ARISP JUS #4

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Informativo jurídico especializado

Des. Ricardo Dip

ENTREVISTA

Vai chegando a seu término a gestão da Ministra NANCY ANDRIGHI à frente da Corregedoria Nacional de Justiça. Como o Sr. avalia sua contribuição à Corregedoria Nacional? Des. Dip: Foi uma honra, efetivamente, e penso que muito além do que me tocava, ter sido chamado a cooperar com a Ministra NANCY ANDRIGHI, que é Magistrada modelar intelectual e moralmente e teve uma dedicada atuação à frente da Corregedoria Nacional de Justiça. A pergunta indicou bem a circunstância de que eu fui convidado a contribuir junto à Ministra NANCY, e isto quanto ao direito notarial e ao registrário. A Ministra fez muita coisa, trabalhou muitíssimo, e julgo ter adotado frequentemente boas medidas. Minha contribuição foi maior no primeiro 1


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ano do biênio, porque, tendo eu, em janeiro de 2016, assumido a Presidência da Seção de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo (e venho votando em seis Colegiados distintos!), tive pouca disponibilidade de tempo para viajar e para mais de perto auxiliar a Corregedoria Nacional. Lamento isto. Mas, de toda sorte, sempre que a Ministra decidiu consul-

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sou pouco afeto à edição de resoluções e provimentos judiciais em matéria de notas e de registros, porque entendo, sempre com o devido respeito a quem sustente diversamente, não caber ao Judiciário brasileiro a atuação do chamado “poder de instrução”. Acho que bem por isto, com a generosidade atenta com que se conduz costumeiramente, a Ministra NANCY não me consultou acerca deste projeto. Aproveito para dizer que uma coisa é admitir − e isto eu admito − um poder de orientação judiciária do extrajudicial, o poder de expedir recomendações ou diretivas, isto que os autores têm chamado de “normas soft”. Outra coisa, muito diferente, contudo, é o poder de instrução, porque nele há imperativos que, a meu ver, confrontam com a independência jurídica que, já mediante conaturalidade, já por força de determinação positiva (na Lei n. 8.935, de 1994), é um predicado, in suo ordinē, dos notários e dos registradores públicos. Que é este poder de instrução?

tar-me, tratei de corresponder à honra de seu convite e, em consciência, fiz o melhor que pude. Que o Sr. tem a dizer-nos do projeto da Ministra NANCY ANDRIGHI acerca de um provimento sobre a usucapião extrajudicial, que é agora matéria de audiência pública? Des. Dip: Lamento dizer isto, mas tenho pouco ou mesmo nada a dizer sobre este projeto. Não tive ocasião de lê-lo, e, como decerto não vou surpreender ninguém com esta minha afirmação, deixo dito que 2

Des. Dip: Isto corresponde ao pouvoir d’instruction dos autores franceses, ou à potestas leges ferendi dos canonistas: é a atribuição administrativa de estabelecer a órgãos inferiores previsões impositivas para casos gerais e abstratos. Penso que, no Brasil de hoje, segundo a repartição constitucional, a competência para normas gerais, em matéria de notas e de registros públicos, não é do Judiciário, salvo −este é um ponto a realçar− no âmbito da função técnica, por força da conjugação do § 1º do art. 236 da Constituição federal de 1988 com a Lei n. 8.935, de 1994 (inc. XIV de seu art. 30).


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SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. O registro especial da incorporação imobiliária (art. 32 da Lei nº 4.591/64). 3. As fases do processo de registro da incorporação imobiliária: 3.1. Rogação. 3.2. Qualificação registraria. 3.3. Registro. 3.4. Publicidade. 4. Conclusão. Referências Bibliográficas

ARTIGO NOTAS SOBRE O REGISTRO DA INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA Vicente de Abreu Amadei Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Professor/ palestrante em curso de extensão e de especialização em Direito Notarial e Registral, Imobiliário, Urbanístico e Ambiental Urbano em diversas instituições (v.g. PUC/SP, Escola Paulista da Magistratura, SECOVI-SP, UNIREGISTRAL). Membro da Academia Brasileira de Direito Registral Imobiliário (ABDRI) e da Academia Notarial Brasileira (ANB).

1. INTRODUÇÃO. Conforme a clássica definição de Caio Mário da Silva Pereira, incorporação imobiliária “é o contrato por via do qual uma pessoa física ou jurídica se obriga a promover a construção de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas, para alienação total ou parcial”1. A razão ou causa final da incorporação imobiliária, portanto, é o porvir do condomínio edilício, quer de apartamentos (“condomínio em pé”), quer de casas (“condomínio deitado”2) em modo empresarial. Por isso se diz que a incorporação é “fase pré-condominial”3, ou seja, etapa antecedente, preliminar, provisória e eventual do condomínio edilício, que pode ser instituído com ou sem prévia incorporação imobiliária. O fim, então, é o condomínio edilício, regime

1) Incorporação Imobiliária – RDI nº 4, p. 9-18. A Lei nº 4.591/64, que partiu de um esboço ou anteprojeto do mesmo jurista, em seu art. 28, parágrafo único, apresenta conceito similar: “considera-se incorporação imobiliária a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas”. 2) A expressão é de Elvino Silva Filho (Loteamento fechado e condomínio deitado, in RDI 14, p. 8-35) para indicar a figura inserta no art. 8º, “a”, da Lei nº 4.591/64, ou seja, dos condomínios edilícios em que as unidades autônomas constituem casas térreas ou assobradadas. 3) SANTOS, Flauzilino Araújo dos. Condomínios e incorporações no registro de imóveis. São Paulo: Mirante, 2012, p. 204.

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jurídico imobiliário de feição definitiva; um dos caminhos que leva a esse fim é a incorporação imobiliária, que, com seu registro predial e até a instituição do condomínio edilício, configura regime jurídico imobiliário próprio e de feição provisória, disciplinado na Lei nº 4.591/64.

ao registro predial função social protetiva dos adquirentes dessas novas unidades, quer quanto à liquidez do domínio, quer quando à segurança do negócio e do bom termo do empreendimento.

