Revista A Ordem - Julho/2021

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Fundação Paz na Terra Ano XLV - Nº 62 Natal/RN | julho de 2021

AMIGO:

UM VERDADEIRO TESOURO



A ORDEM

SUMÁRIO EDITORIAL

UMA EDIÇÃO RECHEADA DE TEMAS ATUAIS

Fundação Paz na Terra Ano XLV - Nº 62 Natal/RN | julho de 2021

AMIGO:

UM VERDADEIRO TESOURO

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O conteúdo desta edição está recheado de temas relacionados à vida das pessoas e sua inserção na sociedade e na Igreja. Dois artigos abordam questões do dia a dia das pessoas. Um deles sobre o Plano Diretor de Natal, em fase de discussão, e que certamente proporá melhorias para a vida dos cidadãos e cidadãs. O outro fala sobre a esperança em dias melhores, mesmo em meio à Pandemia em que se vive hoje, afetando pessoas no Mundo Inteiro. Duvidar de dias melhores parece ser normal, pois mesmo São Tomé duvidou da Ressurreição de Jesus (Jo 20, 24-29). Na coluna da entrevista, o conteúdo será sobre reforma nas sanções penais no seio da Igreja. Há, ainda, outros assuntos, como os 60 anos do Movimento de Educação de Base (MEB), e as duas reportagens principais. Uma delas é bastante interessante. Trata dos relacionamentos das pessoas, em meio à Pandemia do Coronavírus. As amizades se alimentam dos encontros, bate-papo, ajudas mútuas, proximidade, relacionamentos. Como estão os relacionamentos de amizade em meio à Pandemia, já que há necessidade de manter o distanciamento? A segunda reportagem traz como tema a vida dos diáconos na Arquidiocese de Natal, principalmente os mais idosos e já inativos. Diferentemente dos Padres, mantidos pelas paróquias, os diáconos vivem do exercício de sua profissão. Mas como manter a família, quando perdem o trabalho, como ocorreu com alguns em consequência da Pandemia? Acesse e leia o rico conteúdo desta edição.

CAPA

ENTREVISTA - Papa modifica sanções penais na Igreja

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REPORTAGEM - Esperança

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REPORTAGEM - Os Diáconos permanentes da Arquidiocese de Natal, suas funções e dificuldades

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VIDA PASTORA - Movimento de Educação de Base completa 60 anos

EXPEDIENTE

Revista mensal da Fundação Paz na Terra Endereço: Rua Açu, 335 – Tirol CEP: 59.020-110 – Natal/RN Fone: 3201-1689

CONSELHO CURADOR: Pe. Antônio Nunes Vital Bezerra de Oliveira CONSELHO EDITORIAL: Cacilda Medeiros Luiza Gualberto Josineide Oliveira Jeferson Rocha Cione Cruz André Kinal Milton Dantas Vitória Élida

EDIÇÃO E REDAÇÃO: Luiza Gualberto (DRT-RN 1752) Cacilda Medeiros (DRT-RN 1248) REVISÃO: Milton Dantas (LP 3.501/RN) FOTO DA CAPA: Pixabay

COLABORADORES: José Bezerra (DRT-RN 1210) Cione Cruz Vitória Élida Rede de Comunicadores da Arquidiocese de Natal

DIAGRAMAÇÃO: Akathistos Comunicação (47) 9 9618-3464 COMERCIAL: (84) 3615-2800

ASSINATURAS: Com as coordenações paroquiais da Pastoral da Comunicação ou na redação da revista, no Centro Pastoral Pio X – Av. Floriano Peixoto, 674 – Tirol – Natal/RN (84) 3615-2800 assinante@arquidiocesedenatal.org.br www.arquidiocesedenatal.org.br

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A ORDEM

PALAVRA DA IGREJA

MENSAGEM AOS AVÓS E IDOSOS

Francisco Papa

A tua oração é um recurso preciosíssimo: é um pulmão de que não se podem privar a Igreja e o mundo, sobretudo neste tempo tão difícil para a humanidade em que estamos.

4 JULHO DE 2021

A Santa Sé divulgou a mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos, que será celebrado em 25 de julho. Francisco escreveu sua mensagem, colocando-se lado a lado com os idosos, e iniciou afirmando: “’Eu estou contigo todos os dias’ (cf. Mt 28, 20) é a promessa que o Senhor fez aos discípulos antes de subir ao Céu; e, hoje, repete-a, também a ti, querido avô e querida avó. Sim, a ti! ‘Eu estou contigo todos os dias’ são também as palavras que eu, Bispo de Roma e idoso como tu, gostaria de te dirigir por ocasião deste primeiro Dia Mundial dos Avós e dos Idosos: toda a Igreja está solidária contigo – ou melhor, conosco –, preocupa-se contigo, ama-te e não quer deixar-te abandonado”. Depois de ter recordado as perdas e sofrimentos por causa da pandemia, o Papa consolou: “O Senhor conhece cada uma das nossas tribulações deste tempo. Ele está junto de quantos vivem a dolorosa experiência de ter sido afastado; a nossa solidão – agravada pela pandemia – não O deixa indiferente”. No texto, o Santo Padre explica o motivo pelo qual proclamou, justamente neste ano, o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos: “Mesmo quando tudo parece escuro, como nestes meses de pandemia, o Senhor continua a enviar anjos para consolar a nossa solidão, repetindo-nos: ‘Eu estou contigo todos os dias’. Di-lo a ti, di-lo a mim, a todos. Está aqui o sentido deste Dia Mundial que eu quis celebrado pela primeira vez precisamente neste ano, depois dum longo isolamento e com uma retomada ainda lenta da vida social: oxalá cada avô, cada idoso, cada avó, cada idosa – especialmente quem dentre vós está mais sozinho – receba a visita de um anjo!”. O Papa recorda que o “anjo enviado por Deus, pode ter o rosto de um familiar, de um conhecido”, mas o Senhor “envia-nos os seus mensageiros também através da Palavra divina, que Ele nunca deixa faltar na nossa vida. Cada dia, leiamos uma página do Evangelho, rezemos com os Salmos, leiamos os Profetas! Ficaremos comovidos com a fidelidade do Senhor”. E alerta aos idosos: “Atenção! Qual é a nossa vocação hoje, na nossa idade? Salvaguardar as raízes, transmitir a fé aos jovens e cuidar dos pequeninos. Não vos esqueçais disto” E reitera: “Não existe uma idade para aposentar-se da tarefa de anunciar o Evangelho, da tarefa de transmitir as tradições aos netos. É preciso pôr-se a caminho e, sobretudo, sair de si mesmo para empreender algo de novo”. Na mensagem, o Pontífice também destaca a oração, na vida do idoso: “A tua oração é um recurso preciosíssimo: é um pulmão de que não se podem privar a Igreja e o mundo, sobretudo neste tempo tão difícil para a humanidade em que estamos – todos na mesma barca – a atravessar o mar tempestuoso da pandemia, a tua intercessão pelo mundo e pela Igreja não é vã, mas indica a todos a serena confiança de um porto seguro”. O Papa Francisco conclui a mensagem com um desejo: “Oxalá cada um de nós aprenda a repetir a todos, e em particular aos mais jovens, estas palavras de consolação que ouvimos hoje dirigidas a nós: ‘Eu estou contigo todos os dias’. Avante e coragem! Que o Senhor vos abençoe”. FONTE: Portal Vatican News


