égide da Lei nº 9.514/97 (fls. 99/110). Constou da referida avença que em caso de inadimplemento a devedora seria intimada para efetuar o pagamento das prestações em atraso, acrescidas dos encargos moratórios (cláusula 37 fls. 74 dos autos originais), sob pena de, não o fazendo, ensejar a averbação na matrícula do imóvel da consolidação da propriedade em nome do credor (cláusula 28 fls. 74), podendo este promover leilões públicos para a alienação do bem (cláusula 30 fls. 75). O imóvel, portanto, foi dado em garantia por ato que transferiu ao agravante a propriedade fiduciária do bem, consoante o disposto no artigo 22 da Lei nº 9.514/97. Ressalte-se que, em havendo o inadimplemento do devedor fiduciante e a configuração da mora, a propriedade do imóvel consolida-se em nome do credor fiduciário, que poderá promover o leilão público do bem, nos termos do disposto nos artigos 26 e 27 do referido Diploma legal.
1 Artigo 1.015, CPC/2015. “Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I tutelas provisórias”.
A pretensão do agravante é a modificação da decisão que determinou a suspensão dos leilões por entender que não houve notificação dos devedores quanto às datas em que aqueles seriam realizados. Alega o recorrente que não há que se falar de purgação da mora após a consolidação da propriedade em favor do credor fiduciário, pois não constaria da Lei 9.514/97 a previsão de tal possibilidade. Com efeito, a Lei nº 9.514/97 não faz referência à necessidade de intimação pessoal do devedor acerca da realização do leilão extrajudicial; no entanto, o artigo 39 do referido Diploma dispunha, à época da celebração do contrato de financiamento (novembro de 2014), que às operações de financiamento imobiliário, a que se refere a aludida Lei, aplicam-se as disposições dos artigos 29 a 41 do Decreto-lei nº 70/66. Ademais, o entendimento desta Colenda Câmara se consolidou no sentido de que há necessidade de intimação pessoal acerca da data da realização do leilão extrajudicial de imóvel submetido à execução hipotecária, de que trata o Decreto-lei nº 70/66. Confira-se: “A intimação pelo oficial do Registro de Imóveis para a constituição do devedor em mora no sistema de alienação fiduciária não basta para os leilões extrajudiciais, que exigem prévia, nova e específica intimação pessoal. Por isso, que se traduz em probabilidade do direito e em perigo de dano, defere-se a antecipação da tutela, sustando-se os efeitos dos leilões”2. Pontue-se que o art. 343 do Decreto-lei nº 70/66 preconiza
2 SÃO PAULO. Tribunal de Justiça (28ª Câmara de Direito Privado). Agravo de Instrumento nº 2113629-59.2016.8.26.0000. Rel. Des. Celso Pimentel. J. 19/07/2016. 3 Art. 34. É lícito ao devedor, a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação, purgar o débito, totalizado de acordo com o artigo 33, e acrescido ainda dos seguintes encargos: I - se a purgação se efetuar conforme o parágrafo primeiro do artigo 31, o débito será acrescido das penalidades previstas no contrato de hipoteca, até 10% (dez por cento) do valor do mesmo débito, e da remuneração do agente fiduciário; II - daí em diante, o débito, para os efeitos de purgação, abrangerá ainda os juros de mora e a correção monetária incidente até o momento da purgação. ARISP JUS 31
que o devedor hipotecário pode, a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação, purgar o débito em aberto, com os acréscimos legais. Nesse sentido já decidiu o C. STJ, tendo em vista que o instituto jurídico da garantia real tem como finalidade apenas e tão somente garantir o pagamento de obrigações contraídas entre as partes e não a integração do bem dado em garantia ao patrimônio do credor: “RECURSO ESPECIAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. LEI Nº 9.514/1997. PURGAÇÃO DA MORA APÓS A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DO CREDOR FIDUCIÁRIO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO DECRETO-LEI Nº 70/1966. 1. Cinge-se a controvérsia a examinar se é possível a purga da mora em contrato de alienação fiduciária de bem imóvel (Lei nº 9.514/1997) quando já consolidada a propriedade em nome do credor fiduciário. 2. No âmbito da alienação fiduciária de imóveis em garantia, o contrato não se extingue por força da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, mas, sim, pela alienação em leilão público do bem objeto da alienação fiduciária, após a lavratura do auto de arrematação. 3. Considerando-se que o credor fiduciário, nos termos do art. 27 da Lei nº 9.514/1997, não incorpora o bem alienado em seu patrimônio, que o contrato de mútuo não se extingue com a consolidação da propriedade em nome do fiduciário, que a principal finalidade da alienação fiduciária é o adimplemento da dívida e a ausência de prejuízo para o credor, a purgação da mora até a arrematação não encontra nenhum entrave procedimental, desde que cumpridas todas as exigências previstas no art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966. 4. O devedor pode purgar a mora em 15 (quinze) dias após a intimação prevista no art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/1997, ou a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação (art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966). Aplicação subsidiária do Decreto-Lei nº 70/1966 às operações de financiamento imobiliário a que se refere a Lei nº 9.514/1997. 5. Recurso especial provido”4. Embora o agravante tenha afirmado que notificou os devedores mediante carta com aviso de recebimento, reproduzida às fls. 9/10, verifica-se que a sua entrega se deu em 05 de abril de 2018, mesmo dia ao qual foi designado o primeiro leilão suspenso pela decisão agravada, datada, por sua vez, de 03 de abril. 4 REsp 1462210/RS,n 3ª T., Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 18/11/2014. 32 ARISP JUS
Não houve, por conseguinte, notificação dos agravados de forma a conceder-lhes tempo hábil para o exercício do direito à purgação da mora antes da realização do primeiro leilão. Desta forma, deve ser garantido aos recorridos o prazo de cinco (5) dias úteis, que é suficiente para o exercício de tal direito. Esta faculdade, contudo, não exige a permanência da suspensão da realização dos leilões, que podem ocorrer desde que encerrado o mencionado prazo para a purgação da mora pelos agravados. Ante o exposto, pelo meu voto, dou provimento, em parte, ao recurso, para revogar a tutela de urgência concedida e permitir o prosseguimento do processo, com a realização do leilão extrajudicial, garantindo-se aos recorridos o prazo de cinco (5) dias para o exercício do direito à purgação da mora, a contar da publicação deste. DIMAS RUBENS FONSECA RELATOR
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