O registro da incorporação imobiliária se diz especial não só porque a sua previsão normativa e os requisitos necessários à inscrição constam em lei especial (art. 32 da Lei nº 4.591/64), distinta da comum (Lei de Registros Públicos), mas também, porque, no universo próprio de empreendimento imobiliário (tal como o loteamento), a realizar ou em curso de realização, gerador de inúmeras unidades imobiliárias novas, destinadas, em regra, à oferta pública, agrega-se

Destacam-se quatro fases no processo de registro de incorporação imobiliária: (1) A da rogação (a incluir, para além do requerimento documentado, a contrapartida de sua formalização adequada na serventia predial); (2) a da qualificação registrária (a incluir, para o caso de dúvida registrária, a requalificação judicial); (3) a do registro da incorporação; (4) a da publicidade registral imobiliária da incorporação registrada.

Daí, por exemplo, a necessidade de processo de registro diferenciado, com apresentação de inúmeA incorporação imobiliária, então, nasce para ros documentos, alguns relativos à idoneidade patrimorrer; o condomínio edilício nasce para ficar. E, de- monial e financeira, ou mesmo à eventual afetação limitando essas vidas institucionais, marcando o nas- do patrimônio (art. 31-A da Lei n 4.591/64, incluído cimento e a morte de um e de outro, encontra-se o pela Lei nº 10.931/2004), com ampla oportunidade de registro imobiliário, como “elemento formal”4. acesso aos interessados, que, comumente, não se verifica nos processos comuns de registro imobiliário. A finalidade destas breves notas é apenas tangenciar o registro especial da incorporação imobiliária Daí, ainda, o referido registro ter efeitos substan(art. 32 da Lei nº 4.591/64), considerando, em estudo ciais importantes, que estão além dos efeitos jurídicobásico ou elementar, a sua morfologia registral, isto é, -reais ordinários do registro predial, como é a faculdao seu aspecto procedimental. de de negociar as frações ideais do terreno vinculadas às futuras unidades apenas após o registro da incorpo2. O REGISTRO ESPECIAL DA INCORPO- ração, ou, então, para as alienações ou onerações das RAÇÃO IMOBILIÁRIA (art. 32 da Lei nº 4.591/64). unidades autônomas, o óbice à evicção ou ao decreto de ineficácia delas (art. 55 da Lei nº 13.097/2015). Especial é o que se distingui do comum, do ordinário, por suas peculiaridades, seus traços diferenciados 3. AS FASES DO PROCESSO DE REGISTRO ou seus efeitos excepcionais. DE INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA.

3.1. Rogação. 4) CAMBLER, Everaldo A. 'O registro da incorporação imobiliária: pontos estratégicos e problemáticos in ‘Direito Notarial e Registral Avançado', Coord. Yoshida, Figueiredo e Amadei. São Paulo: RT, 2014, p. 381-396.

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Rogar é pedir, e, em sede registral imobiliária, é pressuposto que se atende, a princípio, com a mera apresentação do título para registro, pelo interessado.


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Cuidando-se de registro de incorporação imobiliária, a rogação, pelo ângulo do interessado no registro, é satisfeita com a apresentação de requerimento acompanhado dos documentos arrolados no art. 32 da Lei nº 4.591/64 no Registro de Imóveis competente.

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em sintonia, assim, com o princípio de territorialidade que informa a organização dos serviços de registro predial no Brasil. Observe-se, contudo a necessidade de cautela, para o caso de desmembramento ou anexação da base territorial de uma unidade de registro à outra, ocasião em que a rogação (e o registro) se deve fazer na unidade nova/atual, mas apresentando certidão de propriedade e ônus expedida pela unidade antiga, salvo prévia abertura de matricula da área em incorporação na unidade nova, que se recomenda.

Estão legitimados a requerer esse registro: a) o incorporador-proprietário cujo nome consta na matrícula ou em transcrição da área em incorporação; b) o incorporador-compromissário comprador/cessionário/promitente cessionário da área, com seu direito O requerente pode ser pessoa física ou jurídica, real de aquisição inscrito; c) o incorporador não pro- embora, em regra, sejam pessoas jurídicas. Se pessoa prietário com procuração (art. 31, §1º, Lei 4.591/64). jurídica, ela deve estar em situação regular e representada por seus sócios, conforme o teor do contrato Observe-se, contudo, que embora amplo o leque social (e suas alterações), que acompanhará o requeridos legitimados ao registro da incorporação imobi- mento. Se pessoa natural, é preciso ter atenção ao seu liária, é indispensável, sempre, a disponibilidade da estado civil, se solteira ou casada, pois, nessa hipótese área em incorporação, para a qual se pede o mencio- (casada), é necessária a anuência do cônjuge, exceto nado registro, na medida em que a incorporação (e no regime de separação absoluta de bens, e, naquela seu registro) é para a negociação das unidades imo- (solteira), ainda é preciso verificar se há notícia oficial biliárias (e o registro é que habilita o incorporador a de união estável, pois, neste caso, também se fará nenegociá-las). Ademar Fioraneli e Jersé Rodriguez da cessária a anuência da(o) companheira(o). Silva, aliás, bem enfatizam o caráter empresarial (com os traços da organização e da comercialização), intiQuanto ao objeto, ou seja, à área em incorporação mamente ligado à incorporação, enquanto “atividade a que o requerimento se reporta é necessária a conconjugada de construir e vender”5. Por isso, incorporar, gruência com o imóvel matriculado ou transcrito, e, enquanto direito subjetivo dominial, é poder jurídico se o caso, a indispensável fusão de matrículas ou uniradicado não apenas na faculdade de usar (edificar, ficação de imóveis, ou, ainda, se o caso, a retificação para extrair da coisa melhor uso), mas também e, so- de registro. bretudo, na faculdade de dispor. Assim, a indisponibilidade forçada ou voluntária da área inibe a incorpoE, por fim, em relação à forma, o requerimento, ração e seu registro. que precisa ser escrito e assinado, admite instrumento particular ou público, e exige, se particular, firmas Registro Imobiliário competente, por outro a lado, é reconhecidas. o do local em que a área em incorporação está situada, ou seja, aquele cuja circunscrição abrange essa área, Não basta, contudo, requerer; é preciso instruir esse requerimento com os diversos documentos arrolados no art. 32 da Lei nº 4.591/64. 5) Das incorporações, especificações, instituição e convenção de condomínio. Direito imobiliário (Coletânea I), org. por Marival Antonio Jordão. São Paulo: Instituto de Ciências Aplicadas, 1989, p. 53.