A VOZ DO PASTOR

A ORDEM

Sobre Sant’Ana e São Joaquim Prezados leitores/as Neste mês de julho, comemoramos Sant’Ana e São Joaquim, pais de Nossa Senhora, avós de Jesus. É um mês especial para lembrarmos nossos avós e nossos idosos. Neste ano, com uma menção honrosa, pois Papa Francisco instituiu o “Dia Mundial dos Avós e dos Idosos”, a ser celebrado no último domingo de julho. Embora não tenhamos notícias sobre os pais da Mãe de Jesus nos escritos do Novo Testamento, sabemos de seus nomes por meio dos livros denominados “apócrifos” (livros considerados “não-canônicos”, isto é, não fazem parte da lista dos livros inspirados), como o livro “Proto-evangelho de Tiago”, do século II. Este livro conta a história de Ana e Joaquim. Ana, sendo estéril, concebe Maria, e a leva, aos três anos, ao Templo, para ser dedicada ao serviço divino. De fato, nós comemoramos no dia 21 de novembro a festa desta “apresentação” de Maria ao Templo, feita por Sant’Ana, daí o nome de nossa Padroeira, Nossa Senhora da Apresentação. O culto aos pais de Nossa Senhora é muito antigo, especialmente entre os gregos, a partir do século VI, tendo um desenvolvimento nos séculos XV-XVI. Sant’Ana é muito cultuada na região do Seridó, no nosso Estado. A honra que lhe é devida por ser a mãe da Virgem Maria, assim incluída na História da Salvação, faz-nos venerar esta mulher de fé, piedosa israelita que, com seu esposo, Joaquim, fazem parte do povo eleito, o povo de Israel, dentro do qual nasce o Filho de Deus que se fez homem. Por serem os avós de Jesus, e isso tem um forte cunho antropológico e teológico, pois dá consistência ao fato fundamental do Cristianismo, a Encarnação do Verbo, também lembramos os avós e idosos. E, na sensibilidade pastoral do Papa Francisco, tal recordação deve inspirar-nos a que nunca deixemos de olhar, cuidar, integrar e aprender com os nossos idosos. Além de que, recordando a realidade dos avós, hoje não mais visto como estritamente reservada aos idosos, há muitos avós “jovens”, no sentido de que se tornam avós mais cedo, porém, com a mesma singeleza de quem deposita aos filhos de seus filhos, aquela ternura que nos encanta e afaga. Com o lema: “Eu estou contigo todos os dias”, o Papa Francisco enviou uma mensagem para o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos”, cuja primeira celebração ocorrerá no dia 25 de julho, lembrando que o Senhor envia sempre “anjos” para acompanhar, ajudar e fortalecer: “Ora, mesmo quando tudo parece escuro, como nestes meses de pandemia, o Senhor continua a enviar anjos para consolar a nossa solidão repetindo-nos: ‘Eu estou contigo todos os dias’. Di-lo a ti, di-lo a mim, a todos. Está aqui o sentido deste Dia Mundial que eu quis celebrar pela primeira vez, precisamente neste ano, depois de um longo isolamento e com uma retomada ainda lenta da vida social: oxalá cada avô, cada idoso, cada avó, cada idosa – especialmente quem dentre vós está mais sozinho – receba a visita de um anjo! Este anjo, algumas vezes, terá o rosto dos nossos netos; outras vezes, dos familiares, dos amigos de longa data ou conhecidos, precisamente neste momento difícil”. Celebremos os pais de Nossa Senhora. Cuidemos e honremos nossos avós e nossos idosos!

Dom Jaime Vieira Rocha Arcebispo Metropolitano de Natal

O culto aos pais de Nossa Senhora é muito antigo, especialmente entre os gregos, a partir do século VI, tendo um desenvolvimento nos séculos XVXVI”

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A ORDEM

O Papa Francisco fez algumas modificações no livro VI, do Código de Direito Canônico. O livro é um dos sete que formam o Código e diz respeito às sanções penais na Igreja. No dia primeiro de junho deste ano, foi publicada a constituição apostólica Pascite Gregem Dei, com a qual o Papa realiza tais modificações. O trabalho de revisão das leis já havia sido iniciado pelo Papa Bento XVI, hoje emérito. O Padre Júlio César Souza Cavalcante, vigário judicial da Arquidiocese de Natal e que também é mestre em direito canônico, esclarece sobre o significado dessas modificações nas sanções penais da Igreja.

Rivaldo Júnior

PAPA MODIFICA SANÇÕES PENAIS NA IGREJA 6 JULHO DE 2021


ENTREVISTA A ORDEM

No dia primeiro de junho, a Santa Sé apresentou modificações no Código de Direito Canônico, no que diz respeito às sanções penais da Igreja. Mas, antes de falar deste ponto, gostaríamos que o senhor explicasse o que é o Código de Direito Canônico. Padre Júlio César: O surgimento da Igreja Católica a partir da atuação dos Apóstolos instituídos pelo próprio Jesus se deu através do anúncio da Ressurreição e Ascensão de Jesus ao céu. Por volta dos anos 60, este anúncio chega a Roma, capital do Império que dominava o mundo, e inicia-se um firme trabalho de evangelização que conduz à conversão ao cristianismo de muitos pagãos. Com o passar do tempo, Roma se torna o centro da cristandade e o seu Bispo passa a ser considerado o sucessor do Apóstolo Pedro, o primeiro Papa. Com a ruptura entre a Igreja de Constantinopla e aquela de Roma, por volta do século IX, o Papa Leão IX utiliza o termo católica para designar a Igreja Romana em oposição à Igreja chamada Ortodoxa pelo Patriarca Miguel Cerulário. A verdade é que a Igreja Católica influenciou de maneira forte e premente a História da humanidade nos últimos XXI séculos. A sua expansão, enquanto anunciadora do Evangelho – estima-se que hoje 1,7 bi de pessoas professam a fé católica no mundo –, veio, porém, acompanhada da sua evolução também enquanto instituição. O crescimento da instituição Igreja Católica levou à necessidade de regulação dos fiéis através do direito enquanto formavam uma sociedade sujeita a conflitos e desentendimentos embora fundamentada no Evangelho do Amor e da Misericórdia. É precisamente dentro dessa necessidade de normas e regulamentos que encontramos o Direito Canônico. Formalizado pela primeira vez no século XII, através do Decretum Gratiani, evoluiu de acordo com a sociedade de cada

São previstos novos delitos em matéria econômicofinanciária e novas penas como a multa, o ressarcimento dos danos, a privação de toda ou parte da remuneração eclesiástica, suspensão a todos os fiéis e não só mais aos clérigos.

época e se faz presente no tempo atual através do Código de Direito Canônico (1983) e do Código dos Cânones das Igrejas Orientais (1990), ambos promulgados por São João Paulo II, que assim se expressou quando da promulgação daquele latino: “O Código de Direito Canônico é totalmente necessário à Igreja. Constituída também como corpo social e visível, a Igreja precisa de normas: para que torne visível sua estrutura hierárquica e orgânica; para que se organize devidamente o exercício das funções que lhe foram divinamente confiadas, principalmente ad do poder sagrado e da administração dos sacramentos; para que se componham, segundo a justiça inspirada na caridade, as relações mútuas entre os fiéis, definindo-se e garantindo-se os direitos de cada um”. E acrescentava: “As leis canônicas, por sua natureza, exigem ser observadas” ( Cf.

Constituição Apostólica Sacrae disciplina eleges, 25 de janeiro de 1983.)

As modificações apresentadas pela Santa Sé, dia primeiro de junho, são referentes ao livro VI, do Código. Do que trata esse livro? Padre Júlio César: Como já sabemos, se trata de um dos sete livros que formam o Código de Direito Canônico. No dia 23 de maio passado, com a Constituição Apostólica Pascite gregem Dei (Apascentar o rebanho de Deus), o Papa Francisco promulgou o novo Livro VI do Código de Direito Canônico, que tem como conteúdo a normativa sobre as sanções penais da Igreja. “A fim de que todos possam adequadamente informar-se e conhecer a fundo as disposições das quais se trata”, o referido livro entrará em vigor no dia oito de dezembro próximo, Solenidade da Imaculada Conceição. No geral, quais são as principais modificações que dizem respeito às sanções penais da Igreja? JULHO DE 2021 7


A ORDEM

ENTREVISTA

Fotos: Dantas Júnior

Padre Júlio César: As modificações introduzidas no novo Livro VI respondem fundamentalmente a três critérios diretivos: a) Adequada determinação das normas penais; Proteção da comunidade e atenção para a reparação do escândalo e o ressarcimento do dano; c) Oferecimento aos Pastores dos meios necessários para poder prevenir os delitos e poder intervir a tempo na correção de situações que poderiam tornar-se mais graves. Partindo destes princípios, o novo direito penal introduz novos fatos delituosos e configura melhor outros delitos já previstos, sancionando-lhes também com penas diversas. São previstos novos delitos em matéria econômico-financiária e novas penas como a multa, o ressarcimento dos danos, a privação de toda ou parte da remuneração eclesiástica, suspensão a todos os fiéis e não só mais aos clérigos. Também são previstos instrumentos de intervenção mais idôneos a corrigir e prevenir os delitos. Merece ser assinalada a afirmação explícita no texto do princípio fundamental da presunção de inocência e a modificação da norma sobre a prescrição, com a finalidade de favorecer a conclusão dos processos em termos razoavelmente breves. Também os delitos reservados à Congregação para a Doutrina da Fé, tipificados depois da promulgação do Código vigente, foram inseridos no livro VI. Outras modificações, também na denominação dos títulos das partes e dos capítulos nos quais o livro vem dividido. Algumas modificações foram feitas relativas à disposição dos cânones. O que muda no caso de abusos contra menores? Padre Júlio César: A transferência dos cânones relativos ao delito de abuso sexual contra menores e os delitos de pedopornografia do capítulo sobre os “delitos contra obrigações especiais” àquele dos “delitos contra a vida, a dignidade e a liberdade da pessoa” pode ser visto como uma escolha redacional, se assim 8 JULHO DE 2021