Então, e agora sob o ângulo do registrador, a ro5


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gação terá a contrapartida de sua regular formalização na serventia predial, que abrange duas cautelas formais: a) primeiro a autuação, com posição dos documentos conforme aquela mesma ordem legal; b) segundo, a prenotação, ou seja, o seu lançamento no Protocolo (Livro 1), que tem por fim assegurar a posição registral, garantindo a prioridade.

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exame do registro existente, em si; c) terceiro, exame do nexo entre o título apresentado e o registro existente.

Em incorporação imobiliária, a qualificação registraria, que se deve fazer em quinze dias, é complexa, quer pela pluralidade documental (a exigir observância legal para todos os documentos necessários, e exaÉ possível, apresentar o requerimento e documen- me da regularidade de cada um deles), quer pelo rigor tos apenas para exame e cálculo (art. 12 Lei de Re- técnico e conhecimento específico que se impõe. gistros Públicos); mas isso não é recomendado, pois aí inexistirá posição registral assegurada (prioridade Não há espaço, nestas breves notas, para detalhar garantida). Ademais, sem prenotação, em caso de exi- essa qualificação, discorrendo analiticamente sobre gência pelo registrador, não há, se ela for satisfeita, cada um dos documentos do art. 32 da Lei nº 4.591/64, como aproveitar prazo de prenotação (que inexiste), razão pela qual apenas aponto, ilustrativamente, uma nem a autuação realizada, nem mesmo, por consequ- dentre as várias e intrincadas questões nesta matéria. ência, a validade dos documentos segundo o prazo de vigência da prenotação (que, repita-se, não houve). É o tema da minimização ou eliminação de algumas dessas exigências documentais. Assim é a ques3.2. Qualificação registrária. tão que resulta da redução do prazo da usucapião extraordinária para quinze anos, no novo Código Civil, Qualificar juridicamente é atribuir ao fato, por sua e, daí, saber se ainda perdura o prazo vintenário do subsunção à norma jurídica, determinado efeito. art. 32, “c”, da Lei nº 4.591/64, referente ao histórico dos títulos de propriedade do imóvel, acompanhaQualificação registrária, então, é espécie de qualifi- do de certidão dos respectivos registros. E, ainda, o cação jurídica, que atribui ao título (fato examinado) que, na mesma ratio iures, resulta da inovação inserta a consequência de sua inscrição predial ou de sua re- no art. 55 da Lei nº 13.097/2015: se, desde a vigência cusa correlata (efeito decorrente do juízo do registra- desta regra, a tutela dos adquirentes é absoluta, pelo dor), segundo os princípios registrários e as normas principio de fé pública (não mais de mera legitimalegais aplicáveis. ção registral, ou de presunção relativa de exatidão e de integralidade), por efeito do registro da incorporação Nas palavras de Ricardo Dip, “Diz-se qualificação imobiliária, não se justificaria, então, nem esse históregistral (imobiliária) o juízo prudencial, positivo ou rico, nem tal certidão, nem ainda, as diversas outras negativo, da potência de um título em ordem a sua ins- certidões destinadas apenas a informar os adquirencrição predial, importando no império de seu registro tes sobre os correlatos riscos na aquisição da unidade ou de sua irregistração”6, não se olvidando, ainda, do imobiliária (v.g. certidão de protesto). bom e didático método que ele apresenta para esse fim: a) primeiro, exame do título, em si; b) segundo, Nada obstante as boas razões daqueles que entendem, em interpretação sistemática, estar reduzido esse prazo, de vinte para quinze anos, ou até mesmo 6) Sobre a qualificação no Registro de Imóveis. Registros de Imóveis dispensados os documentos cujo fim seria apenas o de (vários estudos). Porto Alegre: SafE, 2005, p. 168.

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facilitar aos interessados (adquirentes de unidades autônomas) a pesquisa dos atos jurídicos antecedentes à sua aquisição, agora já assegurada, pela lei, em modo absoluto (sem os riscos da evicção ou do decreto de ineficácia), penso que ainda vingam o mencionado prazo vintenário e a exigência de todos os documentos insertos no art. 32 da Lei nº 4.591/64: a) a uma, por sua previsão expressa em lei especial, em sede de segurança jurídica formal, que comunga, a princípio, com os nortes da interpretação literal; b) a duas, porque tais documentos são exigidos, por antecipação ao registro da incorporação, para análise do registrador (e, daí, secundariamente, dos interessados na aquisição das unidades autônomas), conferindo-lhe, então, ampla documentação, para análise da idoneidade do incorporador, do empreendimento e dos negócios futuros, em ordem à inscrição de registro especial de efeitos extremamente relevantes (especialmente após a vigência do art. 55 da Lei nº 13.097/2015); c) a três, porque a referida exceção ao sistema de legitimação registral é recente (2015) e, a rigor, ainda não está plenamente absorvida na doutrina nem decantada na jurisprudência, e, como se sabe, não é de boa prudência, na esfera administrativo-registrária, minimizar ou eliminar a tutela social dos adquirentes, que a lei formal ainda impõe, em contexto exegético ainda instável, ou seja, em quadro de orientação doutrinária e jurisprudencial ainda incerto quanto ao real sentido e alcance da norma. Outrossim, havendo qualificação registrária negativa e não se conformando o interessado com todas as exigências formuladas (irresignação total, não penas parcial), viável a requalificação judicial, em processo de dúvida registrária (art. 198 da LRP), observando cuidar-se de dissenso entre o registrador e o apresentante do título sobre a prática de ato de registro em sentido estrito.

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O registro da incorporação imobiliária, embora obrigatório, é “registro efêmero”7 (nasce para morrer) lançado na matrícula da área de terreno, que submete o imóvel ao regime da incorporação imobiliária, o qual vigora até a formal instituição do condomínio edilício. Daí, pois, o seu caráter transitório, pois com a averbação da construção e os registros da instituição, especificação e convenção do condomínio, o imóvel passa a submeter-se a regime jurídico diverso, ou seja, ao regime do condomínio edilício. Inconfundível, portanto, o registro da incorporação imobiliária, com os registros da instituição, da especificação e da convenção do condomínio edilício, bem como com o registro da atribuição das unidades autônomas aos titulares. Por isso, o registro da incorporação não confere existência jurídica ao condomínio edilício nem às unidades autônomas, que dependem da averbação da construção e do registro da instituição do condomínio; “porém, o incorporador pode negociar frações ideais que por força da incorporação ficam vinculadas a futuras unidades autônomas” (CSM, Ap. 1.002-6/9). Destaque-se que se cuida de registro com prazo de validade, ou seja, é válido pelo prazo de 180 dias, findo o qual, caso não concretizada a incorporação, o incorporador só poderá negociar as unidades após atualizar a documentação do art. 32, revalidando o registro por igual prazo (art. 33). Prazo de validade do registro (art. 33), portanto, é prazo para concretizar ou caracterizar a incorporação, ou seja, “para tomar a iniciativa do empreendimento, que é assumida pelo incorporador, mediante a alienação de ao menos uma das unidades autônomas ou pela contratação da construção” (CSM, Ap. 525-6/8), e, as-

3.3. Registro da incorporação. 7) SANTOS, Flauzilino Araújo dos. Ob. cit., p. 209.

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sim, “Não se confunde prazo de carência com prazo de cumprimento da finalidade contratual” (p. 121/122)8. validade do registro. A regra do citado artigo 33 é aplicável tanto na hipótese de fixação do prazo de carência, 3.4. Publicidade registral imobiliária. quanto na hipótese na qual não se estabelece carência” (CSM, Ap. 525-6/8). A publicidade imobiliária, por último, é, em regra, indireta, por informações ou certidões, mas, excepPrazo de carência da incorporação é prazo dentro cionalmente, pode ser direta, ou seja, com acesso diredo qual é possível desistir do empreendimento (art. to do interessado ao que consta na unidade de serviço 34). Daí, o prazo de carência é mera faculdade do in- de registro predial. corporador, e, (a) dentro dele o incorporador pode desistir da incorporação imobiliária (art. 34), ou (b) O registro de incorporação imobiliária é, para além em até cinco dias do seu término, o proprietário do da acessibilidade ao que consta na matrícula em que terreno (compromissário comprador ou cessionário) for lançada essa inscrição, via informações ou certique outorgou procuração (art. 31, §1º) pode denun- dões, publicidade procedimental, cujo acesso (aos auciar a incorporação inviável, caso o mandatário-in- tos do processo e ao conjunto dos documentos depocorporador não o faça (art. 35, §3º). sitados na Serventia Predial e que deram suporte ao registro especial) é facultado A falta desse registro especial, aliás, é tão grave que, a qualquer interessado, em modo direto, ou seja, com para além de ilícito civil, configura ilícito criminal (art. consulta direta no Registro Imobiliário. 66 da Lei nº 4.591/64), embora, a princípio, não deva prejudicar os adquirentes das unidades autônomas. 4. CONCLUSÃO. Por isso, conforme a doutrina de Luiz Philipe Tavares de Azevedo Cardoso, “No campo da incorporação Em incorporação imobiliária (meio) e em condoimobiliária, o STJ, em julgado-líder, que conta também mínio edilício (fim), como exposto, o registro predial com adesão no TJSP, afastou a ocorrência de nulidade tem não só posto estratégico de regularidade, de juou anulabilidade em decorrência do descumprimento ridicidade e de mutação das situações prediais, mas do art. 32 da Lei 4.591/1964, solucionando a questão também tem função ontológica, atributiva do ser jupela resolução por inadimplemento” (p. 45). Trata-se, rídico de cada um. É, pois, pelo registro imobiliário, então, de inadimplemento por “descumprimento de que o prédio ingressa e vive em regime jurídico imodeveres secundários” (p. 48), com amarração na que- biliário de incorporação e de condomínio edilício. bra do princípio da boa-fé objetiva (arts. 113, 187, 422 do CC) e na consequência geral do inadimplemento Cuidar, pois, do registro da incorporação imobili(art. 389 do CC), em “relação obrigacional complexa ária é, então, para além do trato da regularidade e da advinda do contrato” e da lei (art. 32), “imposta para juridicidade da incorporação, cuidar do ponto jurídia tutela da coletividade de consumidores e até do inte- co formal que lhe dá existência no universo do direito, resse difuso da sociedade em não haver... edificações ir- que, enfim, confere ao imóvel um regime jurídico próregulares” (p. 207). É, pois, “forma de inadimplemento prio, transitório e tendente à mutação para o regime antecipado” por “violação de deveres acessórios, instrumentais ou preparatórios” (p. 109/110), em que a “perda da função social deveu-se à perda da confiança no 8) Inadimplemento Antecipado do Contrato no Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2015.