ENTREVISTA A ORDEM

Hoje, o acesso torna-se bastante facilitado pois o Código de Direito Canônico encontrase na internet, em sua versão oficial, no site do Vaticano e no site da CNBB, inclusive já com o texto da reforma ora promulgada se quer, mas é uma afirmação expressiva da vontade do Legislador de reafirmar a gravidade deste crime e a atenção a ser reservada às vítimas. Deve-se acrescentar que tais delitos são agora estendidos pelo Código também aos membros dos Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica e aos fiéis leigos que gozam de uma dignidade ou desenvolvem um ofício ou uma função na Igreja. E sobre os crimes de natureza patrimonial? Padre Júlio César: Em modo particular, foram tipificados delitos de tipo patrimonial como a alienação de bens eclesiásticos sem as prescritas consultas e os delitos patrimoniais cometidos por grave culpa ou grave negligência na administração. Além disso, foi tipificado um novo delito previsto para os clérigos ou os religiosos que “além dos casos já previstos pelo direito, comete um delito em matéria econômica, mesmo que em âmbito civil, ou viola gravemente as prescrições contidas no cân. 285 § 4” que veta aos clérigos administração de bens sem a licença do próprio Ordinário.

cedida

Como os fiéis leigos podem ser acesso, ou seja, conhecer as leis do Código de Direito Canônico, especialmente as que dizem respeito a eles? Padre Júlio César: Hoje, o acesso torna-se bastante facilitado pois o Código de Direito Canônico encontra-se na internet, em sua versão oficial, no site do Vaticano e no site da CNBB, inclusive já com o texto da reforma ora promulgada. Além disso, a versão impressa pode ser encontrada nas livrarias católicas. Aos fiéis leigos recomendo a leitura do Livro II, intitulado Do Povo de Deus, sem detrimento da leitura e estudo da obra completa do Código de Direito Canônico, em seus sete livros. JULHO DE 2021 9


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ARTIGO

Esperança

O ser humano foi ontem, é hoje, mas, principalmente, será amanhã. É projeto. É dínamos. É olhar para frente. É escolher caminhar. Mas, em nossas vidas, quem não aprecia um momento de ócio, de paz? Um momento de paragem. Nós estamos hoje submetidos ao tempo do desempenho. O que seria isso? Basta um cotejo com o passado de nossos pais para percebermos que nossos dias estão cada vez menores, embora tenham as mesmas vinte e quatro horas. Estamos muito ocupados, querendo mostrar serviço. Quem de nós não tentou marcar uma simples reunião de pastoral e nunca houve um horário em que todos pudessem? É que o desempenho exige de nós o frenético. Qual tempo nos foi roubado, nessa lógica que nos faz ficar cada vez mais sem tempo? Justo o tempo da reflexão. O tempo das perguntas fundamentais. O Cardeal José Tolentino tem razão: existe um pequeno caminho nas grandes perguntas. É que a pergunta é energia pura. Ao pararmos num banco de uma praça por uns instantes e observarmos a natureza ao redor, tantas vezes contrastando com a obra da inteligência humana, nos damos conta de que existe um criador. Hoje se fala muito de falta de fé. Mas, no fim das contas, o momento de cultivo da fé está sempre espremido, como um recheio de sanduíche ralo. Falta-nos a capacidade de descer do bonde alucinante da vida moderna para um tempo de observação. É nesse espaço que ouvimos a voz de Deus. E a voz de Deus é inquietadora como o comprimir de uma mola. Há uma tensão após uma oração que é pura energia. Ao sair da experiência da transfiguração vivida na prece, e na oração maior, que é a eucaristia, é necessário descer a ladeira ‘apressadamente’, como Maria, e transformar toda essa energia em movimento. O cristianismo é caminho e caminho só se faz caminhando. É estéril o caminho sem caminhante. A propósito, nem caminho é. José, esposo de Maria, tinha esses momentos de paragem, em sonhos. Dorme e se relaciona com Deus. “Levanta-te, toma o menino e sua mãe, e foge para o Egito. Fica lá até que eu te avise...”(Mt 2, 13). O tempo de crise, como aquele da iminência da morte ordenada por Herodes e como o que estamos vivendo nessa pandemia, é um tempo de provação para toda a Igreja. Tempo de contemplação evangélica para o bom discernimento do caminho, mas, essencialmente, é caminho novo a construir e caminhar. Dias melhores virão! Mas só virão para aqueles que tiverem a coragem de caminhar. E caminhar primeiro com o coração. “Não ardia nosso coração enquanto ele nos falava pelo caminho...?”(Lc 24,32) se perguntaram os discípulos de Emaús. Quando o coração arde, os pés se põem a caminho! Não importa a estrada, que pode ser uma rede social, um encontro no Meet ou no Zoom. Importa caminhar. Mais importante que a estrada é a companhia e nossa companhia é Jesus! Essa ode ao caminho é força propulsora que vem de Deus. Não consta nos escritos que José murmurou em todo o caminho até o Egito. Para a Sagrada Família de Nazaré, é como se o caminho fosse tão natural quanto o respirar, o sopro vital. Em seguida, o segundo sonho, na paragem egípcia, para um novo caminhar, agora em rota de retorno. Com o impulso de Deus, o passado vai passando, o presente vai passando, mas o futuro é uma eterna descoberta, um gostoso espanto com o novo, a alegria do evangelho, a alegria do amor. Alegrai-vos e exultai! Afinal, Cristo vive ao lado do caminheiro, em toda terra, que chamamos de querida! Querido caminho! No movimento fundamental do cristianismo, ora et ambula (ore e caminhe)! 10 JULHO DE 2021

Diác. Eduardo Wanderley Professor do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN) Paróquia de São Camilo de Léllis – Natal (RN)

“Hoje se fala muito de falta de fé. Mas, no fim das contas, o momento de cultivo da fé está sempre espremido, como um recheio de sanduíche ralo”


A ORDEM

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A ORDEM

CAPA

“ SÃO JOSÉ: O COLO DO DIVINO

SÍNODO ECLESIAL

Como é bom sermos estimulados a vivenciar o estilo de vida de São José, começando por seus traços históricos e adentrando ao irrequieto mundo de suas virtudes! Por mais alegorias que se façam presentes em seu ornato de santo, nada substituiria a sua condição de “Pai amado”; aquele que tomou nos braços uma criança e se fez pai, dando colo: um humano sendo reverenciado como cuidador do divino. Acreditamos ser isto algo transcendente em meio ao mundo concreto dos homens e mulheres desta terra. Nada seria capaz de responder a qualquer indagação feita em torno deste cenário de homem e Deus a não ser a própria santidade de José, pai amantíssimo. São José muito nos inspira pelo seu feitio de homem, de pai. Aquele que ama, que faz, que conduz, educa, expressa no gesto, na palavra, um verbo que se fez homem, habitando o colo de um homem. Ele teve o amor no colo, o Jesus vivo em suas mãos de pessoa simples, do cotidiano, porém se fazendo santo com o santo conduzido. Ele, como pai amado, soube guiar uma vida breve em breve olhar e santidade que passa no cotidiano, aperfeiçoando a cada passo, a cada ato, o primeiro trono de Jesus: seus braços. Foi escolhido para este cuidado, para este zelo e, como diz São Bernardo, “Deus encontrou José, segundo o seu coração, e confiou plena segurança no mais misterioso segredo de seu coração”. Ainda diz de São José: “De sua vocação, considerai a multiplicidade, a excelência, a sublimidade dos dons sobrenaturais com que foi enriquecido por Deus”. Neste sentido, se São José goza destas grandes virtudes, sendo protetor do Menino-Deus, somos agraciados como pessoas caminhantes neste espaço eclesial de hoje, tendo-o como patrono – protetor, defensor, guarda deste corpo místico, a Igreja. A irmã Toinha Paiva, josefina, traduz a inspiração de sua vocação a “com São José, aprendemos a nos santificar”. Quando se aprende a caminhar na santificação, com certeza, fomos movidos/as por alguma virtude contemplada; esta virtude é ternura de Deus manifestada pelo amor. José, pai amantíssimo, conduziu um sonho e, acordando, transformou em realidade: silenciou para fazer crescer o Salvador.