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jurídico condominial edilício, que se busca, no futuro, consolidar. E, por outro lado, embora efêmero ou de caráter transitório, o registro da incorporação imobiliária é de singular importância, inclusive por seus relevantes efeitos substancias, a justificar o regime jurídico peculiar e o discurso pontual de cada uma das fases de seu processo nas Serventias Prediais, campo próprio da morfologia registral e da operacionalidade do sistema registral imobiliário. Ficam, pois, estas breves notas introdutórias, apenas na esperança de traçar algumas linhas gerais da matéria e de fomentar estudos de maior densidade aos que dedicam à teoria e à prática do direito imobiliário registral. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: AZEVEDO CARDOSO, Luiz Philipe Tavares de. Inadimplemento Antecipado do Contrato no Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2015. CAMBLER, Everaldo A. O registro da incorporação imobiliária: pontos estratégicos e problemáticos in ‘Direito Notarial e Registral Avançado’, Coord. Yoshida, Figueiredo e Amadei. São Paulo: RT, 2014, p. 381-396. DIP, Ricardo H. M. Sobre a qualificação no Registro de Imóveis. Registros de Imóveis (vários estudos). Porto Alegre: SafE, 2005, p. 168. FIORANELI, Ademar. SILVA, Jersé Rodriguez. Das incorporações, especificações, instituição e convenção de condomínio. Direito imobiliário (Coletânea I), org. por Marival Antonio Jordão. São Paulo: Instituto de Ciências Aplicadas, 1989, p. 51-102. SANTOS, Flauzilino Araújo dos. Condomínios e incorporações no registro de imóveis. São Paulo: Mirante, 2012. SILVA FILHO, Elvino. “Loteamento fechado e condomínio deitado”, in Revista de Direito Imobiliário – RDI nº 14. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p. 8-35. SILVA PEREIRA, Caio Mario da. Incorporação Imobiliária, in Revista de Direito Imobiliário – RDI nº 4. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1979, p. 9-18.

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oo Ano AnoI I NN 43 Agosto/2016 Julho/2016

ARTIGO BREVES ANOTAÇÕES SOBRE A USUCAPIÃO EXTRAJUDICIAL Ralpho Waldo de Barros Monteiro Filho Juiz de Direito auxiliar da 1ª Vara de Registros Públicos da Comarca de São Paulo. Mestre em Direito Civil. Especialista em Direito Civil, Direito Imobiliário, Processo Civil e Empresarial. Professor de Direito Civil das FMU-SP. Professor de Registros Públicos do Cursinho Damásio Educacional. Professor-Assistente da Escola Paulista da Magistratura (Pós-Graduação em D. Civil) e Professor Convidado da Pós em Direito Imobiliário da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo.

1. Introdução: desjudicialização dos procedimentos. É possível afirmar que existe tendência de se aumentar o espectro de atribuições das Serventias Extrajudiciais para que trabalhe cada vez mais parelha à população e ao Poder Judiciário. Muitas destas novas atribuições referem-se à matérias até então tratadas exclusivamente no âmbito jurisdicional, i. e., processadas perante um Juiz de Direito por meio de ação ou, ainda, pedido de providências (de natureza administrativa mas ainda assim na esfera do Poder Judiciário). Essa tendência representa fenômeno que se se pode chamar, com razoável precisão, de desjudicialização dos procedimentos, que já se fizera sentir anteriormente por meio da possibilidade de realização dos inventários, partilhas e divórcios extrajudiciais. O mesmo se diga, ainda, da postura assumida pelo Código Civil de 2002. Para ficar em um exemplo, a emancipação, atualmente, acontece, como regra, por meio de instrumento público, pela concessão dos pais, independentemente de homologação judicial (art. 5º, parágrafo único, I, Código Civil). Especificamente sobre a usucapião, a desjudicialização já se apresentou em mais de uma oportunidade. O art. 214, § 5º, da LRP (inserido pela Lei nº 10.931/2004), evita o cancelamento do registro por

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vício de procedimento quando presentes os requisitos da usucapião. É dizer, privilegia-se a aquisição de direito (já consumado, diga-se), em detrimento de norma procedimental. É exemplo, ainda, o parágrafo único do art. 1.242, do Código Civil que, a seu turno, transforma o registro em si (o ato de registrar), em requisito para se usucapir. Em passo seguinte, veio a Lei nº 11.977/2009, primeira a regulamentar a usucapião administrativa, restrita, entretanto, às situações de regularização fundiária de interesse social. Por tais peculiaridades, embora correto dizer que se tratou de norma pioneira, inadequado afirmar que tenha sido ela – a Lei de 2009 – o grande marco desta modalidade administrativa de usucapião. Foi o Código de Processo Civil de 2015 (art. 1.071), inegavelmente, que ao inserir o art. 216-A à Lei de Registros Públicos, fez nascer em nosso ordenamento – tal como já acontece em sistemas jurídicos estrangeiros – a usucapião administrativa geral (e geral porque aplicável para a aquisição de qualquer direito imobiliário usucapível). Mas o que sobreleva notar, neste ponto, é a legalidade/constitucionalidade e conveniência desta medida, o que faço por meio de duas observações pontuais. Primeiro: a desjudicialização – e aqui me refiro especificamente à usucapião extrajudicial, com a ressalva de que, de resto, aplica-se também para as outras providências desta natureza - é reconhecidamente constitucional, posto não se tratar daquelas questões resguardadas pela chamada reserva de jurisdição. Ademais disso, por óbvio, não se excluirá, em qualquer hipótese, a possibilidade de judicialização da questão, i. e., análise pelo Judiciário, caso necessário, observando-se, pois, rigorosamente o estatuído na Lei Maior (art. 5º, XXXV).