Certamente, você já viu ou ouviu a palavra “sinodalidade”. Ela, de fato, tem sido bastante usada nos últimos tempos. E, agora, mais precisamente, porque a Igreja Católica se prepara para o próximo Sínodo dos Bispos, que ocorrerá em 2023, com o tema “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”. Em outubro deste ano, o Papa Francisco dará início a um caminho sinodal de três anos e articulado em três fases (diocesana, continental e universal) feito de consultas e discernimento, que culminará com a grande assembleia, em outubro de 2023, em Roma. Pela primeira vez, a Igreja terá um sínodo descentralizado, nascendo a partir das igrejas locais. De acordo com matéria publicada no Portal Vatican News, no último dia 21 de maio, o itinerário sinodal, que o Papa aprovou, é anunciado em um documento da Secretaria do Sínodo no qual são explicadas suas modalidades. “Um processo sinodal integral só será realizado de forma autêntica, se as Igrejas particulares estiverem envolvidas nele”, diz o texto. Além disso, também será importante a participação dos “órgãos intermediários da sinodalidade, isto é, os Sínodos das Igrejas católicas orientais, os Conselhos e Assembleias das Igrejas sui iuris e as Conferências episcopais, com suas expressões nacionais, regionais e continentais”. Na Arquidiocese de Natal, foi constituída uma comissão que vai ficar responsável pelo “caminho sinodal”, em nível local.

Prof. Milton Dantas.

12 JULHO DE 2021


CAPA A ORDEM

Amigo: UM VERDADEIRO TESOURO

A fidelidade é a característica essencial, que mantém viva a chama da amizade, pois tem como base a confiança, mesmo nos momentos mais críticos e difíceis da existência Por Luiza Gualberto

O livro do Eclesiastes 6, 14-17, assim define o amigo: “um amigo fiel é uma poderosa proteção: quem o achou, descobriu um tesouro. Nada é comparável a um amigo fiel, o ouro e a prata não merecem ser postos em paralelo com a sinceridade de sua fé. Um amigo fiel é um remédio de vida e imortalidade; quem teme ao Senhor, achará esse amigo. Quem teme ao Senhor, terá também uma excelente amizade, pois seu amigo lhe será semelhante”. Assim como em

Eclesiastes, outros trechos da Bíblia nos aprensentam os amigos e o verdadeiro sentido das amizades. Dia 20 de julho, se comemora o dia internacional da amizade e essa relação entre os amigos, nos proporcionam alegrias e fortalecimento de vínculos, por meio de um relacionamento que deve ser embasado na confiança. De acordo com a escritora Judith Viorst, em seu livro “Perdas necessárias”, nossos relacionamentos voluntários, como as amizades, nos permitirão, tanto alegrias, quanto desapontamentos. “São relações também chamadas de conexões imperfeitas”, define. O psicanalista Sigmundo Freud já disse que em nossas relações interpessoais, vivemos os atravessamentos simultâneos de sentimentos de amor e ódio. “Assim como vivemos estes sentimentos com nossas primeiras figuras de afeto, no caso, pais, mães

ou cuidadores, seguimos, na vida, repassando esses sentimento às nossas demais relações, isto é, irmãos, cônjuges, filhos e amigos”, frisa. A escritora Judith, na mesma obra, destacou alguns tipos de amigos, sendo eles: amigos por conveniência, pessoas com as quais trocamos pequenos favores; amigos por interesses pessoais, que são aquele que dependem de haver alguma atividade ou interesse comum; amigos históricos, em que os anos passaram e cada seguiu seu caminho, tendo pouco em comum agora; amigos de encruzilhada, assim como os históricos, são importantes por causa do passado; amigos de gerações diferentes, que mantém uma relação de intimidade carinhosa, terna, mas, desigual, em virtude da diferença de idade; por fim, os amigos íntimos, aqueles que envolvem o emocional e físico. São amizades de profunda intimidade. A cada um dos amigos íntimos, essas amizades implicam a revelação de aspectos

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A ORDEM

CAPA

Maria Beatriz

do eu particular, de sentimentos íntimos, como, pensamentos, desejos, temores, fantasias e sonhos. Filosofia da amizade A socióloga Josineide Silveira, aponta a reflexão levantada pelo filósofo italiano, Giorgio Agamben, em que diz que a amizade assenta-se na experiência de con-sentir, que ultrapassa a superficialidade para centrar-se nos desafios da existência. “Para o citado filósofo, a verdadeira amizade recruta o desprendimento das amarras da subjetividade, para propiciar a compreensão dos princípios construtivos da comunidade, onde os humanos podem crescer em sabedoria e tecer moldes de uma ética responsável”, aponta. Ainda de acordo com a socióloga, para demonstrar a clareza do argumento de Giorgio, o autor recorre ao quadro 14 JULHO DE 2021

Dia 20 de julho, se comemora o dia internacional da amizade e essa relação entre os amigos, nos proporcionam alegrias e fortalecimento de vínculos”

de Giovanne Serodine “O encontro dos apóstolos Pedro e Paulo na estrada do martírio”. Nessa obra, os dois apóstolos aparecem tão próximos que não conseguem enxergar a si mesmos. Contempla-se, nessa tela, a confirmação do compromisso de propagar as lições de Cristo. Eis o maior selo da amizade: a unidade de convicções e propósitos”, ressalta. Josineide também pontua que ao contemplar os fundamentos da amizade, a partir do cristianismo, somos instigados a ir além da superficialidade e do reforço às individualidades para cultivar a capacidade de con-sentir. “Ou seja, experimentar, com o amigo, dores e alegrias. Encravar-se na profundidade do viver. Tal experiência permite compreender a relação de proximidade entre o ser e o viver, na qual vigoram gratuidade e acolhimento, preceitos reitores da sabedoria”, enfatiza.


CAPA A ORDEM

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Amizade na pandemia É bem verdade e do conhecimento comum que a pandemia modificou diversos aspectos do nosso ser e existir. Entre essas mudanças, os relacionamentos entre as pessoas foram fortemente impactados. A família e amigos sofreram com o distanciamento necessário, diante da propagação do vírus. Segundo a psicóloga do Hospital Anchieta, em Brasília (DF), Fernanda Meira, a amizade tem influência direta na mente e no corpo do homem. “Com a pandemia, muita coisa mudou. Os encontros presenciais foram substituídos pelas vivências virtuais, o que foi sentido como negativo por várias pessoas, pois sem a presença dos amigos, os seres humanos passaram a sentir falta de sentimentos, como, felicidade, aconchego, segurança e tranquilidade”, destaca. Diante desse novo momento de distanciamentos físicos, a psicóloga aconselha o fortalecimento de vínculos, mesmo que de forma virtual. “Reforço a importância de mostrar aos amigos o quão especiais são eles em nossas vidas. Aproveite a fantástica tecnologia da internet para se aproximar das pessoas que você ama”, frisa.

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, Ser Mi iоario Flávio Luiz

Dona Maria dos Santos, uma vida dedicada ao Evangelho Por Flávio Luiz da Silva Coordenador da Pastoral da Comunicação Paróquia da Imaculada Conceição – Nova Cruz-RN

Maria dos Santos, 66 anos, casada com Antônio Nunes, com quem teve 16 filhos, sendo nove vivos. Ela é catequista, legionária, membro da Pastoral do Batismo, líder da Pastoral da Criança e Ministra Extraordinária da Sagrada Comunhão. Dona Maria dos Santos, como popularmente é conhecida, na Paróquia da Imaculada Conceição, em Nova Cruz, iniciou os trabalhos de evangelização por meio de orações na Rua Zacarias Barbosa de Oliveira, no Bairro Antônio Peixoto, com recitação do terço mariano, CF em família, mês de maio, mês da Bíblia, Natal em Família, além de catequisar crianças, adultos, casados, encaminhando para os sacramentos, na calçada da sua casa, mas também nos bairros Planalto e Santa Maria Goretti. Tradicionalmente, no dia 12 de outubro, ela fazia festinhas para crianças do seu bairro, que terminava com a celebração de Nossa Senhora Aparecida. No mês de dezembro, organizava o jantar para famílias no encerramento do Natal em Família. No dia das mães e no domingo de páscoa, sempre fazia celebrações da Palavra. E só parou estas ações, devido à pandemia. Além disso, dona Maria promove diversas ações na comunidade, através de doações das pessoas, como doação de cestas básicas, reformas de casas de pessoas que são carentes, aluguel de famílias carentes. Antes da pandemia, organizava um sopão, semanalmente, na sua casa, destinado para as famílias carentes do bairro. O sopão era feito com ingredientes doados por voluntários. No dia 12 de outubro de 1999, começou a celebração da Santa Missa, presidida pelo Pe. José Adelson, pároco da época, em frente à casa dela. Em 2011, com a Campanha da Fraternidade sobre a preservação da natureza, por iniciativa de Dona Maria, um lixão da entrada do bairro deu lugar a um monumento com a Imagem de Nossa Senhora Aparecida, transformando lixo em jardim. Com essa iniciativa, as celebrações passaram a ser realizadas nesse local, despertando o desejo da comunidade em construir uma capela. Através dos esforços de Dona Maria dos Santos, organizando campanhas para construção da capela, em 2013, foi adquirido um terreno e iniciada a construção. Em 2014, foi celebrada a primeira missa na capela já construída, presidida pelo Pe. Francisco de Assis Inácio. Dona Maria ainda tem sonhos para realizar na comunidade: construir uma torre na capela e conseguir uma quadra para as crianças e jovens terem uma ocupação na prática de esportes.


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Os Diáconos Permanentes DA

ARQUIDIOCESE DE NATAL, SUAS FUNÇÕES E DIFICULDADES Diáconos Permanentes, sejam casados ou celibatários, têm funções diferentes dos presbíteros e não podem assumir a função de pároco Por Diác. José Bezerra

Arquidiocese conta com 94 diáconos em exercício missionário nas paróquias, setores e comissões da Arquidiocese de Natal

A Arquidiocese de Natal tem um contingente de clérigos bem significativo, composto por dois arcebispos eméritos (Dom Heitor de Araújo Sales e Dom Matias Patrício de Macedo), o Arcebispo Metropolitano, Dom Jaime Vieira Rocha, mais de 200 presbíteros (entre diocesanos e religiosos) e 104 diáconos permanentes. Muitos dos diáconos auxiliam os presbíteros nos serviços da Liturgia, da Palavra e da Caridade, nas suas respectivas paróquias, ou em outras atividades em comunidades paroquiais. Esse contingente de clérigos (Padres e Diáconos) se dedica ao trabalho de “apascentar as ovelhas” do Senhor (cf. Jo 21,19) no território da Arquidiocese natalense. Funções do Presbítero Os presbíteros, sejam diocesanos ou de congregações religiosas, assumem as paróquias que lhes são confiadas nas condições de pároco ou administrador paroquial. O Direito Canônico prevê que eles “têm direito a uma remuneração adequada à sua condição, levando-se em conta a natureza do próprio

ofício e as conduções do lugar e tempo, e com a qual possam prover às necessidades da própria vida e à justa retribuição daqueles de cujo serviço necessitam”(CDC Cân. 281, § 1). Eles também têm direito à “assistência social que atenda convenientemente às suas necessidades em caso de doença, invalidez ou velhice” (CDC, Cân. 281, § 2). Além de assumirem paróquias, outros ainda coordenam serviços ou organismos arquidiocesanos. Funções dos Diáconos Os Diáconos Permanentes, sejam casados ou celibatários, têm funções diferentes dos presbíteros e não podem assumir a função de pároco. “Ao ministério dos diáconos são impostas mãos não para o sacerdócio, mas para o serviço”, lembrou o Papa Francisco em recente encontro com os Diáconos da Diocese de Roma, citando a Constituição Dogmática Lumen Gentium (29), do Concílio Vaticano II. Mas o Papa acrescentou que “Esta diferença não é insignificante. O diaconato, que na concepção anterior foi reduzido a uma ordem de passagem para o sacerJULHO DE 2021 17


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luxo’. Não, não é este o cadócio, recupera assim seu minho. São servos cuidadolugar e sua especificidade. sos que dão o melhor de si O simples fato de enfatizar Dos atuais para que ninguém seja exesta diferença ajuda a supecluído do amor do Senhor rar o flagelo do clericalismo, 104 Diáconos e toque a vida das pessoas que coloca uma casta de saPermanentes de uma maneira concreta”, cerdotes ‘acima’ do Povo de da Arquidiocese afirmou o Papa. Deus”, disse o Papa. O Direito Canônico deAos Diáconos da Diocese de Natal, sejam termina que os Diáconos de Roma, Francisco ressalincardinados ou não são remunerados tal tou que “na Igreja deve prevalecer a lógica oposta, a do residentes, sejam qual o presbítero. Só podem rebaixamento. Todos somos diocesanos ou do ser remunerados “os diáconos casados que se dedichamados a nos rebaixarmos, porque Jesus se rebai- Ordinariato Militar, quem em tempo integral ao ministério eclesiástico” para xou, ele se fez servo de to24 estão com dos. Recordemos, por favor, idade entre 70 e 95 que “possam prover ao sustento seu e de sua família”. que sempre, para os discípuanos de vida” Porém, “os que receberem los de Jesus, amar é servir e remuneração em razão de servir é reinar. O poder está profissão civil, que exercem no serviço e em nada mais”, ou exerceram, atendem às necessidades pródisse o Papa. Por isso mesmo o Diácono é o “homem do prias e de sua família com as rendas daí proserviço”, como lembra outra vez o Papa, na venientes” (cf. CDC, Cân. 281, § 3). O Diácono Permanente casado exerce trisua fala aos diáconos da diocese romana: “A generosidade de um diácono que se entrega pla função em sua vida de cristão e no exersem procurar as filas da frente tem perfume cício de seu ministério, coerente com a misde Evangelho, conta a grandeza da humilda- são que abraçou: a de pai de família (Igreja de de Deus que dá o primeiro passo para ir doméstica), a de diácono servidor na Igreja ao encontro até mesmo dos que lhe viraram de Jesus Cristo e a de profissional. Com o as costas”. E Francisco acrescenta que “Os que ganha como profissional ele sustenta a diáconos não são ‘sacerdotes pela metade’ família e assim não depende da Igreja para o ou de segunda categoria nem ‘coroinhas de exercício ministerial.