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Nesse sentido, por exemplo, o § 9º do art. 216-A da LRP afirma que a rejeição do pedido extrajudicial não impede o ajuizamento de ação de usucapião. Por força da conformação dada ao instituto pela novel legislação, também não há risco de se arranhar contraditório e ampla defesa, posto inexistir litígio no procedimento. Segundo: o contexto desta legislação – e não apenas sob o enfoque da legalidade da medida – é absolutamente favorável à sua edição. Inicialmente porque notória a quantidade de feitos, de maneira geral, em trâmite perante nossas Varas e Tribunais. Soma-se a essa constatação o fato de que – e essa talvez seja a nota mais importante e digna destas observações - os Registradores e Notários são profissionais de qualificação técnica irrefutável, igualmente capacitados para atender a presente demanda, com larga experiência em temas extremamente específicos. Seja dado, portanto, enfoque jurídico ou fático-contextual, o advento da usucapião administrativa é acontecimento notável e alvissareiro. 2. A usucapião extrajudicial em nosso Direito positivo: algumas questões. a) Tratamento da nova Lei processual. Adequado afirmar que nesta nova sistemática processual pretendeu o legislador tornar a usucapião extrajudicial a regra, deixando a via judicial como exceção. O regramento da usucapião judicial no novo Código de Processo Civil é escasso, tratado como processo comum, e não mais especial. A via administrativa, entretanto, foi regulamentada em detalhes e minúcias inexistentes naquela via, o que denota, certamente, a preferência da lei. b) Atribuição. 11


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O pedido será dirigido, como diz expressamente a cabeça do art. 216-A, da LRP, ao Cartório do Registro de Imóveis da Comarca em que estiver situado o imóvel (ou da circunscrição imobiliária se na Comarca houver mais de um). Para além de simplesmente se discutir atribuição, a constatação é de extrema importância na medida em que será nesta Serventia que se processará o pedido para posterior deferimento/indeferimento. Pelos mesmos motivos, conclui-se que nunca haverá necessidade de qualquer homologação judicial ou autorização judicial. Mas é de se indagar, entretanto, o seguinte: como regra geral, os pais e representantes legais dos menores e incapazes não podem alienar ou onerar os bens dos representados, ou ultrapassar os atos de mera administração, sem a devida autorização judicial (art. 1.691, CC). Haverá então necessidade de autorização judicial para que o incapaz postule usucapião administrativa ou aceite a usucapião requerida por outrem?

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outros incapazes. Ainda dentro do tema da atribuição, é interessante abordar outro ponto que poderá render discussão. Formulando outra indagação: quais as modalidades de usucapião que poderiam ser levadas ao conhecimento do Registro Imobiliário? A princípio todas. E essa é a resposta que se deve dar tomando-se em conta nosso ordenamento positivo. Vejo, entretanto, dificuldade no processamento da espécie coletiva. E, frise-se desde já, não porque o art. 10, § 2º, da Lei nº 10.257/2001 diga que essa modalidade será declarada pelo juiz, mediante sentença. Até porque não se lê, na determinação, qualquer vedação. É que se deve levar em consideração que tal norma foi redigida antes do advento da usucapião administrativa e seguiu, de resto, o padrão, o modelo geral, que era o reconhecimento da usucapião pela via judicial (nesse sentido, as outras modalidades também são, como se sabe, produto de decisão judicial, e nem por isso restarão excluídas da via administrativa). A dificuldade vem, em meu sentir, de empecilhos que parecem, num primeiro momento, incontornáveis (mas cuja discussão está justamente lançada para que se busquem alternativas e soluções). O art. 10 (e de maneira geral todas as leis atuais) contém cláusulas gerais (como população de baixa renda), que ficariam a cargo do Oficial interpretar, ainda que sem as garantias próprias do Poder Judiciário. São, como se sabe, expressões propositadamente vagas que terão concretização teórica a cargo dos julgadores. E assim se permite porque os magistrados são dotados de garantias – e aqui sobreleva destacar a sua forma de responsabilização civil – que não existem para os registradores. Esse é um fato a ser considerado.

A resposta mais apressada poderia caminhar pela afirmação, o que não me parece correto. E a solução é mesma também para os casos em que o incapaz se posicione como aceitante. E isso porque uma vez preenchidos os requisitos da usucapião, a propriedade restou adquirida pelo titular, independentemente da vontade de quem quer que seja. Não é a vontade manifestada nesta seara, pois, que servirá de base para a prefiguração da usucapião. Nesse sentido, os representantes do incapaz não estariam alienando nada, onerando nada, mas apenas reconhecendo que já se preencheram os requisitos da usucapião (em outras palavras, admitindo que ela já se consumou e, assim, já há legítimo direito de propriedade). Posta a discussão nestes termos, não há razão para que se exija qualNão é só. No processo judicial (da usucapião colequer providência judicial, ainda que figurem como in- tiva), há efetiva (efetiva mesmo, com presença substeressados, no procedimento extrajudicial, menores e tancial) participação do Ministério Público, o que não 12


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aconteceria na via administrativa. Considere-se, também, a sempre existente dificuldade em se consolidar os ocupantes nestas espécies de usucapião, para o fim de fazê-los participar do procedimento. A demanda judicial conta com a perícia e, ainda assim, não se soluciona por completo o problema. Veja-se que não são exatamente óbices instransponíveis, mas são constatações que podem levar, na prática, a não se processar a usucapião coletiva extrajudicialmente. Trocando em miúdos: não há vedação jurídica, mas circunstâncias que talvez inibam a utilização da via registral.

c) Pedido Inicial.

I. É possível comparar o pedido inicial, que será levado ao Registro Imobiliário, com aquele que estampa uma petição inicial para o processo judicial. Me parece, assim, que os requisitos deste pedido administrativo são próximos, mas sem o mesmo rigor, de uma daquelas exordiais. Desta forma, será necessário que o postulante faça o enquadramento legal do caso, apontamento da modalidade de usucapião, descrição da posse e os fatos que fundamentam o pedido (início da posse, exercício da posse etc.). Embora não estejam na lei tais exigências, é adequado que o pleito venha delas acompanhado, até porque será formulado – tal como determina o caput do art. 216-A – por advogado. Poderá o Oficial, inclusive, pedir para que seja suprida determinada carência de informações (como se fosse verdadeira emenda). O descumprimento destas determinações

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poderão levar o registrador a rejeitar o pedido. É certo que se for possível ao Oficial retirar essas informações do contexto, poderá admitir a peça. Como não há um indeferimento da inicial, se não houver qualquer atendimento aos requisitos ou ao pedido de emenda do Oficial, o resultado será sempre a rejeição do pedido (§ 8º). II. Desnecessidade de reconhecimento de firma na procuração. Como dito, o pedido será formulado por advogado. Daí porque deverá acompanha-lo, também, procuração outorgando poderes para tanto. Neste ponto, é de se perguntar se essa procuração, caso formalizada por instrumento particular, deverá ter firma reconhecida por Tabelião (nos termos do art. 221, II, da LRP). Tenho que não. Por dois motivos: (i) a determinação referida no inciso II do art. 221, LRP, refere-se à necessidade de reconhecimento de firma nos documentos que servirem de título para o registro, o que não se verifica com a procuração (que aqui é, antes de qualquer coisa, um mero instrumento, e não o objeto, em si, do ato registral); (ii) para que se evite um descompasso entre as vias judiciais e extrajudiciais, vez que o art. 38 do CPC/73, após alteração em 1994, deixou de exigir a providência, o que se manteve no atual art. 105. Parece-me, por certo, de todo recomendável que se procure diminuir ao máximo as discrepâncias entre o tramitar judicial e o processamento administrativo. Sem prejuízo desta opinião, soa-me discutível a necessidade de advogado para tal providência, dado que, em âmbito administrativo – esfera registral – podem postular pessoas que não ostentem inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil. Aliás, a regra no sistema registrário é a desnecessidade da presenção do 13


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advogado para os pedidos que se lhe dirige. De qualquer forma, é ponto que, reconheço, merece maiores e mais amplos debates para que se efetive de um ou outro jeito. III. Prenotação.

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fato, transcrevendo-o, fielmente, para os seus livros ou outro documento. Diferentemente da escritura pública, não contém declaração de vontade. Sobre a ata notarial, de rigor apontar, ainda que resumidamente, os seguintes pontos:

Assim que apresentado, o pedido de usucapião será inscrito no protocolo (prenotado). Embora a prenotação, nos termos da LRP, art. 188, tenha validade de 30 dias (ao término do qual será cancelado), no procedimento administrativo ele se prolonga até a manifestação de mérito do Oficial (rejeição ou acolhimento) ou a impugnação (a lei não fala, mas a impugnação também tem o condão de terminar a validade da prenotação porque o pedido irá à Juízo).

(i) Possível afirmar que ela ganhou posição de absoluta proeminência no sistema da usucapião extrajudicial.

Questão pertinente que certamente será levantada diz respeito à possibilidade de o Oficial analisar outros títulos subsequentes ao protocolo (portanto na pendência do procedimento de usucapião). Ao meu sentir não poderá fazê-lo porque se trata (o requerimento da usucapião extrajudicial) de pedido que poderá alterar a titularidade do bem, com criação e extinção de direitos (se, por exemplo, reconhecida a propriedade).

(iii) Deverá narrar, essencialmente, elementos acerca da titularidade, do tempo e da qualidade da posse existente. Poderá, para isso, descrever o imóvel, tal como o visualizou, ouvir vizinhos ou pessoas próximas do imóvel.

(ii) O notário narrará os fatos que presenciar, mas não emitirá juízo de valor. Por exemplo, não atestará que a posse é mansa ou pacífica; que a posse é longeva ou que há posse “ad usucapionem”. A análise de tais dados ficará a cargo do Oficial do Registro de Imóveis.

Há opiniões no sentido de que se houver documento (título, por exemplo) que dê suporte à usucapião, como na modalidade ordinária, desnecessária seria a Nem se há argumentar que o mesmo é possível no feitura da ata. Não me parece adequado, pesem tais pedido de retificação imobiliária, de maneira que se posicionamentos, dispensar o documento em qualpoderia, também, praticar na pendência do proces- quer caso, porque ainda assim ele servirá para atestar samento da usucapião. E isso porque na reitificação outras circunstâncias, como a própria pacificidade e somente se alterará, se o caso, elementos objetivos ou mansidão da posse. subjetivos do registro, sem se atacar a titularidade do bem. (iv) Nada impede que sejam lavradas várias atas. Pode surgir a necessidade, por exemplo, de compled) Documentos que acompanham o pedido. mentar a primeira com informação importante e que faltou na primeira oportunidade. Possível, inclusive, I. Ata notarial lavrada pelo tabelião, ates- que sejam lavradas por notários diferentes (e. g. se for tando o tempo de posse do requerente e seus ante- necessário ouvir um vizinho que se mudou de Cocessores, conforme o caso e suas circunstâncias. marca). Ata notarial é o instrumento público por meio do II. Planta e memorial descritivo com a qual o notário capta, por seus sentidos, determinado concordância dos titulares de direitos reais e ou14