Diác. Eugênio Lima, presidente da comissão arquidiocesana dos diáconos

18 JULHO DE 2021


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A ORDEM

Os Diáconos na Arquidiocese de Natal Dos atuais 104 Diáconos Permanentes da Arquidiocese de Natal, sejam incardinados ou residentes, sejam diocesanos ou do Ordinariato Militar, 24 estão com idade entre 70 e 95 anos de vida. Desses, 9 deles não estão mais exercendo as atividades próprias do Ministério: Diác. José Anchieta Rodrigues, 84 anos, viúvo, que reside com familiares, na comunidade Arenã, de São José de Mipibu; Diác. José Tito Júnior, 95 anos, viúvo, residente no Abrigo Juvino Barreto, em Natal; Diác. Pedro de Souza Leite, 80 anos, residente com familiares, em Ponta Negra, Natal; Diác. João Batista de oliveira, celibatário, 91 anos, residente em Neópolis, Natal; Diác. Amadeu Ferreira, 77 anos, residente no conjunto Potengi, em Natal; Diác. Serafim de Medeiros Victor, 79 anos, residente no bairro Lagoa Nova, Natal; Diác. Antônio Evaristo de Santana, 87 anos, residente no Pitimbu, Natal; Diác. Antônio Sampaio do Rego, 77 anos, viúvo, residente no conjunto Amarante, em São Gonçalo do Amarante; e o Diác. Josimar Francisco de Macêdo, com apenas 52 anos, lutando contra um câncer há cerca de 10 anos, residente no bairro Bom Pastor, com a família. Ele, também, não exerce mais o Ministério. Algumas dificuldades Os demais 94 Diáconos Permanentes exercem suas atividades, seja em paróquias, seja realizando missões, seja atuando em alguma pastoral. Eles, conforme prevê o Direito Canônico, não são remunerados pela função ministerial que exercem, cada um nas comunidades em que residem, seja em paróquias de Natal ou do interior. Vivem do que a profissão lhes proporciona e com os proventos sustentam suas famílias. Alguns desses diáconos, pelo menos 11 relacionados pela Comissão Arquidiocesana dos Diáconos (CAD), começaram a enfrentar dificuldades no provimento das famílias com a chegada da Pandemia do Coronavírus. Alguns foram infectados e um deles, o Diác. Hélio Moreira, 80 anos, faleceu vítima da COVID. Outros, infectados junto com familiares, venceram a COVID. Mas alguns perderam o emprego e outros, autônomos, não puderam mais trabalhar. Um deles, por exemplo, trabalhava com transporte escolar e, com o fechamento das escolas por causa da pandemia, cessou o trabalho. Tentou usar o transporte noutras atividades, mas o veículo “bateu o motor”, isto é, quebrou peças, e ele não teve como continuar trabalhando. Ciente dessas dificuldades, o presidente da Comissão Arquidiocesana dos Diáconos (CAD), Diácono Eugênio Lima de Souza, propôs ao corpo diaconal que se aprovasse uma ajuda eventual aos que enfrentavam dificuldades para o sustento da família. A ajuda foi aprovada e, conforme as necessidades de cada um dos relacionados, recebeu uma doação em dinheiro, retirada da conta da CAD. Ao todo, as doações somaram R$ 3.900,00 (três mil e novecentos reais). “Como homens da prática da caridade, não podemos deixar de ajudar esses nossos irmãos, nestes momentos difíceis que estão enfrentando”, justificou o Diácono Eugênio, na assembleia virtual que aprovou a ajuda. Para alegria do grupo, até o final da produção desta matéria, alguns já haviam recuperado o emprego ou voltado a trabalhar como autônomos. JULHO DE 2021 19


VIVER

A ORDEM

Arquidiocese NOSSA

PARÓQUIAS DO 3º ZONAL

A revista A Ordem vem apresentando como está organizada a Arquidiocese de Natal, em relação a vicariatos, zonais e paróquias. Nesta edição, vamos conhecer as 12 paróquias e uma área pastoral que compõem o terceiro Zonal, que abrange parte da zona sul da capital potiguar e o município de Parnamirim. Socorro Freitas

Área Pastoral de Nossa Senhora Rainha da Paz – Nova Parnamirim Responsável: Pe. Antônio Marinho da Silva Neto

Luciano Silva

Paróquia de Cristo Rei – Pirangi Pároco: Pe. Alfredo Oliveira Costa Filho Telefone: (84) 3615-2830 Cedida

Paróquia de Nossa Senhora da Conceição Nova Parnamirim Pároco: Pe. João Batista Chaves da Rocha Telefone: (84) 3615-2833 Walter Severiano

Paróquia de Nossa Senhora de Fátima Parnamirim Pároco: Pe. Antônio Murilo de Paiva Telefone: (84) 99434-7122 Cedida

Paróquia de Santo Ambrósio Francisco Ferro – Planalto Pároco: Pe. Antônio Teixeira Gomes Telefone: (84) 3218-7512 Eisenhower Souza

Paróquia de Santo André de Soveral Jardim Aeroporto Pároco: Pe. Francisco Ney Lopes Telefone: (84) 3643-1355

20 JULHO DE 2021


A ORDEM Cleane Araújo

Paróquia de Nossa Senhora dos Impossíveis – Pitimbu Administrador paroquial: Pe. Luís Paulo da Silva Telefone: (84) 99482-9022 Lucas Aires

Paróquia de São Francisco de Assis Cidade Satélite Pároco: Pe. José Nazareno Vieira da Nóbrega Telefone: (84) 3615-2834 / 999610-0652 (whatsapp)

Rivaldo Júnior

Paróquia de São Francisco de Assis e São Lostau Navarro – Pirangi do Norte Pároco: Pe. Cidinei Firmino da Silva

Cedida

Paróquia de São Mateus Moreira Cidade Verde Pároco: Pe. Francisco de Assis da Silva Telefone: (84) 2030-3381 / 98622-4138

Diác. Izanildo Cordeiro

Paróquia de Nossa Senhora do Carmo Parque das Nações Pároco: Pe. Manoel Henrique de Paiva Edilson Borges

Paróquia de Nossa Senhora Virgem dos Pobres Pároco: Pe. José Adelson da Silva Rodrigues Telefone: (84) 98839-1692 Honório Dias

Paróquia de Santa Clara – Pitimbu Pároco: Pe. Joaquim Ataíde de Araújo Telefone: (84) 3618-3113 JULHO DE 2021 21


A ORDEM ARTIGO

O que o Plano Diretor tem a ver com você? O Plano Diretor (PD) é uma lei municipal que regulamenta a política urbana, definindo as formas de ocupação do território, suas áreas protegidas e principalmente como as pessoas podem acompanhar e contribuir com seu desenvolvimento. Deve garantir os interesses coletivos, o equilíbrio ambiental e a adequação à infraestrutura urbana. O município de Natal possui planos de ordenamento urbano desde o início do século XX, mas só a partir de 1984 estruturou seu primeiro PD, com conteúdo semelhante ao atual, antes mesmo de sua obrigatoriedade, determinada pelo Estatuto da Cidade (2001). Após sucessivas revisões, o plano aprovado em 2007 apresenta um macrozoneamento em 3 zonas: uma Adensável, que inclui bairros com infraestrutura urbana suficiente (com saneamento básico adequado, por exemplo) para um maior adensamento construtivo e populacional; uma de Adensamento Básico, onde essa infraestrutura ainda é insipiente ou inexistente e, por isso, deve ter seu adensamento controlado; e as de Proteção Ambiental (ZPA), que inclui territórios ambientalmente frágeis (sejam áreas de dunas, margens de rios, etc.) e, portanto, devem ter sua ocupação controlada, com restrições maiores com fins de preservação desses biomas. O plano também define algumas áreas especiais com características específicas, que precisam ser protegidas e receber investimentos para seu pleno desenvolvimento como: as Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS); a Zona Especial de Proteção Histórica (ZEPH) e as Áreas Especiais de Controle de Gabarito (AECG). Um novo processo de revisão do plano ocorre desde 2017, sendo uma de suas maiores pautas a elevação do adensamento, trazida por alguns setores específicos da sociedade. Atualmente, Natal amplia sua rede de saneamento, entretanto, mesmo concluída, essa atenderá mais uma demanda que já estava defasada do que possibilitará maiores adensamentos na cidade. Assim, a atual revisão deveria, se ater numa reflexão sobre suas adequações às legislações nacionais atualizadas e regulamentações que não ocorreram desde a última revisão. Esse processo, entretanto, que precisaria ser participativo e representar os anseios da população à cidade, não conseguiu captar o interesse de grande parte dela, muito pela falta de divulgação de seus eventos e das poucas condições efetivas de participação que foram desenhadas pela Prefeitura. A Conferência Final do Plano finalizou recentemente a última fase do processo no poder executivo, apresentando uma minuta de lei que pouco representa os interesses coletivos, favorecendo os setores que demandam por adensamento. O processo continua na Câmara Municipal, antes de virar lei, tornando importante que mais pessoas se aproximem das discussões, de modo que o PD direcione o município para um desenvolvimento urbano ambientalmente sustentável. O Plano Diretor é um instrumento importante da Política Urbana e que reverbera na vida cotidiana das pessoas mesmo que elas não percebam: a exacerbação do adensamento, por exemplo, pode gerar, quando mal planejada, problemas de mobilidade urbana, sérios riscos ao meio ambiente e problemas de conforto térmico – só para citar alguns. 22 JULHO DE 2021

Amíria Brasil Arquiteta e urbanista, professora do DARQ/UFRN (Departamento de Arquitetura) e membro do Fórum Direito à Cidade.

Rodrigo Silva Aquiteto e urbanista, mestrando do PPGAU/UFRN (Programa de Pos-graduação em Arquitetura e Urbanismo) e membro do Fórum Direito à Cidade.

O Plano Diretor é um instrumento importante da Política Urbana e que reverbera na vida cotidiana das pessoas mesmo que elas não percebam”


VIVER A ORDEM

Idosos continuam MANTENDO

CUIDADOS PARA EVITAR O CORONAVÍRUS Esse discurso, do “fique em casa”, vem sendo cumprido mais pelos idosos que, apesar de vacinados em sua maioria, acham que ainda não é hora de bater perna por aí. Por Cione Cruz

Quase um ano e quatro meses após o início da Pandemia do Coronavírus, as medidas restritivas para controlar a expansão da doença no Brasil continuam. Já com a previsão de um terceira onda, embora não tenhamos saído da segunda, contabilizando mais de 500 mil mortes no País, a recomendação dos especialistas é que os cuidados continuem e as medidas sejam prorrogadas e respeitadas, especialmente no que diz respeito ao distanciamento e uso de máscara e álcool em gel. Um certo isolamento ainda é recomendado, até que o vírus tenha sido controlado. Esse discurso, do “fique em casa”, no entanto, vem sendo cumprido mais pelos idosos que, apesar de vacinados em sua grande maioria, porém ressabiados, acham que ainda não é hora de bater perna por aí. Desde o início da pandemia, foram eles as grandes vítimas (quadro mudado nos últimos meses), apesar dos cuidados dos filhos e por iniciativa deles mesmos. Muitos sofreram com solidão, por conta do isolamento, sem direito de ver os próprios filhos e netos. Alguns se apegaram à religião com mais afinco, mesmo que de forma remota, pois os templos religiosos passaram muito tempo fechados, embora hoje já estejam abertos, mas com certas recomendações e restrições.

Realidade atual Para alguns idosos essa “reclusão” tem sido mais dura, como é o caso de Dona Rosarinho, ou Maria do Rosário Souza Barros, 95 anos, “acamada” há três anos depois de uma queda que lhe fraturou o fêmur. Conta-nos sua filha, a jornalista Regina Barros que, reclusas desde 15 de março de 2020, quando a pandemia chegou ao Brasil, ela diz, bem humorada, que viraram umas “carmelitas descalças”. “As compras são feitas pela internet, com entrega em domicílio e eventuais consultas só no modo remoto. Ela até já tomou as duas doses da vacina Coronavac. Eu já tomei uma primeira dose, e mesmo assim não recebemos visita e o isolamento continuará até termos segurança de que a tempestade passou”. A ausência dos outros três filhos, segundo Regina, tem mexido muito com o emocional de sua mãe e não tem sido fácil preencher esse vazio familiar e preservar a sanidade mental de todos. “Ela tem ficado mais confusa no tempo e espaço, pergunta por eles e nem sempre compreende a dimensão do problema que assombra o mundo. Buscamos ajuda terapêutica com psicólogo, fisioterapeuta e terapeuta ocupacional que, mesmo de forma remota, têm nos auxiliado na missão. A fé cristã, sem dúvida, tem sido a melhor das terapias. RezaJULHO DE 2021 23


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VIVER

mos diariamente, assistimos missas e outras celebrações e estamos certas de que os anjos e santos de Deus estão por perto dando força e coragem para atravessar o deserto dos tempos atuais”, afirmou. Dona Rosarinho é católica praticante, foi catequista, ministra do Batismo e da Eucaristia, fiel zeladora do Apostolado da Oração, devota da Virgem Maria. Além das orações e missas pela TV Aparecida e da Paróquia Nossa Senhora da Conceição (Macau) ela preenche o tempo com leitura de livretos religiosos, exercícios e revisitando fotos antigas da família. O mesmo protocolo de isolamento total cumpriu Maria Lucidete Rizuenio de Freitas, 71 anos, paroquiana de Santo Afonso Maria de Ligório, em Mirassol, onde é membro da Pastoral Familiar. “Não frequentamos lugar nenhum durante a pandemia e os filhos é que iam ao supermercado e farmácia. Ficamos isolados em casa e na praia. Agora que arriscamos sair só para supermercados e farmácias”, afirmou. Segundo Lucidete, no início não viam nem filhos e netos, depois passaram a se verem nas áreas externas da casa, com um certo distanciamento. “Só eles e mais ninguém”, frisou. Hoje estão mais próximos, porque todos eles estão vacinados. A religiosidade é exercida remotamente: “rezamos o terço diariamente, eu e meu marido, às 18h. Aos domingos assistimos missa pelo Youtube e, às vezes, assisto na semana. Mas estou louca para voltar para a igreja, em algumas missas em que os horários não tenham muita gente”. Lucinha Fernandes, 64 anos, mãe de dois filhos e avó de quatro netos, paroquiana da

24 JULHO DE 2021

Santo Afonso, atuante (participa das pastorais Familiar e dos Irmãos de Rua e é ministra da Eucaristia) cumpriu todas as recomendações de isolamento, agora um pouco suavizadas, e aproveitou para se aprofundar nas leituras recomendadas pelo pároco, Padre Matias Soares, as encíclicas Amoris Laetitia e Fratelli Tutti. Ela acredita que, quando a pandemia acabar, “com certeza iremos voltar melhores. Porque a falta que está fazendo a família, os abraços, os apertos de mão, os beijos, tudo isso. Os amigos, o ambiente do trabalho”. Em seu depoimento, lamentou não poder acompanhar o nascimento de um neto: “Nossas vidas viraram de cabeça para baixo. Nos primeiros meses nossas vidas foram mais afetadas. Parei de caminhar, tranquei hidroginástica, academia, tudo que fazia fora de casa. Fiquei trancada. Nosso filho, que mora em Natal, era quem ia deixar as nossa feira na porta de casa ou ligava e mandava fazer a entrega. E os dias foram se passando. Família, só monitorando, visitas todas canceladas. Com os filhos e netos falávamos através de vídeo-chamadas. Nasceu outro neto neste período e não pudemos sequer irmos ao hospital, como fizemos com os outros. Nossa vida religiosa serviu de alicerce, foi nosso porto seguro. Apesar de ter sido cancelada a missa presencial, e do problema que tivemos com nosso pároco, que abalou toda nossa paróquia e nossa estrutura”. Atualmente, já voltou a servir, presencialmente, à missa e já trabalha numa nova campanha para os Irmãos de Rua, pedindo doação de alimentos, cobertores, fronhas e roupas infantis, pois muitos têm crianças. “E recentemente fomos fazer uma visita à nossa filha, em Campina Grande, com todas as precauções”.


VDA PASTORAL A ORDEM

Movimento de Educação DE BASE COMPLETA 60 ANOS

O MEB foi inspirado nas Escolas Radiofônicas, experiência que nasceu em Natal Por Cacilda Medeiros Fotos: Acervo da Arquidiocese

Na página 25, a legenda é: Equipe do Serviço de Assistência Rural (SAR) e das Escolas Radiofônicas, nos idos dos anos 60

Uma solenidade no Palácio do Planalto, na recém inaugurada Brasília (DF), em 21 de março de 1961, marcou, oficialmente, a fundação do Movimento de Educação de Base (MEB). Dessa solenidade participaram os então Núncio Apostólico no Brasil, Dom Armando Lombardi; o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Jaime de Barros Câmara; o presidente da República, Jânio Quadros, e vários bispos. Na ocasião, segundo artigo de Dom Armando Martín, bispo de Bacabal (MA), publicado no site da CNBB, em 22 de março passado, Jânio Quadros assinou um decreto que “dispõe sobre programa de educação de base e adota medidas necessárias à sua execução através de escolas radiofônicas a ser empreendida pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil”.

o jornal A Ordem publicou notícias sobre essa ação colombiana. Tratava-se da experiência da Rádio Sutatenza. Era o começo de um sonho de criar experiência semelhante, em Natal, que só se concretizou em 10 de agosto de 1958, com a inauguração da Emissora de Educação Rural de Natal, hoje, 91.9 FM. Como o próprio nome já sugeria, a Rádio nasceu com o objetivo de ser uma espécie de “escola”, que ensinava a ler, escrever, contar e noções de cidadania, principalmente à população que vivia na zona rural e que não tinha acesso às escolas convencionais. O analfabetismo era um problema crucial, naquela época, no Rio Grande do Norte. O censo do IBGE de 1960 mostra que, no RN, numa população de 951.726 habitantes, 586.688 não sabiam ler nem escrever, representando um percentual de 61,6%. Quase 50% da população Uma história que começa no RN brasileira era analfabeta. O Brasil era o sexto No final da década de 40, o então Padre Eu- país em analfabetismo. gênio de Araújo Sales, da Diocese de Natal, leu, em uma revista americana sobre um trabalho Início das Escolas educacional, no meio rural da Colômbia, país A primeira aula radiofônica foi levada ao ar vizinho ao Brasil, utilizando uma emissora de no dia 20 de setembro de 1958. A aula foi sintorádio. Nas edições de 10/01/1950 e 27/01/1950, nizada por 69 escolas, situadas em comunidaJULHO DE 2021 25


A ORDEM

VIDA PASTORAL

tiva de formação e qualificação das camadas populares e promoção da cidadania, buscando trilhar os caminhos de superação de perversos mecanismos de exclusão social”.