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tros direitos registrados ou averbados na matrícula do, como violência; ou, ainda, se é precária (em caso do imóvel usucapiendo e na matrícula dos imóveis de locação e comodato). confinantes. O interesse é especificamente este, de maneira que A planta e o memorial devem estar assinadas pelo qualquer outra coisa que não diga respeito à situação profissional habilitado (CREA – Conselho Regional do imóvel deverá ser ignorada pelo Oficial (como de Engenharia e Agronomia - ou CAU – Conselho de eventuais ações de cobrança das partes e outras ações Arquitetura ou Urbanismo). A descrição, obviamente, pessoais sem pertinência ao imóvel). deverá obedecer os critérios de especialidade objetiva da LRP (arts. 176 e 225). É cuidado que, por óbvio, Considere-se, ainda, que em tese a medida seria visa garantir o fácil ingresso do documento no álbum dispensável porque, em princípio, qualquer ação que imobiliário. possa alterar a situação jurídica de um imóvel deveria estar averbada na matrícula do bem. Assinarão, ainda, todos os titulares de direitos reais e outros direitos sobre o imóvel usucapiendo, e conO que se poderia sugerir, para fins de ampliar a frontantes, com o que manifestam concordância com discussão para uma futura alteração legislativa, é diso laudo e com o pedido. Embora a lei pareça apenas pensar a apresentação destas certidões, deixando a exigir que as assinaturas dos outros titulares sejam da- cargo – o ônus, em verdade – a eventual terceiro que das somente no memorial, ideal é que as assinaturas se opuser e demonstrar interesse na solução do caso. sejam apostas em ambos os documentos, até porque É certo que, nesta hipótese, e de acordo com o for– e a prática cotidiana mostra isso - para o leigo há mato atual da nossa legislação, o procedimento seria maior facilidade em compreender a planta. judicializado em face do surgimento do litígio (outro ponto que, eventualmente, poderia ficar para posteConsidero, ainda neste tema, que inexistindo li- rior discussão). tígio, e mesmo que se considere a usucapião forma originária de aquisição da propriedade, deverão ser Nesta ordem de pensamento, lanço ainda outra localizadas – nesta via administrativa - as matrículas pergunta: se houver certidão que aponte ação (judi(ou transcrições) do imóvel usucapiendo e dos con- cial, portanto) de usucapião, pelo mesmo requerente, frontantes, diferentemente do que acontece na via ju- haverá de se considerar prefigurada litispendência? dicial em que, se não achados, abrir-se-á matrícula de Não há – porque juridicamente inviável – litispendênqualquer forma. Se não for possível, a medida deverá cia. É questão conceitual: litispendência é fenômeno ser rejeitada pelo Oficial. que somente se forma entre processos judiciais. Logo, impossível de se formar entre demanda judicial e proIII. Certidões negativas dos distribuidores cedimento administrativo. O que se deve verdadeirada comarca da situação do imóvel e do domicílio do mente indagar é quais serão os efeitos que ambas as requerente. medidas, simultâneas, podem causar reciprocamente. O objetivo da providência é verificar se há ações Anote-se, inicialmente, que se já houver julgamenreferentes ao imóvel (por exemplo, outra usucapião, to de procedência ou improcedência judicial (transiação possessória, repersecutória e até ações locatí- tado em julgado), o Oficial deverá recusar o pedido cias). Visa investigar, neste sentido, se a posse é efeti- administrativo. vamente mansa e pacífica; ou se iniciada por ato vicia15


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Em caso contrário, as medidas conviverão. Ade- essência. quado será que o Oficial informe o Juízo acerca da providência extrajudicial. Aliás, acrescente-se – e isto já foi dito - que a existência desse justo título não libera a feitura da ata noPara solver o conflito, preponderará sempre o man- tarial que, em meu sentir, continua sendo peça indisdamento judicial, posto ser a decisão que se revestirá pensável. de coisa julgada material (portadora, assim, de efeitos mais severos). Mas, de fato, a redação do dispositivo não é das melhores. Além daquela ideia equívoca, acima apontada, Pode-se imaginar várias situações: o registrador também se poderia deduzir (e da mesma forma erropoderá deferir, e depois o juiz rejeitar, cancelando o neamente), após sua leitura, que o justo título pode registro feito administrativamente; o oficial poderá ser substituído por outros documentos. Na verdade, negar, e depois o juiz deferir. Poderá, mesmo, ser aco- tratou o inciso de coisas diferentes. Uma delas é a exilhido antes pelo oficial, que irá, então registrar, con- gência do justo título quando a modalidade pleiteada ferindo a propriedade. O juiz, então, poderá, depois for a ordinária. Outra é aquilo que se aceitará como disso, julgar procedente a ação proposta. Neste caso, prova dos fatos (recibos e quitações dos encargos fisque será peculiar, adequado efetuar-se novo registro cais e tributários; minutas de contratos e promessas; da mesma usucapião, justamente por conta daqueles declarações de pessoas atestando determinada situaefeitos acima referidos e que acobertarão a decisão ju- ção etc.). Para estes últimos, servirá, então, a expresdicial. são qualquer outro documento. IV – Justo título ou qualquer outros docu3. Considerações Finais. mentos que demonstrem a origem, a continuidade, a natureza e o tempo da posse, tais como o pagaEm linha de conclusão deste resumido arrazoamento dos impostos e das taxas que incidirem sobre do, surge a usucapião administrativa – efetivamente o imóvel. uma notável novidade – em nosso ordenamento positivo, em posição de destaque, a ponto mesmo de se À redação da lei, ao demandar apresentação de lhe considerar a regra em nosso sistema, no lugar das justo título, poderia passar a impressão de que este ações usucapionais. documento sempre acompanhará o pedido na via extrajudicial. Se assim fosse, a única modalidade aceiÉ certo que, tal como sói acontecer com todas as tável para a seara administrativa seria a ordinária. E novidades, precisará de alguns reparos e ajustes futucertamente não é esta a ideia da legislação. Pretendeu ros para o seu bom funcionamento, não se negando, dizer o legislador é que se trata de documento indis- de outra forma, o valor que em si carrega, mormente pensável, mas somente quando se tratar de pedido de se considerada à luz do que se chamou de desjudiciausucapião ordinária. lização dos procedimentos, tendência que deve ser seguida a toda evidência. Veja-se que a lei não criou nova modalidade de usucapião, mas nova forma de processamento, de reAdequado, igualmente, concluir que a nossa parconhecimento. As modalidades são as mesmas, já co- ticipação – e aqui digo nossa participação em sentido nhecidas dos juristas, sem qualquer alteração em sua muito amplo – será de extrema importância, precisa16


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mente para verificar, no cotidiano forense e extrajudicial, os nós e gargalos eventualmente existentes. Os próprios oficiais e registradores que lidarão com o tema são peças chave para tal mister, considerando-se sua vasta experiência nesta área tão específica bem como o fato de se constituírem, a partir de agora, também no pelotão de frente do instituto que, até então, era exclusividade do Poder Judiciário.

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DECISÕES JUDICIAIS E ADMINISTRATIVAS Selecionadas por

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ÍNDICE Página 19: DECISÃO JUDICIAL #1 Página 30: DECISÃO JUDICIAL #2 Página 36: DECISÃO ADMINISTRATIVA #1 Página 44: DECISÃO ADMINISTRATIVA #2


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DECISÃO ADMINISTRATIVA #2

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