Casa onde funcionava o MEB, no mesmo complexo onde funcionava a Rádio Rural de Natal, 1964

des rurais pertencentes aos municípios de São Paulo do Potengi, Macaíba, São José de Mipibu, São Gonçalo do Amarante, Ceará-Mirim e Touros. A direção da Emissora ficava a cargo do Bispo Dom Eugênio Sales, que também supervisionava o conteúdo das Escolas Radiofônicas. As aulas eram transmitidas pelo rádio, diariamente, das 18h30 às 19 horas. Como a maioria das pessoas não possuía receptor, a Arquidiocese distribuía os receptores (rádios), que não deveriam pertencer ao monitor, mas a toda a comunidade. Eram cativos, isto é, só era possível sintonizar a Rádio Rural de Natal. Geralmente, os alunos se reuniam na casa do monitor, para acompanhar a aula radiofônica. E o MEB surgiu Em 21 de março de 1961, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB firmou convênio, por meio do Decreto 50.370, com o Ministério da Educação, dando origem ao Movimento de Educação de Base – MEB. O convênio foi assinado pelo então presidente da República, Jânio Quadros. A partir daí, o MEB passou a assumir o ensino radiofônico, na Arquidiocese de Natal e em outras regiões do País. Em pouco tempo, as escolas radiofônicas contavam com 25 emissoras e atingiam 15 estados. Na verdade, o convênio previa a instalação de 15 mil Escolas Radiofônicas nas regiões subdesenvolvidas do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Com a chegada do MEB, pode-se considerar a segunda fase das Escolas Radiofônicas. O MEB, hoje Quando da sua origem, o Movimento de Educação de Base tinha o objetivo de alfabetizar e politizar os menos favorecidos, especialmente, o trabalhador rural. Passados 60 anos, a história tomou outro rumo. A conjuntura social difere da vivida no final dos anos 50. O MEB funciona, ainda, em outro formato, mas sua missão não difere muito da proposta inicial. De acordo com o exposto no site institucional, a missão do Movimento, hoje, é: “a promoção integral, humana e cristã de jovens e adultos, desenvolvendo programas de educação popular, na perspec26 JULHO DE 2021

Educação a distância Há algum tempo e, principalmente, agora, com a pandemia, é comum ver anúncios de escolas, faculdades e universidades que oferecem educação a distância, ou simplesmente, com a sigla EAD. Essa modalidade, no entanto, não é tão nova assim. “Atualmente, fala-se muito em ensino remoto, híbrido, educação a distância, “homeschooling” (educação ou escola domiciliar), metodologias e tecnologias alternativas. Entretanto, não se alude à experiência pioneira das escolas radiofônicas, nascida em Natal, no ano de 1958, fruto do trabalho pastoral e socioeducativo de Dom Eugênio de Araújo Sales. Este, inspirado na obra de Monsenhor José Salcedo, na Rádio Sutatenza (Colômbia), voltou-se para a radioeducação, em moldes avançados para a época”, escreveu o Padre João Medeiros Filho, em artigo publicado no site arquidiocesedenatal.org. br, em 20 de abril deste ano. “O próprio Paulo Freire, em carta endereçada a um professor da Universidade de Utrecht (Holanda), assim se expressou: ‘O pioneirismo da alfabetização cidadã está nas escolas radiofônicas do RN. Lá, houve criatividade e ousadia”, destaca Padre João Medeiros.

Para conhecer mais sobre o funcionamento do MEB, especialmente nos tempos atuais, é só acessar o site https:// www.meb.org.br ou o perfil https://instagram.com/mebsocial Leia também o artigo “Sessenta anos do Movimento de Educação de Base”, do Padre João de Medeiros Filho, do clero da Arquidiocese de Natal, acessando: https://bit.ly/3gSTLwz

Monitores das Escolas Radiofônicas, da Arquidiocese de Natal, segurando os “rádios cativos”


EM AÇÃO A ORDEM

SAR DESENVOLVE PROJETO

“Bodega Solidária”

Iniciativa da Igreja arquidiocesana é uma ação de combate à fome e ao desperdício de alimentos Por Luiza Gualberto

Com o objetivo de combater a fome e atender famílias em situação de vulnerabilidade social, o Serviço de Assistência Rural (SAR), da Arquidiocese de Natal, iniciou um projeto, intitulado “Bodega solidária”. A iniciativa arrecada e distribui alimentos às pessoas vulneráveis, com o apoio da própria comunidade, que faz o exercício da solidariedade, por meio de doações para abastecê-la. O SAR visa, com esse projeto, fortalecer e integrar os vínculos entre o campo e a cidade, bem como, junto com as organizações sociais e populares, reunidos em uma ação mais permanente pelo direito humano à alimentação. A ação conta com o apoio de instituições estrangeiras, como a ADVENIAT e MISEREOR. Segundo o coordenador executivo do SAR, o diácono Francisco Adilson, quando a iniciativa foi pensada, o foco seria nessa ação mais permanente de acesso ao alimento. “Se a gente faz entrega de uma cesta básica, quando acaba, aquela família permanece em risco alimentar, então, essa iniciativa veio para garantir essa segurança alimentar, favorecendo o acesso permanente à alimentação. Foi aí que veio a ideia da

Bodega solidária, de ser um espaço onde as pessoas recebam, não só o alimento, mas, onde também possam ter acesso a outros tipos de ações, que possam gerar mais cidadania e compromisso com a vida”, conta. O projeto visa a implantação de cinco bodegas solidárias, em cinco municípios do interior do Rio Grande do Norte. Até o momento, já está em funcionamento os espaços nas cidades de João Câmara e Lagoa Salgada. Segundo o pároco da Paróquia de Nossa Blog de Assis

Em João Câmara, projeto está atendendo 220 famílias

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A ORDEM EM AÇÃO SAR

Iniciativa visa acesso permanente à alimentação

Senhora Mãe dos Homens, em João Câmara, o padre Josino Raimundo, é uma alegria para a comunidade receber esse projeto social da Igreja arquidiocesana. “Por meio desta iniciativa, queremos chegar às famílias que foram mais afetadas com a pandemia, principalmente do ponto de vista econômico, o que inviabiliza, na maioria dos casos, o acesso ao alimento. Convocamos a todos para que possam se somar conosco nesta ação”, reforça. Em João Câmara, estão sendo atendidas pela iniciativa, 220 famílias, sendo parte da zona urbana e parte do Assentamento Modelo, que está situado na zona rural da cidade. No município de Lagoa Salgada, a Bodega Solidária está fazendo o acompanhamento de 60 famílias. De acordo com Gilberto de Almeida, coordenador da iniciativa no município, foi feito um levantamento dessas famílias, analisando as maiores necessidades, para que o projeto pudesse dar o apoio necessário a elas. “Essas pessoas que foram cadastradas, já são acompanhadas por outros trabalhos pastorais da comunidade, como a Pastoral da Aids e pelo próprio SAR”, fala. Doações: Para dar continuidade às ações da Bodega solidária, o SAR conta com doações, que podem ser feitas na forma de entrega de gêneros alimentícios nas comunidades onde o projeto está sendo desenvolvido, bem como, na forma de recursos financeiros. Para essa finalidade, foi disponibilizou uma conta bancária: Banco do Brasil – Ag. 3525-4 – Conta: 46161-X – CNPJ: 08.344.459/0001-14 ou Chave PIX – (84) 99628-8269. 28 JULHO DE 2021


VIDA PASTORAL

A ORDEM

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